Verbete Espac3a7o Polc3adtico Dicionario de Politica Norberto Bobbio

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    392 ESPAO POLTICO

    Espao Poltico.

    I. DEFINIO.Por Espao poltico se entende a

    rea de conflito que constitui a base da relao entreeleitores e partidos, num dado sistema poltico e numcerto momento histrico. Todo sistema poltico caracterizado por um certo nmero de conflitos:conflitos sobre a distribuio da renda, sobre ainterveno do Estado na economia, sobre as relaesEstado-Igreja, ou ento conflitos de naturezalingstica, tnica, e por a alm. Na medida em quetais conflitos ou linhas de diviso so fatores demobilizao do eleitorado, eles influem nocomportamento poltico dos eleitores e na estratgiados partidos e, conseqentemente, no desenrolar da

    disputa eleitoral. A conformao destes conflitosrepresenta a rea do Espao poltico. Em resumo,portanto, o Espao poltico identifica-se com o espaoda competio eleitoral nos regimes democrticos demassa.

    No basta, porm, que existam conflitos portanto, problemas a resolver e escolhas a fazer para se poder usar significativamente a noo deEspao poltico. Para isso, necessrio que secumpram algumas condies que garantam a existnciade um certo grau de "racionalidade" nocomportamento de eleitores e partidos: 1) eleitores e

    partidos devem ser capazes de compreender e avaliarsua mtua posio a respeito das dimenses doconflito poltico, que so mais evidentes ou relevantesnum determinado momento; 2) esta compreenso econseqente avaliao ho de estar dotadas de ummnimo de coerncia interna; 3) o eleitor vota pelo

    partido cuja posio dentro do Espao poltico estmais prxima sua autocolocao espacial. claroque estas condies se realizam em medida diversanos vrios sistemas polticos, e, em certos casos, nemse realizam. A compreenso do Espao poltico podevariar de eleitor para eleitor; isto por vrios motivos.Em primeiro lugar, nem sempre os eleitores "vem"todos os partidos do sistema, nem mesmo os maisimportantes. Por vezes, s reconhecem oseupartido, o

    partido com que se identificam intimamente. Ou entotm conhecimento da existncia dos outros partidos,mas no conseguem distinguir as suas particularidadescaractersticas e, portanto, a sua posio relativa noespao. Outras vezes pode acontecer, em vez disso,que a percepo de certos eleitores seja total ou

    parcialmente diferente da percepo dos outros, porvariar o destaque ou a importncia dos conflitos emao. Em outros casos, possvel que os juzos que umeleitor faz dos vrios partidos sejam totalmente

    contraditrios e, por

    conseguinte, privados de qualquer lgica interna.Quando estes fenmenos assumem dimensesrelevantes, a noo de Espao poltico perde, na

    prtica, significado emprico. Em suma, para se poderfalar de Espao poltico, preciso que exista umacerta "estrutura ordenada", que supe ocomportamento de eleitores e de partidos. Afreqncia com que os eleitores, os lderes e osobservadores polticos empregam termos comoesquerda-direita, laico-clerical, conservador-

    progressista e outros anlogos, para definir as suasposies polticas, indica que uma tal estrutura existe,se bem que em medida diversa, tanto a nvel de elitescomo de massas. uma estrutura feita de imagenssimplificadas da complexa realidade dos partidos, masnem por isso menos capaz de oferecer aos eleitoresuma sntese das particularidades politicamente maisrelevantes de cada um desses partidos. Baseando-seem tais imagens, o eleitor constri o seu mapa dosistema e organiza os seus prprios conhecimentos

    polticos. A reconstruo deste mapa durante apesquisa revelar ao estudioso os elementosconstitutivos do Espao poltico.

    II. ESPAOS LINEARES E ESPAOS PLURIDIMENSIONAIS.Todo Espao poltico se define por certo nmero dedimenses. Tais dimenses correspondem s linhas deconflito, aos problemas e s escolhas que influem na

    posio dos partidos e dos eleitores e orientam seucomportamento. Conforme forem uma ou mais deuma, falar-se- de espaos lineares ou de espaos

    pluridimensionais. O Espao poltico mais simples emais utilizado, tanto no mbito da pesquisa cientficacomo no do debate poltico, o da dimenso esquerda-direita. Esta dimenso ou continuum tem sidovariadamente interpretada. Anthony Dows, o primeiro

    politlogo que usou de maneira sistemtica a noo deEspao poltico neste sentido, a interpreta como graude interveno do Estado na economia, quando uma

    posio de esquerda se identifica com uma maior

    propenso a favor de polticas de interveno. ParaLipset e muitos outros, o divisor de guas entreesquerda e direita est na atitude favorvel ou no s

    polticas de mudana nostatus quo. Seja qual for a suainterpretao mais correta, no h dvida de que, nasmodernas democracias de massa, as noes deesquerda e direita desempenham um papel importanteno mbito da disputa eleitoral entre os partidos. Elastornam mais simples a escolha por parte dos eleitores econstituem um meio eficaz de comunicao entre oseleitores e os partidos. Isto largamente provado pornumerosas pesquisas empricas, que mostram como, anvel dos eleitorados de vrios pases, a

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    maior parte dos entrevistados no tm dificuldade emsituar a si mesmos e os partidos do sistema (ou, pelomenos, os maiores) neste continuum.

    Depois disto, apesar da notvel contribuio que ouso da dimenso esquerda-direita trouxe ao estudo dadisputa poltica, no lcito fazer coincidir com ela,como pretendem alguns investigadores, a noo deEspao poltico, pois isso a empobreceria do ponto devista analtico e fundamental. Os espaos lineares sosimples e, por isso, fceis de utilizar e interpretar; mas,devido justamente sua simplicidade, nem sempre

    podem explicar certas estratgias de partido ou certoscomportamentos de voto, por esquecerem a existnciade outras dimenses de identificao e de competioque podem cruzar-se com a dimenso esquerda-direita,e alterar assim a dinmica global da luta poltica. Umadessas outras dimenses , por exemplo, a religiosa,mas podemos citar tambm a propsito a dimensotnica, a lingstica e outras. s vezes, tais dimenses

    podem sobrepor-se ao continuum esquerda-direita. Omais freqente entrecruzarem-se. Neste caso, oEspao poltico h de ser considerado, para todos osefeitos, como pluridimensional, e no linear.

    Em concluso, o ponto que preciso fixar que nopodemos estabelecer a priori qual a estrutura doEspao poltico, como se houvesse um espao da

    poltica universalmente vlido. A configurao doEspao poltico pode variar de sistema para sistema e,dentro de um mesmo sistema, de um determinado

    perodo histrico para outro, precisamente porquemudam os conflitos, as linhas de diviso e os

    problemas, que definem as imagens dos partidos e aautocolocao dos eleitores dentro do espao. Ditoisto, pode-se afirmar, no entanto, com base naexperincia apresentada pelo funcionamento dosregimes democrticos ocidentais, que os componentesfundamentais do Espao poltico tm-se mantido maisfreqentemente estveis a nvel de massa.Correspondem ainda, em grande parte, ao sistema derupturas que caracterizaram o professo de formao

    dos partidos e dos sistemas partidrios. Estas, rupturas(o contraste cidade-campo, a lngua, a religio, aideologia) constituem, em larga medida, a base dos

    processos de identificao partidria e, por isso, docomportamento do voto entre a grande maioria doseleitores dos pases da Europa ocidental. Contudo, oEspao poltico no compreende apenas tais dimenses.A par destas, que so "tradicionais", pode haveroutras. Em geral, qualquer questo em que os partidostenham posies divergentes entre si e que no se

    possa identificar com uma

    linha de diviso preexistente pode representar umadimenso do Espao poltico, desde que constituaefetivamente um fator de mobilizao de parte doseleitores. Assim, em certos sistemas polticos, o espaoda competio eleitoral pode ser constitudo por cadaum dos problemas que, de quando em quando,assumem importncia poltica aos olhos dos eleitores.O problema do aborto, o problema da energia nuclear,ou determinadas questes de poltica externa, soalguns possveis exemplos.

    III. CONSIDERAES CRTICAS.A anlise espacialda disputa eleitoral pressupe, em certa medida, umainterpretao "racional" do comportamento doseleitores. coisa que ressalta claramente de tudo queacabamos de dizer. Porm, exatamente por tal

    motivo que muitos estudiosos levantam objees sobrea aplicabilidade e relevncia de uma noo que envolve,fundamentalmente, comportamentos que parecemraramente encontrar-se na realidade dos fatos. Oescasso interesse pela poltica e o baixo nvel deconhecimento da matria em certos estratos doeleitorado tm sido documentados por grande nmerode pesquisas empricas. Segundo uma slida tradiode pesquisa sobre o comportamento eleitoral de massa,o eleitor "mdio", mais que expressar o prprio votodepois de um atento confronto entre as suas

    preferncias polticas e as propostas e programas dos

    vrios partidos do sistema, tende a identificar-se comum determinado partido, baseando-se no sentimentode uma certa afinidade psicolgica e no racional. Ovoto no seria, portanto, uma escolha realmenteconsciente, mas antes um fato habitudinrio,determinado por um forte grau de adeso ao prprio

    partido e de hostilidade em relao aos partidosantagnicos.

    Embora estas observaes assentem em slidas basesfatuais, a concluso que muitas vezes delas se tira, deque quase absolutamente irrelevante uma teoriaracional do comportamento eleitoral, , por diversas

    razes, excessivamente apressada. Em primeiro lugar,o fenmeno da identificao entre eleitor e partido noexclui a presena em tal relao de elementos decarter racional. O eleitor identificado, embora nemsempre, , em muitos casos, um eleitor que possuiuma certa conscincia de partido, condicionada pelaadeso ao programa do seu partido e s suas posies

    polticas em face dos problemas do momento. O fatode que o seu voto seja fundamentalmente estvel nosignifica que seja mero resultado de fatores

    psicolgicos, irredutvel a uma anlise racional. Porisso, necessrio precaver-se em no deduzir da

    estabilidade do voto a sua pressuposta

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    ""irracionalidade". Em segundo lugar, a prpria noode eleitor "mdio" no tem grande significado. Noexiste um eleitor tpico, mas antes diversos tipos de

    eleitores, de que os identificados so apenas umacategoria. A par deles existem tambm eleitores deopinio que se orientam em seu comportamento, noapenas por consideraes de carter ideolgico outradicional, mas pela influncia da posio dos

    partidos em relao a temas e problemas na ordem dodia do debate poltico, ou ento pela sua percepo daeficincia, honestidade e competncia dos lderes doGoverno e da oposio.

    Estas consideraes bastaro para mostrar que, comefeito, uma teoria espacial do comportamento eleitoral

    possui um campo de aplicao mais amplo do que s

    vezes somos levados a crer. Tanto o comportamentodos eleitores "identificados", como, com maior razo,o comportamento dos eleitores de opinio soredutveis a uma anlise espacial. Neste ltimo caso,sobretudo, a noo de espao se presta muito bem aexplicar as transferncias de voto e, portanto, algunsdos aspectos da dinmica global do sistema. De fato,os eleitores de opinio so os mais crticos, os maismveis. Da ser justamente o seu voto que determinaaqueles desvios marginais nas relaes de fora entreos partidos de Governo e oposio, que muitas vezesdecidem o resultado da disputa eleitoral. Embora seunmero possa ser exguo, a sua importncia tal quechega a influir notavelmente na formulao daestratgia dos partidos e no funcionamento do sistema.

    BIBLIOGRAFIA.A. DOWNS,An economic theory ofdemocracy Harper, New York 1957; R. INGLEHART eH. D. KLINGEMANN,Party identification, ideologicalpreference and left-right dimension among westernmass publics. in party identification and beyond. aocuidado de I. BUDGE, J. CREWE e D. FARLIE, Wiley,

    New York 1976; G. SARTORI, Parties and partysystems, Cambridge University Press. New York 1976;D. STOKES, Spatials models of party competition. in"American Political Science Review", LVII, junho1963.

    [ROBERTO D'ALIMONTE]

    Estabilidade Poltica.

    I. DEFINIO DO CONCEITO. Uma definiosatisfatria do conceito de Estabilidade poltica h de

    partir de algumas consideraes preliminares. Antesde tudo, preciso buscar uma definio isenta,enquanto possvel, de elementos

    avaliativos. mister pr particular ateno nesteponto, j que se trata de um conceito que, em geral, acusado de privilegiar mais o fator de conservao

    que o de mudana: um sistema poltico, por exemplo, muitas vezes considerado estvel justamente por sercapaz de manter ostatus quo. Em vez disso, devemosdeixar claro que se buscar uma definio neutra; queum sistema estvel no tem por isso mesmo umaconotao positiva; que um sistema poltico estvelno "bom" como tal; e, enfim, que a Estabilidadeno necessariamente, nem deve ser, o fim de todosistema.

    Em segundo lugar, s importa uma definioemprica e operacional, suscetvel de uma vinculaoimediata com a realidade, uma definio que permita

    determinar, no fim do processo cognitivo, o grau deEstabilidade deste ou daquele sistema em particular.

    Enfim, necessrio buscar uma definio capaz deevidenciar que a Estabilidade um estado do sistema,num determinado espao de tempo. A Estabilidade oresultado de uma certa disposio dos elementos dosistema.

    Levadas em conta estas consideraes, a definioque parece preencher mais do que outras os requisitosindispensveis a seguinte: Estabilidade acapacidade previsvel que um sistema tem de se

    prolongar no tempo. Deste modo, um sistema deve ser

    considerado estvel quando, num momento dado, tidoem conta um conjunto de sinais, razoavelmenteprevisvel que ele continuar no tempo. Existe" umanotvel diferena entre a Estabilidade assim definida ea Estabilidade entendida como simples durao notempo. Esta segunda definio, ao contrrio da

    primeira, no traduz o sentido tpico deste conceito,que pretenderia tambm englobar a funo de prever,mais do que de referir-se a sistemas histricos. E

    poderia levar a sustentar erroneamente que umamonarquia tradicional, por exemplo, que permanecede h muito, estvel, embora possa estar a ponto de

    ser destruda por uma revoluo. por outro ladoevidente que, num juzo a posteriori,poder-se- dizerque um sistema poltico que durou por muito tempofoi provavelmente estvel durante boa parte da suaexistncia.

    A definio de Estabilidade antes apresentadapoder parecer bastante genrica, se no procedermosa algumas especificaes. preciso, por isso, deixarclaro o' que no Estabilidade. Ela, antes de tudo, nose identifica com o equilbrio estvel. Estaidentificao, feita por muitos autores, inexata; paracompreendermos um pouco mais a fundo a suafalsidade, necessrio referirmo-nos, se bem que

    brevemente, ao conceito de equilbrio e, maisgenericamente, ao modelo