Lemos (2015) - Parte III, Capítulo 1 (p. 99-126)

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    2/30

    Andre Lemos, 2002

    Capa :

    Mari Fiorelli

    Foto:

    fonso

    Jr

    Ptojeto gnifico e editorac,:ao : Daniel Ferreira da Silva

    Revisao: Caren Capaverde

    Editor:

    Luis ntonio Paim Gomes

    Dados Intemacionais de Catalogac,:ao na Publicac,:ao ( CIP

    Bibliotecaria Responsavel: Ginamara Lima Jacques Pinto CRB \0/1204

    L557c Lemos, Andre

    Cibercultura: tecnolog

    ia

    e

    vi

    da social na cultura contemporiinea

    Andre Lemos. - 7 ed. - Porto Alegre: Sulina, 20 15

    295 p

    (Colel iio Cibercultura)

    ISBN: 978-85-205-0577-9

    I. Sociologia. 2. Cultura - Midia. 3. Cibercultura. 4. Tecnologia

    da lnformal ilo. I Titul

    o

    Todos os direitos desta edivao reservados

    a

    EDJTORA M ERID IONAL LTDA.

    Av

    Osvaldo Aranha, 440 cj. I

    01

    Cep: 90035-190 PortoA1egre-RS

    Tel: (051) 3311-4082

    www.editorasulina.com.br

    e-mail: [email protected]

    {Janeiro/2015}

    COD: 301.243

    CDU: 3 16

    lMPRESSO NO

    BRASILfPRl

    NTED IN B RAZIL

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    C PiTULO

    I

    N SCIMENTO

    D CIBERCULTURA:

    A MICROINFORM TIC

    Vamos situar o nascimento da cibercultura no surgimento

    da microinformatica na metade dos anos 1970. A cibercultura,

    embora a expressao deva muito a cibemetica, nao e, no sentido

    exato, correlata a esta ciencia. Antes, a cibercultura surge como

    os impactos socioculturais da microinformatica. Mais do que uma

    questao tecnol6gica, o ue vai marcar a cibercultura nao e somente

    0

    potencial das novas tecnologias, mas uma

    a t i t u d e ~ e

    no mefo

    dosa nos- 1970

    :-

    TnJI.uencia a pela c o f h : _ a

    l l t u r

    a m ~ r i f a n a

    a e j i ~

    cOnifao poOeit ec

    iiOCrat

    ic

    o.

    (T lema da microinformatica sera:

    c

    orriputadores para

    0

    povo-' -

    (

    computer

    to

    the people ).

    0

    advento de

    ~ y n o g g j ~

    9 9

    c o m p u t ~ d o r

    pode ser explicado

    por tres condi9oes

    b i s t q r j ~ a s .as

    _

    s m < i

    9

    e ~ n i c a ~ o c i

    ~

    e

    ol6gica (Breton

    6

    .

    A informatica sera uma ciencia (baseada na

    cibernetica) de produyao, organizayao, armazenamento e distribui

    yi io automatizada da in formayao, agora traduzida em its (c6digos

    binarios tipo 0 e 1). A informatica e, assim, uma forma de aliar o

    conhecimento da natureza

    as

    formas de funcionamento da sociedade

    moderna. Cria-se a possibilidade de leitura da realidade, traduzida

    pela linguagem digital , automatizando a

    informayao.

    Como vimos, o mundo da modemidade e o mundo quanti

    ficado atraves da matematica e das tecnologias anal6gicas. Aq ui , a

    aproximayao matematica, quantitativa e experimental da natureza

    e a base do racionalismo analitico e dedutivo modemo, herdeiro de

    Descartes. A organizayao sociopolitica e a administra9ao burocratica

    e racional da vida social generalizou-se. A cibercultura tern origem

    nesse mundo hiperquantificado, hiper-racionalista, que tenta inte

    grar, ou melhor, traduzir, e nao mais representar a natureza atraves

    das tecnologias digitais. Essa condi9ao tecnica, da qual a cibercul

    tura e sua consequencia, e resultante do progresso da matematica e

    das ciencias a partir dos meados do seculo XVII .

    A forma9ao da microinformatica deve-se ao desenvolvimento

    de domfnios cientfficos a partir dos anos 1940: a cibemetica ( 1948),

    a inteligencia artificial (1956), a teoria da auto-organizayao e de

    99

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    i

    te rnas (dos anos 1960), a tecnologia de comunica

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    Breton, a separavi'io entre a informatica e a cibernetica provem,

    talvez, em parte das tomadas de decisao de Wiener hostis a

    in

    s

    ti

    tuivi'io militar [ ..]. 0 fundador da cibernetica foi entao marg inal em

    relavi'io a tudo que tocava de perto ou de Ionge ao computador [ . ].

    Wiener foi [ ] um dos primeiros a se interrogar sabre os desafios

    eticos e S US S SOCiais desses novas dominios

    208

    .

    Como explicitado em Cibernetica e Sociedade

    209

    , Wiener

    preve uma estrategia de pilotagem informacional da vida socia

    l

    A primeira informatica vai ser concebida como uma utopia, cujo

    objetivo e a transformayi'iO do homem e da sociedade. A invenyi'iO

    de computadores desvincula-se da compreensao sabre que e

    homem e

    sab

    re quais seriam os impactos dessas maquinas em meio

    a

    sociedade, migrando para 0 desenvolvimento de maquinas que

    tratarao (de forma meciinica) a informavi'io - basicamente, calcular

    e contar.

    Nao

    e

    a

    oa que a maquina chama-se computer - aquele

    que conta ; ou ordinateur - aquele que poe

    ordem,

    automatiza,

    classifica. A informatica segue, agora, desvinculada da metafisica

    cibernetica, sendo concebida dentro dos idea is modernos de uma

    utopia tecnol6gica. Busca-se a transformavi'io e a administravi'io

    racional da sociedade. 0 modelo sera um

    pool

    formado pela IBM ,

    militares, universidades e institutos de pesquisa.

    Embora

    a microinformatica popular s6 surgisse em meados

    da decada de

    1970,

    precursores do que viria a ser a revoluvi'io da

    informatica pessoal (e do ciberespa9o) come9avam a pensar em

    tornar o

    computador

    mais amigavel desde os anos

    1940.

    Nessa

    decada o

    problema

    da informavi'io preocupa os cientistas. Vanevar

    Bush, coordenador de pesquisa das forvas armadas americanas,

    em

    meio a

    uma

    profusao de informavi'io, inventa uma metamaquina

    (nunca realizada) para ajudar

    os

    cientistas a armazenar e indexar

    informa96es nos seus diversos campos de pesquisa, o Memex .

    Outros pioneiros, como Engelhart e Licklider, vao

    cunhar

    no96es

    como interface e ambiente de resposta. Doug

    Enge

    lhart e

    sua

    equipe

    do

    Stanford Research Institute (SRI) inventa a interface

    WYSIWYG

    ( what you see

    s

    what you g t - o

    que voce ve e o

    que voce tem

    )

    , o processador de texto , o

    mouse

    e as

    janelas

    com

    os menus. J.C. R. Licklider, pesquisador em psicologia, vai levar

    adiante a ideia de interatividade e

    propoe uma relavi'io simbi6tica

    entre o homem e o computador.

    Como vemos, a persp

    ect

    iva de interatividade foi discemida

    muito cedo. Nos anos 1960, urn real impulso foi dado pelas pes-

    1 1

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    quisas de Ivan Sutherland como Sketchpad (1963), urn software

    onde o usmirio atua diretamente sobre a tela do monitor com uma

    light pen. Esse programa abriu o campo da computa

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    da informatiza

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    A micro informatica vai acentuar a democratiza

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    Marc Guillaume

    218

    vai desenvolver o conceito de espectral idad

    para tentar dar conta dos novas mecanismos postos em pnitica pela

    tecnologias microeletronicas. Segundo ele, a

    rela

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    As representavoes programadas e taticas podem

    ser

    aplica

    das aquilo que Guillaume chama de teletechnologies as tecnologias

    da informavao e

    da

    comunicavao. Essas as constituem os pilares

    da cibercultura, respondendo a urn desejo de escapar parcial e mo

    mentaneamente aos constrangimentos simbolicos da modernidade

    e seus funcionalismos totalitarios. 0 proprio sujeito individualista,

    filho da modernidade, torna-se urn espectro, porque desaparece para

    vagar em uma ordem simbolica que se tornou transparente.A espec

    tralidade torna-se urn fenomeno de massa

    ja no come9o do seculo

    XX, com a difusao dos filmes em salas de cinema, com o radio e,

    posteriorrnente, a televisao, hoje entrando em sua fase mais virotica

    com a aparivao

    da

    micro informatica e das redes telematicas. Assim

    existe comunicavao espectral quando aqueles que dela participam

    a podem fazer ficando eventual, parcial e provisoriamente, sem

    nome, sem identidade definida, escapando aos constrangimentos

    da

    identidade

    22

    Os indivfduos espectrais reagem a funcionalidade racional e a

    homogeneidade de comportamentos, procurando identifica9oes su

    cessivas

    222

    Para Guillaume, o que caracteriza a sociedade pos-modema

    e a sensavao dessa subversao pelo anonimato. Deleuze e Guattari, em

    outro registro, mostram a espectralidade como desejo individual de se

    tomar nomade, imigrante na sua propria cidade, corpo e subjetividade.

    Embora os

    tres nfveis de avao da tecnica propostos por Guillaume

    estejam presentes na contemporaneidade e na cibercultura, parece-nos

    que o surgimento da cibercultura deva muito ao nfvel da apropriavao

    social,

    ao

    nfvel tatico. Podemos dizer que a mi ro informatica nao seria

    mais culminada pela esperanva utopica [

    ]mas

    ela se aproximaria da

    subversao, aqui e agora, pelo seu uso menor

    223

    .

    A ideia de ruptura radical transforma-se em uma mistura de

    desconfian9a e de apropriavao (simbolica e quotidiana) das novas

    tecnologias. Se nao ha

    urn

    futuro possfvel , se a historia, com seus

    componentes ideologicos (futuro, progresso, razao ), nao tern suporte

    social mobilizador, entao, a t'mica safda e tomar nas maos o destino

    tecnologico. Essa apropriavao desesperada da tecnologia contem

    poriinea e visfvel atraves dos virus de computador, dos hackers da

    realidade virtual , do cibersexo, das comunidades virtuais. A historia

    da microinformatica mostra que, na sua origem, a cibercultura e

    consequencia da atitude social em relavao a informatica.

    m 1972, a revista radical People Computer Company

    (PCC), do suburbio industrial de Sao Francisco, cria urn banco de

    1 6

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    dados eletronico urbano acessivel e util a comunidade. urgem

    os primeiros BBSs

    Bulettin Board Systems).

    Bob Albrecht, urn

    dos idealizadores, propoe a essa comunidade uma base de dado

    disponivel em rede telematica que funcionasse como urn centro

    onde crian

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    decada de 1970 propunham a informatica para todos, os internautas

    da decada de 1990 propoem a conexao genera

    li

    zada. A microinfor

    matica, berc;o da cibercultura, surge na sinergia da qual falavamos

    entre a socialidade e as tecnologias digitais. Nesse sentido, o cana

    dense S. Proulx vai analisar os movimentos sociais que se formam

    em

    torno da

    mi

    croinformatica

    par

    a mostrar que a informatizac;ao da

    sociedade e urn processo social: "Desde o nascimento da microin-

    1

    ormatica na California no comec;o dos anos 1970, os primeiros

    hackers

    se associam a urn movimento social que prega a contestac;ao

    ',do poder do

    establishment

    que controla a grande informatica"

    225

    .

    Longe de uma racionalizac;ao simples de praticas, a tecnologia e

    motor de mitologias e e, nesse se

    nti

    do, que

    C

    Miguel vai mostrar que

    a pratica da microinfonnatica nao corresponde ao imaginario de

    um

    a

    maquina objetiva, como qualquer objeto tecnico funcional. Ao con-

    trario, o computador e portador de urn universo imaginario complexo,

    com uma micromitologia propria, sendo visto como

    urn

    objeto para

    doxa , ao mesmo tempo ferramenta de organizac;ao e de administrac;ao

    racional da vida social, e objeto sagrado, onde individuos participam

    de urn pensamento magi co, de uma hierofania quotidiana. Como afir

    ma Miguel, "a pesquisa pennitiu, nesse sentido de confirmar [ .

    ]que

    ,

    na nossa sociedade, o sagrado crista liza-se de maneira eremera sobre

    urn objeto tecnico".

    226

    As fonnas de interatividade e de interfaces vao

    aguc;ar ainda mais essa sacra

    li

    zac;ao das novas tecnologias.

    lnteratividade interface

    / When yo u are interacting with a

    comp

    ut

    er

    , you are n

    ot

    co

    nvers

    in

    g

    1

    with anoth

    er

    person . You are exploring another world .

    J OHN

    W

    ALKER

    227

    A interface grafica e as novas formas de interac;ao homem

    maquina foram decisivas para a apropriac;ao social dos microcompu

    tadores.

    Os

    estudos de

    r

    enda Laurel sobre interfaces e interativida

    de mostram bern como as novas tecnologias oferecem possibilidades

    para experiencias

    cr

    iativas e interativas, particularmente na forma

    do drama. Ja nos primeiros jogos eletronicos vemos a capacidade

    das novas maquinas informaticas

    par

    a representar "ac;ao no qual

    humanos podem participar"

    228

    H

    Como vimos, o presenteismo e a t

    ea

    tralidade da vida social

    ulili zar o potencial das novas maquinas digitai

    s

    Essa teatra-

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    lidade quotidiana sera levada em conta no desenvolvimento da

    interface homem-computador

    229

    A no

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    interfaces urn paralelo com o papel do diretor de teatro : Ambos

    criam representayao de objetos e ambientes que criam urn contexto

    para a

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    tecnica, de cunho eletronico-digital, diferente da intera9ao anal6gi a

    que caracterizou os media tradicionais.

    Experimentamos, todos os dias , formas de intera9ao ao

    mesmo tempo tecnicas e sociais. Nossa rela9ao com o mundo e

    urna rela9ao interativa em que as a96es variadas correspondem a

    retroa96es das mais diversas. Essa intera9ao funda toda a vida em

    sociedade. Vamos tratar aqui nao da intera9ao social, mas do que

    severn chamando de interatividade (digital) relacionada aos novos

    media (em bora esta esteja sempre ligada

    a

    primeira). Is so pressupoe

    delimitar a interatividade como uma a9ao dia16gica entre o homem

    e os objetos tecnol6gicos.

    A tecnologia e, e sempre foi, inerente ao social. Utilizada

    no seu sentido mais amplo, ela e constitutiva do homem e de toda

    vida em sociedade. A intera9ao homem-tecnologia e uma atividade

    tecnossocial presente em todas as etapas da civiliza9ao. 0 que vemos

    hoje, com as tecnologias do digital, nao e a cria9ao da interatividade

    propriamente dita, mas de processos baseados em manipula96es de

    informa96es binarias.

    lnt

    r t

    iv

    de e

    i n t e r ~ o

    soci l

    Urn exemplo quotidiano qu ndo falamos em intera9ao

    tecnossocial e 0 transito. 0 fluxo de autom6veis depende de urn

    sistema interativo, auto-organizante e participativo. No transito, o

    motorista participa de urn processo duplamente interativo: de urn

    lado, uma intera9ao com a maquina, que chamaremos de anal6gico-

    eletromec{mica

    23S

    e de outro, uma intera9ao com os carros (mo

    toristas) que chamaremos simplesmente de

    interar iio

    sociaP

    A

    interatividade e, ao mesmo tempo, uma intera< ilO tecnica (de tipo

    analogico-mecanico) e social,_,

    0 telefone e urn outro exemplo desse tipo de intera9ao, mas,

    aqui, a intera9ao e basicamente social, existindo uma reduzida in

    tera9ao

    como

    terminal, de tipo anal6gico-mecanica. Essa limita-se

    composi9ao do numero desejado atraves das teclas do aparelho

    (sua interface), sendo a intera9ao

    como

    outro o que faz do telefone

    uma ferramenta convivial, no senti do dado por Illich. Para Illich, o

    telefone e urn exemplo de convivialidade, pois nenhum burocrata

    podera fixar a priori o conteudo de uma comunica9ao

    237

    Existe,

    com o telefone, uma forte intera9ao social , numa fraca intera9a0

    tecnica. Como diz Negroponte, o telefone nao e inteligente (inter

    a-

    l l

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    tivo ), pois

    0

    que queremos fazer com ele e falar com

    0

    outro, nao

    pegar o telefone, esperar a linha, discar os numeros etc...

    238

    ) Podemos ter como hip6tese (e varios exemplos aparecem a

    ,cada dia) que a evolw;ao da

    relac;;ao

    homem-tecnologia vai nesse

    sentido, ou seja, no privilegio

    da interac;;ao

    social e no

    mento_progressivo da interatividade tecnica. Vamos em direc;;ao a

    . rna i nterface '

    :Zero

    a-uma simbiose completa, cujo

    exemplomaior

    e

    a

    realidade

    vlrtiTa1

    como veremos nos pr6ximos capitulos.

    Se pensarmos sobre o percurso tecnol6gico da televisao,

    poderemos ver, com clareza, a evoluc;;ao

    da

    interac;;ao

    tecnica em

    urn

    aparelho de pouca

    interac;;ao

    social, embora muitos autores insistam

    sobre o carater coletivo e tribal da televisao, principalmente com

    a noc;;ao de missa televisiva. Num primeiro momenta, que vou

    chamar de interac;;ao nivel 0, a TV e em preto e branco, com apenas

    urn ou do

    is

    canais. A interatividade aqui e limitadaa c;;ao de ligar ou

    de desligar o aparelho, regular vo lume, brilho ou contraste. Depois

    aparece a TV em cores e outras opc;;oes de canais.

    0

    controle remo

    ta

    vai permitir que 0 telespectador possa

    zappear,

    isto e, navegar

    por

    emissoes e cadeias de TV das mais diversas, instituindo uma

    certa autonomia

    da

    telespectac;;ao

    239

    (nivel 1 . zapping e assim

    urn antecessor da navegac;;ao contemporanea na

    World

    id

    e

    eb

    WWW

    ou Web).

    No

    nivel2,

    alguns equipamentos invadem a televisao, como

    o video, as camaras portateis

    ou

    os consoles de

    jogos

    eletr6nicos,

    fazendo com que o telespectador se aproprie do objeto TV (para

    outros fins, como ver videos ou jogar) e das emissoes (gravar e

    assistir ao programa

    na

    bora que quiser), instituindo

    uma

    tempo

    ralidade propria e independente do fluxo das mesmas. Eno nivel

    3 que aparecem sinais de uma interatividade de cunho digital , em

    que o usuario pode interferir no conteudo das emissoes a partir de

    telefones, fax ou e-mail. No nivel4 , em que estamos atualmente, a

    chamada televisao interativa surge, possibilitando a participac;;ao,

    via telematica, ao conteudo informativo das emissoes em tempo real

    ( escolher angulos e cameras, por exemplo) como a experiencia do

    Videoway

    no Canada

    240

    ,

    por

    exemplo.

    A televisao tradicional permite uma

    interac;;ao

    com a maquina,

    tipo anal6gico-digital (ligar,

    zappear ,

    sem permitir uma

    interac;;ao

    direta e mais ampla (que a simples votac;;ao por telefone) com o

    conteudo das emissoes, o que seria uma interatividade eletr6nico

    digital. Embora emissoes brasileiras como Voce Decide, ou Inter-

    112

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    cine sejam interativas num sentido lato

    24 1

    , a interatividade se limita

    aqui a uma escolha entre duas ou tn s op96es a partir de ligayoe

    telefOnicas. A emissao Hugo (jogo eletronico pela televisao com

    manipulayao do personagem central) incorpora elementos de uma

    verdadeira V interativa, ja que, a partir das teclas do telefone,

    o espectador se transforma em jogador e modifica o conteudo da

    emissao, no caso, o resultado do jogo. A televisao digital interativa

    pode viabilizar, ao mesmo tempo, intera96es medinico-anal6gica

    (com a maquina), eletronico-digital (com o conteudo) e social.

    Como exemplo dessa fusao, temos a experiencia da Piazza Virtuale

    como veremos a segUir

    Assim, alem da interatividade de tipo anal6gico-mecanica

    e da intera9ao social, podemos dizer que os novos media digitais

    vao proporcionar uma nova qualidade de interayao, ou o que cha

    mamos hoje de interatividade digital : uma interayao tecnica de

    tipo eletronico-digital correspondendo

    a superayao do paradigma

    anal6gico-mecanico.

    Como vimos, a revoluyao digital possibilita o que chamamos

    aqui de uma terceira interatividade, a interatividade de tipo eletronico

    digital. Podemos no tar que a interatividade se situa em tres niveis nao

    excludentes: tecnico anal6gico-mecanico, tecnico eletronico-digital

    e social (ou simplesmente interayao). A interatividade digital e urn

    tipo de relayao tecnossocial e, nesse sentido, "urn equipamento ou

    urn programa e dito interativo quando seu utilizador pode modificar

    o comportamento ou o desenrolar"

    242

    A tecnologia digital possibilita

    r

    ao usuario interagir, nao mais apenas como objeto (a maquina ou a I

    ferramenta), mas com a informayao, isto e, como conteudo. Jsso vale \

    tanto para uma emissao da televisao interativa digital, como para os

    leones das interfaces graficas dos microcomputadores, como vimos.

    A interayao homem-tecnologia tern evoluido a cada ano

    no sentido de uma

    relayao mais agil e confortavel. Vivemos hoje

    a epoca da comunicayao planetaria fortemente marcada por uma

    intera9ao com as informa96es, cujo apice e a realidade virtuaJ2

    43

    A interatividade digital caminha para a superayao das barreiras

    fisicas entre S agentes (homens e maquinas) e para uma interayiiO

    cada vez maior do usuario com as informay5es, e nao com objetos.

    Epor isso que Manzine fala da interatividade digital como "[ ..]

    uma interatividade cujo programa nao esta inscrito na forma fisica

    macrosc6pica do objeto, masse encontra gravado nos suportes ele

    tronicos ( cuja forma fisica escapa a nossa

    escalade

    percep9ao)"

    244

  • 7/26/2019 Lemos (2015) - Parte III, Captulo 1 (p. 99-126)

    18/30

    Essa nova qualidade da interatividade (eletronico-digital),

    com os computadores eo ciberespa

  • 7/26/2019 Lemos (2015) - Parte III, Captulo 1 (p. 99-126)

    19/30

    Internet 0 c i b e r e s p a ~ o planetaria

    In cyberspace, there is no need to move about

    it

    in has leotard like

    tea one you possess

    in

    physical reality. [ ..] Imagine has costume

    party at which you adopt not merely has new set

    of

    clothes, goal

    has new leotard, has new voice, and-in has very fundamental and

    literal judicious-has identity new.

    249

    A [ntemet, urn conjunto

    de

    redes planetarias de base tele

    matic

    a,

    come

  • 7/26/2019 Lemos (2015) - Parte III, Captulo 1 (p. 99-126)

    20/30

    A Internet, como foi a microinforrmitica, ao menos em sua

    c o n f i g i l l ~ o atual, nao

    eo

    resultado somente de uma estrate Ia tecno

    cnitica de cima para baixo, mas 0 produto de uma p r o p r i ~ o soCial

    Ela age como potencial descentralizadora do podertecnoindustrial

    mediatico, abrindo uma rede verdadeiramente aberta e acessivel [ ]

    urn ambiente de expressoes onde nenhum governo pode controlar

    252

    Como exemplos desse ambiente aberto, e de dificil controle, po

    demos citar as

    i n f o r m a ~ o e s

    passadas ao Ocidente pelos estudantes

    da

    p r ~

    Tiananmen na China, ou aquelas sobre o golpe de Estado

    na ex-Uniao Sovietica, ou, recentemente, as ideias dos zapatistas

    mexicanos, sem contar todo o movimento sobre o direito autoral

    (MP3) ou

    as

    formas de emissao de

    i n f o r m a ~ a o

    que nao necessitam

    mais do poder mediatico chissico. Bruce Sterling mostra que no

    caso do golpe na Russia era impossivel para o poder geriatrico do

    Kremlin suprimir a

    d i s s e m i n a ~ a o

    da verdade. Mensagens de fax e

    e-mail deixaram a p o s i ~ a o mais informada dos desenvolvimentos

    do que a KGB com seu sistema de i n f o r m a ~ a o hierarquico poderia

    possivelmente ser

    253

    .

    historia da grande rede

    A ideia de unir computadores em rede e desenvolvida por Bob

    Taylor, diretor em 1966 do DARPA, Departamento de Projetos de

    Pesquisas v a n ~ a d a s da Agencia de Defesa Americana

    254

    Urn dos

    passos fundamentais foi dado em 1969, quando o processador de

    mensagens e construido em urn minicomputador na Universidade

    da California em Los Angeles (UCLA). Esse foi o primeiro ponto

    da entao rede Arpanet

    255

    m 1980, Darpanet se dividiu em duas

    novas redes: Arpanet (cientifica) e Milnet (militar). No entanto,

    as

    conexoes feitas entre as duas redes permitiram continuar a troca de

    c o m u n i c a ~ o e s

    eletronicas. Essa interconexao foi chamada de

    Darpa

    nter et no principio, ou somente Internet, limitada aos cientistas

    e militares .

    Surgem depois redes cooperativas e descentralizadas como

    a UUCP (em UNIX) e a Usenet Users Network) , ja na decada de

    1970, para servir a comunidade academica, a sociedade em geral

    e depois as

    o r g n i z ~ o e s

    comerciais. No principio dos anos 1980,

    as redes CSNET Computer Science Network) e a Bitnet Because

    ts

    time to Network)

    expandiram ainda mais a Internet. A o r r n ~ o

    da rede NSFNET National Science Foundation Network), unindo

    6

  • 7/26/2019 Lemos (2015) - Parte III, Captulo 1 (p. 99-126)

    21/30

    alguns investigadores americanos a cinco centros com supercom

    putadores, transforma-se no grande marco da hist6ria da Internet. A

    NSFNET substituiu a Arpanet, que desapareceu em man;o de 1990,

    e a CSNET, extinta

    em

    1991 . Hoje a Internet e formada

    por

    mais

    de 8.000 redes, interligando todos os continentes. A Internet nao s6 \

    esta em expansao em numero de usuarios, mas tambem em tipos

    de aplicac;:oes. Atualmente, o grande projeto e a Internet 2, criada

    para ligar, a altas velocidades, centro de pesquisa e universidades

    256

    .

    A Internet, como uma rede de redes, e formada por LANs

    Loc

    alAr

    ea Networkou Redes Locais), MANs

    M

    etropolitan Area

    Network ou Redes Metropolitanas) e WAN World Area Network

    ou Redes Mundiais). Essas sao conectadas por redes telefonicas, ,

    satelites, micro-ondas, cabos coaxiais e fibras 6pticas, permitindo a

    comunicac;:ao com os computadores que utilizam protocolos comuns

    (regras e acordos que permitem o vinculo e a comunicac;:ao entre

    maquinas diferentes). 0 idioma de computadores na rede Internet

    eo

    protocolo TCP/IP Transmission Control Protocol/Internet Pro

    tocol), desenvolvido nos anos 1970 no Darpa e usado pela primeira

    vez em 1983 na Arpanet. 0 interessante a ser ressaltado aqui e que

    o TCP/IP foi desenvolvido com capitais publicos sendo, desde

    1

    sempre, considerado livre, significando que nenhuma companhia

    possui seu monop61io. A Netja nasce com este espirito: o TCP/IP

    e demais softwares basicos que perm item acessar a grande rede sao

    gratuitos e disponiveis em varios servidores ao redor do mundo.

    A rede Internet e composta de hierarquias diferentes: as redes

    centrais de alta velocidade high-speed central networks) e os back

    bones, ou espinha dorsal. Existem redes de nivel medio mid-level

    networks) ,

    que se ligam aos

    backbones

    e distribuem a informac;:ao

    para

    OS

    usuarios. Como explica LaQuey, nao existe nenhuma gestao

    centralizada da rede: Gente e a palavra operativa aqui. A Internet

    parece ser institucional e anti-institucional ao mesmo tempo, mas

    siva e intima, organizada e ca6tica. Em urn sentido, a Internet e urn

    empreendimento cooperativo ..

    257

    Toda a organizac;:ao dos computadores da Internet e es

    truturada

    com dominios

    especificos para cada maquina. 0 DNS

    Domaine Name System) normaliza nomes dos computadores: edu

    (educac;:ao), com ( comercio), gov (governo , mil ( exercito ), org (or

    ganizac;:oes) etc. Duas letras-c6digo identificam o pais (normalmente

    os EUA nao tern nenhuma terminac;:ao) como fr para a

    Franc;:a

    ,

    br para Brasil e assim sucessivamente. Outras redes, que tern

    7

  • 7/26/2019 Lemos (2015) - Parte III, Captulo 1 (p. 99-126)

    22/30

    protocolos de transferencia de arquivo diferentes, fora da Internet,

    sao chamadas de outernets. Essas podem ser interconectadas

    a

    grande rede por e-mail atraves de e-mailgateways ou passarelas

    para troca

    e

    correio eletr6nico. As redes mais conhecidas nesse

    genera sao FidoNet, Bitnet, UUCP, CompuServe, America Online

    etc. Outro servis;o/rede disponivel na Internet e o network news ou

    Usenet. Essa rede e dividida em newsgroups tematicos formados

    por artigos onde qualquer pessoa pode participar. Voltaremos a esse

    ponto mais adiante quando formos analisar as comunidades virtuais.

    A Internet oferece varias ferramentas para a navegas;ao em

    seu ambiente, agindo como uma verdadeira incubadora mediatica,

    j

    que da espas;o para a crias;ao de diversos dispositivos comuni

    cacionais, como o correio eletronico e-mail); o programa telnet

    que permite a conexao remota a outros computadores ); o FTP files

    tr ner protocol -

    para transferencia de arquivos, permitindo a troca

    de arquivos de forma anonima); o WWW World Wide Web ou Web,

    a parte multimidia e mais popular hoje da Internet, que permite a

    navegas;ao por paginas de informas;ao homepages, sites) atraves de

    links,

    lexias hipertextuais que induzem a navegas;ao de informas;ao

    em informas;ao, de site em site, de pais em pais atraves de

    softwares

    como o antigo Mosaic ou os atuais Nestcape, Explorer ou mesmo

    o magrinho Opera; os agentes inteligentes,

    softwares

    que buscam

    informas;ao

    a

    a carte para o usuario como o Archie, WAIS, entre

    outros; o IRC, ou Internet Relay Chat, ICQ, Gooey e outros que

    permitem o dialogo em tempo real, sincronico entre usuarios . Cada

    dia novas ferramentas midiaticas sao incubadas na rede.

    Urn dos instrumentos mais interessantes sao

    OS

    chamados

    Agentes Inteligentes.

    gentes

    Os agentes inteligentes estao em franca expansao, desde ma

    quinas de busca que cruzam informas;oes de diferentes servidores

    ao redor do mundo ate programas particulares que efetuam pesquisa

    para seus usuarios. 0 excesso de informas;ao obriga a construs;ao de

    dispositivos que possam auxi

    li

    ar os usuarios e aprender com seus

    costumes. Passaremos, assim, a delegar a urn agente inteligente

    eletronico a tarefa de encontrar informas;oes que desejamos.

    Alguns programas foram desenvolvidos nesse sentido an

    tes da Web e tern hoje uma funs;ao marginal, como o ARCHIE

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    23/30

    (desenvolvido por Paternoster Deutsch na McGill Univer ity m

    Montreal), que procura informa

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    24/30

    a casa-escola), nas redes telematicas (ou a casa-enciclopedia), nos

    diversos dispositivos de telecompras ( ou a casa-shopping) etc.

    c ~ l t u r vai, pouco a pouco, red_

    fipinQOJlQSSa

    pratica do

    e_s_pas o

    e do tern

    oparticularinente

    no que se refere ao novo nomadismo

    tecnol6gico e as fronteiras entre o espas;o publico

    eo

    espas;o privado.

    Com os telefones celulares, os fax, os computadores portateis, mo

    dem e satelites, estamos em casa o tempo todo. Como disse Barlow

    num evento multimfdia em Amsteroa, rii'i"nhacasa e meu e-mail"

    258

    0 espas;o privado se imbrica no espas;o publico e vice-versa, numa

    verdadeira publiciz

    as ao

    do privado e de privati z

    as ao

    do publico.

    0 tempo real da comunicas;ao instantiinea

    eo

    espas;o fisico

    comprimido e dilufdo na fronteira eletronica do ciberespas;o criam

    uma contradis;ao entre o imobilismo da casa e o nomadismo pro

    porcionado pelas novas tecnologias. Essas permitem que eu esteja

    em qualquer Iugar sempre conectado. Assim, quanto mais a casa

    e perfurada por canais que nos unem as infom1as;oes binarias que

    nos chegam do mundo, mais nos tomamos nomades, cowboys do

    ciberespas;o, armados de maquinas de comunicar (computadores

    portateis, celular

    wap pagers

    celulares,pa/m

    computers

    .

    Podemos,

    assim, agir como nomades, num modo de exflio permanente. Mais

    uma vez, nao e o espas;o fisico que conta (minha casa real) , mas

    o ciberespas;o (meu enderes;o eletronico, minha home

    p g

    e meu

    numero ICQ, meu p ger ..

    .

    A casa ja e, nas sociedades modern as, uma estrutura porosa,

    mesmo que supostamente limitada fisicamente por paredes, portas

    e janelas. Essa porosidade e subterriinea, escondida em redes que

    nos entregam, diariamente, o fluxo material e informacional do

    mundo (radio, TV, esgoto, agua, luz, correio etc). Ao acordarmos

    pela manha, deparamo-nos com urn mundo que esta dentro de casa:

    eletricidade, esgotos, caixas de correio, ondas de radio e televisao,

    telefone. A casa e assim urn hardware, uma ilha, uma especie de

    machine avivre, como di zia o arquiteto Le Corbusier.

    No entanto, o hardware-casa nao faz

    urn Jar

    , nao funda o meu

    Iugar. 0 meu Iugar nao e

    urn

    hardware, mas tudo aquilo que me

    faz reconhecer esse Iugar como meu. 0

    Jar

    e assim uma especie de

    software da casa,

    urn

    con unto de c6digos e programas que nos faz

    ter a sensas;ao de estar no

    chez moi.

    0 lar e produtor de sensas;oes

    particulares e simb6licas, urn espas;o de rriem6ria, subjetividade e

    intimidade. 0 Jar e o nao espas;o da casa. Ritualizado e mftico, o

    Jar e a alma da casa e o parafso de nossa individualidade privada.

    12

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    25/30

    E aqui que n6s somos, de uma vez

    por

    todas, n6s mesmos, qu

    nos diferenciamos dos outros, tentamos evitar as interferencias d

    espavo publico. Aqui, o tempo nao e mais aquele de

    Cronos

    linear

    e positivo, mas o

    Kair6s

    circular: o tempo do dia a dia para, dei

    xando ftuir o meu tempo . 0 lar caracteriza-se por ser urn espavo '

    imagimirio, simb61ico; urn conjunto de pniticas concretas e rituais

    imaginarios que fazem de minha casa algo sem igual.

    Hoje, com a Internet, o meu lar-casa torna-se o ponto de

    aglutinavao de informavao, como uma especie de buraco negro

    onde entram, alem das formas tradicionais de captayao de materia,

    energia e

    informavao, palavras, imagens e sons do ciberespayo. Mas,

    aqui, introduz-se uma diferenya fundamental: lar-casa tambem e

    urn ponto de disseminayao de espectros e fantasmas pelo ciberes

    payo: os agentes inteligentes, programas que circulam buscando

    informav5es distantes e precisas, via ciberespayo.

    Os agentes vao circular no ciberespayo em busca de infor

    mavao personalizada, transformando-o num imenso ecossistema.

    Como os cachorros que vao procurar o chinelo dos seus mestres,

    os agentes inteligentes, a partir de instruv5es dadas pelo usuario,

    realizam diversas tarefas, como buscar urn artigo em urn banco de

    dados, passar pedidos de compras, ordenar informavao nos jornais

    eletronicos, filtrar discussoes nas conferencias eletronicas, procurar

    uma musica, guiar em

    urn

    servivo eletronico ..

    ip rt xto

    0 hipertexto mundial que e o ciberespayo fez com que os

    produtores culturais mudassem suas formas de concepyao dos

    conteudos de seus produtos. Assim, se com o

    broadcasting

    os

    produtores tinham como objetivo realizar uma programavao que

    captasse a audiencia de forma homogenea, com os novos

    media

    digitais interativos o que esta em

    jo o

    e urn

    metadesign

    ou seja,

    o design de ferramentas, parametros e condiv5es de operavao

    que permitem ao usuario final a tarefa de interativamente fazer

    design final

    25

    9

    .

    Esse

    metadesign

    deixa livre o utilizador para que

    ele participe tambem do processo de concepvao em processos hi

    pertextuais com urn CD-ROM ou os sites na

    Web

    Estabelece-se,

    dessa forma, urn processo nao linear de concepyao e de utilizayao

    (interatividade) dos conteudos, em que a realizavao da obra, ou da

    ayao como diria Laurel, e impossivel sem o usuario. Se nao intera-

    121

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    26/30

    girmos com os hipertextos, seja ele urn site ou

    urn jogo

    eletr6nico,

    nada acontece, e a

    a

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    27/30

    Dessa forma, a leitura nao e mais, necessariamente, linear. Ia

    transforma-se em urn estado de "aten

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    28/30

    contar est6rias, porque o hipertexto sempre coloca uma redefinic;:ao

    entre corpo e

    espac;:o

    269

    .

    Tecnicamente, o hipertexto e uma forma de or aniz - da

    ~ c ; _ a o

    p o s s i b i l i t d pelos

    avanc;:os

    dainformatica, traduzindo

    se

    em

    urn conjunto de n6s, ligado por conexoes, permitindo a

    explorac;:ao atraves de urn processo de 'leitura-navegac;:ao' nao

    linear e associativo, descentralizado e rizomatico

    270

    Aqui, instala-se

    uma sequencia de processos interativos e criativos - advindos das

    possibilidades de traduc;:ao

    , transforrnac;:ao e passagens atraves de

    conexoes multiplas em velocidade. Longe de ser apenas urn novo

    suporte tecnico para a

    inforrnac;:ao, os hipertextos problematizam as

    formas de conceber a

    produc;:ao

    e apreensao da informa

    c a

    o e do co

    nhecimento, ao mesmo tempo que urn rearranjamento do espac;:o

    27

    1

    Landow

    272

    vai alem, ressaltando que os hipertextos sao uma

    especie de laborat6rio onde as hip6teses levantadas e sustentadas

    teoricamente pelos p6s-estruturalistas poderiam ser testadas.

    Os

    hipertextos permitem o questionamento do pensamento logocentrico

    ocidental e afirrnam as ideias de Barthes, Derrida e Foucault sobre

    a falencia dos significados de margem, hierarquia e linearidade

    273

    .

    0 hipertexto seria, em outros termos, urn modo de conceber

    como pensamos e organizamos o pensamento. Para Landow [ ..]

    devemos abandonar sistemas conceptuais fundados nas ideias de

    margem, hierarquia e linearidade, e substitui-los por outros de

    multilinearidade, n6s, links e redes. Quase todos os estudiosos

    desta mudanc;:a

    de paradigma, que marca uma revoluc;:ao no pensa

    mento humano, percebem a escrita eletronica como uma resposta

    para as

    forc;:as

    e fraquezas do livro impresso

    274

    .

    Landow trata o

    hipertexto como uma estrutura sem centro. 0 ponto do

    espac;:o

    tido

    como central (ou de partida) e constantemente atualizado, sendo

    permanentemente deslocado . Dito de outra forma, o hipertexto e

    urn sinonimo de rede.

    Arede hipertextual instaura-se como urn modelo de conexao

    generalizada e, nesse sentido, ftanar numa cidade ou navegar por

    hipertextos evoca urn mesmo processo: uma relac;:ao descentralizada

    e rizomatica com o

    espac;:o.

    Estabelece-se a interconexao entre o

    processo de leitura (relac;:ao entre o corpo eo texto) eo mapeamento

    (relac;:ao entre o corpo eo espac;:o ), fund indo as figuras do lei tor (que

    segue o mapa) e do escritor (que faz o mapa). Como mostra Landow,

    [ ..] ja que sistemas hipertextuais permitem ao leitor anotar urn

    texto individual e linkar para outros, ate textos contradit6rios, isso

    24

  • 7/26/2019 Lemos (2015) - Parte III, Captulo 1 (p. 99-126)

    29/30

    destr6i uma das mais importantes caracteristicas do texto impre s

    - sua separayao e univocalidade. Sempre que colocamos urn text

    numa rede de outros textos, reforyamos a sua

    x i s t t ~ n c i

    como parte

    de urn dialogo complexo

    7

    Todo o sistema hipertextual instaura urn hibrido de leitor e

    escritor, de aventureiro e conformista, na figura daquilo que Rosello

    chama de Screener. Nao e por acaso que parar diante de

    urn

    im6-

    vel que pertenceu a nossa infiincia, sentir os cheiros e ruidos que

    s6 a n6s faz sentido, ou clicar num link que a voce surge naquele

    in

    stante interessante, parece fazer parte de urn mesmo processo

    hipertextual. Assim, da jlanerie do poeta urbano aciber-flanerie

    eletr6nica do intemauta nao ha, nesse sentido, muita dist:ancia.

    Trata-se de

    urn

    mesmo processo de metaconstru9ao das estruturas

    (urbana e tecnol6gica - o ciberespayo

    .

    Vagar pela cidade e clicar '

    em sites na Internet e, assim, escrever lendo , e deixar marcas a

    partir de mapas dados, e imprimir urn trayo no espayo, ao mesmo

    tempo maleavel e inflexivo do quotidiano.

    0 jlaneur como o navegador de hipertextos eletr6nicos, e

    esse personagem para quem o andar nao e necessariamente inten

    cional ou objetivo. Ele toma-se observador que olha sem julgar, que

    busca a imersao, e nao a compreensao. Ajlanerie no ciberespayo e

    nas cidades (como ato de desmesura) permite jogar como espayo

    instituido, escrever percursos alem dos textos construidos por suas

    macroestruturas. 0 andar do jlaneur e, assim, a to de to mar posse,

    de marcar simbolicamente o espayo.

    Trata-se mesmo de apropria96es silenciosas, minusculas e

    banais do quotidiano, de praticas de subversao intersticial, de possi

    bilidades de se locomover escrevendo pequenas hist6rias - forma de

    apropria9ao que De Certeau chamou de invenyao do quotidiano

    276

    Assim, a partir desses gestos, o l neur

    eo

    ciber-flaneur estariam,

    certamente, imprimindo trayOS , deixando marcas (nao e a toa

    que somos ca9ados pelas impress6es eletr6nicas que deixamos

    na Web, nos cart6es eletr6nicos, nos celulares etc.) . Longe de

    uma simples consumayao passiva dos espayos (urbano ou ciber),

    estariamos diante de processos de seduyao, de desvio. Tanto a

    cidade como os hipertextos sao (des )organizados pela marca ( es

    crita) nao linear, indexada a associa96es das mais diversas. Aqui

    0 mapa nao e 0 territ6rio .

    Os links, ou lexias como propos Barthes, sao obviamente

    dependentes de estruturas previas.

    o

    entanto, essas estruturas nao

    2

  • 7/26/2019 Lemos (2015) - Parte III, Captulo 1 (p. 99-126)

    30/30

    sao totalmente determinantes. Como mostra Rosello, quem observa

    oficmeur [

    ]tern

    que pensar a

    relac;:ao

    entre o corpo do viajante eo

    mapa, mas tambern o

    status

    do mapa como uma

    rendic;:ao

    metaf6rica

    do

    espac;:o:

    o corpo

    dofianeur

    que nao segue uma rota ou inventa

    novos caminhos para urn velho destino, tambem subverte a visao

    do espac;:o como uma nave vazia, urn mero receptacula neutro da

    rede

    277

    0 ciberespac;:o, como uma metacidade de

    bits

    e urn imenso

    hipertexto mundial interativo, onde cada urn pode adicionar, retirar

    e modificar partes desse texto vivo, escrevendo sua pequena hist6-

    ria. A aproximac;:ao

    entrefianerie

    urbana e navegac;:ao hipertextual

    parece estimulante, uma vez que permite a apreensao de ambos os

    processos nao em

    oposic;:ao

    - como sugere uma determinada corrente

    critica, a partir da suposic;:ao de irrealidade da experiencia virtual -

    mas como continuos. A

    c er-jlanerie

    pode ser compreendida como

    uma forma de ampliac;:ao metaf6rica do fl.anar urbano.

    importante ressaltar, tambem, as especificidades de cada

    urn dos processos de

    fianerie -

    ou suas diferenc;:as de escala. Se,

    na vida real, a concretude e a materialidade do corpo e do

    espac;:o

    fisico deterrninam e constrangem a identidade, a

    relac;:ao

    individuo

    mundo e as formas de sociabilidade - e, portanto, afianerie

    -

    toda

    uma outra forma de socialidade ca6tica e fractal , descentralizada,

    dispersa e multipla, fundada antes

    em

    multipersonalidades, em co

    munidades sem proximidade e atuando por identificac;:oes efemeras

    e sucessivas, exacerba-se a partir dos ftuxos virtualizantes

    278

    Da

    mesma forma, a dimensao de nao Iugar do ciberespac;:o, constituida

    a partir das caracteristicas combinadas de aterritorialidade, imate

    rialidade, instantaneidade e interatividade, circunscreve a analogia

    entre as metr6poles concretas e as mega cidades de bits .