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A DOCÊNCIA NA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA: PAPÉIS, SABERES, DESAFIOS E POSSIBILIDADES EM DIFERENTES MODELOS A educação a distância é foco deste painel, no qual se abordam saberes, conflitos, desafios e possibilidades da docência no desenvolvimento dos processos de ensino e aprendizagem em diferentes modelos pedagógicos no âmbito dessa modalidade. Assim, a pesquisa Modelos de EaD e saberes do professor tutor no Ensino Superior na modalidade a distância tem por objetivo reunir elementos que caracterizam os saberes e conhecimentos, bem como a atuação de professores tutores do Ensino Superior na modalidade a distância, que permitem delimitar a constituição e as especificidades da docência em EaD. Tem-se como objeto o contexto da socialização profissional do professor tutor, segundo diferentes modelos de EaD, e as respectivas implicações quanto aos saberes e à atuação desse profissional no Ensino Superior. Papéis, interações e conflitos nas relações docentes em um curso de licenciatura a distância analisa as relações docentes em um curso de licenciatura em matemática na modalidade semipresencial, contemplando o modelo de EaD adotado e as visões de polidocência. Enfatiza-se os papéis e formas de interação dos docentes coordenadores de disciplinas, tutores a distância e presenciais; as interrelações entre os saberes e práticas docentes; dinâmicas de atuação e conflitos relativos à autonomia destes agentes e às questões de profissionalização. Por sua vez, a pesquisa Tecnologias Digitais na EaD: perspectivas contemporâneas para a didática e prática de ensino apresenta o processo de formação em educação permanente em saúde no curso de pós-graduação lato sensu ―Formação Integrada Multiprofissional em Educação Permanente em Saúde (EPS em Movimento)‖, e aborda uma proposta baseada em aprendizagem problematizadora e significativa, perspectivas contemporâneas para a didática, a partir do estudo de caso em um curso de especialização semipresencial. Descreve-se essa experiência com base nos desafios que envolveram a participação no processo em três níveis: tutor, formador e aprendiz. Palavras-chave: Educação a Distância. Saberes Docentes. Tutoria. TECNOLOGIAS DIGITAIS NA EAD: PERSPECTIVAS CONTEMPORÂNEAS PARA A DIDÁTICA E PRÁTICA DE ENSINO Paulo Jorge de Oliveira Carvalho PEPG em Educação: História, Política, Sociedade da PUCSP RESUMO Este trabalho apresenta o processo de formação em Educação Permanente em Saúde (EPS) no curso EPS em Movimento pós-graduação lato sensu em EaD. Aborda uma proposta baseada em aprendizagem problematizadora e significativa, a partir de estudo de caso relativo a um curso de especialização na modalidade semipresencial em uma parceria entre o Ministério da Educação e uma universidade pública brasileira. O objetivo é descrever a experiência durante o período formativo do curso com base nos desafios que envolveram a participação no processo em três níveis de formação: tutor, formador e aprendiz. Trata-se de pesquisa de caráter qualitativo e de cunho documental XVIII ENDIPE Didática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira 110 ISSN 2177-336X

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A DOCÊNCIA NA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA: PAPÉIS, SABERES,

DESAFIOS E POSSIBILIDADES EM DIFERENTES MODELOS

A educação a distância é foco deste painel, no qual se abordam saberes, conflitos,

desafios e possibilidades da docência no desenvolvimento dos processos de ensino e

aprendizagem em diferentes modelos pedagógicos no âmbito dessa modalidade. Assim,

a pesquisa Modelos de EaD e saberes do professor tutor no Ensino Superior na

modalidade a distância tem por objetivo reunir elementos que caracterizam os saberes e

conhecimentos, bem como a atuação de professores tutores do Ensino Superior na

modalidade a distância, que permitem delimitar a constituição e as especificidades da

docência em EaD. Tem-se como objeto o contexto da socialização profissional do

professor tutor, segundo diferentes modelos de EaD, e as respectivas implicações

quanto aos saberes e à atuação desse profissional no Ensino Superior. Papéis, interações

e conflitos nas relações docentes em um curso de licenciatura a distância analisa as

relações docentes em um curso de licenciatura em matemática na modalidade

semipresencial, contemplando o modelo de EaD adotado e as visões de polidocência.

Enfatiza-se os papéis e formas de interação dos docentes coordenadores de disciplinas,

tutores a distância e presenciais; as interrelações entre os saberes e práticas docentes;

dinâmicas de atuação e conflitos relativos à autonomia destes agentes e às questões de

profissionalização. Por sua vez, a pesquisa Tecnologias Digitais na EaD: perspectivas

contemporâneas para a didática e prática de ensino apresenta o processo de formação

em educação permanente em saúde no curso de pós-graduação lato sensu ―Formação

Integrada Multiprofissional em Educação Permanente em Saúde (EPS em

Movimento)‖, e aborda uma proposta baseada em aprendizagem problematizadora e

significativa, perspectivas contemporâneas para a didática, a partir do estudo de caso em

um curso de especialização semipresencial. Descreve-se essa experiência com base nos

desafios que envolveram a participação no processo em três níveis: tutor, formador e

aprendiz.

Palavras-chave: Educação a Distância. Saberes Docentes. Tutoria.

TECNOLOGIAS DIGITAIS NA EAD: PERSPECTIVAS CONTEMPORÂNEAS

PARA A DIDÁTICA E PRÁTICA DE ENSINO

Paulo Jorge de Oliveira Carvalho

PEPG em Educação: História, Política, Sociedade da PUCSP

RESUMO

Este trabalho apresenta o processo de formação em Educação Permanente em Saúde

(EPS) no curso EPS em Movimento – pós-graduação lato sensu em EaD. Aborda uma

proposta baseada em aprendizagem problematizadora e significativa, a partir de estudo

de caso relativo a um curso de especialização na modalidade semipresencial em uma

parceria entre o Ministério da Educação e uma universidade pública brasileira. O

objetivo é descrever a experiência durante o período formativo do curso com base nos

desafios que envolveram a participação no processo em três níveis de formação: tutor,

formador e aprendiz. Trata-se de pesquisa de caráter qualitativo e de cunho documental

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por meio da análise de tecnologias digitais no Ambiente Virtual de Aprendizagem

(AVA). Os procedimentos metodológicos utilizados compreenderam a análise do diário

cartográfico do autor, no período do curso referente à capacitação para tutoria e, para

investigação do trabalho como formador, correspondente à segunda etapa do curso,

realizou-se coleta de dados em documentos digitalizados, assim como no material

didático, nos diários cartográficos e nos trabalhos de conclusão dos cursistas, e

analisaram-se as mediações dos tutores registradas no AVA. O referencial teórico-

metodológico no qual se desenvolve esta investigação baseia-se, em uma perspectiva

geral, nos estudos sobre didática e trabalho docente e, especificamente, nos estudos

sobre formação de professores em EPS, desenvolvidos pela equipe pedagógica do curso,

que discutem conceitos como caixa de afecções, diário cartográfico, tenda do conto,

outrar-se. Os resultados da narrativa sobre o processo de formação constataram

mudanças na compreensão do processo de formação em EPS realizado por docentes da

área da saúde assim como nas ações e estratégias implantadas nos diversos territórios

implicados pelo curso EPS em Movimento.

Palavras-chave: Educação Permanente em Saúde. Educação a Distância. Formação de

professores.

INTRODUÇÃO

Este trabalho apresenta estudo sobre o processo de formação em educação

permanente em saúde (EPS) ocorrido em curso de pós-graduação, nível de

especialização, promovido por uma universidade pública em parceria com o Ministério

da Saúde com a finalidade de compor a Política Nacional de Educação Permanente em

Saúde (PNEPS) no eixo de formação de tutores/facilitadores/orientadores para educação

permanente nas áreas de gestão e atenção à saúde.

O curso EPS em Movimento foi estruturado na modalidade semipresencial, com

360 horas/aula distribuídas entre momentos presenciais e a distância, cuja ação

formativa não se apresentava de forma linear ou modular permitindo que cada grupo

traçasse o próprio processo formativo com base nas suas vivências e experiências (EPS

EM MOVIMENTO, 2014a).

O trabalho docente, assim como a atividade clínica e de gestão institucional no

campo da saúde pública, contribuíram para o interesse deste pesquisador pelo curso de

EPS que sugeria inovação com base em proposta metodológica diferenciada na

modalidade de Educação a Distância (EaD) utilizando concepção de aprendizagem

problematizadora e significativa. Além disso, a participação no curso como tutor

responsável pela formação dos alunos enquanto realizava, concomitantemente, o meu

próprio processo de formação, assinalava os desafios que a experiência possibilitaria

para deslocar saberes e vivências profissionais e provocar mudanças no exercício da

docência.

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A inovação suscitada pela proposta do curso de pós-graduação que vislumbrava

prática diferenciada na constituição da docência mostrava-se conforme a estudos

realizados sobre a temática do trabalho docente – como se identifica em Marin (2005a),

ao discutir sobre didática e trabalho docente, e em Huberman (1992), na pesquisa

relativa ao ciclo vital da carreira dos professores – permitindo identificar no processo de

formação do curso uma oportunidade para desenvolver habilidades docentes com base

na experimentação de método de ensino diversificado assim como de novas práticas

pedagógicas. Na discussão sobre estudos que avaliam os modelos de desenvolvimento

profissional e os processos de mudanças dos docentes, Marcelo (1998) defende a

necessidade de ―considerarmos os professores como sujeitos cuja atividade profissional

os leva a envolver-se em situações formais de aprendizagem‖ (p. 64).

O envolvimento com a situação de aprendizagem proporcionada pelo curso EPS

em Movimento possibilitou a realização desta pesquisa que pretende investigar aspectos

inovadores das práticas didáticas propostas pelo modelo deste curso de EaD.

As bases teóricas do estudo serão apresentadas a seguir, assim como a pesquisa

com seus objetivos, procedimentos e resultados que dela emergem.

BASES TEÓRICAS

O campo teórico no qual se situa esta investigação origina-se, em uma

perspectiva geral, nos estudos sobre didática e trabalho docente – cujo marco encontra-

se nos trabalhos de Schön (1983), Marcelo (1998), e Marin (2005a; 2005b) – e,

especificamente, nos estudos sobre formação de professores em EPS desenvolvidos pela

equipe pedagógica do curso EPS em Movimento, com destaque para os trabalhos de

Emerson Merhy e de Laura Feuerwerker.

Pesquisas sobre formação de professores, preocupadas em analisar os processos

de mudança e inovação considerando, de uma maneira global e sistêmica, dimensões

organizacionais, curriculares, didáticas e profissionais, assim como centradas no

processo de aprender e ensinar dos professores, tem crescido quantitativa e

qualitativamente nos últimos anos permitindo o desenvolvimento de ―estudos que

analisam e avaliam os modelos de desenvolvimento profissional, bem como as

diferentes fases desse processo‖ (MARCELO, 1998, p. 63).

A proposta do curso EPS em Movimento parecia trazer algo novo, que se

diferençava de outros cursos de formação de educadores em saúde, cujo significado se

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materializava em uma “pedagogia do encontro‖ que visava a essas modalidades

diferentes ampliando conhecimentos e agindo de modo tecnológico (MERHY, 2013).

O cotidiano do trabalho como campo de aprendizado que produz conhecimento a

partir da reflexão sobre a prática está na base da discussão proposta por Schon (1983)

no que concerne à dissociação existente entre o saber e o fazer que, de acordo com o

autor, costuma ser muito presente na formação profissional docente. Tal distanciamento

estabelece uma hierarquia com relação à valorização do conhecimento produzido pelos

cientistas em detrimento daquele produzido pelos professores em sua prática, além de

uma relação temporal que determina que os conhecimentos disciplinares sejam,

necessariamente, acomodados ao repertório docente para, então, aplicá-los aos

problemas enfrentados na prática do cotidiano.

As estratégias didáticas para abordagem da EPS presentes no curso

apresentavam-se de forma bastante peculiar ao que se conhecia das ações propostas na

PNEPS para formação e desenvolvimento de trabalhadores para o setor da saúde

(BRASIL, 2004), e apontava para outras direções marcadas pela ―ruptura com a

dicotomia entre teoria e prática por meio da inversão da relação conteúdo teórico –

vivência, fazendo com que as vivências sejam as ordenadoras dos conteúdos teóricos‖

(MERHY, 2013).

No processo de formação do curso destacava-se a preocupação sobre o papel do

educador permanente em saúde ser diretivo ou não – caberia a ele propor algo

estruturado, como ocorre com a oferta de um texto, ou criar condições para construir o

aprendizado a partir do encontro? Vale dizer, hesitar entre as tecnologias duras e as

leves (MERHY, 1997; MERHY & FEUERWERKER, 2009).

A questão, da maneira como se formulava, requer esclarecimento de dois

conceitos que perpassam as bases teóricas deste estudo, quais sejam, trabalho docente e

Didática. Conforme Marin (2005b, p. 162), o trabalho docente resulta da articulação

entre o conhecimento que se tem dos alunos, no contato diário com eles, e as

teorizações sobre eles. Junta-se a isso o aprendizado adquirido com o conteúdo

sistematizado da área específica de conhecimento com a qual se trabalha (que possibilita

selecionar o que será transmitido) além dos conhecimentos sobre procedimentos

técnicos para compor as metodologias mais adequadas a cada momento.

Com relação à Didática, a autora alerta para a necessidade de que ―cumpra o

papel histórico de vincular-se ao campo científico, por um lado, e ao universo

prático, por outro lado” (MARIN, 2005b, p. 164, grifo do original), lembrando ainda

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sobre as dificuldades que rondam o atendimento a essas expectativas, uma vez que os

estatutos de ambos (teoria e prática) são muito diferentes entre si.

Da mesma forma, o mergulho no cotidiano de práticas profissionais a fim de

incentivar o compartilhamento de saberes enquanto instrumento de aprendizagem é

metodologia ainda rara no cotidiano profissional das equipes de saúde dificultando o

trabalho docente na formação de educadores na área. No ambiente formal de trabalho,

privilegiam-se eixos organizadores de atividades diárias com base em roteiros

predefinidos que se sustentam em regras funcionais, ―sem nenhuma combinação ou

construção coletiva, ou seja, sem escuta‖ (EPS EM MOVIMENTO, 2014b). De acordo

com os autores, o exercício do trabalho em Saúde é difícil, requer outrar-se, isto é,

desenvolver a ―capacidade de descobrir/produzir/acolher outros dentro de nós mesmos e

instigar nossa capacidade de criação, de desbravamento, de curiosidade diante do

mundo, ativando nossa potência diante da vida‖ (EPS EM MOVIMENTO, 2014c), e

agir interessado no outro, mantendo a escuta atenta, numa incansável tentativa de

permanecer na dimensão cuidadora e evitar a armadilha de supor ser dono de um certo

saber sobre o melhor modo de viver que serviria para todos, independente do sujeito que

sofre – para não incorrer na aceitação de uma ―única verdade possível e tornar-se objeto

da decisão do outro‖ (MERHY, FEUERWERKER & GOMES, 2010).

PESQUISA: OBJETIVOS, PROCEDIMENTOS E RESULTADOS

O processo de formação no curso EPS em Movimento ocorreu em duas etapas:

formação de tutoria, em busca de compartilhar um território de produção coletiva com

base nas diferentes inserções no mundo do trabalho pelos alunos, candidatos à tutoria; e

formação em EPS com a oferta e desenvolvimento de atividades formativas para

cursistas oriundos de diferentes municípios e regiões do território nacional. Durante

todo o processo, realizaram-se seis encontros presenciais além de atividades a distância

desenvolvidas em Plataforma Virtual hospedada em uma ―comunidade de Práticas‖ com

apoio do Observatório de Tecnologias em Informação e Comunicação em Sistemas e

Serviços de Saúde (BRASIL. MS/SAS/DAB, 2012).

Este trabalho tem o objetivo de descrever a experiência no processo de formação

do curso EPS em Movimento com base nos desafios que envolveram a participação

concomitante em seus três níveis de formação: tutor, formador e aprendiz.

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Para a realização do estudo, recuperei o meu diário cartográfico – registro de

afecções produzidas a partir das experiências no cotidiano do trabalho e instigadas pelo

processo de problematização e significação sobre a EPS (EPS EM MOVIMENTO,

2014d) – como fonte de consulta para o desenvolvimento do relato sobre o período do

curso referente à capacitação para tutoria. A segunda etapa do curso foi investigada por

meio da análise de mediações dos tutores no Ambiente Virtual de Aprendizagem

(AVA), cujos dados foram coletados em documentos do curso – normativas legais,

regras de funcionamento, proposta pedagógica, material e atividades didáticas, processo

avaliativo – digitalizados na plataforma, assim como da análise dos diários cartográficos

e dos trabalhos de conclusão de curso (TCC) dos cursistas. Com a análise dos diários

cartográficos e dos TCC, também pretendeu-se identificar os movimentos de EPS

produzidos in loco, no território de cada cursista, cujos resultados foram apresentados

no terceiro EP ocorrido entre tutores, alunos e formador, e entre formador e seu grupo

de tutores. Essa coleta de dados documentais compõe uma técnica importante em

pesquisa qualitativa ao desvelar aspectos novos de um determinado tema ou problema,

ou ao complementar informações obtidas por outras técnicas (LÜDKE e ANDRÉ,

1986).

O curso: procedimentos e materiais didáticos

A meta do curso tinha como objetivo formar um coletivo de 6000 profissionais

da área da saúde, educação e assistência espalhados por 435 regiões de saúde do Brasil

– em processo de especialização ou aperfeiçoamento – além dos 600 tutores capacitados

na primeira etapa do curso (EPS EM MOVIMENTO, 2014e).

Após a formação inicial, cada tutor responsabilizou-se pela formação de um

grupo com dez alunos com a cooperação e acompanhamento de seus formadores

iniciais, quantidade considerada abaixo do aceitável que são 20 a 30 alunos para um

acompanhamento que pretendia ser altamente eficaz, com base no uso das ferramentas

colaborativas e integrativas que compunham a tecnologia e as mídias nas quais se

estruturara o modelo pedagógico do curso.

Na segunda etapa do curso, por ocasião do início das atividades didáticas

correspondentes à formação dos cursistas – profissionais da saúde, da assistência e da

educação – recebi convite do núcleo condutor do projeto para compor a equipe

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pedagógica e assumir a função de formador, responsável pela formação acadêmica dos

tutores e pelo acompanhamento, orientação e supervisão da formação dos alunos.

Para a formação dos alunos, uma estratégia comum proposta pelo grupo de

tutores, e utilizada durante os três EP realizados na segunda etapa do curso, foi a tenda

do conto, resultado de uma experiência desenvolvida na rede de saúde pública de Natal-

RN como tecnologia de cuidado aos usuários da atenção básica à saúde daquele

município. Como afirma Merhy & Franco (2006), a tenda do conto é ―trabalho vivo em

ato‖ – nessa atividade, os alunos são convidados a participar e orientados a levar

consigo algo que represente um fato de sua história de vida. No local, monta-se uma

mesa decorada com todos os objetos trazidos e vários tipos de tecidos coloridos para

compor a tenda, que simula o conforto de uma sala de estar. Em torno desse ambiente

são dispostas cadeiras em formato de uma roda e, ao lado da tenda do conto, uma

cadeira cuidadosamente decorada, que a diferencia das demais, destinada a quem vai

contar a história, ou seja, àqueles ―que são narradores e autores de sua própria história”

(EPS EM MOVIMENTO, 2014f).

A proposta pedagógica do curso permitia que cada tutor, junto com seu grupo,

definisse um itinerário formativo singular. Esse percurso seria fundamentado em

necessidades identificadas no cotidiano assim como nas ações de educação permanente

delineadas pela cartografia construída no território a que pertenciam os profissionais, de

tal forma que todos pudessem explorar o material disponível e definir o ponto de início

―a partir de suas necessidades e afecções no território e no mundo do trabalho‖ (EPS

EM MOVIMENTO, 2014b).

Os objetivos se mostraram desafiadores pois (o curso) propunha ativar

processos de EPS nos territórios, reconhecendo práticas e saberes

existentes no cotidiano do trabalho. Ao incentivar a produção de

novos sentidos no fazer saúde se propunha estimular um encontro

entre trabalhadores e usuários, trabalhadores e gestores e

trabalhadores entre si na perspectiva da Educação Permanente em

Saúde (EPS). Esse convite aos trabalhadores do SUS se sustentava na

reinvenção das práticas de aprender, de cuidar e de fazer/viver a EPS

para potencializar o trabalho vivo em ato (TCC da tutora Raquel).

Trazer para o processo de aprendizagem um novo olhar na forma de

sentir, pensar, e fazer é outro convite (...). Inventar, vivenciar novos

experimentos, permitir-se, e gerar incômodos e estranhamentos é a

proposta. Um novo desenho começa ser formatado no processo

formativo (TCC da tutora Rossana).

[...] uma proposta ousada, que aposta na criatividade e autonomia dos

sujeitos, que acredita no poder de decisão e na capacidade de escolha

dos envolvidos, que rejeita a verticalidade entre professor e aluno,

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eliminando relações autoritárias e de poder, mas que valoriza as

relações horizontais, as experiências e vivências de cada um (TCC da

tutora Sonia).

O início do processo formativo poderia ocorrer a partir de qualquer entrada

disponível no AVA. Cabia aos tutores e formadores a ativação do recurso adequado, de

acordo com as demandas surgidas durante o processo. Como afirma a tutora Sonia, no

seu TCC, ―uma proposta que não privilegia conteúdos, mas que ousa fazer conexões

entre eles e o mundo do trabalho vivo no aqui e no agora‖.

Assim como discute Marin (2005a) sobre configuração do campo do ensino, ao

afirmar que a atividade didática independe de local para sua realização, de tal forma que

―não ocorre, necessariamente, apenas na sala de aula‖ (p. 36), no presente trabalho

entende-se que a forma como são apresentados os espaços de interação disponíveis no

AVA – fóruns, caixa de afecções, diário cartográfico, material didático – e pelas

possibilidades de exploração e utilização, também podem ser igualmente analisados

como dispositivos pedagógicos de ensino e aprendizagem.

Esses espaços apresentavam propostas de experiências distintas: o material

didático disposto em varais com os quais o aluno tinha contato a qualquer momento do

curso, sem uma sequência predeterminada, permitia ampliar o repertório teórico,

prepará-lo para conteúdos relacionados com o trabalho em saúde, organizar e dar

sentido à prática profissional cotidiana. A caixa de afecções, estava proposta como ―um

espaço de arquivo para os objetos relacionais, pinçados das suas experiências como

educador(es) no mundo da vida e do trabalho‖ (EPS EM MOVIMENTO, 2014g), no

qual compartilhavam-se cenas significativas da vida pessoal e profissional que

contribuíam para dar significado ao processo de formação em EPS, além de funcionar

como importante repositório de dados para alimentar os diários cartográficos durante o

desenvolvimento do curso.

Acho que o diferencial do curso é considerar o cotidiano trabalho

como estratégia de aprendizagem e, para mim, tornou muito mais fácil

a compreensão, pois estava abordando algo de minha realidade. Com

certeza, a utilização das estratégias e dos instrumentos do curso

possibilitou a contextualização do cotidiano (Diário cartográfico da

tutora Dayana).

Os fóruns serviam como terreno fértil às discussões de novas ideias surgidas a

partir das trocas de impressões sobre o material didático consultado e do

compartilhamento de experiências e vivencias cotidianas, além de ponto de referência

para sanar dúvidas sobre aspectos administrativos do curso. Espaços e ferramentas de

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interação que facilitavam o aprendizado coletivo e possibilitavam cumprir a proposta da

modalidade EaD do curso – construir uma cartografia viva em ato capaz de registrar e

narrar o movimento provocado pelo processo de formação em EPS.

O acompanhamento das narrativas produzidas pelos alunos contribuía para o

trabalho de orientação dos tutores que, com base nas discussões realizadas nos fóruns,

nos registros das caixas de afecções e dos diários cartográficos, selecionavam e

propunham textos disponíveis no varal de conteúdos, iniciavam novos fóruns e

mediavam as discussões.

Em todo momento, durante o curso, pude fazer um paralelo tanto entre

os textos quanto os instrumentos (caixa de afecções, fórum, diário

cartográfico) disponibilizados, com o nosso papel na tutoria a partir

das reflexões e discussões proporcionadas pelo grupo (TCC da tutora

Dayana).

A metodologia proposta com base no uso das ferramentas descritas inicialmente

encontrou resistência por parte dos alunos que se sentiam inseguros ou relatavam pouco

entendimento na maneira como utilizá-las. Como se pode verificar,

Não entendem a metodologia ativa, precisam de tarefas específicas,

prazos, provas e, como o curso apresenta a metodologia diferenciada,

onde cada aluno vai construindo o seu aprendizado a partir de nosso

apoio e das ferramentas disponibilizadas, não estão conseguindo dar

seguimento (Diário cartográfico da tutora Dayana).

Embora muito bem acolhidos, os alunos saíram com certo

estranhamento e muitas dúvidas quanto ao entendimento e

desenvolvimento do curso e na compreensão e manejo das

ferramentas a serem utilizadas no AVA: Diário Cartográfico, Caixa de

Afecções e Fóruns. Tudo isso era muito novo e bem diferente do que

estavam acostumados habitualmente. [...] Uma maneira de estudar

muito diferente da tradicional, e por isso, alguns tiveram dificuldade

de acreditar nela. Sentiam necessidade de um professor que lhes

explicasse e interpretasse os textos e que lhes dissessem o que e como

fazer, como era de costume. A possibilidade da liberdade de escolha e

de tomada de decisão foi, de certa forma, assustadora e gerou

insegurança em alguns que acabaram se perdendo no processo e

desistiram (Diário cartográfico da tutora Sonia).

No segundo EP – entre formador, tutores e seus alunos – foi possível verificar

como estavam sendo apropriadas as diretrizes operacionais propostas para o curso,

assim como os referenciais teóricos e, especialmente, permitiu escutar o grupo e

entender as dificuldades encontradas na utilização das ferramentas e dos espaços

disponíveis. De acordo com a tutora Raquel, “a estratégia utilizada para a condução foi

a de fazer o aluno protagonista do processo de modo a capacitá-los à multiplicação das

estratégias em seus ambientes de trabalho‖ (TCC).

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O conhecimento prévio do aluno assim como a valorização de suas situações

cotidianas são fundamentais para o processo de aprendizagem significativa (AUSUBEL,

NOVAK & HANESIAN, 1980). Valorizar a importância do aluno e de suas vivências

como suportes do processo de formação em EPS implicava em torná-lo responsável

pelo processo de aprendizagem significativa proposto. No TCC, a tutora Dayana reitera

que ―a EPS pode contribuir para a construção de novos sentidos para a prática do

processo de trabalho sendo a aprendizagem motivada pelo desejo dos participantes de

se apropriarem de novos saberes e novas práticas.”

Durante a realização daquele EP, a ausência de direcionamento na metodologia

aplicada – o que postar no diário cartográfico, proposição de leituras, tarefas e prazos

determinados para cumprimento das atividades – apresentou-se como sendo uma das

principais dificuldades por não se tratar de curso com uma metodologia mais diretiva.

Nessa oportunidade, os grupos firmaram novos acordos a fim de garantir a

continuidade do curso na plataforma e visando ao menor impacto possível na proposta

inicial do EPS em Movimento.

A mudança na metodologia dos fóruns contribuiu para o grupo se

sentir mais seguro e participativo, pois cada um deles passou a ter uma

função, uma responsabilidade. [...] Além disso, experimentaram ser

mediadores de fórum, e manter o fórum ativo e participativo (Diário

cartográfico da tutora Dayana).

Cada aluno deveria escolher um texto do varal ou cena, abrir um

fórum e mobilizar o grupo à participação. [...] Essa estratégia deu

muito certo e manteve os fóruns aquecidos do início ao fim do curso

(TCC da tutora Raquel).

A ação parece ter contribuído para consolidar o protagonismo dos cursistas e

retomar a discussão sobre a importância do trabalho em equipe nos processos do

cotidiano dos serviços. Por exemplo, é o que se observa no trecho a seguir:

[...] acredito que todas as experiências vividas durante este período me

fizeram passar por vários momentos: o de repensar, de me implicar, de

buscar, de me afetar e de tentar afetar. Mas acima de tudo, foi um

momento de me afetar enquanto educadora, pois cheguei à conclusão

que não conseguimos afetar alguém se não estivermos afetados

(Diário cartográfico da tutora Dayana).

No tocante ao processo de avaliação dos alunos, foram estabelecidos alguns

critérios que o qualificassem como ferramenta de investigação sobre a produção de

conhecimento construída por cada cursista durante o seu processo formativo. Para tanto,

a avaliação deveria ser processual e compreendeu três critérios, quais sejam, o grau de

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participação do aluno (no AVA e durante os EP), a construção do diário cartográfico e a

elaboração de um produto final para apresentação no último encontro presencial.

Os resultados alcançados na pesquisa realizada, com base nos registros dos

diários cartográficos, nas mediações realizadas no AVA, assim como nos trabalhos de

conclusão de curso dos tutores e especializandos, constataram mudanças na

compreensão do processo de formação em EPS realizado por docentes da área da saúde,

e incremento de programas de EPS desenvolvidos no cotidiano do trabalho dos cursistas

marcados por mudanças nos serviços de saúde e na dinâmica de funcionamento dos

trabalhadores, assim como nas ações e estratégias implantadas nos diversos territórios

implicados pelo curso EPS em Movimento.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nas três dimensões em que foi vivenciado o processo de formação em educação

permanente em saúde proposto pelo curso EPS em Movimento – tutor, formador e

aprendiz – relatadas neste trabalho, configurou-se um grande desafio conciliar a EPS

com os recursos pedagógicos oferecidos pelo modelo deste curso de EaD. Porque isso

implicou em manejar ferramentas do universo da pura racionalidade tecnológica, e suas

inexoráveis limitações, com a subjetividade característica do universo das relações

humanas, repleto de possibilidades e de pontos de entrada e saída.

O desafio constantemente presente – como aprendiz, tutor ou formador – em

transformar aquele ambiente "virtual" de aprendizagem em um cenário de verdadeiros

encontros e interação tornou-se eixo norteador no direcionamento do processo de

formação em educação permanente em saúde. Tanto nos momentos da oferta de textos,

cenas e experiências, nos quais o convite se dava ao encontro de si mesmo, por meio da

introspecção e da reflexão propiciados por esses estímulos como no incentivo à

participação nos fóruns, chats e diários, bombardeados por afecções, relatos e

discussões, nos quais o convite direcionava ao encontro com a vida uns dos outros.

O relato registrado nas mediações realizadas pelos tutores assim como nos seus

trabalhos de conclusão de curso demonstraram que o curso EPS em Movimento, na

modalidade a distância, representou um passo adiante no processo de formação de

docentes em educação permanente em saúde justamente porque nos convidou a

mergulhar na experiência, sem que precisássemos nos afogar nela, permitindo o suporte

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

120ISSN 2177-336X

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dos dispositivos pedagógicos disponíveis para organizar-lhe o sentido no cotidiano das

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MODELOS DE EAD E SABERES DOCENTES DO PROFESSOR TUTOR NO

ENSINO SUPERIOR NA MODALIDADE EAD

Roberta Rossi Oliveira Palermo

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP

RESUMO

Na presente comunicação que tem por objeto de estudo o contexto da socialização

profissional do professor tutor, segundo os modelos de EaD e as respectivas implicações

quanto aos saberes docentes e a atuação do professor tutor no ensino superior na

modalidade a distância, por conseguinte o objetivo é reunir elementos que caracterizem

os saberes e conhecimentos de base de professores tutores no ensino superior na

modalidade a distância, bem como sua atuação profissional, que permitam o

reconhecimento do trabalho do professor tutor como mais uma faceta do trabalho

docente. Esta pesquisa inclui, inicialmente, uma pesquisa bibliográfica e, em seguida,

incluirá pesquisa documental e pesquisa de campo sobre saberes docentes,

conhecimentos e práticas profissionais do professor tutor no ensino superior na

modalidade a distância. Como fontes de apoio teórico o estudo propõe considerar

autores que estão relacionados com a área da Sociologia da Educação, especialmente no

que tange aos saberes docentes e às relações que se estabelecem entre docência e

identidade profissional. No que tange à compreensão da natureza dos saberes docentes e

suas fontes de aquisição pelo professor, Maurice Tardif e Danielle Raymond, bem como

em relação à compreensão do trabalho docente, Maurice Tardif e Claude Lessard. Para

compreender as condições necessárias à inserção profissional docente e sua valorização

social, Denise Vaillant; Carlos Marcelo Garcia, para compreender os saberes da

experiência adquiridos no espaço docente; Claude Dubar, referência específica dos

demais autores para definição de identidade profissional docente; e Lee Shulman para

identificar o pensamento do professor tutor e os conhecimentos profissionais de base

para o exercício de sua função docente. Como resultado inicial em relação à pesquisa de

campo – foi definida a amostra das instituições a serem investigadas/pesquisadas,

resultando no total de 10 instituições/cursos de excelência a serem

investigadas/pesquisadas.

Palavras-chave: Educação a Distância/EaD; Ensino Superior; Saberes e práticas

docentes do Professor Tutor.

INTRODUÇÃO

Da pesquisa realizada por Palermo (2013) e que se tornou a Dissertação de

Mestrado intitulada ―Formação e Identidade do Professor Tutor no Ensino Superior na

Modalidade a Distância: a produção de Teses e Dissertações brasileira na área de

educação (2001-2010)‖, o foco de análise foi a busca pela compreensão da formação e

identidade do professor tutor. Como professora tutora sempre questionei o processo de

contratação e consequentemente de atuação dos professores tutores, afinal são

considerados profissionais ―de segunda classe‖, sendo inclusive, intitulados apenas,

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tutores – não pertencentes à carreira docente. Desse modo, seus saberes e sua atuação

não são considerados ―docentes‖.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação - LDB 9394, de 20 de dezembro de

1996, incluiu em seu texto:

Art. 80. O Poder Público incentivará o desenvolvimento e a

veiculação de programas de ensino a distância, em todos os níveis e

modalidades de ensino, e de educação continuada. (BRASIL, 1996).

Na lei, esse texto faz parte do ―TÍTULO VIII – Das Disposições Gerais‖,

destinado a tratar, além da Educação a Distância a Educação Indígena, sendo essas -

consideradas modalidades de educação, tais como: a Educação de Jovens e Adultos —

EJA, Educação Profissional e Tecnológica e a Educação Especial. Para cada

modalidade há um conjunto de pareceres, diretrizes, entre outros documentos que

fundamentam e organizam o desenvolvimento das mesmas.

Assim, se o poder público ―incentivará‖ a modalidade de educação a distância,

torna-se possível a conclusão de sua importância para o país.

Com a atualização do documento ―Referenciais de Qualidade para Educação a

Distância‖, tendo sua primeira versão em 2003 (sem disponibilidade no endereço

eletrônico do MEC – Ministério da Educação), tem-se explicitado:

No Brasil, a modalidade de educação a distância obteve respaldo legal

para sua realização com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação – Lei

9.394, de 20 de dezembro de 1996 –, que estabelece, em seu artigo 80,

a possibilidade de uso orgânico da modalidade de educação a distância

em todos os níveis e modalidades de ensino. Esse artigo foi

regulamentado posteriormente pelos Decretos 2.494 e 2.561, de 1998,

mas ambos revogados pelo Decreto 5.622, em vigência desde sua

publicação em 20 de dezembro de 2005. (BRASIL, 2007).

Nesse documento – ―Referenciais de Qualidade para Educação a Distância‖,

entre outros pontos é mencionado o ―entendimento‖, por parte do MEC – Ministério da

Educação, acerca de modelo de educação a distância:

Não há um modelo único de educação à distância! Os programas

podem apresentar diferentes desenhos e múltiplas combinações de

linguagens e recursos educacionais e tecnológicos. A natureza do

curso e as reais condições do cotidiano e necessidades dos alunos são

os elementos que irão definir a melhor tecnologia e metodologia a ser

utilizada, bem como a definição dos momentos presenciais

necessários e obrigatórios, para estágios supervisionados, práticas em

laboratórios de ensino, tutorias presenciais nos pólos descentralizados

de apoio presencial e outras estratégias. (BRASIL, 2007).

Será esse – um modelo único de EaD, um dos entraves do reconhecimento dos

saberes dos professores tutores, como saberes de natureza ―docente‖? Afinal, ainda que

o MEC – Ministério da Educação, não admita a indicação de um modelo de EaD, a

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124ISSN 2177-336X

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UAB – Universidade Aberta do Brasil, tem sido reconhecida e amplamente ―copiada‖

pelas instituições de ensino superior, particulares. Desse modo, organizando a

modalidade de educação a distância, no país. Mesmo tornando-se um ―modelo‖ de

educação a distância, esse é limitado para as potencialidades da modalidade no país.

Acreditamos que o MEC esteja equivocado ao estabelecer que há

apenas um único modelo de qualidade na EaD, e que é este o modelo

adotado pela Universidade Aberta do Brasil (UAB), importante

projeto do próprio Ministério. O MEC diz que é apenas no formato da

educação ―semipresencial‖ (a mistura do presencial com a EaD), com

atendimento regular de alunos em polos presenciais, é que existe

―qualidade‖. Essa visão diminui as possibilidades de experimentação,

de inovação e de abordagens pluralistas, fatores altamente positivos,

defendidos na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (n.

9.394/1996). Da mesma forma, representam uma atitude conservadora

e fechada. Por exemplo, o MEC exige biblioteca presencial e

específica para cada curso oferecida no polo, e não aceita bibliotecas

digitais online, ou a possibilidade de a biblioteca central da

universidade enviar livros solicitados pelos alunos. (LITTO, 2008,

apud GIOLO, 2010, p. 1290).

Diante das problemáticas questões, que se colocavam na época, como o modelo

de EaD e a definição de atividades de profissionais como os ―Tutores‖, que

necessitavam de ampla discussão, encaminhamentos e fundamentalmente diretrizes, é

extinta a SEED – Secretaria de Educação a Distância, pelo MEC – Ministério da

Educação, que segundo Moran (2011): ―A lógica é entrar em uma normalidade,

contemplando os mesmos instrumentos para as modalidades a distância e presencial‖, e

Moran (2011) acrescenta: ―Porém, dependendo de como esse processo seja feito, a

educação a distância corre o risco de não ser prioridade tendo em vista as outras

demandas do MEC.‖

BASES TEÓRICAS

Como fontes de apoio teórico o estudo propõe considerar autores que estão

relacionados com a área da Sociologia da Educação, especialmente no que tange aos

saberes docentes e às relações que se estabelecem entre docência e identidade

profissional.

Nos estudos realizados, buscando compreender a inserção profissional do

professor tutor com o apoio de Vaillant (2009) foi possível considerar que não há, no

início da carreira docente na modalidade a distância, uma preparação para seu exercício,

uma vez que a função de professor tutor não compõe a carreira de professor, assim esse

profissional pode ser, por vezes, um profissional menos qualificado e que não tenha

também experiência docente. A falta de reconhecimento do trabalho como professor

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tutor passa então a desvalorização da atuação desse profissional, resultando em

frustração e desmotivação do professor tutor, com consequências na qualidade dos

processos de ensino e aprendizagem, nessa modalidade de educação.

Com base nos estudos de Tardif & Raymonds (2000) foi possível identificar que

no conjunto dos saberes docentes, suas fontes e formas de integração à prática, o

exercício da função de professor tutor é somente mais uma faceta da profissão docente,

pois a natureza do trabalho que ambos realizam na modalidade a distância ou presencial

é a mesma, diferenciando-se apenas na forma de tratar a mediação do conhecimento e a

relação professor aluno, que serão facilitadas pela tecnologia na EaD e, bem como por

vezes, também na modalidade presencial é utilizado esse recurso.

Saberes docentes não se restringem a um conjunto de saberes pautados ou

passíveis de serem organizados, por exemplo, em uma disciplina, mas sua compreensão

deve ser ampliada. Os saberes docentes são compreendidos a partir da noção de saber,

que tem como pressuposto a contribuição de (Tardif; Raymonds, 2000, p. 212): ―[...] a

noção de ―saber‖ em sentido amplo, que engloba os conhecimentos, as competências, as

habilidades (ou aptidões) e as atitudes dos docentes, ou seja, aquilo que foi muitas vezes

chamado de saber, de saber-fazer e de saber-ser‖.

Nessa perspectiva de análise, encontra-se aqui o princípio dinâmico de qualquer

profissão:

No fundamento da análise das profissões é, pois, necessário considerar

o princípio de que uma profissão é uma realidade dinâmica e

contingente, baseada em ações coletivas de um grupo, cuja identidade

se constrói através de interações com outros grupos, instâncias e

atores diversos. Nesta ótica, uma profissão não remete, como o

pretende o estruturo-funcionalismo, para uma coleção de atributos de

base definidos uma vez por todas; é em primeiro lugar, uma

construção social que é necessário analisar, tendo em conta diferentes

interações através das quais o grupo profissional (ou aspirando

profissionalizar-se) monopoliza, mantém e renova o seu território,

assim como os seus privilégios e estatutos, tanto materiais como

simbólicos. Por outras palavras, é necessário passar de uma visão

substancialista e objetiva das profissões a uma visão construtivista e

dinâmica. (TARDIF; LESSARD; GAUTHIER, 1998, p. 11).

Segundo (Tardif; Lessard; Gauthier, 1998, p. 11) a noção de construção social

coloca as profissões numa realidade sócio histórica, mas por outro lado, não está

reduzindo-a ao determinismo, que para os respectivos autores significa “... “leis da

história”, “forças sociais”, “tendências históricas”, “mecanismos objetivos”...” mas,

destacando a ação dos atores sociais que, independentemente de estarem inseridos em

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contextos pré-determinados, movimentam-se, atuam e modificam o ambiente, tornando-

o assim distinto de outros.

Então, ainda que se tenha a inclusão – do professor tutor na regulamentação da

profissão de professor, e cabe aqui destacar a importância desse ato, não será por ele

definida a identidade do profissional – no caso desta pesquisa, a de ―professor tutor‖.

Sobretudo em relação ao reconhecimento social do tutor como professor.

No artigo intitulado ―Desenvolvimento Profissional Docente: passado e futuro”,

Marcelo (2009), considera:

Deve entender-se o desenvolvimento profissional dos professores

enquadrando-o na procura da identidade profissional, na forma como

os professores se definem a si mesmos e aos outros. É uma construção

do eu profissional, que evolui ao longo das suas carreiras. Que pode

ser influenciado pela escola, pelas reformas e contextos políticos, e

que integra o compromisso pessoal, a disponibilidade para aprender a

ensinar, as crenças, os valores, o conhecimento sobre as matérias que

ensinam e como as ensinam, as experiências passadas, assim como a

própria vulnerabilidade profissional. As identidades profissionais

configuram um complexo emaranhado de histórias, conhecimentos,

processos e rituais. (MARCELO, 2009, p. 7).

Há que se considerar que a sua identidade profissional – professor tutor precisa

ser analisada com base nos dois processos identitários básicos de que fala Dubar (1997):

o biográfico e o relacional.

Apesar da heterogeneidade desses dois processos, biográfico (identidade para si)

e relacional (identidade para outro), ambos utilizam ―esquemas de tipificação‖ que

pressupõe a existência ―[...] de um número limitado de modelos socialmente

significativos para realizar combinações coerentes de identificações fragmentárias‖

(Dubar, 1997, p.110). Tem-se, portanto, categorias que servem, tanto para identificar os

outros, quanto para identificar a nós mesmos. Elas variam em relação aos espaços

sociais e ao tempo histórico e biográfico onde se desenvolveram as trajetórias sociais.

Lee Shulman (2005) traz contribuições importantes para a investigação do

pensamento do professor e de seus conhecimentos profissionais. Esse autor tem

identificado às fontes e os esquemas gerais desses conhecimentos que são essenciais

para a atividade de ensino e para o exercício da docência. Tais conhecimentos são: a)

Conhecimento do conteúdo; b) Conhecimento didático geral; c) Conhecimento do

currículo; d) Conhecimento didático do conteúdo; e) Conhecimento dos alunos e de

suas características; f) Conhecimento dos contextos educativos; e g) Conhecimentos

dos fins educativos.

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Entre todos esses conhecimentos, o autor atribui especial importância ao

conhecimento didático do conteúdo, pois nele se identificam os conhecimentos

característicos para o ensino. Por intermédio dele, é possível distinguir a compreensão

do professor sobre determinada área do saber e sobre como os ―[...] temas y problemas

se organizan, se representan y se adaptan a los diversos intereses y capacidades de los

alumnos, y se exponen para su enseñanza‖ (Shulman, 2005, p. 11).

É ampliada a perspectiva de compreensão dos significados da docência na

modalidade a distância, quando:

Na tentativa de compreender a natureza do trabalho pedagógico a

partir da intensificação do uso de tecnologia digitais na educação

(presencial ou a distância), a polidocência demonstra que o trabalho

docente encaminhou-se para um parcelamento e que na EaD ele é

ainda mais intensivamente fragmentado do que na educação presencial

(Mill, 2002). Na educação presencial, predomina a responsabilização

de um único professor pelas diversas atividades integrantes de sua

disciplina: a organização das aulas, o desenvolvimento do conteúdo –

podendo exercer certa liberdade, apesar do direcionamento dado pelos

livros didáticos, entre outras predefinições -, a orientação das

atividades pedagógicas, a avaliação da aprendizagem, a gestão da sala

de aula, bem como o acompanhamento do desempenho discente.

Normalmente no âmbito da EaD, a responsabilidade pelas atividades é

distribuída. (MILL, 2014, p.27).

Com a contribuição de Mill (2014) o conceito de docência é ampliado. Para o

autor não existe na modalidade de educação a distância a figura de um único professor.

Mill (2014) insere o conceito de polidocência nessa modalidade de educação, sobretudo

quando considera o quanto o ato docente foi fragmentado e, paradoxalmente,

coletivizado e integrado por profissionais da área de educação, como por exemplo, o

designer instrucional.

Outros autores corroboram com a contribuição de Mill (2014), quando

consideram:

[...] o ensino, com suas formas clássicas de trabalho com os alunos

(turma fechada, responsável de um grupo, de uma disciplina,

focalização na instrução, fraca ligação com os outros agentes etc.)

passa atualmente por uma fase de transformação importante, isto é,

passa por uma mutação caracterizada por processos de decomposição

e de recomposição do trabalho docente tradicional através dos quais se

instauram, por segmentação, diferenciação, delegação e degredo,

novos territórios de trabalho educativo, bem como pelas novas

práticas e modalidades de educação assumidas por novos agentes ou

por antigos agentes reconvertidos aos novos ofícios de educação. O

docente regular certamente permanece uma das figuras centrais da

escola contemporânea, mas esta figura vê-se doravante decomposta e

recomposta novamente, entrando em ressonância com formas plurais

do trabalho educativo e com a emergência de formas coletivas ou

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compartilhadas de educação dos alunos. (TARDIF; LEVASSEUR,

2011, p.12, grifo nosso).

Além disso, como conceito que deverá ser ampliado – a tecnologia, com a

contribuição de (Marcuse, 1999, p. 73), ―[...] é vista como um processo social no qual a

técnica propriamente dita (isto é, o aparato técnico da indústria, transportes,

comunicação) não passa de um fator parcial.”. Afinal, ainda que a modalidade de

educação a distância, seja reduzida ao uso de um computador, sintetizando-a como a tal

tecnologia, é preciso ampliar esse conceito:

Não estamos tratando da influência ou do efeito da tecnologia sobre os

indivíduos, pois são em si uma parte integral e um fator da tecnologia,

não apenas como indivíduos que inventaram ou mantém a maquinaria,

mas também como grupos sociais que direcionam sua aplicação e

utilização. A tecnologia, como modo de produção, como a totalidade

dos instrumentos, dispositivos e invenções que caracterizam a era das

máquinas, é assim, ao mesmo tempo, uma forma de organizar e

perpetuar (ou modificar) as relações sociais, uma manifestação do

pensamento e dos padrões de comportamentos dominantes, um

instrumento de controle e dominação. (MARCUSE, 1999, p.73).

Ao tentar analisar o contexto educacional, esse não está descolado do contexto

mais amplo – contexto social, no qual está inserida toda a perspectiva de análise, até

aqui apresentada.

Na pesquisa realizada no Mestrado, já mencionada, foi possível identificar que o

trabalho do professor tutor é altamente impactado pelo excesso de regras e controles

para ―garantir‖ o processo educacional, e nesse momento, não se coloca em discussão, a

questão da qualidade desse processo, mas sobretudo o registro, como uma forma de

prestação de contas – controle do processo educacional, pelo professor tutor, ou melhor,

pela instituição em que ele – o professor tutor atua. Faz todo o sentido a utilização

dessas palavras, tais como: prestação de contas e controle, afinal, a educação na

modalidade a distância tornou-se em muitos casos, uma mercadoria.

Ainda em relação à pesquisa realizada no Mestrado, cumpri acrescentar que a

rotina de trabalho desse profissional indica que ele adota uma ―lógica‖ própria para

exercício de sua função, a partir de: a) referenciais pessoais; b) referenciais de

formação; e c) características do modelo a distância em que atua.

Buscando aproximar-se desse contexto educacional, que está inserido no

contexto social, encontra-se uma perspectiva de análise - a racionalização tecnológica,

que considera:

A racionalização tecnológica criou uma estrutura comum de

experiência para as várias profissões e ocupações. Esta experiência

exclui ou restringe aqueles elementos que transcendem o controle

técnico sobre os fatos e, assim, amplia o alcance da racionalização do

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mundo objetivo para o subjetivo. Por debaixo da complexa rede de

controle estratificado encontra-se uma série de técnicas mais ou

menos padronizadas, tendendo a um padrão geral, que assegura a

reprodução material da sociedade. (MARCUSE, 1999, p. 92).

Isto posto, é preciso considerar que ―[...] No decorrer do processo tecnológico,

uma nova racionalidade e novos padrões de individualidade se disseminaram na

sociedade, diferentes e até mesmo opostos àqueles que iniciaram a marcha da

tecnologia.‖ (Marcuse, 1999, p. 74).

A secretária de educação da cidade de Helsinque, ―a maior rede do país, com

198 escolas, 36.000 alunos e 3.000 professores.”, em entrevista intitulada ―Na

Finlândia, competência toma lugar do conteúdo: Redesenho do sistema educacional

coloca projetos transversais à frente de disciplinas. ‖, realizada pelo site PORVIR,

considera:

O modo tradicional de ensino foi feito para a era industrial, com todos

os trabalhadores fazendo a mesma coisa e se mostrando obedientes,

mas para o amanhã e para o futuro é necessário fazer diferente e

desenvolver habilidades individuais e, ao mesmo tempo, demonstrar

colaboração, capacidade de inovar, ter coragem para fracassar e

encontrar novos modos de fazer as coisas. (KYLLÖNEN, 2015).

Coloca-se uma reflexão importante a fazer, afinal que caminhos acerca da

educação no Brasil, especialmente na modalidade a distância, estão sendo organizados,

construídos?

PESQUISA: OBJETIVO, PROCEDIMENTOS E RESULTADOS

O objeto de pesquisa é o contexto de socialização profissional do professor

tutor, mais especificamente: os modelos de EaD e as respectivas implicações quanto

aos saberes docentes e a atuação do professor tutor.

O objetivo é reunir elementos que explicitem, em diferentes contextos

institucionais e respectivos modelos de EaD, os processos de socialização profissional e

construção de identidade, caracterizando os saberes, conhecimentos de base e as

práticas de professores tutores no ensino superior, na modalidade a distância, que

permitam o reconhecimento do trabalho do professor tutor, como um trabalho de

natureza docente.

Esta pesquisa inclui, inicialmente, uma pesquisa bibliográfica e, em seguida,

incluirá pesquisa documental e pesquisa de campo.

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130ISSN 2177-336X

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Segundo Giovanni (2011), no que tange à metodologia de pesquisa – pesquisa

bibliográfica – cumpre assinalar que os dados a serem coletados – decorrentes do

levantamento bibliográfico – podem ser reunidos segundo perspectiva de análise

proposta por Mey (apud GIOVANNI, 2011), que toma as pesquisas como integrantes de

um contexto social mais amplo, que implica a presença de diferentes ―vozes‖ ou

―personagens‖, num tempo e espaço específicos que lhes conferem sentido:

- quando foram realizadas as pesquisas?

- quem são os pesquisadores?

- de onde falam?

- sobre o que ou quais aspectos da temática central se voltam suas análises?

- como foram realizadas as pesquisas?

Em relação à pesquisa documental cumpre assinalar que ela se dará com

auxílio de Roteiro para análise de documentos, a ser construído e testado, e incidirá

sobre: legislação específica sobre ensino superior a distância no Brasil e documentos

norteadores das diferentes instituições a serem identificadas e pesquisadas. Trata-se de

reunir, nesta etapa da investigação, informações capazes de permitir a composição do

perfil ou contexto dos fatos, instituições, sujeitos e situações em estudo.

No que tange à pesquisa de campo destaca-se aqui o fato de que ela se refere,

especificamente, à localização, seleção e estudo das instituições e sujeitos a serem

investigados.

Paralelamente às leituras teóricas, foi iniciado o mapeamento das fontes de

pesquisa em nível nacional e internacional, com vistas a localizar e conhecer os estudos

já realizados sobre a temática a ser investigada. O universo da pesquisa bibliográfica

realizada abrangeu diferentes fontes, nacionais e internacionais, dada a importância do

tema e, contraditoriamente, a escassez de pesquisas realizadas, especialmente em

âmbito nacional.

Assim, inicialmente, as fontes identificadas foram:

SciELO - Scientific Electronic Library Online;

Banco de Teses e Dissertações da CAPES – Coordenação de Aperfeiçoamento de

Pessoal do Ensino Superior.

OU - The Open University – Reino Unido;

UNED – Universidad Nacional de Educación a Distancia – Espanha;

UAb – Universidade Aberta de Portugal;

FU – FernUniversität in Hagen – Alemanha;

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

131ISSN 2177-336X

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UNISA – University of South Africa – África do Sul;

ESC – Empire State College – Estados Unidos;

TÉLUQ – Tele Université – Canadá

ABED – Associação Brasileira de Educação a Distância;

Revistas da área de Educação, especialmente às relacionadas a modalidade de EaD,

identificadas por nível de qualidade CAPES/QUALIS A1, A2, A3, B1;

Congressos representativos na área de educação, especialmente com foco na

modalidade de educação a distância;

Os descritores utilizados para todas as fontes mencionadas foram: “saberes

docentes do professor tutor” e “atuação do professor tutor” e como parâmetro para

localização dos possíveis trabalhos, o período delimitado foi o de 2001-2012,

lembrando, que para as instituições estrangeiras os descritores foram traduzidos, assim

tem-se respectivamente: “knowledge of teachers tutor” e “tutor teacher performance”.

Um dado importante a mencionar é o fato dos quadros elaborados para cada

fonte de pesquisa, estarem estruturados de forma distinta, isso se deve ao fato de que

cada fonte de pesquisa, disponibiliza suas informações de uma forma diferente. Assim,

inicialmente, buscou-se incluir o maior número de informações, considerando os

parâmetros definidos para esse levantamento inicial: a) descritores ―saberes docentes do

professor tutor” e “atuação do professor tutor” e b) período delimitado de 2001-2012,

contudo, em algumas fontes, não foi possível incluir na busca inicial o período

temporal.

Os quadros elaborados visam responder às perguntas elencadas na metodologia

apresentada, para essa etapa da pesquisa, tais como: -quando foram realizadas as

pesquisas?; quem são os pesquisadores?; de onde falam?; sobre o que ou quais aspectos

da temática central se voltam suas análises?; e como foram realizadas as pesquisas?

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como a pesquisa encontra-se em andamento, pretende-se com o cumprimento da

primeira etapa - pesquisa bibliográfica, identificar e caracterizar as pesquisas sobre essa

temática, bem como investigar as perspectivas de análises presentes nos trabalhos

selecionados, explicitando como ficam definidos os saberes e conhecimentos de base de

professores tutores no ensino superior na modalidade a distância, bem como sua atuação

profissional que permitam o reconhecimento do trabalho do professor tutor como

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132ISSN 2177-336X

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trabalho docente. Na segunda etapa – com a pesquisa documental, tem-se o objetivo,

por meio do exame da legislação específica sobre ensino superior na modalidade a

distância no Brasil e de documentos norteadores das diferentes instituições que foram

identificadas, reunir nesta etapa da investigação, informações capazes de permitir a

composição do perfil ou contexto dos fatos, instituições, sujeitos e situações em estudo.

E por último, a pesquisa de campo – já definida a amostra com base no (ENADE -

Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes), que considerou como critério de

seleção das instituições/cursos a serem investigados/pesquisados, a permanência com a

nota máxima – 5, em pelo menos dois dos exames ENADE, aplicados nos anos de

2005/2008/2011. O que resultou no total de 10 instituições/cursos de excelência a serem

investigadas/pesquisadas – 8 (oito) instituições públicas e 2 (duas) instituições

particulares, concentrando-se nas regiões Sudeste e Sul do Brasil, exceto 1 (uma)

instituição pública, que se encontra no Nordeste do país, em Natal/Rio Grande do Norte.

Essa etapa incluirá: a) levantamento do universo das instituições que oferecem

ensino superior na modalidade a distância e respectivos professores tutores, b)

localização, seleção e estudo das instituições e sujeitos a serem investigados (a partir de

critérios previamente definidos), e c) construção e teste de instrumentos para coleta de

dados (Questionário, Roteiro de Entrevista e Roteiro de Análise de Documentos), com

base nos objetivos, hipótese e questões de pesquisa, bem como nos conceitos teóricos

norteadores da pesquisa.

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PAPÉIS, INTERAÇÕES E CONFLITOS NAS RELAÇÕES DOCENTES

EM UM CURSO DE LICENCIATURA A DISTÂNCIA

Marcelo da Silva Correa – UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

Luciene Cerdas – UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

Resumo

O objetivo deste trabalho é discutir a docência na Educação a Distância. Enfatiza-se

aqui, a partir da discussão teórica que envolve o conceito de polidocência na Educação a

Distância, os papéis e as formas de interação dos docentes coordenadores de disciplinas,

conteudistas, tutores a distância e tutores presenciais; as inter-relações entre os saberes e

as práticas docentes; as dinâmicas de atuação e os conflitos referentes à autonomia

relativa destes agentes e às questões de profissionalização. Toma-se como contexto

específico o curso de Licenciatura em Matemática a Distância da Universidade Federal

Fluminense, oferecido, na modalidade semipresencial, por meio do Centro de Educação

Superior a Distância do Estado do Rio de Janeiro - o Consórcio CEDERJ, com o

suporte do Sistema Universidade Aberta do Brasil (UAB). Contempla-se o modelo de

EaD adotado e as visões de polidocência que o permeiam, com destaque para as

especificidades do modelo de organização didático-pedagógica e administrativa do

curso; as particularidades da docência nesse modelo, no qual diferentes sujeitos exercem

funções diversas em prol de um projeto comum; e os desafios da interlocução entre

esses sujeitos. Esta é uma investigação exploratória, de cunho qualitativo, que pretende

contribuir para o processo de compreensão, documentação, ressignificação e

aperfeiçoamento das relações docentes neste contexto, sendo que as análises são

baseadas também nas experiências vivenciadas pela equipe de coordenação do curso e

os desafios enfrentados na gestão acadêmica de pessoas e de processos. O tema terá

desdobramentos em pesquisas futuras, qualitativas e quantitativas, que envolverão

instrumentos de investigação direcionados aos diferentes sujeitos do processo

educacional.

Palavras-chave: Educação a Distância. Polidocência. CEDERJ

1. Introdução

Embora não seja novidade, a EaD ainda é permeada por uma aura de

desconfiança e descrença quanto a sua eficiência na materialização das políticas de

formação de professores no Brasil. No entanto, não se pode desprezar o fato de que,

assumida no conjunto das políticas nacionais como estímulo à formação inicial e

continuada de professores, a EaD tem amplo alcance geográfico, graças ao uso de

tecnologias e da Internet. Fica claro no decreto 5800, de 2006, na criação do sistema

Universidade Aberta do Brasil (UAB) seu objetivo ―[…] de expandir e interiorizar a

oferta de cursos e programas de educação superior no País‖, aumentando a oferta de

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136ISSN 2177-336X

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vagas nas instituições públicas de ensino superior, considerando a abrangência das

tecnologias.

Segenreich (2009) chama a atenção para a nova configuração do corpo docente

das universidades – em especial UAB - que envolve o sistema de tutoria presencial nos

polos; a tutoria a distância nas instituições de Ensino Superior; e o pagamento de bolsas

tanto para tutores como para coordenadores de disciplinas e outros agentes participantes

do programa.

No âmbito da produção acadêmica, o interesse pela Ead se efetiva no crescente

número de pesquisas, como evidenciam alguns estudos (CERDAS, CORREA, e

OLIVEIRA, 2015; BARRETO et al., 2006). A pesquisa sobre EaD avança à medida que

ela se fortalece e se expande como modalidade de ensino na formação de professores,

seja em nível de graduação, pós-graduação ou educação continuada. Sobre a docência, a

ênfase da pesquisa acadêmica recai sobre suas especificidades na modalidade a

distância, uma vez que reúne diferentes sujeitos que exercem funções docentes

específicas em prol de um projeto comum.

Para Mill e Oliveira (2014, p.33)

[…] o movimento das pesquisas em EaD está acompanhando a

tendência das investigações na área de Educação em geral: tomar o

professor no centro da discussão, como importante agente na definição

das estratégias de ensino e de aprendizagem, autor de recursos

didáticos, pessoa e profissional em desenvolvimento.

Destaca-se, no caso da EaD, a presença de um novo profissional, o professor

tutor, presencial e a distância, imprescindível no acompanhamento dos alunos em seus

processos de aprendizagem, na construção de uma comunidade virtual ou no apoio em

atividades presenciais, e que deve trabalhar em conjunto com os professores

coordenadores de disciplina e demais agentes envolvidos, numa relação que não está

isenta de conflitos, encontros e desencontros.

Ao falar de nosso lugar de coordenadores de cursos em EaD, convivemos

diretamente com as várias demandas desses diferentes profissionais que nem sempre

coincidem, o que acaba por gerar situações conflituosas, mediadas pelas diferentes

instâncias da coordenação.

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Assim, neste trabalho, analisamos os papéis e formas de interação dos docentes

coordenadores de disciplinas, tutores a distância e presenciais; as inter-relações entre os

saberes e práticas docentes; dinâmicas de atuação e conflitos referentes à autonomia

relativa desses agentes e às questões de profissionalização, no âmbito do curso de

Licenciatura em Matemática a Distância, na modalidade semipresencial, da

Universidade Federal Fluminense, oferecido por meio do Consórcio CEDERJ com

suporte do Sistema UAB.

2. Os papéis docentes na EaD

Exercer a função docente na EaD é o mesmo que fazê-lo na modalidade

presencial? Acreditamos que não. Apesar da função primordial do professor ser a

mesma - mediar a relação entre o aluno e conhecimento, organizando atividades,

recursos didáticos e procedimentos de ensino para atingir objetivos predeterminados -

na EaD essa mediação se efetiva em ambientes virtuais e polos presenciais, o que

delimita características específicas para a docência. Entre elas o fato de ser

compartilhada. Não se faz educação sozinho – seja qual for a modalidade - mas o

compartilhamento da função docente na EaD é condição sine qua non da realização dos

processos de ensino.

A EaD caracteriza-se pela polidocência, conceito que se refere à ideia de Mill

(2010) de um conjunto articulado de profissionais necessário para a realização dos

processos de ensino e aprendizagem na EaD. Vincula-se à busca de uma docência

coletiva, ou seja, envolve um

[…] coletivo de trabalhadores que, mesmo com formação e funções

diversas, é responsável pelo processo de ensino e aprendizagem […]. Na

EaD, não existe a opção de um único profissional realizar todas as

atividades porque, via de regra, a quantidade de alunos ou a

complexidade do processo de trabalho na EaD impossibilita a

‗unidocência‘. (MILL, 2010, p. 24).

A polidocência envolve no coletivo de trabalhadores uma perspectiva de

interdependência entre os diferentes sujeitos com funções específicas. Como explica

Mill (2010), o saber que seria detido por um único educador na educação presencial é

segmentado e distribuído a vários profissionais. Isso implica que todos dialoguem tendo

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em vista objetivos educacionais comuns, o que nem sempre se efetiva na prática,

embora ajam iniciativas em busca dessa inter-relação.

Apesar das nomenclaturas serem diversas, segundo a instituição e o modelo de

EaD adotado, entre os diferentes sujeitos que compartilham a função docente, cada qual

com suas atribuições específicas, estão os professores conteudistas, coordenadores de

disciplinas e tutores virtuais e tutores presenciais que atuam diretamente nos polos de

apoio presencial, docente projetista educacional, entre outras.

No caso do curso analisado aqui, há a figura dos coordenadores de disciplina,

cuja função primordial é organizar os processos pedagógicos (dinâmicas de trabalho,

atividades, avaliações) da disciplina sob sua responsabilidade, bem como orientar e

coordenar o trabalho dos tutores. O curso conta também com os docentes conteudistas,

ou autores, na definição de Mill (2012), responsáveis pela elaboração dos materiais

didáticos da disciplina - especialmente textos bases para estudo dos conteúdos. Essas

duas funções naturalmente são exercidas pelos mesmos sujeitos, mas não

necessariamente coincidem. Conteudistas e coordenadores de disciplinas, atualmente,

são oriundos do corpo docente das instituições consorciadas e recebem bolsas para

realizar essas funções, conciliando-as com outras que exercem na Universidade. O curso

também conta com a atuação da equipe de designers instrucionais do Consórcio

CEDERJ, cuja função é apoiar os conteudistas na produção e organização de materiais

educacionais, textuais, objetos de aprendizagem, ferramentas de comunicação e

interação, de acordo com as situações de ensino.

Embora o tutor seja, ―legitimamente um docente‖ (MILL et al, 2008, p.115), sua

função consiste em dar apoio aos alunos na construção de seus conhecimentos, envolve

oferecer explicações, guiar, orientar, sugerir fontes de informação, facilitando, assim, a

participação dos alunos no curso. Obviamente essas funções podem variar conforme o

modelo pedagógico do curso e as práticas docentes desenvolvidas (MAGGIO, 2001

apud MILL et al, 2008). Além disto, há diversas questões envolvendo as formas de

vinculação dos docentes coordenadores de disciplina e docentes tutores: "a diferença

entre o docente e o tutor é institucional, que leva a consequências pedagógicas

importantes.". (SÁ, 1998, apud MACHADO &MACHADO, 2004).

No modelo de EaD do Consórcio CEDERJ, a tutoria se dá tanto nos ambientes

virtuais como nos 24 polos presenciais em que o curso está sendo oferecido no Estado

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do Rio de Janeiro. Suas funções no âmbito do curso de Matemática caracterizam-se por

atividades específicas e diferenciadas. Os tutores a distância acompanham os alunos,

realizando atividades como responder às dúvidas dos alunos postadas em um espaço

específico da sala da disciplina no ambiente virtual de aprendizagem, a Plataforma

CEDERJ; mediar as discussões em atividades interativas e colaborativas, corrigir e dar

feedback em atividades realizadas na Plataforma CEDERJ e interagir com os alunos por

meio de ligações telefônicas em sistema de chamadas grátis (0800) e por

videoconferências.

O trabalho dos tutores presenciais, especialistas por área ou conteúdos, por sua

vez se constitui no atendimento, nos polos de apoio presencial, aos alunos em sessões

semanais de 2h, em média, por disciplina, até o quarto período letivo da grade

curricular. Nestas sessões de tutoria, eles auxiliam os alunos nas dúvidas e dificuldades

em relação aos temas previstos para a respectiva semana, no cronograma de estudos da

disciplina, realizando também atividades agendadas pelos coordenadores de disciplina,

como experimentos em laboratório, sequências didáticas, seminários, etc. Além disto, os

tutores presenciais dão suporte à aplicação das provas presenciais e outros eventos

acadêmicos. Nos períodos iniciais do curso, há um forte trabalho de acolhimento por

parte do tutor presencial e apoio à adaptação do aluno, incentivando-o também a utilizar

o ambiente virtual de aprendizagem e a tutoria a distância, até que se aproprie

completamente das ferramentas e facilidade do apoio virtual, tanto que a partir da

metade do curso o aluno deixa de contar com o apoio da tutoria presencial, com

exceções pontuais em disciplinas que alguns alunos apresentam maiores dificuldades.

De acordo com Palermo (2015), a atuação do professor tutor caracteriza-se por

saberes docentes distintos que

[…] indicam a legitimidade dessa nova faceta da profissão docente, na

modalidade de ensino a distância. A rotina de trabalho desse

profissional indica que ele adota uma ―lógica‖ própria para exercício

de sua função, a partir de referenciais pessoais e de formação e das

características do modelo de ensino superior a distância em que atua.

(PALERMO, 2015, p. 3758).

Como apontam Mill, et al (2008, p.114) há que se discutir a importância desse

novo docente como "[…] elemento-chave para o desenvolvimento cognitivo do

estudante nas atividades individuais e coletivas ao longo da disciplina.".

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3. Interações e conflitos nas relações docentes

Ao entendermos a polidocência como uma condição da EaD, as interações e

conflitos presentes nas relações entre os docentes ganham relevo em nosso trabalho,

considerando que a sua resolução é condição para o andamento harmonioso do curso. A

participação de todos os envolvidos na EaD é fundamental, e os esforços da

coordenação devem estar direcionados à conciliação e a mediação dos conflitos que

eventualmente podem existir. De acordo com Mill (2010), o trabalho fragmentado e a

interdependência entre os membros da equipe, são riscos da polidocência, se por um

lado incentivam a colaboração, por outro podem levar à redução da sua autonomia e à

perda da noção do todo do trabalho em uma perspectiva de alienação da sua atividade

profissional.

Entretanto, a visão de um trabalho docente fragmentado precisa ser transformada

em docência compartilhada: docentes exercendo papéis complementares com diferentes

responsabilidades, interagindo e colaborando mutuamente. A autonomia passa a ser

relativa na medida em que as diretrizes e ações pedagógicas não estão centradas em um

único agente educacional, como muitas vezes ocorre no ensino presencial.

Assim, dentre as tensões nem sempre explícitas, mas latentes, na relação entre os

diferentes sujeitos, ganha destaque a seguinte questão: ―Quem receberia o estatuto de

professor […]?‖ (MILL, 2010, p.28). A discussão pode ser centrada na percepção de

quem seria o ―professor responsável‖ academicamente por uma disciplina ou por uma

turma. Há modelos em que não é simples dar uma resposta clara para esta questão, na

medida em que um docente conteudista prepara os materiais e recursos didáticos e,

possivelmente em conjunto com um docente coordenador da disciplina, estabelecem as

diretrizes e as ações pedagógicas que devem ser adotadas, enquanto os tutores as

aplicam e respondem isoladamente pelo processo de interação e de avaliação dos

alunos.

No modelo pedagógico do Consórcio CEDERJ, a responsabilidade acadêmica

sobre as disciplinas é regimentalmente atribuída às Instituições Públicas de Ensino

Superior (IPES) consorciadas, que a delegam para as coordenações e colegiados de

curso, que por sua vez a delegam aos coordenadores de disciplina, que são

obrigatoriamente membros dos corpos docentes dessas IPES. Portanto, o coordenador

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de uma disciplina do Curso de Licenciatura em Matemática a Distância da UFF é o

chamado professor responsável da respectiva disciplina.

Contudo, essa questão continua a permear algumas relações entre os sujeitos do

processo educacional e revelar conflitos, ou ao menos falta de entendimento de sua

extensão e consequências. Cita-se, como exemplo, a fala de um coordenador de

disciplina: ―o tutor não é o professor‖, que tomada isoladamente do seu contexto pode

ser interpretada como um erro conceitual grave e uma desqualificação do tutor. Porém,

a fala estava inserida em uma discussão sobre a atuação de alguns tutores presenciais

que não se integravam à equipe docente da disciplina nas discussões sobre os processos

de aprendizagem e construção e aplicação de ferramentas e atividades, procedendo de

modo até contrário às diretrizes e abordagens adotadas. Deste modo, o coordenador da

disciplina pretendia acentuar que o tutor não era o professor responsável pela disciplina

e não tinha autonomia para rejeitar ou contrapor em sua essência as estratégias definidas

pelo coordenador sem que suas objeções ou visões alternativas fossem discutidas pela

equipe docente.

Outro conflito é representado pela afirmação feita por um tutor presencial a um

aluno: ―Eu sou tutor e não o professor‖. O aluno pediu auxílio para compreender certo

ponto do conteúdo, tratado no material didático textual, e o tutor se recusou,

entendendo, na sua visão, que o aluno não havia estudado previamente o material. O

aluno alegou que havia sim estudado e discutido com seus colegas. O tutor parece ter

entendido erroneamente seu papel e a própria ação docente em EaD. Se, por um lado,

ele pretendia se distanciar da visão do professor em um processo de ensino

unidirecional, transmissivo, por outro, não acolheu o aluno em suas dificuldades,

buscando interagir e incentivar o aluno a perceber os meios e recursos que poderiam

auxiliá-lo no entendimento do conteúdo. As sessões de tutoria presencial não se igualam

às aulas presenciais, na medida em que não são projetadas como referência principal

para o processo de ensino aprendizagem, e sim com um elemento auxiliar. Entretanto,

mesmo que o aluno não tenha estudado previamente, o tutor presencial deve promover a

discussão e reflexão dos temas com os alunos, a fim de estimulá-los a seguir vinculados

à disciplina.

Há, portanto, um conflito explícito entre as posições de cada um nos processos

pedagógicos, o que por vezes, tende a reforçar uma visão de trabalho fragmentado. Nas

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relações entre coordenadores de disciplina e tutores, presenciais e a distância, é

essencial estabelecer uma visão de equipe docente, de docência compartilhada, que seja

baseada na construção de parcerias e na implementação de um processo contínuo e

colaborativo de assimilação, reflexão, avaliação e reformulação dos processos didático-

pedagógicos.

As maiores dificuldades que encontramos no curso para transformar

positivamente as relações docentes em uma visão de docência compartilhada se devem a

falhas no processo de comunicação e interação entre estes docentes. Tanto há

resistências por parte dos tutores presenciais, e alguns tutores a distância, em se integrar

à equipe, como há coordenadores de disciplina que se mostram pouco pró-ativos na

promoção de espaços de interação e no estímulo aos tutores e acolhimento de suas

demandas e questões.

Nas discussões sobre docência na EaD, a tutoria é uma função em processo de

configuração como atividade profissional, revelando-se por termos controversos ―[...]

tanto em sua terminologia (abarcando concepções diversificadas) quanto em suas

funções e competências (que são variadas e até contraditórias, dependendo da proposta

pedagógica do curso e da concepção de tutoria adotada). (MILL, 2012, p.267).

No entanto, embora se reconheça o importante papel realizado pelos tutores, e

[...] embora as atividades de tutoria constituam-se como docência, o

trabalhador-tutor não pode ser considerado um trabalhador-professor.

O tutor não pode ser chamado de professor pelo fato de não haver aula

propriamente dita na educação a distância, mas o tutor é,

legitimamente, um docente. As principais distinções entre tutor e

professor residem nos tempos e espaços de trabalho [...]. (MILL, et al,

2008, p.115, grifos nossos).

O fato de se identificar as especificidades das tarefas dos docentes tutores em

relação aos demais agentes dos processos de ensino aprendizagem na EaD, não os isenta

de vivenciarem conflitos marcados pela busca de seu reconhecimento como categoria

profissional, pela regulamentação da atividade, estabelecimento de vínculos de trabalho

e remuneração adequada. O subvencionamento do curso por meio de programas de

bolsas da UAB e do Consórcio CEDERJ, gera enormes tensões sobre este sistema, na

medida em não se consegue perceber direitos trabalhistas para os tutores e os bolsistas,

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em geral, são cada vez mais afetados e desestimulados pela insegurança gerada por

crises nos órgãos governamentais.

Nesse sentido, as formas de contratação de professores na EaD, que variam

muito conforme o modelo adotado na instituição, a inexistência de vínculos

empregatícios pelo pagamento de bolsas, ou contratos temporários de prestação de

serviços, são algumas características que vêm impactar enormemente os trabalhadores

dessa modalidade. Essa situação é um elemento gerador de conflitos, na medida em que

leva muitos a considerarem sua atuação em EaD apenas como complementação de

renda, atraindo profissionais envolvidos em outras atividades.

Outro desafio das relações docentes na EaD diz respeito ao uso das diferentes

tecnologias como ferramentas de ensino, pois muitas vezes são profissionais oriundos

dos cursos presenciais, que ingressam em um universo no qual as relações tempo espaço

são diferenciadas, novos saberes se impõem a esses docentes, que precisam estar abertos

à aprendizagem, o que nem sempre acontece. Pretto e Riccio (2010) discorrem sobre

formação continuada do professor universitário face à presença das tecnologias digitais

e à explosão da EaD no país. A formação continuada do professor universitário, nesse

contexto, é analisada sob o ponto de vista da experiência na docência online como parte

da necessária imersão no universo da cibercultura.

Paulo Freire se mantém atual, mesmo em um contexto tão diferenciado do seu,

ao identificar entre os docentes a necessidade de uma postura de constante aprendizado,

em que esse profissional se reconhece inacabado, sendo a reflexão crítica um momento

fundamental da docência, baseada na curiosidade epistemológica, pois ―É pensando

criticamente a prática de ontem que se pode melhor a próxima prática.‖ (FREIRE, 1996,

p.18).

O processo de trabalho na educação a distância virtual

estabelece novos tempos e espaços para o trabalhador docente

e esse redimensionamento espaço-temporal afeta não somente

o cotidiano ou a prática pedagógica dos educadores, mas

também sua natureza como categoria de trabalhador. (MILL et

al, 2008, p. 115)

4. Conclusão

Esta é uma investigação exploratória, de cunho qualitativo, em que buscamos

contribuir para o processo de compreensão, documentação, ressignificação e

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aperfeiçoamento das relações docentes no curso de Licenciatura em Matemática a

Distância da Universidade Federal Fluminense, oferecido, na modalidade

semipresencial, por meio do Consórcio CEDERJ, com o suporte do Sistema UAB.

Tomamos com referência as visões teóricas sobre polidocência e acentuamos os

aspectos da docência compartilhada em que os docentes exercem papéis

complementares com diferentes responsabilidades, interagem e colaboram mutuamente.

Neste contexto, as análises foram baseadas também nas experiências vivenciadas pela

equipe de coordenação do curso e os desafios enfrentados na gestão acadêmica de

pessoas e de processos.

A existência de conflitos nas relações entre os diferentes sujeitos educacionais, e

o seu reconhecimento como uma realidade na busca do trabalho docente coletivo e

compartilhado, demandam ações por parte da coordenação do curso para ouvir cada um

desses sujeitos, perceber suas necessidades e fomentar a interação e o diálogo entre eles

no contexto concreto do curso. Assim, estas ações serão apoiadas por pesquisas futuras,

qualitativas e quantitativas, que envolverão instrumentos de investigação específicos

direcionados aos perfis e demandas destes docentes.

5. Referências

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