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SOCIEDADE DE PEDIATRIA DE SÃO PAULO Ano I - Nº 2 - Novembro 2012 Baixa Estatura Idiopática A criança nascida pequena para a idade gestacional Dr. Raphael Del Roio Liberatore Junior Dra. Cristiane Kochi Dr. Hamilton Cabral de Menezes Filho Temas atuais em PEDIATRIA

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Sociedade de Pediatria de São Paulo

Ano I - Nº 2 - Novembro 2012

Baixa Estatura Idiopática

A criança nascida pequena para a idade gestacionalDr. Raphael Del Roio Liberatore JuniorDra. Cristiane KochiDr. Hamilton Cabral de Menezes Filho

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� ExpEdiEntE

diretoria da Sociedade de pediatria de São paulo, triênio 2010-2013.

diretoria Executiva Presidente: Clóvis Francisco Constantino. 1º Vice-Presidente: Mário roberto Hirschheimer. 2º Vice-Presidente: Eraldo Samogin Fiore. Secretária-Geral: Maria Fernanda B. de Almeida. 1º Secretário: João Coriolano rego Barros. 2ª Secretária: Ana Cristina ribeiro Zollner. 1ª Tesoureira: Lucimar Aparecida Françoso. 2º Tesoureiro: Aderbal Tadeu Mariotti.

Coordenação diretoria de publicações:Diretora: Cléa rodrigues Leone.

Revista paulista pediatria Editora: ruth Guinsburg. Editora associada: Sônia regina Testa da Silva ramos. Editores executivos: Amélia Miyashiro Nunes dos Santos, Antonio Carlos Pastorino, Antônio de Azevedo Barros Filho, Celso Moura rebello, Cléa r. Leone, Lilian dos Santos rodrigues Sadeck e Mário Cícero Falcão.

departamentos CientíficosDiretor: rubens Feferbaum. Membros: Ciro João Bertoli, Sérgio Antônio B. Sarrubbo.

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� 1. DefiniçãoA baixa estatura idiopática (BEI) repre-

senta entidade clínica ainda com defini-ção controversa.

A definição correntemente mais aceita é a de crianças que apresentem baixa es-tatura com as seguintes características: z--score de altura inferior a -2,0, velocidade de crescimento normal para idade e sexo, ausência de doença subjacente, peso ao nascer normal, proporções corporais nor-mais (baixa estatura simétrica), aporte nutricional adequado, ausência de altera-ções psiquiátricas e secreção do hormô-nio de crescimento normal em resposta a estímulos farmacológicos1-3.

Esses critérios fazem com que a BEI apresente heterogeneidade clínica, en-volvendo a baixa estatura relacionada ao retardo constitucional do crescimento e da puberdade e a baixa estatura fami-liar2. No entanto, o consenso de 2008 da Sociedade Americana de Endocrinolo-gia Pediátrica (Lawson Wilkins Pediatric Endocrinology Society — LWPES) indica que a BEI deve ser subcategorizada em

baixa estatura familiar e retardo constitu-cional do crescimento e da puberdade3.

� 2. DiagnósticoO diagnóstico da BEI é feito a partir das

características clínicas que a definem.Trata-se de crianças portadoras de bai-

xa estatura proporcionada, com veloci-dade de crescimento adequada, sem ca-racterísticas dismórficas e sem doenças concomitantes.

de acordo com o consenso da LWPES, não há indicação para os testes de estí-mulo da secreção do GH nos pacientes com baixa estatura e velocidade de cres-cimento normal, ausência de atraso da idade óssea e IGF-I sérico superior à mé-dia para idade e sexo3.

Os pacientes diagnosticados com BEI não devem ser submetidos a exames de imagem do sistema nervoso central3.

2.1 – Dúvidas no diagnósticoNa caracterização da BEI ainda persis-

tem as seguintes indefinições: inclusão do z-score da altura final prevista, inclusão

Baixa estatura idiopática

Departamento de Endocrinologia Pediátrica

Dr. Raphael Del Roio Liberatore Junior - CRM-SP 56.940Professor Livre-Docente, Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo

Dra. Cristiane Kochi - CRM-SP 69.772Professora Adjunta da Faculdade de Medicina da Santa Casa de São Paulo

Dr. Hamilton Cabral de Menezes Filho - CRM-SP 69.917-SPMédico Assistente da Unidade de Endocrinologia Pediátrica do Instituto da Criança do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo

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ou não das alturas dos familiares (e como incluí-las) e inclusão de outros parâmetros relacionados à secreção do GH e à sua sensibilidade, tais como IGF-I e IGFBP-32.

A dúvida quanto à consideração da BEI como entidade nosológica reside no fato de que a altura é uma característica individual com distribuição normal na população, de modo que alguns indiví-duos biologicamente normais podem estar situados inferiormente a um limite estatisticamente definido (por exemplo, 2 desvios-padrão abaixo da média)2.

Por outro lado, crianças com baixa es-tatura familiar ou com retardo constitu-cional do crescimento e da puberdade poderão futuramente, a partir dos avan-ços da biologia molecular e da investi-gação laboratorial, serem consideradas como afetadas por determinadas sín-dromes genéticas ou outras doenças2.

Na BEI o z-score de altura pode aumen-tar de valores situados entre -2,1 e -3,1 durante a infância para valores de z-score de altura final situados entre -0,7 e -2,7, com ganho médio de altura entre 0,5 e 1,9 desvios-padrão.2 Esse ganho estatural pode ser devido à inclusão de crianças com retardo constitucional do cresci-mento e da puberdade2.

� 3. tratamentoO objetivo principal do tratamento da

BEI consiste em permitir que o paciente atinja altura final normal, o objetivo secun-dário é permitir que a altura normal seja atingida já durante a infância3.

A BEI é uma das indicações de trata-mento com rhGH aprovadas pela US Food and drug Administration (FdA)2,4. Na BEI, o tratamento com rhGH leva ao aumento da velocidade de crescimento durante os primeiros dois anos em sig-

nificativo número de pacientes, não ha-vendo, no entanto, dados homogêneos quanto aos efeitos sobre a altura final2.

Em revisão recente da literatura a res-peito da resposta ao tratamento com rhGH na BEI, os resultados encontrados em dez estudos (incluindo ao todo 741 crianças) mostraram que: o tratamento com rhGH melhora o crescimento e a altura final dos pacientes com BEI; que as crianças tratadas permaneceram rela-tivamente pequenas em comparação a seus pares com crescimento normal; que as meninas tratadas tiveram altura 7,5 cm maior do que as meninas do grupo--controle não tratadas5. O tratamento da BEI com rhGH pode resultar em ganho da altura final entre 3,5 e 7,5 cm após pe-ríodo de terapia de quatro a sete anos3.

A FdA aprova o uso de rhGH na BEI na dose de 0,30 – 0,37 mg/kg/semana (equi-valente a 0,13 – 0,16 UI/kg/dia) quando o z-score de altura for inferior a -2,25 e não houver, com base na atual velocidade de crescimento, possibilidade de se atingir altura final normal (havendo previsão de altura final inferior a 157,6 cm e 148 cm em homens e mulheres, respectivamen-te), desde que as epífises estejam ainda abertas e não haja outras causas para o comprometimento do crescimento1,2. No entanto, os critérios para o tratamento com rhGH variam desde valores de z--score de altura inferiores a -2,0 a valores inferiores a -3,0, dependendo do país3.

Outros critérios para a indicação do rhGH na BEI incluem z-score de altura inferior a -2,0 e mais do que 2 desvios--padrão inferior ao z-score da altura-alvo e/ou o z-score de altura final prevista in-ferior a -2,03.

O sucesso do primeiro ano de trata-mento com rhGH na BEI é caracterizado

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pelo aumento do z-score de altura en-tre 0,3 e 0,5, aumento da velocidade de crescimento em ao menos 3 cm/ano (em comparação ao ano anterior à introdu-ção do rhGH) ou z-score de velocidade de crescimento superior a +1,03.

A dose do rhGH poderá ser aumenta-da quando a resposta de crescimento for inferior à esperada em um paciente aderente ao tratamento3. Por outro lado, a resposta ainda deficiente durante um a dois anos de tratamento com doses mais altas deve levar à suspensão do hormô-nio3. durante a infância, espera-se que o tratamento possa levar à normalização da altura do paciente3. Apesar do efeito do tratamento ser dose-dependente, há receio de que na BEI doses superiores a 0,37 mg/kg/semana (ou superiores a 0,16 UI/kg/dia) possam levar ao avanço da idade óssea e à antecipação do início da puberdade3.

Atualmente, não há dados definitivos a respeito da segurança a longo prazo do uso de doses de rhGH superiores a 0,16 UI/kg/dia na BEI3. A dosagem periódi-ca do IGF-I sérico durante o tratamento com rhGH é útil na avaliação da eficácia, da segurança e da aderência, auxiliando no ajuste da melhor dose para cada pa-ciente3. A presença de valores de z-score de IGF-I persistentemente elevados (su-periores a +2,5) deve levar à redução da dose do rhGH3.

O tratamento com rhGH na BEI deve ser interrompido quando se considerar que o paciente atingiu altura próxima da altura final, ou seja, quando a velocidade

de crescimento for inferior a 2 cm/ano e/ou a idade óssea for superior a 14 anos nas meninas e 16 anos nos meninos3. A dose do rhGH pode ser aumentada quando houver resposta inadequada ao tratamento; por outro lado, se após um a dois anos de tratamento com doses maiores de rhGH o crescimento ainda for inadequado, este deverá ser interrompi-do3. Os efeitos colaterais do tratamento com rhGH na BEI são semelhantes aos observados em crianças tratadas por outros motivos, mas geralmente menos frequentes3.

Futuramente, estudos de biologia molecular poderão indicar quais pa-cientes com BEI terão melhor potencial para responder ao rhGH, o que será ex-tremamente útil tanto na elegibilidade para o tratamento quanto na definição da dose a ser prescrita2. Os poucos es-tudos a respeito não foram capazes de evidenciar melhora da qualidade de vida das crianças com BEI tratadas com rhGH, ou mostraram que a BEI não está associada a problemas na adaptação psicológica ou na autoimagem dessas crianças5.

Concluindo, o uso de rhGH em crianças e adolescentes com BEI tem-se acompa-nhado de ganho de estatura, conforme citado neste texto. No entanto, a decisão para a indicação do tratamento deverá considerar, além dos resultados positivos, que alguns pacientes não apresentam boa resposta ao tratamento e também a necessidade de aplicações diárias nesses pacientes e os custos do tratamento5.

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� 1. DefiniçãoO critério mais utilizado para definir

uma criança como pequena para idade gestacional (PIG) é a detecção de peso e/ou comprimento de nascimento abaixo de -2 desvios-padrão (dP) para o sexo e a idade gestacional, embora alguns grupos utilizem o critério do peso abaixo do per-centil 10. O termo restrição de crescimen-to intrauterino (rCIU) é aplicado quando há uma falência em se obter uma veloci-dade de crescimento intrauterina normal, geralmente observada pela realização de ultrassonografias seriadas, e implica causa patológica para a inibição do crescimento intrauterino, refletindo um processo pato-lógico de restrição ao crescimento fetal. O uso do termo “baixo peso ao nascimento” como sinônimo de PIG também é impre-ciso. Por definição, apresenta baixo peso de nascimento o recém-nascido que nas-ce com menos de 2.500 g. Porém, crianças prematuras podem nascer com peso infe-rior a 2.500 g e estarem adequadas para a idade gestacional.

Essa definição exige, portanto, a adequa-da determinação da idade gestacional e a adequada técnica de medida do compri-

mento. Posteriormente, devem-se plotar os dados obtidos pelo cálculo da idade gesta-cional e pela medida de comprimento em tabelas apropriadas para comparação.

Foi realizado estudo nacional de peso e comprimento ao nascer por idade gesta-cional pelo Prof. dr. José Lauro de Araujo ramos, mas não publicado (doutorado em Medicina, Universidade de São Pau-lo, USP, Brasil. Título: Avaliação do cresci-mento intrauterino por medidas antro-pométricas do recém-nascido).

� 2. etioLogiaO nascimento de uma criança PIG é o

resultado de constrição ou restrição sofri-da durante a gestação.

Várias são as causas possíveis para jus-tificar restrição de crescimento. Causas relacionadas a mães são as mais frequen-tes. Assim, tabagismo, alcoolismo, uso de drogas ilícitas, hipertensão arterial e anemia falciforme podem justificar o nas-cimento de uma criança PIG.

Causas de insuficiência placentária e causas fetais, como gemelaridade e alte-rações cromossômicas, também podem ser observadas.

A criança nascida pequena para a idade gestacional

Departamento de Endocrinologia Pediátrica

Dr. Raphael Del Roio Liberatore Junior - CRM-SP 56.940Professor Livre-Docente, Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo

Dra. Cristiane Kochi - CRM-SP 69.772Professora Adjunta da Faculdade de Medicina da Santa Casa de São Paulo

Dr. Hamilton Cabral de Menezes Filho - CRM-SP 69.917Médico Assistente da Unidade de Endocrinologia Pediátrica do Instituto da Criança do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo

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� 3. forma De DiagnósticoComo citado anteriormente, o correto

diagnóstico de PIG para peso e estatura envolve a correta determinação do com-primento da criança e a plotagem desse valor em curva adequada.

O recém-nascido deve ter seu compri-mento medido pela utilização de uma régua com uma das extremidades móvel e sobre uma superfície rígida, de forma que o com-primento (distância entre a cabeça e os pés) seja obtido com as pernas estendidas.

Existem várias curvas de comprimen-to por idade gestacional para recém--nascidos. A mais conhecida é a curva de Lubchenco, e curvas mais recentes estão disponíveis na literatura em inglês.

Na tabela 1, está representada a cur-va baseada na população americana (dados de 257.855 lactentes, coletados no período de 1998 a 2006) para peso, comprimento, perímetro cefálico, idade gestacional estimada, idade, sexo e etnia, publicada em 2010.

� 4. cuiDaDos especiaisAlguns anos atrás, a preocupação com

recém-nascidos PIG era reduzir as com-plicações e aumentar a sobrevida no período neonatal imediato. Atualmente, tem-se dado maior ênfase nas compli-cações a longo prazo. dentre essas com-plicações, podemos citar: baixa estatura, obesidade, síndrome de ovários policísti-cos, diabetes mellitus tipo 2.

4.1 – Comprometimento estaturalCom relação à estatura, cerca de 10%

a 15% das crianças que nascem PIG te-rão comprometimento estatural, ficando abaixo do padrão familial, e destas, 50% ficarão com a estatura final abaixo de -2 dP em relação à população geral.

A recuperação do crescimento come-ça imediatamente após o nascimento, sendo que os maiores incrementos da estatura são observados por volta dos 6 meses de idade. Crianças com redução do peso de nascimento têm um risco 5,2 vezes maior de se tornarem adultos com baixa estatura, nos casos em que o com-primento de nascimento for reduzido, o risco se eleva para 7,1 vezes.

A prematuridade é um fator associado, que não apenas interfere no diagnóstico, mas também no padrão de recupera-ção do crescimento. Crianças nascidas a pré-termo-PIG apresentam recuperação mais lenta que as a termo PIG, podendo a recuperação se completar apenas ao redor dos 4 anos de vida. A prematuri-dade por si só tem sido apontada como um fator de risco para a baixa estatura. Nos nascidos a pré-termo, pode ocorrer uma restrição do crescimento pós-natal, que determina redução da capacidade de recuperação do crescimento e perda estatural.

As causas da falta de recuperação pós--natal da estatura permanecem pouco esclarecidas. Alguns estudos sugerem que alterações do eixo GH/IGF-I ou da ação da insulina possam ter um papel importante no bloqueio da recuperação estatural.

Considerando-se que a deficiência de GH não é um fator preponderante nas crianças com rCIU, a avaliação da secre-ção de GH através de testes de estímulo torna-se de pouca utilidade na identifica-ção das crianças que irão se beneficiar do tratamento, confirmando que os valores basais de GH ou o pico de GH após testes de estímulo não são fatores preditivos de melhor resposta durante o tratamento.

Crianças PIG geralmente possuem ida-

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de óssea atrasada, mas que não apresen-ta consistência na previsão da estatura final. Esse fato parece refletir um proces-so anormal de maturação óssea nessas crianças. Portanto, a idade óssea não deve ser usada na previsão de estatura final em crianças nascidas PIG.

A incapacidade de se prever a esta-tura final nesses pacientes também se deve ao fato de a idade óssea não se re-lacionar ao momento de início puberal. Frequentemente, a puberdade começa nos limites inferiores do normal para a população geral, mesmo com idades ós-seas atrasadas.

4.2 – Alterações metabólicasA associação entre baixo peso ao nas-

cer e doenças crônicas do adulto tem sido muito descrita, tanto por estudos epidemiológicos quanto por modelos animais.

Estudos populacionais mostram que indivíduos que nasceram pequenos têm prevalência maior de doença coronaria-na aguda (15%) em relação aos que nas-ceram com peso adequado (4%). Esses estudos mostram que a restrição de cres-cimento intrauterino representa um risco maior de doença coronariana e hiperten-são arterial do que a prematuridade.

Além da associação com hipertensão arterial e doença cardiovascular, o baixo peso ao nascer também está associado à intolerância à glicose, resistência insu-línica, diabetes tipo 2, ovários policísti-cos, dislipidemia e doença pulmonar obstrutiva.

No entanto, a maioria dos estudos populacionais relaciona o baixo peso ao nascer, não corrigindo o peso para a ida-de gestacional, dificultando a interpreta-ção se o risco para síndrome metabólica

ocorre pela restrição de crescimento in-trauterino, pela prematuridade ou am-bos. Vários relatos recentes têm associado a prematuridade à menor sensibilidade insulínica. No entanto, Willemsen, em ar-tigo publicado em 2009, demonstrou em pacientes adultos jovens que não havia diferença da sensibilidade insulínica en-tre os que haviam nascido prematuros ou a termo.

Independentemente da idade gesta-cional, as crianças que nasceram com baixo peso e que ganham peso rapida-mente nos primeiros anos de vida têm maior risco de obesidade e síndrome metabólica no futuro, ocorrência de menarca mais cedo e menor desempe-nho escolar. Estudo de coorte avaliando as crianças PIG com recuperação rápida de peso e/ou estatura, em comparação àquelas sem recuperação, demonstrou maiores concentrações de insulinemia no primeiro grupo já no primeiro ano de vida. O rápido ganho de peso entre 0 e 6 meses é preditor de risco de síndrome metabólica em idades mais avançadas. Ainda se discute o mecanismo pelo qual algumas crianças apresentam crescimen-to compensatório e outras não. Poderia ser apenas a maior oferta de alimentos, mas outros fatores também poderiam estar implicados, como aumento da con-centração de grelina.

A principal hipótese para tentar expli-car essa associação entre baixo peso ao nascer e resistência insulínica é a propos-ta por Barker e Hales em 1992. Esses auto-res adotam o conceito de programação fetal, que seria uma resposta adaptativa do feto às situações adversas nutricio-nais no ambiente intrauterino. Nessa si-tuação, haveria crescimento preferencial de órgãos nobres (como o cérebro) em

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detrimento de outros (como as células betapancreáticas). Após o nascimento, se houver mudança das características do meio ambiente, com maior oferta de nutrientes, esses indivíduos se tornariam de maior risco para o desenvolvimento de síndrome metabólica. Portanto, implí-cito nesse conceito está a ideia de que há um período crítico de plasticidade meta-bólica, sensível ao ambiente, seguido de período de perda da plasticidade e capa-cidade funcional fixa.

No entanto, ainda não estão bem es-tabelecidos os mecanismos que regu-lam essa programação fetal. Há algumas evidências sugerindo que alterações na regulação epigenética de alguns genes específicos poderiam estar envolvidas nesse processo.

Um conhecimento maior dos padrões de plasticidade fetal em resposta aos fatores ambientais e nutricionais deve-ria permitir identificar marcadores para reconhecer precocemente, na vida pós--natal, as crianças de maior risco metabó-lico. Além disso, seria possível também programar intervenções no sentido de redução de risco de doenças crônicas, como orientação nutricional adequada para esse grupo de lactentes. recente-mente, estudos em modelos animais su-gerem que a programação fetal possa ser revertida. Se essa teoria for aplicável aos seres humanos, abre amplo espectro de abordagem terapêutica e preventiva.

� 5. tratamentoCrianças PIG que não apresentaram re-

cuperação de sua estatura para o padrão populacional ou para o padrão estatural familiar até os 2 anos de vida podem se beneficiar do tratamento com GH. Antes que o tratamento seja iniciado, as doen-

ças pediátricas associadas ao crescimen-to deficiente devem ser afastadas, confir-mando que a baixa estatura seja apenas secundária ao rCIU, sem nenhum outro fator pós-natal determinante da para-da do crescimento. A indicação do GH a esses pacientes se consolidou após os resultados observados na estatura final e da aprovação de órgãos internacionais que regulamentam o uso de medica-mentos, como a US Food and drug Ad-ministration (FdA) em 2001, e a Agência Europeia em 2003 (CPMP-Committee on Proprietary Medicinal Products). A tabela 1 mostra os critérios para a introdução de GH de acordo com as duas agências. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) também aprovou o uso do GH em crianças PIG no Brasil.

Em 613 crianças com rCIU, ranke e cola-boradores relataram que 52% da variação da resposta no primeiro ano de tratamento foi explicada pela dose do GH, idade cro-nológica e peso ao início do tratamento e estatura-alvo. A dose de GH teve o maior valor preditivo. Além disso, a resposta ao primeiro ano de tratamento foi o melhor preditor de resposta no segundo ano.

A idade de início do GH continua contro-versa, porém acredita-se que o início do GH deva ser precoce. Os estudos mostram que as crianças tratadas antes dos 4 anos apre-sentam maior recuperação do crescimen-to. Além da idade de início de GH, o tem-po de tratamento também é importante, sendo demonstrado que as crianças com maior tempo de uso de GH apresentam melhores resultados de estatura final.

O uso de dose de GH de 0,1 UI/kg/d (0,033 mg/kg/d), especialmente quando iniciada no final da primeira década de vida, não determina benefício significan-te sobre a estatura final. doses entre 0,15

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e 0,2 UI/kg/d determinaram respectiva-mente um ganho de 2,0 e 2,7 dP de es-tatura em relação à estatura inicialmente prevista, permitindo ainda que em gran-de parte dos casos haja recuperação do padrão genético familial.

Pacientes que iniciaram tratamento próximo ou durante a puberdade apre-sentaram incremento da estatura de ape-nas 0,6 dP em relação ao grupo controle, pacientes tratados mais precocemente obtiveram um ganho estatural de até 2 dP na estatura final. Portanto, deve-se ob-ter recuperação estatural próximo ao alvo genético antes do início da puberdade.

Com relação ao tipo de administração do GH, contínuo ou intermitente, ainda continua controverso qual esquema seria melhor. Alguns estudos mostraram que o esquema contínuo apresenta melhor resul-tado na estatura final, pois com o esquema intermitente um grande número de crian-ças apresenta desaceleração do crescimen-to após a suspensão da medicação.

Com relação à segurança do GH, os es-tudos mostram que o GH é bem tolerado

pelas crianças com rCIU. recomenda--se manter as concentrações de IGF-I e IGFBP-3 dentro dos valores normais. O uso do GH reduz o índice aterogênico, melhora a composição corporal dessas crianças, aumentando a massa magra e reduzindo a massa gorda. O aumento da insulinemia observada durante o trata-mento volta ao normal em até seis meses após o término do GH.

Estudo recente com 55 mil crianças em tratamento com GH mostrou que o trata-mento em crianças PIG tem baixa taxa de efeitos colaterais.

Estudo realizado em nosso meio em crianças prematuras PIG, com início do GH entre dois e quatro anos, mostrou melhora do escore-z de estatura nos dois primeiros anos de tratamento, sem efeito colateral observado nesse grupo.

Com relação ao quadro metabólico, o mais importante é a prevenção. O con-trole adequado do ganho pôndero-esta-tural, especialmente nos primeiros meses de vida, pode prevenir a evolução das doenças crônicas.

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Tabela 1: Curvas de peso, comprimento

e perímetro craniano para idade gestacional

(A) peso para idade de meninas; (B) comprimento e perímetro cefálico de meninas; (C) peso para idade de meninos; (B) comprimento e perímetro cefálico de meninos, de acordo com a idade gestacional. Os percentis 3 e 97 de todas as curvas para 23 semanas de idade devem ser interpretados com cuidado, por causa do reduzido número da amostra (adaptado de Olsen et al. 2010).

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expediente

Diretor:Miguel Taberner Sala

toda correspondência deve ser dirigida a:

Rua Engenheiro Jorge Oliva, 332 - Vila Mascote - 04362-060 - São Paulo - SPTel.: (11) 2339-4440 - (11) 2339-4450E-mail:[email protected] – Site: www.editoraartedecuidar.com.br

O conteúdo desta obra é de responsabilidade dos Autores, devidamente indicados na publicação, e não reflete necessariamente a opinião da MTS EDITORA ARTE DE CUIDAR LTDA. e do laboratório que patrocina a distribuição do material aos profissionais envolvidos. Em consonância com os termos da RDC Anvisa no. 96/08, esta obra destina-se exclusivamente a profissionais autorizados a prescrever os medicamentos aqui apresentados.

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