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    Ideao,Feira de Santana, n.5, p.13-36, jan./jun. 2000.

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    O QUE ISTO A FENOMENOLOGIA DEHUSSERL?

    Dante Augusto Galeffi Professor Adjunto do Departamento II da FACED - UFBA

    Doutor em Educao - [email protected]

    RESUMO: Trata-se de uma leitura da concepo fenomenolgicade Husserl, um exerccio de compreenso do alcance do que eleprope como Filosofia Transcendental. A visada interrogantee perplexiva, em momento algum conclusiva. Procura-se pensarcom Husserl e no contra ele. Releva-se, assim, o campo posi-tivo da aquisio da atitude fenomenolgica, no sentido dofundamento de uma cincia do homem e para o homem, naabertura de suas possibilidades livres e responsavelmente deter-minadas.

    PALAVRAS-CHAVE:Filosofia Transcendental, Fenomenologia,Conscincia Constituinte.

    ABSTRACT:This is a reading of Husserls phenomenology conception, a comprehension exercise of significance on whathe proposes as Transcendental Philosophy. This focus is something interrogative and perplexed, never against him. So that, itsemphasized the positive zone of acquisition of phenomenologicalattitude, in the meaning of science reason of human being, inthe opening of his free and determined responsable possibilities.

    KEY-WORDS:Transcendental Philosophy, Fenomenology,Constituent Consciousness.

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    Com a pergunta,o que isto a fenomenologia?, somosconvidados a tomar parte em um jogo que tem como fim aelucidao da verdade fenomenolgica. Mas, podemos nsesclarecer o sentido e o significado do que venha a ser umaverdade elucidada fenomenologicamente? Sabemos ns, demodo claro, o que isto a fenomenologia? Sabemos a suaorigem, o seu meio, o seu fim? E se algo sabemos, o que somoscapazes de dizer sobre sua gnese, seu processo, seu projeto,e sobre qual ponto de vista gnosiolgico a compreendemos?

    Desde o incio, a pergunta pela fenomenologia guia osnossos passos, enfatizando a necessidade de um procedimentode rigor para a apresentao da questo. Um tal procedimentodiz respeito prpriafenomenologiacompreendida comomtododa crtica do conhecimento universal das essncias,segun-do Edmund Husserl (1859-1938), mtodo que a prpriaci-ncia da essncia do conhecimento, ou doutrina universaldas essncias. (Husserl, 1990: 22)

    Segundo essa breve definio, afenomenologia ummtodo, o que significa dizer que ela o caminho da crticado conhecimento universal das essncias. Assim, para Husserl,a fenomenologia o "caminho (mtodo) que tem por metaa constituio da cincia da essncia do conhecimento oudoutrina universal das essncias. Mas, o que isto significa uma doutrina universal das essncias e qual a sua serventia?

    De imediato, a pergunta sobre a fenomenologia est sendofeita a Edmund Husserl. Em outras palavras, colocamos-nosno caminho da Fenomenologia por ele concebida, a partir daleitura e esforo de interpretao da sua obraA Idia da Fenomenologia ,texto resultante deCinco Lies proferidas em Gotinga, no pe-rodo de 26 de abril a 2 de maio de 1907. Esse texto j apresentaa perspectiva madura da Fenomenologia de Husserl, o momentoem que ele decide por uma crtica da razo (em todas as suas

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    dimenses), configurando, assim, uma nova FenomenologiaTranscendental (ou pelo menos uma renovao-continuaoda atitude radical ), o que nos permite ir direto ao assunto, i. ,falar da Fenomenologia segundo a visada inovadora do seuinventor.

    De acordo com o prprio rigor da atitude filosfica, por-tanto, de acordo com a interrogao sistemtica que analisa ascondies, os limites e as possibilidades de um conhecimentodas coisas mesmas , a nossa atitude frente s idias de Husserlprocura ser a mais radical possvel, o que pe em jogo umesclarecimento para ns mesmos do alcance e do significadoessencial de uma investigao fenomenolgica.

    Nesse sentido, permanecemos na pergunta:Que Fenomenologia? A pergunta nos lana em um caminho que interroga a prpriarazo constituinte; a pergunta institui a crtica da razo:acincia da essncia do conhecimento, ou melhor, aFenomenologiaTranscendental.

    Assim, perguntar pela fenomenologia significa percorrerum caminho de crtica da razo fenomenolgica, ou seja,crtica da cincia do conhecimentoa priori , o conhecimentotranscendental (puro). Mas, uma vez admitida esta definio,qual seria a diferena entre a Fenomenologia de Husserl e aFilosofia Transcendental de Kant?

    O texto sobre o qual exercitamos esta compreenso iniciale provisria de fenomenologia A Idia da Fenomenologia apresenta, como dissemos, as principais teses que deram incio fasetranscendental da filosofia de Husserl, precisamente aquelado mtodo fenomenolgico que tanto influiu nos maisimportantes movimentos do pensamento do sculo XX. AtravsdasCinco Lies que deram origem ao texto em questo, Husserlexpe os fundamentos de umaCrtica da Razo, ao modo

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    Investigaes Lgicas.Nesta fenomenologia transcendental no nos havemos com

    ontologia apririca, nem com lgica formal e matemtica for-mal, nem com geometria como doutrina apririca do espao,nem com cromometria e foronomia apririca, nem com ontologiareal apririca de qualquer espcie (coisa, mudana, etc.).

    A fenomenologia transcendental fenomenologia dacons- cincia constituinte e, portanto, no lhe pertence sequer um nicoaxioma objetivo (referente a objetos que no so conscin-cia.. .).

    O interesse gnosiolgico, transcendental, no se dirige aoser objetivo e ao estabelecimento de verdades para o ser obje-tivo, nem, por conseguinte, para a cincia objetiva. O elementoobjetivo pertence justamente s cincias objetivas, e afazerdelas e exclusivamente delas apenas alcanar o que aqui faltaem perfeio cincia objetiva. O interesse transcendental, ointeresse dafenomenologia transcendental dirige-se para a consci-ncia, enquanto conscincia, vai somente para osfenmenos ,fenmenos em duplo sentido: 1) no sentido da aparncia( Erscheinung ) em que a objetividade aparece; 2) por outro lado,no sentido da objetividade ( Objektitt ) to s considerada, en-quanto justamente aparece nas aparncias e, claro est,transcendentalmente, na desconexo de todas as posiesempricas...

    Dilucidar estes nexos entreverdadeiro ser e conhecer e, destemodo, investigar em geral as correlaes entre acto, significaoe objeto, a tarefa da fenomenologia transcendental (ou dafilosofia transcendental). (Husserl, 1990: 13-14)

    Essas observaes de Husserl no deixam dvida do que eleest chamando defenomenologia transcendental . E nessa tica

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    outras palavras, Husserl acreditava na edificao de umacincia transcendental dos fenmenos da conscincia enquanto conscincia , to-mando distncia do ceticismo reinante no ambiente intelectualda sua poca.

    Diante da crise da razo gnosiolgica do seu tempo, quevinha solapando qualquer pretenso de se dar seguimento a umacincia da constituio do conhecimento puro ( a priori ),Husserl restaura aatitude transcendental como retorno s coisasmesmas, provocando, assim, profundas mudanas no horizon-te terico do fazer filosfico do sculo XX. Reclamando,renovadamente, uma nova tarefa para a Filosofia do Sujeito,precisamente aquela capaz de superar o amadorismo empricoou o transcendentalismo ingnuo (ou realista) das pocas ante-riores, Husserl projeta para a Filosofia a possibilidade dedesfazer-se dos tormentos da obscuridade, e isto atravs domtodo fenomenolgico(oureduo fenomenolgica)leva-do s suas extremas consequncias, a saber:o retorno consci- ncia .

    Segundo Husserl, a chamadareduo fenomenolgica propor-ciona o acesso ao modo de considerao transcendental, ouseja, o retorno conscincia. Assim, atravs da reduofenomenolgica os objetos se revelam na sua constituio.Retornando conscincia, os objetos aparecem na suaconstituio, ou seja, como correlatos da conscincia. O retor-no, portanto, permite dissolver o ser na conscincia, isto ,permite que o ser (ou ente, ou melhor, o ser do ente) se torneconscincia.

    O retorno conscincia, eis a pedra fundamental daFenomenologia de Husserl. Mas, em que sentido devemosentender este retorno conscincia? O que que Husserlentende por conscincia? E em que medida a sua definiofenomenolgica capaz de alcanar a essncia da cincia dos

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    fenmenos da conscincia?No caso, esse retorno pressupe a reduo fenomenolgica.

    Trata-se, portanto, de um pr-se no caminho das prprias coi-sas, isto , de retornar a elas. Neste sentido, a reduo seconfundiria com o prprio mtodo fenomenolgico, pois seriaum caminho para se alcanar e clarificar filosoficamente aessncia universal do conhecimento absoluto. Entretanto, naatitude fenomenolgica a atitude natural posta em ques-to, o que significa o exerccio crtico do prprio conhecimento.Assim, uma das grandes tarefas da reduo fenomenolgica a superao do prprio horizonte do conhecimento natural,o que implica no aparecimento de complexas tenses e obscurosproblemas gnosiolgicos.

    Nessa visada, a tarefa daFenomenologia Transcendental seriajustamente a de preparar o terreno para o aparecimento de umacompreenso mais apurada (e menos turbulenta) dos atos in ten-cionais que constituem a conscincia, e isto de tal modo a sepoder instituir um conhecimento filosfico independente doconhecimento produzido pelas cincias da natureza. Trata-se,no caso, de umprojeto transcendental capaz de validar uma autn-tica cincia filosfica, cincia ocupada com a crtica da prpriaconscincia, que se impe a tarefa de esclarecer cada vez maise melhor a prpria conscincia dos objetos na sua constituiofenomenal.

    Como se v, a tarefa que Husserl se impe a levar adiantepossui uma grandeza extraordinria. Simplesmente ela se pe nocaminho da crtica da razo capaz de liberar o fluxo do prprioretorno conscincia. Deste modo, ao provocar o retornoradical conscincia pura, a reduo fenomenolgica ins-titui a suspeio de todos os dados da conscincia emprica(conscincia psicolgica, existencial, ntica), e isto de tal formaque a prpria conscincia supere a sua identificao com o

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    conhecimento natural,mostrando-se como conscincia de coisas,de fatos, de ideaes, de afetos, etc., podendo, assim, serrigorosamente investigada na sua constituio, ou melhor, nomodo como constitui os objetos e constituda por eles, segun-do uma indissolvel relao dialtica.

    Nessa visada, a diferena entre conhecimento natural econhecimento filosfico se d como consequncia da dvi-da interrogante. Trata-se de uma sada do curso natural dosacontecimentos por meio da construo de um conhecimentotranscendental, isto , um conhecimento capaz de pr emsuspeio o seu prprio modo de conhecer. Portanto, um conhe-cimento capaz de duvidar de s i mesmo e de tornar-se o lugar dealcance das formasa priori da sua constituio, atravs dasuspenso de todos os dados empricos que, ento, se mos-tram fenmenos da conscincia, mas no a prpria conscincia.

    Pela reduo fenomenolgica retorna-se prpria cons-cincia. E a conscincia se mostraconscincia de objetos constitudos no prprio ato cognoscente . Deste modo, oretorno conscincia o mesmo que oretorno s prprias coisas , retorno que permite,segundo Husserl, a construo de umacincia da essncia doconhecimento. Assim, se o conhecimento sempre conhe-cimento de coisas, ele ser sempre um conhecer de aconte-cimentos conscientemente dados. Ora, se a conscincia igualmente conscincia de..., como pode ela ser concebidafora do seu acontecimento fenomenal, ou melhor, como podeela transcender a esfera psicolgica do chamado sujeito con-creto?

    De modo inequvoco, a fenomenologia pregada por Husserlprocura tomar distncia da dvida em relao possibilidadede umacincia absoluta, ou melhor, de umacincia universaldas essncias, umacincia transcendental, portanto, ocupa-da em dilucidar os vrios aspectos, nveis e graus da constitui-

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    o da conscincia dos objetos, isto , da razo nas suas maisdiversas modalidades.

    Entretanto, a Fenomenologia Transcendental no pode serconfundida com um sistema de pensamento acabado, no qualtodas as leis e princpios do mundo e da conscincia encontra-riam uma resposta imediata e imutvel. Pelo contrrio, aquesto fenomenolgica ,levantada por Husserl, procura tomardistncia da pretenso de explicar as essncias, segundo umdeterminado modelo generalizador, baseado em intuies inte-lectuais fundadas na aporia entreimanente e transcendente . Se-gundo esta concepo ingnua e determinista, oimanente perten-ceria esfera da subjetividade (seria, no caso, interior aosujeito), e otranscendente seria tudo aquilo que ultrapassa asubjetividade, tudo aquilo que exterior ao sujeito. Ora, umatal concepo no se sustenta diante de uma crtica da razorigorosamente exercitada.

    Como afirma Husserl, no estgio inicial da consideraosobre o conhecimento, o estgio da ingenuidade, tudo se passaem uma captao direta das coisas e dos nexos. Aqui a evidnciaconfunde-se com o simples ver, o olhar do esprito desprovidode essncia, em todos os casos um s e o mesmo e em siindiferenciado: o ver divisa simplesmente as coisas; as coisassimplesmente existem e, no intuir verdadeiramente evidente,existem na conscincia, e o ver centra-se simplesmente nelas.No caso, tratar-se-ia de uma captao direta, em que o pegarou apontar para algo significa uma ao sobre algo que j seencontra a, j est evidentemente dado. Assim, toda dife-rena est, pois, nas prprias coisas, segundo suas diferentesipseidades (identidades). (Husserl, 1990: 32)

    Entretanto, deixando-se de lado essa atitude natural, umaanlise mais precisa acaba revelando a enorme problematicidadedo ver as coisas. Como elucida Husserl:

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    Se bem que se conserve sob o nome de ateno o olharem si indescritvel e indiferenciado, mostra-se, porm, queefetivamente no tem sentido algum falar de coisas que simples-mente existem e apenas precisam de ser vistas; mas que essemeramente existir so certas vivncias da estrutura especficae mutvel; que existem a percepo, a fantasia, a recordao,a predicao, etc., e que as coisas no esto nelas como numinvlucro ou num recipiente, mas seconstituem nelas as coisas,as quais no podem de modo algum encontrar-se como ingre-dientes naquelas vivncias. O estar dado das coisas exibir- se (ser representadas) de tal e tal modo em tais fenmenos. Ea as coisas no existem para si mesmas e enviam para dentroda conscincia os seus representantes. Algo deste gnero nonos pode ocorrer no interior da esfera da reduo fenomenolgica,mas as coisas so e esto dadas em si mesmas no fenmeno( Erscheinung ) e em virtude do fenmeno; so ou valem, claroest, como individualmente separveis do fenmeno, na medidaem que no importa este fenmeno singular (a conscincia deestar dadas), mas, essencialmente so dele inseparveis.

    Mostra-se, pois, por toda a parte, esta admirvel correlaoentrefenmeno do conhecimentoe o objeto de conhecimento. (Husserl,1990: 32-33)

    Tudo isso nos mostra o quanto rdua e complicada a tarefada Fenomenologia Transcendental de Husserl, fato atestado porsuas prprias palavras:Advertimos agora que a tarefa da fenomenologia,ou antes, o campo das suas tarefas e investigaes, no uma coisa totrivial como se apenas houvesse que olhar, simplesmente abrir os olhos.(Husserl, 1990:33)

    Estamos diante de uma tarefa que toma distncia daatitude natural (ingnua) e instaura uma atitude filosfica(problemtica). Como vimos, na atitude natural a dicotomiaentre o que imanente e o que transcendente se mostra como

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    imediatamente evidente para o conhecimento. Deste modo, oprprio conhecimento no nunca analisado, segundo a suaprpriaestrutura fenomenal, o que impede o desenvolvimentode uma investigao crtica sobre as condies essenciais emque se d o conhecer fenomnico. Neste sentido, a tarefa daFenomenologia Transcendental seria a de tornar evidente, pormeio do esforo elucidativo daestrutura fenomenal da cons-cincia, o prprio modo de ser dos objetos que constituem aconscincia humana.

    Assim, a tarefa da Fenomenologia seria a derastrear todas as formas do dar-se e todas as correlaes , e isto dentro do mbitoda prpria evidncia pura do dar-se em si mesmo ( Selbstgegebenheit ),exercendo, sobre todas elas, a anlise esclarecedora da prpriaestrutura dos fenmenos da conscincia. No caso, a anlisefenomenolgica procura abarcar no apenas os atos da consci-ncia dos objetos, como tambm os seus nexos e correlatos, eisto segundo uma compreenso unvoca da estrutura do fen-meno. Nesta medida, o fenmeno, enquanto dar-se em simesmo, algo incontestvel. Entretanto, no dar-se no estinclusa a anlise esclarecedora que a fenomenologia tomacomo tarefa. Em outras palavras, isto significa que a simplespercepo consciente de um dado fenmeno no pressupe aanlise dos seus atos e correlatos, suas complexes e osseus nexos (discordantes ou concordantes), suas teleologiase configuraes.

    Portanto, a tarefa daFenomenologia Transcendental a deelucidar e rastrear gradualmente todos os possveis dados daconscincia, segundo as suas modalidades e possveis modifi-caes de comportamento. Trata-se da construo de umacincia das essncias,construo edificada passo a passo;uma cincia das essncias capaz de descrever a estruturados fenmenos da conscincia; umacincia dos fenmenoscognoscitivos em duplo sentido:

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    esta ocupao se refere exclusivamente, como ensina Heidegger,ao modocomose de-monstra e se tratao que nesta cincia deveser tratado. Como cincia dos fenmenos, a fenomenologiaapreende os objetosde tal maneira que acaba por tratar de tudoque se pe em discusso, segundo uma de-monstrao e proce-dimento diretos. (Heidegger, 1988: 64)

    Como se v, h um conceito fenomenolgico de fenme-no operado pela fenomenologia. Trata-se de um conceito novulgar, portanto, filosfico. Um conceito que , em si mesmo,uma de-monstrao sobre aquilo que se mostra. Segundo essaperspectiva, aquilo que se mostra para o olhar fenomenolgico, com palavras de Heidegger:

    Justo o queno se mostra diretamente e na maioria dasvezes e sim se mantmveladofrente ao que se mostra diretamen-te e na maioria das vezes, mas, ao mesmo tempo, pertenceessencialmente ao que se mostra diretamente e na maioria dasvezes a ponto de constituir o seu sentido e fundamento.(Heidegger, 1988: 66).

    Ento, podemos dizer precisamente que aquilo que namaioria das vezes no se mostra e sim se mantm velado... o nico fenmeno que interessa investigao fenomenolgica.Trata-se, para Husserl, do retorno conscincia; retorno que uma determinao do sentido doser-do-homem enquantoser-no- mundo. No caso, o problema do retorno conscincia encontraexpresso suficientemente clara no modo como a mesma compreendida pela fenomenologia, a saber:a conscincia sempre conscincia de alguma coisa.Em outras palavras, segundo estamxima fenomenolgica, no existe uma conscinciaem si ,portanto, umser em si , pois a conscincia s se apreende comorelao, isto , ela existe enquanto relao de eventos vivose concatenados: a conscincia sempre conscincia de um ser-no- mundo, portanto, um existencial concreto.

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    Assim, quando a fenomenologia de Husserl prope oretorno conscincia, de modo algum devemos compreendertratar-se de uma espcie deconscincia em si . Muito pelo contr-rio, longe desta abstrao ingnua, este retorno significainvestigar o prprio acontecimento da conscincia, segundo oaparecer do ser das coisas mesmas, isto , segundo o modocomo os objetos aparecem na nossa percepo, compreensoe entendimento.

    Como enfatizava Husserl, definindo o sentido do conheci-mento fenomenolgico:O conhecimento , pois, apenas conheci- mento humano , ligado s formas intelectuais humana s, in- capaz de atingir a natureza das prprias coisas, as coisas em si .(Husserl, 1990: 44)

    De modo anlogo, a conscincia apenasconscincia humana ,isto , ummodo de ser-no-mundo, portanto, um existir feno-menal. Entretanto, a conscincia consiste justamente em seraquilo quetranscende e, como tal, no se deve confundi-la comos entes em estado natural . A conscincia, no caso, no maisaquela figura associada ao sujeito transcendental de Kant, esim muito mais o prprio ser-do-homem-no-mundo, o que descortinauma perspectiva completamente nova para a filosofia transcendental.No caso, o transcendental permanece sendo a capacidade dedescrever a prpriaestrutura do fenmeno, isto , a de-monstrao fenomenolgica do fenmeno. E este fenme-no tem a ver, em primeira instncia, com o ser-do-homem. Esendo para a fenomenologia o ser-do-homem o seu prprioobjeto de investigao, inevitavelmente o interesse fenomenolgicotem a ver com a conscincia filosfica, a conscincia crti-ca. Essa conscincia crtica , entretanto, uma sofisticadaconstruo da inteligncia humana.

    Para que se evite ambigidade nessa definio de consci-ncia, a nossa ltima afirmao intenciona apenas enfatizar

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    que, para a fenomenologia, a conscincia compreendida comoo prprio ser-do-homem-no-mundo, sendo, portanto, necess-rio se esclarecer a essencial diferena entre conscincia natural(naturalmente ingnua) e conscincia filosfica (construtiva-mente crtica). No caso, no mbito da anlise fenomenolgicao que importa o descobrimento dialgico da prpriaestru-tura do fenmeno humano, o que tambm significa saberinventar e saber decidir o prprio modo de acesso aoser das coisas mesmas .

    Trata-se, consequentemente, de compreender a fenomenologiatranscendental como filosofia crtica para a reorientao (res-taurao) do sentido do ser-do-homem-no-mundo. Como tal, asua tarefa tambm tomar distncia das cincias naturais einstituir as possibilidades e os contornos doconhecimentopropriamente humano,conhecimento radicalmente transcendental,posto que funda as suas razes no prprio ser capaz de enten-dimento: o ser-no-mundo,o homem e sua humanidade oudesumanidade.

    Para que se possa melhor compreender a inteno fenomenolgicade Husserl de constituir um mtodo rigoroso de acesso ao serdas prprias coisas, onde, ento, se pode compreender de umamaneira menos ingnua e deslocada a alada gnosiolgica dasua fenomenologia transcendental , inscrevendo-se na perspectivado desenvolvimento das cincias do esprito, transcrevere-mos, a seguir, algumas passagens muito elucidativas que, umavez recolhidas na devida conta, podem abrir amplas perspecti-vas de acesso fenomenolgico ao ser das coisas os fen-menos de uma fenomenologia gentica (construtiva)

    S, pois, a reflexo gnosiolgica origina a separao decincia natural e filosfica. Unicamente se torna patente que ascincias naturais do ser no so cincias definitivas do ser. necessrio uma cincia do ente em sentido absoluto. Esta

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    cincia, que chamamosmetafsica , brota de uma crtica doconhecimento natural nas cincias singulares com base na inteleco,adquirida na crtica geral do conhecimento, da essncia e daobjetividade do conhecimento segundo as suas diferentes con-figuraes fundamentais, e com base na inteleco do sentidodas diversas correlaes fundamentais entre conhecimento eobjetividade do conhecimento.

    Se abstrairmos das metas metafsicas da crtica do conhe-cimento, atendo-nos apenas sua tarefa deelucidar a essncia doconhecimento e da objetividade cognitiva , ela entofenomenologia doconhecimento e da objetividade cognitiva e constitui o fragmentoprimeiro e bsico da fenomenologia em geral.

    Fenomenologia designa uma cincia, uma conexo dedisciplinas cientficas; mas, ao mesmo tempo e acima de tudo,fenomenologia designa um mtodo e uma atitude intelectual:a atitude intelectual especificamentefilosfica , o mtodo especi-ficamentefilosfico. (Husserl, 1990: 46)

    Tomando distncia de uma esfera natural de investiga-o, Husserl compreende o mtodo fenomenolgico comoradicalmente diverso do mtodo das cincias naturais. Comisso, ele apresenta um projeto de construo filosfica quedeclara independncia em relao ao modelo gnosiolgico cons-titudo em base s cincias exatas (matemtica, geometria,fsica, etc.). Trata-se, claramente, de uma abertura de possibi-lidades que se apresenta apropriada ao conhecimento humano,na perspectiva da suaformatividade e pela superao de suasrealidades j configuradas.

    Desse modo, por radicar-se no prprio ser-do-homem-no-mundo, o conhecimento filosfico o nico capaz de realizaruma crtica das cincias da natureza, isto , uma compreensoapurada e absoluta dos limites e determinaes de todas as

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    possveis cincias particulares. Portanto, o papel da filosofiaseria precisamente o de propiciar ao homem o conhecimento desua essncia, enquanto existe, instituindo, assim, uma cinciados fenmenos que dizem respeito ao ser-no-mundo, o ser-do-homem na histria do mundo. Como afirma Husserl:

    Na esfera natural da investigao, uma cincia pode, semmais, edificar-se sobre outra e uma pode servir outra demodelo metdico, se bem que s em certa medida, determinadae definida pela natureza do respectivo campo de investigao.A filosofia, porm, encontra-se numa dimenso completamente nova .Precisa depontos de partida inteiramente novos e de um mtodototalmente novo, que a distingue por princpio de toda cincianatural. (Husserl, 1990: 47)

    A filosofia, repito, situa-se, perante todo o conhecimentonatural, numadimenso nova , e a esta nova dimenso, por maisque tenha como j transparece no modo figurativo do falar conexes essenciais com as antigas dimenses, correspondeum mtodo novo novo desde o seu fundamento , que secontrape ao natural. Quem isto negar nada compreendeu dogenuno estrato de problemas da crtica do conhecimento e, porconseguinte, tambm no entendeu o que a filosofia realmentequer e deve ser, nem o que lhe confere a especificidade e a suaprpria justificao, perante todo o conhecimento e a cincianaturais. (Husserl, 1990: 49)

    Portanto, segundo a clareza abissal de Husserl, o conheci-mento humano no da mesma ordem do mundo natural. Nestesentido, somente uma investigao dos modos de ser e dasestruturas em que se d o conhecimento permite a construode uma cincia dos fenmenos, no qual o homem o nicosentido essencial. Neste caso, logra-se fazer filosofia, e s destemodo possvel se constituir umacincia da essncia doconhecimento. Ao que tudo indica, esta parece ser a direo

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    em que a fenomenologia transcendental de Husserl apresenta-se inequvoca, cabendo apenas verificar em que medida estaposio nos toca e capaz de fazer-nos pensar no nosso prprioser-no-mundo em uma perspectiva genuinamente filosfica problemtica.

    De alguma forma, acabamos de responder provisoriamen-te a pergunta-guia do nosso exerccio elucidativo. Desde oincio perguntvamos pela fenomenologia. Agora, de algummodo, configurou-se umnovohorizonte compreensivo para acoisa fenomenolgica . E, pelo menos, essanova configuraosecompreende comomtodo e como atitude intelectual: aatitude especificamente filosfica, a filosofia como mtodode elucidao do prprio ser que o homem-no-mundo.

    Como modo de finalizar esta considerao provisria sobrea fenomenologia, encontramos ampla ressonncia em algumaspassagens de Heidegger, aqui evocadas, com o especfico intui-to de deixar e fazer aparecer o sentido mais radical e ainda nodescoberto daatitude filosfica genuna,o sentido fenomenolgicodo ser-no-mundo, o ser-do-homem:

    A fenomenologia a via de acesso e o modo de verificaopara se determinar o que deve constituir tema da ontologia.Aontologia s possvel como fenomenologia . O conceito fenomenolgicode fenmeno prope, como o que se mostra, o ser dos entes, oseu sentido, suas modificaes e derivados. Pois, o mostrar-seno um mostrar-se qualquer e, muito menos, uma manifesta-o. O ser dos entes nunca pode ser uma coisa atrs da qualesteja outra coisa que no se manifesta.

    Atrs dos fenmenos da fenomenologia no h absoluta-mente nada, o que acontece que aquilo que deve tornar-sefenmeno pode-se velar. A fenomenologia necessria justa-mente porque, de incio e na maioria das vezes, os fenmenos

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    no se do. O conceito oposto de fenmeno o conceito deencobrimento.

    [...] O ser o transcendens pura e simplesmente. A transcendnciado ser da pre-sena ( Da-sein ) privilegiada porque nela residea possibilidade e a necessidade daindividuaomais radical.Toda e qualquer abertura do ser enquanto transcendens co-nhecimentotranscendental. A verdade fenomenolgica (abertura doser) veritas transcendentalis.

    [...] As explicitaes do conceito preliminar de fenomenologiade-monstram que o que ela possui de essencial no ser umacorrente filosficareal . Mais elevada do que arealidade esta possibilidade.A compreenso da fenomenologia depende uni-camente de se apreend-la como possibilidade. (Heidegger,1988: 66-70)

    Como se pode ver, a nossa inteno de elucidao fenomenolgicaalcanou um ponto limite, o que nos permite ter a certeza deque o mtodo fenomenolgico confunde-se com a prpriafilosofia. E esta filosofia deve ser capaz de libertar o ser-do-homem-no-mundo do julgo da sua imbecilizao deliberada ouda tirania individual e coletiva, mas isso sempre e a partir deuma deciso radical: o querer-ser livre e responsvel pelo ser-no-mundo na abrangncia da construo da humanidade huma-na.

    Como assinalou Heidegger, a verdadeira fenomenologia compreendida comoabertura do ser verdade transcendental ,o que significa dizer que ela umacincia da essncia doconhecimento, como j havamos enfatizado no incio desteexerccio. Neste sentido, pode-se compreend-la de fato comouma nova possibilidade capaz de iluminar a abertura doprojetodo ser-do-homem-no-mundo na abrangncia doprocesso desuas efetividades vividas. E sendo apenasuma possibilidade , afenomenologia libera-se do intelectualismo monolgico de um

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    sujeito do conhecimento dado para sempre, instaurando, emseu lugar, o prprioacontecimento-apropriaodo que semprepermanece aberto spossibilidades : o prprio ser-do-homem, en- quanto lanado na temporalidade do mundo; mundo que no cessa de tornar-se fenmeno; mundo em ebulio permanente .

    Segundo esta abertura do ser-do-homem-no-mundo, afenomenologia lana luzes sobre oprojeto histricoda humanida-de do homem, o que abre a possibilidade de reconfigurao doseu estatuto de liberdade.

    A construo humana autnoma, ento, passa a ser umaquesto fenomenolgica, isto , uma questo de compreensoprvia do prprio ser-no-mundo. E esta compreenso quedescortina as possibilidades do ser-do-homem poder assumir asresponsabilidades da sua prpria histria. Contudo, tambmpreciso saber de antemo que o futuro sempre um existencialpresente-passado, assim como ter bem claro que omundo vivido a nica morada a ser plasmada pelo ser-do-homem. E para omundo vividos o inesperado bem vindo, pois se o ser-do-homem no fosse capaz detranscendncia tudo estaria fadado aser uma mera e montona repetio do igual, onde, eviden-temente, no poder-se-ia falar em transformao social domundo, como algo alm de qualquer programao previsvel,o que obrigatoriamente nos jogaria para dentro de um confor-mismo insano e um determinismo incompatvel com a aberturade possibilidades da prpria grandeza hominal.

    nessa perspectiva deprojeto que a fenomenologia semostra na sua mais concreta fora, o que permite, enfim, con-cluir que no deveramos trat-la como algo do passado comomais um dos mltiplos movimentos do pensamento construtivodo homem na histria , pois se assim agssemos estaramosabrindo mo do usufruto das nossas reais possibilidades deconstruo de umacultura pessoal amplamente inserida no seu meiosocial , o que implicaria na aceitao da condio obtusa de seres

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    impotentes, incapazes de tomar decises radicais e de viver emplenitude.

    O caso que a fenomenologia um mtodo para o prprioesclarecimento do ser humano na histria. E isto significa queela, alm de ter que levar em conta o j institudo de formaampla e criteriosa, deve tambm saber investigar as condiesde possibilidade do ser que, independente das vontades alheias,permanece sendo o instituinte de todo o vir-a-ser, isto , osentido e a finalidade permanentemente presentes na prpriaausncia de acabamento do ser-do-homem-no-mundo.

    Na condio de abertura de possibilidades para a investi-gao rigorosa do ser-do-homem, a fenomenologia permanecesendo apenas uma possibilidade. E isso enquanto se apresenteinterrogante, ou melhor,metassistmica , no pretendendo, por-tanto, ensinar a verdade acabada, e muito menos as leisperenes do ser-no-mundo, mas apenas tornar-se o meio descri-tivo do acontecimento do sentidofenomeno-lgico.

    Nessa perspectiva, a fenomenologia permanece sendo umexerccio transcendental , o que inevitavelmente pressupe e exigeuma tica da mais ampla envergadura, requisitando de quem sepe a investigar o homem uma efetiva atitude radical diante doprprio ser-consciente doeu-outro-mundo. A responsabilidadediante de um projeto de tamanha ordem a nica condio depossibilidade para que se possa fazer do homem um ser dotadode liberdade inventiva e partilhada .

    De qualquer modo, enquantoprojeto,a fenomenologia tor-na-se um concreto e eficaz instrumento de ao para a trans-formao doprocesso humano, o que apenas enfatiza a grandepossibilidade que se descortina quando assumimos a nossaprpria condio de liberdade partilhada. Isso afirma a nossapeculiar transcendncia, o que na verdade apenas confirmanossa condio histrica de seres mundanos. Tudo o mais s

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    depende da capacidade de compreender a transcendncia comoo prprio modo do ser-do-homem.

    Somente o ser humano pode decidir de que forma pretendeestar-no-mundo, sobretudo quando aprender a se dar conta deque ele est aberto no mundo, e de que o mundo so todasas possibilidades. E diante delas que os seres humanos so oudeixam de ser, se tornam e se transformam, exercem seus sonhose desejos, vivem ou desistem de viver, se fazem dignos ousimplesmente rastejam como animais invertebrados.

    Entretanto, a deciso por uma dignidade de ser coisa ques se pode decidir diante da liberdade do ser. E o ser pareceno tolerar a insensatez e a indignidade, a bestificao e afragmentao alienante. Este ser perpetuamente algo que sse d alm das coisas. Mas as coisas so para este ser a sua nicamorada, a sua existncia: saber habit-las sempre uma questode ser, ser-no-mundo uma jocosa espera do inesperado. Eo inesperado-esperado sempre aquilo que nos mantm emestado de dignidade permanente.

    Procurando umaimagem para encerrar essa nossa fala sem-pre provisria, apresentou-se umdizer, ao modo de Herclito,que muito bem pode exprimir o sentido de perplexidadedialgica aberto nesta compreenso fenomenolgica: Pois, quando dor- mimos, no dormimos, e quando estamos acordados, no estamos acor- dados; mas quando dormimos, dormimos, e quando estamos acordados,estamos acordados.

    De qualquer modo, resta sempre a cada um decidir se querou no pensar com liberdade e altivez, superando as antinomiasdo ser e do aparecer, da essncia e da aparncia continuarno caminho interrogante:meditao infinita .

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    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS

    HEIDEGGER, Martin.Ser e Tempo. Parte I. Traduo:Mrciade S Cavalcante. 2 ed. Petrpolis: Vozes, 1988.

    HUSSERL, Edmund.A Idia da Fenomenologia . Traduo: ArturMoro. Lisboa: Edies 70, 1990.