Mouros Míticos en Tras-os-Montes_vol.2, por Alexandre J. Parafita Correia

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    Alexandre Jos Parafita Correia

    Mouros Mticos em Trs-os-Montes

    contributos para um estudo dos mouros no imaginrio rural

    a partir de textos da literatura popular de tradio oral

    Volume II(corpus narrativo)

    Universidade de Trs-os-Montes e Alto Douro

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    NDICE DO CORPUSNARRATIVO

    Nota Prvia .................................................................................................................. 10

    Concelho de Alfndega da F ..................................................................................... 121 [Os cavaleiros das esporas douradas]2 [O Castelo da Marrua]3 [A Fonte dos Vilarelhos]4 [A Fraga da Tecedeira]5 [O segredo da moura]

    6 [A moura das Casas Brancas]

    Concelho de Alij .......................................................................................................... 157 [A moura encantada de Sanfins do Douro]8 [Os figos da princesa moura]9 A moura do monte do Piolho10 Lenda da Anta da Ch11 Lenda da Pala Moura

    Concelho de Boticas ...................................................................................................... 1812 [Os mouros do castro de Sapios]13 Lenda da moura a cantar14 Lenda do Cobrio

    15 [A moura, as palhas e o ouro]16 [A moura a catar os piolhos]17 [O Cto dos Corvos]18 Ponte da cerca do castro19 Tenda das lameiras do castro

    Concelho de Bragana .................................................................................................. 2220 [Ladeira do Pingo]21 [A moura, metade homem e metade cabra]22 [O tesouro do castro de Caravela]23 [A fonte do Castro de Baal]24 A moura encantada no fundo de um poo25 O castelo de Rebordos

    26 [O Cabeo da Velha]27 [O Picadeiro dos Mouros]28 [O Vale da Moura]29 Lenda de S. Pedro de Sarracenos30 A Fonte da Moura de S. Julio31 Lenda de Santa Colombina de Gimonde32 A lenda do Conde de Aries33 Lenda dos Sete Infantes de Lara34 A fraga do cavaleiro35 Lenda da Fundao de Bragana36 O cabeo de S. Bartolomeu

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    37 A Fontela de Candegrelo

    38 O bruxo e a moura39 A Cortadura dos Mouros40 Lenda da moura do Reboledo41 Lenda do Castelo de Pinela

    Concelho de Carrazeda de Ansies ........................................................................... 3742 [Lenda do penedo das letras]43 O Castelejo44 [Figueira Redonda]45 Dlmen de Vilarinho de Castanheira46 [O Vale da Osseira]47 Lenda da Fonte da Moura de Seixo de Ansies48 A menina encantada

    49 Lenda da Fraga de Selim

    Concelho de Chaves ...................................................................................................... 4250 A Cerca dos Mouros de Vila Verde da Raia51 [A vila de Chaves e os mouros]52 Lenda do cavalo branco montado por Santiago de Compostela53 Lenda do bezerro de ouro54 Lenda da grande cobra a guardar o encanto55 A mina da Bolideira56 O guerreiro e a princesa moura57 O monstro do castelo de Monforte58 O cavaleiro e a princesa59 Os lagares da moura

    60 A moura da Ilha dos Lagartos61 A moura do stio das Colmeias62 Lenda do Calhau da Moura63 Os figos da Fonte de Vale de Asnos64 A parteira e a moura65 Lenda do Forte de S. Neutel

    Concelho de Freixo de Espada Cinta .................................................................... 5466 Freixo de Espada Cinta67 Fonte da Moira

    Concelho de Macedo de Cavaleiros ........................................................................... 5568 [Nossa Senhora das Flores]

    69 [Cordo de oiro nas Gumbrias]70 [A galinha com pintainhos de oiro]71 [Espada nele! Espada nele!]72 [A Senhora do Blsamo na Mo]73 A Pedra Baloiante74 O tesouro do monte do Castelujo75 A moura e o moleiro de Nozelos76 Lenda do Cabeo dos Mouros77 Lenda de Lates78 Lenda da Pia dos Mouros

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    79 O moleiro, a moura e a cabra

    80 O Vale dos Namorados81 O tesouro da serra de Bornes82 O mouros do Monte de Morais83 O Z-da-moura

    Concelho de Meso Frio .............................................................................................. 6784 [O Castelo dos Mouros em Fontelas]85 Os mouros e o convento do Varatojo

    Concelho de Miranda do Douro ................................................................................. 6886 [O cristo, o mouro e a Senhora do Nazo]87 O poo sem fundo88 A Fonte do Pingo

    89 O cabreiro e a moura90 S. Bartolomeu e os mouros

    Concelho de Mirandela ................................................................................................ 7391 Baslia92 [Santa Comba e o rei Orelho]93 A lenda de Dona Chama94 A sineta dos mouros95 A cisterna da Torre de Dona Chama96 [Mil ais]97 [O tesouro, a moura e o diabo]98 Lenda de Mirandela99 A maldio da serra dos Passos

    100 O Monte da Moura101 O tesouro dos mouros da Freixeda102 O caador e a moura103 Lenda do buraco da Muradelha104 O lavrador e a cobra105 Lenda da Fonte de Vide106 A fraga da mula107 Lenda do Regodeiro108 A grade de ouro109 A velha e o carvo110 A chave de ouro111 A pocinha do Vale de Amieiro

    Concelho de Mogadouro .............................................................................................. 89112 [O Castelo de Boua de Aires]113 Capela de Santa Cruz114 Os forninhos de Alvagueira115 [A moura do castelo de Bemposta]116 [O castelo dos mouros de Vilarinho dos Galegos]117 [O castelo do Mau Vizinho]118 Vilarinho dos Galegos119 A lenda da fraga do Poio120 A lenda de Vale da Madre

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    121 A Fonte do Ouro

    122 Lenda do Poo do Dourado123 O caminho da moura encantada

    Concelho de Mondim de Basto ................................................................................... 97124 Lenda do Alto dos Palhaos125 O pequeno pastor e a moura126 A bacia de ouro127 O Monte Farinha e a Senhora da Graa128 Os mouros e a ferramenta

    Concelho de Montalegre .............................................................................................. 101129 [A tenda da moura]130 O Crrego da Paixo

    131 [O cinto do mouro]132 [As mouras dos Rameseiros]133 [Crastelos ou Casas dos Mouros]134 [A marra dos mouros]135 [A fora dos mouros]136 [Fonte da Moura]137 [Altar da Moura]138 [Castro de Travassos]139 [Lenda do Mosteiro de Pites das Jnias]140 [O castelo de Montalegre]141 - Lenda da Serra da Mourela142 Foge Mouro143 A Cova dos Maus

    144 As mouras da Portela do Antigo145 Lenda de Parafita146 A navalha de ouro147 O mouro e a menina da Cidade de Mel

    Concelho de Mura ....................................................................................................... 114148 O poo da moira149 O rochedo da moira150 A moura de Sobreda151 O cavalo de ouro

    Concelho de Peso da Rgua.......................................................................................... 116152 [A mina de peste e oiro]

    153 A Mina de Dona Mirra154 Os figos de Dona Mirra155 Lenda do Frago de S. Leonardo156 A bola de Dona Mirra157 Os lagartos de Dona Mirra158 A moura e a giestas159 O cavalo de trs pernas160 Lenda de Moura Morta161 Lenda da Moura Encantada do Fonto

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    Concelho de Ribeira de Pena...................................................................................... 122162 O tesouro de Lamelas

    Concelho de Sabrosa ..................................................................................................... 123163 [Os mouros do castelo de S. Domingos]164 [O Cho dos Mouros em Donelo]165 Lenda de Provezende166 O castelo dos mouros167 Em busca dos cordes de ouro168 O buraco onde urinavam os mouros169 A noiva encantada170 A lenda da Pala da Moura

    Concelho de Santa Marta de Penaguio .................................................................. 128171 [Lenda de Penaguio]172 Entre S. Pedro e Urval173 A fraga da Moura (Alvaes do Corgo)

    Concelho de Torre de Moncorvo ............................................................................... 131174 A lenda da Cabea do Mouro175 [Santo Apolinrio e os mouros]176 [O buraco dos mouros debaixo da capela]177 [A matana dos mouros]178 A Lenda da Fraga Amarela179 A moura encantada de Adeganha180 [Chelindro da Presa]181 Lenda do Bezerro de Ouro182 Lenda da Fraga da Pindura183 A fonte da Chuzaria184 A lenda da Fonte de Carvalho185 Lenda da Ferrada186 A moura e o bezerro de ouro

    Concelho de Valpaos ................................................................................................... 141187 [O Vale da Batalha]188 Pia dos Mouros189 A mina da moura190 A Fonte da Moura191 A fonte fria192 A tesoura da moura

    193 A fraga da urze194 A parteira das mouras195 Lenda do Monte das Fragas196 O rio seco197 A lmpada de ouro198 A moura e o torgueiro199 Lenda da Fonte da Urze200 A Fada d'El Rei201 O bezerro de ouro de Lebuo202 As pias dos mouros de Argeriz

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    Concelho de Vila Flor ................................................................................................... 151203 [O cntaro cheio de novelos de ouro]204 [Na fonte do Lameiro de Cima]205 [As mouras de Freixiel]206 Lenda da Fonte da Crica da Vaca207 [Mil Almas e Covas]208 Lenda da Fonte das Bestas209 A moura das Fragas do Rugido210 Lenda da Fonte do Lameiro211 A menina e o cordo de ouro212 Lenda do Penedo Redondo213 Lenda de Vale Frechoso214 O choro da moura em Santa Comba da Vilaria

    215 Lenda da Fraga do Pinhal216 Lenda da Fonte d'El Rei217 A Fraga da Moura de Seixo de Manhoses

    Concelho de Vila Pouca de Aguiar ............................................................................ 161218 Os trs potes219 A casa dos mouros de Cidadelha220 Lenda dos pintainhos de ouro221 Lenda da fraga do gestal222 A lenda da fraga das campainhas

    Concelho de Vila Real .................................................................................................. 164223 O castelo de S. Tom

    224 Lenda de S. Tom do Castelo225 [As talhas do mouro]226 Gruta com feitio de Mesquita227 A moira e o carvoeiro228 A moura da Ponte da Aradeira229 O Vale da Bela Luz230 Lenda do Poo de Panias231 Lenda da moura branquinha232 A moura, o pssaro e a cobra234 [O cristo, o mouro e a Senhora de Guadalupe]

    Concelho de Vimioso .................................................................................................... 173235 [O mouro e a boieira]

    236 [Lenda do cordo de oiro]237 Lenda da Serra do M238 Lenda do Castelo de Algoso239 Lenda da Fonte de S. Joo240 O lagar de ouro de Algoso241 O pente e o cabelo da moura242 Lenda do Penedo da Abrunheira243 O bruxo do castelo de Algoso

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    Concelho de Vinhais ..................................................................................................... 178244 A tomada de Souane aos mouros245 O choro da moura [de Souane]246 [A moura encantada e o lenhador]247 [A moura e a pastora]248 [A moura no rio Mente]250 [A lenda de Igreja de S. Facundo]251 [O mouro e a igreja de S. Facundo]252 [O Serro de Penhas Juntas]253 [A Fraga do Pingadeiro]254 [Santa Comba de Ousilho]255 A moura e o cavaleiro cristo256 A fraga onde Nossa Senhora descansou257 A Fraga dos Mouros de Espinhoso

    258 Lenda do Canho259 Lenda da Torca de Balmeo260 As mulheres do linho e as mouras261 Lenda das Fragas do Carvalhal262 A fraga da Moura de Sobreir de Cima263 O tesouro da Cerca

    ndice Remissivo das Fontes do Corpus ................................................................... 191

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    Cumpre-nos aqui ressalvar que, na pesquisa realizada em fontes primrias,

    procurmos afastar as lendas de contedo claramente romanceado (lendas de

    autor), onde se torna difcil (ou arriscado) potenciar os assuntos e motivos que

    emanaram das fontes orais originais, distinguindo-os dos impulsos erudito-literrios

    dos seus autores.2

    A ideia foi reunir um corpus fivel e representativo no quadro de uma exegese

    do universo antropolgico tradicional. Por isso, importou, acima de tudo, uma busca

    dos contedos da memria que melhor se aproximem do seu fundo essencial,

    permanente, que provm da lonjura dos tempos.

    2 Procurmos apresentar todos os textos narrativos sob o ttulo que as respectivas fontes indicavam. Noscasos (de publicaes) em que tal indicao no existia, optmos por propor um ttulo, colocando-oentre parntesis rectos.

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    Concelho de Alfndega da F

    1 [Os cavaleiros das esporas douradas]

    Tendo os mouros uma fortaleza no monte do Carrascal, prximo da vila deChacim, saram de Alfndega da F 25 cavaleiros de esporas douradas, que ajudandoos de Chacim e de Castro Vicente, desbarataram os mouros, obrando tais actos de bravura que obtiveram para a sua terra, que se chamava somente Alfndega, o

    sobrenome que tem3

    .Diz-se que o alcaide mouro do Carrascal, ufano com o seu castelo, impunha aoscristos circunvizinhos os tributos que queria, exigindo at tributo de donzelas para oseu harm. Pedindo esse tributo aos cristos de Castro Vicente, estes pediram socorroaos desta vila [Alfndega da F], que, tomando as armas, atacaram o castelo comgrande intrepidez, tomando-o, matando o alcaide e livrando o pas deste malvado4.

    Fonte: LEAL, Pinho Portugal Antigo e Moderno, vol. 2, Lisboa,Livraria Editora de Mattos Moreira & Companhia, 1873, p. 114.

    2 [O Castelo da Marrua] No stio chamado Marrua, tambm dito Castelo de Marrua [em Parada,

    concelho de Alfndega da F], h restos de fortificaes, muros, fossos, etc., quedizem ser dos mouros. Perto fica a Fraga do Crato, metida em espesso carrascal,interessante por apresentar a forma de capela e por o povo lhe ligar a lenda de tesourosencantados.

    No Castelo da Marrua aproveitaram os rochedos para defesa, completando aparte onde faltavam por muros. quase inacessvel, a no ser por um lado, no qualreforaram o sistema defensivo por outro muro um pouco afastado do recinto e poruma larga faixa de pedras de mais de metro, enterradas com a ponta aguada para

    cima.Fonte: ALVES, Francisco M. Memrias Arqueolgico-Histricas do

    Distrito de Bragana, vol. IX, Porto, 1934, p. 149.

    3 Pinho Leal refere que ainda em 1650 se conservavam na casa da Cmara de Alfndega da F diversasarmas com que o povo se defendia dos rabes e os atacava. E acrescenta terem sido, entretanto,convertidas em instrumentos agrrios (1873: 114).4 Esta verso, publicada por Pinho Leal, reproduz, com a respectiva actualizao ortogrfica, o contedo

    j antes publicado pelo Padre Luiz Cardoso, noDiccionario Geographico, em 1747, em artigo dedicadoa Alfndega da F (apudAlves, 1934a: 106).

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    3 [A Fonte dos Vilarelhos]

    Na fonte dos Vilarelhos, termo de Alfndega da F, vive uma linda moura emguarda de valiosssimo tesouro. Um homem a quem apareceu soube-lhe falar e ela prontificou-se a dar-lhe seis vintns dirios, tanto disse bastar-lhe para seu governosem necessidade de trabalhar, se l fosse todos os dias ao dar da meia noite.

    Na verdade, o homem no era peco, e todos os dias, hora aprazada,encontrava junto fonte, debaixo de uma pedra, a luzente moeda de prata. Os vizinhosadmiravam-se, porque, sendo pobre, vivia tripa-forra sem trabalhar. Os antigos

    camaradas de geira chamavam-no ao passar junto da sua porta para o servio, mas eledizia sempre que no ia. Por ltimo, aborrecido com a impertinncia da chamada,retorquiu escarnecedor e soberbo:

    Que no ia trabalhar,Nem de trabalhar precisaria,Enquanto a Fonte de VilarelhosLhe desse seis vintns por dia.

    Na noite seguinte voltou fonte, mas a moeda no estava e nunca mais a viu.

    Fonte: ALVES, Francisco M. Memrias Arqueolgico-Histricasdo Distrito de Bragana, vol. IX, Porto, 1934, p. 451.

    4 [A Fraga da Tecedeira]

    H lenda da moura encantada e de tesouros encantados em Agrobom [concelhode Alfndega da F], no stio chamado Fontanhas, onde aparece a moura a tecer emtear de oiro na manh de So Joo, e por isso chamam ao stio Fraga da Tecedeira eainda Mourim. O tesouro consta de um lagar de oiro.

    Diz a lenda que para o desencantar j l foi um padre com o povo fazeresconjuros e rezas. Apareceu o diabo escarnanchado na ponta do peso do lagar,declarando como que violentado e com a horrenda cara de quem :

    O tesouro aqui est. Onde queredes que vo-lo apresente?Tudo fugiu aterrado e o diabo desapareceu com o lagar, sem mais haver notcia

    dele.

    Fonte: ALVES, Francisco M. Memrias Arqueolgico-Histricasdo Distrito de Bragana, vol. IX, Porto, 1934, p. 490

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    5 [O segredo da moura]

    Na cortinha da Ermanda, no termo de Sendim da Ribeira [concelho deAlfndega da F], h uma moura encantada que apareceu a um rapaz, prometendo-lheimensas riquezas. Para isso devia o rapaz de meter as suas calas no meio de umrochedo que se abria por artes mgicas e se fechava seguidamente, e tambm de atirarcom um ovo cabea de uma cobra que sairia rapidamente contra ele.

    O rapaz devia guardar segredo, nada revelando de quanto lhe disse a moura,mas no teve pacincia. Jubiloso como estava com a riqueza prometida pela moura,declarou tudo.

    Ah, ladro, que deste cabo da tua fortuna! disse-lhe o pai quando soube dasinconfidncias do filho.

    E, na verdade, o fragueiro no se abriu e nunca mais viu a moura.

    Fonte: ALVES, Francisco M. Memrias Arqueolgico-Histricasdo Distrito de Bragana, vol. IX, Porto, 1934, p. 491

    6 [A moura das Casas Brancas]

    H uma moura encantada a tecer em tear de oiro nas Casas Brancas, termo deVale de Pereiro [concelho de Alfndega da F]. Estas casas, muitssimo pretas, porsinal, so os alicerces de uma aldeia mourisca. Percebem-se ali os restos de algumascasas, que no puderam ser acabadas por causa da expulso dos mouros.

    Ali ficou uma moura encantada em horrorosa serpente, e se algum mortal tivercoragem e tempo de dizer certas palavras sacramentais, a cobra desaparecer para darlugar a uma moura.

    Fonte: VILARES, Joo Baptista (apud ALVES, Francisco M. Memrias Arqueolgico-Histricas do Distrito de Bragana, vol.IX, Porto, 1934, pp. 491-492).

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    Concelho de Alij

    7 [A moura encantada de Sanfins do Douro]

    Ao tempo das longas e sangrentas batalhas que os rabes e os cristosdesenvolveram para o domnio do Algarve, foi uma bela princesa sarracena raptada etrazida [para Sanfins do Douro, concelho de Alij] por um jovem guerreiro cristo. Elonge da sua terra e dos seus carpiu a princesa as mgoas da solido e as angstias dainterminvel esperana do regresso ao lar.

    Inmeras foram as tentativas que os moiros fizeram para a libertar, baldadas,todas elas, pela vigilncia constante a que estava sujeita. Um dia, porm, o antigoapaixonado da infeliz moira, dando como senha de reconhecimento algo que noexistia na zona do desterro os figos do Algarve resolveu, com risco da prpria vida,libertar a sua amada.

    Em m hora o fez, j que foi descoberto e morto pelos escudeiros do raptor. A

    aventura romntica do califa, longe de terminar em bem, serviu ainda para maiorrecluso da princesa que, desiludida, se fechou nos aposentos e, desfeita em lgrimas,se finou aos poucos.

    Desde ento, porque morrera de amor, ficou encantada espera de algum,desditoso nos amores, que fosse capaz de obter o seu desencantamento. por isso que,nas raras manhs estivais de nevoeiro, ao subir o monte da Senhora da Piedade, sealgum apaixonado encontrar uma velha manta cheia de figos, deve apanh-los. Sequalquer deles se transformar em libra de oiro, a jovem moirinha recuperar aliberdade.

    S quem possuir um esprito puro o conseguir. E como a ningum aconteceualgum figo se transformar em oiro, a linda princesa aguarda um novo e intrpido

    cavaleiro que a liberte do encantamento e a devolva s terras quentes do seu queridoAlgarve.

    Fonte: GRCIO, Joaquim Monografia de Sanfins do Douro,Alij, Cmara Municipal de Alij, 1990, p.53.

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    8 [Os figos da princesa moura]

    Conta-se que no tempo em que os mouros habitavam esta regio, a filha de umrei mouro foi encantada por uma bruxa m que a tornou invisvel por muito tempo. Atque um dia um homem, quando vinha de trabalhar no campo, que ficava num lugarchamado Ribeirinhos e costumava atravessar por um atalho que fica por trs daSenhora da Piedade [Sanfins do Douro], reparou numa rocha que estava cheia de figos.

    Por momentos ficou confuso, porque no era tempo de figos. Passada aconfuso, resolveu pegar num punhado deles, meteu-os ao bolso e foi para casa. Mas oespanto dele ainda foi maior quando chegou a casa e quis mostrar os figos mulher.

    Ao meter a mo ao bolso, em vez de figos apareceram libras em ouro.O homem correu at rocha para apanhar mais libras, mas quando l chegou j

    no havia mais nada. E de repente ouviu uma voz que lhe disse: Tivesse-los levado. Agora j no h mais.Ele ento vira-se, e v uma menina muito bonita com lgrimas nos olhos.

    Fonte: JornalNotcias da Pequenada, Escola do 1 Ciclo de Sanfinsdo Douro, Alij, Maro de 1998.

    9 A moura do monte do Piolho

    Reza uma lenda antiga que, numa gruta escondida no denso pinhal do monte doPiolho, concelho de Alij, encontra-se uma princesa moura encantada, que guarda umvalioso tesouro e aparece em todas as noites de S. Joo, logo aps a meia noite. Diz-seque vista sob a forma de serpente tenebrosa, e que ali aguarda desde sempre que umhomem de coragem a v resgatar ao encanto a que est sujeita.

    O homem que conseguir voltar as costas ao medo e, numa dessas noites,esperar pela chegada da serpente e a beijar quebrar-lhe- o encanto, casar com ela eficar com todo o seu tesouro, que composto por muito ouro e muitas jias.

    Um dia um homem das redondezas, cansado de viver pobre e desejoso de casar

    com a princesa, encheu-se de coragem e disse para os seus vizinhos: Quem l vai sou eu, e haveis de ver se trago ou no trago essa tal moira!Todos lhe disseram para no ir, pois isso era perigoso. Se nunca ningum tinha

    conseguido ver a princesa moura, porque havia, logo ele, de o conseguir?O homem fez orelhas moucas aos conselhos que lhe deram, e l foi numa

    dessas noites de S. Joo. Primeiro levou algum tempo a procurar a gruta, e, quando adescobriu, esperou que chegasse a meia noite. Nessa altura, apareceu-lhe a serpente

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    que lhe subiu pelo corpo acima at ao rosto. Porm, o homem no chegou a beij-la.Apanhou tamanho susto, que fugiu dali a sete ps, ficando mudo para o resto da vida.

    No conseguiu, por isso, contar a ningum o que quer que fosse sobre aprincesa, ou sobre o tesouro. Diz-se ainda que outros o tentaram tambm ao longo dostempos, mas que, ou morreram de susto, ou ficaram cegos ao depararem com aserpente, e, por isso, o mistrio l continua.

    Fonte: PARAFITA, Alexandre O Maravilhoso Popular Lendas.Contos. Mitos., Lisboa, Pltano Editora, 2000, p. 165.

    10 Lenda da Anta da Ch

    Em tempos muito antigos existiu no lugar da Ch, concelho de Alij, um povode mouros que, segundo a tradio popular, deixou o seu vestgio numa anta oudlmen, sendo denominado aquele stio como "Fonte Coberta".

    Conta-se que uma jovem moura casou por amor contra a vontade do seu pai,um rei mouro. E por isso pagou caro a sua desobedincia, sendo obrigada a trabalharpara sustento da sua famlia e a construir, sozinha, a sua casa. Foi ela que carregou aspedras da anta cabea, e ao colo levava o seu filho ainda beb.

    Diz-se que, em noites de luar, ainda h quem oua os ais da jovem moura acarregar enormes pedras.

    Fonte: Inf.: Maria Fernanda M. Cardoso Dias, 51 anos; rec.: Alij,2001

    11 Lenda da Pala Moura

    Na manh de S. Joo dizem que as mouras aparecem com todos os seustesouros em frente da Pala Moura, em Carlo, concelho de Alij, estendendo-se ao sol, para ver se cativam algum da aldeia que as v libertar do encanto em que se

    encontram.

    Fonte: Inf.: Manuel Carvalho, 70 anos; rec.: Carlo, Alij,1999

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    Concelho de Boticas

    12 [Os mouros do castro de Sapios]

    O castro de Sapios, chamado tambm Casas dos Mouros, fica cerca de 400metros adiante de Sapios [concelho de Boticas]. Corre na tradio que os mourosdaquele castro apedrejavam os cristos quando por ali passavam a caminho da igrejaromnica de S. Pedro, que fica na margem direita do rio Terva, e a uns 500 metros dabase do castro.

    Fonte: COUTO, Artur Monteiro do Patrimnio Histrico de umaAldeia Transmontana Sapios, Boticas, C. Municipal de Boticas,1998, p. 17.

    13 Lenda da moura a cantar

    A Sr Delfina da Rua disse que a sua amiga Isabel Roseira, que j morreu h

    muitos anos, ia um dia com as ovelhas e, no stio da Pedreira, junto do monte do castrode Nogueira [em Bobadela, concelho de Boticas], viu uma moura, toda vestida debranco, a cantar em cima dum penedo. Cantava to bem e to lindamente que era umencanto ouvi-la.

    Quando a Isabel se aproximou, para a ver mais de perto e melhor a ouvircantar, a moura deixou de cantar e desapareceu.

    Fonte: MIRANDA JNIOR, Avelino; SANTOS, Joaquim Norberto;SANTOS JNIOR, Joaquim R. Castros do Concelho de Boticas - IICampanhas de 1984 e 1985, Boticas, Cmara M. de Boticas, 1986, p. 17.

    14 Lenda do Cobrio

    Um rapaz que meia noite vinha da Quint, ao passar junto do monte do castrode Nogueira, ouviu a voz de uma moura que lhe disse:

    Vou aparecer-te na forma dum cobrio muito grande. Vou subir por ti acimaat aos ombros e vou dar-te um beijo, mas no tenhas medo: ganhars o tesouro. Tensde me fazer sangue e no falars em Deus. Espera um pedao.

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    O rapaz, cobioso de haver mo o tesouro prometido pelo falar de moura,parou e aguardou que aparecesse o cobrio.

    Quando apareceu o cobrio, era um cobro to grande e fazia tanto barulho queo rapaz tomado de espanto e apavorado com o tamanho do bicho, no se conteve e,aflito, disse:

    Ai, Jesus!Naquele mesmo instante o cobrio desapareceu e, com ele, l se foi o tesouro,

    que continua encantado no castro de Nogueira.

    Fonte: MIRANDA JNIOR, Avelino; SANTOS, JoaquimNorberto; SANTOS JNIOR, Joaquim R. Castros do Concelho deBoticas - II Campanhas de 1984 e 1985, Boticas, Cmara Municipalde Boticas, 1986, pp. 17-18.

    15 [A moura, as palhas e o ouro]

    A uma rapariguinha que levou as vacas a pastar ao Cto dos Mouros [emVilarinho Seco, concelho de Boticas] apareceu-lhe um moura. Chegou-se fala comum pucarinho na mo e pediu-lhe se lho enchia de leite. A rapariguinha pousou umacestinha onde tinha trazido a merenda e prontamente mugiu uma vaca e encheu opcaro de leite.

    A moura, em paga do leite, encheu-lhe de palha a cestinha da merenda,recomendando que s abrisse a cesta em casa, e que muito teria que lhe agradecer. Arapariguinha, cheia de curiosidade, na primeira volta do caminho, mal deixou de ver amoura, abriu a cesta e, desejosa de ver o que poderia estar por baixo da palha, foiatirando fora a palha aos punhados. Como nada viu, fez mau juzo da moura.

    Quando chegou a casa contou tudo o que passara com a moura e mostrou acesta onde tinham ficado algumas palhas. Espanto da me e da filha: as palhas tinham-se transformado em ouro5.

    Fonte: MIRANDA JNIOR, Avelino; SANTOS, JoaquimNorberto; SANTOS JNIOR, Joaquim R. Castros do Concelho deBoticas - II Campanhas de 1984 e 1985, Boticas, Cmara Municipal

    de Boticas, 1986, pp. 53-54.

    5 Narrativas idnticas so referenciadas a propsito dos vizinhos castros de Nogueira, em Bobadela, edos Corvos, em Ardos, no mesmo concelho, variando apenas alguns dos motivos: em vez das vacas,ovelhas; em vez das palhas, pedaos de carvo (Miranda Jnior, et al., 1986: 18-19 e 74). Alis, estegnero de relatos, com idntica variao de motivos, comum a outras zonas da Regio.

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    16 [A moura a catar os piolhos]

    Conta-se que um dia, um cristo viu de longe uma moura a catar os piolhos nacabea do pai [na zona do castro dos Corvos, em Ardos]. Uns cristos de instintosmaldosos, sem no entanto a lenda explicar a razo daquela maldade, foram-seaproximando cautelosamente, rastejando por entre o mato. A pobre da mourinha, aover o mato a abalar, mal teve tempo de dizer ao pai "a urze venteja", poisimediatamente foram mortos o pai e a filha.

    Fonte: MIRANDA JNIOR, Avelino; SANTOS, Joaquim

    Norberto; SANTOS JNIOR, Joaquim R Castros do Concelho deBoticas - II Campanhas de 1984 e 1985, Boticas, Cmara Municipalde Boticas, 1986, pp. 74-75.

    17 [O Cto dos Corvos]

    Outra lenda (...) foi-nos dita pelo Sr. Antnio Afonso Fernandes, de 73 anos, eresidente na aldeia de Alturas de Barroso. Esta da guerra com os mouros do Castrode S. Romo. Os do Castro dos Corvos "puseram luzes nos cornos das cabras" e com oluminoso rebanho avanaram de noite sobre o Castro de S. Romo, que fica na base daencosta a sul e perto da Barragem de Pises. Claro que os do Castro de S. Romofugiram apavorados.

    O mesmo Sr. Antnio Afonso Fernandes informou que trs homens da aldeiadas Alturas foram ao Cto dos Corvos com o livro de S. Cipriano. Em dada altura daleitura "apareceu o encanto em forma de boi" que os fez prontamente fugir, aterrados.

    Fonte: MIRANDA JNIOR, Avelino; SANTOS, Joaquim Norberto;SANTOS JNIOR, Joaquim R Castros do Concelho de Boticas - IICampanhas de 1984 e 1985, Boticas, Cmara Municipal de Boticas,1986, p. 75.

    18 Ponte da cerca do castro

    Em tempos muito antigos, os mouros pretenderam fazer uma ponte de pedra dacerca do castro [de Carvalhelhos, concelho de Boticas] para a encosta ou ladeira doCorial, onde h os "fornecos dos mouros" e as mamoas. tradio que neles osmouros coziam o po.

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    Pois bem: tal ponte nunca se pde fazer, pela razo simples de que a gente deCarvalhelhos ia l de dia e deitava abaixo tudo o que os mouros tinham construdo denoite. A pertincia destruidora da gente de Carvalhelhos manteve-se firme e os mourostiveram de desistir do intento.

    Fonte: SANTOS JNIOR, J.R. O Castro de Carvalhelhos, Porto,Instituto de Antropologia da Universidade do Porto, 1957, p. 51.

    19 Tenda das lameiras do castro

    Conta-se que, em tempos muito antigos, nas lameiras da base do castro [deCarvalhelhos, concelho de Boticas], andava uma rapariga a pastar o gado quando viuuma tenda muito bonita com muitos objectos de ouro. Brincos, anis, cordes earrecadas eram em tal quantidade que metia espanto.

    Nessa tenda, espcie de lojinha, estava uma velhinha que pediu rapariga umapanela de leite. Se lha trouxesse, em paga lhe daria toda aquela riqueza. Deslumbrada,a rapariga no teve perna manca e foi a casa buscar uma panela de leite que a velhinhateria bebido com boa sede e grande aprazimento. Em paga encheu a panela de qualquercoisa que a rapariga no pde ver o que era. Ao entregar-lha disse-lhe que at casa novisse o que a panela tinha.

    A meio do caminho, porm, a curiosidade levou a rapariga a destampar a panela. Foi enorme o seu desapontamento ao ver singelssimos carves, que foideitando fora. Em casa desabafou com a me. A velhinha prometera-lhe a riqueza todae, no fim de contas, dera-lhe apenas carves que ela arremessara indignada. A mepodia certificar-se: ainda restavam dois ou trs no fundo da panela.

    A me foi ver a panela e verificou, espantada, que os bocados do carvo desobejo se haviam transformado noutras tantas magnficas libras em ouro. Me e filhaapressaram-se a percorrer o caminho em busca do carvo que a filha levianamentearremessara. Nada encontraram. Dos carves, da tenda e da velhinha, nem o menorvestgio.

    A minha informadora rematou: "A rapariga depois bem se arrepelava derretidaem lgrimas, mas j de nada lhe valia". A curiosidade, atributo bem feminino, fizera

    com que ela perdesse tanta riqueza.

    Fonte: SANTOS JNIOR, J.R. O Castro de Carvalhelhos, Porto,Instituto de Antropologia da Universidade do Porto, 1957, p. 52.

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    Concelho de Bragana

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    Na ladeira do Pingo, no termo de Espinhosela [concelho de Bragana], h um

    tesouro encantado [de que a moura guarda], que s pode ser desencantado, isto descoberto, pelas cabras a arranhar a terra.

    Fonte: ALVES, Francisco M. Memrias Arqueolgico-Histricasdo Distrito de Bragana, vol. IX, Porto, 1934, p. 492.

    21 [A moura, metade homem e metade cabra]

    No vale de Sio, termo de Parada de Infanes [concelho de Bragana], saiuuma moura encantada, metade homem e metade cabra, a um tal Antnio Alves,

    dizendo-lhe: Anda c, Antnio Alves, que levars para ti, filhos, netos e tetranetos.Mas o homem assustou-se, fugiu e o encanto sumiu-se.

    Fonte: ALVES, Francisco M. Memrias Arqueolgico-Histricasdo Distrito de Bragana, vol. IX, Porto, 1934, 493.

    22 [O tesouro do castro de Caravela]

    No termo de Caravela, concelho de Bragana, para a parte do poente, nas

    vizinhanas de uma pequena ribeira, acham-se vestgios de uma fortaleza, que segundoa tradio do tempo dos mouros. o castro de Caravela (...).

    Diz a lenda que neste castro h um grande tesouro, constitudo por um tear deoiro enterrado no ponto onde bate primeiro o sol na manh de So Joo. Mas como ocabeo onde est o castro banhado todo ao mesmo tempo, seria preciso revolver tudoe ningum se atreve a tanto.

    Fonte: ALVES, Francisco M. Memrias Arqueolgico-Histricasdo Distrito de Bragana, vol. IX, Porto, 1934, pp. 142-143.

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    23 [A fonte do Castro de Baal]

    O stio do termo de Baal, concelho de Bragana, chamado Castro, fica noextremo norte do mesmo, um quilmetro do povoado, a despenhar-se para o rio Pepim,que lhe corre aos ps a duzentos metros de profundidade, talhado quase a prumo. (...)

    Cem metros abaixo fica a Fonte do Castro, de boa gua, que rega uma pequenahorta, na qual, segundo a lenda, est uma moura encantada, por algum j vista nasmanhs de S. Joo a pentear-se com pentes de ouro ou pressentida nas mesmasmanhs, antes do sol-nado, a tecer em tear de ouro.

    Fonte: ALVES, Francisco M. Memrias Arqueolgico-Histricasdo Distrito de Bragana, Porto, vol. IX, 1934, pp. 122-123

    24 A moura encantada no fundo de um poo

    Uma vez trs amigos souberam que estava uma moura encantada no fundo deum poo [em Rio de Onor, concelho de Bragana] e resolveram ir desencant-la. O primeiro desceu num cesto, mas a certa altura era tal a escurido que ele tocou acampainha e os outros puxaram-no c para fora. O segundo foi mais fundo, mas eramtantos os mosquitos que ele tambm tocou e foi iado. O terceiro disse que se tocasseera para o descerem ainda mais. Quando ia a meio viu-se muito aflito, mas por maisque tocasse, os outros iam-no sempre descendo.

    Por fim, chegou ao fundo e encontrou uma linda moura encantada, que lhedisse:

    homem, tu que fizeste? Tu ests perdido! O diabo quem me guarda, e elevem a j e mata-te! Olha, ele vai desafiar-te para um duelo e mostrar-te espadas muitolindas e uma feia. As lindas so de vidro e tu deves pegar na outra.

    Assim sucedeu. O diabo apareceu e, cheio de fria, desafiou o homem para umduelo. O homem pegou na espada ferrugenta que era a de ferro, enquanto que o diaboteve de ficar com a de vidro. Vai o homem e zs, cortou uma orelha ao diabo, que deuum berro e deitou a fugir. A moura ficou toda contente e disse:

    Bem, j estamos livres dele, agora somos livres!Mas o homem no sabia o que havia de fazer. Ento a moura disse: Tu tens a a orelha dele e desde que a mordas tens tudo quanto queiras.

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    O homem mordeu a ponta da orelha e logo lhe apareceu o diabo a perguntar oque que ele queria. Ele disse que queria que os tirasse dali para fora. Logo baixaramo cesto os companheiros e a moura subiu. Mas mal esta chegou l acima, estes ficaramcom ela e deixaram o companheiro sozinho no fundo do poo6.

    Fonte: DIAS, Jorge Rio de Onor Comunitarismo Agro-Pastoril,Lisboa, Ed. Presena, s/d, p.172.

    25 O castelo de Rebordos

    Verso A:Diz a tradio que este castelo [situado no concelho de Bragana] fora manso

    de um rgulo mouro, a quem as povoaes pagavam de tributo certo nmero dedonzelas; e aponta-se, em confirmao, para o lameiro da vela acesa, que fica perto, aolado, porque foi nele que uma serva colocou, altas horas da noute, uma vela acesa,sinal da traio para com seu amo e de aviso, para avanar, aos inimigos que queriamdar morte, como deram, ao exactor de to negro tributo. (...) Notvel que, para perpetuar o facto, no se haja erguido sobre essas runas uma capela ou ermidadedicada Virgem, por interveno da qual os guerreiros ressuscitavam paracontinuarem a luta em defesa da virgindade ofendida.

    Verso B:Dois quilmetros a noroeste de Rebordos [concelho de Bragana],

    caminhando para o santurio da Senhora da Serra, sito no cume da Serra da Nogueira,distante quilmetro e meio, fica o local chamado Castelo de Rebordos, constitudo por enormes fragueiros, apenas acessvel pela nascente sul. Apresentando os outrosdois lados uma rampa a pique de mais de quatrocentos metros. (...)

    Vivia neste castelo um potentado mouro, a quem as povoaes limtrofespagavam o tributo de certo nmero de donzelas para o seu harm; mas uma delas, certanoite, quando ele dormia, deu sinal, segundo combinara, colocando uma vela acesa noprado, ainda hoje, por isso, chamado da Vela Acesa, e o rgulo foi atacado, morto, ocastelo destrudo e as donzelas libertas.

    Verso C (O rei mouro e a pipa dos pregos): Num morro prximo de Rebordos, concelho de Bragana, h um castro

    arruinado conhecido como o castelo dos mouros, onde, h muitos e muitos anos,viveu um rei mouro que subjugava pela fora toda a populao das redondezas. Quantos moas, antes de serem possudas por qualquer homem, eram obrigadas a frequentaro seu harm e satisfazer os seus prazeres.

    6 Jorge Dias acrescenta ao texto a indicao de que a histria devia ter continuao, mas [osinformantes, no indicados] no sabiam mais.

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    Um dia, uma jovem crist, irm do famoso Conde de Aries, tendo-se recusadoa seguir este destino, foi raptada pelo rei mouro e levada para o castelo. A, o tiranotentou faz-la ceder aos seus desejos, e, como ela continuasse a recus-lo, o reimandou buscar uma pipa e cravejou-a de pregos de fora para dentro, a fim de meter amoa l dentro e p-la a rolar pela encosta do morro abaixo.

    O Conde de Aries, ao saber do rapto, conseguiu chegar ao alto do morro, nomomento em que o rei se preparava para lanar a pipa no despenhadeiro. Travou umaluta com o tirano, venceu-o, e, por castigo, meteu-o a ele dentro da pipa, mandando-apela encosta abaixo. E assim o povo se libertou, de vez, do jugo dos mouros.

    Verso D (O Prado da Vela Acesa)Perto da aldeia de Rebordos, no concelho de Bragana, existia um castelo

    onde vivia um rei mouro muito poderoso, que obrigava as povoaes vizinhas apagarem, como tributo, um certo nmero de donzelas para o seu harm.Uma das donzelas, que era muito corajosa, no aceitou ser sujeita a tal infmia,

    e combinou um estratagema com o povo para matarem o rei mouro. Assim, pela caladada noite, enquanto ele dormia, a donzela saiu do castelo e foi acender uma vela nolugar que tinham combinado, que era um lameiro prximo. E ao sinal da vela acesa, opovo armado deslocou-se ao castelo a fim de matar o rei.

    Depois de morto o rei, o castelo foi destrudo e as donzelas foram libertadas. Eo lugar onde foi colocada a vela ainda hoje designado como o "Prado da VelaAcesa", havendo quem o conhea tambm como o "Lameiro da Talvela".

    Fonte verso A : LOPO, Albino Pereira "O castelo de Rebodos",in O Arquelogo Portugus, vol. 3, n.s 5 e 6, Lisboa, 1897, pp. 116-117. Fonte verso B: ALVES, Francisco M. Memrias

    Arqueolgico-Histricas do Distrito de Bragana, Porto, vol. x, 1934,pp. 8-9. Fonte verso C: Inf.: Virglio do Vale, 59 anos; rec.: Vila Boa, Vinhais, em 2000. Fonte verso D: Inf.: Maria Jos SantosSalgueiro, 35 anos; rec.: Bragana, 2000.

    26 [O Cabeo da Velha]

    Na base poente do Cabeo da Velha [em Labiados, concelho de Bragana], junto margem do rio Contense, stio chamado Rachas, fica a Pala dos Mouros,tambm dita Pena Veladeira, sob a qual h uma gruta, a pala no dizer do povo, quepode acobertar um rebanho de quarenta ovelhas (...)

    Pelos anos de 1860 foram desencantar a riqueza do Cabeo da Velha unsquantos sonhadores de tesouros, naturais de Baal e Sacoias, acompanhados de umpadre e de uma bruxa (...). Ainda conheci o padre, a bruxa (tia Martinha, de Sacoias) eos homens o tio Vicente e o tio Nicolau, aquele de Sacoias e este empregado namquina de destilao de vinhos de Baal.

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    O padre era natural de Baal, onde faleceu em 1892, e muitas vezes me contouo caso. Ele lia, lia no Livro de S. Cipriano, o autntico, um cdice antigo, manuscrito,se bem me recordo, pois os modernos, impressos, nada valem, dizia ele, e exorcismavasem cessar ( tambm condio indispensvel), metido dentro de um pentalfa inscritonum crculo que traou no terreno, do qual no podia sair, sob pena de ficar tudo semefeito; a bruxa, dentro de um signo Salomo, fazia conjuros e deitava as varinhas docondo e os homens cavavam, cavavam, sem parar e calados.

    Tudo corria admiravelmente, indicando que o tesouro estava prestes a sair.Neste comenos surge na escavao um sapo enorme, colossal (era o diabo, guarda dotesouro), a abrir e fechar a boca, num gesto de os papar a todos. Os homens aterram-se,o padre recua um pouco, saindo do crculo, a bruxa faz o mesmo e de repente atrincheira esboroa-se, apanhando o Nicolau pelas pernas; o tesouro, uma enorme bola

    de oiro, maior que a roda de um carro, reginga pela ladeira abaixo, at se esfrangalharno rio, sentindo-se nitidamente o tilintar do oiro nos fraguedos e lajes das margens, eum medonho tufo arrasta os sonhadores, por cima de carrascos e fraguedos, a muitosmetros de distncia, deixando-os assaz maltratados e sem poderem regressar a casa nomesmo dia ou s muito tarde.

    A bruxa, porm, foi vista logo em Sacoias, s e escorreita, com a cantarinhadebaixo do brao a ir buscar gua fonte. sempre assim! O tesouro l est, dizem osda carolice; falta, porm, a coragem precisa para o desencantar.

    Fonte: ALVES, Francisco M. Memrias Arqueolgico-Histricasdo Distrito de Bragana, Porto, vol. IX, 1934, pp. 631-632

    27 [O Picadeiro dos Mouros]

    Um pouco abaixo da Pena Veladeira [em Labiados, concelho de Bragana], nostio chamado Vale de Madeiro, no cume de um cabeo, h uma esplanada a quechamam Picadeiro dos Mouros, pois segundo a lenda, era ali que iam exercitar oscavalos.

    Um outro tesouro encantado est logo ali ao p no stio chamado Penados. NaPena Veladeira haviam gravado um corvo, que muita gente diz ter visto, e, segundo a

    mesma [lenda], o corvo estava voltado na direco do tesouro e a olhar para ele, masos galegos destruram-no ao arrancar a panela de dinheiro que l estava.

    Fonte: ALVES, Francisco M. Memrias Arqueolgico-Histricasdo Distrito de Bragana, Porto, vol. IX, 1934, pp. 632-633

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    28 [O Vale da Moura]

    H no termo desta povoao [Pinela, concelho de Bragana] um cabeo queapresenta restos de fortificaes, compostos de muros, fossos, etc. Chama-lhe Castelode Avelina (...) Encerra grandes tesouros guardados por uma moura encantada.

    (...) O povo tem m f com as trovoadas vindas do Vale da Moura, stio pertodo Castelo de Avelina, porque diz ele so pavorosas em granizo e pedradestruidora das searas. Deste castelo partia uma galeria subterrnea por onde osmouros iam levar os cavalos a beber a um regato distante. Tambm lhe aplicam a lendado tributo das donzelas.

    Fonte: ALVES, Francisco M. Memrias Arqueolgico-Histricasdo Distrito de Bragana, Porto, vol. IX, 1934, pp. 149-150.

    29 Lenda de S. Pedro de Sarracenos

    Diz a tradio popular que o actual termo de S. Pedro, no concelho deBragana, foi, noutros tempos, habitado pelos sarracenos, ou mouros. E que, quando

    veio a reconquista, os cristos investiram contra eles para os expulsarem. A batalhadeu-se em "Oliveiras do Bispo", um stio que ainda hoje tem esse nome.Conta-se que, durante a luta, os cristos tinham com eles a imagem de S. Pedro,

    que era o seu padroeiro. E que, de repente, tanto os mouros como os cristos ficaramimobilizados e depuseram as armas. No chegou a haver vencedores, nem vencidos.

    Tanto os cristos como os mouros encararam isso como um milagre de S.Pedro. E que era vontade deste santo no continuarem a batalha. Passaram por isso aviver em paz e coabitar a mesma terra, que passou a chamar-se S. Pedro de Sarracenos.

    Fonte:Inf.: Antnio Joo, de 81 anos; rec.: S. Pedro de Sarracenos,Bragana, 2001.

    30 A Fonte da Moura de S. Julio

    Na aldeia de S. Julio, concelho de Bragana, havia uma fonte conhecida comoa "Fonte da Moura" e tambm lhe chamavam "Fonte de Cima da Trembla", poissituava-se no cimo de uma lameira com esse nome.

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    Dizem as pessoas de idade que meia noite era costume ouvir-se ali tecer umtear. E que numa madrugada de S. Joo, uma mulher foi fonte e entrou-lhe a ponta deum cordo para o cntaro. Ela pegou nele e comeou a dobar at fazer um novelogrande, to grande que j no lhe cabia nas mos. E como s com muita dificuldadeconseguia dobar mais, resolveu partir o cordo.

    Nesse mesmo instante o novelo desapareceu-lhe das mos, e ouviu uma vozque disse:

    Marota, que me encantaste para toda a minha vida!E o tear ento nunca mais se ouviu. Dizem que a voz era de uma moura

    encantada. Se a mulher no tem partido o cordo, a moura teria aparecido na figura deserpente e no fazia mal a ningum. Bastaria que a mulher lhe tivesse deitado umpouco de saliva na cabea para ela ficar desencantada e em figura de uma jovem muito

    bonita. E traria com ela toda a sua riqueza.

    Fonte: Inf.: Raquel de Lassalete Vaz Rodrigues, 52 anos; rec.:Bragana, 2000.

    31 Lenda de Santa Colombina de Gimonde

    H muito, muito tempo, havia uma jovem chamada Colombina, que era filha deum rei mouro, e que foi pedida em casamento por um cavaleiro rico. O pai ficou muito

    satisfeito e no hesitou em conceder-lhe a mo da jovem.Porm, Colombina ficou aflita, porque, sem o pai saber, estava prometida a

    Jesus Cristo. Assim, no podia aceitar o casamento acordado por seu pai, e no podiatambm dizer-lhe as razes do impedimento. Resolveu por isso fugir.

    Andou muito tempo fugida, correndo sem destino, at que chegou a uma terrachamada Gimonde (situada no concelho de Bragana). E em sua perseguio vinha onoivo. Atormentada e j sem foras, a jovem pediu ajuda a uma fraga que encontroujunto aldeia:

    Abre-te fraga, que sers a minha morada!E o milagre deu-se. A fraga abriu-se, Colombina escondeu-se dentro, e ali

    passou a viver. Mais tarde apareceu a uma mulher que ia a passar, pedindo-lhe para

    construrem, naquele local, uma capela. O pedido foi aceite e o povo construiu acapela, que hoje l existe. E Santa Colombina continua a ser ali muito venerada pelopovo, especialmente pela mocidade.

    Fonte: Inf.: Raquel de Lassalete Vaz Rodrigues, 52 anos; rec.:Bragana, 2000.

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    32 A lenda do Conde de Aries

    Num castelo que havia alm naquele cabeo, entre Bragana e o Castro deAvels, vivia o Conde de Aries. Naquele tempo s havia ali o castelo e pouco mais. Eaqui, em Castro de Avels, havia um convento de monges. O Conde de Aries vivia nocastelo com a sua me, e tinham l tambm uma moa Alcina era como se chamava com quem ele andava para casar.

    Nessa altura, na Serra da Nogueira havia outro castelo e tambm outro conde.Chamava-se Conde Redemiro. Mas era uma pessoa diferente. Era mau. To mau queat exigia umas sete ou oito donzelas todos os anos para o castelo dele, para as ter l aoseu dispor. E tinha muitos cimes pela moa do Conde de Aries. Bem lha queria

    roubar, mas no podia.Ora, certa ocasio o Conde de Aries foi para uma batalha. E quando regressou

    ao castelo j no encontrou a noiva. A me tinha-a deixado raptar numa noite, quandovieram uns, a mando do Conde da Serra da Nogueira, e varreram com ela. E paraonde? Para o castelo do Conde Redemiro.

    O Conde de Aries ficou to aborrecido com a sua me que lhe soltou os lees.E como ela era uma velha, sem foras, j se est a ver o que lhe aconteceu.Desfizeram-na.

    Mais tarde ele arrependeu-se. E foi ento pedir aos monges do mosteiro doCastro de Avels que lhe dissessem que castigo deveria receber por ter deixado que ame fosse devorada pelos lees. E o que lhe disseram eles? Que criasse uma cobra que

    depois o devorasse tambm a ele, tal como deixou devorar a me. Ele assim fez. Criouuma cobra e sepultou-se com ela num tmulo que ainda hoje existe. E ali foi devorado.

    Quando o Conde estava j no tmulo, travou-se uma batalha entre cristos emouros na Serra da Nogueira, onde os cristos mataram o Conde Redemiro, com aajuda de uma criada que ele l tinha, e ganharam a batalha. E logo libertaram a moa, aAlcina. Ela fugiu ento para o castelo de c. S que quando chegou j o conde estavasufocado. Mas ainda travaram palavras, at que ele morreu. E com o desgosto, a moamorreu junto dele.

    Dizem tambm que os ais dela eram to grandes, que se ouviam nas terras aoredor. E uma dessas terras ficou at com o nome "Grandais", por causa dos grandes aisque se ouviam.

    O tmulo do conde est no mosteiro de Castro de Avels, onde viveramdurante muito tempo os monges beneditinos7.

    Fonte: Inf.: Lcia Gonalves, de 75 anos; rec.: Castro de Avels,Bragana, 2001.

    7 No muro do adro deste mosteiro esto igualmente representados em pedra os lees que devoraram aidosa. Um deles est sem cabea, o que, na tradio popular, tambm justificado: foi o conde quem lhacortou aps se arrepender do que aconteceu sua me.

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    33 Lenda dos Sete Infantes de Lara

    H muitos e muitos anos, houve na aldeia de Parada [de Infanes], concelhode Bragana, uma mulher, chamada Dona Sancha, que teve sete filhos de um s ventre.E viu-se to envergonhada com isso8 que combinou com a criada para que lhe fosseafogar seis, tendo escolhido um para criar. Quando a criada ia com os meninos metidosnuma canastrinha a caminho do rio, encontrou o patro, o famoso Conde Gonalves,que andava caa. Ao v-la, perguntou-lhe:

    Que levas nessa canastrinha?E a criada respondeu: Levo cezinhos de uma cadela que pariu l em casa. A senhora apenas quis

    um e mandou afogar estes.Diz-lhe ento o Gonalves: Pois no quero que os afogues. Volta para casa com eles e diz senhora que

    fui eu que mandei.A criada alterou-se contra o patro, e no lhe queria obedecer. Dizia que eram

    ordens da patroa. E essas que valiam. Ento o conde, mais arreliado ainda, tira-lhe acanastrinha das mos e v l os meninos. E diz-lhe:

    Valha-me Deus, mulher, que isto parte do meu corao!

    E assim o conde salvou os filhos. Mandou ento a criada embora, dizendo-lheque guardasse segredo junto da patroa. Que ele faria igual. A seguir foi espalhar os seisirmos pelas aldeias das redondezas9, para que lhos criassem. Quando atingiram aidade de sete anos, resolveu junt-los novamente e apresent-los me. Vestiu-ostodos de igual e meteu-os numa sala, juntamente com o que ela tinha. Depois chamoua mulher e disse:

    Vai visitar o teu filho. E v se o reconheces entre os demais.Mal a mulher olhou para eles, caiu redonda no cho, desmaiada. Quando

    acordou pediu perdo ao marido e aos filhos e passaram a viver unidos e felizes.Os anos correram e, num certo dia, o Conde Gonalves, a mulher e os sete

    infantes, foram convidados pelo Rei Blasques10, para o casamento de uma filha. Como

    eram famlia, l foram ento ao casamento. E quando estavam na festa, um dos seteinfantes, que era o mais brincalho, atirou uma pulha noiva. Ela no gostou e foi

    8 Havia outrora a crena de que uma mulher s poderia gerar um filho de cada vez. De contrrio, estariaa denunciar uma relao havida com mais do que um homem. Assinale-se a semelhana deste relato, nasua fase inicial, com a lenda de Maria Mantela, narrada na tradio oral da zona de Chaves.9 Segundo a tradio, foram criados nas aldeias de Vila Boa, Pinela, Palhe, Carocedo, Paredes e Grij10 Comparada esta lenda com verses que correm em Espanha, este nome, aqui transcrito tal como

    pronunciado na tradio oral popular transmontana, corresponde a Velsquez, de Rui Velsquez. Damesma forma, que Gonalves corresponde a Gonzalo Gustios, o famoso conde de Lara.

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    queixar-se ao rei, pedindo-lhe vingana. E o rei para se vingar resolve esperar pormelhor ocasio. Dali a dias, mandou o Conde Gonalves com uma embaixada ao reimouro. Fez uma carta, fechou-a, e disse ao conde que fosse lev-la a Crdova, ao reimouro. E que esperasse pela resposta.

    O conde assim fez. Levou a carta, s que no sabia o que ela dizia. Por isso nolhe passava pela cabea que a carta o denunciava como traidor. E que pedia ao reimouro que castigasse o mensageiro com a morte. O rei mouro, ao ler a carta. mandoulogo encerrar o Conde Gonalves nas masmorras, esperando mand-lo matar na horaprpria.

    Entretanto, o tempo passou, e, como o conde nunca mais regressava a sua casa,os sete irmos, desconfiando que tivessem feito mal a seu pai, foram l para o resgatar.E travaram uma batalha, sozinhos, contra quinze mil mouros. Uma batalha que no

    puderam vencer. Acabaram todos eles mortos e degolados.Depois o rei mouro mandou pr as sete cabeas numa bandeja e deu ordens

    para que as levassem s masmorras, ao pai dos infantes. A vida do Conde Gonalves,depois disto, foi terrvel no cativeiro do rei mouro. Valeu-lhe uma filha deste que,sabendo do sucedido, teve pena do prisioneiro e afeioou-se a ele. s escondidas dorei, a jovem protegeu-o como pde. E um dia disse-lhe:

    Se negares a tua religio e professares a minha, posso salvar-te.Ao que o conde lhe respondeu:Antes sofrer mil mortes!A princesa moura, ao aperceber-se da fora tamanha que tinha a f do

    prisioneiro, dispondo-se a dar por ela a sua prpria vida, ainda se afeioou mais a ele.

    Passou a ser mais que sua protectora. Enamoraram-se. E com isto arranjaram um filho,ao qual puseram o nome Mudarra. Quando ele cresceu e soube a verdade sobre o seu pai e sobre a morte dos seus irmos, resolve vingar-se, matando o Rei Blasques eoutros que com ele colaboraram.

    Depois, procurou nas masmorras o Conde Gonalves. Como no o conhecia,perguntou a um homem velho e cego que encontrou:

    H aqui um tal Gonalves?O velho respondeu: Eu lhe darei razo dele. Fale-me aqui ao ouvido, e diga-me o senhor quem .Tornou-lhe ento Modarra: Sou filho duma moura, mas por Gonalves fui gerado!

    O velho conde, comovido, abraou-se ao jovem e disse: Sou esse que procuras!Modarra tirou o pai da priso e levou-o para a sua casa em Parada. E ali passou

    a viver com ele, sob as leis do cristianismo. A casa ainda l existe. E a aldeia conhecida como Parada de Infanes, em memria dos sete infantes.11

    11 Este relato, tal como aqui se apresenta, , segundo a nossa informante, apenas o resumo de um automuito antigo e muito extenso ouvido em criana. Refira-se que a mesma lenda igualmente conhecidaem Espanha, em verses que no s contrariam as preocupaes toponomsticas das verses

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    Fonte: Inf.: Neuza da Conceio Estevinho, 50 anos; rec.:Bragana, 2001.

    34 A fraga do cavaleiro

    H em Freixedelo, no concelho de Bragana, uma fraga a que o povo chama a"Fraga do Cavaleiro". Diz-se que, h muitos e muitos anos, se ouvia ali, nos dias 1, 2 e3 de Maio, um tear a trabalhar e que aparecia uma menina muito bonita. E que estamenina, depois de aparecer na forma de gente, transformava-se em serpente.

    Por isso nem todas as pessoas tinham coragem de ir l. E conta-se que uma vezum cavaleiro famoso no disse nada a ningum e foi l nos trs dias. Ao terceiro dia,viu ento a menina, e a ela se dirigiu. Ela disse-lhe que se ia transformar numaserpente e que, se ele no tivesse medo, ficava muito rico. Mas o cavaleiro, quando aviu transformar-se, teve medo. Dizem que por ter medo lhe dobrou o encanto e, porisso, desde a nunca mais ningum a voltou a ver nem ouviu bater o tear.

    Fonte: Inf.: Maria Jos Santos Salgueiro, 35 anos; rec.: Bragana,2000.

    35 Lenda da Fundao de BraganaVerso A:

    Bragana, ao tempo circunscrita ao cabeo onde hoje chamam vila, foiabandonada no perodo da invaso dos Mouros. Conquistada a terra aos usurpadoresmuitos anos depois, os cristos voltaram sua Bragana. Os pastores apascentavam osseus rebanhos num espesso sardoal (o mesmo que carrascal) que se estendia pelaplancie situada imediatamente a N. do dito cabeo.

    Aconteceu que um certo dia os pastores foram encontrar a imagem de NossaSenhora pousada num sardo (ou seja num carrasco). Com toda a devoo a tomaramem suas mos e levaram-na para o seu povoado onde a recolheram na sua capela.Verificaram, porm, que a imagem voltara para o antigo lugar. Muito admirados com oacontecido, novamente a conduziram para a Capelinha do povo. E mais vezes serepetiu o caso, ao mesmo tempo que se repetiam os milagres que a Senhora fazia atodos aqueles que a Ela recorriam nas suas aflies. Em consequncia de tudo isto,

    transmontanas, como diferem tambm na relao parental entre personagens importantes. Por exemplo,na verso espanhola que consta na Crnica Geral de Espanha de 1344, estudada por Lindley Cintra, oheri Mudarra no neto do rei Almanor mas seu sobrinho (apudPinto-Correia, 2002: 1999). De notartambm que, naquele pas , essencialmente, atravs do romanceiro que este clebre relato transmitido.Sobre ele se debruaram, entre outros, Menendez Pidal (1991).

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    deliberaram erigir uma Capela no stio do sardo e ali ficou a imagem de Nossasenhora para sempre, e os habitantes mudaram-se para junto dela, e assim se deuprincpio cidade de Bragana.

    Verso B (Lenda da Senhora do Sardo):H muitos e muitos anos, quando se construiu a igreja de Santa Maria, em

    Bragana, a cidadela era frequentemente invadida por mouros. Ento o povo, comotinha grande devoo por Nossa Senhora, resolveu escond-la no tronco de um sardo,num sardoal que havia logo por trs do castelo, pois os inimigos podiam roub-la edestru-la.

    Entretanto o tempo foi passando, as pessoas foram morrendo e Nossa Senhoraali ficou escondida. At que, num certo dia, andava um pastor a guardar o seu rebanho,

    quando, ao escurecer, viu duas luzinhas que brilhavam ao longe. Ficou muitoassustado e foi chamar outra gente para verem o que seria tal coisa.Foram ento na direco das luzinhas e descobriram Nossa Senhora no tronco

    do sardo. Diz o povo que as luzinhas eram os seus olhos. Fez-se ento uma grandeprocisso para levar a imagem para a igreja de Santa Maria, dentro das muralhas docastelo.

    Por esta razo, a igreja de Santa Maria ainda hoje chamada pelas pessoasmais idosos Igreja de Nossa Senhora do Sardo.

    Fonte verso A: NETO, Joaquim Maria O leste do territrioBracarense, Torres Vedras, s/ed., 1975, pp. 187-188. Fonte verso B:Inf.: Maria Emlia Alves, 46 anos; rec.: Bragana, 2000.

    36 O cabeo de S. Bartolomeu

    Dizia-se antigamente que havia no cabeo de S. Bartolomeu, em Bragana,uma mata com grandes fragas, e a maior delas estava rachada de um lado ao outro.Dizia-se que essa fraga, meia noite, costumava abrir-se e sair de l uma luz e umacobra a falar.

    Quem quer entrar? Quem quer entrar?Era isto que lhe ouviam dizer. O povo dizia que a cobra era uma moura

    encantada, mas todos tinham medo de l ir. Um dia foi l um homem, a quemchamavam "Maluquinho", e que dizia que no tinha medo a nada. Dizia que se a cobralhe falasse, ento era mesmo uma mulher e ficava com ela. Outros homens seguiram-no de longe.

    Dizem ento que viram a fraga a abrir-se e a engolir o "Maluquinho". Nuncamais ningum deu f dele. Houve quem acreditasse que, ao entrar l, quebrou oencanto, ficou rico e nunca mais voltou.

    Fonte: Inf.: Maria do Carmo Lopes, 39 anos; rec.: Bragana, 2000.

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    37 A Fontela de Candegrelo

    Conta-se em Grij, concelho de Bragana, que um homem, que ambicionavaser muito rico, sonhou numa noite que havia um tesouro na Fontela de Candegrelo eque estava l umfiguro12 a guard-lo. E no sonho tambm lhe foi dito que o tesouroseria seu se fosse de sua casa at fontela sempre a ler, na ida e volta, o livro de S.Cipriano, e que bastaria dizer aofiguro onde queria que ele lhe levasse o tesouro.

    O homem assim fez. Chegou l, aparece-lhe ento ofiguro que lhe diz:

    Onde queres que te leve o tesouro? Leva-o minha quinta.O figuro pegou no tesouro e seguiu-o na direco da quinta. E o homem l

    continuava sempre a ler o livro de S. Cipriano. Acontece que, antes de chegar quinta,o homem emocionou-se de tal modo por sentir a grande riqueza que sonhara j ali toperto, que acabou por se enganar na leitura do livro. E ao enganar-se, diz-se que seabriu um grande buraco na terra onde entrou ele, o figuro e o tesouro. Nunca mais ovoltaram a ver.

    Fonte: Inf.: Ana Maria Amaral Faria, 36 anos; rec.: Bragana,2000.

    38 O bruxo e a moura

    No cabeo de S. Bartolomeu, em Bragana, deu-se uma grande batalha com osmouros, quando estes iam a abandonar estas terras a caminho do norte de frica.Conta-se que ia ento um rei mouro com a sua comitiva e que levava grandes tesouros.E com ele ia tambm a sua filha, uma jovem muito bela.

    Quando os mouros avistaram os inimigos, o rei escondeu os tesouros em localque s ele conhecia, e preparou-se para a luta. S que os inimigos eram muitos, peloque os mouros acabaram por ser derrotados e muitos deles mortos. O rei foi um dos

    que morreu, mas antes confessou a sua filha onde escondera os tesouros.Quando os inimigos capturaram a jovem e os mouros que sobreviveram, o

    chefe dos vencedores dirigiu-se princesa dizendo:Sers livre se nos disseres onde esto os tesouros.E a jovem respondeu-lhe: Podes fazer de mim o que quiseres, mas o segredo de meu pai no o ters.

    12 Ofiguro representa, neste comunidade, uma das referncias do maravilhoso popular, cuja simbologiaharmoniza com o mouro mtico.

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    Se assim , ficars aqui prisioneira para sempre sentenciou o chefe.Palavras tais no era ditas, ouve-se ento um grito medonho, que a todos

    assustou, dizendo: Prisioneira?! Nunca!Era um bruxo que saiu de entre os mouros cativos, e lanou sobre a princesa

    uma tal bruxaria que ela se transformou de repente numa asquerosa serpente. E peranteos olhos espantados de todos, a serpente escapou-se por entre as fragas e desapareceu.

    Tanto o bruxo como os mouros foram encerrados nas masmorras, ondeapodreceram. Quanto princesa diz-se que ainda por l anda, encantada.

    Fonte: Inf.: Ana Maria Amaral Faria, 36 anos; rec.: Bragana,2000.

    39 A Cortadura dos Mouros

    No termo de Gimonde, no concelho de Bragana, h do lado direito do rioSabor um cabeo com o nome de Monte Guieiro e que faz uma grande cova que conhecida como Cortadura dos Mouros. Diz-se que foram os mouros que a fizeram.

    Segundo a lenda, os mouros, quando estavam subjugados pelos cristos, depoisda reconquista, apostaram que, em apenas uma noite, faziam passar por ali o rio Sabor.Se o conseguissem, os cristos no os expulsariam.

    Tentar, bem tentaram, mas no chegaram ao fim. Diz o povo que se tm maisuma hora ganhavam a aposta. Como no ganharam, tiveram de ir embora. E o corte lficou, chamando-se por isso mesmo Cortadura dos Mouros.

    Fonte: Inf.: Francisca Teresa Fernandes Moreno, 47 anos; rec.:Bragana, 2000.

    40 Lenda da moura do Reboledo

    Perto da aldeia de Santa Comba de Rossas, concelho de Bragana, existe um

    altinho denominado Reboledo, coroado por um amontoado de rochas. Conta a lendaque havia l um encanto que costumava aparecer a um rapaz que era pastor. E que esseencanto tinha a forma de uma velha muito feia que lhe comia a merenda.

    Um dia o rapaz, farto de ficar com forme, pensou: "Hoje no me comes amerenda, pois vou pr Picoto!" E assim fez. S que tambm ali a velha lhe apareceu.Desta vez, porm, ela trazia s costas um grande cesto repleto de boa comida eofereceu-lho. O moo no quis saber de mais nada. Atirou-se ao farnel com quantasbarrigas tinha. Ento a velha contou-lhe:

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    Sou uma donzela e estou encantada no Reboledo. Vem at l, ao stio ondeest uma cruz, faz um sino saimo e mete-te l. Ho de aparecer-te muitos bichos. Acobra sou eu. Se lhe deres um beijo quebras-me o encanto e ficars rico.

    O rapaz disse-lhe logo que sim. Mas ao chegar a hora e ao ver tantos bichos...ah pernas! E nunca mais l voltou com o gado.

    Fonte: Inf.: Maria Antnia Machado Ferro, 77 anos; rec.:Santa Comba de Rossas, Bragana, 2001.

    41 Lenda do Castelo de PinelaA meio caminho entre Rossas e Pinela, no concelho de Bragana, h um

    monto de rochas que a tradio baptizou com o nome de Castelo de Pinela. Diz opovo que nesse castelo viveram os mouros e que, ao sentirem-se vencidos pelas hostesda cristandade, enterraram valiosos tesouros nos subterrneos do castelo, ali ficando guarda de belas mouras encantadas. Estas mouras, reza a tradio, costumam fazer-seouvir, ao meia dia e meia noite de S. Joo, soltando tristes ais e repicando sinos.

    Conta-se que numa ocasio uns rapazes de Rossas resolveram ir, na noite de S.Joo, em busca desses tesouros. Acontece que, ao chegarem l, foram assaltados poruma horda de bichos muito feios e apareceram-lhes umas damas a fumar charuto.Ento elas ofereceram charutos aos rapazes e, consoante eles pegavam neles, eramatirados pelo ar para muito longe com pernas e braos partidos. Nunca mais tiveramvontade de l ir. Nem eles nem ningum.

    Fonte: Inf.: Maria ngela Almeida, 72 anos; rec.: Santa Comba deRossas, Bragana, 2001.

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    Concelho de Carrazeda de Ansies

    42 [Lenda do penedo das letras]

    Entre o Cacho da Rapa e a Pesqueira do Marulho, [no concelho de Carrazedade Ansies] est um grande penedo, prximo da corrente do rio, mas onde no chegamas guas dele. (....)

    Ao fundo do penedo, da parte que olha para o Douro, existe um portal queparece obra da natureza e d entrada para uma grande sala, com assentos em redor, eno meio uma grande mesa, tudo em pedra. Nesta sala h uma porta, que provavelmenteconduz a outras interiores, que ningum tem querido examinar.

    Consta que o padre Domingos Mendes, na manh de S. Joo, no ano de 1678,com sobrepeliz e estola, pretendeu penetrar nestas concavidades, em busca de tesourosencantados, mas que, entrando na segunda sala, sentiu um cheiro to pestilente, e tevetal medo, que fugiu tremendo, e ficou mentecapto o resto dos seus dias, que foram poucos. Tambm se diz que pouco depois de sair deste antro, lhe caram todos osdentes. (...)

    A esta penha ainda o povo chama openedo das letras.13

    Fonte: LEAL, Pinho Portugal Antigo e Moderno, vol. 8, Lisboa,Livraria Editora de Mattos Moreira & Companhia, 1878, pp. 49-50

    43 O Castelejo

    Verso A:No lugar do Pombal [concelho de Carrazeda de Ansies], sobranceiro estrada

    que vai para S. Loureno, do lado direito, existe um Castelejo que no mais que um

    amontado de penedos que a Natureza ali colocou. H quem diga que deriva de umcastelo ou de um castro que em tempos remotos ali existiu.

    Contam que no dito castelo est uma moura encantada com o seu tear de ouro.A lenda diz tambm que na noite de S. Joo, da meia noite at antes do sol nascer,ouviam bater o tear, a ponto de uma pessoa, ingnua e ao mesmo tempo ambiciosa,num certo dia de S. Joo, dentro do raio de umsino saimo, foi rezar, implorar e pedirum pouco desse ouro. S que, lenda ou no, contam que essa pessoa foi to maltratada

    13 assim designado pelo povo por nele existirem inscries, hoje j imperceptveis

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    por foras estranhas e invisveis, que tremeu sezes e nunca mais se atreveu a ircobiar a tal suposta riqueza.

    2 verso (A moura do Castelejo): Na aldeia de Pombal de Ansies, concelho de Carrazeda de Ansies, num

    monte sobranceiro ao rio Tua, e junto s guas termais de S. Loureno, h um conjuntode fragas muito bem alinhadas a que o povo chama Castelejo. O povo diz tambm queem noites de lua cheia ali se ouve o bater de um tear e, s vezes, o choro triste de umamoura encantada.

    H quem tenha conhecido na aldeia um pastor que, ao passar ali numa certanoite, viu a moura a pentear os seus longos e belos cabelos. Cheio de curiosidade, eporque lhe parecia uma mulher muito bonita, aproximou-se para meter conversa com

    ela. S que nessa altura pde v-la melhor, e descobriu que ela apenas era mulher dacintura para cima. Da para baixo era uma cobra.

    O pastor arrepiou-se todo e deu ento trs passos atrs, pronto para fugir. Masela chamou-o, dizendo:

    No tenhas medo da minha triste sina. Estou neste estado, mas sou umamulher bela. E se tens dvidas, vem c na noite de S. Joo, e ver-me-s, tal como sou,a banhar-me nestas guas.

    Diz-se que o pastor l foi nessa noite, e que a viu a tomar banho nas guas de S.Loureno. E que era to bela como nenhuma outra mulher. Tambm se diz que,durante muito tempo, era costume as moas da aldeia, nas noites de S. Joo, irembanhar-se nessas guas, na crena de que ficariam belas e sedutoras.

    Fonte verso A: TEIXEIRA, Flora "O Castelejo", in O Pombal,Carrazeda de Ansies, Associao Rec. e Cultural de Pombal deAnsies, Setembro de 1997. Fonte B: Inf.: Maria da Conceio

    Flix Fonseca, 43 anos; rec.: Zedes, Carrazeda de Ansies, 2000.

    44 [Figueira Redonda]

    No stio da Figueira Redonda, termo de Mgo de Malta, concelho de Carrazeda

    de Ansies, h um bloco enorme de granito, forma esferide, de muitos milhares detoneladas de peso, que, diz a lenda, foi trazido cabea por uma mulher fiando na roca(outros dizem pelo diabo) do stio de Cabreira, num percurso de trs quilmetros, poruma ngreme ladeira acima, cheia de ravinas e despenhadeiros, eriadas de fragas,onde com dificuldade se anda a p. Contguo a este, h outro de configuraodiscidea achatada, que, no dizer da lenda, era a rodela onde assentava o bloco maiorque a mulher trazia cabea.

    Fonte: ALVES, Francisco M. Memrias Arqueolgico-Histricasdo Distrito de Bragana, vol. IX, Porto, 1934, p. 454.

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    45 Dlmen de Vilarinho de Castanheira

    Em Vilarinho de Castanheira, concelho de Carrazeda de Ansies, h umdlmen chamado Cova da Moira. Diz a lenda que na noite de S. Joo vem a moiradanar dentro dele. Quantas voltas a moira d, tantas d a tampa do dlmen, a qual sev mexer, acompanhando o movimento da moira, que dana por baixo.

    Fonte: VASCONCELOS, J. L. Dlmen de Vilarinho deCastanheira, in O Arquelogo Portugus, vol. XXIV, 1919 e 1920,

    p. 237.

    46 [O Vale da Osseira]

    [O castelo de Carrazeda da Ansies] esteve em poder dos moiros, os quaisforam investidos e atacados, sendo expulsos e perseguidos at a um vale prximo, aoocidente de Vilarinho da Castanheira, onde foram batidos e trucidados. Pelo avultadonmero de moiros que ali se enterraram ficou a chamar-se Vale da Osseira.

    Fonte: LEAL, Silva Os Pelourinhos de Traz-os-Montes Freixode Espada Cinta, in Ilustrao Transmontana, Porto, 1910, p.171.

    47 Lenda da Fonte da Moura de Seixo de Ansies

    No lugar da Fonte da Moura, em Seixo de Ansies, concelho de Carrazeda deAnsies, h um grande tesouro guardado por uma moura encantada que os mourosabandonaram quando foram expulsos de Portugal. Diz-se que nas manhs de S. Joo

    ela vem estender ao sol uma barrela de ouro que tece num tear tambm de ouro, cujosom s perceptvel pelo bater dos canais.

    De sete em sete anos a moura aparece a alguns mortais a quem prometeimensas riquezas se lhe quebrarem o encanto. Mas, apesar de as cobiarem, ningumse atreve na aventura. que a moura surge sempre meia noite transformada emserpente ou leo, e tenta beijar quem l vai. Nessa altura tudo foge com medo, e assimse renova, por mais sete anos, o encantamento da pobre moura.

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    De quando em quando, a moura aparece na mesma fonte transformada numcordo de ouro muito comprido que entra para a boca da pessoa que ali vai beber. Sque esta ao tentar dobr-lo para o guardar, apercebe-se que ele nunca mais acaba e,achando-se j com riqueza bastante, resolve cort-lo. Nesse momento desaparece tudo,ficando nas mos da pessoa apenas uns mseros carves.

    Tambm se diz que o tesouro est enterrado numa grande panela de barro, eque sua volta esto outras panelas com peste, que matariam meio mundo se algumas abrisse. E assim, ningum se atreve a ir l desenterr-lo, com receio de no dar coma panela certa. Razo porque a moura l continua eternamente espera.

    Fonte: Inf.: Maria Arminda Teixeira Rodrigues, 43 anos;rec.:Carrazeda de Ansies, 1999.

    48 A menina encantada

    Dizem que no stio da Costa, termo de Mogo de Malta, do concelho deCarrazeda de Ansies, costume ouvir-se meia noite uma menina a chorar. umamenina encantada. E para se lhe tirar o encanto preciso ir l, meia noite, e ler olivro de S. Cipriano. E quem o ler no se pode enganar, nem ter medo. Caso contrrio,a pessoa que se aventure ficar tolhida.

    Ainda no houve at data quem tivesse coragem para l ir. Mas bemgostariam, porque a pessoa que fizesse como manda a lenda ficaria muito rica.

    Fonte: Inf.: Maria Jos Teixeira Almeida, 45 anos; rec.: Vila Flor,1999.

    49 Lenda da Fraga de Selim

    Havia antigamente um padre que paroquiava as aldeias de Mogo e Zedes, noconcelho de Carrazeda de Ansies, e costumava ir a p de uma aldeia para a outrasempre que tinha de ir rezar missa.

    Num certo domingo, em dia de Inverno, quando ia para rezar uma das missas,passou num stio onde h uma fraga chamada Selim, e onde os antigos dizem que huma moura encantada, e a encontrou um tendal de figos a secar. Muito espantado,disse:

    Credo! Um tendal de figos?!Ora, a admirao do padre era porque, sendo Inverno, no podia haver figos a

    secar. E pensou ento:

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    Pecado sei que , mas vou meter trs ao bolso.Meteu-os ao bolso e seguiu caminho. Quando acabou a missa apeteceu-lhe um

    figo e meteu a mo ao bolso para o tirar. E qual no foi o seu espanto ao ver que emvez dos figos, o que tinha no bolso eram trs libras de ouro.

    Sem dizer nada a ningum, foi rapidamente ao lugar onde tinha encontrado osfigos a secar para tirar mais, mas quando l chegou j no achou nada. E ao meter amo ao bolso, para assegurar-se de que, pelo menos, teria as trs libras de ouro, apenasachou trs carves.

    Fonte: Inf.: Maria Jos Teixeira Almeida, 45 anos; rec.: Vila Flor,1999.

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    Concelho de Chaves

    50 A Cerca dos Mouros de Vila Verde da Raia

    A Cerca dos Mouros uma espcie de fortaleza que existe perto da povoaode Vila Verde da Raia [concelho de Chaves], formada por pedras lousas, colocadas a

    esmo, duma forma tosca, que mais parece obra da natureza do que trabalho doshomens. O seu permetro tem uma superfcie de cerca de cem metros quadrados.

    Desconhece-se a verdadeira histria da sua origem. Mas o povo no temdvidas: uma obra feita pelos mouros que ali se refugiaram e por l se deixaramficar. Para melhor se defenderem, construram essa fortaleza. E, para poderem resistiraos cercos prolongados, cavaram minas subterrneas, atravs das quais podiam entrar esair sem serem descobertos, procura de gua e de alimentos. Quando as guerrasterminaram, entregaram-se tarefa de derreter o oiro, que possuam em grandequantidade. Com ele, construram teares que trabalham, dia e noite, no fabrico devesturio, tambm de oiro.

    Outrora, quem passava por l perto, de dia ou de noite, podia ouvir

    distintamente o tim-tim dos martelos nas bigornas e o truque-truque das lanadeirasnos teares. Agora, j nada disso se ouve, mas os mouros l continuam a manipular oseu oiro, embora de uma maneira silenciosa.

    Fonte: FERREIRA, Joaquim Alves Literatura Popular de Trs-os-Montes e Alto Douro, V Volume Lendas e Contos Infantis , VilaReal, edio do autor, 1999, pp. 51-52.

    51 [A vila de Chaves e os mouros]

    A vila de Chaves (...) foi destruda duas vezes pelos mouros que no deixarampedra sobre pedra, somente a ponte da Madalena que sempre ficou intacta e foi obrados romanos como consta dos seus antigos padres. No ano de 1160, reinando emPortugal Dom Afonso Henriques, foi restaurada e tirada do poder dos mouros por doiscavaleiros portugueses, esforados soldados e irmos chamados Rui Lopes e GarciaLopes, ficando senhores desta praa, renovaram os muros at que a fecharam com

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    chaves, de que tomou seu nome, porque antigamente se chamava guas Clidas, porcausa das caldas que tem muito quentes.14

    Fonte: PEREIRA, Pe. Joo Barroso Livro de antigas memrias da freguesia de Salto, lugar da Seara e outras partes vizinhas (livromanuscrito), Curros - Valpaos, 1730 pp. 128-129.

    52 Lenda do cavalo branco montado por Santiago de Compostela

    Conta-se que foi Santiago de Compostela, montado num cavalo branco muito

    corredor, que escorraou os mouros do castelo do Mau Vizinho [situado na freguesiade Cimo de Vila da Castanheira, concelho de Chaves]; e que um mouro daquelecastelo berrara a Santiago que no fugisse tanto.

    Ao ouvir tal remoque, o santo deu um forte puxo ao freio; o cavalo, empinado,foi bater com as patas dianteiras a meia ladeira da rampa que d subida para o alto dopicoto. Ali ficaram marcadas as patas do grande cavalo, que se pode considerar, almde grande corredor, tambm um grande saltador, pois as marcas das patas esto, pelomenos, 6 a 7 metros acima da base do rochedo.15

    Fonte: SANTOS JNIOR, J. R.; et al. O Santurio do Castelo doMau Vizinho, Separata da Revista de Guimares, vol. 99,Guimares, 1991, p. 42.

    53 Lenda do bezerro de ouro

    Verso A: corrente no povo, no s na aldeia de Cimo de Vila [da Castanheira, concelho

    de Chaves], mas tambm de outras aldeias roda do Castelo do Mau Vizinho, a crenade l existir um encanto, que , nada mais nada menos, um bezerro de ouro macio.

    14 Esta apenas uma das verses a mais antiga que encontrmos da lenda dos irmos Rui e Garcia

    Lopes, apresentando uma hiptese, bastante discutvel, sobre a toponomstica da actual cidade deChaves. Poderamos apresentar outras verses entretanto publicadas, contudo, por seremexcessivamente romanceadas, optmos por omiti-las neste trabalho.15 O castelo do Mau Vizinho situa-se no topo de uma escarpa, onde se ergue como cabea de vbora(...), pontiaguda, ameaadora, quase inacessvel, a desafiar os ares (Eira, 1973: 346). Segundo o povo diz Antnio da Eira este castelo patrimnio do Pecado; e aqui Pecado sinnimo de Diabo,

    portanto o castelo do Mau Vizinho castelo do Diabo (1973: 348). de admitir que a profundaimpresso causada por esta singular disposio mesolgica esteja na origem da multiplicidade de lendasque o povo preservou, as quais assumem, ao mesmo tempo, justificaes etiolgicas para algumas dasmarcas mais exuberantes que o homem primitivo ou a natureza ali deixaram.

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    Conta-se que um ambicioso portugus, ansioso por deitar as unhas ao bezerrode ouro, contratou um galego para ir com ele quebrar o encanto, com a condioexpressa de no se falar em Deus. Com o livro de S. Cipriano fizeram as rezasobrigatrias. A dada altura surgiu o bezerro, to alentado que o galego no conteve oseu espanto admirativo e disse:

    Jesus...!Foi o bastante para que o bezerro rebentasse em carves.

    Verso B:Um portugus cobioso do tesouro encantado em forma de bezerro de ouro

    combinou com um padre, armado de estola, e munidos de uma panela com unguentohumano, irem quebrar o encanto.

    L foram com o indispensvel e famoso livro de S. Cipriano. Feita a leitura dotexto apropriado ao caso, surgiu o bezerro guiado pelo inimigo. A atarantao foi togrande, tanto do padre leitor como do adjunto portugus cobioso, que se entornou apanela e o unguento foi escaldar o padre em vez de escaldar o inimigo.

    A um valha-me Deus o bezerro e o diabo que o guiava desapareceram numpice.

    Fonte verses A e B: SANTOS JNIOR, J. R. et al. OSanturio do Castelo do Mau Vizinho, Separata da Revista deGuimares, vol. 99, Guimares, 1991, p. 40.

    54 Lenda da grande cobra a guardar o encanto

    A Sr Josefa Gigante, cujo pai foi tamanqueiro em Orjais [aldeia prxima deCimo de Vila da Castanheira, concelho de Chaves], diz que os seus avs e os velhos deOrjais contavam ter visto muitas vezes uma grande cobra de enorme cabea sair do rioMouce que circunda o picoto do Mau Vizinho.

    Viram-na subir e passear pelo castelo do Mau Vizinho. Mas quando algumsubia ao castelo ela prontamente se afastava. Num pincho, atirava-se do alto e vinhaenfiar-se na ola do rio que h acima dapraseira, paredo que atravessa o rio para ele

    represar. A tal cobra era a guarda do encanto.Quando aparecer algum que, em vez de escorraar a cobra ou fugir delaassustado, tiver a coragem de ficar quedo e de ser deixar beijar pela cobra, estatransformar-se-, acto contnuo, em pessoa humana. Deste modo se quebra o encanto eo corajoso receber o tesouro que o far muito rico.

    Fonte: SANTOS JNIOR, J. R. et al. O Santurio doCastelo do Mau Vizinho, Separata daRevista de Guimares,vol. 99, Guimares, 1991, p. 41.

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    55 A mina da Bolideira

    Conta-se que um dia andava um homem caa com o seu co na zona daBolideira [concelho de Chaves]. A dada altura o co viu um coelho e correu atrs dele.S que o coelho meteu-se num buraco entre duas fragas e o co entrou l tambm. Eatrs do co entrou o caador. Era uma mina.

    O homem andou, andou, e, de repente, viu que estava no meio dum prado, ondehavia um belo lago e tambm um altar de ouro guardado por uma serpente. Aoaproximar-se do altar, logo a serpente lhe disse:

    No passes da, seno morres!O caador ficou de tal modo assustado que nem um passo mais avanou. Tratou

    mas foi de voltar para trs, e muito ligeiro. E ao chegar sua aldeia fez constar o quelhe tinha acontecido naquela mina. Isto tornou-se por isso conhecido em toda a parte,acabando por chegar tambm aos ouvidos de um prncipe que costumava andar por alia caar.

    Como era muito destemido, entrou sem medo pela mina adentro e l foi dar,tambm ele, ao mesmo prado onde havia um lago e um altar de ouro guardado pelaserpente. Esta, quando viu que ele se preparava para avanar, disse-lhe:

    No passes da, seno morres!Mas o prncipe no se assustou, e, olhando bem para os olhos da serpente,

    respondeu-lhe:

    serpente que te arrastasDia e noite nesse pranto,Levanta-te desse cho,Desfaa-se o teu encanto!

    E medida que ia dizendo estas palavras, a serpente ia-se transformando numabela menina, pois mais no era que uma moura que tinha sido encantada por uma fadam. Diz-se que o prncipe e a moura casaram e passaram a viver ali, onde, em certasnoites, ainda se ouvem cantigas e risos de alegria.

    Fonte: Inf.: Maria da Graa Oliveira Gomes, 54 anos; rec.:Lebuo, Valpaos, em 1999;

    56 O guerreiro e a princesa moura

    Conta-se que, h muitos e muitos anos, quando nas terras do norte se travouuma grande batalha entre cristos e mouros, um jovem guerreiro cristo raptou umalinda princesa moura e fugiu com ela para o castelo de Monforte [no concelho deChaves]. E o pai da jovem, ao ver em que mos ela ia, lanou-lhes uma maldio tal,

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    que, quando chegaram ao castelo, o que o guerreiro levava consigo j no era aprincesa moura mas sim uma enorme serpente.

    Ora o guerreiro, sem saber o que fazer com ela, resolveu fech-la numa torre docastelo. Passou ento a ouvir-se ali durante a noite uma voz de menina a gemer e achorar. E o guerreiro, que se tinha apaixonado por ela, ao ouvir aquele choro, subiasempre torre na esperana de a encontrar na figura da princesa que trouxera. Masenganava-se. O que l encontrava era a serpente e nada mais.

    O jovem cristo no sabia como trat-la. Passou por isso a viver numa grandetristeza. At que, certa noite, em que o choro da serpente o atormentou demais, foi lvisit-la e, condodo da sua dor, disse-lhe estas palavras enquanto a afagava e abeijava:

    Trouxe-te linda princesaPara contigo casar,Agora se olho pra tiS me apetece chorar!

    Quem me dera ter poderPra te quebrar o encanto,E poder olhar pra tiPra te enxugar o teu pranto!

    E eis que, acabadas estas palavras, a serpente aparece transformada na bonitamenina que era antes. O guerreiro quebrara-lhe o encanto. E depois casaram.

    Fonte: Inf.: Maria da Graa Oliveira Gomes, 54 anos; rec.:Lebuo, Valpaos, em 1999.

    57 O monstro do castelo de Monforte

    Conta o povo que o castelo de Monforte [no concelho de Chaves] foi emtempos propriedade dos mouros, e que l dentro vivia uma jovem chamada Baslia, nacompanhia de seu pai e de muitos criados. A alturas tantas comearam a chegar aocastelo notcias de um jovem guerreiro, cham