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168 Summa Phytopathol., Botucatu, v. 38, n. 2, p. 168-169, 2012 Transmissão experimental revela novos potenciais reservatórios do Cowpea aphid- borne mosaic virus * Leonardo Assis da Silva 1** , Renata Maia Garcêz 1*** , Alexandre Levi Rodrigues Chaves 1 , Addolorata Colariccio 1 , Marcelo Eiras 1**** 1 Instituto Biológico, LFF/CPDSV, São Paulo, SP, CEP 04014-002. * Parte da Dissertação do primeiro autor. Programa de Pós-graduação do Instituto Biológico. Bolsistas de Mestrado ** FAPESP e *** CAPES. **** Projeto financiado pela Fapesp, processo: 2011/11796-5. Autor para correspondência: Marcelo Eiras ([email protected]) Data de chegada: 19/03/2012. Aceito para publicação em: 15/04/2012. 1809 O Brasil é, atualmente, o maior produtor mundial de maracujá. Porém, o rendimento da cultura ainda é limitado devido às doenças que causam perdas significativas na produção (Meletti LMM. Revista Brasileira de Fruticultura v. especial, p. 83-91, 2011). O endurecimento dos frutos, induzido pelo Cowpea aphid-borne mosaic virus (CABMV, Potyvirus ), é a principal virose do maracujazeiro ( Passiflora spp.), e seu difícil controle mantém elevada a sua incidência nos pomares em todo o Brasil. Como, ainda não há variedades comerciais de maracujazeiros resistentes ao CABMV, são empregadas táticas de manejo, tais como: (i) formação de pomares com plântulas livres de vírus; (ii) erradicação de pomares antigos; (iii) cuidados na poda para prevenir a transmissão mecânica do vírus; e (iv) controle de espécies de Fabaceae, possíveis reservatórios naturais do vírus (Fischer IH, Rezende JAM. Pest Technology v. 2, p. 1-19, 2008). Visando à identificação de novos potenciais reservatórios do CABMV no campo, 12 plântulas de diferentes espécies de Fabaceae foram desafiadas com isolados virais provenientes de regiões do Estado de São Paulo: Bauru, Jacupiranga e Monte Alegre do Sul. A semeadura foi feita em bandejas, e as plântulas transplantadas, 15 dias após a germinação, para vasos de 350 mL, mantidas em casa de vegetação. Extratos vegetais, obtidos de folhas de maracujazeiros infectadas, em presença de sulfito de sódio 0,5%, pH 6,0, na proporção de 1:5 (g:mL) e carbureto de silício como abrasivo, foram friccionados com pistilo de porcelana esterilizado sobre a superfície adaxial de folhas das plantas avaliadas. Os controles constaram de plantas da mesma espécie e mesma idade, cujas folhas foram friccionadas com sulfito de sódio 0,5% e abrasivo, sendo em seguida lavadas com água. As plantas foram mantidas em casa de vegetação e a presença do vírus avaliada, 30 dias após a inoculação, pela observação dos sintomas e PTA-ELISA com antissoro policlonal contra o CABMV, cedido pelo Dr. J.A.M. Rezende, ESALQ. As espécies Dolichos lablab, Leucaena leucocephala, Mucuna deeringiana (mucuna-anã) e cultivares de Arachis hypogaea (‘BR1’, ‘BRS-Havana’, ‘BRS151L-7’), Phaseolus vulgaris (‘Pérola’, ‘BRS- Pontal’, ‘BRS-7762-Supremo’, ‘BRS-Valente’, ‘BRS-Estilo’) e Vigna unguiculata (‘BR17-Gurgueia’, ‘BRS-Pajeú’, ‘Pampo’, ‘Pitiuba’, ‘Macaibo’) comportaram-se como resistentes, não manifestaram sintomas, e não houve recuperação do vírus das mesmas, com resultados negativos em PTA-ELISA. Por outro lado, Canavalia ensiformes, Crotalaria juncea, C. incana, C. spectabilis, Cajanus cajan , Lupinus albus , Macroptilium atropurpureum, Neonotonia wightii (soja-perene) e Senna occidentalis manifestaram sintomas de mosaico e deformação foliar. Plantas de Pisum sativum (ervilha ‘Triofin’) reagiram com amarelecimento, mosaico e leve deformação foliar. Mucuna aterrina (mucuna-preta) e M. cinerea (mucuna-cinza) reagiram com anéis cloróticos locais nas folhas cotiledonares, e mosaico sistêmico nas folhas verdadeiras (Figura 1). O vírus foi detectado por PTA-ELISA e recuperado em Figura 1. Sintomas induzidos pelo Cowpea aphid-borne mosaic virus isolado de maracujazeiro de Monte Alegre do Sul, SP (CABMV-MAS) em espécies de Fabaceae inoculadas experimentalmente: (A) folha cotiledonar de Mucuna cinerea sadia, (B) folha cotiledonar apresentando anéis cloróticos locais, (C) folha verdadeira de M. cinerea sadia e (D) folha verdadeira exibindo mosaico; (E) folha de Pisum sativum (ervilha cv. ‘Triofin’) sadia e (F) folha de planta inoculada apresentando mosaico e deformação leve; (G) folha de Neonotonia wightii (soja-perene) sadia e (H) folha de planta inoculada com mosaico e deformação.

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168 Summa Phytopathol., Botucatu, v. 38, n. 2, p. 168-169, 2012

Transmissão experimental revela novos potenciais reservatórios do Cowpea aphid-borne mosaic virus*

Leonardo Assis da Silva1**, Renata Maia Garcêz1***, Alexandre Levi Rodrigues Chaves1, Addolorata Colariccio1,Marcelo Eiras1****

1Instituto Biológico, LFF/CPDSV, São Paulo, SP, CEP 04014-002. *Parte da Dissertação do primeiro autor. Programa de Pós-graduação doInstituto Biológico. Bolsistas de Mestrado **FAPESP e ***CAPES. ****Projeto financiado pela Fapesp, processo: 2011/11796-5.Autor para correspondência: Marcelo Eiras ([email protected])Data de chegada: 19/03/2012. Aceito para publicação em: 15/04/2012.

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O Brasil é, atualmente, o maior produtor mundial de maracujá.Porém, o rendimento da cultura ainda é limitado devido às doençasque causam perdas significativas na produção (Meletti LMM.Revista Brasileira de Fruticultura v. especial, p. 83-91, 2011). Oendurecimento dos frutos, induzido pelo Cowpea aphid-bornemosaic virus (CABMV, Potyvirus), é a principal virose domaracujazeiro (Passiflora spp.), e seu difícil controle mantémelevada a sua incidência nos pomares em todo o Brasil. Como,ainda não há variedades comerciais de maracujazeiros resistentesao CABMV, são empregadas táticas de manejo, tais como: (i)formação de pomares com plântulas livres de vírus; (ii) erradicaçãode pomares antigos; (iii) cuidados na poda para prevenir atransmissão mecânica do vírus; e (iv) controle de espécies deFabaceae, possíveis reservatórios naturais do vírus (Fischer IH,Rezende JAM. Pest Technology v. 2, p. 1-19, 2008).

Visando à identificação de novos potenciais reservatórios doCABMV no campo, 12 plântulas de diferentes espécies de Fabaceaeforam desafiadas com isolados virais provenientes de regiões doEstado de São Paulo: Bauru, Jacupiranga e Monte Alegre do Sul. Asemeadura foi feita em bandejas, e as plântulas transplantadas, 15dias após a germinação, para vasos de 350 mL, mantidas em casade vegetação. Extratos vegetais, obtidos de folhas de maracujazeirosinfectadas, em presença de sulfito de sódio 0,5%, pH 6,0, naproporção de 1:5 (g:mL) e carbureto de silício como abrasivo, foramfriccionados com pistilo de porcelana esterilizado sobre a superfícieadaxial de folhas das plantas avaliadas. Os controles constaram deplantas da mesma espécie e mesma idade, cujas folhas foramfriccionadas com sulfito de sódio 0,5% e abrasivo, sendo em seguidalavadas com água. As plantas foram mantidas em casa de vegetaçãoe a presença do vírus avaliada, 30 dias após a inoculação, pelaobservação dos sintomas e PTA-ELISA com antissoro policlonalcontra o CABMV, cedido pelo Dr. J.A.M. Rezende, ESALQ.

As espécies Dolichos lablab, Leucaena leucocephala, Mucunadeeringiana (mucuna-anã) e cultivares de Arachis hypogaea (‘BR1’,‘BRS-Havana’, ‘BRS151L-7’), Phaseolus vulgaris (‘Pérola’, ‘BRS-Pontal’, ‘BRS-7762-Supremo’, ‘BRS-Valente’, ‘BRS-Estilo’) eVigna unguiculata (‘BR17-Gurgueia’, ‘BRS-Pajeú’, ‘Pampo’,‘Pitiuba’ , ‘Macaibo’) comportaram-se como resistentes, nãomanifestaram sintomas, e não houve recuperação do vírus dasmesmas, com resultados negativos em PTA-ELISA. Por outro lado,Canavalia ensiformes, Crotalaria juncea, C. incana, C. spectabilis,Cajanus cajan, Lupinus albus, Macroptilium atropurpureum,Neonotonia wightii (soja-perene) e Senna occidentalis manifestaramsintomas de mosaico e deformação foliar. Plantas de Pisum sativum

(ervilha ‘Triofin’) reagiram com amarelecimento, mosaico e levedeformação foliar. Mucuna aterrina (mucuna-preta) e M. cinerea(mucuna-cinza) reagiram com anéis cloróticos locais nas folhascotiledonares, e mosaico sistêmico nas folhas verdadeiras (Figura1). O vírus foi detectado por PTA-ELISA e recuperado em

Figura 1. Sintomas induzidos pelo Cowpea aphid-borne mosaic virusisolado de maracujazeiro de Monte Alegre do Sul, SP (CABMV-MAS) emespécies de Fabaceae inoculadas experimentalmente: (A) folha cotiledonarde Mucuna cinerea sadia, (B) folha cotiledonar apresentando anéiscloróticos locais, (C) folha verdadeira de M. cinerea sadia e (D) folhaverdadeira exibindo mosaico; (E) folha de Pisum sativum (ervilha cv.‘Triofin’) sadia e (F) folha de planta inoculada apresentando mosaico edeformação leve; (G) folha de Neonotonia wightii (soja-perene) sadia e(H) folha de planta inoculada com mosaico e deformação.

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Chenopodium amaranticolor, que manifestou lesões locais. Asespécies avaliadas reagiram igualmente aos três isolados virais, comexceção de M. atropurpureum, que foi resistente ao isolado deJacupiranga.

No Brasil, já foi descrito o “vírus do mosaico da alfafa”induzindo mosaico amarelo em mucuna-preta (Costa AS, Vega J,Braga NR. Fitopatologia Brasileira v. 12, p.30, 1986). Em P. sativum

já havia relatos da infecção experimental pelo CABMV, porém semindução de sintomas (Lovisolo O, Conti M. Netherland Journal ofPlant Pathology v. 72, p. 265-269, 1966). Esta, portanto, é aprimeira constatação de que M. cinerea, M. aterrina, N. wightii e P.sativum podem ser potenciais reservatórios do CABMV no campo,uma vez que M. aterrina, M. cinerea e N. wightii são amplamentedifundidas no Brasil, por serem empregadas em adubação verde.