Metodologia Científica RUIZ 1 e 2

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SUMÁRIO 1 MÉTODO, ECONOMIA E EFICIÊNCIA NOS ESTUDOS 1.1 Aprender a aprender na faculdade 1.2 Tempo para estudar 1.3 Para descobrir tempo 1.4 Programar a utilização do tempo 1.5 Horário de preparação para a aula 1.6 Horário das revisões das aulas 1.7 Horário das revisões para provas e exames 1.8 O grande tempo de todo estudante 1.9 Como aproveitar o tempo das aulas 1.10 Como aproveitar o tempo em reuniões de grupo 2 ESTUDO PELA LEITURA TRABALHADA 2.1 Importância da leitura 2.2 Como selecionar o que ler 2.3 Velocidade e eficiência da leitura 2.4 Comodidade e higiene na leitura 2.5 Definição de propósitos 2.6 A idéia mestra em sua constelação 2.7 Sublinhar com inteligência 2.8 Normas para sublinhar 2.9 Vocabulário e leitura eficiente 2.10 Usar melhor a vista 2.11 Ler e levantar esquemas e resumos 2.11.1 Natureza, função e regras do esquema 2.11.2 Natureza, função e regras do resumo 2.12 Com o texto diante dos olhos REFERÊNCIA RUIZ, J. A. Metodologia da Pesquisa: guia para eficiência nos estudos. Cap. 1 e 2. 3. ed. São Paulo: Atlas, 1995. Recomendação de leitura preparatória para os estudos de acadêmicos do curso de Administração

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SUMÁRIO 1 MÉTODO, ECONOMIA E EFICIÊNCIA NOS ESTUDOS 1.1 Aprender a aprender na faculdade 1.2 Tempo para estudar 1.3 Para descobrir tempo 1.4 Programar a utilização do tempo 1.5 Horário de preparação para a aula 1.6 Horário das revisões das aulas 1.7 Horário das revisões para provas e exames 1.8 O grande tempo de todo estudante 1.9 Como aproveitar o tempo das aulas 1.10 Como aproveitar o tempo em reuniões de grupo 2 ESTUDO PELA LEITURA TRABALHADA 2.1 Importância da leitura 2.2 Como selecionar o que ler 2.3 Velocidade e eficiência da leitura 2.4 Comodidade e higiene na leitura 2.5 Definição de propósitos 2.6 A idéia mestra em sua constelação 2.7 Sublinhar com inteligência 2.8 Normas para sublinhar 2.9 Vocabulário e leitura eficiente 2.10 Usar melhor a vista 2.11 Ler e levantar esquemas e resumos 2.11.1 Natureza, função e regras do esquema 2.11.2 Natureza, função e regras do resumo 2.12 Com o texto diante dos olhos

REFERÊNCIA

RUIZ, J. A. Metodologia da Pesquisa: guia para eficiência nos estudos. Cap. 1 e 2. 3. ed. São Paulo: Atlas, 1995. Recomendação de leitura preparatória para os estudos de acadêmicos do curso de Administração

RUIZ, J. A. - METODOLOGIA CIENTÍFICA (1995)

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1 MÉTODOS, ECONOMIA E EFICIÊNCIA NOS ESTUDOS

1.1 APRENDER A APRENDER NA FACULDADE

Quem acaba de ingressar numa faculdade precisa ser informado sobre a maneira de tirar o máximo proveito do curso que vai fazer.

Em primeiro lugar, o calouro vai perceber que muita coisa mudou em comparação àquilo com que estava acostumado em seus cursos de primeiro e segundo graus. E quem não souber compreender devidamente o espírito da nova, situação para adaptar-se ativa e produtivamente a ela perderá preciosa oportunidade de integrar-se desde o início no ritmo desta nova etapa de ascensão no saber, que se chama vida universitária.

Dizíamos que muita coisa mudou, e que é preciso entender o espírito desta mudança propositada e necessária, com vistas à adaptação a uma organização ativa e produtiva na vida de estudos.

No curso médio, o estudante deve estar na sala de aula no horário exato, e não pode ausentar-se antes da saída do professor. Nos cursos universitários geralmente não se exige semelhante rigor; quem não chegar a tempo pode assistir às aulas seguintes, e quem tiver necessidade de ausentar-se, antes do término da última aula, pode fazê-lo. No curso médio o estudante leva para casa tarefas diárias; não acontece o mesmo na faculdade. No curso médio os alunos andam uniformizados, não podem fumar no recinto da escola e as classes são bastante homogêneas; no curso superior nada disso acontece; as salas de aula são mais amplas e bastante heterogêneas; não raro, ao lado de um jovem de dezoito anos senta-se um diretor de escola ou um gerente de empresa. Os programas do curso médio apresentam dificuldade igual para todos os estudantes, enquanto na faculdade a formação heterogênea dos alunos faz com que os programas não apresentem dificuldades iguais para todos. No colégio, os diretores e os professores dão ordens e fiscalizam seu cumprimento; na faculdade, os acadêmicos recebem orientações. Afinal, na faculdade, todos são tratados como adultos responsáveis e capazes de dirigir a própria vida social, disciplinar e de estudos. Mas, sempre há o perigo de má interpretação deste novo clima, especialmente quando não se é, de fato, adulto e responsável.

Que pensar do acadêmico que não se preocupa com a pontualidade porque o professor respeita o seu direito de chegar com algum atraso, por motivo que um adulto julgaria razoáveis? O que acontecerá com o acadêmico que não organiza seu tempo de estudo particular para preparar aulas, para fazer revisões, só porque o professor não estabeleceu o controle das tarefas 'diárias? Que se há de esperar do aluno que transcura "orientações" porque elas não se formalizaram como "ordens"?

Quem acaba de entrar para a faculdade percebe que muita coisa mudou, e deve perceber que também ele precisa mudar, especialmente na responsabilidade, na autodisciplina e na maneira de conduzir sua vida de estudos, para tirar o maior proveito possível da excelente oportunidade de crescimento cultural que a faculdade lhe oferece.

Neste primeiro capítulo de nosso curso de Metodologia Científica, vamos compendiar uma série de considerações, muito simples, porém muito importante sobre método, economia e eficiência nos estudos no curso universitário.

Muitos calouros confessam que aprenderam muita coisa, mas que nunca aprenderam a estudar, isto é, nunca aprenderam a aprender. Quem reconhece a própria carência já deu o passo mais importante para se dispor a tomar o remédio adequado. E sempre haverá o que aprender para melhorar o rendimento de nossos trabalhos, de nossos estudos e, desta forma, aumentar nossa satisfação pessoal nos êxitos alcançados. Esta parte introdutória e eminentemente prática de nosso trabalho deverá, pois, interessar vivamente a todos os nossos universitários.

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Quem acaba de ingressar na faculdade sabe como deve orientar seus estudos particulares? Sabe como participar ativa e produtivamente das aulas? Sabe ler com eficiência, tomar apontamentos, levantar esquemas, fazer resumos, desenvolver temas, redigir trabalhos? Julga-se satisfeito porque entendeu tudo ou quase tudo que o professor disse? Percebe que aprender é principalmente analisar, assimilar, reter e ser capaz de reproduzir com inteligência? Observe que as sabatinas, ou provas, não examinam o que se entendeu vagamente sobre um problema apresentado; examinam, sim, quanto se reteve e como se é capaz de reproduzi-lo adequadamente.

Fazer um curso superior não é ouvir aulas para conseguir adivinhar testes, mas instrumentar-se para o trabalho científico. Mais vale esta instrumentação do que o conhecimento de uma série de problemas ou o aumento de informações acumuladas assistematicamente; ou, como já se disse, mais vale uma cabeça bem feita do que uma cabeça bem cheia (de informações, de erudição). Nesse sentido terá feito bom curso superior não tanto aquele que for capaz de repetir o que aprendeu, mas aquele que, diante de problemas completamente novos, tiver nível e método para empreender uma pesquisa séria e profunda. Nesse sentido, diz, Mira y López que aprender é aumentar o cabedal de recursos de que dispomos para enfrentar os problemas que nos apresenta a vida cultural1.

Não se esperem amplos desenvolvimentos de teses nem elencos de conselhos neste trabalho estritamente elementar, mas tão-somente algumas considerações sobre temas de real importância para a eficiência de um curso superior. Tudo será simples, como é simples uma vacina que salva da morte. Não se confunda simplicidade, praticidade, com inutilidade ou superficialidade. É evidente que, ao examinar-se um conceito muito simples, se procure, de preferência, verificar se ele está sendo posto em prática, e com resultados.

Há uma generalizada curiosidade entre jovens a respeito de discussões teóricas sobre o método mais perfeito para estudar e para aprender; para estudar pouco e aprender muito. Não se verifica o mesmo interesse em adotar e pôr em prática, com empenho e perseverança, nem o método mais perfeito nem outro método qualquer, porque, na verdade, nenhum método é perfeito a ponto de dispensar o trabalho que não se quer ter. Mas a idéia de um método que torne mais eficiente o trabalho é muito válida. Podemos e devemos conhecer a maneira mais econômica e mais eficiente de estudar para aprender de fato, para crescer culturalmente. Não será difícil reconhecer um bom método; não será fácil arregimentar disposições para pô-lo em prática com perseverança. Só esta decisão garantirá bom rendimento e satisfação pessoal nos estudos, melhorará a capacidade de compreensão e facilitará a assimilação e a retenção, desenvolverá a capacidade de análise e o poder de síntese, aumentará progressivamente a clareza e a profundidade dos conceitos, conferirá eficácia à comunicação, disciplinará e exercitará a mente.

Quem acaba de ingressar numa faculdade precisa ser informado sobre a maneira de conseguir pleno êxito no curso que vai fazer. Deve aprender a aprender na faculdade. Deve ler e analisar as considerações exaradas neste primeiro capítulo.

1.2 TEMPO PARA ESTUDAR

O progresso é, em grande parte, uma luta contra os ponteiros do relógio. Pergunte-se ao empresário e ao industrial quanto vale o tempo, isto é, quanto vale o bom aproveitamento do tempo como fator de produção, custo e comercialização de seus produtos.

O primeiro passo para quem quer estudar consiste em reorganizar a vida, de maneira a abrir espaços para o estudo e planejar o melhor aproveitamento possível de seu tempo.

Há quem imagine que deva fazer um curso superior sem dispor de tempo para estudar, ou mesmo para freqüentar as aulas dos diversos cursos; e chega-se a imaginar que a apresentação

1 Mira Y López, Emílio, Como estudar e como aprender, p. 30.

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documentada de sua total falta de tempo seja motivo nobre e suficiente para dispensa das aulas, dos trabalhos, dos estudos, afinal, da obrigação de fazer o curso. Como, pretende estudar quem não pode estudar? É um ser curioso o aluno que pretende conciliar o estudo com a impossibilidade de estudar.

Ninguém desconhece o sacrifício da quase totalidade de nossos acadêmicos, que vão para suas escolas após uma jornada de oito horas ou mais de trabalho profissional. Se isso é sumamente louvável, não o exime, por outro lado, do compromisso de estudar e, portanto, de descobrir tempo para estudar. É preciso descobrir tempo. Tempo para freqüentar as aulas dos diversos cursos, e tempo para estudos particulares. Se procurarmos, o tempo aparecerá. E lembremo-nos de que meia hora por dia representa três horas e meia por semana, quinze horas por mês e cento e oitenta horas por ano. E quem não conseguiria descobrir um ou mais espaços de meia hora em sua jornada? Ou quem não conseguiria fazer aparecerem esses espaços, se o quisesse realmente? Ou será que esses espaços não aparecem porque nós não os procuramos, por medo de encontrá-los? Quem quer descobre tempo, cria tempo, especialmente nós, brasileiros, que somos, por assim dizer, capazes do impossível.

1.3 PARA DESCOBRIR TEMPO

A maneira mais prática de descobrir ou fazer aparecer o tempo consiste em tomar uma folha de papel, anotar os diversos dias da semana em linha horizontal e os diversos afazeres em linha vertical; registrar depois, na coluna de cada dia da semana, as horas plenas e os possíveis espaços ociosos, como segue:

DIA SEGUNDA-FEIRA... (demais dias da semana)

AFAZERES Início Término Tempo

Levantar 7:00 7:00

Higiene 7:00 7:30 Meia hora

Transporte 7:30 8:00 Meia hora

Trabalho 8:00 12:00 Quatro horas

Almoço 12:00 14:00 Duas horas

Etc.

É evidente que a meia hora de higiene pode ser reduzida e que se pode levantar dez minutos mais cedo, abrindo um espaço utilíssimo logo de manhã. E não seria muito aproveitar quinze minutos dos cento e vinte reservados para intervalo de almoço. E será fácil o hábito de ler dez minutos antes de dormir.

Eis uma pergunta que surgirá fatalmente a esta altura: podem-se aproveitar dez minutos apenas para uma seção de estudos?

Não será esta a duração ideal, é evidente. E quem não conhece outros detalhes sobre a leitura, revisão e fichamento pouco ou nada produzirá em dez minutos. Mas, quem souber ler, quem considerar e puser em pratica nossas indicações sumariadas sobre técnicas de leitura eficiente, de revisão e de fichamento, certamente lerá boas páginas em dez minutos, descobrirá e assinalará a idéia principal ou central, as palavras-chave e os pormenores importantes no contexto.

Entenda-se que não basta descobrir tempo: é necessário desenvolver técnicas para tornar qualquer tempo produtivo. Por ora, entretanto, nossa preocupação consistirá mima revisão de nossa jornada, com o propósito de descobrir ou de fazer aparecer qualquer porção de tempo que possa ser reservada aos nossos planos de estudo.

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Quanto menos tempo tivermos, mais motivados deveremos estar para aproveitá-lo ao máximo. Há alunos de períodos noturnos que trabalham oito ou mais horas por dia, e que conseguem resultados, em seus estudos, bem maiores que alunos de outros períodos que não trabalham ou que só trabalham em regime de meio expediente. Isso não se explica pelo tempo disponível, mas pelo seu melhor aproveitamento.

Aliás, não raro o estudante se esquece de considerar, como tempo para estudo, as horas que passa nas salas de aula, como se não devesse cuidar do aproveitamento máximo de tempo tão precioso. Entretanto, por sua particular importância, trataremos deste item mais adiante, com maior cuidado.

1.4 PROGRAMAR A UTILIZAÇÃO DO TEMPO

Depois de reconsiderar, de lápis na mão, sua jornada, tom a atenção do empresário que luta contra os ponteiros do relógio para poder produzir mais e a menor custo, devemos programar a utilização dos espaços de dez minutos, de meia hora, de possíveis horas inteiras que possam ser reservadas para o estudo, sem prejuízo das horas de lazer. Aliás, aproveitar intensamente o tempo é uma espécie de condição para se dar sentido às horas de lazer e para desfrutá-las intensamente. Parece que a satisfação e a força restauradora das horas de lazer são proporcionais ao bom aproveitamento e à intensa produtividade das horas de trabalho. Quem, nas horas de lazer, se preocupa com tarefas não cumpridas nas horas de trabalho, não descansa nunca, nem nas horas de trabalho, nem nas horas de lazer.

Não basta determinar, ao longo de nossa jornada, espaços para estudar. É preciso que se determine o que estudar em cada horário de maneira programática, embora se alterem planos em determinadas circunstâncias ou se façam remanejamentos periódicos, ou se deixem alguns horários opcionais.

Esta exigência não deve parecer excessiva ou utópica. A programação do que fazer em cada horário evita vacilações, indecisões, adiamentos; evita, exatamente, a perda do tempo reservado ao estudo, ou sua má utilização. Se não houver uma prévia determinação programática, não aproveitaremos o tempo simplesmente, ou estudaremos só o que mais nos agrada, o que é um mal muito menor.

A perseverança no cumprimento do programa é o maior problema. Geralmente, nosso tempo é pequeno, mas o pior é que o pequeno espaço de tempo se converte em nada pela falta de perseverança.

O horário que o acadêmico descobriu ou fez aparecer para dedicar ao estudo deve ser- preenchido com três atividades que perfaçam o ciclo e criem o ritmo de trabalho eficiente, a saber: preparação para a aula, revisão de aula e revisões gerais para provas e exames. Trataremos, separadamente, do "grande tempo das aulas".

1.5 HORÁRIO DE PREPARAÇÃO PARA A AULA

O estudante deve ter à mão o programa, bem como seu material de estudo, tais como: livros de texto, bloco para anotações, um bom dicionário, apostilas ou fontes indicadas para leitura de aprofundamento.

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O estudante deverá ler previamente a matéria que será desenvolvida durante a aula, por uma série de razões; em primeiro lugar, essa leitura será feita em poucos minutos e aumentará o rendimento das várias horas de aula que o professor utilizará para o seu desenvolvimento em classe. Ora, se é possível conseguir, com trabalho prévio de meia hora, aumentar o rendimento de várias horas de trabalho posterior, essa leitura prévia representa economia e eficiência no trabalho. Além disso, esta leitura prévia permitirá que se assinalem à margem do texto, com simples sinal de interrogação, problemas que exigirão entendimento durante a aula. Estas anotações permitirão uma espécie de regulagem da atenção, pois, enquanto estão em pauta passagens de fácil entendimento, o aluno que preparou sua aula prestará uma atenção de intensidade normal; mas, à medida que o desenvolvimento da aula caminha para passagens anotadas com uma simples interrogação, ou reformuladas à margem sob forma de problema, redobrará sua atenção. Se tudo ficou claro agora, muito bem; caso contrário, eis o momento de formular sua dúvida inteligente.

Quem não preparou sua aula não pode distribuir convenientemente a intensidade de sua atenção e pode não fazer perguntas, porque nem sabe que não entendeu. E os problemas mais difíceis irão avolumando enormemente seu trabalho extra-aula, que se tornará antieconômico, e reduzirá sensivelmente o rendimento escolar.

Outra razão para a leitura prévia do assunto a ser desenvolvido em classe é a qualidade dos apontamentos e das anotações. Os apontamentos dos alunos que vão para a aula preparados são sóbrios, claros e localizam o essencial, enquanto os apontamentos dos que estão tendo contato pela primeiríssima vez com o assunto da aula são difusos, desordenados, obscuros, captam passagens secundárias e omitem o principal. Tais apontamentos são um estorvo e não uma ajuda substancial ao trabalho de revisão e preparação de provas e exames.

Não deve restar dúvida sobre a importância de se reservar no próprio horário de estudo espaço suficiente para a leitura prévia dos assuntos de aula. Essa leitura, que poderá ser feita em poucos minutos, determinará melhor rendimento durante as aulas, inteligente distribuição da atenção, ordem, clareza e perfeição nos apontamentos e grande economia de tempo e trabalho nas revisões.

Entender isso parece muito fácil; não é tão fácil agir dessa forma. É preciso decidir-se a começar, fixar o hábito e sentir de perto as vantagens de tal disciplina de trabalho. Quem tem muito tempo pode proceder desta forma; quem tem pouco tempo deve agir deste modo, pois representa extraordinária economia de tempo, especialmente nas revisões, e é fator de eficiência na vida escolar.

1.6 HORÁRIO DAS REVISÕES DAS AULAS

Não basta preparar-se para a aula e conseguir entender tudo enquanto o professor desenvolve o assunto. É claro que isso é muito importante; mas não é tudo. É necessário fazer revisões, e nestas revisões procurar questionar o assunto da aula e responder claramente às questões ao menos mentalmente. Dizemos ao menos mentalmente porque seria melhor reproduzir por escrito as questões fundamentais. Às vezes nos iludimos pensando que entendemos tudo muito bem, mas, ao procurar formular questões precisas sobre o assunto da aula e ao respondê-las por escrito, percebemos que não conseguimos. E não vale a desculpa de que entendemos mas temos dificuldade de expressão. Temos vocabulário e recursos suficientes para exprimir tudo que entendemos, embora nos faltem recursos para traduzir tudo que sentimos. Ninguém pode ter dificuldade de exprimir

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idéias claras e distintas; a presença da dificuldade, pois, atesta que nossas idéias não estão tão claras e distintas. Quando o aluno se prepara para a aula e, por isso mesmo, aproveita-a ao máximo, o trabalho de revisão torna-se fácil e não toma muito tempo.

Devemos distinguir duas espécies de revisão, e planejar espaços para ambas em nosso programa de horários reservados para o estudo. À primeira denominamos revisão imediata; essa é a revisão que se faz da aula anterior, antes da aula subseqüente, ou por ocasião da preparação dessa. Toma pouco tempo, porque o processo de esquecimento ainda não se desencadeou com sua ação demolidora. Para algumas matérias seria interessante que a revisão consistisse na elaboração sumária do assunto com o auxílio da bibliografia e dos apontamentos de classe. À segunda, revisões globalizadoras ou integradoras. As aulas segmentam os assuntos em unidades, em itens e subitens, de acordo com os preceitos da pedagogia e a, seqüência lógica dos problemas. Não entendemos tudo de uma vez; nosso raciocínio é discursivo, Isto e, passa de um ponto para outro, discorre, caminha, flui. De outro lado, o todo complexo deve ser desdobrado em partes, pela análise, para que possam ser definidos seus componentes. Assim, são desmembradas, em aula, as partes dos vários assuntos. Restará para o aluno o trabalho de síntese, reunificação e integração das partes no todo. Este importantíssimo trabalho de revisão globalizadora é o mais eficiente recurso de organização da aprendizagem, bem como a mais válida preparação de provas e exames.

1.7 HORÁRIO DAS REVISÕES PARA PROVAS E EXAMES

As provas e sabatinas são, exatamente, recursos pedagógicos utilizados não só para efeito de avaliação dos alunos, mas para induzi-los a fazer revisões globalizadoras periódicas. Pode, pois, o acadêmico programar suas revisões globais para a época das provas e sabatinas.

Queremos observar que a esta altura dos ciclos de estudo bem ordenados não é hora de entender, mas de rever apenas. Há alunos que vão acumulando matéria pouco elaborada e problemas não compreendidos nem durante a preparação da aula, nem durante a aula, nem nas revisões imediatas, que, neste caso, não estariam totalmente sendo feitas, e que deixam tudo para as vésperas das provas e sabatinas; isto é um erro de conseqüências nefastas para a eficiência dos cursos e até para a saúde física dos desorganizados e imprudentes, que se vêem na contingência de serem reprovados ou de intensificarem extraordinariamente seus esforços de última hora, que trazem muitos prejuízos para a saúde e muito poucos benefícios para o estudo. A natureza não dá saltos; as árvores crescem lentamente, e dão fruto no tempo devido; planta que cresce muito, depressa não tem cerne forte. O estudo deve ser também um processo de desenvolvimento lento e constante para que possa dar bons frutos em tempo oportuno.

Quem se preparou para as aulas, quem trabalhou em classe como adiante reveremos, quem fez revisões imediatas e revisões periódicas globalizadoras aproveitará muito bem o tempo de preparação para os exames e as revisões de fim de curso, que são extraordinariamente vantajosas.

1.8 O GRANDE TEMPO DE TODO ESTUDANTE

O grande tempo de todo estudante são as aulas.

Pretendemos desenvolver um pouco mais este item por julgá-lo da mais alta importância. E nosso objetivo, como sempre, será predominantemente prático ou atitudinal, pois visamos despertar consciências e motivar atitudes a partir de esclarecimentos teóricos que serão apenas sumariados.

O aluno que, após um dia de trabalho, ao invés de ir para sua casa, toma o rumo da faculdade, às vezes, mesmo sem tempo para uma refeição, e, contrariamente a tudo que se poderia

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supor, não aproveita as aulas, é um incoerente.

O aluno que paga uma faculdade para adquirir o direito a uma carteira dura, onde possa perder tempo durante as aulas, está clamando aos quatro ventos que lhe falta algo de muito importante na caixa craniana.

Nunca será demasiadamente encarecida aos estudantes, especialmente aos principiantes dos cursos universitários, a importância do tempo-aula, pois não basta oferecer a quem quer ser pianista um belo exemplar do instrumento e a mais completa coleção de métodos. Na generalidade dos casos, é indispensável a freqüência às aulas, onde terá o aluno a orientação do professor.

Sabemos que a causa principal da aprendizagem é o aluno, é o próprio aprendiz. De fato, a aprendizagem, concebida como resultado do processo da educação formal institucionalizada na escola, tem por agente principal o próprio aluno. O mestre não reparte sua ciência entre os alunos, nem fica mais pobre de conhecimentos depois de cada aula, porque o aluno adquire por si mesmo a ciência sob a ajuda externa do mestre. Quem causa os frutos é principalmente a árvore, embora o faça sob a ação do agricultor; quem sara é principalmente o organismo do enfermo, embora sob a ação do médico e dos medicamentos; quem aprende é principalmente o aluno, embora sob a ação do mestre. Deve haver na planta, no enfermo e no aluno um princípio intrínseco, ativo, operante, capaz de produzir os efeitos da frutificação, da cura, da aprendizagem. A ação do agricultor, do médico e do mestre tem caráter de causa eficiente auxiliar, coadjuvante apenas. Quem dá frutos ou não é a árvore; quem sara ou não é o próprio organismo; quem aprende ou não é o aluno. Ninguém ensinará a um cabrito o teorema de Pitágoras; por isso, o magistério já era denominado pelos antigos "ars cooperativa naturae", ou seja, o magistério apenas coopera com a natureza, mas é ela que reage ativamente à arte do magistério. É esta reação, quando existe, a causa da aprendizagem e é por isso que ninguém pode fazer um poste dar frutos, ou curar uma múmia, ou ensinar teoremas a cabritos.

Lembramos esta indiscutível verdade não para diminuir a importância da ação do mestre, mas para acentuar a responsabilidade do aluno.

Quem ensina exerce uma ação exterior e auxiliar apenas, é verdade, mas esta ação é importantíssima no complexo processo da aprendizagem, como se pode depreender das considerações que seguem.

O mestre é necessário para ensinar como aprender. O mestre é necessário para justificar por que aprender e por que estudar isso antes daquilo. O mestre é necessário para organizar e ordenar o que aprender. O mestre é necessário para a seleção de recursos, de instrumentos adequados ao trabalho do estudante, bem como para iluminar com sua ciência objetos que a mente do aluno não veria fora desta luz. O mestre é necessário como mediador entre o programa e o aluno.

A ação do mestre é uma arte "sui generis", porque ele trabalha com um material que se molda a si mesmo. Formar não significa, em educação, prensar numa matriz para dar a um material a forma que se deseja. Quem trabalha material passivo são os escultores, por exemplo, não os mestres.

A vantagem do mestre é que ele já conhece o caminho certo e os desvios perigosos; conhece os alunos como o médico conhece seus doentes e o agricultor conhece suas sementes e sua terra.

Há quem se ilude imaginando que aproveitaria melhor seu tempo ficando a estudar em casa ao invés de ir às aulas. Isto pode ser até verdade em alguns casos, em alguns dias, quando já se está orientado para determinados estudos. Mas tomando-se o curso como um todo, pensar que se aproveita mais ficando em casa, sem orientação, sem a ajuda que as aulas prestam no complexo fenômeno da aprendizagem metódica, é uma grande ilusão. Fosse isso verdade, seria muito mais econômico aos cofres públicos dar uma biblioteca básica para cada família do que manter a gigantesca rede oficial de ensino.

Cremos ter acentuado a decisiva e primacial importância do aluno no processo da aprendizagem, bem como a importância decisiva, embora apenas auxiliar, do professor.

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Examinaremos a seguir como deve proceder o aluno em aula, para que se beneficie ao máximo do precioso tempo que passa na escola.

1.9 COMO APROVEITAR O TEMPO DAS AULAS

Na quase generalidade dos casos, acreditamos que o tempo que o aluno passa nas salas de aula constitua a maior parte do tempo que dedica aos estudos. E não se justificaria o esforço de encontrar ou fazer aparecer pequenos espaços para os estudos dentro da jornada de trabalho, se não se procurasse, principalmente, aproveitar ao máximo o tempo, dilatado por mais de três horas, que o aluno passa diariamente na sala de aula. Aliás, ninguém compreenderia o aluno empenhado nos estudos fora da sala de aula, surdo aos convites da televisão e dos amigos, que, por outro lado, fosse desinteressado pelo rendimento de seu tempo durante as aulas.

O aluno que não aproveita o tempo das aulas com empenho já está julgado: não leva a sério sua vida de estudos.

Em primeiro lugar, para aproveitar o tempo das aulas, é preciso freqüentá-las. E é muito importante que se esteja em sala desde o início das aulas, primeiro porque aquele que chega depois do início da aula tem dificuldade de apanhar-lhe o fio e, em segundo lugar, porque geralmente quem chega atrasado causa certa perturbação e prejudica o andamento da aula. Quando não houver outra opção senão a de chegar atrasado, seja discreto e sente-se logo, sem chamar muito a atenção. Há tipos que batem à porta, pedem licença, cumprimentam o professor, justificam-se do atraso e caminham lentamente até à última cadeira, parando de quando em quando para murmurar aos ouvidos deste ou daquele colega, sentando-se finalmente, após alinhar melhor sua cadeira com um razoável estrépito! E quando alguns daqueles que estão sempre prontos para tudo que represente perda de tempo se voltam para vê-lo, o ridículo autodespoliciado está sorrindo de felicidade por ter sido objeto de alguma consideração.

Não basta ir às aulas e chegar antes de seu início. É preciso levar consigo material adequado ao trabalho do dia. Quem só leva o jornal ou alguma revista ilustrada carrega consigo estímulos à distração própria e à dos companheiros. É preciso levar os livros recomendados pelo professor, o texto que serviu para preparação da aula, bem como o material para apontamentos.

É muito importante guardar silêncio exterior para não distrair os outros e silêncio interior para não distrair a si próprio. O silêncio interior consiste em deixar fora da sala todo problema que nada tem a ver com a aula. É este silêncio interior que permite concentração mais profunda e menos cansativa. O silêncio exterior cria o clima necessário ao bom rendimento da aula. O barulho e as conversinhas em sala distraem os demais e refletem no próprio ânimo do professor. Não é fácil manter-se em ritmo de trabalho, de dedicação e concentração diante de uma classe barulhenta e de alunos conversadores. Querem os alunos que uma aula seja boa? Comecem por oferecer ao professor condições materiais de trabalho.

Em aula, não adianta ficar sonhando com problemas domésticos, profissionais ou financeiros. Só vale a pena pensar naquilo que está sendo desenvolvido no momento. Cada um deve criar seu silêncio interior e concentrar-se suave e ativamente no assunto em exame.

O silêncio exterior e o interior não devem ser entendidos como imposição externa, mas como autodisciplina de alunos conscientes de sua necessidade. Que se diria de um grupo de jovens que se dirigissem ao teatro, pagassem seus ingressos e depois ficassem a conversar alheios ao desenrolar da peça? Não incomodariam aos demais presentes? Não quebrantariam os ânimos dos atores? Não estariam a se diminuir ante a crítica de todos?

Quando reina silêncio exterior e interior, quando a fantasia repousa e a boca se fecha, o espírito se abre e a inteligência atua em melhores condições.

Neste clima e nesta atitude favorável ao trabalho o aluno acompanha a exposição do mestre,

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participa ativamente dos debates, toma apontamentos e, principalmente, não deixa sem esclarecimento nenhum ponto obscuro ou duvidoso. É muito importante não levar dúvidas ou pontos obscuros para casa; debata-os até seu razoável e desejável esclarecimento. Às vezes, determinado assunto constitui ponto de particular interesse deste ou daquele aluno, mas não interessa aos demais. Em casos semelhantes, o professor poderia ser procurado em particular, dentro de sua disponibilidade de tempo, fora do horário de aula.

Devemos ainda lembrar que todos, professores e alunos, devem empenhar-se no sentido de manter um clima cordial de relacionamento. O trabalho em sala de aula é cansativo tanto para os alunos como para os professores, mas o peso normal do trabalho ficará agravado, e chegará, por vezes, a se tomar insuportável se não houver cordialidade. Quando se instalam e se avolumam certas barreiras de desafeto mútuo, a aula torna-se desgastante ao extremo. Trabalhar com aluno atento, empenhado, participante e cordial causa uma satisfação íntima que, de certa forma, diminui ou compensa o peso do trabalho e os alunos beneficiar-se-ão, porque um professor animado com sua classe produz muito mais; esse aspecto concorre também para o crescimento da cordialidade. Neste sentido, podemos dizer que cada classe tem a aula que merece.

E se surgir um problema entre alunos e professor? Caso isto aconteça, o problema deve ser enfrentado com elegância e correção. Nem se deve fugir dele, nem se deve ultrapassar os limites do comedimento. Em primeiro lugar, o representante da classe poderá abordar o professor e dialogar com ele em particular, caso o problema seja de toda a classe. A segunda instância poderá ser a exposição objetiva do problema ao coordenador do departamento, que deverá falar com o professor e, eventualmente, com a classe. Em terceiro lugar, o assunto poderia chegar ao diretor pedagógico, ao diretor administrativo, e assim por diante, até ao Ministério da Educação. O que não se deve é levar o problema diretamente ao presidente ou aos diretores da faculdade. Normalmente, o assunto ficará encerrado no primeiro contato com o professor. Da mesma forma o professor deverá, em primeiro lugar, entender-se com o representante da classe ou com a classe toda, em diálogo franco e comedido; sua segunda instância será o coordenador do departamento, e assim por diante. A experiência ensina que um diálogo franco, honesto e comedido entre professor e alunos, ou seu representante, não só resolve os problemas, mas estreita os laços de respeito e de cordialidade mútuos.

1.10 COMO APROVEITAR O TEMPO EM REUNIÕES DE GRUPO

Difunde-se cada vez mais a prática salutar do estudo em grupos nos meios universitários. Para uma classe nova de alunos que não estejam familiarizados com esta forma de atividade, tais reuniões podem representar apreciável perda de tempo, podem angustiar alunos e gerar frustrações. Vamos, pois, neste trabalho dedicado aos que acabam de ingressar na faculdade, considerar este problema especialmente em seus aspectos mais práticos e gerais. Saibam os alunos que o estudo em equipe é muito proveitoso sob todos os aspectos, quando todos os seus componentes assumem sua parcela de responsabilidade e se dispõem a trabalhar, contribuir e participar ativamente. Todos devem trabalhar, não só estes ou aqueles, porque são julgados mais inteligentes ou menos ocupados.

Logo no início do semestre, a classe deve distribuir-se em grupos de sete ou oito participantes, aproximadamente, e é aconselhável que cada grupo escolha um coordenador. Incumbiria ao coordenador entrar em contato com os professores quando for conveniente, tratar dos interesses de seu grupo junto ao representante de classe, presidir e coordenar reuniões, organizar e distribuir funções, anotar e cobrar a colaboração de cada integrante do grupo.

A primeira exigência para que um grupo funcione e atinja em suas reuniões os objetivos previstos por esta estratégia de trabalho consiste exatamente na organização prévia do próprio grupo, que deve reunir alunos que tenham facilidade de se comunicar e de se encontrar fora da escola também. Vamos enumerar outras exigências ou normas necessárias ao bom andamento dos trabalhos dos grupos para que haja bom aproveitamento do tempo consagrado a reuniões:

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1.10.1 - Ao receber um tema para trabalho, o grupo deve reunir-se o mais rapidamente possível para programar suas reuniões e proceder a uma primeira distribuição de tarefas preparatórias à primeira sessão de trabalho. Se o tema já estiver definido e a bibliografia já tiver sido apresentada pela cadeira, o primeiro trabalho consistirá na busca de fontes; cada participante não só se responsabilizará por providenciar determinado texto, como também deverá lê-lo e esclarecer suas dificuldades antes da reunião da equipe. O coordenador anotará estes compromissos e os solicitará ordenadamente na reunião seguinte. Esta primeira reunião não deverá encerrar-se sem que estejam bem esclarecidos o local, a data e o horário do próximo encontro.

1.10.2 - Todos deverão providenciar os textos pelos quais se responsabilizaram, e deverão estudá-los conforme será explicado em nosso capítulo a respeito do "estudo pela leitura trabalhada". Sempre que se tratar de pesquisa bibliográfica, como geralmente acontece, o primeiro passo é providenciar a bibliografia, os livros e os textos. Isto é evidente. Entretanto, há por aí grupos que se reúnem sem material conveniente ou, quando há material, fazem a primeira leitura durante a reunião de equipe. A leitura prévia é necessária para o bom andamento dos trabalhos.

1.10.3 - Há uma ordem para que os participantes apresentem os textos pelos quais se responsabilizaram e comuniquem brevemente seu conteúdo. Em primeiro lugar o coordenador passará a palavra àqueles que se encarregaram de pesquisar generalidades em dicionários, enciclopédias e manuais didáticos. Em seguida, solicitará a contribuição daqueles que se responsabilizaram pela análise prévia de segmentos do texto básico. .

1.10.4 - Não se deve alongar debates antes que se chegue ao final de uma primeira apresentação de generalidades da leitura do texto básico. Só depois deste primeiro passo é que se deve voltar ao início para um contato mais íntimo com o texto para levantar seu esquema, para discutir suas idéias principais, para avaliar a coerência interna destas idéias, para ponderar o vigor dos argumentos, a perfeição da análise, e assim por diante, conforme esclareceremos mais amplamente no próximo capítulo.

1.10.5 - De acordo com o nível do grupo ou de sua familiaridade com o assunto em pauta, espera-se que os debates, ao final, ultrapassem o texto, ou seja, caminhem além do texto numa reabordagem crítica de sua tese e de seus argumentos.

1.10.6 - Nenhuma reunião de equipe funcionará se seus componentes não providenciarem o material necessário, ou não comparecerem preparados para contribuir e participar ati-vamente. Como debater em círculo de estudos se não se estudou previamente a parte pela qual cada um se responsabilizou? Por outro lado, se o grupo se organizou convenientemente, se escolheu seu coordenador, se programou seu trabalho e distribuiu previamente atribuições limitadas e específicas a cada participante, a experiência tem demonstrado que as reuniões de grupos de estudo são de extraordinária eficiência, quer para desenvolver itens do programa em seminários, quer para elaboração de mo-nografias de caráter didático-pedagógico, quer para revisões gerais para provas ou exames. Tudo quanto apresentamos neste item condensadamente tem caráter prático e genérico. A classe deverá estar atenta a ulteriores especificações que cada cadeira poderá fazer ao solicitar reuniões de equipes para execução de trabalhos em sua área.

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2 ESTUDO PELA LEITURA TRABALHADA

2.1 IMPORTÂNCIA DA LEITURA

Não basta ir às aulas para garantir pleno êxito nos estudos. É preciso ler e, principalmente, ler bem. Quem não sabe ler não saberá resumir, não saberá tomar apontamentos e, finalmente, não saberá estudar. Ler bem é o ponto fundamental para os que quiserem ampliar e desenvolver as orientações e aberturas das aulas. É muito importante participar das aulas; elas não circunscrevem, não limitam; ao contrário, abrem horizontes para as grandes caminhadas do aluno que leva a sério seus estudos e quer atingir resultados plenos de seus cursos. Aliás, quase todas as cadeiras desenvolvem programas de pesquisa bibliográfica para que o aluno desenvolva temas e reconstrua ativamente o que outros já construíram. Para elaborar trabalhos de pesquisa, é necessário ir às fontes, aos autores, aos livros; é preciso ler, ler muito e, principalmente, ler bem.

Durante as primeiras aulas de qualquer disciplina, os mestres apresentam criteriosa bibliografia; alguns livros são básicos, ou de leitura obrigatória, para quem quer colher todo fruto das aulas; outros são mais especializados ou se concentram em algum item do programa, e pode, entre os tratados gerais de consulta obrigatória, ser indicado um, como livro de texto. A indicação do livro de texto tem vantagens e inconvenientes cuja análise ultrapassaria os limites que este compêndio impõe. Diremos, apenas, que o livro de texto é muito bom para a preparação da aula, mas que o aluno não pode ater-se exclusivamente a ele. "Timeo hominem unius libri", diziam os antigos. Devemos temer o homem de um livro só. É necessário abeberar-se de outras fontes mais amplas, mais especializadas sobre cada tema ou sobre cada pormenor dos programas.

Se não é possível pensar em fazer um bom curso sem descobrir ou fazer aparecer espaços de tempo para o estudo extra-aula e se é necessário programar criteriosamente a utilização desse tempo, não seria igualmente impossível pensar em fazer um bom curso sem ter à mão boas fontes de leitura? É possível que se pretenda fazer um curso universitário sem freqüentar bibliotecas ou sem adquirir, ao menos, os livros básicos para cada programa?

A leitura amplia e integra os conhecimentos, desonerando a memória, abrindo cada vez mais os horizontes do saber, enriquecendo o vocabulário e a facilidade de comunicação, disciplinando a mente e alargando a consciência pelo contato com formas e ângulos diferentes sob os quais o mesmo problema pode ser considerado. Quem lê constrói sua própria ciência; quem não lê memoriza elementos de um todo que não se atingiu. E, ao terminar um curso superior, deveríamos não só estar capacitados a repetir o que foi aprendido na faculdade, como também estar habilitados a desenvolver, através de pesquisas, temas nunca abordados em aula. Deveríamos ser uma pequena fonte, não um pequeno depósito de conhecimentos, ou mero encanamento por onde as coisas apenas passam.

É preciso ler, ler muito, ler bem.

É preciso sentir atração pelo saber, e encontrar onde buscá-lo. É necessário iniciar este trabalho com determinação e perseverar nele; o crescimento cultural tem crises como o crescimento físico; quem não sente apetite não deve deixar de alimentar-se; comprometeria sua saúde. Também na leitura trabalhada devemos ser perseverantes; só esta perseverança garantirá aquela espécie de saltos de integração de dados, que se vão acumulando e associando como frutos da leitura continuada.

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2.2 COMO SELECIONAR O QUE LER

O título do livro é a primeira informação que temos sobre seu conteúdo, mas não deve figurar como critério de escolha para a leitura. Devemos examinar sumariamente o livro cujo título nos interessa à primeira vista; devemos ver o nome do autor, seu curriculum; devemos ler sua "orelha", o índice da matéria, a documentação ou as citações ao pé das páginas, a bibliografia, assim como verificar a editora, a data, a edição e ler rapidamente o prefácio. A convergência destes vários elementos ajuda a selecionar o que ler. Ademais, podemos consultar professores da respectiva área.

Todo estudante deveria interessar-se pela formação de uma pequena biblioteca de obras selecionadas; os livros são suas ferramentas de trabalho. O primeiro passo é adquirir os livros citados pelos professores como indispensáveis ou fundamentais; em seguida as obras mais amplas e mais especializadas dentro da área profissional ou do interesse particular de cada um.

2.3 VELOCIDADE E EFICIÊNCIA DA LEITURA

Alguns lêem tão devagar que, ao final de um parágrafo, já tiveram tempo para esquecer seu início, e voltam para revê-lo, Estes retornos representam nova forma de perda de tempo que se soma à lentidão da leitura, com enorme prejuízo. Quem assim procede não encontra tempo para ler, pois não há tempo que chegue e, desta forma, instala-se um verdadeiro círculo vicioso.

Normalmente, a leitura veloz não prejudica a eficiência ou a compreensão. Quem lê bem e depressa encontra tempo para ler e faz seu tempo render. Não existe uma velocidade-padrão de leitura; a maior ou a menor velocidade depende do gênero do próprio texto, bem como das peculiaridades do leitor. Não se lêem com a mesma velocidade textos de gênero diferente, como, por exemplo, um romance e um manual de biologia. Por outro lado, cada um deve atingir sua velocidade ideal, mas é certo que sempre é possível aumentar a velocidade sem prejuízo da compreensão.

Não pretendemos apresentar um curso de leitura veloz, mas oferecer uma seqüência de normas e de considerações que levarão normalmente a um aumento de velocidade e de eficiência na leitura cultural, isto é, um curso que aumentará o rendimento do esforço pessoal no estudo, através da leitura. Em nosso caso, da leitura eficiente decorrem a captação, a retenção e a integração de conhecimentos contidos no manancial dos textos lidos.

2.4 COMODIDADE E HIGIENE NA LEITURA

O ambiente material de leitura deve reunir umas tantas condições que a favoreçam. É preferível ler em ambiente amplo, arejado, bem iluminado e silencioso; se a luz for artificial, deve ser difusa, e seu foco deve estar à esquerda de quem lê. É preferível ler sentado a ler em pé ou deitado. Além do texto a ser lido, é importante ter à mão um bom dicionário, lápis e um bloco de papel. É de suma importância, também, o clima de silêncio interior, de concentração naquilo que se vai fazer.

Tudo o que resumimos acima está amplamente desenvolvido provado e justificado nos tratados de pedagogia e de didática. Não duvidamos de sua importância, mas quem não dispuser do ambiente ideal de leitura deve aprender a ler com boa velocidade e eficiência num banco de jardim, numa sala de espera ou numa fila de ônibus. Cada um constrói sua casa com as pedras que tem.

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Não se julgue impossibilitado de ler aquele que não puder fazê-lo em ambiente de condições ideais, mas é importante conhecer estas condições e procurar criá-las ou desfrutar delas tanto quanto possível.

2.5 DEFINIÇÃO DE PROPÓSITOS

Alguém pode ler só para passar o tempo, para não manter conversação com o cidadão estranho que se sentou a seu lado no mesmo vagão, ou para dar ares de intelectual; estas são maneiras de dar alguma finalidade à leitura. Mas não é dessa finalidade ou propósito que estamos falando.

A finalidade básica da leitura cultural é a procura, a captação, a crítica, a retenção e a integração de conhecimentos, e isto se faz, em primeiro lugar, pela procura das idéias mestras, das idéias principais, também chamadas idéias diretrizes. Cada texto, cada seção, cada capítulo e, mesmo, cada parágrafo têm uma idéia principal, uma palavra-chave, um conceito fundamental. “... é essencial que o estudante se preocupe em descobrir qual é essa idéia diretriz, fio condutor do pensamento do mestre ou expositor", escreve Emílio Mira y López, em seu “Como estudar e como aprender”, e continua: "Assim, pois, como cada fábula tem sua 'moral', isto é, a sua essência significativa, cada série de pensamentos possui uma idéia diretriz ou conceito fundamental. Descobri-lo, quando não está em negrito, é conquistar um dos fatores essenciais de toda aprendizagem cultural2”.

Em cada parágrafo, pois, o leitor deve captar a idéia principal; deve concentrar-se em sua procura. O mau leitor, ou seja, o leitor lento e ineficiente, lê palavras, ou melhor dizendo, lê palavra por palavra, como se todas tivessem igual valor; o bom leitor lê unidades de pensamento, lê idéias e as hierarquiza enquanto lê, de maneira a encontrar a idéia mestra ou a palavra-chave. Quem lê idéias é mais veloz na leitura e capta melhor o que lê. Mas isto é fruto de treinamento, de exercícios. "Se vocês, amigos leitores, dedicassem uma hora por dia à tarefa de descobrir, concretizar e formular as idéias diretrizes de alguns parágrafos de diversos textos, exercitar-se-iam em uma técnica de abstração e de síntese que lhes permitiria tirar o máximo proveito de qualquer tipo de leitura ou estudo ulterior3".

Nossa experiência de mais de vinte anos de magistério, bem como de mais de trinta anos de continuados estudos confirmam as palavras de Mira y López e da generalidade dos autores que versaram sobre o assunto. Por ocasião da última abordagem do presente assunto em classe, uma aluna tomou a palavra para prestar interessante depoimento: Estou cursando esta cadeira de Metodologia com calouros, mas já estou no último semestre do curso de Estudos Sociais. Sou transferida de outra faculdade, onde não existe a cadeira de Metodologia. Confesso que estava chegando ao fim do curso sem saber ler. Percebo que fui muito prejudicada. Mas... antes tarde do que nunca", concluiu. Esse depoimento teve mais força persuasiva do que toda nossa aula. E aquela classe passou a valorizar nossa cadeira, a estar mais atenta às aulas e a aplicar-se com maior dedicação à leitura cultural para trabalhos de pesquisa bibliográfica.

Quem não puder dedicar uma hora por dia ao trabalho de encontrar as idéias principais de alguns parágrafos não se julgue dispensado deste exercício; leia com este propósito seu livro de textos, suas apostilas e toda a bibliografia consultada na elaboração de seus trabalhos de pesquisa. Procure, após a leitura de algumas páginas, reformular as idéias mestras; leia novamente a passagem para verificar se atingiu o propósito de toda leitura cultural, que é captar, reter, integrar e evocar conhecimentos reformulados. "Crie o hábito de encontrar a idéia principal em cada parágrafo que ler.

2 Mira Y Lopez, Emílio, op. cit., p. 37.

3 Idem, ibidem, p. 39.

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Quando julgar tê-lo feito, confira sua conclusão e mantenha a idéia em mente enquanto continua a ler, e compare-a, especialmente, com a sentença-sumário. Se tiver dúvidas a respeito de sua seleção, releia o parágrafo, desta vez olhando-o bem para se certificar de que captou a idéia correta. Lembre-se, porém, de que nem sempre pode encontrá-la numas poucas palavras dadas; talvez, tenha de refraseá-la com palavras suas (uma boa prática, afinal de contas) para captá-la com exatidão4".

2.6 A IDÉIA-MESTRA EM SUA CONSTELAÇÃO

Não existem capítulos, seções ou livros só com idéias mestras; estas seriam encontradas nos índices, nos prefácios e nos sumários. Nem é possível captar, hierarquizar, criticar, reter ou evocar idéias mestras totalmente despojadas de pormenores importantes. A idéia principal aparece sempre numa constelação de idéias que gravitam à sua volta; um argumento que a justifique, um exemplo que a elucide, uma analogia que a torne verossímil e um fato ao qual ela se aplique são elementos de sustentação da idéia principal.

O bom leitor não lê só o essencial; não lê apenas resumos com o propósito insano de memorizá-los. O bom leitor produz seus resumos, é verdade; e procura acompanhar a montagem, o encadeamento, a articulação das idéias em amplos e profundos textos nos quais as idéias principais são fundamentadas em bases sólidas, em demonstrações de validade ponderável, em fatos de evidência comprovada, em documentos insofismáveis, ou são aplicadas na solução de problemas ou na definição ou normalização da conduta.

Quem alega, por ocasião de exames ou em conversações rotineiras, que tem facilidade para responder a perguntas essenciais, mas não se interessa por pormenores e "coisinhas" está confessando, embora não seja esta a sua intenção, que não lê ou não sabe ler, que não estuda ou não sabe estudar.

É importantíssimo discernir o principal e o secundário, a idéia mestra e os pormenores mais importantes ou menos importantes. Memorizar índices, enunciados, teses, ou postulados não exime ninguém da pecha de mau leitor, de mau estudante ou de pseudo-selecionador de preciosidades. Quem procede assim não tem razão para escusar-se; deve mudar de conduta e começar a ler e a estudar com inteligência e sabedoria, isto é, com amor pelo saber.

2.7 SUBLINHAR COM INTELIGÊNCIA

Sublinhar é uma arte que ajuda a colocar em destaque as idéias mestras, as palavras-chave e os pormenores importantes. Quem sublinha com inteligência está constantemente atento à leitura; descobre o principal em cada parágrafo e o diferencia do acessório; este propósito o mantém concentrado e em atitude de crítica durante todo o tempo dedicado à leitura. Além desse efeito benéfico, já durante a leitura, o hábito de sublinhar com inteligência favorece o trabalho das revisões imediatas, bem como as revisões globalizadoras posteriores.

Há leitores que ouviram falar na vantagem de sublinhar, ou que tiveram colegas excelentes nos estudos, cujos livros estavam sempre sublinhados inteligentemente; por isso resolveram sublinhar também. Mas esses imitadores de coisas vão sublinhando logo na primeira leitura todas as palavras que parecem mais importantes em determinado

4 MORBAN, Clifford T., e DEESSE, James, Como estudar, p. 46.

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parágrafo, e seguem em frente como se tudo estivesse perfeitamente localizado, hierarquizado, captado, entendido.

Sublinhar é uma técnica que tem suas normas. Se essas normas não forem observadas, o sublinhamento indiscriminado atrapalhará mais do que ajudará, quer durante a leitura, quer por ocasião das revisões.

2.8 NORMAS PARA SUBLINHAR

Cada um pode adotar uma simbologia arbitrária e pessoal para sublinhar e fazer anotações à margem dos textos. Basta que a simbologia adotada mantenha uma significação bem definida e constante. Entretanto, poderíamos sugerir algumas normas colhidas em fontes credenciadas e em larga experiência pessoal:

a) Sublinhar apenas as idéias principais e os detalhes importantes: não se deve sublinhar em demasia. Não sublinhar longos períodos; basta sublinhar palavras-chave. Aplica-se ao caso o adágio latino "non multa, sed multum", que traduziríamos, adaptando a nosso intento: não sublinhar multa, isto é, muitas coisas, mas sublinhar multum, isto é, muito significativo.

b) Não sublinhar por ocasião da primeira leitura: as pessoas mais experimentadas, que examinam textos pertinentes à sua área de especialização, sublinham inteligentemente por ocasião da primeira leitura; mas recomenda-se aos principiantes que não o façam; leiam primeiro um ou mais parágrafos, e retomem para sublinhar aquelas palavras ou frases essenciais que, desde a pri-meira leitura, foram identificadas como principais, e que a releitura mais rápida confirma como tais.

c) Reconstruir o parágrafo a partir das palavras sublinhadas: é supérfluo esclarecer esta norma que traduz a natureza e a finalidade do ato de sublinhar.

d) Ler o texto sublinhado com a continuidade e plenitude de sentido de um telegrama: por ocasião das revisões imediatas ou posteriores, os textos sublinhados de acordo com esta norma permitirão uma leitura rapidíssima, apoiada nos pilares das palavras sublinhadas; por outro lado, a leitura das palavras sublinhadas, embora pertencentes a frases diferentes e até distanciadas, terá um sentido fluente e concatenado.

e) Sublinhar com dois traços as palavras-chave da idéia principal, e com um único traço os pormenores importantes: devemos sublinhar tanto as idéias principais como os detalhes importantes, mas é bom agir de tal maneira que as idéias principais se mantenham destacadas.

f) Assinalar com linha vertical, à margem do texto, as passagens mais significativas: não raro, a idéia principal retorna em diversos parágrafos e em diversos contextos. E há passagens em que o autor atinge uma espécie de clímax; essas passagens, que poderíamos transcrever em nossas fichas de documentação pessoal, devem ser identificadas para futuras buscas. Nada melhor que um traço vertical à margem do texto para tal identificação.

g) Assinalar com um sinal de interrogação, à margem, os pontos de discordância: podemos não concordar com as posições assumidas pelo autor, como também perceber incoerências, paralogismos, interpretações tendenciosas de fontes e uma série de falhas ou de colocações que julgamos insustentáveis, dignas de reparos ou passíveis de críticas: Devemos registrar o fato mediante uma interrogação à margem do texto em apreço.

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Há quem fale do uso de cores diferentes para assinalar idéias principais e pormenores importantes, em lugar de usar um ou dois traços, conforme preferirmos, bem como do uso de uma terceira cor para assinalar pontos mais difíceis ou que não tenham ficado claros. Para assinalar pontos mais obscuros, quer durante a leitura de preparação para as aulas, quer durante as leituras ulteriores, em textos de maior desenvolvimento, preferimos a utilização de lápis e não de canetas a tinta. De resto, aplica-se ao caso o provérbio latino “de gustibus et cloribus nom disputatur", isto é, "a respeito de preferências e de cores não se deve discutir": que cada um adote a simbologia que melhor lhe pareça.

2.9 VOCABULÁRIO E LEITURA EFICIENTE

Muita gente lê mal porque não tem bom vocabulário e não tem bom vocabulário porque lê mal, o que se torna um círculo vicioso que deve converter-se em círculo virtuoso, para todo aquele que aspira atingir nível de crescimento cultural.

O domínio cada vez mais amplo do vocabulário enriquece nossa possibilidade de compreensão e concorre para aumentar a velocidade na leitura.

Mas como aumentar nosso vocabulário? Decorando algum dicionário? Quem o fez em seu tempo de estudante, em eras que não voltam mais, confessa que o trabalho era penoso; entretanto, acaba agradecendo aos professores exigentes de seu tempo. Mas o melhor recurso para aumentar o próprio vocabulário é, sem dúvida, a leitura.

Como proceder ante uma palavra de sentido desconhecido, ou que assume sentido novo em determinado contexto? Morgan e muitos outros recomendam a imediata consulta aos dicionários: "A primeira coisa a fazer é procurá-la num dicionário5". Por nossa parte, sugerimos que se experimente não interromper a leitura ante um termo de sentido desconhecido; não raro, a seqüência o texto deixará bem claro o sentido da palavra desconhecida; anote, pois, a palavra desconhecida em um papel avulso, e continue a ler. Ao final de um capítulo, apanhe o dicionário para esclarecer todas as palavras anotadas como desconhecidas e verifique o sentido que melhor se coaduna com o respectivo contexto. Assim, durante a segunda leitura, em que se sublinham as idéias principais e os pormenores importantes, todos os termos estarão claros e incorporados ao nosso vocabulário. Adote a sugestão da consulta imediata ou a sugestão de não interromper a leitura cada vez que encontrar uma palavra desconhecida. O fundamental é que não se deve perder a oportunidade de enriquecer o próprio vocabulário pela preguiça da busca de palavras novas em algum dicionário. Por certo, estaríamos prejudicando a compreensão do texto e impedindo o próprio crescimento cultural.

Que dicionários consultar? Não se entende um estudante de nível superior que não tenha um bom dicionário comum da língua materna. Mas há certas palavras que, embora incorporadas à linguagem vulgar, conservam ou assumem sentido específico, definido pelas diversas ciências, como a botânica, a biologia, a medicina, a filosofia, e assim por diante. Outras palavras não constam nos dicionários comuns, mas tão-somente nos dicionários de maior porte ou em dicionários técnicos das diversas áreas. O estudante deve adquirir um bom dicionário dentro de sua área de especialização. Entretanto, as faculdades mantêm bibliotecas ricas em fontes de consulta, com grande variedade de dicionários e enciclopédias à disposição de seus alunos. Não é preciso que cada um compre enciclopédias caríssimas para usar uma vez ou outra; com o dinheiro de uma

5 MORGAN, Clifford T., op. cit., p. 60.

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enciclopédia de generalidades monta-se uma preciosa estante com obras da própria especialidade, inclusive com dicionários técnicos; e isto parece ser mais útil.

2.10 USAR MELHOR A VISTA

Durante a leitura, nossos olhos percorrem as linhas não em movimento contínuo, mas aos pulos, não lemos durante o movimento dos olhos, mas nas suas rápidas paradas, que podem ser observadas com aparelhos adequados. Nossos olhos podem fixar-se em uma sílaba, em uma palavra, ou em um grupo de palavras, nessas paradas de reconhecimento dos estímulos gráficos. Quanto mais amplo for este campo de parada ou de reconhecimento, mais veloz será a leitura; e como essas paradas incidem em palavras principais, mais compreensível torna-se o texto.

O bom leitor não lê palavra por palavra, muito menos sílaba por sílaba; sua vista incide sobre grupos de palavras; a pausa de reconhecimento deste grupo de palavras é curta. Mas, esta habilidade é fruto de exercícios e da prática da leitura.

Sugerimos que se façam exercícios de leitura, procurando fixar em cada grupo de palavras as sílabas iniciais, como se o texto estivesse escrito com abreviaturas.

2.11 LER E LEVANTAR ESQUEMAS E RESUMOS

Para acentuar os propósitos da leitura, para melhor captar, discernir, assimilar, gravar e facilitar a evocação futura dos conteúdos da leitura, nada melhor do que procurar reproduzir ou refrasear aquilo que lemos: "Se você resolver anotar brevemente o que o autor diz, não pode evitar que o que ele diz se torne parte do seu próprio processo mental6".

Quem lê bem, de lápis na mão, à procura das idéias diretrizes e dos pormenores importantes, já preparou caminho para o levantamento do esquema seguido pelo autor, bem como para a elaboração do resumo daquilo que leu. Quem faz leitura trabalhada exercita-se na habilidade de discernir o principal e o acessório, e deixa assinalado, durante a leitura, tudo o que poderia fornecer elementos para o levantamento do esquema, para a elaboração do resumo ou para transcrições em fichas de documentação pessoal. Ao contrário, quem não lê com discernimento, ou quem não sublinha com inteli-gência, fará resumos falhos, sínteses mutiladas que mais atrapalharão nos estudos e confundirão nas revisões do que ajudarão.

2.11.1 Natureza, função e regras do esquema

Esquema é o plano, a linha diretriz seguida pelo autor no desenvolvimento de seu escrito; esse plano delimita um tema e estabelece a trajetória básica de sua apresentação, subordinando idéias, selecionando fatos e argumentos.

A função do esquema, pois, é definir o tema e hierarquizar as partes de um todo numa linha diretriz, para torná-lo possível a uma visão global. Pelo esquema, pode-se atingir o todo numa única mirada.

A elaboração ou levantamento do esquema obedece a algumas regras:

6 MORGAN, Clifford T., op. cit., p. 69.

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a) Seja fiel ao texto. Não se pode trabalhar com esquemas fixos ou preconcebidos e forçar o texto lido a entrar neles.

b) Apanhe o tema do autor, destaque títulos, subtítulos que guiaram a introdução, o desenvolvimento e as conclusões do texto.

c) Seja simples, claro e distribuído organicamente, de maneira a apresentar límpida imagem concentrada do todo.

d) Subordine idéias e fatos, não os reúna apenas.

e) Mantenha sistema uniforme de observações, gráficos e símbolos para as divisões e subordinações que caracterizam a estrutura do texto.

2.11.2 Natureza, função e regras do resumo

O resumo pedagógico, não necessariamente científico, consiste no trabalho de condensação de um texto capaz de reduzi-lo a seus elementos de maior importância. Não estamos considerando, no contexto da presente análise, os resumos elaborados com o intuito de divulgação científica nas seções especializadas de jornais ou revistas, mas o resumo como recurso de aprendizagem e como material adaptado ao trabalho de revisão.

O resumo difere do esquema e do sumário porque é formado por parágrafos de sentido completo; sua leitura dispensa a do texto original, no que diz respeito ao levantamento dos conteúdos; não indica tópicos apenas, mas condensa sua apresentação. Ademais, os resumos comportam apreciação crítica a partir de uma posição assumida.

"Numerosas pesquisas, a propósito, provaram que recordamos muito melhor as coisas que fazemos...7”. O trabalho de resumir ajuda a captação, a análise, o relacionamento, a fixação e a integração daquilo que estamos estudando, assim como facilita sua evocação e reduz o tempo destinado à preparação de provas, aumentando o aproveitamento geral.

Não concordamos com a sugestão de elaborar por escrito resumos de tudo o que estudamos. Isso pode ser muito bom, ou mesmo necessário, quando o texto em apreço é muito amplo ou de acesso difícil, pois não temos condição ou interesse de possuí-lo; isso acontece quando estamos pesquisando obra rara em uma biblioteca pública, por exemplo. O resumo torna-se aconselhável quando ouvimos uma aula ou conferência profunda e amplamente desenvolvida, ou quando estamos coletando material para um trabalho de maior fôlego. De resto, o resumo será útil para testar nosso entendimento de textos mais difíceis, para nos exercitar na arte de redigir com clareza e concisão. Mas, um texto lido, trabalhado, analisado, sublinhado, com anotações à margem, é um resumo em potencial; não concordamos com a posição daqueles que prescrevem a prática do resumo escrito de tudo o que se lê como condição necessária ao estudo eficiente. Voltemos à idéia fundamental: quem lê bem será capaz de elaborar bom resumo, e obedecerá quase espontaneamente às seguintes regras:

a) Não pretender resumir antes de ler, de esclarecer todo o texto, de sublinhar, de fazer breves anotações à margem do texto - Quem pretende fazer resumo enquanto lê acaba sendo tão prolixo como o original e muito menos perfeito. Podem-se, entretanto, anotar em papel avulso dados que, possivelmente, serão depois incorporados ou mesmo salientados no resumo. Por outro lado, resumo é trabalho de "extração" e não de "criação". É possível fazer um resumo daquilo que se sabe, independente de qualquer texto, mas resumo de

7 MORGAN, Clifford T., op. cit., p. 69.

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"texto" supõe, necessariamente, fidelidade ao texto e, conseqüentemente, leitura e exame prévios.

b) Ser breve e compreensível - Se é resumo, que não se estenda em demasia; mas, como deve ser suficiente, isto é, como deve dispensar a leitura do texto original, o resumo não pode permanecer nas indicações sumárias de tópicos, como acontece com o esquema.

c) Percorrer especialmente as palavras sublinhadas e as anotações à margem do texto - Depois de uma primeira leitura geral e corrida, depois de todos os esclarecimentos de termos e conceitos, depois de uma segunda leitura com anotações, está preparado o caminho para um resumo perfeito; nem é preciso reler todo o texto; basta seguir as anotações e sublinhas.

d) Nos casos de transcrição textual, usar aspas e fazer referência completa à fonte - Às vezes, o próprio autor condensa admiravelmente seu pensamento em passagens lapidares; podemos transcrever tais passagens, enriquecendo e valorizando nosso resumo, mas é importante destacar tais textos e transcrevê-los entre aspas, indicando a fonte.

e) Juntar, especialmente ao final, idéias integradoras, referências bibliográficas e críticas de caráter pessoal - Os resumos, embora marcados pelo caráter de objetividade e de fidelidade às fontes, comportam inclusões de crítica pessoal e certas anotações de caráter integrador; diríamos que os resumos podem e devem ser "personalizados".

2.12 COM O TEXTO DIANTE DOS OLHOS

Se entendermos, ao término de nossas considerações sobre o estudo através da leitura trabalhada, a importância desse recurso, no processo de crescimento cultural, a que devem necessariamente aspirar todos os que ultrapassaram o vestíbulo de uma faculdade, para devotar-se à conquista da formação superior; se nos convencermos da necessidade de partir, como propósito básico, em qualquer leitura cultural, à procura da idéia mestra e dos pormenores importantes que serão sublinhados, discutidos, analisados, assimilados, reduzidos a esquemas e resumos, numa atividade de excelentes resultados práticos; se compreendermos que é assim que nos preparamos para os exames e para as responsabilidades profissionais de amanhã; se isso acontecer aos nossos leitores como acontece a nossos alunos em classe, no primeiro mês de aula, estamos atingindo nosso objetivo.

Entretanto, é necessário pôr em prática aquilo que se aceitou como importante e eficaz na vida de estudos. Pode haver dificuldades numa primeira tentativa de leitura trabalhada, mas é necessário iniciar e perseverar nesta prática. Em breve, sentiremos concretamente seus efeitos benéficos. E todo nosso curso e todas as nossas leituras beneficiar-se-ão dessa maneira correta de trabalhar sobre um texto.

Tome seu texto, seja ele qual for; sente-se, acomode-se à mesa, com um dicionário e um bloco para apontamentos ao lado. Concentre-se, suavemente, no trabalho que vai iniciar, certo de que não é hora de se distrair com problemas alheios ao propósito de ler com aplicação e inteligência. Numa espécie de fase inicial de aquecimento e concentração, comece lendo o título do assunto, os subtítulos, o sumário, se houver; só então inicie a primeira leitura geral com a atenção sempre voltada para as idéias mestras e para os pormenores importantes; caminhe decididamente; se encontrar termos desconhecidos, anote-os em papel avulso; não perca de vista os títulos e os subtítulos; descubra e acompanhe a trajetória percorrida pelo autor; assinale a lápis, à margem do texto, o que lhe parecer digno de ulteriores considerações; mas não se detenha, caminhe até o fim com velocidade compatível com a compreensão do texto. Ao chegar ao fim, procure esclarecer o sentido das palavras desconhecidas que anotou

RUIZ, J. A. - METODOLOGIA CIENTÍFICA (1995)

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durante a leitura. Essa sessão de estudos não deve ultrapassar vinte minutos ou meia hora; programe, pois, previamente, o ponto a que deve chegar, que pode ser um subtítulo do texto; neste caso, continue sua leitura até ao final do capítulo ou do texto em apreço.

Recomece a segunda leitura procurando no texto respostas às questões que o autor se propôs analisar ou que você mesmo formulou após a primeira leitura; atenda, agora, aos sinais que foi fazendo à margem do texto durante a primeira leitura. Detenha-se em cada parágrafo; sublinhe as idéias principais e os pormenores importantes; examine a coerência, a estrutura lógica do texto; pondere a natureza e a força dos argumentos, a validade dos exemplos e a perfeição das divisões; questione, compare, critique; faça breves anotações à margem do texto; assinale pontos obscuros para debater com colegas ou professores. Vá associando novas conquistas a seus conhecimentos anteriores, integrando-as, enriquecendo-as com algo de seu, ao mesmo tempo em que se enriquece com elas, pois o crescimento cultural não se realiza por agregação ou superposição de camadas de conhecimentos, mas por gestação de concep-ções, como diria Sócrates. Crescimento cultural é processo vital de captação, análise, reconstituição ou síntese, assimilação ou integração unificada e unificante das partes ou elementos em um todo maior.

Não alegue que este trabalho supõe um cabedal de conhecimentos; isto é ou pode ser verdade; entretanto, é preciso começar para ir adquirindo cabedal sempre maior de conhecimentos; é ele que, em grande parte, é fruto da leitura trabalhada.

A segunda leitura é mais trabalhosa, mas oferece em troca excelentes gratificações. Ela disciplina nossa razão, desenvolve o senso crítico, alimenta o espírito científico, promove o nosso real desenvolvimento à semelhança da digestão sempre mais lenta e mais proveitosa que a ingestão. Ao término dessa segunda leitura, está aplainado o caminho para qualquer espécie de esquematização, resumo ou fichamento, que se queiram fazer. Dizemos "que se queiram fazer", porque, como já dissemos, não precisamos elaborar esquemas, resumos e fichamentos escritos de tudo o que lemos. Parece-nos um exagero de teóricos as prescrições insistentes em sentido contrário. Mas, quando o texto é muito longo ou difícil, ou mesmo elaborado sob forma de exercício, é bom refraseá-lo através de resumos, conforme as normas acima citadas. Quem não é capaz de resumir mentalmente ou oralmente um filme a que assistiu; uma peça de teatro, um romance ou um texto, sem precisar tê-lo feito antes por escrito?

Não basta ler uma, duas, ou até três vezes o mesmo texto. É preciso parar para analisá-lo, criticá-lo, discuti-lo, questioná-lo, anotá-lo, sublinhá-lo, retê-o, refraseá-lo mentalmente e, quando necessário, em resumos escritos; é preciso captar com discernimento, analisar, associar, assimilar e reter com tenacidade, crescer através do desenvolvimento interno e não por agregação ou amontoamento desordenado de informações superficiais e assistemáticas. A leitura cultural é um trabalho de garimpeiro; é um trabalho, não um passatempo ocioso.

Muitos alunos confessaram francamente que não pensavam ser a leitura tão importante. E declararam também que não sabiam ler.

Nosso objetivo neste item é simples e direto: mostrar como se lê e mostrar que é fácil ler bem. Quem não sabe ler jamais amará a leitura ou tirará dela esperado benefício. Quem aprendeu a ler confessa que passou a gostar de ler e a tirar grandes vantagens do estudo através da leitura; passou a encontrar tempo para ler e fazê-lo mais depressa e com melhor compreensão.