CASO CLÍNICO Caso Clínico de Edema Pulmonar de Pressão Negativa em Contexto de ... ·...

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REVISTA DA SOCIEDADE PORTUGUESA DE ANESTESIOLOGIA VOL. 28 - Nº 3 - 2019 198 Revista da Sociedade Portuguesa de Anestesiologia http://revistas.rcaap.pt/anestesiologia https://dx.doi.org/10.25751/rspa.18257 CASO CLÍNICO Autor Correspondente/Corresponding Author * : Catarina Torres Monteiro Morada: Rua Cosme Ferreira de Castro, nº 283, 4420-096, São Cosme, Gondomar, Portugal. E-mail: [email protected] Caso Clínico de Edema Pulmonar de Pressão Negativa em Contexto de cirurgia de Ambulatório Negative Pressure Pulmonary Edema in Ambulatory Setting: A Case Report Catarina Monteiro 1 *, Margarida Coelho 2 , Luisa Pereira 3 , Inês Portela 1 , Miguel Jacob 1 , Alírio Gouveia 4 , Ana Lares 5 Afiliação 1 Interna de Formação Específica de Anestesiologia do Centro Hospitalar Universitário do Algarve, Unidade de Faro, Faro, Portugal. 2 Interna de Formação Específica de Medicina Interna do Centro Hospitalar Universitário do Algarve, Unidade de Faro, Portugal. 3 Interna de Formação Específica de Nefrologia do Centro Hospitalar Universitário do Algarve, Unidade de Faro, Portugal. 4 Assistente Hospitalar de Anestesiologia do Centro Hospitalar Universitário do Algarve, Unidade de Faro, Portugal. 5 Assistente Hospitalar Graduada Sénior e Diretora do Serviço de Anestesiologia do Centro Hospitalar Universitário do Algarve, Unidade de Faro, Portugal. Palavras-chave Anestesia Geral; Complicações Pós-Operatórias; Edema Pulmonar; Obstrução das Vias Respiratórias; Procedimentos Cirúrgicos Ambulatórios Keywords Ambulatory Surgical Procedures; Anesthesia, General; Airway Obstruction; Postoperative Complications; Pulmonary Edema INTRODUÇÃO O edema pulmonar de pressão negativa (EPPN) é uma forma de edema pulmonar não cardiogénico que pode ocorrer no contexto da anestesia geral e que resulta da geração de uma pressão negativa intratorácica (PNI) significativa após ventilação espontânea contra uma obstrução da via aérea superior (OVA). 1 Esta OVA pode dever-se a laringospasmo, aspiração de corpo estranho ou complicações da entubação ou extubação orotraqueal (EOT). Esta complicação potencialmente fatal tem uma incidência estimada de 0,05% a 0,1%, encontrando-se documentada após procedimentos cirúrgicos nasais ou das vias aéreas superiores (VAS). 1-3 A ocorrência de laringospasmo na EOT, ao acordar da anestesia ou no período pós-operatório é a etiologia mais comum de EPPN em adultos, tendo sido identificada como a causa de mais de 50% dos casos de edema pulmonar pós- obstrução. 4 Cerca de 11% dos doentes que apresentam laringospasmo evoluem para o EPPN. 5 Constituem fatores de risco para a ocorrência de EPPN: obesidade; presença de lesões na via aérea; antecedentes de cirurgia nasal, oral ou faríngea; jovens atléticos do sexo masculino e doentes pediátricos. 1,4 Foram identificados dois mecanismos distintos para explicar a patogénese do EPPN. Uma teoria proposta é que este edema ocorre devido ao shift significativo de fluídos na sequência de alterações da pressão intratorácica. 6,7 Uma pressão intratorácica marcadamente negativa é gerada por esforços inspiratórios significativos contra uma via áerea obstruída ou uma glote fechada. Esta pressão intratorácica negativa (PIN) é transmitida ao espaço intrapleural, resultando num aumento do retorno venoso e das pressões venosas pulmonares e RESUMO O edema pulmonar de pressão negativa constitui uma complicação incomum mas potencialmente fatal, estando a sua ocorrência mais frequentemente documentada após um esforço inspiratório significativo contra uma obstrução da via aérea superior. Existem inúmeros fatores de risco identificados para a sua ocorrência e o seu reconhecimento é fundamental para que o diagnóstico e tratamento sejam instituídos de modo precoce, com impacto significativo na morbimortalidade que lhe está associada. Este artigo descreve um caso clínico de edema pulmonar de pressão negativa que ocorreu num doente saudável do sexo masculino em contexto de cirurgia eletiva em regime de ambulatório. ABSTRACT The negative pressure pulmonary edema is an uncommon but potentially fatal complication, being more frequently reported following a significative inspiratory effort against an upper airway obstruction. Diverse risk factors have been identified and its knowledge is the cornerstone for an expeditous diagnosis and treatment, with severe impact on morbidity and mortality. This article reports a case of negative pressure acute pulmonary edema that occurred in a healthy male patient in the ambulatory setting.

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REVISTA DA SOCIEDADE PORTUGUESA DE ANESTESIOLOGIA VOL. 28 - Nº 3 - 2019198

Revista da Sociedade Portuguesa de Anestesiologiahttp://revistas.rcaap.pt/anestesiologiahttps://dx.doi.org/10.25751/rspa.18257

CASO CLÍNICO

Autor Correspondente/Corresponding Author*:Catarina Torres MonteiroMorada: Rua Cosme Ferreira de Castro, nº 283, 4420-096, São Cosme, Gondomar, Portugal.E-mail: [email protected]

Caso Clínico de Edema Pulmonar de Pressão Negativa em Contexto de cirurgia de AmbulatórioNegative Pressure Pulmonary Edema in Ambulatory Setting: A Case Report

Catarina Monteiro1*, Margarida Coelho2, Luisa Pereira3, Inês Portela1, Miguel Jacob1, Alírio Gouveia4 , Ana Lares5

Afiliação1 Interna de Formação Específica de Anestesiologia do Centro Hospitalar Universitário do Algarve, Unidade de Faro, Faro, Portugal.2 Interna de Formação Específica de Medicina Interna do Centro Hospitalar Universitário do Algarve, Unidade de Faro, Portugal.3 Interna de Formação Específica de Nefrologia do Centro Hospitalar Universitário do Algarve, Unidade de Faro, Portugal.4 Assistente Hospitalar de Anestesiologia do Centro Hospitalar Universitário do Algarve, Unidade de Faro, Portugal.5 Assistente Hospitalar Graduada Sénior e Diretora do Serviço de Anestesiologia do Centro Hospitalar Universitário do Algarve, Unidade de Faro, Portugal.

Palavras-chaveAnestesia Geral; Complicações Pós-Operatórias; Edema Pulmonar; Obstrução das Vias Respiratórias; Procedimentos Cirúrgicos AmbulatóriosKeywordsAmbulatory Surgical Procedures; Anesthesia, General; Airway Obstruction; Postoperative Complications; Pulmonary Edema

INTRODUÇÃOO edema pulmonar de pressão negativa (EPPN) é uma forma de edema pulmonar não cardiogénico que pode ocorrer no contexto da anestesia geral e que resulta da geração de uma pressão negativa intratorácica (PNI) significativa após ventilação espontânea contra uma obstrução da via aérea superior (OVA).1 Esta OVA pode dever-se a laringospasmo, aspiração de corpo estranho ou complicações da entubação ou extubação orotraqueal (EOT). Esta complicação potencialmente fatal tem uma incidência estimada de 0,05% a 0,1%, encontrando-se documentada após procedimentos cirúrgicos nasais ou das vias aéreas superiores (VAS).1-3

A ocorrência de laringospasmo na EOT, ao acordar da anestesia ou no período pós-operatório é a etiologia mais comum de EPPN em adultos, tendo sido identificada como a causa de mais de 50% dos casos de edema pulmonar pós-obstrução.4 Cerca de 11% dos doentes que apresentam laringospasmo evoluem para o EPPN.5

Constituem fatores de risco para a ocorrência de EPPN: obesidade; presença de lesões na via aérea; antecedentes de cirurgia nasal, oral ou faríngea; jovens atléticos do sexo masculino e doentes pediátricos.1,4

Foram identificados dois mecanismos distintos para explicar a patogénese do EPPN. Uma teoria proposta é que este edema ocorre devido ao shift significativo de fluídos na sequência de alterações da pressão intratorácica.6,7 Uma pressão intratorácica marcadamente negativa é gerada por esforços inspiratórios significativos contra uma via áerea obstruída ou uma glote fechada. Esta pressão intratorácica negativa (PIN) é transmitida ao espaço intrapleural, resultando num aumento do retorno venoso e das pressões venosas pulmonares e

RESUMOO edema pulmonar de pressão negativa constitui uma complicação incomum mas potencialmente fatal, estando a sua ocorrência mais frequentemente documentada após um esforço inspiratório significativo contra uma obstrução da via aérea superior. Existem inúmeros fatores de risco identificados para a sua ocorrência e o seu reconhecimento é fundamental para que o diagnóstico e tratamento sejam instituídos de modo precoce, com impacto significativo na morbimortalidade que lhe está associada. Este artigo descreve um caso clínico de edema pulmonar de pressão negativa que ocorreu num doente saudável do sexo masculino em contexto de cirurgia eletiva em regime de ambulatório.

ABSTRACTThe negative pressure pulmonary edema is an uncommon but potentially fatal complication, being more frequently reported following a significative inspiratory effort against an upper airway obstruction. Diverse risk factors have been identified and its knowledge is the cornerstone for an expeditous diagnosis and treatment, with severe impact on morbidity and mortality. This article reports a case of negative pressure acute pulmonary edema that occurred in a healthy male patient in the ambulatory setting.

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reduzindo a pressão hidrostática intersticial perivascular, que favorece o movimento de fluído dos capilares pulmonares para o interstício e espaços alveolares. Associadamente, pode ocorrer um estado hiperadrenérgico com vasoconstrição periférica e incremento do retorno venoso, aumentando ainda mais o fluxo sanguíneo pulmonar e agravando o edema.5,7-9

O segundo mecanismo sugere que o stress mecânico induzido pela inspiração contra uma OVA pode induzir microroturas na membrana microvascular pulmonar e alveolar epitelial, resultando em permeabilidade capilar pulmonar aumentada e edema pulmonar.8-11

Geralmente, este quadro clínico é autolimitado, com resolução entre 12 a 48 horas, desde que reconhecido e tratado imediatamente.8,9 A compreensão da fisiopatologia subjacente ao edema pulmonar permite o diagnóstico diferencial do EPPN de outras causas não cardíacas de edema pulmonar, prevenindo, deste modo, um tratamento ina-propriado em doentes com EPPN.O tratamento de primeira linha inclui a manutenção da via aérea patente e administração de oxigénio suplementar com pressão positiva por ventilação não invasiva (VNI). A ventilação invasiva deve ser reservada para casos graves que não respondem à VNI.

CASO CLÍNICOEste artigo reporta o caso clínico de um doente do sexo masculino, 33 anos, proposto para discectomia de hérnia discal lombossagrada (L5-S1) em regime de ambulatório. Tratava-se de um doente saudável, autónomo, fumador (1,5 unidades maço-ano), sem outros antecedentes médico-cirúrgicos de relevo. Do exame físico destaca-se um biótipo atlético, com peso de 73,5 kg e altura de 173 cm (índice de massa corporal - IMC 24,6 kg/m2); da avaliação da via aérea, distâncias inter-incisivos, tiro- e esterno-mentonianas adequadas, Mallampati III e boa mobilidade cervical; não apresentava alterações na auscultação cardíaca ou pulmonar. Os exames auxiliares diagnósticos pré-operatórios realizados (hemograma, bioquímica, estudo da coagulação, radiografia do tórax e eletrocardiograma) não apresentavam alterações. O doente foi classificado como estado funcional American Society of Anesthesiologists (ASA) II. Foi obtido o consentimento informado anestésico bem como para publicação do caso clínico.No dia do procedimento, após entrada no bloco operatório, procedeu-se à monitorização do paciente de acordo com os standards definidos pela ASA (oximetria de pulso, eletrocardiograma de 5 derivações, pressões arteriais não invasivas, monitorização de relaxamento neuromuscular e de profundidade anestésica). Após realização de pré-oxigenação com uma duração de 3 minutos, utilizando uma fração inspirada de oxigénio de 100% a 12 L/min e obtendo um end tidal de oxigénio superior a 85%, foi realizada a

indução com administração de 150 μg de fentanil, 150 mg de propofol e 50 mg de rocurónio endovenosos (EV). A EOT foi executada utilizando um laringoscópio MacKintosh com um tubo orotraqueal nº 7,5 aramado, sem intercorrências. A manutenção anestésica foi realizada com uma mistura de O2 (40%), sevoflurano 2% e ar. O doente foi ventilado em modo de pressão controlada com volume garantido (volume corrente de 475 mL, frequência respiratória de 12 ciclos por minuto, relação inspiração-expiração 1:2, pressão de plateau < 20 cmH20, PEEP de 5 cmH20). O doente manteve-se hemodinamicamente estável durante o procedimento cirúrgico. Para profilaxia de náuseas e vómitos foram administrados dexametasona 5 mg e ondansetron 4 mg EV. A analgesia foi realizada com administração de paracetamol 1000 mg, tramadol 100 mg, parecoxib 40 mg e infiltração da incisão cirúrgica com 150 mg de ropivacaína 0,75%. Após o final da intervenção cirúrgica, durante o reposicionamento do paciente da posição de decúbito ventral para dorsal, no contexto de uma provável superficialização anestésica, ocorreu uma reação do paciente contra o TOT, resolvida após administração de um bólus de 50 mg de propofol EV e administração de pressão positiva. A reversão do bloqueio neuromuscular foi efetuada posteriormente de acordo com a monitorização do relaxamento neuromuscular (TOF com 4 contagens) com 200 mg de sugamadex, tendo-se procedido à extubação após recuperação da consciência, reflexos protetores da via aérea e de ventilação espontânea eficaz. De seguida, foi efetuada a transferência do doente para o recobro, que se encontrava hemodinamicamente estável, eupneico e sem oxigenoterapia suplementar. Após a transferência, foi realizado reforço analgésico (800 mg de metamizol magnésico EV) por dor ligeira associada a taquipneia. Adicionalmente, o doente reportou sensação de dispneia, objetivando-se taquipneia e redução dos valores de oximetria periférica (SpO2 89%) apesar da administração de O2 suplementar (cânula nasal a 3 L/min, FiO2 32%). À auscultação pulmonar, identificavam-se crepitações dispersas bilaterais, sem sibilância. Foi incrementada a oxigenoterapia suplementar (máscara de venturi a 8 L/min; FiO2 40%)). Por manutenção do quadro, foi realizada uma gasimetria arterial em ar ambiente, que revelou uma insuficiência respiratória tipo 1 grave com pO2 40%. Foi realizada posteriormente uma radiografia torácica, incidência postero-anterior, que revelou sinal em asa de borboleta compatível com um quadro de edema agudo do pulmão (Fig. 1). O ecocardiograma transtorácico realizado não apresentava alterações de relevo, nomeadamente dilatação de câmaras cardíacas, disfunção ventricular esquerda ou direita, disfunção valvular, sistólica (fração de ejeção ventricular esquerda estimada de 60%) ou diastólica. A excursão sistólica do plano do anel tricúspide foi estimada em 23 mm.Dado o quadro clínico apresentado e resultados de exames

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Caso Clínico de Edema Pulmonar de Pressão Negativa em Contexto de cirurgia de AmbulatórioNegative Pressure Pulmonary Edema in Ambulatory Setting: A Case Report

auxiliares de diagnóstico realizados, foi diagnosticado um edema agudo do pulmão por pressão negativa e procedeu-se ao internamento do doente na unidade de cuidados intermédios, com realização de ventilação não invasiva (BI-level positive airway pressure - BiPAP), continuação de tratamento sintomático e administração de diuréticos. A ventilação não invasiva foi mantida por 36 horas tendo como parâmetros iniciais: fração inspirada de oxigénio de 40%, pressão de suporte de 12 cmH20, PEEP 5 cmH20.Durante o internamento, o doente manteve-se hemodinamicamente estável, apirético e com recuperação progressiva do ponto de vista respiratório e imagiológico (Fig.s 2 e 3), com desmame de suporte ventilatório não invasivo e O2 suplementar, tendo tido alta ao quarto dia pós-operatório.

DISCUSSÃOPerante o quadro clínico apresentado, foram considerados como possíveis diagnósticos diferenciais: pneumotórax, edema agudo do pulmão, reação anafilática ao metamizol e EPPN.Relativamente ao pneumotórax, apesar de poder ocorrer em doentes jovens, sobretudo fumadores, e de se apresentar como um quadro de dispneia súbita, esta hipótese diagnóstica foi descartada pela ausência de sinais compatíveis na auscultação pulmonar e radiografia de tórax realizada.A presença de crepitações bibasais e dispneia poderia ser compatível com um edema agudo do pulmão de etiologia cardiogénica. No entanto, tratava-se de um paciente com boa capacidade fucional (> 10 METs), praticante de atividade física regular e sem patologia cardíaca pré-existente conhecida. Adicionalmente, a realização do ecocardiograma

transtorácico, que não apresentava alterações, excluiu esta hipótese de diagnóstico. Existe um caso descrito de uma reação anafilática ao metamizol com manifestação pulmonar sob forma de edema.12 Pese embora a existência de agravamento da sintomatologia respiratória após a sua administração, a presença de taquipneia já havia sido reportada anteriormente pelo paciente, tornando a relação causal entre o quadro apresen-tado e a administração deste fármaco pouco provável. Adicionalmente, já havia sido administrado previamente metamizol a este doente sem qualquer manifestação anafilática.O doente apresentava uma compleição física atlética, sendo

Figura 1. Radiografia do tórax realizada 1 hora após término de procedimento anestésico-cirúrgico

Figura 2. Radiografia do tórax realizada ao segundo dia de internamento

Figura 3. Radiografia do tórax realizada ao quarto dia de internamento

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Responsabilidades ÉticasConflitos de interesse: Os autores declaram a inexistência de conflitos de interesse na realização do presente trabalho.Fontes de financiamento: Não existiram fontes externas de financiamento para a realização deste artigo.Confidencialidade dos dados: Os autores declaram ter seguido os protocolos da sua instituição acerca da publicação dos dados de doentes.Consentimento: Consentimento do doente para publicação obtido.Proveniência e revisão por pares: Não comissionado; revisão externa por pares.

Ethical DisclosuresConflicts of interest: The authors have no conflicts of interest to declare.Financing support: This work has not received any contribution, grant or scholarship.Confidentiality of data: The authors declare that they have followed the protocols of their work center on the publication of data from patients.Patient consent: Consent for publication was obtained.Provenance and peer review: Not commissioned; externally peer reviewed.

Submissão: 10 de julho, 2019 | Aceitação: 07 de setembro, 2019Received: 10th of July, 2019 | Accepted: 07th of September, 2019

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este o único fator de risco para EPPN.1,4 De acordo com diferentes referências bibliográficas, o EPPN ocorre devido à geração de uma PNI devido a esforços inspiratórios significativos contra uma OVA.1,2,10,11 No caso clínico descrito, a EOT decorreu sem complicações, no entanto, na fase de reposicionamento do doente ocorreu uma reação ao TOT, resolvido após administração de terapêutica endovenosa e administração de pressão positiva. No entanto, é necessário realçar que neste caso foi colocado um TOT aramado, que impediria a ocorrência kinking do TOT. Outra potencial causa para a OVA seria a obstrução por secreções no TOT, sobretudo considerando os antecedentes tabágicos do doente. No entanto, não se verificou a presença de secreções no interior do TOT, inclusive na extubação. Todavia não pode ser excluída a possibilidade de a administração de pressão positiva ter mobilizado alguma secreção previamente existente no TOT que fosse a causa da reação ao mesmo. A relevância clínica deste caso justifica-se assim pela ocorrência EPPN após reação ao TOT na ausência de OVA, por oposição à bibliografia existente, na qual a presença de OVA aparece documentada.1,2,10,11 A ocorrência de reatividade da via aérea associada à sintomatologia apresentada pelo doente, o padrão de edema agudo do pulmão encontrado na radiografia torácica e a evolução verificada são argumentos a favor do diagnóstico de EPPN. Como limitação do caso clínico descrito há que referir a desconeção da monitorização de profundidade anestésica e do relaxamento neuromuscular de modo a facilitar o reposicionamento do doente no momento em que ocorreu a reação ao TOT. A presença desta monitorização nesse momento poderia auxiliar na melhor descrição e eventual pre-venção dos eventos decorridos.Em suma, o EPPN é uma condição clínica que pode agravar procedimentos cirúrgicos considerados de baixa morbimorbilidade e que surge principalmente em doentes jovens. Este caso clínico realça a importância da utilização adequada da monitorização intra-operatória e evitar a ocorrência de reatividade da via aérea na abordagem anestésica de doentes jovens, sobretudo do sexo masculino, sendo o momento de entubação e extubação traqueal críticos na prevenção da sua ocorrência. Contrariamente aos casos clínicos previamente descritos, este caso clínico é menos comum no sentido de que não foi identificada uma OVA declarada. O reconhecimento precoce de EPPN e a sua pre-venção são fundamentais. Quando presente, o tratamento deve ser instituído precocemente, permitindo a diminuição da morbimortalidade que lhe está associada. Os doentes com alto risco de desenvolver OVA devem ser adequadamente identificados e mantidos em vigilância apertada por um anestesiologista devido à possibilidade de EPPN.10,11

AGRADECIMENTOSGostaríamos de agradecer à colega Caroline Dahlem pela discussão profícua do caso.

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