Deus e o Estado Bakunin

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8/14/2019 Deus e o Estado Bakunin http://slidepdf.com/reader/full/deus-e-o-estado-bakunin 1/76 Mikhail Bakunin Deus e o Esta o MIKHAIL BA Esta edição de Deus e o Estado , cujo título não foi de autoria de Bakunin, recupera a primeira, de 1882, organizada por Carlo Cafiero e Elisée Reclus publicada em Genebra pela Gráfica Juraciana. No livro Bakounine - comba idées , lançado pelo Instituto de Estudos Eslavos, Paris, 1979, p. 242, afirm Pierre Pécheaux em artigo intitulado "1882 - Deus e o Estado, editado por arlo Cafiero e Elisée Reclus" : "Este escrito, que é um fragmento da 2ª edição do Império nuto-Germânico e a Revolução Social , e o mais conhecido da obra de Bakunin, traduzido ara uma quinzena de idiomas, é objeto de pelo menos 75 edições. De 1882 a 1973, vantamos 71 edições em quinze idiomas diferentes". Neste mesmo livro há um outro artig Balanço das publicações" -, onde Pécheaux declara que houve quatro versões de Deus e stado : a primeira, de 1882, de Carlo Cafiero e Elisée Reclus; a segunda, de 1895, de Max ettlau; a terceira, uma combinação dos textos contidos nas duas anteriores e a quarta, do tado Nettlau, acrescida de outros escritos de 1870 e 1871. Em função dessas combinaçõ ariadas de textos, cria-se a confusão durante muitos anos a respeito do conteúdo de Deu Estado , título que coube a Carlo Cafiero, na edição de 1882, mas que foi aproveitado em ferentes edições subsequentes. A tradução para o português é de Plínio Augusto Coelho Apresentação sta apresentação foi escrita como advertência para a primeira edição desta obra, em 188 or Carlo Cafiero e Elisée Reclus. vida de Mikhail Bakunin já é suficientemente conhecida em seus aços gerais. Amigos e inimigos sabem que este homem foi grand o intelecto, na vontade, na energia perseverante; sabem que grau e desprezo ele ressentia pela fortuna, pela posição social, pela lória, todas estas misérias que a maioria dos humanos têm a aixeza de ambicionar. Fidalgo russo, aparentado da mais alta obreza do império, entrou, um dos primeiros, nesta orgulhosa ssociação de revoltados que souberam se libertar das tradições, os preconceitos, dos interesses de raça e de classe, e desprezar eu bem-estar. Com eles enfrentou a dura batalha da vida, agravad ela prisão, pelo exílio, por todos os perigos e todas as amarguras ue os homens devotados sofrem em sua existência atormentada ma simples pedra e um nome marcam no cemitério de Berna o lugar DEUS E O ESTADO le:///C|/site/LivrosGrátis/deuseoestado.htm (1 of 76) [13/04/2001 15:13:33]

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Mikhail Bakunin

Deus e o Esta oMIKHAIL BA

Esta edição de Deus e o Estado , cujo título não foi de autoria de Bakunin,recupera a primeira, de 1882, organizada por Carlo Cafiero e Elisée Recluspublicada em Genebra pela Gráfica Juraciana. No livro Bakounine - comba

idées , lançado pelo Instituto de Estudos Eslavos, Paris, 1979, p. 242, afirmPierre Pécheaux em artigo intitulado "1882 - Deus e o Estado, editado por 

arlo Cafiero e Elisée Reclus" : "Este escrito, que é um fragmento da 2ª edição do Império nuto-Germânico e a Revolução Social , e o mais conhecido da obra de Bakunin, traduzidoara uma quinzena de idiomas, é objeto de pelo menos 75 edições. De 1882 a 1973,vantamos 71 edições em quinze idiomas diferentes". Neste mesmo livro há um outro artig

Balanço das publicações" -, onde Pécheaux declara que houve quatro versões de Deus e stado : a primeira, de 1882, de Carlo Cafiero e Elisée Reclus; a segunda, de 1895, de Maxettlau; a terceira, uma combinação dos textos contidos nas duas anteriores e a quarta, do

tado Nettlau, acrescida de outros escritos de 1870 e 1871. Em função dessas combinaçõariadas de textos, cria-se a confusão durante muitos anos a respeito do conteúdo de DeuEstado , título que coube a Carlo Cafiero, na edição de 1882, mas que foi aproveitado emferentes edições subsequentes. A tradução para o português é de Plínio Augusto Coelho

Apresentaçãosta apresentação foi escrita como advertência para a primeira edição desta obra, em 188or Carlo Cafiero e Elisée Reclus.

vida de Mikhail Bakunin já é suficientemente conhecida em seusaços gerais. Amigos e inimigos sabem que este homem foi grando intelecto, na vontade, na energia perseverante; sabem que graue desprezo ele ressentia pela fortuna, pela posição social, pelalória, todas estas misérias que a maioria dos humanos têm aaixeza de ambicionar. Fidalgo russo, aparentado da mais altaobreza do império, entrou, um dos primeiros, nesta orgulhosa

ssociação de revoltados que souberam se libertar das tradições,os preconceitos, dos interesses de raça e de classe, e desprezareu bem-estar. Com eles enfrentou a dura batalha da vida, agravadela prisão, pelo exílio, por todos os perigos e todas as amargurasue os homens devotados sofrem em sua existência atormentada

ma simples pedra e um nome marcam no cemitério de Berna o lugar

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nde foi depositado o corpo de Bakunin. E, talvez, muito para honrar amemória de um lutador que tinha as vaidades deste gênero em tãomedíocre estima! Seus amigos não farão construir para ele, certamente

em faustosos túmulos nem estátua. Sabem com que amplo riso ele oseria acolhido se lhe tivessem falado de um jazigo edificado em suaória. Sabem também que a verdadeira maneira de honrar seus morto

ontinuar sua obra - com o ardor e a perseverança que eles própriosedicam a ela. Certamente que esta é uma tarefa difícil, que demandaodos os nossos esforços, pois, entre os revolucionários da geração quassa, não há sequer um que tenha trabalhado com mais fervor pelaausa comum da Revolução.

a Rússia, entre os estudantes, na Alemanha, entre os insurretos deresden, na Sibéria, entre seus irmãos de exílio, na América, na

nglaterra, na França, na Suíça, na Itália, entre todos os homens de boontade, sua influência direta foi considerável. A originalidade de suaséias, sua eloquência figurada e veemente, seu zelo infatigável naropaganda, ajudados, por sinal, pela majestade natural de suaparência e por uma vitalidade possante, abriram a Bakunin o acesso a

odos os grupos revolucionários socialistas, e sua ação deixou em todos lugares marcas profundas, mesmo entre aqueles que, após ocolherem, o rejeitaram por causa da diferença de objetivo ou de métoua correspondência era das mais extensas; passava noites inteiras

edigindo longas epístolas a seus amigos do mundo revolucionário, egumas destas cartas, destinadas a fortalecer os tímidos, a despertar dormecidos, a traçar planos de propaganda ou de revolta, tomaram aroporções de verdadeiros volumes. São estas cartas que explicamobretudo a prodigiosa ação de Bakunin no movimento revolucionário déculo.

s brochuras por ele publicadas, em russo, em francês, em italiano, pomais importantes que sejam, e por mais úteis que tenham sido para

sseminar as novas idéias, são a parte mais fraca da obra de Bakunin

O texto que publicamos hoje, Deus e o Estado , não é outra coisa, naealidade, senão um fragmento de carta ou de relatório. Composto da

mesma maneira que a maioria dos outros escritos de Bakunin, possui o

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mesmo defeito literário, a falta de proporções; além disso, é bruscamenterrompido: todas as buscas por nós realizadas para encontrar o finao manuscrito foram em vão. Bakunin nunca tinha o tempo necessárioara concluir todos os trabalhos empreendidos. Obras eram começadaem que outras tivessem sido terminadas. "Minha própria vida é umagmento", dizia àqueles que criticavam seus escritos. Entretanto, os

itores de Deus e o Estado certamente não lamentarão que o texto deakunin, ainda que incompleto, tenha sido publicado. Nele, as questõeparecem tratadas com um singular vigor de argumentação e de uma

maneira decisiva. Ao se dirigir, com justa razão, aos adversários de boé, Bakunin lhes demonstra a inanidade de sua crença nesta autoridadvina sobre a qual foram fundamentadas todas as autoridades

emporais; ele lhes prova a gênese puramente humana de todos osovernos; enfim, sem deter-se naquelas origens do Estado que já estã

ondenadas pela moral pública, tais como a superioridade física, aolência, a nobreza, a fortuna, ele faz justiça à teoria que daria à ciêncgoverno das sociedades. Mesmo supondo que fosse possível

econhecer, no conflito das ambições rivais e das intrigas, os pretensoss verdadeiros homens de ciência, e que se encontrasse um modo deeição que fizesse esgotar infalivelmente o poderio daqueles cujo sabautêntico, que garantia de sabedoria e de probidade em seu governo

oderiam eles nos oferecer? De antemão, não poderíamos, ao contrárrever entre estes novos senhores as mesmas loucuras e os mesmosrimes que entre os senhores de outrora e os do tempo presente?nicialmente, a ciência não é: ela se faz. O homem de ciência do dia na

mais é que o ignorante do dia seguinte. Basta que ele pense ter chegao fim para, por isso mesmo, cair abaixo da criança que acaba de nasc

Mas, tendo reconhecido a verdade em sua essência, não pode deixar de corromper pelo privilégio e corromper outros pelo comando. Para

ssentar seu governo, ele deverá, como todos os chefes de Estado,entar parar a vida nas massas que se agitam abaixo dele, mantê-las nnorância para assegurar a calma, enfraquecê-los pouco a pouco paraominá-los de uma altura maior.

e resto, desde que os "doutrinários" apareceram, o "gênio" verdadeirou pretenso tenta tomar o cetro do mundo, e sabemos o que isto nosustou. Nós vimos esses homens de ciência em ação, tanto mais

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sensíveis quanto mais estudaram, tanto menos amplos em suas idéiauanto mais tempo passaram a examinar algum fato isolado sob todasuas faces, sem nenhuma experiência de vida, porque durante muitoempo não tiveram outro horizonte senão as paredes de seu queijo,ueris em suas paixões e vaidades, por não terem sabido tomar parteas lutas sérias, e nunca aprenderam a justa proporção das coisas. Nã

mos, recentemente, fundar-se uma escola de "pensadores", por sinalulgares bajuladores e pessoas de vida sórdida, que fizeram toda umaosmogonia para seu uso particular? Segundo eles, os mundos nãooram criados, as sociedades não se desenvolveram, as revoluções nãansformaram os povos, os impérios não desmoronaram, a miséria, aoença e a morte não foram as rainhas da humanidade senão para fazurgir uma elite de acadêmicos, flor desabrochada, da qual todos osutros homens nada mais são senão seu estrume. E a fim de que esse

edatores do Temps e dos Débats tenham o lazer de "pensar" que asações vivem e morrem na ignorância; os outros humanos sãoonsagrados à morte a fim de que estes senhores tornem-se imortais!

Mas podemos nos tranqüilizar: esses acadêmicos não terão a audácia lexandre, cortando com sua espada o nó górdio; eles não erguerão oádio de Carlos Magno. O governo pela ciência torna-se tão impossíveuanto o do direito divino, o do dinheiro ou da força brutal. Todos osoderes são, doravante, submetidos a uma crítica implacável. Homensos quais nasceu o sentimento de igualdade não se deixam maisovernar, aprendem a governar a eles mesmos. Precipitando do alto déus aquele do qual todo poder era suposto descer, as sociedadeserrubam também todos aqueles que reinavam em seu nome. Tal é aevolução que se realiza. Os Estados se deslocam para dar lugar a umova ordem, na qual, assim como Bakunin gostava de dizer, "a justiça

umana substituirá a justiça divina". Se é permitido citar um nome entres revolucionários que colaboraram neste imenso trabalho de renovaçãão há nenhum que possamos assinalar com mais justiça do que o de

Mikhail Bakunin.

arlo Cafiero, Elisée Reclusenebra, 1882.

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rês elementos ou três princípios fundamentais constituem, na histórias condições essenciais de todo desenvolvimento humano, coletivo oudividual: 1º) a animalidade humana ; 2º) o pensamento ; 3º) a revolta . rimeira corresponde propriamente a economia social e privada ; à

egunda, a ciência ; à terceira, a liberdade .Os idealistas de todas as escolas, aristocratas e burgueses, teólogos emetafísicos, políticos e moralistas, religiosos, filósofos ou poetas, sem

squecer os economistas liberais, adoradores desmedidos do ideal, coe sabe, ofendem-se muito quando se lhes diz que o homem, com suateligência magnífica, suas idéias sublimes e suas aspirações infinitasada mais é, como tudo o que existe neste inundo, que um produto da

matéria .oderíamos responder-lhes que a matéria da qual falam os materialista

matéria espontaneamente, eternamente móvel, ativa, produtiva, a matéuímica ou organicamente determinada e manifesta pelas propriedadeu pelas forças mecânicas, físicas, animais e inteligentes, que lhe são

orçosamente inerentes, esta matéria nada tem de comum com a vil matéria dos idealistas . Esta última, produto de falsa abstração, é

fetivamente uma coisa estúpida, inanimada, imóvel, incapaz de dar vio mínimo produto, um caput mortuum , uma infame imaginação opostasta bela imaginação que eles chamam Deus ; em relação ao Serupremo, a matéria, a matéria deles, despojada por eles mesmos de tuque constitui sua natureza real, representa necessariamente o supreada. Eles retiraram da matéria a inteligência, a vida, todas as qualidadeterminantes, as relações ativas ou as forças, o próprio movimento, squal a matéria sequer teria peso, nada lhe deixando da

mpenetrabilidade e da imobilidade absoluta no espaço; eles atribuíramodas estas forças, propriedades ou manifestações naturais ao sermaginário criado por sua fantasia abstrativa; em seguida, invertendo oapéis, denominaram este produto de sua imaginação, este fantasma,ste Deus que é o nada, "Ser supremo"; e, por conseqüência necessáreclararam que o Ser real, a matéria, o mundo, era o nada. Depois dises vêm nos dizer gravemente que esta matéria é incapaz de produzir

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ualquer coisa que seja, até mesmo colocar-se em movimento por simesma, e que por conseqüência deve ter sido criada por seu Deus.

Quem tem razão, os idealistas ou os materialistas? Uma vez feita aergunta, a hesitação se torna impossível. Sem dúvida, os idealistasstão errados e os materialistas certos. Sim, os fatos têm primazia sob

s idéias; sim, o ideal, como disse Proudhon, nada mais é do que umaor, cujas condições materiais de existência constituem a raiz. Sim, todhistória intelectual e moral, política e social da humanidade é um reflee sua história econômica.

odos os ramos da ciência moderna, da verdadeira e desinteressadaência, concorrem para proclamar esta grande verdade, fundamental eecisiva: o mundo social, o mundo propriamente humano, a humanidad

uma palavra, outra coisa não é senão o desenvolvimento supremo, amanifestação mais elevada da animalidade pelo menos para nós e emelação ao nosso planeta. Mas como todo desenvolvimento implicaecessariamente uma negação, a da base ou do ponto de partida, aumanidade é, ao mesmo tempo e essencialmente, a negação refletidarogressiva da animalidade nos homens; e é precisamente esta negaçacional por ser natural, simultaneamente histórica e lógica, fatal como ão os desenvolvimentos e as realizações de todas as leis naturais no

mundo, é ela que constitui e que cria o ideal, o mundo das convicçõestelectuais e morais, as idéias.

im, nossos primeiros ancestrais, nossos Adão e Eva foram, senãoorilas, pelo menos primos muito próximos dos gorilas, dos onívoros, dnimais inteligentes e ferozes, dotados, em grau maior do que o dosnimais de todas as outras espécies, de duas faculdades preciosas: a aculdade de pensar e a necessidade de se revoltar .

stas duas faculdades, combinando sua ação progressiva na história,epresentam a potência negativa no desenvolvimento positivo danimalidade humana, e criam consequentemente tudo o que constitui aumanidade nos homens.

Bíblia, que é um livro muito interessante, e aqui e ali muito profundo,uando o consideramos como uma das mais antigas manifestações da

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abedoria e da fantasia humanas, exprime esta verdade, de maneiramuito ingênua, em seu mito do pecado original. Jeová, que, de todos o

ons deuses adorados pelos homens, foi certamente o mais ciumento,mais vaidoso, o mais feroz, o mais injusto, o mais sanguinário, o mais

espótico e o maior inimigo da dignidade e da liberdade humanas, Jeocabava de criar Adão e Eva, não se sabe por qual capricho, talvez pa

er novos escravos. Ele pôs, generosamente, à disposição deles toda aerra, com todos os seus frutos e todos os seus animais, e impôs umnico limite a este completo gozo: proibiu-os expressamente de tocar outos da árvore de ciência. Ele queria, pois, que o homem, privado de

oda consciência de si mesmo, permanecesse um eterno animal, sempe quatro patas diante do Deus "vivo", seu criador e seu senhor. Mas eue chega Satã, o eterno revoltado, o primeiro livre-pensador e omancipador dos mundos! Ele faz o homem se envergonhar de sua

norância e de sua obediência bestiais; ele o emancipa, imprime em sonte a marca da liberdade e da humanidade, levando-o a desobedecea provar do fruto da ciência.

onhece-se o resto. O bom Deus, cuja presciência, constituindo uma dvinas faculdades, deveria tê-lo advertido do que aconteceria, pôs-se

errível e ridículo furor: amaldiçoou Satã, o homem e o mundo criados pe próprio, ferindo-se, por assim dizer, em sua própria criação, como

azem as crianças quando se põem em cólera; e não contente em atingossos ancestrais, naquele momento ele os amaldiçoou em todas asuas gerações futuras, inocentes do crime cometido por seus ancestraossos teólogos católicos e protestantes acham isto muito profundo esto, precisamente porque é monstruosamente iníquo e absurdo. Depmbrando-se de que ele não era somente um Deus de vingança e

ólera, mais ainda, um Deus de amor, após ter atormentado a existênc

e alguns bilhões de pobres seres humanos e tê-los condenado a umterno inferno, sentiu piedade e para salvá-los, para reconciliar seu amterno e divino com sua cólera eterna e divina, sempre ávida de vítimae sangue, ele enviou ao mundo, como uma vítima expiatória, seu filhonico, a fim de que ele fosse morto pelos homens. Isto é denominado

mistério da Redenção, base de todas as religiões cristãs.

inda se o divino Salvador tivesse salvo o mundo humano! Mas não; n

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araíso prometido pelo Cristo, como se sabe, visto que é formalmentenunciado, haverá poucos eleitos. O resto, a imensa maioria daserações presentes e futuras arderão eternamente no inferno. Enquanso, para nos consolar, Deus, sempre justo, sempre bom, entrega a teo governo dos Napoleão III, Guilherme 1, Ferdinando da Áustria elexandre de todas as Rússias.

ais são os contos absurdos que se narram e as doutrinas monstruosaue se ensinam, em pleno século XIX, em todas as escolas populares uropa, sob ordem expressa dos governos. Chama-se a isto civilizar oovos! Não é evidente que todos os governos são os envenenadoresstemáticos, os embrutecedores interessados das massas populares?

is os ignóbeis e criminosos meios que eles empregam para reter as

ações em eterna escravidão, a fim de poder melhor despojá-las, semúvida nenhuma. O que são os crimes de todos os Tropmann do mundm presença deste crime de lesa-humanidade que se cometeuotidianamente, abertamente, sobre toda a superfície do mundovilizado, por aqueles mesmos que ousam chamar-se de tutores e paios povos?

ntretanto, no mito do pecado original, Deus deu razão a Satã; ele

econheceu que o diabo não havia enganado Adão e Eva ao lhesrometer a ciência e a liberdade, como recompensa pelo ato deesobediência que ele os induzira a cometer. Assim que eles provaramo fruto proibido, Deus disse a si mesmo (ver a Bíblia): "Aí está, o hom

ornou-se como um dos deuses, ele conhece o bem e o mal; impeçamoois de comer o fruto da vida eterna, a fim de que ele não se torne imoomo Nós".

eixemos agora de lado a parte fabulosa deste mito, e consideremos serdadeiro sentido, muito claro, por sinal. O homem se emancipou,eparou-se da animalidade e se constituiu homem; ele começou suastória e seu desenvolvimento especificamente humano por um ato deesobediência e de ciência, isto é, pela revolta e pelo pensamento.

O sistema dos idealistas apresenta-nos inteiramente ao contrário. É aeviravolta absoluta de todas essas experiências humanas e deste bom

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enso universal e comum, que é a condição essencial de qualqueronhecimento humano, e que, partindo desta verdade tão simples, háanto tempo reconhecida, que 2 mais 2 são 4, até às consideraçõesentíficas mais sublimes e mais complicadas, não admitindo, por sinalada que não seja severamente confirmado pela experiência e pelabservação das coisas e dos fatos, constitui a única base séria dos

onhecimentos humanos.oncebe-se perfeitamente o desenvolvimento sucessivo do mundo

material, tanto quanto o da vida orgânica, animal, e da inteligênciastoricamente progressiva do homem, individual ou social. É um

movimento completamente natural, do simples ao composto, de baixoara cima, ou do inferior ao superior; um movimento conforme a todas ossas experiências quotidianas e, consequentemente, conforme

ambém à nossa lógica natural, às leis próprias de nosso espírito, que se formam e só podem desenvolver-se com a ajuda destas mesmasxperiências, que nada mais são senão sua reprodução mental, cerebru o resumo ponderado.

onge de seguir a via natural, de baixo para cima, do inferior ao superiodo relativamente simples ao mais complicado; ao invés de admitir

abiamente, racionalmente, a transição progressiva e real do mundo

enominado inorgânico ao mundo orgânico, vegetal, animal, em seguidspecialmente humano; da matéria ou do ser químico à matéria ou ao vo, e do ser vivo ao ser pensante, os idealistas, obsedados, cegos e

mpulsionados pelo fantasma divino que herdaram da teologia, tomam a absolutamente contrária. Eles vão de cima para baixo, do superior aferior, do complicado ao simples. Eles começam por Deus, seja comoessoa, seja como substância ou idéia divina, e o primeiro passo que duma terrível queda das alturas sublimes do eterno ideal na lama do

mundo material: da perfeição absoluta na imperfeição absoluta; doensamento ao ser, ou ainda, do Ser Supremo ao Nada. Quando, comor que o Ser divino, eterno, infinito, o perfeito absoluto, provavelmententediado de si mesmo, decidiu-se a esse salto mortal desesperado, eue nenhum idealista, nem teólogo, nem metafísico, nem poeta, jamaisoube compreender, nem explicar aos profanos. Todas as religiõesassadas e presentes e todos os sistemas de filosofia transcendentes

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poiam-se nesse único e iníquo mistério[']. Santos homens, legisladorespirados, profetas e messias, procuraram lá a vida e só encontraram

ortura e a morte. Assim como a esfinge antiga, ele os devorou, porqueão souberam explicar esse mistério. Grandes filósofos, desde HeráclitPlatão até Descartes, Spinoza, Leibnitz, Kant, Fichte, Schelling e Heg

em falar dos filósofos hindus, escreveram amontoados de volumes e

riaram sistemas tão engenhosos quanto sublimes, nos quais disseramassagens muito belas, e grandes coisas, e descobriram verdadesmortais, mas deixaram este mistério, objeto principal de suas

vestigações transcendentes, tão insondável quanto antes deles. Ossforços gigantescos dos mais admiráveis gênios que o mundo conhecque, uns após outros, durante trinta séculos pelo menos,mpreenderam sempre esse trabalho de Sísifo, só conseguiram tornarste mistério mais incompreensível ainda. Podemos esperar que ele no

eja desvendado pelas especulações rotineiras de algum pedantescípulo de uma metafísica artificialmente requentada, numa época emue todos os espíritos vivos e sérios desviaram-se dessa ciênciaquivoca, saída de uma transação entre o contra-senso da fé e a sadiaazão científica?

evidente que esse terrível mistério é inexplicável, isto é, absurdo, ebsurdo porque não se deixa explicar. E evidente que alguém que deleecessite para sua felicidade, para sua vida, deve renunciar à sua razãretornar, caso seja possível, à fé ingênua, cega, estúpida; repetir comertuliano e com todos os crentes sinceros estas palavras que resumeprópria quintessência da teologia: Credo quja absurdum .

esse caso cessa toda a discussão e só resta a estupidez triunfante daé. Mas logo em seguida surge uma outra pergunta:

omo pode nascer, em um homem inteligente e instruído, a necessidae crer nesse mistério?

Que a crença em Deus, criador, ordenador, juiz, senhor, amaldiçoadoralvador e benfeitor do mundo, tenha se conservado no povo, eobretudo nas populações rurais, muito mais do que no proletariado dadades, nada mais natural. O povo, infelizmente, é ainda muito ignora

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mantido na ignorância pelos esforços sistemáticos de todos osovernos que consideram isso, com muita razão, como uma dasondições essenciais de seu próprio poder. Esmagado por seu trabalhouotidiano, privado de lazer, de comércio intelectual, de leitura, enfim, uase todos os meios e de uma boa parte dos estímulos queesenvolvem a reflexão nos homens, o povo aceita, na maioria das

ezes, sem crítica e em bloco, as tradições religiosas. Elas o envolvemesde a primeira idade, em todas as circunstâncias de sua vida,rtificialmente mantidas em seu seio por uma multidão de corruptoresficiais de todos os tipos, padres e leigos, elas se transformam entre elm um tipo de hábito mental, freqüentemente mais poderoso do que seom senso natural.

á uma outra razão que explica e legitima de certo modo as crenças

bsurdas do povo.sta razão é a situação miserável à qual ele se encontra fatalmenteondenado pela organização econômica da sociedade, nos países mavilizados da Europa. Reduzido, sob o aspecto intelectual e moral, tanuanto sob o aspecto material, ao mínimo de uma existência humana,ecluso em sua vida como um prisioneiro em sua prisão, sem horizonteem saída, até mesmo sem futuro, se se acredita nos economistas, o

ovo deveria ter a alma singularmente estreita e o instinto aviltado dosurgueses para não sentir a necessidade de sair disso; mas, para issoá somente três meios: dois fantásticos, e o terceiro real. Os doisrimeiros são o cabaré e a igreja; o terceiro é a revolução social. Estatima, muito mais que a propaganda antiteológica dos livres-pensador

erá capaz de destruir as crenças religiosas e os hábitos de libertinageo povo, crenças e hábitos que estão mais intimamente ligados do queensa. Substituindo os gozos simultaneamente ilusórios e brutais dargia corporal e espiritual pelos gozos tão delicados quanto ricos daumanidade desenvolvida em cada um e em todos, a revolução social

erá a força de fechar ao mesmo tempo todos os cabarés e todas asrejas.

té lá, o povo, considerado em massa, crerá, e se não tem razão de crelo menos terá o direito de fazê-lo.

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á uma categoria de pessoas que, se não crêem, devem pelo menosazer de conta que sim. São todos os atormentadores, os opressores, oxploradores da humanidade: padres, monarcas, homens de Estado,omens de guerra, financistas públicos e privados, funcionários de todos tipos, soldados, policiais, carcereiros e carrascos, capitalistas,proveitadores, empresários e proprietários, advogados, economistas,

olíticos de todas as cores, até o último vendedor de especiarias, todosepetirão em uníssono essas palavras de Voltaire: "Se Deus não existiseria preciso inventá-lo".

ós compreendeis, "é preciso uma religião para o povo". E a válvula descape.

á também um número de almas honestas, mas fracas, que, muito

teligentes para levar os dogmas cristãos a sério, rejeita-os a retalho,mas não têm a coragem, nem a força, nem a resolução necessária parepeli-los por atacado. Elas abandonam à crítica todos os absurdosarticulares da religião, elas desdenham de todos os milagres, mas segarram desesperadamente ao absurdo principal, fontes de todos osutros, ao milagre que explica e legitima todos os outros milagres, àxistência de Deus. Seu Deus não é, em nada, o Ser vigoroso e potentDeus totalmente positivo da teologia. E um ser nebuloso, diáfano,

usório, de tal forma ilusório que se transforma em Nada quando secredita tê-lo agarrado; é uma miragem, uma pequena chama que nãoquece nem ilumina. E entretanto elas se prendem a ele, e acreditam qe ele desaparecesse, tudo desapareceria com ele. São almas incertasoentes, desorientadas na civilização atual, não pertencendo nem aoresente nem ao futuro, pálidos fantasmas eternamente suspensos encéu e a terra, e ocupando, entre a política burguesa e o socialismo doroletariado, absolutamente a mesma posição. Elas não seu tem forçaara pensar até o fim, nem para querer, nem para se decidir, e perdemeu tempo e sua ocupação esforçando-se sempre em conciliar oconciliável.

a vida pública, estas pessoas se chamam socialistas burgueses.enhuma discussão é possível com elas. Elas são muito doentes.

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Mas há um pequeno número de homens ilustres, dos quais ninguémusará falar sem respeito, e dos quais nada poderá colocar em dúvidaem a saúde vigorosa, nem a força de espírito, nem a boa fé. Basta quu cite os nomes de Mazzini, Michelet, Quinet, John Stuart Mill [2] Almaenerosas e fortes, grandes corações, grandes espíritos, grandesscritores, o primeiro, regenerador heróico e revolucionário de uma

rande nação, são todos apóstolos do idealismo, e desprezadores,dversários apaixonados do materialismo, e, consequentemente, doocialismo, em filosofia tanto quanto em política.

pois contra eles que é preciso discutir esta questão.

* * *

onstatemos inicialmente que nenhum dos homens ilustres que acabotar, nem qualquer outro pensador idealista com alguma importância eossos dias ocupou-se, para dizer a verdade, com a parte lógica destauestão. Nenhum tentou resolver filosoficamente a possibilidade do sa

mortal divino das regiões eternas e puras do espírito à lama do mundomaterial. Será que eles temeram abordar esta insolúvel contradição e s

esesperaram de resolvê-la, depois que os maiores gênios da históriaacassaram, ou será que eles a consideraram como já suficientemente

esolvida? É segredo deles. O fato é que eles deixaram de lado aemonstração teórica da existência de um Deus, e só desenvolveramuas razões e conseqüências práticas. Eles falaram dele como de umato universalmente aceito e, como tal, não podendo mais tornar-sebjeto de uma dúvida qualquer, limitando-se, contra qualquer prova, aonstatar a antigüidade e mesmo a universalidade da crença em Deus

sta unanimidade imponente, segundo a opinião de muitos homens e

scritores ilustres, e, para citar apenas os mais renomados dentre elesoseph de Maistre e o grande patriota italiano Giuseppe Mazzini, valemais do que todas as demonstrações da ciência; e, se a lógica de um

equeno número de pensadores conseqüentes e mesmo muitofluentes, mas isolados, lhe é contrária, tanto pior, dizem eles, para esensadores e para sua lógica, pois o consentimento geral, a adoçãoniversal e antiga de uma idéia foram sempre consideradas como a pro

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mais vitoriosa de sua verdade. O sentimento de todo o mundo, umaonvicção que é encontrada e se mantém sempre e em todos os lugareão poderia se enganar; eles devem ter sua raiz numa necessidadebsolutamente inerente à própria natureza do homem. E visto que foionstatado que todos os povos passados e presentes acreditaram ecreditam na existência de Deus, é evidente que aqueles que têm a

felicidade de duvidar disso, qualquer que seja a lógica que os tenhavado a esta dúvida, são exceções, anomalias, monstros.

ssim, pois, a antigüidade e a universalidade de uma crença seriam,ontra toda ciência e contra toda lógica, uma prova suficiente erecusável de sua verdade.

or quê?

té o século de Galileu e de Copérnico, todo mundo acreditava que o srava em torno da terra. Todo mundo não estava errado? O que há de

mais antigo e de mais universal do que a escravidão? A antropofagia,alvez. Desde a origem da sociedade histórica, até nossos dias, semprouve, e em todos os lugares, exploração do trabalho forçado das

massas, escravos, servos ou assalariados, por alguma minoriaominante, opressão dos povos pela Igreja e pelo Estado. Deve-se

oncluir que esta exploração e esta opressão sejam necessidadesbsolutamente inerentes à própria existência da sociedade humana? Eguns exemplos que mostram que a argumentação dos advogados doom Deus nada prova.

ada é, com efeito, nem tão universal nem tão antigo quanto o iníquo ebsurdo; é ao contrário a verdade, a justiça que, no desenvolvimento dociedades humanas, aio as menos universais e as mais jovens. Assim

e explica, por sinal, um fenômeno histórico constante: as perseguiçõequeles que proclamam a primazia da verdade, por parte dosepresentantes oficiais, privilegiados e interessados pelas crençasuniversais" e "antigas", e freqüentemente também por parte destas

mesmas massas populares que, após tê-los inicialmente desconhecidocabam sempre por adotar e por fazer triunfar suas idéias.

ara nós, materialistas e socialistas revolucionários, não há nada que n

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urpreenda e nos amedronte nesse fenômeno histórico. Fortalecidos eossa consciência, em nosso amor pela verdade, por esta paixão lógicue por si só constitui uma grande força, e fora da qual não háensamento; fortalecidos em nossa paixão pela justiça e em nossa féquebrantável no triunfo da humanidade sobre todas as bestialidades

eóricas e práticas; fortalecidos, enfim, em nossa confiança e no apoio

mútuo que se dá o pequeno número daqueles que compartilham nossaonvicções, nós nos resignamos por nós mesmos a todas asonseqüências desse fenômeno histórico no qual vemos a manifestaçãe uma lei social tão invariável quanto todas as outras leis que governamundo.

sta lei é uma conseqüência lógica, inevitável, da origem animal daociedade humana; e diante de todas as provas científicas, fisiológicas

sicológicas, históricas, que se acumularam em nossos dias, assim coante das façanhas dos alemães conquistadores da França, que dãoma demonstração tão ruidosa, não é mais possível, realmente, duvidasso. Mas, do momento em que se aceita esta origem animal do home

udo se explica. A história nos aparece então como a negaçãoevolucionária, ora lenta, apática, adormecida, ora apaixonada eossante, do passado. Ela consiste precisamente na negaçãorogressiva da animalidade primitiva do homem pelo desenvolvimento ua humanidade. O homem, animal feroz, primo do gorila, partiu da norofunda do instinto animal para chegar à luz do espírito, o que explicama maneira completamente natural todas as suas divagações passadnos consola em parte de seus erros presentes. Ele partiu da escravidnimal, e atravessando a escravidão divina, termo transitório entre suanimalidade e sua humanidade, caminha hoje rumo à conquista e àealização da liberdade humana. Resulta daí que a antigüidade de uma

rença, de uma idéia, longe de provar alguma coisa em seu favor, deveo contrário, torná-la suspeita para nós. Isto porque atrás de nós estáossa animalidade, e diante de nós nossa humanidade; a luz humana,nica que pode nos aquecer e nos iluminar, a única que nos podemancipar, tornar-nos dignos, livres, felizes, e realizar a fraternidadentre nós, jamais está no princípio, mas, relativamente, na época em qe vive, e sempre no fim da história. Não olhemos jamais para trás,hemos sempre para a frente; à frente está nosso sol, nossa salvação

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e nos é permitido, se é mesmo útil, necessário nos virarmos para ostudo de nosso passado, é apenas para constatar o que fomos e o quão devemos mais ser, o que acreditamos e pensamos, e o que nãoevemos mais acreditar nem pensar, o que fizemos e o que nunca maieveremos fazer.

is o que concerne à antigüidade. Quanto à universalidade de um erroa só prova uma coisa: a semelhança, senão a perfeita identidade daatureza humana, em todos os tempos e sob todos os climas. E, vistoue está constatado que todos os povos, em todas as épocas de suada, acreditaram e acreditam ainda em Deus, devemos concluir disso,mplesmente, que a idéia divina, emanada de nós mesmos, é um errostoricamente necessário no desenvolvimento da humanidade, e noserguntarmos por que, como ele foi produzido na história, por que a

mensa maioria da espécie humana o aceita, ainda hoje, como umaerdade?

nquanto não soubermos dar-nos conta da maneira como a idéia de umundo sobrenatural e divino se produziu, e pôde fatalmente se produz

o desenvolvimento histórico da consciência humana, de nada adiantastarmos cientificamente convencidos do absurdo desta idéia, nãoonseguiremos nunca destruí-la na opinião da maioria, porque não

aberemos jamais atacá-la nas profundezas do ser humano, onde ela sriginou. Condenados a uma esterilidade sem saída e sem fim, devemempre contentar-nos em combatê-la somente à superfície, em suasúmeras manifestações, cujo absurdo, tão logo abatido pelos golpes dom senso, renasce imediatamente após, sob uma nova forma, não

menos insensata. Enquanto a raiz de todos os absurdos que atormentamundo não for destruída, a crença em Deus permanecerá intacta e

amais deixará de produzir novos brotos. E assim que, em nossos diasm certas regiões da alta sociedade, o espiritismo tende a se instalarobre as ruínas do cristianismo. Não é somente no interesse das massno interesse da saúde de nosso próprio espírito que devemos nossforçar para compreender a gênese histórica, a sucessão das causasue desenvolveram e produziram a idéia de Deus na consciência dosomens. De nada adianta nos dizermos e nos considerarmos ateus;nquanto não tivermos compreendido essas causas, nos deixaremos

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empre mais ou menos dominar pelos clamores dessa consciêncianiversal, da qual não teremos descoberto o segredo, e dada a fraquezatural do indivíduo, mesmo do mais forte, contra a influência

odo-poderosa do meio social que o entrava, corremos sempre o risco ecair, cedo ou tarde, de uma maneira ou de outra, no abismo do absueligioso. Os exemplos dessas conversões vergonhosas são freqüente

a sociedade atual.* * *

alei da razão prática principal do poder exercido ainda hoje pelasrenças religiosas sobre as massas. Essas disposições místicas nãoenotam no homem somente uma aberração do espírito, mas umrofundo descontentamento do coração. E o protesto instintivo e

paixonado do ser humano contra as estreitezas, as vulgaridades, asores e as vergonhas de uma existência miserável. Contra esta doençaá disse, só há um único remédio: a Revolução Social.

m outros escritos me preocupei em expor as causas que presidiram aascimento e ao desenvolvimento histórico das alucinações religiosas onsciência do homem. E aqui quero tratar desta questão da existênciae um Deus, ou da origem divina do mundo e do homem sob o ponto d

sta de sua utilidade moral e social, e direi poucas palavras sobre aazão teórica desta crença, a fim de melhor explicar meu pensamento.

odas as religiões, com seus deuses, seus semideuses e seus profetaeus messias e seus santos, foram criadas pela fantasia crédula doomem, que ainda não alcançou o pleno desenvolvimento e a plenaossessão de suas faculdades intelectuais. Em conseqüência, o céueligioso nada mais é do que uma miragem onde o homem, exaltado p

norância pela fé, encontra sua própria imagem, mas ampliada evertida, isto é, divinizada. A história das religiões, a do nascimento, drandeza e da decadência dos deuses que se se sucederam na crençaumana, não é nada mais do que o desenvolvimento da inteligência e onsciência coletivas homens. À medida que, em sua marcha históricarogressiva, eles descobriam, seja neles próprios, seja na naturezaxterior, uma força, uma qualidade, ou mesmo grande defeito quaisquees os atribuíam a seus deuses após tê-los exagerado, ampliado

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esmedidamente, como fazem habitualmente as crianças, por um ato dua fantasia religiosa. Graças a esta modéstia e a esta piedosaenerosidade dos homens, crentes e crédulos, o céu se enriqueceu cos despojos da terra, e, por conseqüência necessária, quanto mais o ce tornava rico, mais a humanidade e a terra se tornavam miseráveis.ma vez instalada a divindade, ela foi naturalmente proclamada a caus

razão, o árbitro e o distribuidor absoluto de todas as coisas: o mundoão foi mais nada, ela foi tudo; e o homem, seu verdadeiro criador, apóê-la tirado do nada sem o saber, ajoelhou-se diante dela, adorou-a e sroclamou sua criatura e seu escravo.

O cristianismo é precisamente a religião por excelência, porque ele expmanifesta, em sua plenitude, a natureza, a própria essência de todo ostema religioso, que é empobrecimento, a escravização e o

niquilamento da humanidade em proveito da divindade.eus sendo tudo, o mundo real e o homem não são nada. Deus sendoerdade, a justiça, o bem, o belo, a força e a vida, o homem é a mentiriniqüidade, o mal, a feiúra, a impotência e a morte. Deus sendo o

enhor, o homem é o escravo. Incapaz de encontrar por si próprio astiça, a verdade e a vida eterna, ele só pode alcançar isso por meio dma revelação divina. Mas quem diz revelação diz reveladores, messia

rofetas, padres e legisladores inspirados pelo próprio Deus; e estes,ma vez reconhecidos como os representantes da divindade sobre aerra, como os santos instituidores da humanidade, eleitos pelo próprioeus para dirigi-la em direção à via da salvação, exercemecessariamente um poder absoluto. Todos os homens lhes devem umbediência passiva e ilimitada, pois contra a razão divina não há razãoumana, e contra a justiça de Deus não há justiça terrestre que se

mantenha. Escravos de Deus, os homens devem sê-lo também da Igredo Estado, enquanto este último for consagrado pela Igreja. Eis o quee todas as religiões que existem ou que existiram, o cristianismoompreendeu melhor do que as outras, sem excetuar a maioria dasntigas religiões orientais, as quais só abarcaram povos distintos erivilegiados, enquanto que o cristianismo tem a pretensão de abarcar umanidade inteira; eis o que, de todas as seitas cristãs, o catolicismoomano, sozinho, proclamou e realizou com uma conseqüência rigoros

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por isso que o cristianismo é a religião absoluta, a última religião, é pso que a Igreja apostólica e romana é a única conseqüente, a únicagica.

despeito dos metafísicos e dos idealistas religiosos, filósofos, políticou poetas, a idéia de Deus implica a abdicação da razão e da justiça

umanas; ela é a negação mais decisiva da liberdade humana e resultecessariamente na escravidão dos homens, tanto na teoria quanto narática.

não ser que queiramos a escravidão e o envilecimento dos homens,omo o querem os jesuítas, como o querem os mômiers [3], osetistas[4] e os metodistas protestantes, não podemos nem devemos

azer a mínima concessão, nem ao Deus da teologia nem ao da

metafísica. Aquele que, neste alfabeto místico, começa por Deus, deveatalmente acabar por Deus; aquele que quer adorar Deus, deve, sem ôr ilusões pueris, renunciar bravamente à sua liberdade e à suaumanidade.

e Deus é, o homem é escravo; ora, o homem pode, deve ser livre,ortanto, Deus não existe.

esafio quem quer que seja para sair deste circulo, e agora que sescolha.

* * *

preciso lembrar quanto e como as religiões embrutecem e corrompes povos? Elas matam neles a razão, o principal instrumento damancipação humana e os reduzem à imbecilidade, condição essenciaa escravidão. Elas desonram o trabalho humano e fazem dele sinal e

onte de servidão. Elas matam a noção e o sentimento da justiça humaazendo sempre pender a balança para o lado dos patifes triunfantes,bjetos privilegiados da graça divina. Elas matam o orgulho e a dignidaumana, protegendo apenas a submissos e os humildes. Elas sufocamo coração dos povos todo sentimento de fraternidade humana,reenchendo-o de crueldade.

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odas as religiões são cruéis, todas são fundadas sobre o sangue, vistue todas repousam principalmente sobre a idéia do sacrifício, isto é,obre a imolação perpétua da humanidade à insaciável vingança davindade. Neste sangrento mistério, o homem é sempre a vítima, e oadre, homem também, mas homem privilegiado pela graça, é o divinoarrasco. Isto nos explica por que os padres de todas as religiões, os

melhores, os mais humanos, os mais doces, têm quase sempre no fune seu coração - senão no coração, pelo menos em sua imaginação, eeu espírito - alguma coisa de cruel e de sanguinário.

* * *

udo isso, nossos ilustres idealistas contemporâneos sabem melhor doue ninguém. São homens sábios, que conhecem sua história de

memória; e como eles são ao mesmo tempo homens vivos, grandesmas penetradas de um amor sincero e profundo pelo bem daumanidade, eles amaldiçoaram e estigmatizaram todas estas

malfeitorias, todos estes crimes da religião com uma eloqüência semual. Eles rejeitam com indignação toda solidariedade com o Deus das

eligiões positivas e com seus representantes passados e presentesobre a terra.

O Deus que eles adoram, ou que eles pensam adorar, distingue-serecisamente dos deuses reais da história por não ser um Deus positiveterminado da maneira que se quiser, teologicamente, ou até mesmo

metafisicamente. Não 6 nem o Ser supremo de Robespierre e de J.-J.ousseau, nem o deus panteísta de Spinoza, nem mesmo o deus, ao

mesmo tempo inocente, transcedente e muito equívoco de Hegel. Elesomam cuidado de lhe dar uma determinação positiva qualquer, sentind

muito bem que toda determinação o submeteria à ação dissolvente da

rítica. Eles não dirão se ele é um deus pessoal ou impessoal, se eleriou ou não criou o mundo; sequer falarão de sua divina providência.udo isso poderia comprometê-lo. Eles se contentarão em dizê-lo: Deunada mais do que isso. Mas então o que é seu deus? Não é sequerma idéia, é uma aspiração.

o nome genérico de tudo o que parece grande, bom, belo, nobre,umano. Mas por que não dizem então: o homem? Ah! E que o rei

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uilherme da Prússia e Napoleão III, e todos os idênticos a eles sãoualmente homens: eis o que os embaraça muito. A humanidade realos apresenta um conjunto de tudo o que há de mais vil e de mais

monstruoso no mundo. Como sair disso? Eles chamam um de divino eutro de bestial, representando a divindade e a animalidade como doisólos entre os quais eles situam a humanidade. Eles não querem ou nã

odem compreender que estes três termos formam um único, e que seepararmos, nós os destruímos.

les não são bons em lógica, e dir-se-ia que a desprezam. E isso que ostingue dos metafísicos panteístas e deístas, e o que imprime às suaéias o caráter de um idealismo prático, buscando suas inspirações

menos no desenvolvimento severo de um pensamento do que nasxperiências, direi, quase nas emoções, tanto históricas e coletivas

uanto individuais, da vida. Isto dá à sua propaganda uma aparência dqueza e de potência vital, mas aparência somente, pois a vida se tornstéril quando é paralisada por uma contradição lógica.

sta contradição é a seguinte: eles querem Deus e querem aumanidade. Obstinam-se em colocar juntos dois termos que, uma vezeparados, só podem se reencontrar para se entredestruir. Eles dizem ma só vez: Deus e a liberdade do homem, Deus e a dignidade, a justi

igualdade, a fraternidade, a prosperidade dos homens, sem sereocupar com a lógica fatal, em virtude da qual, se Deus existe, ele éecessariamente o senhor eterno, supremo, absoluto, e se este senhoxiste, o homem é escravo; se ele é escravo, não há justiça, nemualdade, nem fraternidade, nem prosperidade possível. De nadadiantará, contrariamente ao bom senso e a todas as experiências dastória, eles representarem seu Deus animado do mais doce amor pel

berdade humana: um senhor, por mais que ele faça e por mais liberalue queira se mostrar, jamais deixa de ser, por isso, um senhor. Suaxistência implica necessariamente a escravidão de tudo o que sencontra debaixo dele. Assim, se Deus existisse, só haveria para ele unico meio de servir à liberdade humana; seria o de cessar de existir.

moroso e ciumento da liberdade humana e considerando-a como aondição absoluta de tudo o que adoramos e respeitamos na

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umanidade, inverto a frase de Voltaire e digo que, se Deus existisse,eria preciso aboli-lo.

* * *

severa lógica que me dita estas palavras é muito evidente para que eecessite desenvolver esta argumentação. E me parece impossível qus homens ilustres, dos quais citei os nomes tão célebres e tãostamente respeitados não tenham sido tocados e não tenham percebcontradição na qual eles caem ao falar de Deus e da liberdade humamultaneamente. Para que tenham passado ao longo do problema, foreciso que tivessem pensado que esta inconseqüência ou esta injustiç

osse, na prática, necessária para o próprio bem da humanidade.

alvez, também, ao falar da liberdade como de uma coisa que é paraes respeitável e cara, eles a compreendam completamente diferente ue concebemos, nós, materialistas e socialistas revolucionários. Comfeito, eles não faiam jamais dela sem acrescentar imediatamente umautra palavra, a da autoridade, uma palavra e uma coisa que detestamom toda a força de nosso coração.

O que é a autoridade? E a força inevitável das leis naturais que semanifestam no encadeamento e na sucessão fatal dos fenômenos domundo físico e do mundo social? Efetivamente, contra estas leis, aevolta é não somente proibida, é também impossível. Podemosonhecê-las mal, ou ainda não conhecê-las, mas não podemosesobedecê-las porque elas constituem a base e as próprias condiçõee nossa existência: elas nos envolvem, nos penetram, regulam todos ossos movimentos, pensamentos e atos; mesmo quando pensamosesobedecê-las, não fazemos outra coisa que manifestar sua

nipotência.im, somos absolutamente escravos destas leis. Mas nada há deumilhante nesta escravidão. A escravidão supõe um senhor exterior, ugislador que se situe fora daquele ao qual comanda; enquanto as leisão estão fora de nós, elas nos são inerentes, constituem nosso ser, toosso ser, corporal, intelectual e moralmente: só vivemos, só respiramó agimos, só pensamos, só queremos através delas. Fora delas não

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omos nada, não somos. i)e onde nos viria então o poder e o querer deos revoltarmos contra elas?

m relação às leis naturais, só há, para o homem, uma única liberdadeossível: reconhecê-las e aplicá-las cada vez mais, conforme o objetivoe emancipação ou de humanização coletiva e individual que ele

ersegue. Estas leis, uma vez reconhecidas, exercem uma autoridadeue jamais é discutida pela massa dos homens. E preciso, por exemploer, no fundo, um teólogo ou um economista burguês para se revoltarontra esta lei, segundo a qual dois mais dois são quatro. E preciso terara pensar que não nos queimaríamos no fogo e que não nosfogaríamos na água, a menos que tenhamos recorrido a algumubterfúgio, fundado sobre qualquer outra lei natural. Mas estas revoltau melhor, estas tentativas ou estas loucas fantasias de uma revolta

mpossível não formam mais do que uma exceção bastante rara, pois, eral, se pode dizer que a massa dos homens, na vida quotidiana, seeixa governar pelo bom senso, o que significa dizer, pela soma das leaturais geralmente reconhecidas, de maneira mais ou menos absoluta

infelicidade é que grande quantidade de leis naturais já constatadasomo tais pela ciência, permanecem desconhecidas das massasopulares, graças aos cuidados desses governos tutelares que só

xistem, como se sabe, para o bem dos povos.á, além disso, um grande inconveniente: é que a maior parte das leisaturais, que estão ligadas ao desenvolvimento da sociedade humana ão tão necessárias, invariáveis, quanto as leis que governam o mundosico, não foram devidamente constatadas e reconhecidas pela própriaência [5]. Uma vez tivessem elas sido reconhecidas pela ciência, e qua ciência, através de um amplo sistema de educação e de instrução

opular, elas passassem à consciência de todos, a questão da liberdadstaria perfeitamente resolvida. As autoridades mais recalcitrantes devdmitir que aí então não haverá necessidade de organização, nem dereção nem de legislação políticas, três coisas que emanam da vontado soberano ou da votação de um parlamento eleito pelo sufrágioniversal, jamais podendo estar conformes às leis naturais, e são sempualmente funestas e contrárias à liberdade das massas, visto que ela

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es impõem um sistema de leis exteriores, e consequentementeespóticas.

liberdade do homem consiste unicamente nisto: ele obedece às leisaturais porque ele próprio as reconheceu como tais, não porque elas

oram impostas exteriormente, por uma vontade estranha, divina ou

umana, coletiva ou individual, qualquer.uponde uma academia de sábios, composta pelos representantes maustres da ciência; imaginai que esta academia seja encarregada dagislação, da organização da sociedade, e que, inspirando-se apenas mor da mais pura verdade, ela só dite leis absolutamente conforme às

mais recentes descobertas da ciência. Pois bem, afirmo que estagislação e esta organização serão uma monstruosidade, por duas

azões: a primeira, é que a ciência humana é sempre necessariamentemperfeita, e que, comparando o que ela descobriu com o que ainda lhesta a descobrir, pode-se dizer que está ainda em seu berço. De modue, se quiséssemos forçar a vida prática dos homens, tanto coletivouanto individual, a se conformar estritamente, exclusivamente, com ostimos dados da ciência, condenar-se-ia tanto a sociedade quanto osdivíduos a sofrer martírio sobre um leito de Procusto, que acabaria emreve por desarticulá-los e sufocá-los, ficando a vida sempre

finitamente maior do que a ciência.segunda razão é a seguinte: uma sociedade que obedecesse àgislação emanada de uma academia científica, não porque ela tivess

ompreendido seu caráter racional - em cujo caso a existência dacademia se tornaria inútil - mas porque esta legislação, emanando dacademia, se imporia em nome de uma ciência que ela veneraria semompreendê-la, tal sociedade não seria uma sociedade de homens, ma

e brutos. Seria uma segunda edição dessas missões do Paraguai, que deixaram governar durante tanto tempo pela Companhia de Jesus. ão deixaria de descer, em breve, ao mais baixo grau de idiotia.

Mas há ainda uma terceira razão que tornaria tal governo impossível. Éue uma academia científica, revestida desta soberania por assim dizebsoluta, ainda que fosse composta pelos homens mais ilustres; acabafalivelmente, e em pouco tempo, por se corromper moral e

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telectualmente. E atualmente, com o pouco de privilégios que lheseixam, a história de todas as academias. O maior gênio científico, no

momento em que se torna acadêmico, um sábio oficial, reconhecido,ecai inevitavelmente e adormece. Perde sua espontaneidade, suausadia revolucionária, e a energia incômoda e selvagem que caracternatureza dos maiores gênios, sempre chamada a destruir os mundos

nvelhecidos e a lançar os fundamentos dos novos mundos. Ganha seúvida em polidez, em sabedoria utilitária e prática, o que perde em fore pensamento. Numa palavra, ele se corrompe.

próprio do privilégio e de toda posição privilegiada matar o espírito e oração dos homens. O homem privilegiado, seja política, sejaconomicamente, é um homem depravado de espírito e de coração. Ema lei social que não admite nenhuma exceção e que se aplica tanto

ações inteiras quanto às classes, companhias e indivíduos. E a lei daualdade, condição suprema da liberdade e da humanidade. O objetivrincipal deste estudo é precisamente demonstrar esta verdade em tods manifestações da vida humana.

m corpo científico, ao qual se tivesse confiado o governo da sociedadcabaria logo por deixar de lado a ciência, ocupando-se de outro assuneste assunto, o de todos os poderes estabelecidos, seria sua

ternização, tornando a sociedade confiada a seus cuidados cada vezmais estúpida e, por conseqüência, mais necessitada de seu governo ee sua direção.

Mas o que é verdade para as academias científicas, o é igualmente paodas as assembléias constituintes e legislativas, mesmo quandomanadas do sufrágio universal. Este último pode renovar suaomposição, é verdade, o que não impede que se forme, em alguns

nos, um corpo de políticos, privilegiados de fato, não de direito, que,edicando-se exclusivamente à direção dos assuntos públicos de umais, acabem por formar um tipo de aristocracia ou de oligarquia políticejam os Estados Unidos e a Suíça.

ssim,. nada de legislação exterior e nada de autoridade, uma, por sinendo inseparável da outra, e todas as duas tendendo à escravização ociedade e ao embrutecimento dos próprios legisladores.

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* * *

ecorre daí que rejeito toda autoridade? Longe de mim este pensamenQuando se trata de botas, apelo para a autoridade dos sapateiros; se s

ata de uma casa, de um canal ou de uma ferrovia, consulto a dorquiteto ou a do engenheiro. Por tal ciência especial, dirijo-me a este o

quele cientista. Mas não deixo que me imponham nem o sapateiro, nearquiteto, nem o cientista. Eu os aceito livremente e com todo o respeue me merecem sua inteligência, seu caráter, seu saber, reservando

odavia meu direito incontestável de crítica e de controle. Não meontento em consultar uma única autoridade especialista, consulto váriomparo suas opiniões, e escolho aquela que me parece a mais justa.

Mas não reconheço nenhuma autoridade infalível, mesmo nas questõespeciais; consequentemente, qualquer que seja o respeito que eu pos

er pela humanidade e pela sinceridade desse ou daquele indivíduo, nãenho fé absoluta em ninguém. Tal fé seria fatal à minha razão, à minhberdade e ao próprio sucesso de minhas ações; ela me transformariamediatamente num escravo estúpido, num instrumento da vontade e d

teresses de outrem.

e me inclino diante da autoridade dos especialistas, e se me declaroronto a segui-la, numa certa medida e durante todo o tempo que isso

areça necessário, suas indicações e mesmo sua direção, é porque esutoridade não me é imposta por ninguém, nem pelos homens, nem poeus. De outra forma as rejeitaria com horror, e mandaria ao diabo seuonselhos, sua direção e seus serviços, certo de que eles me fariamagar, pela perda de minha liberdade e de minha dignidade, as migalhe verdade, envoltas em muitas mentiras que poderiam me dar.

nclino-me diante da autoridade dos homens especiais porque ela me é

mposta por minha própria razão. Tenho consciência de só poder abraçm todos os seus detalhes e seus desenvolvimentos positivos, uma pamuito pequena da ciência humana. A maior inteligência não bastaria pa

braçar tudo. Daí resulta, tanto para a ciência quanto para a indústria, ecessidade da divisão e da associação do trabalho. Recebo e dou, tavida humana. Cada um é dirigente e cada um é dirigido por sua vez.ssim, não há nenhuma autoridade fixa e constante, mas uma troca

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ontínua de autoridade e de subordinação mútuas, passageiras eobretudo voluntárias.

sta mesma razão me proíbe, pois, de reconhecer uma autoridade fixaonstante e universal, porque não há homem universal, homem que seapaz de aplicar sua inteligência, nesta riqueza de detalhes sem a qua

plicação da ciência a vida não é absolutamente possível, a todas asências, a todos os ramos da atividade social. E, se uma talniversalidade pudesse ser realizada em um único homem, e se eleuisesse se aproveitar disso para nos impor sua autoridade, seria precxpulsar esse homem da sociedade, visto que sua autoridade reduziriaevitavelmente todos os outros à escravidão e à imbecilidade. Nãoenso que a sociedade deva maltratar os gênios como ela o fez até oresente momento; mas também não acho que os deva adular demais

em lhes conceder quaisquer privilégios ou direitos exclusivos; e isto pês razões; inicialmente porque aconteceria com freqüência de ela tomm charlatão por um gênio; em seguida porque, graças a este sistema rivilégios, ela poderia transformar um verdadeiro gênio num charlatãoesmoralizá-lo, animalizá-lo; e, enfim, porque ela daria a si um senhor.

esumindo. Reconhecemos, pois, a autoridade absoluta da ciênciaorque ela tem como objeto único a reprodução mental, refletida e tão

stemática quanto possível, das leis naturais inerentes à vida material,telectual e moral, tanto do mundo físico quanto do mundo social, senstes dois mundos, na realidade, um único e mesmo mundo natural. Foesta autoridade exclusivamente legítima, pois que ela é racional eonforme à liberdade humana, declaramos todas as outras autoridades

mentirosas, arbitrárias e funestas.

econhecemos a autoridade absoluta da ciência, mas rejeitamos a

falibilidade e a universalidade do cientista. Em nossa igreja - que meeja permitido servir-me por um momento desta expressão que por sinetesto: a igreja e o Estado são minhas duas ovelhas negras; em noss

greja, como na Igreja protestante, temos um chefe, um Cristo invisívelência; e como os protestantes, até mais conseqüentes do que osrotestantes, não queremos tolerar nem o papa, nem o concilio, nemonclaves de cardeais infalíveis, nem bispos, nem mesmo padres. Nos

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risto se distingue do Cristo protestante no fato de este último ser umristo pessoal, enquanto o nosso é impessoal; o Cristo cristão, já

ealizado num passado eterno, apresenta-se como um ser perfeito,nquanto a realização e a perfeição de nosso Cristo, a ciência, estãoempre no futuro: o que equivale a dizer que elas jamais se realizarão.o não reconhecer outra autoridade absoluta que não seja a da ciência

bsoluta, não comprometemos de forma alguma nossa liberdade.ntendo por ciência absoluta a ciência realmente universal, que

eproduziria idealmente, em toda a sua extensão e em todos os seusetalhes infinitos, o universo, o sistema ou a coordenação de todas asis naturais, manifestas pelo desenvolvimento incessante dos mundosvidente que esta ciência, objeto sublime de todos os esforços do espíumano, jamais se realizará em sua plenitude absoluta. Nosso Cristo

ermanecerá pois eternamente inacabado, o que deve enfraquecer muorgulho de seus representantes titulados entre nós. Contra este Deusho, em nome do qual eles pretendiam nos impor sua autoridadesolente e pedantesca, recorremos a Deus pai, que é o mundo real, ada real, do qual ele é apenas a expressão muito imperfeita, e do qualomos os representantes imediatos, nós, seres reais, vivendo,abalhando, combatendo, amando, aspirando, gozando e sofrendo.

uma palavra, rejeitamos toda legislação, toda autoridade e todafluência privilegiada, titulada, oficial e legal, mesmo emanada doufrágio universal, convencido de que ela só poderia existir em proveitoe uma minoria dominante e exploradora, contra os interesses da imen

maioria subjugada.

is o sentido no qual somos realmente anarquistas.

* * *Os idealistas modernos entendem a autoridade de uma maneiraotalmente diferente. Ainda que livres das superstições tradicionais deodas as religiões positivas existentes, eles dão, todavia, a esta idéia dutoridade, um sentido divino, absoluto. Esta autoridade não ébsolutamente a de uma verdade milagrosamente revelada, nem a dema verdade rigorosa e cientificamente demonstrada. Eles a fundam

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obre um pouco de argumentação quase-filosófica, e sobre muita féagamente religiosa, sobre muito sentimento e abstração poética. Suaeligião é como uma última tentativa de divinização de tudo o queonstitui a humanidade nos homens.

bem o contrário da obra que realizamos. Em vista da liberdade, da

gnidade e da prosperidade humanas, pensamos ter de retirar do céu ens que ele roubou e queremos devolvê-los à terra. Eles, ao contráriosforçando-se em cometer um último roubo religiosamente heróico,esejariam restituir ao céu, a este divino ladrão, tudo o que a humanida

em de maior, de mais belo, de mais nobre. E a vez dos livre-pensadorlharem o céu pela audaciosa impiedade de sua análise científica!

Os idealistas acreditam, sem dúvida, que, para gozar de uma maior

utoridade entre os homens, as idéias e as coisas humanas devem serevestidas de uma sanção divina. Como se manifesta esta sanção? Nãor um milagre, como nas religiões positivas, mas pela grandeza ou perópria santidade das idéias e das coisas: o que é grande, o que e beloue é nobre, o que é justo, é divino. Neste novo culto religioso, todoomem que se inspira nestas idéias, nestas coisas, torna-se um padre

mediatamente consagrado pelo próprio Deus. E a prova? Não háecessidade disso; é a própria grandeza das idéias que ele exprime e

as coisas que ele realiza. Elas são tão santas que só podem ter sidospiradas por Deus.

is em poucas palavras toda a sua filosofia: filosofia de sentimentos, ne pensamentos reais, um tipo de pietismo metafísico. Isto pareceocente, mas não o é em absoluto, e a doutrina muito precisa, muitostreita e muito seca, que se esconde sob a onda inapreensível destas

ormas poéticas conduz aos mesmos resultados desastrosos de todas

eligiões positivas: isto é, à mais completa negação da liberdade e dagnidade humanas.

roclamar como divino tudo o que se encontra de grande, de justo, deeal, de belo, na humanidade, é reconhecer implicitamente que aumanidade, por si própria, teria sido incapaz de produzi-lo; isto significzer que abandonada a si própria, sua própria natureza é miserável,íqua, vil e feia. Eis-nos de volta à essência de toda religião, isto é, à

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famação da humanidade pela maior glória da divindade. E do momenm que a inferioridade natural do homem e sua incapacidade profundae levantar por si mesmo, fora de toda inspiração divina, até as idéiasstas e verdadeiras, são admitidas, torna-se necessário admitir també

odas as conseqüências teológicas, políticas e sociais das religiõesositivas. No momento em que Deus, o Ser perfeito e supremo,

osiciona-se em relação à humanidade, os intermediários divinos, oseitos, os inspirados de Deus, saem da terra para esclarecer, dirigir eovernar a espécie humana em seu nome.

ão se poderia supor que todos os homens são igualmente inspiradosor Deus? Neste caso não haveria, sem dúvida alguma, necessidade dtermediários. Mas esta suposição é impossível porque os fatos a

ontradizem sobremaneira. Seria preciso então atribuir à inspiração

vina todos os absurdos e erros que se manifestam, e todos os horrors torpezas, as covardias e as imbecilidades que se cometem no mundó haveria, pois, poucos homens divinamente inspirados, os grandesomens da história, os gênios virtuosos , como dizia o ilustre cidadão erofeta italiano Giuseppe Mazzini. Imediatamente inspirados pelo própeus e se apoiando sobre o consentimento universal expressado peloufrágio popular, Dio e Popolo , são eles que seriam chamados aovernar as sociedades humanas[6].

is-nos de novo sob o jugo da Igreja e do Estado. E verdade que nestaova organização, devida, como todas as organizações políticas antigagraça de Deus, é apoiada desta vez, pelo menos quanto à forma, àuisa de concessão necessária ao espírito moderno, e como nosreâmbulos dos decretos imperiais de Napoleão III, sobre a pretensaontade do POVO , a Igreja não se chamará mais Igreja, ela se chamascola. O que importa? Sobre os bancos desta Escola não estarãoentadas somente as crianças: haverá o eterno menor, o estudante paempre reconhecido como incapaz de se apresentar a seus exames, dcançar a ciência de seus mestres e de passar em sua disciplina: oovo. O Estado não se chamará mais monarquia, chamar-se-á repúblic

mas nem por isso deixará de ser Estado, isto é, uma tutela oficial eegularmente estabelecida por uma minoria de homens competentes,ênios, homens de talento ou de virtude , que vigiarão e dirigirão a

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onduta desta grande, incorrigível e terrível criança, o povo. Osrofessores da Escola e os funcionários do Estado chamar-se-ãoepublicanos; mas não deixarão de ser menos tutores, pastores, e o poermanecerá o que foi eternamente até agora: um rebanho. Os

osquiados que se cuidem, pois onde há rebanho há necessariamenteastores para tosquiá-lo e comê-lo.

O povo, neste sistema, será eterno estudante e pupilo. Apesar de suaoberania totalmente fictícia, ele continuará a servir de instrumento aensamentos e vontades, e consequentemente também a interesses qão serão os seus. Entre esta situação e o que chamamos de liberdadúnica verdadeira liberdade, há um abismo. Será sob novas formas, antiga opressão e a antiga escravidão; e onde há escravidão, há misérmbrutecimento, a verdadeira materialização da sociedade, tanto das

asses privilegiadas quanto das massas.Divinizando as coisas humanas, os idealistas conseguem sempre o 

iunfo de um materialismo brutal . E isto por uma razão muito simples:ste divino se evapora e sobe para sua pátria, o céu, e só o brutalermanece realmente sobre a terra.

erguntei um dia a Mazzini que medidas seriam tomadas para a

mancipação do povo tão logo sua república unitária triunfante sestabelecesse definitivamente. "A primeira medida, disse-me, será aundação de escolas para o povo." - E o que será ensinado ao povoestas escolas? "Os deveres do homem, o sacrifício e a abnegação." -

Mas onde ireis buscar um número suficiente de professores para ensinstas coisas que ninguém tem o direito nem o poder de ensinar, se nãoe dá o exemplo? O número dos homens que encontram no sacrifício ea dedicação uma satisfação suprema não é excessivamente restrito?

queles que se sacrificam ao serviço de uma grande idéia obedecem ama elevada paixão, e, satisfazendo esta paixão pessoal , fora da qual rópria vida perde qualquer valor a seus olhos, eles pensamormalmente em qualquer coisa que não seja erigir sua ação emoutrina, enquanto aqueles que fazem da ação uma doutrina esquecemeqüentemente de traduzi-la em ação, pela simples razão de que aoutrina mata a vida, mata a espontaneidade viva da ação. Os homens

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omo Mazzini, nos quais a doutrina e a ação formam uma admirávelnidade, são raras exceções. No cristianismo também houve grandesomens, santos homens, que realmente fizeram, ou que pelo menos sesforçaram apaixonadamente para fazer tudo o que diziam, e cujosorações, transbordando de amor, estavam cheios de desprezo pelosozos e pelos bens deste mundo. Mas a imensa maioria dos padres

atólicos e protestantes que, por profissão, pregaram e pregam a doutra castidade, da abstinência e da renúncia, desmentem sua doutrinatravés de seu exemplo. Não é em vão, é em conseqüência de umaxperiência de vários séculos que se formaram, entre os povos de todos países, estes ditados: "Libertino como um padre; comilão como umadre; ambicioso como um padre; ávido, interessado e cúpido como umadre". Está constatado que os professores das virtudes cristãs,onsagrados pela Igreja, os padres, em sua imensa maioria , fizeram

xatamente o contrário daquilo que eles pregaram. Esta própria maioriuniversalidade deste fato, provam que não se deve atribuir a culpasso aos indivíduos, mas sim à posição social, impossível e contraditóm si mesma, no qual estes indivíduos estão colocados.

á na posição do padre cristão uma dupla contradição. Inicialmente a doutrina de abstinência e de renúncia às tendências e às necessidadesositivas da natureza humana, tendências e necessidades que, emguns casos individuais, sempre muito raros, podem ser continuamentfastadas, reprimidas e mesmo completamente eliminadas pela influênonstante de alguma poderosa paixão intelectual e moral, que, em cert

momentos de exaltação coletiva, podem ser esquecidas eegligenciadas, por algum tempo, por uma grande quantidade de homeo mesmo tempo; mas que são tão profundamente inerentes à nossaatureza que acabam sempre por retomar seus direitos, de forma que,

uando não são satisfeitas de maneira regular e normal, são finalmenteubstituídas por satisfações daninhas e monstruosas. E uma lei natura, por conseqüência, fatal, irresistível, sob a ação funesta da qual caemevitavelmente todos os padres cristãos e especialmente os da Igreja

atólica romana.

Mas há uma outra contradição comum a uns e a outros. Esta contradiçstá ligada ao titulo e à própria posição do senhor. Um senhor que

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omanda, oprime e explora, é um personagem muito lógico eompletamente natural. Mas um senhor que se sacrifica àqueles que lhão subordinados pelo seu privilégio divino ou humano é um serontraditório e completamente impossível. E a própria constituição dapocrisia, tão bem personificada pelo papa que, ainda que se dizendo ltimo servidor dos servidores de Deus , e por sinal, seguindo o exempl

o Cristo, lava uma vez por ano os pés de doze mendigos de Roma,roclama-se ao mesmo tempo vigário de Deus, senhor absoluto efalível do mundo. E preciso que eu lembre que os padres de todas as

grejas, longe de se sacrificarem pelos rebanhos confiados a seusuidados, sempre os sacrificaram, exploraram e mantiveram em estadoe rebanho, em parte para satisfazer suas próprias paixões pessoais, earte para servir à onipotência da Igreja? As mesmas condições, as

mesmas causas produzem sempre os mesmos efeitos. Isso acontece

om os professores da Escola moderna, divinamente inspirados eomeados pelo Estado. Eles se tornarão, necessariamente, uns sem oaber, os outros com pleno conhecimento de causa, os mestres daoutrina do sacrifício popular para o poderio do Estado, em proveito daasses privilegiadas.

erá preciso então eliminar da sociedade todo o ensino e abolir todas ascolas? Longe disso. É necessário distribuir a mancheias a instrução eio das massas e transformar todas as Igrejas, todos estes templosedicados à glória de Deus e à escravização dos homens, em escolas mancipação humana. Mas, inicialmente, esclareçamos que as escolaropriamente ditas, numa sociedade normal, fundada sobre a igualdadobre o respeito da liberdade humana, só deverão existir para asrianças, não para os adultos, para elas se tornarem escolas demancipação e não de servilismo, será preciso eliminar, antes de tudo

sta ficção de Deus, o escravizador eterno e absoluto. Será necessárioundar toda a educação das crianças e sua instrução sobre oesenvolvimento científico da razão, não sobre o da fé; sobre oesenvolvimento da dignidade e da independência pessoais, não sobrea piedade e da obediência; sobre o culto da verdade e da justiça e,ntes de tudo, sobre o respeito humano. que deve substituir, em tudo em todos os lugares, o culto divino. O princípio da autoridade naducação das crianças constitui o ponto de partida natural: ele é legítim

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ecessário, quando é aplicado às crianças na primeira infância, quandoua inteligência ainda não se desenvolveu abertamente. Mas como oesenvolvimento de todas as coisas, e por conseqüência da educação

mplica a negação sucessiva do ponto de partida, este princípio devenfraquecer-se à medida que avançam a educação e a instrução, paraar lugar à liberdade ascendente.

oda educação racional nada mais é, no fundo, do que a imolaçãorogressiva da autoridade em proveito da liberdade, onde esta educaç

em como objetivo final formar homens livres, cheios de respeito e demor pela liberdade alheia. Assim, o primeiro dia da vida escolar, se ascola aceita as crianças na primeira infância, quando elas mal começbalbuciar algumas palavras, deve ser o de maior autoridade e de umusência quase completa de liberdade; mas seu último dia deve ser ó d

maior liberdade e de abolição absoluta de qualquer vestígio do principinimal ou divino da autoridade.

O princípio de autoridade, alicado aos homens que ultrapassaram outingiram a maioridade, torna-se uma monstruosidade, uma negaçãoagrante da humanidade, uma fonte de escravidão e de depravaçãotelectual e moral. Infelizmente, os governos paternalistas deixaram as

massas populares se estagnarem numa tão profunda ignorância que s

ecessário fundar escolas não somente para as crianças do povo, masambém para o próprio povo Destas escolas deverão ser absolutamentiminadas as menores aplicações ou manifestações do princípio deutoridade. Não serão mais escolas; serão academias populares, nasuais não se poderá mais tratar nem de estudantes, nem de mestres,nde o povo virá livremente ter, se assim achar necessário, umnsinamento livre, nas quais, rico de sua experiência, ele poderá. ensinor sua vez muitas coisas aos professores que lhe trarão conhecimentue ele não tem. Será pois um ensinamento mútuo, um ato deaternidade intelectual entre a juventude instruída e o povo.

verdadeira escola para o povo e para todos os homens feitos é a vidúnica grande todo-poderosa autoridade natural e racional,multaneamente, a única que poderemos respeitar, será a do espíritooletivo e público de uma sociedade fundada sobre o respeito mútuo d

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odos os seus membros. Sim, eis uma autoridade que não ébsolutamente divina, totalmente humana, mas diante da qual nosclinaremos de coração, certos de que, longe de subjugá-los, elamancipará os homens. Ela será mil vezes mais poderosa, estejamertos, do que todas as vossas autoridades divinas, teológicas,

metafísicas, políticas e jurídicas, instituídas pela Igreja e pelo Estado;

mais poderosa que vossos códigos criminais, vossos carcereiros eossos verdugos.

força do sentimento coletivo ou do espírito público já é muito séria hoOs homens com maior tendência a cometer crimes raramente ousam

esafiá-la, enfrentá-la abertamente. Eles procurarão enganá-la, masvitarão ofendê-la, a menos que se sintam apoiados por uma minoriaualquer. Nenhum homem, por mais possante que se imagine, jamais

erá força para suportar o desprezo unânime da sociedade, ninguémoderia viver sem sentir-se apoiado pelo consentimento e pela estima, menos por uma certa parte desta sociedade. E preciso que um homemeja levado por uma imensa e bem sincera convicção, para que encontoragem de opinar e de marchar contra todos, e nunca um homemgoísta, depravado e covarde terá esta coragem.

ada prova melhor do que este fato a solidariedade natural e fatal que

ne todos os homens. Cada um de nós pode constatar esta lei, todos oas, sobre si mesmo e sobre todos os homens que ele conhece. Mas, sta força social existe, por que ela não foi suficiente, até hoje, para

moralizar, humanizar os homens? Simplesmente porque, até o presentssa força não foi, ela própria, humanizada; não foi humanizada porquda social, da qual ela é sempre a fiel expressão, está fundada, como abe, sobre o culto divino, não sobre o respeito humano; sobre autoridade, não sobre a liberdade; sobre o privilégio, não sobre aualdade; sobre a exploração, não sobre a fraternidade dos homens;

obre a iniqüidade e a mentira, não sobre a justiça e a verdade. Poronseqüência, sua ação real, sempre em contradição com as teoriasumanitárias que ela professa, exerceu constantemente uma influência

unesta e depravadora. Ela não oprime pelos vícios e crimes: ela os criua autoridade é consequentemente uma autoridade divina,nti-humana, sua influência é malfazeja e funesta. Quereis torná-la

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enfazeja e humana? Fazei a revolução social. Fazei com que todas aecessidades se tornem realmente solidárias, que os interesses matersociais de cada um se tornem iguais aos deveres humanos de cadam. E, para isso, só há um meio: destruí todas as instituições daesigualdade; estabelecei a igualdade econômica e social de todos, e,obre esta base, elevar-se-á a liberdade, a moralidade, a humanidade

olidária de todos.* * *

im, o idealismo, em teoria, tem por conseqüência necessária omaterialismo mais brutal na prática; não, sem dúvida, entre aqueles qu

regam de boa fé - o resultado habitual, para estes, é de ver todos oseus esforços atingidos pela esterilidade - mas entre aqueles que se

sforçam em realizar seus preceitos na vida, em meio a toda aociedade, enquanto ela se deixar dominar pelas doutrinas idealistas.

ara demonstrar este fato geral, que pode parecer estranho à primeirasta, mas que se explica naturalmente, quando refletimos um pouco

mais, não faltam as provas históricas.

omparai as duas últimas civilizações do mundo antigo: a civilizaçãorega e a civilização romana. Qual delas é a mais materialista, a maisatural em seu ponto de partida, e a mais humanamente ideal em seusesultados? Sem dúvida, a civilização grega. Qual delas é, ao contrário

mais abstratamente ideal em seu ponto de partida, sacrificando aberdade material do homem à liberdade ideal do cidadão, representadela abstração do direito jurídico, e o desenvolvimento natural daociedade humana à abstração do Estado, e qual delas se tornou,odavia, a mais brutal em suas conseqüências? A civilização romana,

ertamente. E verdade que a civilização grega, como todas asvilizações antigas, inclusive a de Roma, foi exclusivamente nacional, eve por base a escravidão. Mas, apesar destes dois imensos defeitos,rimeira nem por isso deixou de conceber e realizar a idéia daumanidade; ela enobreceu e realmente idealizou a vida dos homens; ansformou os rebanhos humanos em livres associações de homensvres; ela criou, pela liberdade, as ciências, as artes, uma poesia, umaosofia imortal, e as primeiras noções do respeito humano. Com a

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berdade política e social ela criou o livre pensamento.

o fim da Idade Média, na época da Renascença, bastou que os gregomigrados introduzissem alguns desses livros imortais na Itália para quvida, a liberdade, o pensamento, a humanidade, enterrados no somb

alabouço do catolicismo, fossem ressuscitados. A emancipação

umana, eis o nome da civilização grega. E o nome da civilizaçãoomana? E a conquista, com todas as suas conseqüências brutais. Suatima palavra? A onipotência dos Césares. E o envilecimento e ascravidão das nações e dos homens.

inda hoje, o que é que mata, o que é que esmaga brutalmente,materialmente, em todos os países da Europa, a liberdade e a

umanidade? E o triunfo do princípio cesáreo ou romano.

ompararei agora duas civilizações modernas: a civilização italiana e avilização alemã. A primeira representa, sem dúvida, em suaaracterística geral, o materialismo; a segunda representa, ao contrárioudo o que há de mais abstrato, de mais puro e de mais transcendenteue concerne ao idealismo. Vejamos quais são os frutos práticos de umda outra.

Itália já prestou imensos serviços à causa da emancipação humana.la foi a primeira que ressuscitou e que aplicou amplamente o princípioa liberdade na Europa, que devolveu à humanidade seus títulos deobreza: a indústria, o comércio, a poesia, as artes, as ciências positivao livre pensamento. Esmagada depois de três séculos de despotismo

mperial e papal, arrastada na lama por sua burguesia governante, elaeaparece hoje, é verdade, bem abatida em comparação ao que foi, e,ntretanto, quanto ela difere da Alemanha! Na Itália, apesar desta

ecadência, passageira, esperemo-lo, pode-se viver e respirarumanamente, cercado de um povo que parece ter nascido para aberdade. A Itália, mesmo burguesa, pode vos mostrar com orgulhoomens como Mazzini e como Garibaldi.

a Alemanha, respira-se a atmosfera de uma imensa escravidão políticsocial, filosoficamente explicada e aceita por um grande povo, com u

esignação e uma boa vontade refletidas. Seus heróis - falo sempre da

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lemanha atual, não da Alemanha do futuro, da Alemanha nobiliária,urocrática, política e burguesa, não da Alemanha proletária - são

otalmente o oposto de Mazzini e de Garibaldi: são, hoje, Guilherme 1, eroz e ingênuo representante do Deus protestante, são os Srs. BismaVon Moltke, os generais Manteuffel e Werler. Em todas as suas

elações internacionais, a Alemanha, desde que existe, foi lenta e

stematicamente invasora, conquistadora, sempre pronta a estenderobre os povos vizinhos seu próprio servilismo voluntário; e desde quea se constituiu em potência unitária, ela se tornou uma ameaça, umerigo para a liberdade de toda a Europa. Hoje, a Alemanha é oervilismo brutal e triunfante.

ara mostrar como o idealismo teórico se transforma incessante eatalmente em materialismo prático, basta citar o exemplo de todas as

grejas cristãs e, naturalmente, antes de tudo, o da Igreja apostólica eomana. No sentido ideal, o que há de mais sublime, de maisesinteressado, de mais desprendido em todos os interesses desta tero que a doutrina do Cristo pregada por esta Igreja? E o que há de marutalmente materialista que a prática constante desta mesma Igreja,esde o século VIII, quando começou a se constituir como poder? Qua

oi e qual é ainda o objeto principal de todos os seus litígios contra osoberanos da Europa? Seus bens temporais, seus ganhos inicialmentem seguida seu poder temporal, seus privilégios políticos.

preciso fazer-lhe esta justiça, pois ela foi a primeira a descobrir, nastória moderna, esta verdade incontestável, mas muito pouco cristã,ue a riqueza e o poder, a exploração econômica e a opressão políticaas massas são os dois termos inseparáveis do reino do idealismo diviobre a terra: a riqueza consolidando e aumentando o poder, o poderescobrindo e criando sempre novas fontes de riqueza, e ambosssegurando, melhor do que o martírio e a fé dos apóstolos, melhor doue a graça divina, o sucesso da propaganda cristã. E uma verdadestórica, e as igrejas, ou melhor, as seitas protestantes também não aesconhecem. Falo naturalmente das igrejas independentes da

nglaterra, da América e da Suíça, não das igrejas servis da Alemanhastas não têm nenhuma iniciativa própria; elas fazem aquilo que seusenhores, seus soberanos temporais, que são ao mesmo tempo seus

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hefes espirituais, lhes ordenam fazer. Sabe-se que a propagandarotestante, a da Inglaterra e a da América sobretudo, se liga de uma

maneira muito estreita à propaganda dos interesses materiais eomerciais destas duas grandes nações; sabe-se também que estatima propaganda não tem absolutamente por objeto o enriquecimentopropriedade material dos países nos quais ela penetra em companhia

a palavra de Deus, mas sim a exploração destes países, à vista donriquecimento e da prosperidade material de certas classes, que, emeu próprio país, só visam a exploração e a pilhagem.

uma palavra, não é nada difícil provar, com a história na mão, que agreja, que todas as Igrejas, cristãs e não cristãs, ao lado de suaropaganda espiritualista, provavelmente para acelerar e consolidar seucesso, jamais negligenciaram de organizar grandes companhias par

xploração econômica das massas, sob a proteção e a bênção direta especial de uma divindade qualquer; que todos os Estados que, em surigem, como se sabe, nada mais foram, com todas as suas instituiçõeolíticas e jurídicas e suas classes dominantes e privilegiadas, senãoucursais temporais destas diversas Igrejas, só tiveram igualmente porbjeto principal esta mesma exploração em proveito das minorias laicadiretamente legitimadas pela Igreja; enfim, que em geral a ação do boeus e de todas as fantasias divinas sobre a terra finalmente resultou,empre e em todos os lugares, na fundação do materialismo próspero equeno número sobre o idealismo fanático e constantemente famintoas massas.

O que vemos hoje é uma nova prova disso. A exceção desses grandesorações e desses grandes espíritos enganados que citei mais acima,uem são hoje os defensores mais obstinados do idealismo? Inicialmeão todas as cortes soberanas. Na França, foram Napoleão III e suasposa, Madame Eugénie; são todos os seus antigos ministros,ortesãos e ex-marechais, desde Rouher e Bazaine até Fleury e Piétri;ão os homens e as mulheres do mundo oficial imperial, que tão bemealizaram e salvaram a França. São seus jornalistas e seus sábios: oassagnac, os Girardin, os Duvernois, os Veuillot, os Leverrier, osumas. . . E enfim a negra falange dos jesuítas e das jesuítas de todoss tipos de vestido; é a alta e média burguesia da França. São os

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outrinários liberais e os liberais sem doutrina: os Guizot, os Thiers, osules Favre, os Pelletan e os Jules Simon, todos os defensoresguerridos da exploração burguesa. Na Prússia, na Alemanha, éuilherme 1, o rei demonstrador atual do bom Deus sobre a terra; são

odos os seus generais, todos os seus oficiais pomeranianos e outros,odo o seu exército que, forte em sua fé religiosa, acaba de conquistar

rança da maneira ideal que se sabe. Na Rússia, é o czar e toda a suaorte; são os Muravieff e os Berg, todos os degoladores e os religiososonversores da Polônia. Em todos os lugares, numa palavra, o idealismeligioso filosófico, um destes qualificativos nada mais sendo do que aadução mais ou menos livre do outro, serve hoje de bandeira à forçaanguinária e brutal, à exploração material descarada; enquanto, aoontrário, a bandeira do materialismo teórico, a bandeira vermelha daualdade econômica e da justiça social, é agitada pelo idealismo prátic

as massas oprimidas e famintas, tendendo a realizar a liberdade maiodireito humano de cada um na fraternidade de todos os homens sobr

erra.

Quem são os verdadeiros idealistas, não - os idealistas da abstração,mas da vida; não do céu, mas da terra; e quem são os materialistas?

* * *

evidente que o idealismo teórico ou divino tem como condiçãossencial o sacrifício da lógica, da razão humana, a renúncia à ciênciaê-se, por outro lado, que defendendo as doutrinas ideais, é-se

orçosamente levado ao partido dos opressores e dos exploradores damassas populares. Eis duas grandes razões que, segundo parece,

astariam para afastar do idealismo todo grande espírito, todo grandeoração. Como é possível que nossos ilustres idealistas contemporâne

os quais, certamente, não faltam nem o espírito, nem o coração, nemoa vontade, e que devotaram toda sua existência ao serviço daumanidade, como é possível que eles se obstinem em permanecer ens representantes de uma doutrina doravante condenada e desonrada

preciso que eles sejam levados a isso por uma razão muito forte. Nãode ser nem a lógica nem a ciência, visto que a lógica e a ciênciaronunciaram seu veredicto contra a doutrina idealista. Não podem ser

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ambém interesses pessoais, pois estes homens estão infinitamenterguidos acima de tudo o que carrega este nome. Só pode ser então u

orte razão moral. Qual? Só pode haver uma. Esses homens ilustresensam, sem dúvida, que as teorias ou as crenças ideais sãossencialmente necessárias à dignidade e à grandeza moral do homemque as teorias materialistas, ao contrário, rebaixam-no ao nível dos

nimais.E se o oposto fosse verdadeiro?

odo desenvolvimento, já disse, implica a negação do ponto de partidaase, ou o ponto de partida, segundo a escola materialista, sendo

material, a negação deve ser necessariamente ideal. Partindo daotalidade do mundo real, ou daquilo que se chama abstratamente de

ostume, ela chega logicamente à idealização real, isto é, àumanização, à emancipação plena e inteira da sociedade. Todavia, eela mesma razão, sendo o ideal a base e o ponto de partida da escolaealista, ela chega forçosamente à materialização da sociedade, àrganização de um despotismo brutal e de uma exploração iníqua enóbil, sob a forma da Igreja e do Estado. O desenvolvimento históricoo homem, segundo a escola materialista, é uma ascensão progressivo sistema idealista ele só pode ser uma queda contínua.

Qualquer que seja a questão humana que se queira considerar,ncontra-se sempre esta mesma contradição essencial entre as duasscolas. Assim, como já fiz observar, o materialismo parte da animalidaara constituir a humanidade; o idealismo parte da divindade paraonstituir a escravidão e condenar as massas a uma animalidade semaída. O materialismo nega o livre-arbítrio e resulta na constituição daberdade; o idealismo, em nome da dignidade humana, proclama o

vre-arbítrio, e, sobre as ruínas da liberdade, funda a autoridade. Omaterialismo rejeita o princípio de autoridade porque ele o considera, cazão, como o corolário da animalidade, e que, ao contrário, o triunfo dumanidade, objetivo e sentido principal da história, só é realizável pelberdade. Numa palavra, vós encontrareis sempre os idealistas emagrante delito de materialismo prático, enquanto vereis os materialistauscarem e realizarem as aspirações, os pensamentos mais amplame

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eais.

história, no sistema dos idealistas, como já disse, não pode ser senãma queda contínua. Eles começam por uma queda terrível da qual

amais se levantam: pelo salto mortale das regiões sublimes da idéiaura, absoluta, à matéria. E em que matéria! Não nesta matéria

ternamente ativa e móvel, cheia de propriedades e de forças, de vida e inteligência, tal como ela se apresenta a nós, no mundo real; mas nmatéria abstrata, empobrecida e reduzida à miséria absoluta, tal como oncebem os teólogos e os metafísicos, que lhe roubaram tudo para daseu imperador, a seu Deus; nesta matéria que, privada de qualquerção e de qualquer movimento próprios, só representa, em oposição àéia divina, a estupidez, a impenetrabilidade, a inércia e a imobilidadebsolutas.

queda é tão terrível que a divindade, a pessoa ou a idéia divina sevilta, perde sua consciência, perde a consciência de si mesma e nunc

mais se reencontra. E nesta situação desesperada ela é ainda forçada azer milagres!

to porque, do momento em que a matéria é inerte, todo movimento qe produz no mundo, mesmo o mais material, é um milagre, outra coisa

ão pode ser senão o efeito de uma intervenção providencial, da ação eus sobre a matéria. E eis que esta pobre divindade, quase anulada pua queda, permanece alguns milhares de séculos neste sono, emeguida desperta lentamente, esforçando-se em vão para recuperarguma vaga lembrança dela mesma, e cada movimento que faz comsta finalidade, na matéria, torna-se uma criação, uma formação nova,m novo milagre. Desta maneira ela ultrapassa todos os níveis da

materialidade e da bestialidade; inicialmente gás, corpo químico simple

u composto, mineral, ela se espalha em seguida sobre a terra comorganização vegetal e animal, depois se concentra no homem. Aqui, elarece haver se reencontrado, pois ela acende no ser humano umahama angélica, uma parcela de seu próprio ser divino, a alma imortal.

omo ela pode conseguir alojar uma coisa absolutamente imaterial nuoisa absolutamente material; como o corpo pode conter, encerrar,

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mitar, paralisar o espírito puro? Eis mais uma destas questões queomente a fé, esta afirmação apaixonada e estúpida do absurdo, podeesolver. E o maior dos milagres. Aqui, nada temos a fazer senãoonstatar os efeitos, as conseqüências práticas deste milagre.

pós milhares de séculos de vãos esforços para retornar a ela mesma

ivindade, perdida e espalhada na matéria que ela anima e que põe emmovimento, encontra um ponto de apoio, uma espécie de local para seróprio recolhimento. E o homem, é sua alma imortal aprisionadangularmente num corpo mortal. Mas cada homem, consideradodividualmente, é infinitamente restrito, muito pequeno para englobar a

mensidão divina; ele só pode conter uma pequena parcela, imortal comTodo, mas infinitamente menor que o Todo. Resulta disso que o Servino, o Ser absolutamente imaterial, o Espírito, é divisível como a

matéria. Eis ainda um mistério cuja solução é preciso deixar à fé.e Deus, por inteiro, pudesse se alojar em cada homem, então cadaomem seria Deus. Teríamos uma grande quantidade de Deuses, cadm se achando limitado pelos outros, mas nem por isso menos infinito,ontradição que implicaria necessariamente a destruição mútua dosomens, a impossibilidade de que existisse mais do que um. Quanto àarcelas, é outra coisa; nada de mais racional, com efeito, que uma

arcela seja limitada por outra, e que ela seja menor do que o Todo. Aqe apresenta outra contradição. Ser maior e menor são dois atributos dmatéria, não do espírito, tal como o compreendem os idealistas. Segun

s materialistas, é verdade, o espírito outra coisa não é senão ouncionamento do organismo totalmente material do homem, e arandeza ou a pequenez do espírito dependem da maior ou menorerfeição material do organismo humano. Mas estes mesmos atributosmitação e de grandeza relativas não podem ser atribuídos ao espírito,omo o compreendem os idealistas, ao espírito absolutamente imateriao espírito existindo fora de qualquer matéria. Lá não pode haver nem

maior, nem menor, nem qualquer limite entre os espíritos, pois só há unico espírito: Deus. Se acrescentarmos que as parcelas infinitamenteequenas e limitadas que constituem as almas humanas são ao mesm

empo imortais, evidenciar-se-á o cúmulo da contradição. Mas é umauestão de fé. Deixemos isto de lado.

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is pois a Divindade destroçada e alojada por infinitas pequenas partesuma imensa quantidade de seres de todos os sexos, de todas asades, de todas as raças e de todas as cores. Eis aí uma situaçãoxcessivamente incômoda e infeliz, pois as parcelas divinaseconhecem-se tão pouco no início de sua existência humana, queomeçam por se entredevorar. Todavia, no meio desse estado dearbárie e de brutalidade totalmente animal, estas parcelas divinas, asmas humanas, conservam como que uma vaga lembrança de suavindade primitiva, e são invencivelmente arrastadas rumo a seu Todoas se procuram, elas o procuram. E a própria Divindade, espalhada eerdida no mundo material, que se procura nos homens, e está de tal

orma embrutecida por esta multidão de prisões humanas, nas quais secha espalhada, que, ao se procurar, comete loucuras sobre loucuras.

omeçando pelo fetichismo, ela se procura e adora a si mesma, orauma pedra, ora num pedaço de pau, ora num esfregão. E até mesmo

muito provável que jamais tivesse saído do esfregão se a outra divindaue não se deixou diminuir na matéria, e se conservou no estado despírito puro, nas alturas sublimes do ideal absoluto, ou nas regiõeselestes, não tivesse tido piedade dela.

is um novo mistério. E o da Divindade que se cinde em duas metadesmas igualmente infinitas todas as duas, e das quais uma - Deus pai - sonserva nas puras regiões imateriais; a outra - Deus filho - se deixanfraquecer na matéria. Nós iremos ver, daqui a pouco,stabelecerem-se relações contínuas de cima para baixo e de baixo pama entre estas duas Divindades, separadas uma da outra; e estas

elações, consideradas como um único ato eterno e constante,onstituirão o Espírito Santo. Tal. é, em seu verdadeiro sentido teológic

metafísico, o grande, o terrível mistério da Trindade cristã.Mas deixemos, rapidamente, estas alturas e vejamos o que se passaobre a terra.

eus pai, vendo, do alto de seu esplendor eterno, que o pobre Deus filumilhado, atordoado por sua queda, mergulhou e perdeu-se de tal fora matéria, que, preso ao estado humano, não consegue se reencontr

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ecide 5& corrê-lo. Entre esta imensa quantidade de parcelasmultaneamente imortais, divinas e infinitamente pequenas, nas quaiseus filho disseminou-se a ponto de não poder se reconhecer, Deus pscolhe aquelas que mais lhe aprazem; ele toma seus inspirados, seusrofetas, seus gênios virtuosos, OS grandes benfeitores e legisladoresumanidade: Zoroastro, Buda, Moisés, Confúcio, Licurgo, Sólon,

ócrates, o divino Platão, e sobretudo Jesus Cristo, a completaealização de Deus filho, enfim recolhido e concentrado numa pessoaumana; todos os apóstolos, São Pedro, São Paulo e São João,onstantino, o Grande, Maomé, depois Gregório VII, Carlos Magno,ante, segundo uns, Lutero também, Voltaire e Rousseau, Ropespierranton, e muitos outros grandes e santos personagens, dos quais é

mpossível recapitular todos os nomes, mas entre os quais, como russoeço para não se esquecerem de São Nicolau.

* * *

is que chegamos à manifestação de Deus sobre a terra. Mas tão logoeus aparece, o homem se aniquila. Dir-se-á que não se aniquila vistoer ele próprio uma parcela de Deus. Perdão! Admito que a parcela dem todo determinado, limitado, por menor que seja esta parte, seja umuantidade, uma grandeza positiva. Mas uma parcela do infinitamente

rande, comparada com ele, é infinitamente pequena. Multiplicai bilhõee bilhões por bilhões de bilhões, seu produto, em comparação aofinitamente grande, será infinitamente pequeno, e o infinitamenteequeno é igual a zero. Deus é tudo, por conseguinte o homem e todo

mundo real com ele, o universo, nada são. Vós não escapareis disto.

eus aparece, o homem se aniquila; e quanto maior se torna aivindade, mais a humanidade se torna miserável. Esta é a história de

odas as religiões; este é o efeito de todas as inspirações e de todas asgislações divinas. Na história, o nome de Deus é a terrível dava com ual os homens diversamente inspirados, os grandes gênios, abateramberdade, a dignidade, a razão e a prosperidade dos homens.

ivemos inicialmente a queda de Deus. Temos agora uma queda que nteressa mais, a do homem, causada pelo aparecimento da

manifestação de Deus sobre a terra.

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ede em que erro profundo se encontram nossos caros e ilustresealistas. Ao nos falarem de Deus, eles crêem, eles querem nos educos emancipar, nos enobrecer e, ao contrário, eles nos esmagam e noviltam. Com o nome de Deus, eles imaginam poder estabelecer aaternidade entre os homens, e, ao contrário, criam o orgulho, oesprezo; semeiam a discórdia, o ódio, a guerra; fundam a escravidão

to porque, com Deus, vêm os diferentes graus de inspiração divina; aumanidade se divide em homens muito inspirados, menos inspirados,ão inspirados. Todos são igualmente nulos diante de Deus, é verdade

mas comparados uns aos outros, uns são maiores do que os outros; nãomente pelo fato, o que não seria nada, visto que uma desigualdade dato se perde por si mesma na coletividade, quando ela não se podegarrar a nenhuma ficção ou instituição legal; mas pelo direito divino daspiração: o que constitui logo em seguida uma desigualdade fixa,

onstante, petrificada. Os mais inspirados devem ser escutados ebedecidos pelos menos inspirados, pelos não inspirados. Eis o princípa autoridade bem estabelecido, e com ele as duas instituições

undamentais da escravidao : a Igreja e o Estado.

* * *

e todos os despotismos, o dos doutrinadores ou dos inspirados

eligiosos é o pior. Eles são tão ciumentos da glória de seu Deus e doiunfo de sua idéia que não lhes resta mais coração, nem pela liberdadem pela dignidade, nem mesmo pelos sofrimentos dos homens vivos,omens reais. O zelo divino, a preocupação com a idéia acabam porssecar, nas almas mais delicadas, nos corações mais compassivos,

ontes do amor humano. Considerando tudo o que é, tudo o que se fazmundo do ponto de vista da eternidade ou da idéia abstrata, eles tratamom desdém as coisas passageiras; mas toda a vida dos homens reaisos homens em carne e osso, só é composta de coisas passageiras; eróprios nada mais são do que seres que passam, e que, uma vezassados, são substituídos por outros, também passageiros, mas queão retornam jamais. O que há de permanente ou de relativamenteterno é a humanidade, que se desenvolve constantemente, de geraçãm geração. Digo relativamente eterno porque, uma vez destruído nosaneta, e ele' não pode deixar de perecer cedo ou tarde, pois tudo que

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omeça tem necessariamente um fim, uma vez nosso planetaecomposto, para servir sem dúvida alguma de elemento a alguma nov

ormação no sistema do universo, o único realmente eterno, quem podaber o que acontecerá com todo o nosso desenvolvimento humano?odavia, como o momento desta dissolução se encontra imensamentefastado de nós podemos considerar, em relação à vida humana tão

urta, a humanidade eterna. Mas esse fato de a humanidade serrogressiva só é real e vivo por suas manifestações em temposeterminados, em lugares determinados, em homens realmente vivos, ão em sua idéia geral.

* * *

idéia geral é sempre uma abstração e por isso mesmo, de alguma

orma, uma negação da vida real. A ciência só pode compreender eenominar os fatos reais em seu sentido geral, em suas relações, emuas leis; numa palavra, o que é permanente em suas informaçõesontínuas, mas jamais seu lado material, individual, por assim dizer,alpitante de realidade e de vida, e por isso mesmo, fugitivo eapreensível. A ciência compreende o pensamento da realidade, não

ealidade em si mesma; o pensamento da vida, não a vida. Eis seu limúnico limite verdadeiramente intransponível para ela, porque ela está

undada sobre a própria natureza do pensamento, que é o único órgãoência.

obre esta natureza se fundam os direitos incontestáveis e a grandemissão da ciência, mas também sua impotência vital e mesmo sua açãmalfazeja, todas as vezes que, por seus representantes oficiais,

omeados, ela se arroga o direito de governar a vida. A missão daência é, constatar as relações gerais das coisas passageiras e reais:

econhecendo as leis gerais que são inerentes ao desenvolvimento dosenômenos do mundo físico e do mundo social, ela assenta, por assimzer, as balizas imutáveis da marcha progressiva da humanidade,dicando as condições gerais, cuja observação rigorosa e necessária

uja ignorância ou esquecimento será sempre fatal. Numa palavra, aência é a bússola da vida; mas não é a vida. A ciência é imutável,

mpessoal, geral, abstrata, insensível, como as leis das quais ela nada

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mais é do que a reprodução ideal, refletida ou mental, isto é, cerebralpara nos lembrar de que a ciência nada mais é do que um produto

material de um órgão material, o cérebro ). A vida é fugidia e passageiramas também palpitante de realidade e individualidade, de sensibilidadeofrimentos, alegrias, aspirações, necessidades e paixões. É somente ue, espontaneamente, cria as coisas e os seres reais. A ciência nada

ria, ela constata e reconhece somente as criações da vida. E todas asezes que os homens de ciência, saindo de seu mundo abstrato,nvolvem-se com a criação viva, no mundo real, tudo o que eles propõu tudo o que eles criam é pobre, ridiculamente abstrato, privado deangue e vida, natimorto, igual ao homunculus criado por Wagner, oscípulo pedante do imortal Dr. Fausto. Disso resulta que a ciência temor missão única iluminar a vida, e não governá-la.

O governo da ciência e dos homens de ciência, ainda que fossemositivistas, discípulos de Auguste Comte, ou ainda discípulos da escooutrinária do comunismo alemão, não poderia ser outra coisa senão uoverno impotente, ridículo, desumano, cruel, opressivo, explorador,

malfazejo. Pode-se dizer dos homens de ciência, como tais , o que digoos teólogos e metafísicos: eles não têm nem sentido, nem coração pas seres individuais e vivos. Não se pode sequer fazer-lhes uma censuois é a conseqüência natural de sua profissão. Enquanto homens deência, eles só podem se interessar pelas generalidades, pelas leisbsolutas, e não a levar em conta outra coisa.

individualidade real e viva só é perceptível para uma outradividualidade viva, não para uma individualidade pensante, não para omem que por uma série de abstrações põe-se fora e acima do conta

mediato da vida; ela pode existir para eles somente como um exemplamais ou menos perfeito da espécie, isto é, uma abstração determinada

e é um coelho, por exemplo, quanto mais bonito for o espécimen, macientista o dissecará com felicidade, na esperança de poder fazer saiesta própria destruição a natureza geral, a lei da espécie.

e ninguém se opusesse a isso, não existiria, mesmo em nossos dias,m número de fanáticos capazes de fazer as mesmas experiências sobhomem? E se, todavia, os cientistas naturalistas não dissecam o

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omem vivo, não é a ciência, são os protestos todo-poderosos da vidaue os fizeram parar. Ainda que eles passem estudando três quartos dua existência, e que, na atual organização, formem um tipo de mundoarte - o que prejudica simultaneamente a saúde de seu coração e a deu espírito - eles não são exclusivamente homens da ciência, mas sãoambém, mais ou menos, homens da vida.

odavia, não se deve confiar nisso. Se se pode estar mais ou menoseguro de que um cientista não ousaria tratar um homem, hoje, comoata um coelho, resta sempre a temer que o corpo de cientistas submes homens vivos a experiências científicas, sem dúvida interessantes,

mas que seriam não menos desagradáveis para suas vítimas. Se nãoodem fazer experiências com o corpo dos indivíduos, eles não pedirãada mais do que fazê-las com o corpo social, e eis o que é precioso

bsolutamente impedir.m sua organização atual, monopolizando a ciência e permanecendo,ssim, fora da vida social, os cientistas formam uma casta à parte,ferecendo muita analogia com a casta dos padres. A abstração científseu Deus, as individualidades são suas vítimas e eles são seus

acrificadores nomeados.

ciência não pode sair da esfera das abstrações. Em relação a isso, emuito inferior à arte, que, ela também, está ligada a tipos e situaçõeserais, mas que os encarna por um artifício que lhe é próprio. Semúvida, essas formas da arte não são a vida, mas não deixam derovocar em nossa imaginação a lembrança e o sentimento da vida; arte individualiza, sob uma certa forma, os tipos e as situações queoncebe; por meio de individualidades sem carne e osso, e,onsequentemente, permanentes e imortais, que tem o poder de criar,

os faz lembrar das individualidades vivas, reais, que aparecem eesaparecem sob nossos olhos. A arte é, pois, sob uma certa forma, oetorno da abstração à vida. A ciência é, ao contrário, a imolaçãoerpétua da vida, fugitiva, passageira, mas real, sob o altar das eternasbstrações.

ciência é tão pouco capaz de compreender a individualidade de umomem quanto a de um coelho. Não é que ela ignore o princípio da

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dividualidade; ela a concebe perfeitamente como principio, mas nãoomo fato. Ela sabe muito bem que todas as espécies animais, inclusivespécie humana, só possuem existência real em um número indefinide indivíduos, nascendo e morrendo para dar lugar a novos indivíduosualmente fugidios. Ela sabe que, elevando-se das espécies animais àspécies superiores, o princípio da individualidade se determina mais;

divíduos aparecem mais completos e mais livres. Ela sabe que oomem, o último e o mais perfeito animal desta terra, apresenta adividualidade mais completa e mais notável por causa de sua faculdae conceber, concretizar, personificar, de um certo modo, em suaxistência social e privada, a lei universal. Ela sabe, enfim, quando nãostá viciada pelo doutrinarismo teológico ou metafísico, político ourídico, ou mesmo por um estreito orgulho, quando ela não é surda aostitutos e às aspirações da vida, ela sabe, e esta é sua última palavra

ue o respeito ao homem é a lei suprema da Humanidade, e que orande, o verdadeiro objetivo da história, o único legítimo, é aumanização e a emancipação, é a liberdade real, a prosperidade deada indivíduo vivo na sociedade. A menos que se recaia nas ficçõesberticidas do bem público representado pelo Estado, ficções fundadasempre sobre a imolação sistemática do povo, deve-se reconhecer queberdade e a prosperidade coletivas só existem sob a condição de

epresentar a soma das liberdades e das prosperidades individuais.ciência sabe de todas essas coisas, mas ela não vai e não pode irém. A abstração, constituindo sua própria natureza, pode conceber bprincípio da individualidade real e viva, mas não pode ter nada a faze

om os indivíduos reais e vivos. Ela se ocupa dos indivíduos em geral,mas não de Pierre ou de Jacques, não de tal ou qual, que não existem

ue não podem existir para ela. Seus indivíduos nada mais são, mais

ma vez, do que abstrações.odavia, não são individualidades abstratas, são os indivíduos agindo vendo que fazem a história. As abstrações só caminham conduzidasor homens reais. Para esses seres formados, não somente em idéia,

mas em realidade, de carne e de sangue, a ciência não tem coração. Es considera quando muito como carne para desenvolvimento intelectusocial . O que lhe fazem as condições particulares e o destino fortuito

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ierre ou Jacques? Ela se tornaria ridícula, ela abdicaria, ela seniquilaria se quisesse se ocupar disso de outra forma que não aabitual, em apoio de suas teorias eternas. E seria ridículo censurá-la,ois ela obedece a suas leis. Ela não pode compreender o concreto; eló pode mover-se em abstrações. Sua missão é ocupar-se da situaçãoas condições gerais da existência e do desenvolvimento, seja da

spécie humana em geral, seja de tal raça, de tal povo, de tal classe ouategoria de indivíduos, das causas gerais de sua prosperidade, de suecadência e dos meios gerais bons para fazê-los progredir de todas a

maneiras. Desde que ela realize ampla e racionalmente esta tarefa, elaerá feito todo seu dever e seria realmente injusto pedir-lhe mais.

Mas seria igualmente ridículo, seria desastroso confiar-lhe uma missãoue ela é incapaz de realizar, visto que sua própria natureza força-a a

norar a existência e o destino de Pierre e de Jacques. Ela continuarianorá-los, mas seus representantes nomeados, homens em nadabstratos, mas, ao contrário muito vivos, possuindo interesses muitoeais, cedendo à influência perniciosa que o privilégio exerce fatalmentobre os homens, acabariam por esfolar os outros homens em nome dência, como os esfolaram até agora os padres, os políticos de todas aores e os advogados, em nome de Deus, do Estado, do Direito jurídic

O que prego é, até certo ponto, a revolta da vida contra a ciência , oumelhor, contra o governo da ciência , não para destruir a ciência - seriam crime de lesa-humanidade - mas para recolocá-la em seu lugar, de

maneira que ela não possa jamais sair de novo. Até o presente momenoda a história humana nada mais foi senão uma imolação perpétua eangrenta de milhões de pobres seres humanos a uma abstração

mpiedosa qualquer: Deus, Pátria, poder do Estado, honra nacional,reitos históricos, liberdade política, bem público. Tal foi até agora o

movimento natural, espontâneo e fatal das sociedades humanas. Nadaodemos fazer para mudar isso, devemos suportá-lo em relação aoassado, como suportamos todas as fatalidades atuais. Deve-se acredue esta era a única via possível para a educação da espécie humanaão devemos nos enganar: mesmo procurando informar amplamenteobre os artifícios maquiavélicos das classes governamentais, devemoeconhecer que nenhuma minoria teria sido bastante poderosa para

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crativas para aqueles que as representam em carne e osso. A ciênciaositiva, reconhecendo sua incapacidade absoluta de conceber osdivíduos reais e de se interessar por seu destino, deve definitiva ebsolutamente renunciar ao governo das sociedades, pois se ela se

miscuir, não poderá fazer outra coisa senão sacrificar sempre os homevos que ela ignora às abstrações de que faz o único objeto de suas

gítimas preocupações.verdadeira ciência da história ainda não existe; quando muito

omeça-se a entrever, hoje, as condições extremamente complicadas.Mas suponhamo-la definitivamente feita, o que ela poderá nos dar? Elaestabelecerá o quadro fiel e refletido do desenvolvimento natural dasondições gerais, materiais e ideais, econômicas, políticas e sociais,eligiosas, filosóficas, estéticas e científicas das sociedades que tiveram

ma história. Mas este quadro universal da civilização humana, por maetalhado que seja, jamais poderá conter senão apreciações gerais e, onseqüência, abstratas . Os bilhões de indivíduos que forneceram a

matéria viva e sofredora desta história, ao mesmo tempo triunfante egubre - triunfante pela imensa hecatombe de vítimas humanas

esmagadas sob sua carruagem" -, estes bilhões de obscuros indivíduoem os quais nenhum dos grandes resultados abstratos da história terido obtido - e que, notemo-lo bem, quer destes resultados jamais seeneficiaram com qualquer destes resultados -, não encontrarão seque

mínimo lugar em nossos anais. Eles viveram e foram sacrificados peloem da humanidade abstrata, eis tudo!

erá preciso censurar a ciência da história? Seria injusto e ridículo. Osdivíduos são inapreensível pelo pensamento, pela reflexão, até mesmela palavra humana, que só é capaz de exprimir abstrações; eles sãoapreensíveis, no presente, tanto quanto no passado. Assim, a própriaência social, a ciência do futuro, continuará forçosamente a ignorá-losudo o que temos direito de exigir dela é que nos indique, com mão fieegura, as causas gerais dos sofrimentos individuais , e, entre estasausas, ela sem dúvida não esquecerá a imolação e a subordinaçãonda muito freqüentes, infelizmente, dos indivíduos vivos àseneralidades abstratas; e ao mesmo tempo nos mostrará as condiçõeerais necessárias à emancipação real dos indivíduos vivendo na 

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ociedade . Eis sua missão; eis também seus limites, para além dos quação da ciência social só poderá ser impotente e funesta. Fora deste

mites começam as pretensões doutrinárias e governamentais de seusepresentantes nomeados, de seus padres. F tempo de acabar com esontífices, ainda que se dessem o nome de democratas-socialistas.

Mais uma vez, a única missão da ciência é iluminar O caminho. Mas,berta de todos os seus entraves governamentais e doutrinários, eevolvida à plenitude de sua ação, somente a vida pode criar.

* * *

omo resolver esta antinomia?

e um lado, a ciência é indispensável à organização racional da

ociedade, de outro, ela é incapaz de se interessar pelo que é real e vista contradição só pode ser resolvida de uma única maneira: é precisue a ciência não permaneça mais fora da vida de todos, tendo porepresentante um corpo de cientistas diplomados, é necessário que elae fundamente e se dissemine nas massas. A ciência, chamadaoravante a representar a consciência coletiva da sociedade, deveealmente tornar-se propriedade de todo mundo. Assim, sem nada perd

e seu caráter universal, do qual jamais poderá se desviar sob pena deessar de ser ciência, e continuando a se ocupar exclusivamente dasausas gerais, das condições e das relações fixas dos indivíduos e dasoisas, ela se fundirá à vida imediata e real de todos os indivíduos. Serm movimento análogo àquele que fez dizer aos pregadores, no

momento do início da reforma religiosa, que não havia mais necessidae padres para um homem que se tornará, dali em diante, seu próprioadre, graças à intervenção invisível do Senhor Jesus Cristo, tendoonseguido finalmente engolir seu bom Deus.

Mas aqui não se trata nem de Jesus Cristo, nem de bom Deus, nem deberdade política, nem de direito jurídico, todas coisas teológicas ou

metafisicamente reveladas, e todas igualmente indigestas. O mundo dabstrações científicas não é revelado; ele é inerente ao mundo real, doual nada mais é do que a expressão e a representação geral ou

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bstrata. Sem que forme uma região separada, representadaspecialmente pelo corpo dos cientistas, este mundo ideal ameaça-nos

omar, em relação ao mundo real, o lugar do bom Deus, reservando aeus representantes nomeados o ofício de padres. E por isso que éreciso dissolver a organização especial dos homens de ciência pelastrução geral, igual para todos e para todas, a fim de que as massas,

essando de ser rebanhos conduzidos e tosquiados por padresrivilegiados, possam controlar a direção de seus destinos[7].

Mas enquanto as massas não tiverem chegado a este grau de instruçãerá necessário que elas se deixem governar pelos homens de ciênciaertamente que não. Seria melhor para elas absterem-se de ciência doue se deixarem governar por homens de ciência. O governo destesomens teria, como primeira conseqüência, tornar a ciência inacessíve

o povo, porque as instituições atuais da ciência são essencialmenteristocráticas. A aristocracia de homens de ciência! Do ponto de vistarático, a mais implacável, e do ponto de vista social, a mais vaidosa e

mais insultante: tal seria o poder constituído em nome da ciência. Esteegime seria capaz de paralisar a vida e o movimento da sociedade. Osomens de ciência, sempre presunçosos, sempre auto-suficientes eempre impotentes, gostariam de se imiscuir em tudo, e as fontes da ve dissecariam sob seu sopro de abstrações.

Mais uma vez, a vida, não a ciência, cria a vida; somente a açãospontânea do povo pode criar a liberdade. Sem dúvida, será bastante

eliz que a ciência possa, a partir de agora, iluminar a marcha do povoara a sua emancipação. Mas, é melhor a ausência de luz do que umaz trêmula e incerta, servindo apenas para extraviar aqueles que a

eguem. Não é em vão que o povo percorreu uma longa carreira histórque pagou seus erros por séculos de miséria. O resumo prático de suolorosas experiências constitui um tipo de ciência tradicional, que, sobertos pontos de vista, tem o mesmo valor de ciência teórica. Enfim, umarte da juventude, aqueles dentre os burgueses estudiosos que sentirastante ódio contra a mentira, a hipocrisia, a injustiça e a covardia daurguesia, por encontrar em si próprios a coragem de lhe virar as costabastante paixão para abraçar sem reservas a causa justa e humana roletariado, estes serão, como já disse, os instrutores fraternos do pov

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raças a eles ninguém precisará do governo dos homens de ciência.

e o povo deve evitar o governo dos homens de ciência, com maiorazão deve se precaver contra o dos idealistas inspirados.

Quanto mais sinceros são os crentes e os padres, mais se tornamerigosos. A abstração científica, já disse, é uma abstração racional,erdadeira em sua essência, necessária à vida, da qual é aepresentação teórica, ou se preferirem, consciência. Ela pode, ela dever absorvida e dirigida pela vida. A abstração idealista, Deus, é umeneno corrosivo que destrói e decompõe a vida, que a deturpa e a ma

O orgulho dos homens de ciência, nada mais sendo do que umarrogância pessoal, pode ser dobrado e quebrado. O orgulho dosealistas, não sendo em nada pessoal, mas divino, é irascível e

mplacável: ele pode, ele deve morrer, mas jamais cederá, e enquanto estar um sopro de vida, tentará subjugar os homens a seu Deus; é assue os tenentes da Prússia, os idealistas práticos da Alemanha,ostariam de ver esmagar o povo sob a bota e espora de seu imperadoa mesma lei, e o objetivo não é nada diferente. O resultado da lei é

empre a escravidão; é ao mesmo tempo o triunfo do materialismo maeio e mais brutal: não há necessidade de desmonstrá-lo para alemanha; seria preciso ser cego para vê-lo.

* * *

O homem, como toda natureza viva, é um ser completamente materialspírito, a faculdade de pensar, de receber e de refletir as diferentesensações exteriores e interiores, de se lembrar delas quando passarade reproduzi-las pela imaginação, compará-las e distingui-las, abstras determinações comuns e criar assim noções gerais, enfim, formar a

éias agrupando e combinando as noções segundo maneiras diferenteuma palavra, a inteligência, única criadora de todo o nosso mundo ideuma propriedade do corpo animal e, especialmente, do organismo

erebral.

abemo-lo de maneira certa, pela experiência de todos, que nenhum faamais desmentiu e que todo homem pode verificar a cada instante deua vida. Em todos os animais, sem excetuar as espécies

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omplementares inferiores, encontramos um certo grau de inteligênciaemos que, na série das espécies, a inteligência animal se desenvolvenda mais quando a organização de uma espécie se aproxima daquelo homem; porém, somente no homem ela alcança este poder debstração que constitui propriamente o pensamento.

experiência universal [8], que é a única origem, a fonte de todos osossos conhecimentos, demonstra-nos pois que toda inteligência estáempre ligada a um corpo animal qualquer, e que a intensidade e o poesta função animal dependem da perfeição relativa do organismo. Esesultado da experiência universal não é somente aplicável às diferentespécies animais; nós o constatamos igualmente nos homens, cujaotência intelectual e moral depende, de forma tão evidente, da maior

menor perfeição de seu organismo como raça, como nação, como clas

como indivíduos, que não é necessário insistir sobre este ponto [9].or outro lado, é certo que nenhum homem tenha visto ou podido verguma vez o espírito puro desprendido de toda forma material, existind

eparadamente de um corpo animal qualquer. Mas, se ninguém a viu,omo foi que os homens puderam chegar a crer em sua existência? Oato desta crença é certo e, senão universal, como dizem todos osealistas, pelo menos muito geral, e como tal é inteiramente digno de

ossa extrema atenção. Uma crença geral, por mais estúpida que sejaxerce uma influência muito poderosa sobre Q destino dos homens, paue possa ser permitido ignorá-la ou dela fazer abstração.

sta crença se explica, por sinal, de uma maneira racional. O exemploue nos oferecem as crianças e os adolescentes, até mesmo muitosomens que ultrapassaram em vários anos a maioridade, prova-nos quhomem pode exercer por muito tempo suas faculdades mentais ante

e perceber a maneira como as exerce. Neste período do funcionameno espírito, inconsciente de si mesmo, desta ação da inteligência ingênu crédula, o homem, obsedado pelo mundo exterior, levado por esteguilhão interior que se chama vida e as suas múltiplas necessidades,ria uma quantidade de imaginações, noções e idéias necessariamente

muito imperfeitas no início, muito pouco conformes à realidade das coisdos fatos que elas se esforçam por exprimir. Ainda não tendo

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onsciência de sua própria ação inteligente, ainda não sabendo que eleróprio produziu e continua a produzir estas imaginações, estas noçõestas idéias, ignorando sua origem totalmente subjetiva , isto é humanae deve naturalmente considerá-las como seres objetivos , como seres

eais totalmente independentes de si, existindo por eles e neles mesmo

oi assim que os povos primitivos, emergindo lentamente de suaocência animal, criaram seus deuses. Tendo-os criado, sem suspeitaue foram seus únicos criadores, eles os adoraram; considerando-osomo seres reais, infinitamente superiores a si próprios, atribuíram-lhesnipotência e se reconheceram suas criaturas, seus escravos. À medidue as idéias humanas se desenvolvem, os deuses, que nunca foramutra coisa senão revelação fantástica, ideal, poética da imagemvertida, idealizam-se também. Inicialmente fetiches grosseiros, eles s

ornam pouco a pouco espíritos puros, existindo fora do mundo visível,nfim, no transcurso da história, eles acabam por se confundir num únier divino, Espírito puro, eterno, absoluto, criador e senhor dos mundos

m todo desenvolvimento legítimo ou falso, real ou imaginário, coletivou individual, é sempre o primeiro passo que custa, o primeiro ato é o

mais difícil. Uma vez ultrapassada a dificuldade, o resto se desenvolveaturalmente, como uma conseqüência necessária.

O que era difícil no desenvolvimento histórico desta terrível loucuraeligiosa que continua a nos obsedar era apresentar um mundo divino tqual, exterior ao mundo real. Este primeiro ato de loucura, tão naturao ponto de vista fisiológico, e por conseqüência necessário na históriaa humanidade, não se realiza de uma só vez. Foram necessários nãoei quantos séculos para desenvolver e para fazer penetrar esta crençaos hábitos sociais dos homens. Mas, uma vez estabelecida, ela se

ornou todo-poderosa, como se torna necessariamente a loucura, aopoderar-se do cérebro do homem. Tomai um louco, qualquer que sejabjeto de sua loucura, e vereis que a idéia obscura e fixa que o obsedaarece-lhe a mais natural do mundo, e que, ao contrário, as coisas daealidade que estão em contradição com esta idéia, parecem-lhe loucudículas e odiosas. Bem, a religião e uma loucura coletiva, tanto maisoderosa por ser tradicional e porque sua origem se perde na antigüida

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mais remota. Como loucura coletiva, ela penetrou até o fundo daxistência pública e privada dos povos; ela se encarnou na sociedade,

ornou, por assim dizer, sua alma e seu pensamento. Todo homem énvolvido por ela desde o seu nascimento; ele a suga com o leite de su

mãe, absorve-a de tudo o que toca, de tudo o que vê. Ele foi, por ela, tem nutrido, envenenado, penetrado em todo o seu ser que, mais tard

or poderoso que seja seu espírito natural, precisa fazer esforçosspantosos para se livrar dela, e ainda assim não o consegue de umamaneira completa. Nossos idealistas modernos são uma prova disso, e

ossos materialistas doutrinários, os conservadores alemães, são outrales não souberam se desfazer da religião do Estado.

ma vez bem estabelecido o mundo sobrenatural, o mundo divino, namaginação dos povos, o desenvolvimento dos diferentes sistemas

eligiosos seguiu seu curso natural e lógico, todavia conformando-se codesenvolvimento contemporâneo das relações econômicas e políticaas quais ele foi, em todos os tempos, no mundo da fantasia religiosa, eprodução fiel e a consagração divina. Foi assim que a loucura coletivstórica que se chama religião se desenvolveu desde o fetichismo,assando por todos os graus, do politeísmo ao monoteísmo cristão.

O segundo passo no desenvolvimento das crenças religiosas, sem dúv

mais difícil, após o estabelecimento de um mundo divino separado, forecisamente a transição do politeísmo ao monoteísmo, do materialismeligioso dos pagãos à fé espiritualista dos cristãos. Os deuses pagãosaí está seu caráter principal - eram antes de tudo deusesxclusivamente nacionais. Muito numerosos, eles conservaramecessariamente um caráter mais ou menos material, ou melhor, porquram materiais é que foram tão numerosos, sendo a diversidade um dorincipais atributos do mundo real. Os deuses pagãos não eramropriamente a negação das coisas reais; eles nada mais eram do queeu exagero fantástico.

imos o quanto esta transição custou ao povo judeu, do qual elaonstituiu, por assim dizer, toda a história. Moisés e os profetas tentaraor todos os meios fazer a pregação do Deus único, mas o povo recaíaempre em sua primeira idolatria, a antiga fé, muito mais natural, com

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nha desenvolvido é prodigiosamente humanizado por seus poetas, euando ela começou verdadeiramente sua história, já possuía umaeligião inteiramente pronta, a mais simpática e a mais nobre de todas eligiões que tenham existido, pelo menos tanto quanto uma religião, is, uma mentira pode ser nobre e simpática. Seus grandes pensadores enhum povo teve pensadores maiores do que a Grécia - encontraram

mundo divino estabelecido, não somente fora deles próprios, no povo,mas também neles mesmos, como hábito de sentir e pensar, eaturalmente eles o tomaram como ponto de partida. Já foi muito bomue eles nada fizessem de teologia, quer dizer, que eles não seborrecessem em reconciliar a razão nascente com os absurdos desteaquele deus, como o fizeram, na Idade Média, os escolásticos. Eleseixaram os deuses fora de suas especulações e se ligaram diretamenidéia divina, una, invisível, todo-poderosa, eterna, absolutamente

spiritualista e não pessoal. Os metafísicos gregos foram, portanto, mumais que os judeus, os criadores de um Deus cristão. Os judeus apena

crescentaram a ele a brutal personalidade de seu Jeová.

Que um gênio sublime, como o divino Platão, tenha podido estarbsolutamente convencido da realidade da idéia divina, isto nosemonstra o quanto é contagiosa, o quanto é todo-poderosa a tradiçãoa loucura religiosa, mesmo sobre os maiores espíritos. Por sinal, nãoevemos nos surpreender com isso, pois mesmo nos dias de hoje, o

maior gênio filosófico desde Aristóteles e Platão, que é Hegel,sforçou-se em repor em seu trono transcendente ou celeste as idéiasvinas, das quais Kant havia demolido a objetividade por uma críticafelizmente imperfeita e muito metafísica. E verdade que Hegel portoue uma maneira tão indelicada em sua obra de restauração que matouefinitivamente o bom Deus. Retirou destas idéias seu caráter divino a

emonstrar, a quem quiser lê-lo, que elas jamais foram outra coisa senma criação do espírito humano, correndo à procura de si próprio atrava história. Para pôr fim a todas as loucuras religiosas e à miragemvina, só lhe faltou pronunciar esta grande frase dita depois, quase ao

mesmo tempo, por dois grandes espíritos, e sem que nunca tivessemuvido falar um do outro: Ludwig Feuerbach, o discípulo e o demolidor egel, e Auguste Comte, o fundador da filosofia política na França. Aase é: "A metafísica se reduz à psicologia". Todos os sistemas de

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metafísica nada mais são do que a psicologia humana se desenvolvena história.

gora não nos é mais difícil compreender como nasceram as idéiasvinas, como foram criadas pela faculdade abstrativa do homem. Mas poca de Platão, este conhecimento era impossível. O espírito coletivo

or conseqüência também o espírito individual, mesmo o do maior gênão estava maduro para isto. Mal pôde ser dito com Sócrates:Conhece-te a ti mesmo". Este conhecimento de si próprio existia apenm estado de abstração; na realidade, era nulo. Era impossível que ospírito humano desconfiasse que era o único criador do mundo divinole o encontrou diante de si, encontrou-o como história, comoentimento, com hábito de pensar, e fez dele necessariamente o objetoe suas mais elevadas especulações. Foi assim que nasceu a metafísi

que as idéias divinas, base do espiritualismo, foram desenvolvidas eperfeiçoadas.

verdade que depois de Platão existiu no desenvolvimento do espíritoomo que um movimento inverso. Aristóteles, o verdadeiro pai da ciêncda filosofia positiva não negou absolutamente o mundo divino, mascupou-se com isto o mínimo possível. Estudou primeiramente, como unalista e um experimentador que era, a lógica, as leis do pensamento

umano, e, ao mesmo tempo, o mundo físico, não em sua essência ideusória, mas sob seu aspecto real.

epois dele, os gregos de Alexandria fundaram a primeira escola dasências positivas. Eles foram ateus. Mas seu ateísmo permaneceu semfluência sobre seus contemporâneos. A ciência tendeu cada vez mais

e isolar da vida. Quanto à negação das idéias divinas, pronunciadaelos epicuristas e pelos céticos, não teve nenhuma ação sobre as

massas.ma outra escola, infinitamente mais influente, formou-se em Alexandroi a escola dos neoplatônicos. Estes, confundindo numa mescla impus imaginações monstruosas do Oriente com as idéias de Platão, forams verdadeiros preparadores e, mais tarde, os elaboradores dos dogmaristãos.

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ssim, o egoísmo pessoal e grosseiro de Jeová, a dominação não menrutal e grosseira dos romanos, e a especulação metafísica ideal dosregos, materializada pelo contato com o Oriente, tais foram os trêsementos históricos que constituíram a religião espiritualista dos cristã

m Deus que se elevava, pois, acima das diferenças nacionais de todo

s países, que era de certa forma a negação direta, devia serecessariamente um ser imaterial e abstrato. Mas já o dissemos, a fé tfícil na existência de um semelhante ser não pôde nascer de uma só

ez. Assim, também, ela foi longamente preparada e desenvolvida pelametafísica grega, que, inicialmente, estabeleceu, de maneira filosófica,

oção da idéia divina , modelo eternamente reproduzido pelo mundosível. Mas a divindade concebida e criada pela filosofia grega era umvindade pessoal. Nenhuma metafísica consequentemente séria,

odendo se elevar, ou melhor, se rebaixar à idéia de um Deus pessoalrecisou, pois, imaginar um Deus que fosse único e que fosse três aomesmo tempo. Ele se encontrou na pessoa brutal, egoísta e cruel deeová, o deus nacional dos judeus. Mas os judeus, apesar deste espíriacional exclusivo que os distingue ainda hoje, tornaram-se, de fato, bentes do nascimento de Cristo, o povo mais internacional do mundo.rrastados em parte como cativos, mas, muito mais ainda, levados porsta paixão mercantil que constitui um dos traços principais de seuaráter, eles se disseminaram em todos os países, levando com eles oulto de seu Jeová, ao qual permaneciam tanto mais fiéis quanto mais s abandonava.

m Alexandria, o deus terrível dos judeus travou conhecimento pessoaom a divindade metafísica de Platão, já muito corrompida pelo contatoom o Oriente, e a corrompeu ainda mais pelo seu. Apesar de seuxclusivismo nacional, ciumento e feroz, não pôde, com o tempo, resiss graças desta divindade ideal e impessoal dos gregos. Desposou-a eeste casamento nasceu o deus espiritualista, mas não espiritual dosristãos. Os neoplatônicos de Alexandria foram os principais criadores eologia cristã.

ntretanto, a teologia ainda não constitui a religião, assim como osementos históricos não bastam para criar a história. Denomino de

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ementos históricos as condições gerais de um desenvolvimento realualquer, por exemplo a conquista do mundo pelos romanos e o encono deus dos judeus com a divindade ideal dos gregos. Para fecundar oementos históricos, para fazê-los percorrer uma série deansformações, foi necessário um fato vivo, espontâneo, sem o qual

eriam podido permanecer muitos séculos ainda em estado de element

mprodutivos. Este fato não faltou ao cristianismo; foi a propaganda, omartírio e a morte de Jesus Cristo.

ão sabemos quase nada deste personagem, tudo o que nos contam ovangelhos é tão contraditório e fabuloso que mal podemos extrair alguaços reais e vivos. O certo é que foi o pregador do povo pobre, o amigconsolador dos miseráveis, dos ignorantes, dos escravos e das

mulheres, e que foi muito amado por estas últimas. Prometeu a vida

terna a todos aqueles que sofrem aqui em baixo, e o número destes émenso. Foi crucificado, como era de se esperar, pelos representantes moral oficial e da ordem pública da época. Seus discípulos e os

scípulos destes últimos puderam se espalhar, graças à conquistaomana e à destruição das barreiras nacionais, e propagaram ovangelho em todos os conhecidos dos antigos. Em todos os lugares

oram recebidos de braços abertos pelos escravos e pelas mulheres, auas classes mais oprimidas, mais sofredoras e naturalmente maisnorantes do mundo antigo. Se fizeram alguns prosélitos no mundorivilegiado e letrado, devem isso, em grande parte, à influência das

mulheres. Sua propaganda mais ampla exerceu-se quase exclusivameo povo infeliz, embrutecido pela escravidão. Foi a primeira importanteevolta do proletariado.

grande honra do cristianismo, seu mérito incontestável e todo oegredo de seu triunfo inaudito, e por sinal totalmente legítimo, foi o deer-se dirigido a este público sofredor e imenso, ao qual o mundo antigompunha uma servidão intelectual e política estreita e feroz, negando-lh

clusive os direitos mais simples da humanidade. De outra forma eleamais teria podido se disseminar. A doutrina que ensinavam ospóstolos do Cristo, por mais consoladora que tenha parecido aosfelizes, era muito revoltante, muito absurda do ponto de vista da razãumana, para que homens esclarecidos tivessem podido aceitá-la. Com

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ue alegria também o apóstolo Paulo fala do "escândalo da fé " e doiunfo desta divina loucura rejeitada pelos poderosos e pelos sábios doéculo, mas tanto mais apaixonadamente aceita pelos simples, pelosnorantes e pelos pobres de espírito!

om efeito, seria preciso um bem profundo descontentamento da vida,

ma grande sede no coração e uma pobreza quase absoluta deensamento para aceitar o absurdo cristão, o mais monstruoso de todos absurdos.

ão era somente a negação de todas as instituições políticas, sociais eeligiosas da antigüidade; era a inversão absoluta de senso comum, deoda a razão humana. O ser vivo, o mundo real, eram considerados dam diante como o nada; enquanto que, para além das coisas existente

mesmo para além das idéias de espaço e de tempo, o produto final daaculdade abstrativa do homem repousa na contemplação de seu vazioe sua imobilidade absoluta, esta abstração, este caput mortuum ,bsolutamente vazio de toda utilidade, o verdadeiro nada, Deus,roclamado o único ser real, eterno, todo-poderoso. O Todo real éeclarado nulo, e o nulo absoluto, o Todo. A sombra se torna o corpo eorpo se desvanece como uma sombra[10].

ra de uma audácia e de um absurdo sem nome, o verdadeiro escânda fé para as massas; era o triunfo da insensatez crente sobre o espírit, para alguns, a ironia de um espírito fatigado, corrompido, desiludido nfadado pela busca honesta e séria da verdade; era a necessidade dee aturdir e de se embrutecer, necessidade que se encontra comeqüência entre os espíritos insensibilizados: "Credo quia absurdum" .

ão acredito somente no absurdo; acredito nele precisamente e

obretudo porque ele é absurdo. E assim que muitos espíritos distintossclarecidos acreditam, nos dias de hoje, no magnetismo animal, nospiritismo, nas mesas que giram - e por que ir tão longe? -, crêem aino cristianismo, no idealismo, em Deus.

crença do proletariado antigo, tanto quanto a do proletariado modernra robusta e simples. A propaganda cristã havia se dirigido a seuoração, não a seu espírito, às suas aspirações eternas, às suas

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ecessidades, aos seus sofrimentos, à sua escravização, não à suaazão, que dormia ainda, e para a qual, consequentemente, asontradições lógicas, a evidência do absoluto não podiam existir. A úniuestão que o interessava era a de saber quando chegaria a hora dabertação prometida, quando chegaria o reino de Deus. Quanto aosogmas teológicos, não se preocupava com eles, pois deles nada

ompreendia. O proletariado convertido ao cristianismo constituía aotência material, mas não o pensamento teórico.

Quanto aos dogmas cristãos, eles foram elaborados em uma série deabalhos teológicos, literários, e nos concílios, principalmente peloseoplatônicos convertidos do Oriente.

O espírito grego tinha descido tão baixo, que no século VII da era cristã

poca do primeiro concilio, a idéia de um Deus pessoal, espírito puro,terno, absoluto, criador e senhor supremo, existindo fora de nós, erananimemente aceita pelos padres da Igreja; como conseqüência lógiceste absurdo absoluto, tornava-se desde então natural e necessário ca imaterialidade e na imortalidade da alma humana, hospedada eprisionada em um corpo mortal, em parte somente, porque no corpo hma parte que, ainda que sendo corporal, é imortal como a alma e devessuscitar com ela. Quanto foi difícil, mesmo aos padres da Igreja,

maginar o espírito puro, fora de qualquer forma corporal! E precisobservar que em geral o caráter de todo raciocínio metafísico e teológio de procurar explicar um absurdo por outro.

oi muito oportuno para o cristianismo ter encontrado o mundo dosscravos. Houve outro motivo de alegria: a invasão dos bárbaros. Estetimos eram uma brava gente, cheios de força natural e sobretudovados por uma grande necessidade e por uma capacidade de viver;

stes bandidos a toda prova, capazes de tudo devastar e tudo engolir,ssim como seus sucessores, os alemães atuais; mas eles eram muitomenos sistemáticos e pedantes que estes últimos, muito menosmoralistas, menos sábios, e em compensação muito mais independent

orgulhosos, capazes de ciências e não incapazes de liberdade, comos burgueses da Alemanha moderna. Apesar de todas as suas grandeualidades, eles nada mais eram senão bárbaros, isto é, tão diferentes

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ara todas as questões de teologia e de metafísica quanto os escravosntigos, dos quais um grande número, por sinal, pertencia à sua raça.ssim, uma vez vencidas suas repugnâncias práticas, não foi difícilonvertê-los teoricamente ao cristianismo.

urante dez séculos, o cristianismo, armado com a onipotência da Igre

do Estado, e sem nenhuma concorrência, pôde depravar, corromper alsear o espírito da Europa. Não havia concorrentes, visto que fora dagreja não houve nem pensadores nem letrados. Somente ela pensavaomente ela falava, escrevia, ensinava. Se heresias surgiram em seueio, elas só atacavam os desenvolvimentos teológicos ou práticos doogma fundamental, não a este dogma. A crença em Deus, espírito pucriador do mundo, e a crença na imaterialidade da alma permaneciame fora. Esta dupla crença tornou-se a base ideal de toda a civilização

cidental e oriental da Europa; penetrou todas as instituições, todos osetalhes da vida pública e privada das castas e das massas; encarnouelas, por assim dizer.

odemos surpreender-nos que depois disso esta crença se tenhamantido até nossos dias, continuando a exercer sua influência desastroobre espírito de elite, tais como os de Mazzini, Michelet, Quinet e tantutros? Vimos que o primeiro ataque foi dirigido contra ela pelo

enascimento do livre espírito no século XV, que produziu heróis emártires como Vanini, Giordano Bruno, Galileu. Ainda que sufocado pearulho, pelo tumulto e pelas paixões da reforma religiosa, ele continuoem barulho seu trabalho invisível, legando aos mais nobres espíritos dada geração sua obra de emancipação humana pela destruição dobsurdo, até que, enfim, na segunda metade do século XVIII, eleeapareceu abertamente de novo, elevando ousadamente a bandeira dteísmo e do materialismo.

* * *

ôde-se acreditar que o espírito humano iria enfim se livrar de todas asbsessões divinas. Foi um erro. A mentira da qual a humanidade era aítima havia dezoito séculos (para só falar do cristianismo) deveria se

mostrar, mais uma vez, mais poderosa do que a verdade. Não maisodendo servir-se da gente negra, dos corvos consagrados pela Igreja

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adres católicos ou protestantes, que tinham perdido todo o crédito,erviu-se dos padres laicos, dos mentores e dos sofistas togados, entres quais o principal papel foi destinado a dois homens fatais, um, ospírito mais falso, o outro, a vontade mais doutrinariamente despóticatimo século: J .-J. Rousseau e Robespierre.

O primeiro é o verdadeiro tipo da estreiteza e da mesquinhariaesconfiada> da exaltação sem outro objeto que sua própria pessoa, dntusiasmo frio e da hipocrisia simultaneamente sentimental e

mplacável, da mentira do idealismo moderno. Pode-se considerá-lo coverdadeiro criador da reação. Aparentemente, o escritor democrático

éculo XVIII prepara em si mesmo o despotismo impiedoso do homemstado. Foi o profeta do Estado doutrinário, como Robespierre, seu digfiel discípulo, tentou tornar-se seu grande padre. Tendo ouvido dizer,

or Voltaire, que se não existisse Deus seria preciso inventá-lo, J .-J.ousseau inventou o Ser Supremo, o Deus abstrato e estéril dos deístfoi em nome do Ser Supremo e da hipócrita virtude comandada por

ste Ser Supremo que Robespierre guilhotinou os Hebertistasicialmente, em seguida o próprio gênio da revolução, Danton, em cujaessoa ele assassinou a república, preparando assim o triunfo, tornadoesde aquele momento necessário, da ditadura napoleônica. Depois drande recuo, a reação idealista procurou e encontrou servidores, men

anáticos, menos terríveis, mais de acordo com a estaturaonsideravelmente diminuta da burguesia atual.

a França, foram Chateaubriand, Lamartine e - é preciso dizê-lo - Victougo, o democrata, o republicano, o quase-socialista de hoje, e depoiseles toda a tropa melancólica, sentimental, de espíritos magros e pálidue constituíram, sob a direção destes mestres, a escola romântica

moderna. Na Alemanha, foram os Schlegel, os Tieck, os Novalis, osWerner, foram Schelling e muitos outros mais, cujos nomes sequermerecem ser lembrados.

literatura criada por esta escola foi o reino dos espíritos e dosantasmas. Ela não suportava a claridade; somente a penumbraermitia-lhes viver. Ela também não Suportava o contato brutal das

massas. Era a literatura dos aristocratas delicados, distintos, aspirando

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o céu, sua pátria, e vivendo, apesar dele, sobre a terra.

inha horror e desprezo pela política e pelas questões do quotidiano; muando falava disso, por acaso, ela se mostrava francamente reacioná

omava partido pela Igreja contra a insolência dos livre-pensadores, emavor dos reis contra os povos e de todos os aristocratas contra o

opulacho das ruas.e resto, como acabamos de dizer, o que dominava na escola do

omantismo era uma indiferença quase completa pela política. No meioas nuvens nas quais ela vivia só se podia distinguir dois pontos reais: ápido desenvolvimento do materialismo burguês e o desencadeamentesenfreado das vaidades individuais.

* * *

ara compreender esta literatura romântica é preciso procurar sua razãe ser na transformação que se operou no seio da classe burguesa,esde a revolução de 1793.

esde a Renascença e a Reforma até a Revolução, a burguesia, senãa Alemanha, pelos menos na Itália, na França, na Suíça, na Inglaterraa Holanda, foi o herói e o representante do gênio revolucionário da

stória. De seu seio saía a maioria dos livre-pensadores do século XVs reformadores religiosos dos dois séculos precedentes e os apóstoloa emancipação humana, inclusive, desta vez, os da Alemanha do sécassado. Ela sozinha, naturalmente apoiada sobre o braço poderoso dovo que nela tem fé, fez a revolução de 1789 e de 1793. Ela haviaroclamado a queda da realeza e da Igreja, a fraternidade dos povos, oireitos do homem e do cidadão. Eis seus títulos de glória; eles são

mortais!

m pouco tempo ele se cindiu. Uma parte considerável de compradoree bens nacionais, tornados ricos, apoiando-se não mais sobre oroletariado das cidades, mas sobre a maior parte dos camponeses darança, tornados, eles também, proprietários de terras, não aspirava autra coisa senão à paz, ao restabelecimento da ordem pública e aostabelecimento de um governo poderoso e regular. Ela aclamou pois

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om alegria a ditadura do primeiro Bonaparte, e, ainda que sempreoltairiana, não viu com maus olhos o tratado com o Papa e oestabelecimento da Igreja oficial na França: "A Religião e tão necessáo Povo!" . O que significa dizer que, satisfeita, esta parte da burguesiaomeçou desde então a compreender que era urgente, para aonservação de sua situação e de seus bens recém-adquiridos, engan

fome não saciada do povo pelas promessas de um maná celeste. Fontão que Chateaubriand começou a pregar[11].

apoleão caiu. A restauração trouxe de volta à França a monarquiagítima e, com esta, o poder da Igreja e da aristocracia nobiliária, que

ecuperaram a maior parte de sua antiga influência, até que veio omomento oportuno de reconquistar tudo.

sta reação relançou a burguesia na Revolução, e com o espíritoevolucionário despertou também nela o da incredulidade: ela se tornoe novo um espírito forte. Pôs Chateaubriand de lado e recomeçou a leoltaire; mas não chegou até Diderot: seus nervos enfraquecidos nãoomportavam mais um alimento tão forte. Voltaire, simultaneamentespírito forte e deísta, ao contrário, convinha-lhe muito.

éranger e P.-L. Courrier exprimiram perfeitamente esta nova tendênc

O "Deus das boas pessoas" e o ideal do rei burguês, ao mesmo tempoberal e democrático, retraçado sobre o fundo majestoso e doravanteofensivo das vitórias gigantescas do Império, tal foi naquela época ouadro que a burguesia da França fazia do governo da sociedade.amartine, excitado pela monstruosa e ridícula inveja de se elevar àtura poética do grande Byron, tinha começado estes hinos friamenteelirantes em honra do Deus dos fidalgos e da monarquia legítima, maeus cantos só ressoavam nos salões aristocráticos. A burguesia não o

scutava. Béranger era seu poeta e Courrier seu escritor político.revolução de julho teve por conseqüência o enobrecimento de seus

ostos. Sabe-se que todo burguês na França traz em si o tipo imperecío burguês fidalgo, tipo que jamais deixa de aparecer, tão logo oovo-rico adquire riqueza e poder. Em 1830, a rica burguesia tinhaefinitivamente substituído a antiga nobreza no poder. Ela tendeu

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bolição da exploração politicamente organizada da maioria por umaminoria qualquer - seria a satisfação direta e completa das necessidad

das aspirações do povo, o que equivaleria à liqüidação da existência asse burguesa e, mais uma vez, à abolição do Estado. E, pois, inútil

alar disso.

O outro meio, ao contrário, funesto somente ao povo, precioso aoem-estar dos privilegiados burgueses, não é outro senão a religião. Eterna miragem que leva as massas à procura dos tesouros divinos,nquanto que, muito mais astuta, a classe governante se contenta emvidir entre seus membros - muito desigualmente, por sinal, e dando

ada vez mais àquele que mais possui - os miseráveis bens da terra e espojos do povo, inclusive, naturalmente, a liberdade política e socialeste.

ão existe, não pode existir Estado sem religião. Considerai os Estadomais livres do mundo, os Estados Unidos da América ou a Confederaç

uíça, por exemplo, e vede que papel importante preenche neles, emodos os discursos oficiais, a divina Providência, esta sanção superior dodos os Estados.

ssim, todas as vezes que um chefe do Estado fala de Deus, quer seja

mperador da Alemanha ou o presidente de uma república qualquer, eserto de que ele se prepara para tosquiar de novo seu povo-rebanho.

burguesia francesa, liberal e voltairiana, levada por seu temperamenum positivismo (para não dizer a um materialismo) singularmentestreito e brutal, tendo se tornado classe governante por seu triunfo de820, o Estado teve de assumir uma religião oficial. A coisa não era fácburguesia não podia se colocar cruamente sob o jugo do catolicismo

omano. Havia entre ela e a Igreja de Roma um abismo de sangue e dedio e, por mais práticos e sábios que nos tornemos, nunca conseguimeprimir em nosso seio uma paixão desenvolvida pela história. Por sinaburguês francês se cobria de ridículo se retornasse à Igreja para tomarte nas cerimônias religiosas de seu culto, levado muito longe. Aurguesia foi levada, então, para sancionar seu novo Estado, a criar umova religião que pudesse ser, sem muito ridículo e escândalo, condiçãssencial de uma conversão meritória e sincera. Muitos o tentaram, é

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erdade, mas seu heroísmo não obteve outro resultado além de umscândalo estéril. Enfim, o retorno ao catolicismo era impossível porausa da contradição insólita que separa a política invariável de Roma desenvolvimento dos interesses econômicos e políticos da classe

média.

o que diz respeito a isto, o protestantismo é muito mais cômodo. E aeligião burguesa por excelência. Ela concede de liberdade apenas oecessário de que precisa o burguês e encontrou o meio de conciliar aspirações celestes com o respeito que exigem os interesses terrestresssim, foi sobretudo nos países protestantes que o comércio e a indúse desenvolveram.

Mas era impossível para a burguesia francesa fazer-se protestante. Pa

assar de uma religião a outra - a menos que o faça calculadamente,omo os judeus da Rússia e da Polônia, que se batizam três e atémesmo quatro vezes para receber o mesmo número de vezes aemuneração que lhes é concedida -, para mudar de religião seriamentpreciso ter um pouco de fé. Ora, no coração exclusivamente positivo urguês francês não há lugar para a fé. Ele professa a mais profundadiferença para todas as questões que não dizem respeito nem ao seuolso inicialmente nem à sua vaidade social em seguida.

le é tão indiferente ao protestantismo quanto ao catolicismo. Por outroado, o burguês francês não poderia passar ao protestantismo sem seolocar em contradição com a rotina católica da maioria, o que teria sidma grande imprudência por parte de uma classe que pretendia governação.

estava um meio: retornar à religião humanitária e revolucionária do

éculo XVIII. Mas isto faria a religião altamente proclamada por toda aasse burguesa.

oi assim que nasceu o Deísmo doutrinário.

Outros já fizeram, muito melhor do que eu poderia fazer, a história doascimento e do desenvolvimento desta escola, que teve uma influênc

ão decisiva e, pode-se dizê-lo muito bem, tão funesta sobre a educaçã

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esmo hoje.

] Mômiers - Apelidos de certos metodistas na Suíça (N. do T.).

] Pietistas - adeptos da doutrina ascética da Igreja Luterana alemã do século XVII (N. do T.).

] Bakunin fala aqui, sem dúvida, das "leis econômicas" e da "ciência social", que, com efeito, aindatá em seu começo.

] Em Londres, eu ouvi o Sr. Louis Blanc exprimir, há pouco, mais Ou menos a mesma idéia: "Aelhor forma de governo", e logo depois, "será a que convocar sempre à direção os homens virtuoso

] A ciência, tornando-se o patrimônio de todo mundo, desposará, de certo modo, a vida imediata e cada um. Ela ganhará em utilidade e em graça o que tiver perdido em orgulho, em ambição e emdantismo doutrinário. Isto não impedirá, sem dúvida, que homens geniais, melhor organizados parpeculações científicas do que a maioria de seus contemporâneos, se dediquem exclusivamente à cus ciências e prestem grandes serviços à humanidade. Todavia, eles não poderão ambicionar outra

fluência social senão a influência natural exercida sobre seu meio por toda a inteligência superior, nutra recompensa que não seja a satisfação de uma nobre preparação.

] É preciso distinguir a experiência universal, sobre a qual os idealistas querem apoiar suas crençasimeira é uma constatação real de fatos, a segunda nada mais á que uma suposição de fatos que ningu e que, por conseqüência, estão em contradição com a experiência de todo o mundo.

] Os idealistas, todos os que crêem na imaterialidade e na imortalidade da alma humana, devem estcessivamente embaraçados com a diferença que existe entre as inteligências das raças, dos povos edivíduos. A menos que se suponha que as diversas parcelas foram irregularmente distribuídas, com

plicar esta diferença? Existe infelizmente um número considerável de homens completamentetúpidos, parvos até o idiotismo. Teriam eles, pois, recebido na divisão uma parcela ao mesmo tempvina e estúpida? Para sair deste embaraço, os idealistas deveriam necessariamente supor que todas mas humanas são iguais, mas que as prisões nas quais elas se encontram necessariamente fechadasrpos humanos, são desiguais, uns mais capazes que outros, para servir de órgão à intelectualidade palma. Esta teria à sua disposição, deste modo, órgãos muito finos; aquelas, órgãos muito grosseiro

as estas são distinções de que o idealismo não tem o direito de se servir, sem cair, ele próprio, naconseqüência e no materialismo mais grosseiro. Isto porque, na absoluta imaterialidade da alma, todiferenças corporais desaparecem, tudo o que á corporal, material, deve aparecer como indiferente

ual, absolutamente grosseiro. O abismo que separa a alma do corpo, a absoluta imaterialidade daaterialidade absoluta, á infinito. Por conseqüência, todas as diferenças, inexplicáveis por sinal, egicamente impossíveis, que poderiam existir do outro lado do abismo, na matéria, devem ser, para ma, nulos, e não podem nem devem exercer sobre ela nenhuma influência. Numa palavra, osolutamente imaterial não pode ser forçado, aprisionado e ainda menos exprimido em qualquer gra

ue seja pelo absolutamente material. De todas as imaginações grosseiras e materialistas, no sentidogado a esta palavra pelos idealistas, quer dizer, brutais, que foram engendradas pela ignorância e petupidez primitiva dos homens, a de uma alma imaterial, aprisionada num corpo material, á certameais grosseira, a mais estúpida, e nada melhor prova a onipotência, exercida até mesmo sobre oselhores espíritos, por preconceitos antigos, do que ver homens dotados de uma grande inteligência

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larem ainda desta extravagante união.

0] Sei muito bem que nos sistemas teológicos e metafísicos orientais, e sobretudo nos da Índia,clusive o budismo, encontra-se já o princípio do aniquilamento do mundo real em proveito do ideaabstração absoluta. Mas ele ainda não traz o caráter de negação voluntária e refletida que distingu

ristianismo; quando estes sistemas foram concebidos, o mundo do espírito humano, da vontade e daberdade ainda não tinha se desenvolvido como se manifestou na civilização grega e romana.

1] Creio ser útil lembrar aqui uma história, por sinal muito conhecida e inteiramente autentica, quença uma luz sobre o valor pessoal destes reaquecedores das crenças católicas e sobre a sociedadeligiosa dessa época. Chateaubriand havia levado ao editor uma obra dirigida contra a fé. O editor

bservou que o ateísmo tinha passado de moda, e que o público leitor não se interessava mais por estma, que pedia, ao contrário, obras religiosas. Chateaubriand retirou-se, mas, alguns meses depois,tornou trazendo-lhe seu Génie du Christianisme.

Visite o site Cultura Brasileira:

http://www.rantac.com.br/users/lazaro/

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