8/7/2019 Iade Entrevista Carlos Barbosa

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NEWSLETTER “DESIGN SUSTENTÁVEL”ENTREVISTA AO PROFESSOR Carlos A. BarbosaProf. da Escola Superior de Design do IADECoordenador do Núcleo de Design para a Sustentabilidade

1 - Há diversos factores a ter em conta para uma mudança dos actuais padrões deprodução e consumo insustentáveis. Em sua opinião, qual poderá ser o papel do designpara a implementação de novos padrões de produção e consumo mais sustentáveis? A acção do design será mais eficaz quando integrada na estratégia das empresas. Assim, asopções relativamente aos sistemas tecnológicos, à tipologia de soluções e ao marketingcomunicacional, deverão resultar do planeamento estratégico global da empresa, tendo emconsideração os factores exigidos para uma gestão de sucesso.

Definidos os critérios do planeamento, o design dispõe de ferramentas e metodologias para odesenvolvimento de propostas – produtos ou serviços – cujos parâmetros correspondam aosimperativos da sustentabilidade quer no que se refere à utilização de tecnologias da produção

amigas do ambiente quer no que diz respeito à origem e características das matérias primas.

Para serem criados paradigmas de consumo sustentáveis, a intervenção do design terá emconta os aspectos culturais e sociológicos que enformam os hábitos de uma sociedadeconsumista, estimulada pelas estratégias de mercado especulativas que têm comoconsequência uma oferta diversificada baseada mais em pressupostos de concorrência e menosnas reais necessidades dos consumidores.

No entanto a sustentabilidade nas opções da produção e do consumidor supõe uma mudança dementalidades.

2 - A preocupação com os aspectos ambientais de um produto deverá existir em todos osestágios de desenvolvimento do mesmo. Em que medida é que a aplicação de critérios dedesign sustentável poderão contribuir para a redução do impacte ambiental durante todoo ciclo de vida de um produto? O design de produtos sustentáveis insere-se num processo que, sob o ponto de vistametodológico, é idêntico ao do design de produtos de características, convencionalmente, maisconotadas com as actividades do marketing comercial.

O desenvolvimento de soluções sustentáveis fundamenta-se no conceito de ciclo de vida que, aoconsiderar o princípio “from the cradle to the grave” equaciona as implicações de carácterambiental, social e económico subjacentes a cada opção – desde a origem dos materiais,passando pelo transporte, produção, distribuição, uso e as alternativas do destino final quando oproduto terminar o ciclo de utilidade para que foi concebido. Para esse efeito, existemferramentas que permitem a avaliação do processo conceptual, do sistema tecnológico e doproduto final tais como o LCD (Life Cycle Design) e a LCA (Life Cycle Analysis), que podem seraplicados em todas as fases e a diferentes níveis desse processo garantindo uma informação

bastante rigorosa dos respectivos valores impactantes.

Deste modo o design pode assegurar a viabilidade económica das soluções, preencher osrequisitos das normas de Qualidade, satisfazer as necessidades reais dos consumidores eminimizar os efeitos negativos na Natureza.

No entanto, a consecução destes objectivos só é possível com a utilização de matérias primasobtidas a partir de recursos renováveis com o uso de tecnologias amigas do Ambiente queoperem com fontes energéticas alternativas às fornecidas através de combustíveis fósseis e com

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opções de transporte, quer dos materiais quer dos produtos, que causem os menores impactosno que diz respeito à poluição atmosférica.

Utopia? Não. Apenas os procedimentos que se impõem de acordo com os estudos científicosque alertam para a imperiosa necessidade de uma mudança a nível das actividades humanas,causa principal do estado de degradação em que se encontra a Terra, afectando abiodiversidade que, em muitos casos já atingiram situações irreversíveis.

3 - O trabalho do designer afecta tanto a produção industrial como afecta as várias formasde comunicação com a sociedade. Qual deverá ser o papel dos Designers para umamudança dos padrões de consumo e estilos de vida?Actividade do designer está, inevitavelmente, conotada com os conceitos comerciais, por norma,equívocos, de design e, por consequência, dos produtos com ele identificados.

A cultura que caracteriza a estrutura da sociedade de consumo, em que vivemos, estáprofundamente arraigada nas premissas das estratégias liberais da globalização bem como noespírito hedonista dos indivíduos, independentemente do seu poder de compra.

Isto supõe a necessidade de alterar mentalidades e hábitos comportamentais.

As acções que se fazem nesse sentido, confrontam-se com a relutância das gerações instaladasna vida que, dificilmente, se predispõem para a mudança de atitudes.

Mas o desafio que, neste campo, se coloca ao designer é, ao mesmo tempo aliciante ecomprometedor. Em particular no que se refere ao design de produto.

Conceber soluções que correspondam às necessidades reais do consumo, em termos dequantidade e, sobretudo, de qualidade intrínseca, não pondo em causa as estratégiaseconomico-financeiras das empresas.Para tal é necessário assumir métodos absolutamente inovadores para que as propostascontemplem todos os factores em jogo.

Isto supõe, inevitavelmente, o estudo e a implementação de novas estratégias de produção euma significativa alteração nos comportamentos da sociedade no que ao consumo diz respeito.

O designer terá sempre que dar resposta ao empresário e ao consumidor de bens e serviços.

Mas os cidadãos terão que ter a consciência da importância que as suas actividades e opçõesde vida têm nos impactos negativos sobre o ambiente.

Todos somos co-responsáveis dos problemas que afectam o Planeta. Necessariamente, cadaum de nós, terá de assumir a sua quota parte de responsabilidade na solução.

4 - Em Portugal, quais são os principais desafios que os designers enfrentam paraimplementarem critérios de sustentabilidade na sua actividade? A credibilidade dos designers no nosso país ainda é afectada, frequentemente, por preconceitosde ordem cultural e profissional.

No entanto, os métodos de trabalho de um designer, quando baseados em pressupostos decarácter antropológico, tecnológico e económico, podem estabelecer os parâmetros específicosexigidos por cada área de actividade, desde que, possua, naturalmente, as competênciasprofissionais que o habilitem para o estudo de propostas ou para coordenar workgroupsadequados aos problemas.

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 Em design, os processos de trabalho, pela sua abrangência, definem estruturas com graus decomplexidade que, por norma, exigem uma acção multidisciplinar.

E o primeiro desafio, consiste, exactamente, em desfazer, junto dos empresários, a imagemerrónea, que ainda subsiste, relativamente à especificidade das habilitações dos designers, emparticular, no que se refere ao design de produto.

Estabelecida a relação de confiança e de credibilidade profissional, enfrenta-se um certoconservadorismo, comum na gestão empresarial, inibidor da cultura de risco e que afecta oinvestimento na inovação.

E as problemáticas suscitadas pela sustentabilidade só podem ser abordadas com oequacionamento dos novos factores validados pela ciência, pela sociologia, pela tecnologia epela economia, que dificilmente se enquadram no modus operandi convencional em que, asempresas, baseiam o seu planeamento estratégico.

Neste contexto, a Inovação depende da criação de uma mentalidade de mudança quecomprometa, simultaneamente os empresários e a sociedade de consumo evitando-se opçõesde ruptura ou acções coercivas que se perspectivam caso não comecem a ser consideradas as

alterações exigidas pelo processo do Desenvolvimento Sustentável.

5 - Sendo o professor Carlos Barbosa um especialista e docente na área do design, comoé que os cursos que lecciona poderão ajudar, na prática, os seus alunos a aplicarem oscritérios de sustentabilidade nas suas respectivas áreas.As escolas do Ensino Básico e Secundário, estão a dar, em geral, particular atenção à criaçãode uma sensibilidade ecológica que vem preparando, mentalmente, as novas gerações deestudantes universitários para entenderem as implicações colocadas pelas diferentes questõesno âmbito da Sustentabilidade.

Contudo os planos curriculares do Ensino Superior ainda não investem, de modo suficiente, naformação das mentalidades dos indivíduos que, a curto prazo, terão capacidade decisória naacção política e no planeamento estratégico das empresas e das instituições com influência nos

vários sectores da sociedade.

Pessoalmente, de há muito, que estou comprometido, com a causa do Ecodesign e do Designpara a Sustentabilidade, através de comunicações elaboradas, naturalmente, na perspectiva dodesigner que sou por formação académica e de acções no âmbito da Escola Superior de Designdo IADE, em cujo Plano de Estudos já foram integradas unidades curriculares nessas áreas.

Para congregar as sinergias de estudantes, professores, investigadores e profissionais, criei,também, o Núcleo de Design para a Sustentabilidade do IADE (NDS_IADE), fundamentado noconceito de uma cultura de projecto com o objectivo geral de implementar soluções paraproblemas identificados no contexto do processo do Desenvolvimento Sustentável,disponibilizando, mesmo, serviços de consultoria e apoio no estudo de propostas de produtos eserviços que contribuam para sustentabilidade social e ambiental.

Mas as actividades académicas e a investigação científica só atingem a sua verdadeira razão deser se forem postas ao serviço da sociedade e se existir uma interacção efectiva com asinstituições de responsabilidade social e as várias estruturas empresariais.

A Inovação Sustentável é, estratégica e economicamente, viável e é, também, o desafio dacausa que compromete a Humanidade e o Planeta em vivemos.