Leis 9472 de 1997 Exposicao Dos Motivos

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  • DOCUMENTO DE ENCAMINHAMENTO DA LEI

    GERAL DAS TELECOMUNICAES

    COMENTANDO-A

    Braslia

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    MINISTRIO DAS COMUNICAES Documento de Encaminhamento da Lei Geral das Telecomunicaes, comentando-a

    GABINETE DO MINISTRO

    E.M. no 231 /MC

    Braslia, 10 de dezembro de 1996

    Excelentssimo Senhor Presidente da Repblica: Tenho a honra de submeter elevada considerao de Vossa Excelncia o anexo

    Projeto de Lei, que versa sobre a nova organizao dos servios de telecomunicaes, sobre a criao de um rgo regulador, e sobre outros aspectos institucionais desse setor, em atendimento Emenda Constitucional no 8, de 15 de agosto de 1995.

    Esse Projeto resultado de intenso esforo desenvolvido pelo Ministrio das

    Comunicaes, que contou com o apoio de consultores nacionais e internacionais, obtido atravs de acordo de cooperao firmado entre o Governo Brasileiro, representado pela ABC - Agncia Brasileira de Cooperao, do Ministrio das Relaes Exteriores, e a UIT - Unio Internacional de Telecomunicaes, organismo especializado da Organizao das Naes Unidas. O Projeto recebeu tambm contribuies valiosas de outros rgos do Governo, que o aperfeioaram adequando-o s caractersticas peculiares da organizao administrativa do Pas.

    Esta Exposio de Motivos est estruturada em trs partes. Na primeira delas feita

    uma breve introduo ao assunto, a partir do contexto em que est inserido o setor de telecomunicaes e da proposta de governo de Vossa Excelncia, cuja primeira ao prtica materializou-se na Emenda Constitucional no 8. Na segunda parte so apresentados os fundamentos da proposta ora formulada, abordando os aspectos essenciais da economia do setor, da estrutura de mercado pretendida e da estratgia de introduo da competio na prestao dos servios. Na terceira parte, que trata especificamente do contedo do Projeto de Lei, so abordadas: as disposies principais da proposta de estruturao do rgo Regulador previsto na Constituio Federal; a proposta para uma nova organizao dos servios e temas regulatrios dela decorrentes; e aspectos relacionados reestruturao empresarial e desestatizao do Sistema Telebrs.

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    I - O Contexto Brasileiro 1. Breve Histrico No incio da dcada de 1960, vigendo a Constituio de 1946, cabia Unio, aos

    Estados e aos Municpios a explorao, de acordo com o seu mbito, dos servios de telecomunicaes, diretamente ou mediante a correspondente outorga. Descentralizada da mesma forma era tambm a atribuio de fixar as tarifas correspondentes. Havia ento cerca de 1.200 empresas telefnicas no Pas, a grande maioria de mdio e pequeno porte, sem nenhuma coordenao entre si e sem compromisso com diretrizes comuns de desenvolvimento e de integrao dos sistemas, o que representava grande obstculo ao bom desempenho do setor.

    Os servios telefnicos concentravam-se na regio centro-leste do Pas, onde se

    situavam mais de 60% dos terminais, explorados pela CTB - Companhia Telefnica Brasileira, de capital canadense. Os servios telefnicos interurbanos eram precarssimos, baseados apenas em algumas ligaes em microondas de baixa capacidade, interligando o Rio de Janeiro, So Paulo, Campinas, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Braslia, e em poucos circuitos de rdio na faixa de ondas curtas. As comunicaes telefnicas e telegrficas internacionais, que tambm no atendiam s necessidades do Pas, eram exploradas por empresas estrangeiras.

    A precariedade da situao do setor sensibilizou o Governo e o Congresso, que

    editaram ento o Cdigo Brasileiro de Telecomunicaes - Lei no 4.117, de 27 de agosto de 1962. Essa lei, que foi o primeiro grande marco na histria das telecomunicaes no Brasil, tinha os seguintes pontos principais:

    ?? criao do Sistema Nacional de Telecomunicaes, visando assegurar a

    prestao, de forma integrada, de todos os servios de telecomunicaes;

    ?? colocao, sob jurisdio da Unio, dos servios de telgrafos, radiocomunicaes e telefonia interestadual;

    ?? instituio do Contel - Conselho Nacional de Telecomunicaes, tendo o Dentel - Departamento Nacional de Telecomunicaes como sua secretaria-executiva;

    ?? atribuio ao Contel de poder para aprovar as especificaes das redes telefnicas, bem como o de estabelecer critrios para a fixao de tarifas em todo o territrio nacional;

    ?? atribuio Unio da competncia para explorar diretamente os troncos integrantes do Sistema Nacional de Telecomunicaes;

    ?? autorizao para o Poder Executivo constituir empresa pblica para explorar industrialmente os troncos integrantes do Sistema Nacional de Telecomunicaes (essa empresa viria a ser a Embratel);

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    ?? instituio do FNT - Fundo Nacional de Telecomunicaes, constitudo basicamente de recursos provenientes da aplicao de uma sobretarifa de at 30% sobre as tarifas dos servios pblicos de telecomunicaes, destinado a financiar as atividades da Embratel;

    ?? definio do relacionamento entre poder concedente e concessionrio no campo da radiodifuso.

    Os instrumentos criados pelo Cdigo foram aos poucos fazendo sentir seus efeitos. O Contel passou a exercer sua misso de orientao da poltica e de fixao de diretrizes para o setor de telecomunicaes; com a submisso ao seu crivo dos planos de expanso dos servios, ele passou tambm a coordenar essas expanses. A Embratel, constituda em 16 de setembro de 1965, lanou-se, com o apoio do FNT, imensa tarefa de interligar todas as capitais e as principais cidades do Pas. Entre 1969 e 1973, a Embratel assumiu a explorao dos servios internacionais, medida que expiravam os prazos de concesso das empresas estrangeiras que os operavam.

    Ainda em 1962, devido precria situao dos servios telefnicos no Rio de

    Janeiro, o Governo Federal decretou a interveno na CTB e, em 1966, foi concretizada a compra das aes daquela empresa pela Embratel.

    Em 1963 o Contel aprovou critrios para nortear o estabelecimento das tarifas dos

    servios de telecomunicaes (que, entretanto, no foram seguidos ao longo do tempo). Em 1966, regulamentou a prtica, ento j de uso corrente, referente participao financeira dos pretendentes aquisio de linhas telefnicas, transformando-a em importante instrumento de apoio expanso dos servios de telefonia no Brasil - o autofinanciamento.

    A questo da fragmentao do poder de outorgar concesses, entretanto, somente

    seria superada em 13 de fevereiro de 1967, pelo Decreto-Lei no 162, que concentrou esse poder na Unio. Essa disposio seria pouco depois consolidada pela Constituio de 1967, mantendo-se at hoje. A Constituio de 1988, entretanto, foi alm, determinando que os servios pblicos de telecomunicaes somente poderiam ser explorados pela Unio, diretamente ou atravs de concesses a empresas sob controle acionrio estatal.

    Em 25 de fevereiro de 1967, atravs do Decreto-Lei no 200, foi criado o Ministrio

    das Comunicaes, ao qual, desde logo, foram vinculados o Contel, o Dentel e a Embratel. O Ministrio das Comunicaes assumiu ento as competncias do Contel.

    As medidas decorrentes do Cdigo levaram a uma melhoria significativa nos

    servios interurbanos e internacionais, mas o mesmo no ocorreu nos servios locais. Isso fez com que, em 1971, o Governo cogitasse da criao de uma entidade pblica destinada a planejar e coordenar as telecomunicaes de interesse nacional, a obter os recursos financeiros necessrios implantao de sistemas e servios de telecomunicaes e a controlar a aplicao de tais recursos mediante participao acionria nas empresas encarregadas da operao desses sistemas e servios. Nascia ento a idia de criao da Telebrs, que seria efetivada em 1972, atravs da Lei no 5.792, de 11 de julho.

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    Essa lei, alm de autorizar a criao da Telebrs -concretizada em 9 de novembro do mesmo ano - tambm colocou sua disposio os recursos do FNT, e autorizou a transformao da Embratel em sociedade de economia mista, subsidiria da Telebrs. Pela lei, a Telebrs ficou vinculada ao Ministrio das Comunicaes.

    Logo aps sua criao, a Telebrs iniciou o processo de aquisio e absoro das

    empresas que prestavam servios telefnicos no Brasil, visando consolid-las em empresas de mbito estadual. Havia nessa poca mais de novecentas operadoras independentes no Brasil e, no total, uma planta de cerca de dois milhes de terminais. Atravs do Decreto n.o 74.379, de 1974, a Telebrs foi designada "concessionria geral" para explorao dos servios pblicos de telecomunicaes em todo o territrio nacional.

    2. A Situao Atual Os servios pblicos de telecomunicaes no Brasil so hoje explorados pelo

    Sistema Telebrs - composto por uma empresa "holding", a Telebrs; por uma empresa "carrier" de longa distncia de mbito nacional e internacional, que explora tambm servios de comunicaes de dados e de telex (a Embratel); e por 27 empresas de mbito estadual ou local - e por quatro empresas independentes, sendo trs estatais (a CRT, controlada pelo Governo do Estado do Rio Grande do Sul; a Sercomtel, pela Prefeitura de Londrina; e a CETERP, pela Prefeitura de Ribeiro Preto) e uma privada (a Cia. de Telecomunicaes do Brasil Central, sediada em Uberlndia e que atua no Tringulo Mineiro, no nordeste de S. Paulo, no sul de Gois e no sudeste do Mato Grosso do Sul).

    O Sistema Telebrs detm cerca de 90% da planta de telecomunicaes existente no

    Pas e atua em uma rea em que vivem mais de 90% da populao brasileira. A Unio Federal detm o controle acionrio da Telebrs, com pouco mais de 50% de suas aes ordinrias; da totalidade do capital, entretanto, a Unio detm menos de 22%. A maior parte das aes de propriedade particular, com cerca de 25% em mos de estrangeiros e o restante pulverizado entre 5,8 milhes de acionistas.

    Ao longo de sua existncia, a Telebrs desenvolveu um trabalho notvel. Nos

    ltimos 20 anos, enquanto a populao brasileira aumentou em 50% e o PIB cresceu 90%, a planta instalada de terminais telefnicos do Sistema Telebrs cresceu mais de 500%, o que veio colocar o Pas entre os detentores das maiores redes telefnicas de todo o mundo. Essa rede, que integra o Pas de norte a sul e de leste a oeste, atende hoje a mais de 20 mil localidades em todo o territrio nacional.

    Nesse mesmo perodo, todavia, o trfego telefnico aumentou em proporo

    significativamente maior - mais de 1200% no servio local e mais de 1800% no servio interurbano, o que mostra que a demanda por servios cresceu bem mais do que a capacidade de seu atendimento.

    O trfego telefnico mede, entretanto, apenas a demanda por servios gerada pela

    parcela da populao e das empresas que j dispe de acesso ao sistema. Ele no mede a demanda por novas linhas, isto , no indica a quantidade de pessoas e organizaes que ainda no conseguiu atendimento telefnico individualizado. A demanda por acessos aos servios telefnicos bsicos no est hoje adequadamente quantificada, seja pela inexistncia de pesquisas, seja pelo fato de jamais ter sido atendida, o que no permite uma

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    referncia confivel para realizar projees. Estima-se entretanto que ela varie entre 18 e 25 milhes de potenciais usurios, dependendo do mtodo utilizado e considerando a substituio do autofinanciamento, como condio de acesso ao servio, por uma taxa de instalao, de valor muito menor. Desse total, pouco mais de 14,5 milhes de usurios so atendidos atualmente.

    Por outro lado, verifica-se que mais de 80% dos terminais residenciais concentram-

    se nas famlias das classes "A" e "B", o que mostra que as classes menos favorecidas no dispem de atendimento individualizado; essas pessoas no dispem tambm de adequado atendimento coletivo, uma vez que os telefones pblicos so insuficientes e mal distribudos geograficamente.

    No so disponveis estatsticas confiveis acerca do atendimento, mesmo com

    servios bsicos de telecomunicaes, aos estabelecimentos de negcios. As grandes corporaes construram, nos ltimos anos, com meios alugados ao Sistema Telebrs, redes privativas para atender s suas necessidades de servios; as pequenas e mdias empresas, entretanto, submetem-se aos mesmos percalos enfrentados pelos usurios residenciais para dispor de atendimento telefnico.

    Adicionalmente, verifica-se que quase a totalidade dos terminais existentes

    localiza-se nas reas urbanas, sendo extremamente reduzido o atendimento a usurios nas reas rurais: apenas pouco mais de 2% das propriedades rurais dispem de telefone.

    Essa situao resultado da incapacidade de manuteno, pelas empresas sob

    controle acionrio estatal, do nvel necessrio de investimentos ao longo do tempo, o que fez com que a taxa de crescimento da planta oscilasse aleatoriamente e fosse insuficiente para, pelo menos, igualar-se do crescimento da demanda, e mais insuficiente ainda para proporcionar o atendimento demanda reprimida.

    Uma razo expressiva para justificar essa incapacidade de investimento certamente

    a questo tarifria, que tem recebido, ao longo dos anos, tratamento inadequado. Desde antes da constituio do Sistema Telebrs, quando o poder de fix-las era fragmentado ao nvel municipal, as tarifas eram estabelecidas segundo critrios totalmente dissociados dos custos dos servios correspondentes - apesar das regras estabelecidas pelo Contel - , o que levou as concessionrias da poca a no realizar os investimentos necessrios expanso da rede e melhoria dos servios. Posteriormente, j com o Sistema Telebrs constitudo, as tarifas passaram a ser definidas pelo Governo Federal, como autoridade econmica, com o interesse centrado na conteno do processo inflacionrio, e no como poder concedente - condio em que deveria cuidar de sua compatibilidade com os custos.

    Mesmo o mecanismo dos subsdios cruzados, que pretendia que os servios mais

    rentveis e as regies mais desenvolvidas contribussem para o atendimento s periferias, interiorizao e aos servios de natureza social, acabou sendo desfigurado, uma vez que, por um lado, sua aplicao limitou-se ao servio telefnico (do de longa distncia para o local) e, por outro, as populaes das periferias e as mais carentes so exatamente aquelas desprovidas de atendimento telefnico.

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    Outra razo importante advinda das restries gesto empresarial impostas s empresas estatais de modo geral, notadamente a partir de 1988, que acabaram equiparando essas empresas administrao pblica. Em vez de disciplinar as empresas estatais pela exigncia de resultados no cumprimento de sua misso, as condicionantes constitucionais foram implementadas atravs de mecanismos de controle de meios, que, alm de ineficazes, limitam exageradamente a flexibilidade operacional indispensvel atuao empresarial, particularmente em ambiente competitivo. Essas restries vo desde a exigncia de processos licitatrios extremamente burocratizados e formalistas para as contrataes de bens e servios - que tm como conseqncia inevitvel o aumento de custos e de prazos - at a gesto de recursos humanos, com limitaes salariais e exigncia de concurso pblico para admisso e progresso interna, passando pela impossibilidade de constituio de subsidirias ou participao acionria em outras empresas sem prvia autorizao legislativa, alm da exigncia de submisso de seu oramento de investimentos aprovao do Congresso Nacional. Acresce-se a isso o aumento de custos operacionais decorrente da instituio de mirades de controles necessrios ao atendimento do excessivo formalismo dos diferentes rgos internos e externos de fiscalizao.

    As duas razes apontadas para justificar a incapacidade de investimento no so,

    entretanto, as nicas. Uma outra, de importncia igual ou maior, deve ser citada: a acomodao resultante do monoplio, da ausncia de competio. A necessidade de conquistar e manter clientes, em ambiente de competio, funciona como poderoso estimulante busca de solues inovadoras para o melhor atendimento demanda, para a reduo de custos e para a melhoria da qualidade. Esse estmulo, as empresas estatais da rea de telecomunicaes no tiveram.

    3. Do Programa de Governo Emenda Constitucional O quadro descrito no item anterior mostra, de maneira insofismvel, que

    fundamental e inadivel uma mudana profunda no setor de telecomunicaes. Mas no se trata apenas de mudar por mudar: preciso que a reforma proporcione as condies necessrias a que o novo cenrio seja melhor do que o atual.

    Em 1994, o programa de governo de Vossa Excelncia, "Mos Obra, Brasil",

    no captulo referente s telecomunicaes, afirmava: A tecnologia da informao tornou-se a pea fundamental do desenvolvimento

    da economia e da prpria sociedade. Isto significa que o atraso relativo do nosso pas dever ser necessariamente superado, como condio para retomar o processo de desenvolvimento. No se trata apenas de alcanar uma maior difuso de um servio j existente, por uma questo de eqidade e justia. Trata-se de investir pesadamente em comunicaes, para construir uma infra-estrutura forte, essencial para gerar as riquezas de que o pas necessita para investir nas reas sociais.

    O setor das telecomunicaes hoje, sem dvida, um dos mais atraentes e

    lucrativos para o investimento privado, em nvel internacional. Trata-se de um dos setores lderes da nova onda de expanso econmica, que se formou a partir da chamada terceira revoluo industrial. Pode-se contar que no faltaro investidores interessados em expandir essa atividade no mundo, em geral, e num pas com as dimenses e o potencial do Brasil, em particular. O problema, que no s do Brasil, encontrar uma frmula para a

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    organizao institucional do setor de telecomunicaes que, ao mesmo tempo em que promova fortemente os investimentos privados, reforce o papel regulador do Estado e reserve ao setor pblico a atuao em segmentos estratgicos do ponto de vista social ou do interesse nacional.

    Essa afirmativa evidenciava uma preocupao em inserir o Brasil de forma efetiva

    no grupo das naes que devem conduzir, no mundo, o processo de integrao da sociedade atravs dos meios de comunicao, como exigncia da nova "era da informao".

    Em outro ponto, o Mos Obra, Brasil assumia um compromisso: O Governo

    Fernando Henrique propor emenda constitucional visando flexibilizao do monoplio estatal nas telecomunicaes. Entretanto, isso no esgota o problema da definio do modelo institucional do setor. A grande atualidade do debate sobre a organizao desse setor na maioria dos pases desenvolvidos torna a deciso brasileira ainda mais complexa e importante. Amplos segmentos da sociedade brasileira devero ser ouvidos para que o governo defina completamente sua proposta, atravs de projeto de lei a ser encaminhado ao Congresso para uma deciso final.

    Esse compromisso foi cumprido logo no incio do Governo de Vossa Excelncia,

    atravs do encaminhamento ao Congresso Nacional, em 16 de fevereiro de 1995, da Mensagem n.o 191/95, com a Proposta de Emenda Constitucional n.o 03-A/95. Dessa proposta resultou a Emenda Constitucional no 8, de 15 de agosto de 1995, que alterou o inciso XI e a alnea "a" do inciso XII do art. 21 da Constituio Federal, dando-lhes a seguinte redao:

    Art. 21. Compete Unio: XI - explorar, diretamente ou mediante autorizao, concesso ou permisso, os

    servios de telecomunicaes, nos termos da lei, que dispor sobre a organizao dos servios, a criao de um rgo regulador e outros aspectos institucionais;

    XII - explorar, diretamente ou mediante autorizao, concesso ou permisso: a) os servios de radiodifuso sonora e de sons e imagens. Objetivava-se com essa emenda flexibilizar o modelo brasileiro de

    telecomunicaes, eliminando a exclusividade da concesso para explorao dos servios pblicos a empresas sob controle acionrio estatal e buscando introduzir o regime de competio na prestao desses servios, visando, em ltima anlise, o benefcio do usurio e o aumento da produtividade da economia brasileira.

    4. As Telecomunicaes no Futuro A partir da aprovao da Emenda Constitucional, a reforma estrutural das

    telecomunicaes no Brasil vem sendo discutida e implementada no contexto das profundas transformaes por que passa esse setor em todo o mundo, ditadas por trs foras, ou vetores, que se inter-relacionam e, em certa medida, se determinam reciprocamente:

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    a) a globalizao da economia; b) a evoluo tecnolgica; e c) a rapidez das mudanas no mercado e nas necessidades dos consumidores. Nesse contexto, a regulamentao vigente inadequada, pois foi concebida sob a

    gide de um mercado essencialmente monopolstico e pouco diversificado, em estgio tecnolgico j amplamente superado.

    De fato, a dinmica atual dos negcios exige, cada vez mais, acesso pleno

    crescente economia da informao. consenso que a indstria intensiva em informaes crescer significativamente e responder por parte importante do PIB, de maneira que a eficincia dos servios de telecomunicaes ser fator de competitividade tanto para essa indstria como, conseqentemente, para os prprios mercados em que elas se inserem.

    Com efeito, as empresas que desejam manter suas vantagens competitivas

    defrontam-se com exigncias cada vez maiores e mais diversificadas em termos de telecomunicaes e de processamento de informaes. A competitividade no mercado internacional depende cada vez mais da eficincia no acesso e no uso da informao, o que por sua vez funo da eficincia relativa dos sistemas de telecomunicaes disponveis no pas, comparados aos dos pases dos concorrentes e dos parceiros comerciais, bem como da eficincia com que as telecomunicaes ligam o pas aos seus mercados e competidores globais.

    A necessidade de adotar uma regulamentao que permita que as operadoras

    possam reagir rapidamente aos imperativos do mercado e da evoluo tecnolgica, oferecendo assim toda a gama de servios de telecomunicaes exigida pela sociedade, no significa que no se deva conferir peso adequado ao papel social das telecomunicaes. Num pas como o Brasil, com grau inadequado de atendimento demanda, deve continuar sendo um objetivo central da poltica governamental a oferta sociedade de servios bsicos de telecomunicaes em toda a extenso do seu territrio, de forma no discriminatria, com atributos uniformes de disponibilidade, acesso e conectividade, e a preos satisfatrios.

    De uma forma ampla, o que se pretende criar condies para que o progresso

    das tecnologias da informao e das comunicaes possa efetivamente contribuir para mudar, para melhor, a maneira de viver das pessoas.

    Para isso, necessrio que o arcabouo regulatrio de telecomunicaes evolua de

    modo a colocar o usurio em primeiro lugar; o usurio dever ter liberdade de escolha e receber servios de alta qualidade, a preos acessveis. Isso somente ser possvel em ambiente que estimule a competio dinmica, assegure a separao entre o organismo regulador e os operadores, e facilite a interconectividade e a interoperabilidade das redes. Tal ambiente permitir ao consumidor a melhor escolha, por estimular a criao e o fluxo de informaes colocadas sua disposio por uma grande variedade de fornecedores.

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    Ao mesmo tempo, as regras da competio devero ser interpretadas e aplicadas

    tendo em vista a convergncia das novas tecnologias e servios, a liberalizao do mercado, o estmulo aos novos fornecedores e a intensificao da concorrncia internacional. Devero tambm ser estimuladas as modalidades de cooperao entre prestadores de servios que visem aumentar a sua eficincia econmica e o bem estar do consumidor, adotando-se entretanto precaues contra o comportamento anticoncorrencial, particularmente o abuso de poder pelas empresas dominantes no mercado.

    Deve ser considerado tambm que o Acordo Geral sobre o Comrcio de Servios,

    firmado pelo Brasil com os demais pases integrantes da Organizao Mundial do Comrcio - OMC em Marrakesh, em 12 de abril de 1994, e aprovado pelo Congresso Nacional em 30 de dezembro do mesmo ano, atravs do Decreto no 1.355, fundamentou-se no reconhecimento da importncia crescente do comrcio de servios para o crescimento e desenvolvimento da economia mundial, e visava estabelecer um quadro de princpios e regras para o comrcio de servios com vistas expanso do mesmo sob condies de transparncia e liberalizao progressiva.

    No que diz respeito a telecomunicaes, o Acordo mencionado contm um Anexo

    prprio, decorrente do "reconhecimento das caractersticas especficas do setor de servios de telecomunicaes, em particular sua dupla funo como setor independente de atividade econmica e meio fundamental de transporte de outras atividades econmicas". Esse Anexo aplica-se a todas as medidas que afetem o acesso s redes e servios pblicos de telecomunicaes e sua utilizao, no se aplicando, porm, s medidas que afetem a distribuio por cabo ou a difuso de programas de rdio ou televiso.

    Durante 1995 e 1996 ocorreram diversas reunies, na sede da OMC, em Genebra,

    visando obteno de um acordo envolvendo as chamadas telecomunicaes bsicas, o que finalmente acabou sendo adiado para fevereiro de 1997. As disposies da nova lei brasileira de telecomunicaes, aplicveis a esse Acordo, podero ser includas na oferta do Brasil nessas negociaes, se houver tempo hbil para isso.

    De uma forma geral, observa-se hoje que: a) a disponibilidade de uma infra-estrutura adequada de telecomunicaes fator

    determinante para a insero de qualquer pas em posio destacada no contexto internacional;

    b) os pases mais desenvolvidos esto atuando em conjunto para desenvolver uma

    adequada infra-estrutura- seja em termos de meios, seja em termos de aplicaes - que possa alavancar o desenvolvimento da chamada "sociedade da informao", em benefcio de seus cidados e de suas empresas (a chamada information highway);

    c) os pases em desenvolvimento, como o Brasil, devem participar dessa

    verdadeira revoluo, que acontecer em escala mundial, para aproveitar as oportunidades que se abriro de saltar etapas de desenvolvimento tecnolgico e de estimular o desenvolvimento social e econmico.

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    Em linha com essas concluses e com a diretriz formulada no Mos Obra, Brasil para uma economia competitiva, no sentido de promover amplo programa de investimentos pblicos e privados, com a participao de agentes nacionais e estrangeiros, na melhoria e expanso da infra-estrutura de transportes, comunicaes e energia, o Governo de Vossa Excelncia estabeleceu metas explcitas de expanso do sistema de telecomunicaes, traduzidas na ampliao da oferta de acessos aos diferentes servios. Essas metas constam do Paste - Programa de Recuperao e Ampliao do Sistema de Telecomunicaes e do Sistema Postal, divulgado pelo Ministrio das Comunicaes no final de setembro de 1995. O Paste detalha os projetos de investimento no setor no perodo 1995-1999 e estima sua extenso at 2003, financiados com recursos provenientes essencialmente da iniciativa privada, totalizando no perodo R$ 75 bilhes.

    Considerando especificamente o segmento de telefonia, o PASTE prope que no

    horizonte 1999-2003 sejam atingidos os objetivos de atendimento mostrados na Tabela 1:

    Tabela 1

    Metas do PASTE em milhes (*)

    1 9 9 9 \ 2 0 0 3

    Segmentos de Mercado

    Telefonia

    Fixa

    Telefonia

    Mvel

    Telefonia Fixa

    Telefonia Mvel

    Total

    24,7

    9,6

    40,0

    17,2

    Famlias Urbanas

    15,7 (41%)

    6,2 (17%)

    22,2 (55%)

    10,2 (25%)

    Famlias Rurais

    1,8 (20%)

    0,7 (8%)

    3,2 (40%)

    1,2 (15%)

    Empresas e

    Outras Entidades

    7,6 (37%)

    2,7 (13%)

    14,6 (50%)

    5,8 (20%)

    (*) os nmeros entre parnteses indicam o percentual de atendimento em cada caso Atingindo esses objetivos, o Brasil ter 15 telefones para cada 100 habitantes em

    1999 e 24 telefones para cada 100 habitantes em 2003. Quanto telefonia mvel, sero 6 terminais para cada 100 habitantes em 1999 e 10 telefones para cada 100 habitantes em 2003.

    Comparados com os 13,2 milhes de terminais telefnicos instalados existentes ao

    final de 1994, esses objetivos significam um crescimento mdio anual de 13,4% no perodo 1994-1999 e de 12,8% no perodo 2000-2003. Quanto telefonia celular, os objetivos propostos representam incrementos mdios anuais de 64,4% entre 1994 e 1999, e de 15,7% entre 2000 e 2003, em relao aos 800 mil terminais existentes em 1994.

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    No momento, o PASTE est sendo revisto, uma vez que, desde sua preparao,

    com base no cenrio do primeiro semestre de 1995, at o momento, ocorreram transformaes significativas no plano institucional e no mercado. Essa reviso dever ser tornada pblica em janeiro prximo, atualizando as diversas metas propostas originalmente para os diversos servios, com expressivos aumentos para algumas delas, como reflexo dessas transformaes.

    II. Os Fundamentos da Proposta 1. Da Emenda Constitucional Implementao da Reforma Em setembro de 1995, portanto um ms aps a aprovao da Emenda

    Constitucional n.o 8, dando seqncia ao programa de governo de Vossa Excelncia, o Ministrio das Comunicaes divulgou dois textos sobre a Reforma Estrutural do Setor de Telecomunicaes, que ficaram conhecidos como REST-1/95 - Plano de Trabalho e REST-2/95 - Premissas e Consideraes Gerais. Esses dois documentos continham as linhas bsicas norteadoras do trabalho que vem sendo desenvolvido desde ento na formulao de um novo modelo institucional para as telecomunicaes brasileiras.

    Conforme estabelecido naquelas publicaes, as premissas que balizam a reforma

    estrutural do setor de telecomunicaes brasileiro so as seguintes: a) a reforma tem por objetivo adequar a estrutura do setor de telecomunicaes ao

    novo cenrio que se pretende para o Brasil, significando, simultaneamente, a viso do setor de telecomunicaes como:

    ?? indutor da democratizao da estrutura de poder no Pas;

    ?? vetor do aumento de competitividade da economia brasileira;

    ?? vetor do desenvolvimento social do Pas, proporcionando condies para a reduo das desigualdades entre regies geogrficas e entre classes de renda pessoal e familiar.

    b) o novo modelo dever: I) ter como referncia os direitos dos usurios dos servios de telecomunicaes e,

    para tanto, dever assegurar: ?? a busca do acesso universal aos servios bsicos de telecomunicaes;

    ?? o aumento das possibilidades de oferta de servios, em termos de quantidade,

    diversidade, qualidade e cobertura territorial; ?? a possibilidade de competio justa entre os prestadores de servios; ?? preos razoveis para os servios de telecomunicaes;

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    II) incentivar o aumento da participao de capitais privados, nacionais e estrangeiros, nas atividades relacionadas ao setor de telecomunicaes;

    III) ser concebido com a pretenso de que tenha a mais longa vida possvel, de

    maneira a no se tornar prematuramente obsoleto pela evoluo tecnolgica. Isto , a tecnologia dever ser utilizada tanto para proporcionar mais opes para a prestao de novos servios quanto para a reduo de custos dos servios tradicionais, garantidas a qualidade desses servios e a possibilidade de interconexo dos diversos sistemas abertos em suas diversas etapas de evoluo;

    IV) estimular a participao ativa do setor de telecomunicaes brasileiro no contexto internacional;

    V) assegurar o uso eficiente do espectro radioeltrico, bem como de qualquer

    outro meio natural limitado que seja utilizado na prestao de servios de telecomunicaes.

    c) a transio para o novo modelo dever ocorrer de forma a preservar o interesse

    pblico. Tambm em 1995, o Governo de Vossa Excelncia optou por submeter a proposta

    de reforma estrutural do setor de telecomunicaes ao Congresso Nacional em duas etapas. A primeira delas foi iniciada com o envio ao Congresso, em 28 de novembro de 1995, do Projeto de Lei que veio a se transformar na Lei no 9.295, de 19 de julho de 1996. Essa Lei viabilizou a adoo das providncias em andamento objetivando a abertura competio de alguns segmentos de mercado com alta atratividade para os investimentos privados, em virtude da forte demanda no atendida (caso da telefonia mvel celular) e, tambm, de sua importncia como infra-estrutura empresarial (caso dos servios via satlite e dos servios limitados, que possibilitam a constituio de redes corporativas).

    A segunda etapa da reforma a que est sendo proposta no momento. Ela visa

    alterar profundamente o atual modelo brasileiro de telecomunicaes, de forma que a explorao dos servios passe da condio de monoplio de competio e que o Estado passe da funo de provedor para a de regulador dos servios e indutor das foras de mercado, fazendo, ao mesmo tempo, com que o foco da regulamentao seja deslocado da estrutura de oferta de servios, como era tradicional, para os consumidores desses servios. Adicionalmente, pretende-se criar um ambiente de estabilidade regulatria que estimule investimentos no setor.

    Com a realizao dessas duas etapas estar sendo reformulada parte das

    disposies contidas na Lei no 4.117/62. Como j apontado anteriormente, esse diploma legal, que instituiu o Cdigo Brasileiro de Telecomunicaes, dispe sobre os servios de telecomunicaes de maneira geral, e tambm sobre radiodifuso; entretanto, apenas os servios de telecomunicaes esto sendo tratados por este Projeto de Lei. Para a reforma completa do Cdigo est previsto que, ao longo de 1997, seja desenvolvido novo projeto, a ser tambm submetido ao Congresso Nacional, que se pretende venha a se tornar a nova Lei de Radiodifuso.

    Aps a aprovao do Projeto de Lei ora proposto, ter incio a fase que poderia ser

    chamada de terceira etapa da reforma, que consistir na criao efetiva do rgo regulador,

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    na privatizao das atuais operadoras estatais e na implementao do regime de competio na explorao dos servios, conforme detalhado a seguir.

    2. Os Objetivos da Reforma Com base nas premissas indicadas no item anterior e na poltica de governo de

    Vossa Excelncia, foram formulados objetivos especficos para a reforma das telecomunicaes no Brasil. De forma sucinta, esses objetivos poderiam ser vistos como a consolidao de dois princpios essenciais: a introduo da competio na explorao dos servios e a universalizao do acesso aos servios bsicos. Esses objetivos so os seguintes:

    I) fortalecer o papel regulador do Estado e eliminar seu papel de empresrio. Esse

    objetivo contempla a orientao de que o Estado promover um grau adequado de superviso sobre o setor, de modo a assegurar que sejam alcanados os objetivos essenciais da reforma, a criao de um mercado de competio efetiva e a proteo dos consumidores contra comportamentos anticoncorrenciais. Adicionalmente, sintetiza a deciso de privatizar as empresas atualmente sob controle acionrio da Unio, bem como de outorgar novas licenas para que operadores privados prestem servios de telecomunicaes no Brasil;

    II) aumentar e melhorar a oferta de servios. Trs temas bsicos decorrem desse

    objetivo: a promoo da diversidade dos servios oferecidos sociedade; o aumento significativo da oferta de servios de telecomunicaes no Brasil; e o alcance de padres de qualidade compatveis com as exigncias do mercado;

    III) em um ambiente competitivo, criar oportunidades atraentes de investimento e

    de desenvolvimento tecnolgico e industrial. Nesse objetivo consolidam-se trs intenes bsicas. A primeira delas associa-se necessidade de atrao de capitais privados atravs da criao de oportunidades para investimento no setor. A segunda diz respeito construo de um ambiente que propicie o desenvolvimento da competio justa no mercado e facilite a consolidao de novos participantes. Finalmente, a terceira refere-se gerao de condies que estimulem a pesquisa e o desenvolvimento tecnolgico e industrial;

    IV) criar condies para que o desenvolvimento do setor seja harmnico com as

    metas de desenvolvimento social do Pas. Quatro so as proposies bsicas consolidadas nesse objetivo: propiciar condies para reduzir o diferencial de cobertura dos servios de telecomunicaes entre as diversas regies do Pas e entre as diversas faixas de renda; criar condies para a prtica de tarifas razoveis e justas para os servios de telecomunicaes; promover servios de telecomunicaes que incentivem o desenvolvimento econmico e social do Pas; e alcanar metas especficas de servio universal;

    V) maximizar o valor de venda das empresas estatais de telecomunicaes sem

    prejudicar os objetivos anteriores. Esse objetivo expressa a inteno de que o processo de privatizao das atuais operadoras estatais seja planejado de forma que os objetivos essenciais ligados introduo da competio e promoo do acesso universal aos servios bsicos sejam alcanados, sem, contudo, provocar impactos negativos importantes no valor dos ativos a serem vendidos.

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    Esses objetivos serviram de sustentao ao desenvolvimento de um modelo

    econmico para o setor, feito em conjunto pela equipe do Ministrio das Comunicaes e por consultores internacionais supridos pela UIT - Unio Internacional de Telecomunicaes, como exposto no incio desta Exposio de Motivos. Esse modelo foi utilizado para suportar a proposta de arcabouo regulatrio e de estrutura de mercado para o setor, a ser descrita a seguir.

    3. Aspectos Fundamentais do Arcabouo Regulatrio Com base nas premissas estabelecidas, nos objetivos citados e nas metas de

    crescimento definidas, procurou-se explicitar alguns aspectos especficos do arcabouo regulatrio que devem ser implementados independentemente da estrutura de mercado que se pretenda ou da estratgia de transio para atingi-la. Esses aspectos so os que asseguram condies justas e estveis de competio s empresas que atuam no mercado, permitindo o seu desenvolvimento e, em conseqncia, a consolidao de um mercado efetivamente competitivo, com proveito para os consumidores.

    Na definio desses aspectos tomaram-se como base as lies apreendidas da

    experincia de outros pases, o conhecimento dos requisitos tecnolgicos associados implantao da competio no setor de telecomunicaes e a situao especfica desse setor no Brasil atual. Dessa forma, foram explicitadas as trs questes fundamentais que devem ser objeto do arcabouo regulatrio em foco:

    a) a existncia de um organismo regulador independente; b) as regras bsicas para que a competio seja justa; e c) o mecanismo de financiamento das obrigaes de servio universal. A passagem da atual condio de mercado monopolista para o novo cenrio

    pretendido para as telecomunicaes brasileiras pressupe, para ser viabilizada, a existncia de um rgo regulador, como determina o novo texto da Constituio Federal. Essa entidade ter como misses principais promover a competio justa, defender os interesses e os direitos dos consumidores dos servios e estimular o investimento privado.

    Embora a competio se constitua no melhor regulador para os mercados, fato

    que, em praticamente todos os pases que j promoveram alguma reestruturao de suas telecomunicaes, algum tipo de organismo regulador foi implementado. Em alguns pases a regulao exercida diretamente pelo governo, atravs de um organismo do poder executivo; em outros, o regulador uma agncia semi-autnoma; em outros, ainda, o rgo regulador independente. Isso decorre da percepo de que, se deixado s prprias foras

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    do mercado estabelecer essa regulao, muito provavelmente ocorreria o seu domnio pelo antigo operador monopolista, de vez que, pelo fato de deter praticamente toda a infra-estrutura e todos os clientes, esse operador teria condies de impedir, ou pelo menos dificultar, a entrada de novos concorrentes no mercado.

    A questo essencial passa a ser, ento, definir as atribuies e poderes desse rgo

    regulador, com o objetivo de torn-los claros para o mercado e para a sociedade em geral. Dado o extremo dinamismo do setor de telecomunicaes, fundamental que o rgo regulador disponha de poderes para estabelecer regulamentos de forma a maximizar os benefcios, para a sociedade, das modificaes propiciadas especialmente pela modernizao da tecnologia. Isso significa que o rgo regulador deve ter atribuies e poderes bastante amplos, para possibilitar que a lei no tenha de ser exageradamente detalhista -- e conseqentemente restritiva.

    Adicionalmente, o rgo regulador pea-chave para inspirar ou no a confiana

    dos investidores na estabilidade das regras estabelecidas para o mercado. Uma entidade dotada de competncia tcnica e de independncia decisria inspira confiana; ao contrrio, uma organizao sem autonomia gerencial, com algum tipo de dependncia restritiva ou sem capacidade tcnica, gera desconfiana e, conseqentemente, afasta os investidores.

    Alm de competncia para definir a regulamentao do setor, cobrindo todos os

    aspectos, desde as licenas at os padres de interconexo, o rgo regulador dever ter autoridade para fazer cumprir a lei e os regulamentos. Essa autoridade, em associao com as dos organismos de defesa da concorrncia, ser essencial para assegurar a proteo dos consumidores contra comportamentos anticompetitivos.

    O rgo regulador difere de outros organismos governamentais porque, em vez de

    simplesmente prestar um servio ao pblico, tem de tomar decises que pressupem o exerccio de poder discricionrio. Para que ele seja eficiente e eficaz, portanto, necessrio que disponha de competncia tcnica; alm disso, fundamental que:

    a) desfrute de liberdade gerencial para atingir os objetivos determinados. Essa

    faculdade visa incentivar a eficincia administrativa e a competncia tcnica: um insumo essencial para o bom desempenho do rgo regulador em ambiente de tecnologia de ponta e de competio;

    b) desfrute de autonomia, isto , no seja passvel de influncias de outros rgos

    do governo ou de grupos de interesse. A autonomia, associada competncia tcnica que pode resultar da liberdade gerencial, tende a levar a decises consistentes e justas, o que significa desempenho satisfatrio. A autonomia fortalecida atravs da disponibilidade de fontes prprias de recursos financeiros, como taxas arrecadadas dos operadores ou dos usurios;

    c) seja obrigado a prestar contas. O rgo regulador deve estar totalmente

    comprometido com objetivos pr-determinados e prestar contas de suas aes, tanto qualitativamente como sob o ponto de vista financeiro. Assim, ele ser, na prtica, um rgo auxiliar do Governo, desde que haja o estabelecimento a priori de objetivos, seguido de controles a posteriori para comprovao do cumprimento dos objetivos a ele atribudos;

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    d) disponha de regras e controles internos para limitar o poder das pessoas

    individualmente, de maneira a dificultar o comportamento oportunista e inibir aes indesejveis por parte de operadoras e grupos de interesse. Exemplos dessas regras e controles so: deciso colegiada; processo de deciso varivel em funo do impacto da deciso (maior o impacto, maior o envolvimento colegiado na deciso); utilizao de grupos consultivos; adoo do mecanismo de submeter a consulta pblica os assuntos de maior relevncia, antes da tomada de deciso; e perodo de carncia entre a tomada de uma deciso e sua entrada em vigor, dando oportunidade s vrias partes afetadas de se manifestar.

    Com relao s regras bsicas para assegurar que a competio seja justa, elas

    podem ser resumidas nas seguintes: ?? interconexo obrigatria das redes que prestam servios destinados ao pblico

    em geral; ?? acesso no discriminatrio dos clientes aos prestadores de servios que

    competem entre si;

    ?? plano de numerao no discriminatrio;

    ?? possibilidade de acesso dos concorrentes s redes abertas em condies adequadas;

    ?? eliminao dos subsdios cruzados entre servios;

    ?? regulao tarifria dos operadores dominantes;

    ?? direitos de passagem no discriminatrios;

    ?? resoluo dos conflitos entre operadores pelo rgo regulador. Com relao ao servio universal, importante fixar, inicialmente, o seu conceito.

    Como enfatizado anteriormente, o desenvolvimento do novo modelo institucional para as telecomunicaes brasileiras suportado num conjunto de objetivos que podem ser sintetizados em duas idias principais: a competio na explorao dos servios e a universalizao do acesso aos servios bsicos.

    A idia da universalizao do acesso contempla duas situaes genricas: ?? servios de telecomunicaes individuais, com nveis de qualidade aceitveis,

    devem ser fornecidos, a tarifas comercialmente razoveis, dentro de um prazo razovel, a qualquer pessoa ou organizao que os requisitar;

    ?? outras formas de acesso a servios de telecomunicaes devem ser fornecidas, em localizaes geogrficas convenientes, a tarifas acessveis, quelas pessoas que no tiverem condies econmicas de pagar tarifas comercialmente razoveis por servios individuais.

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    Na primeira dessas situaes, as tarifas cobrem os custos operacionais e proporcionam retorno comercialmente atrativo ao capital investido, de modo que os provedores de servio buscaro, normalmente, satisfazer a esses clientes como parte de sua estratgia de negcios. Ou seja, a competio na explorao dos servios far com que os consumidores economicamente atrativos sejam atendidos satisfatoriamente, tendo acesso a servios que supram de forma adequada suas necessidades de telecomunicaes.

    J a segunda situao diz respeito queles casos em que o custo de prover o acesso

    fsico seja elevado (por exemplo, em localidades remotas no interior do Pas, nas reas rurais, nas periferias das grandes cidades, em regies escassamente povoadas) ou em que os clientes potenciais disponham de renda inferior que seria necessria para criar uma oportunidade de investimento atrativa para algum provedor de servio. Nesse caso, o acesso a servios de telecomunicaes poder requerer algum tipo de subsdio, que dever ser idealizado e distribudo de modo a no criar vantagens nem desvantagens para nenhum dos operadores e, ao mesmo tempo, possibilitar o atendimento a esse objetivo social ao menor custo.

    Atender a essa segunda situao o que comumente se chama de obrigao de

    servio universal, e financiar essa obrigao o terceiro ponto fundamental da regulao tratada neste item.

    Por se tratar de uma questo de natureza eminentemente social, deve-se admitir, de

    antemo, que essa obrigao possa variar com o tempo, medida que certos objetivos sejam atingidos e que a evoluo da economia, do desenvolvimento regional, das questes demogrficas, da distribuio de renda e outras, vo alterando as condies iniciais. Por isso, as metas especficas de servio universal devem poder ser modificadas periodicamente, de forma a ser adaptadas s condies de cada momento.

    No se deve, entretanto, esperar metas extremamente ousadas num momento

    inicial, como instalar telefones em todas os domiclios brasileiros, pois isso no seria realista. Pelo contrrio, as metas devem ser estabelecidas considerando o seu custo potencial e o impacto que tero para os seus beneficirios.

    Para se ter uma idia do que poderiam ser essas obrigaes no Brasil, num primeiro

    momento, pode-se considerar, a ttulo de exemplo, como meta a ser alcanada at o ano de 2001,a melhoria do acesso da populao ao servio telefnico, basicamente por meio de telefones de uso pblico. Isso seria obtido atravs de:

    ?? aumento da densidade de telefones pblicos, dos atuais 2,6 por 1.000 habitantes

    para 6 por 1.000 habitantes, o que significaria colocar em servio cerca de 550.000 novos aparelhos (ou seja, mais do que duplicar a base hoje instalada, dentro de um perodo de 5 anos);

    ?? atendimento a todas as localidades com mais de 100 habitantes com pelo menos um telefone pblico capaz de fazer e receber chamadas (o que significaria dobrar o nmero de localidades hoje atendidas, da ordem de 20.000);

    ?? melhoria da distribuio geogrfica dos telefones pblicos nas regies urbanas, tanto nas centrais como principalmente nas periferias densamente povoadas e nas reas

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    habitadas por pessoas de baixa renda, de maneira a tornar possvel a qualquer um o acesso a um "orelho" sem necessidade de andar mais do que 300 metros.

    Em outro momento, metas adicionais poderiam ser estabelecidas, como por

    exemplo a disponibilizao, a todas as escolas e bibliotecas pblicas, de acessos Internet, e o acesso, a redes de faixa larga, de hospitais pblicos e centros de sade, de maneira a tornar disponvel, nessas instituies, as facilidades proporcionadas pela moderna tecnologia de comunicaes.

    intuitivo que o atendimento a metas desse tipo provavelmente resultar em altos

    custos para o prestador do servio; entretanto, essa prestao tambm gerar receitas, que sero, em princpio, inferiores aos custos. Financiar as obrigaes de servio universal , portanto, financiar esse potencial dficit. Em outras palavras, cobrir a parcela dos custos marginais de longo prazo que no possam ser recuperadas atravs de uma operao eficiente do servio.

    Como j salientado anteriormente, essencial que o mecanismo de financiamento

    no crie vantagens nem desvantagens para nenhum dos operadores, mas que distribua o nus de forma eqitativa sobre todos eles. Das cinco alternativas de financiamento possveis, apontadas a seguir, apenas a primeira e a ltima atendem, entretanto, essa premissa:

    a) subsdios governamentais diretos. Nessa hiptese, haveria recursos do oramento

    fiscal destinados a financiar o servio universal na rea de telecomunicaes. Embora do ponto de vista puramente econmico esta seja uma opo perfeitamente defensvel, pelos benefcios que o acesso aos servios de telecomunicaes poder trazer para a populao, so evidentes as dificuldades de natureza poltica para justificar a destinao de recursos a esse setor em detrimento de outros de prioridade certamente maior do ponto de vista social;

    b) subsdios implcitos no preo de venda das empresas. Nesse caso, as obrigaes

    de atendimento seriam impostas s atuais empresas estatais e, no momento de sua privatizao, o comprador descontaria, do preo a ser por ele pago, o correspondente ao dficit em que incorreria futuramente com o cumprimento da obrigao. Alm de difcil operacionalizao, essa alternativa certamente implicaria em problemas com os acionistas minoritrios;

    c) subsdios cruzados internos empresa. Nessa opo, a empresa com a

    obrigao de prestar o servio universal financiaria o dficit correspondente atravs da maior rentabilidade obtida dos clientes mais atrativos economicamente. Trata-se de uma alternativa insustentvel num ambiente competitivo;

    d) subsdios cruzados externos (entre empresas). Nessa alternativa, as empresas

    no incumbidas de prestar o servio universal participariam de seu financiamento pagando quelas empresas que tivessem essa obrigao taxas de interconexo maiores do que os custos efetivos da interconexo. Esse mecanismo pode eventualmente funcionar, em condies bastante especficas e por prazos pr-definidos. Entretanto, sua adoo estimula

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    o bypass da rede da operadora com obrigao de prestar o servio, e poder levar a distores imprevisveis no mercado;

    e) criao de um fundo especfico. Nesse caso, todas as operadoras participariam

    do financiamento das obrigaes de servio universal, atravs de uma contribuio proporcional a suas respectivas receitas. O rgo regulador seria o responsvel por administrar esse fundo, definir o valor das contribuies e escolher, de forma adequada, a empresa a ser incumbida da prestao do servio universal em cada situao especfica. Por ser politicamente mais simples, essa opo a que parece ser a mais recomendvel.

    4. Aspectos Econmicos Fundamentais A atrao de capitais privados para novos investimentos pressupe a existncia de

    demanda suficiente pelos servios e preos que cubram os custos e proporcionem retorno adequado.

    A demanda por servios de telecomunicaes no Brasil grande e crescente.

    Considerando apenas a telefonia convencional, a demanda total estimada atualmente varia entre 18 e 25 milhes de acessos; como existem em servio pouco mais de 14 milhes de linhas, a demanda no atendida situa-se entre 4 e 11 milhes de terminais. A demanda total projetada para 2003 varia entre 26 e 35 milhes de linhas.

    A receita mdia gerada atualmente pelos terminais em servio tem cerca de 43% provenientes dos servios locais e 57% dos servios de longa distncia, enquanto os custos distribuem-se 81% para os servios locais e 19% para os de longa distncia. Esse desequilbrio conseqncia da poltica de subsdios cruzados adotada no Brasil (e tambm em outros pases) em situao de monoplio, sob o argumento principal de que, transferindo-se receita dos servios interurbano e internacional, em princpio utilizados pelas empresas e pelas camadas da populao de maior renda, estar-se-ia subsidiando as camadas menos favorecidas do povo, usurias essencialmente apenas dos servios locais.

    Como j mostrado anteriormente, esse argumento falacioso, de vez que, no

    Brasil, as camadas mais pobres da populao no dispem de atendimento telefnico individualizado, de modo que o subsdio acabou beneficiando mesmo as classes sociais mais favorecidas. Ao contrrio, ao onerar as empresas com custos mais elevados para os servios que elas mais usam - interurbano e internacional - esse subsdio s avessas acabou significando uma penalizao s classes mais pobres, pois certamente o diferencial de custos foi repassado aos preos dos produtos que elas consomem. Adicionalmente, num regime de competio na explorao dos servios, a manuteno de subsdios cruzados insustentvel.

    Rebalancear as tarifas dos servios de telecomunicaes, aumentando as dos

    servios locais (assinatura e trfego) e reduzindo as dos servios interurbano e internacional, portanto medida preliminar a ser tomada, antes do estabelecimento do regime de competio, para permitir que esta possa ocorrer em condies justas. Por outro lado, o rebalanceamento tambm condio essencial para permitir que as receitas de cada servio cubram os respectivos custos e proporcionem a mencionada margem adequada de retorno capaz de atrair os investimentos privados.

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    Considerando a implementao de um rebalanceamento tarifrio neutro em termos de receita - isto , que, mantido o uso mdio atual dos servios, no implique nem em aumento nem em diminuio da receita total dos operadores - a receita mdia projetada para cada terminal, derivada dos servios locais (assinatura, trfego e interconexo com os servios interurbano, internacional e celular), deveria cobrir os custos operacionais e de capital das atuais operadoras do Sistema Telebras, considerando, no clculo do custo de capital, a remunerao normalmente desejada por investidores privados, de 15% ao ano, aps o Imposto de Renda. Como os procedimentos atualmente em vigor para estabelecimento das tarifas consideram a referncia de 12% ao ano, antes do Imposto de Renda, para remunerao do capital, pode-se inferir que essas empresas, provavelmente, buscaro aumentar sua produtividade de forma que a explorao desses servios lhes seja economicamente atraente.

    Por outro lado, razovel supor-se que a receita mdia proporcionada pelos novos

    assinantes do servio seja inferior receita mdia gerada pelos atuais assinantes, uma vez que, em princpio, a maioria dos novos assinantes ser proveniente de classes de renda mais baixa do que o segmento atualmente atendido. Dependendo da extenso em que isso ocorrer, poder portanto no haver atratividade econmica para o atendimento a esses novos potenciais assinantes, em termos individualizados, utilizando-se a tecnologia convencional.

    Como h, em princpio, possibilidade de custos menores com a utilizao de

    tecnologias alternativas - acesso sem fio, por exemplo, ou utilizando as redes de distribuio de TV a cabo - existe espao para o desenvolvimento de novos operadores para os servios locais, ou para o atendimento a esses novos assinantes pelos atuais operadores, desde que possam se utilizar dessas novas tecnologias.

    Alm do aspecto do rebalanceamento tarifrio entre os servios locais e os de longa

    distncia, uma outra questo econmica de fundamental importncia a ser adequadamente resolvida a do estabelecimento das tarifas de interconexo entre as redes de suporte dos diversos servios (basicamente dos servios locais com os de longa distncia e com o mvel celular). Essa certamente ser uma das primeiras e principais preocupaes do rgo regulador .

    5. Viso Setorial de Mdio Prazo: o Cenrio-objetivo A visualizao de como ser a estrutura do mercado a mdio prazo importante

    para permitir uma avaliao das possibilidades de que os objetivos da reforma sejam efetivamente atendidos. Para balizar a construo dessa viso, pode-se partir de quatro questes essenciais:

    I) H interesse em se ter s operadoras de abrangncia nacional, isto , tendo como

    rea de atuao o Pas inteiro, ou melhor ter-se operadoras de abrangncia regional? II) Quantos competidores devem ser admitidos no mercado? Deve ou no haver

    algum tipo de limitao?

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    III) Deve ou no haver distino entre empresas que exploram servios locais e

    empresas que exploram servios de longa distncia? Onde terminam uns e comeam outros? Deve ou no haver algum tipo de competio entre essas empresas?

    IV) Os novos operadores devem ou no ser submetidos s mesmas condies que

    os operadores antigos, em termos de obrigaes de atendimento, limitaes geogrficas e de servios?

    A criao de empresas de abrangncia nacional significaria a existncia, desde o

    incio, de empresas provavelmente fortes, capazes de competir internacionalmente num tempo mais curto do que partindo-se de empresas menores. Adicionalmente, com rea de atuao nacional, essas empresas poderiam promover subsdios cruzados internos, fazendo com que as regies mais dinmicas compensassem as menores vantagens obtidas nas reas menos desenvolvidas.

    Entretanto, j foi visto que subsdios cruzados so incompatveis com ambientes

    competitivos. Alm disso, a criao de duas empresas nacionais a partir das teles estaduais e da Embratel resultaria em empresas complementares entre si em termos de infra-estrutura, com forte incentivo coluso e, portanto, dificultando a introduo efetiva da competio. Para contornar isso, haveria necessidade de atuao extremamente forte do rgo regulador j desde a sua constituio, o que aumenta ainda mais as dificuldades. Isso significa um grau de incerteza extremamente elevado, com resultados imprevisveis em termos de evoluo potencial do mercado.

    Alternativamente, a criao de um pequeno nmero de empresas de abrangncia

    regional - isto , de trs a cinco - aumentaria as perspectivas de resultados mais adequados aos objetivos propostos para a reforma. Primeiro, porque essas empresas teriam porte razovel, comparvel ao de suas maiores congneres latinoamericanas, com possibilidade de gerao prpria de recursos para financiar parte expressiva dos investimentos necessrios. Em segundo lugar, a regionalizao permitiria a focalizao dos investimentos dentro de cada regio, aumentando assim as frentes de inverses e cobrindo portanto o Pas todo. Em terceiro lugar, a existncia de vrias companhias facilitaria o trabalho do rgo regulador, porque o fato de haver mais empresas significa menor poder monopolista e maior possibilidade de competio comparativa entre os operadores. Finalmente, a regionalizao permitiria a criao de mecanismos de incentivo aos investimentos necessrios implantao de infra-estrutura e ao atendimento s obrigaes de servio universal, que consistiriam simplesmente na remoo das restries (de natureza geogrfica e de limites quanto aos servios prestados) aps o operador ter atingido as metas previamente definidas.

    Assim sendo, fica claro que cenrios que contemplem a regionalizao das atuais

    teles estaduais so preferveis aos que contemplem apenas operadoras de abrangncia nacional.

    Cabe ento analisar o tema da segunda pergunta, qual seja, a convenincia ou no

    de se limitar a quantidade de operadores admitidos no mercado. Em outras palavras, a questo se deveria buscar uma estrutura duopolstica, ou se seria melhor deixar aberta a possibilidade de atuao no mercado a quantas empresas tiverem interesse.

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    Uma estrutura de duoplio aparenta algumas vantagens. Em primeiro lugar, ela

    permitiria um adequado planejamento do processo de outorga das novas concesses, em que o critrio bsico de seleo do vencedor seria baseado no nvel de investimentos e no grau de cobertura propostos pelos concorrentes. Atravs da imposio de obrigaes similares s teles regionais privatizadas, o rgo regulador teria, para cada regio, dois planos bastante claros de atendimento ao mercado, podendo ento monitorar adequadamente o desenvolvimento do setor em cada regio do Pas. Em segundo lugar, com a competio limitada provavelmente no haveria guerras de preos, de modo que o retorno dos investimentos seria mais seguro, o que acabaria estimulando os investimentos. E, finalmente, com poucos concorrentes para controlar, a tarefa do rgo regulador seria facilitada, dando-lhe portanto condies de se estruturar adequadamente e adquirir a necessria capacitao.

    H riscos, porm. O investimento em infra-estruturas paralelas e a competio em

    preos reduz o valor do negcio de cada um dos duopolistas e, por essa razo, o comportamento mais provvel de ambos ser no sentido de uma composio que evite, ou reduza ao mnimo, esses inconvenientes. O resultado mais provvel sero monoplios em regies bem definidas, com alguma competio nas fronteiras entre essas regies e pela conquista dos usurios mais rentveis. Se, para enfrentar essa situao, o rgo regulador impuser aos novos operadores as mesmas obrigaes que aos antigos, de forma que tambm eles tenham que prestar servio aos consumidores independemente do lugar onde estes estejam, o resultado no mudaria, uma vez que essa restrio poderia ser contornada atravs de acordos entre os operadores para revenda de capacidade. Essas dificuldades mostram que, contrariamente impresso original, o trabalho do rgo regulador seria muito maior, para assegurar o desenvolvimento da competio efetiva no mercado.

    A no limitao da quantidade de novos operadores, associada imposio de

    obrigaes aos operadores antigos, em termos de investimentos na construo de infra-estrutura, pelo tempo necessrio consolidao de um mercado efetivamente competitivo, pode eliminar muitos dos problemas apontados para o caso do duoplio. Antes de mais nada, necessrio frisar que a imposio de obrigaes aos operadores antigos, e a no imposio de obrigaes equivalentes aos novos, no caracteriza uma situao de injustia ou de desequilbrio, uma vez que, na realidade, os operadores antigos tero um perodo de monoplio de fato, enquanto os novos constroem suas redes e se preparam para competir.

    A no existncia de uma estrutura duopolstica rgida dificulta acordos entre os

    operadores para a diviso geogrfica do mercado, porque sempre poder haver uma nova empresa disposta a investir para atender a um mercado que apresente demanda no satisfeita. A interconexo livre, e a possibilidade dos novos operadores adquirirem, dos antigos operadores dominantes, acesso a suas redes nos pontos em que realmente tiverem necessidade, reduziro os investimentos em infra-estruturas duplicadas. Esses dois aspectos devero favorecer o crescimento da competio e, associados remoo das obrigaes impostas inicialmente aos antigos operadores dominantes, citadas no pargrafo anterior, permitiro que se tenha, a mdio prazo, um mercado efetivamente competitivo e, portanto, requerendo menor interveno do rgo regulador.

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    Dessa forma, fica claro que os cenrios que no impem limitao quantidade de operadores parecem ser preferveis aos que pressupem tal restrio; portanto, cenrios com estruturas duopolistas seriam desaconselhados.

    Considere-se, agora, o tema da terceira pergunta. Do ponto de vista tecnolgico, a

    separao entre servios locais e de longa distncia arbitrria, desnecessria e potencialmente difcil de regular. Do ponto de vista econmico, quando no se tem restries de natureza fsica, deve-se limitar o tanto quanto possvel a imposio de limitaes artificiais. Entretanto, historicamente tem havido essa separao e, considerando os sistemas atualmente em operao no mundo, pelos servios de longa distncia que se tem maiores oportunidades de introduzir a competio nos servios de telecomunicaes.

    Para atender a esse princpio, de no impor restries artificiais e desnecessrias,

    mas tambm de criar condies para que se desenvolva efetivamente a competio e se tenha a universalizao do acesso aos servios, mais adequado que se admita um certo grau de competio entre as empresas exploradoras dos servios locais e as dos servios de longa distncia.

    Avaliando a quarta e ltima questo anteriormente formulada, verifica-se que, em

    princpio, seria razovel supor que, para assegurar a competio justa, todos os operadores, novos e antigos, deveriam estar sujeitos s mesmas obrigaes. Entretanto, considerando que os operadores antigos tm uma situao inicial de ntida vantagem em relao aos novos - dispem de uma grande infra-estrutura instalada, tm milhares ou mesmo milhes de clientes, dispem de um fluxo de caixa que lhes permite financiar parte substancial de suas necessidades de investimento, tm uma marca conhecida no mercado - conclui-se que bastante razovel, e talvez mais do que isso, necessrio, que se imponham obrigaes diferenciadas aos antigos e aos novos operadores, de forma a dar a estes ltimos condies de se instalar e se desenvolver.

    Com essas respostas, pode-se idealizar um cenrio como sendo aquele mais

    aderente ao objetivo da reforma: diviso do Sistema Telebrs em trs a cinco empresas regionais e na Embratel. As empresas regionais explorariam os servios locais, interurbano intra-estadual e interestadual, dentro de sua rea de concesso; a Embratel exploraria os servios intra-estadual, interestadual e internacional em todo o Pas. Haveria, portanto, competio entre as empresas regionais e a Embratel. Essa competio no ocorreria, inicialmente, entretanto, nos servios locais (restritos s empresas regionais e aos novos operadores) nem nos de longa distncia inter-reas de concesso e internacional (restritos Embratel e aos novos operadores). Os novos operadores, em nmero ilimitado, poderiam ser autorizados a prestar qualquer servio em qualquer parte do Pas, medida que as empresas atuantes nessa regio estivessem privatizadas. Eles poderiam, portanto, gradualmente ir obtendo autorizaes de regio em regio, at cobrirem todo o territrio nacional, quando no teriam qualquer restrio de atuao, nem geogrfica nem de servios.

    conveniente examinar o que seria, de fato, essa regulamentao diferenciada

    entre operadores antigos e operadores novos. Como visto, a considerao fundamental que, desde a aprovao da nova Lei at um certo tempo aps a outorga das primeiras novas licenas, os atuais operadores gozaro de um monoplio de fato, e mesmo depois que os novos operadores comearem a atuar, eles sero dominantes durante algum tempo, at que

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    se atinja uma situao de mercado efetivamente competitivo. Como contrapartida, portanto, eles estaro sujeitos a uma regulamentao que objetiva reduzir o poder que detm sobre o mercado, obrigando-os a atender requisitos de investimento, especialmente de carter social. Essas obrigaes, que sero removidas quando houver competio efetiva, seriam as seguintes:

    a) continuidade do servio: os operadores no podem interromper a prestao do

    servio, a no ser em casos justificados; b) atendimento: os operadores devem continuar expandindo sua rede de maneira a

    prestar servio, dentro de prazos razoveis, a quem os requisitar e estiver disposto a pagar tarifas comerciais que cubram os custos de capital e operacionais;

    c) servio universal: os operadores devem atender s metas iniciais de prestao do

    servio universal, como definido pelo rgo regulador; entretanto, em caso de dficit nesse atendimento, este ser rateado entre todos os participantes do mercado, atravs de um mecanismo adequado;

    d) qualidade: o rgo regulador dever estabelecer metas especficas de qualidade,

    bem como a metodologia de sua aferio, de forma a elevar o nvel do setor a padres internacionais dentro de um horizonte de tempo razovel;

    e) tarifas: os operadores estaro sujeitos a regulamentao que vise evitar o

    aumento abusivo de preos para os consumidores e a prtica de preos predatrios que impeam a entrada de novos competidores no mercado. A maneira mais prtica de se fazer isso atravs do estabelecimento de um sistema de "teto de preos" (price cap system), em que uma "cesta" de servios, em quantidades representativas da conta mdia dos consumidores, tem seu valor mximo estabelecido pelo rgo regulador. O operador tem alguma flexibilidade para alterar as tarifas de cada servio individualmente, desde que o valor total da "cesta" fique abaixo do "teto" fixado pelo rgo regulador. Aps um perodo inicial, razovel tambm que o rgo regulador defina um fator de produtividade que incidir sobre o valor da "cesta", reduzindo seu nvel real, como forma de estimular o operador dominante a reduzir ainda mais suas ineficincias e assegurar que parte desses ganhos sejam transferidos aos consumidores;

    f) separao contbil: os operadores devero manter separao contbil para

    aqueles servios prestados em regime de competio, de maneira a tornar seus custos transparentes para o rgo regulador, que assim poder, com maior facilidade, averiguar a eventual existncia de subsdios cruzados ou a prtica de "dumping".

    Com relao aos novos operadores, a premissa bsica que competir ao rgo

    regulador garantir que cheguem ao mercado companhias confiveis, comprometidas em atingir a viso que se pretende para o futuro cenrio das telecomunicaes no Pas. Assume-se tambm que, numa fase inicial, os novos operadores devero estar sujeitos a uma regulamentao mais favorvel, que aos poucos ser modificada, de modo a se ter equilbrio entre os novos e os antigos operadores. Dessa forma, a regulamentao inicial sobre os novos operadores deveria contemplar os aspectos a seguir:

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    a) demonstrao de capacidade: ao se candidatarem a uma outorga, os pretendentes devero demonstrar que dispem da capacidade tcnica e de marketing necessria para prestar servios confiveis, e de capacidade financeira suficiente para suportar a etapa inicial de altos investimentos com baixos retornos;

    b) apresentao de plano de negcios vivel: da mesma forma, antes de receber a

    outorga, os pretendentes devero apresentar ao rgo regulador um plano de negcios razovel; tais planos sero acompanhados pelo rgo regulador, sendo atualizados sempre que necessrio;

    c) financiamento do servio universal: todos os novos operadores devero

    contribuir para o financiamento das obrigaes de servio universal. Numa etapa inicial eles no sero obrigados a prestar tais servios, mas podero s-lo no futuro, contanto que os eventuais dficits sejam cobertos por contribuies de todos os operadores;

    d) tarifas e qualidade: no haver regulamentao especfica sobre os novos

    operadores com relao a tarifas e qualidade. Entretanto, dado que os operadores dominantes tero esse tipo de regulao, as condies estabelecidas para estes acabaro servindo de parmetro tambm para os novos operadores.

    Para assegurar que a competio efetivamente se desenvolva, necessrio que o

    rgo regulador atente tambm para as provveis tentativas dos operadores visando dominar o mercado. Uma das maneiras possveis a acumulao de outorgas para diferentes servios na mesma ou em diferentes regies; essa acumulao pode ser buscada por um mesmo operador ou por operadores distintos porm sob o mesmo controle acionrio, direto ou indireto. Portanto, assegurar a efetiva diversidade de controle societrio dos vrios operadores ser uma das tarefas essenciais da fase inicial da reforma.

    Outro ponto importante a ser considerado pelo rgo regulador a evoluo da

    tecnologia e suas implicaes em termos de redes e sistemas de telecomunicaes, facilidades de interconexo e custos associados. Monitorar adequadamente essa evoluo e tomar as medidas regulatrias necessrias incorporao dos ganhos dela decorrentes, de maneira a beneficiar os consumidores, ser essencial para assegurar a evoluo satisfatria do processo de reforma.

    6. A Transio para o Cenrio Desejado Foi visto no item anterior que o cenrio que melhor responderia aos objetivos

    estabelecidos para a reforma estrutural do setor de telecomunicaes aquele que contempla a diviso do Pas em um pequeno nmero de regies (trs a cinco), cada uma delas com uma empresa resultante da diviso do Sistema Telebrs. Essas empresas prestariam os servios locais e de longa distncia dentro de suas respectivas reas de concesso. Adicionalmente, a Embratel continuaria atuando no Pas todo, prestando servios de longa distncia domsticos e internacionais. Os novos operadores seriam admit idos medida que a privatizao fosse avanando, de modo que, dentro de algum tempo, estariam operando em todo o Pas, sem restries geogrficas ou de servios.

    Cabem ento duas questes:

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    a) qual estrutura regional seria mais adequada para as empresas que exploraro os servios locais? e

    b) como deve ser a evoluo da estrutura de mercado, da situao atual de

    monoplio estatal, para a situao de competio idealizada no cenrio descrito? A resposta a essas questes ser decisiva para assegurar a concretizao do quinto

    objetivo descrito no item 2 deste Captulo: maximizar o valor de venda das empresas estatais de telecomunicaes, sem prejudicar os demais objetivos. Para esse trabalho, a equipe do Ministrio das Comunicaes apoiou-se nos estudos desenvolvidos conjuntamente com consultores internacionais, supridos pela UIT - Unio Internacional de Telecomunicaes, visando definir as linhas bsicas para a reestruturao empresarial e para a privatizao do Sistema Telebrs.

    A criao de companhias regionais deve levar a empresas fortes, capazes de

    focalizar seus investimentos dentro de suas respectivas regies. Portanto, essas empresas devero dispor de fluxo de caixa adequado, grande potencial de crescimento e oportunidade de atingir bons nveis de receita por acesso. Alm disso, a regionalizao deve levar em considerao a contigidade geogrfica e ser consistente com a topologia da rede atual, de modo a reduzir eventuais dificuldades de natureza poltico-administrativa e tcnica.

    Um aspecto importante a ser considerado, sem dvida, o da homogeneidade da

    regio, que facilitar tanto a operao da empresa como a tarefa do rgo regulador, que no precisar adotar regras diferenciadas para uma mesma empresa, em funo das variaes no mercado que ela atende.

    Por outro lado, a regionalizao deve ser feita de modo a facilitar o processo de

    privatizao. O programa de privatizao do setor de telecomunicaes no Brasil exibir magnitude sem precedente nos mercados emergentes, e ocorrer num momento em que sero demandados macios investimentos para dotar o Pas da infra-estrutura necessria ao atendimento das necessidades da sociedade, conforme visto anteriormente.

    Devido limitao de capital nacional para o financiamento desses investimentos,

    observa-se que um fator importante para o sucesso de qualquer estratgia de privatizao poder ser a atrao de parceiros estratgicos, com conhecimento operacional e tecnolgico de alta qualidade, capazes de promover substanciais investimentos de capital de longo prazo e de reestruturar as operaes atuais, de modo a viabilizar a ampliao da disponibilidade e da qualidade dos servios prestados.

    Esses potenciais operadores tero aproximadamente quinze outras oportunidades

    equivalentes de investimento no setor de telecomunicaes de outros mercados emergentes nos prximos dois ou trs anos, alm das oportunidades naturalmente abertas pela liberalizao e reestruturao dos mercados dos pases desenvolvidos. Um grande desafio para o Brasil ser, portanto, criar condies apropriadas para atrair investidores estratgicos de alta qualidade.

    A existncia de um nmero limitado desses investidores estratgicos, de alta

    qualidade e efetivamente comprometidos a investir substanciais volumes de recursos no

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    setor de telecomunicaes brasileiro, deve ser um dos fatores dominantes na deciso de reestruturar o Sistema Telebrs em um pequeno nmero de empresas regionais.

    Considerando o exposto, a opo que parece ser a melhor a reestruturao do

    Sistema Telebrs em trs a cinco empresas regionais, mais a Embratel. Esse modelo parece ser o mais adequado medida que:

    a) d ensejo a uma combinao apropriada de negcios;

    b) oferece escala de operao potencialmente atraente para investidores estratgicos

    de alta qualidade e com diferentes objetivos; e c) permite a adoo de um mesmo aparato regulatrio dentro de cada regio. Essa reestruturao levar, dadas as caractersticas scio-econmicas do Brasil,

    constituio de empresas diferentes em termos de atratividade para o investimento privado. Essa diferenciao possibilitar, entretanto, a adoo de estratgias tambm diferentes, em cada uma das regies, de introduo da competio, que dever ser mais rpida nos mercados mais atraentes, e um pouco mais lenta nas regies menos atrativas.

    Para que os objetivos da reforma sejam atingidos da forma mais plena possvel,

    uma avaliao profunda dos pontos abordados anteriormente recomenda a adoo das seguintes linhas de ao:

    a) o rgo regulador dever ser criado antes da privatizao e do incio da

    competio, para garantir que, desde o comeo, se tenha disponveis a infra-estrutura e as habilidades necessrias definio das regras de competio e soluo objetiva de conflitos;

    b) a competio no dever comear antes da privatizao, de modo a dar s

    operadoras atuais condies de se prepararem para competir, dentro das fronteiras estabelecidas pelo rgo regulador, sem as restries de gesto a que se encontram atualmente sujeitas, na condio de empresas estatais;

    c) devero ser realizados, conjugados com o processo de outorga das novas

    licenas, leiles de espectro, de modo a assegurar aos operadores, antigos e novos, oportunidade de acesso aos recursos de que necessitam para concorrer com sucesso;

    d) as operadoras das regies menos atrativas podero contar com um perodo de

    proteo legal, antes do incio da competio, para melhorar sua atratividade ao capital privado. Todas as regies em que o Brasil vier a ser dividido tero, na prtica, um perodo de monoplio de fato, devido ao tempo que os novos operadores precisaro para preparar sua infra-estrutura e para atrair consumidores. O perodo de proteo legal seria, portanto, adicional a esse prazo de monoplio de fato;

    e) as restries impostas aos operadores atuais sero removidas assim que forem

    atingidos objetivos de expanso do sistema e houver competio efetiva no mercado;

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    f) sero celebrados contratos de concesso com as novas companhias regionais e com a Embratel, contendo os compromissos de parte a parte (operadora e poder concedente) que reflitam adequadamente as regras estabelecidas, conforme discutido anteriormente. Esses compromissos so relativos ao atendimento ao mercado, investimentos em infra-estrutura, qualidade, tarifas, interconexo e outros, por um lado, como exigncia do poder concedente; por outro lado, so referentes a que mercados e que servios podem ser explorados pela operadora, e quais condies de competio ela ter de enfrentar;

    g) as licenas dadas aos novos operadores devem refletir, tambm, as regras

    estabelecidas; o principal ponto o da vedao de competirem com empresas estatais, restrio esta que deixar de ter efeito medida que as vrias empresas regionais forem sendo privatizadas.

    7. A Questo da Indstria e da Tecnologia Por se tratar de um setor intensivo em capital, e que se apia fundamentalmente na

    tecnologia, o entrelaamento das telecomunicaes com assuntos industriais e tecnolgicos histrico. O prprio Cdigo Brasileiro de Telecomunicaes atribua ao Contel a competncia de "promover e estimular o desenvolvimento da indstria de equipamentos de telecomunicaes, dando preferncia quelas cujo capital, na sua maioria, pertena a acionistas brasileiros", e de "estabelecer ou aprovar normas tcnicas e especificaes a serem observadas na planificao da produo industrial e na fabricao de peas, aparelhos e equipamentos utilizados nos servios de telecomunicaes" (Lei no 4.117/62, artigo 29, incisos "r" e "s").

    Desde a sua criao, a Telebrs contava em sua estrutura com um Departamento de

    Pesquisa e Desenvolvimento, que evoluiu em 1976 para uma Diretoria de Tecnologia, qual se subordinou o Centro de Pesquisa e Desenvolvimento - CPqD, instalado na cidade de Campinas, em So Paulo. Na dcada de 70, em que a poltica governamental baseou-se na substituio de importaes, o poder de compra da Telebrs foi utilizado como o principal instrumento de consolidao de um parque industrial no Brasil para a fabricao de equipamentos, materiais e sistemas de telecomunicaes, em parte com a utilizao de tecnologia desenvolvida localmente.

    Essa poltica frutificou na dcada de 80, com a consolidao do CPqD atravs da

    ativao comercial de produtos l desenvolvidos, como as centrais de comutao digital da famlia "Trpico", as fibras pticas, o telefone padro, as antenas de comunicaes por satlite e os multiplexadores digitais para telefonia e para telegrafia. No final da dcada, mais de 95% dos investimentos da Telebrs eram canalizados para gastos internos no Brasil, com as importaes restritas apenas a alguns componentes especiais e a instrumentos de teste e medio.

    O desenvolvimento de novos servios de telecomunicaes, especialmente

    suportados por tecnologias mais avanadas, e a abertura do mercado competio, ocorridos no incio dos anos 90 vieram, entretanto, alterar esse quadro. A exposio do setor industrial brasileiro competio internacional, e os limites impostos pela legislao utilizao do poder de compra do Estado, diretamente ou atravs de suas empresas

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    controladas, acabaram resultando em um aumento substancial do volume anual de importaes do setor, que passaram dos 5% sobre os investimentos totais, observados no final dos anos 80, para cerca de 20% em 1996.

    Com a abertura do setor de servios de telecomunicaes competio, e com a

    privatizao das empresas estatais nele atuantes, que ocorrero em decorrncia da aprovao deste Projeto de Lei, de se esperar que esse quadro evolua em direo a uma maior pulverizao das compras de equipamentos de telecomunicaes, busca por diferentes fontes de tecnologias e, conseqentemente, a maiores volumes de importaes. H tambm o risco, a exemplo do que se observou em outros pases, de se ter algum tipo de "desindustrializao", devido aos altos dispndios em pesquisa e desenvolvimento necessrios para manuteno da competitividade no setor e pequena escala do mercado brasileiro para amortizar esses investimentos.

    Certamente essa questo no especfica do setor de telecomunicaes, ocorrendo

    situaes similares em todos os campos de atividade que se suportam em elevado contedo tecnolgico e em inverses macias de capital.

    O programa de governo de Vossa Excelncia j manifestava preocupao com esse

    tema, ao formular diretrizes gerais para a economia ("Fortalecer o papel do Estado como coordenador do processo de desenvolvimento industrial, com o reforo da funo de planejamento" e "Estimular o desenvolvimento da capacidade tecnolgica para a inovao, com o aumento das atividades de pesquisa tecnolgica e o desenvolvimento experimental em empresas e institutos de pesquisa") , para cincia e tecnologia ("Ampliar as fontes de financiamento para aplicao na gerao e difuso de conhecimentos cientficos e tecnolgicos, em especial com recursos provenientes da privatizao, da captao de recursos externos e do setor privado", "Manter programas especiais de apoio melhoria da capacidade de inovao tecnolgica da indstria, estimulando consrcios para o desenvolvimento de tecnologias pr-competitivas e criando mecanismos de apoio a projetos de capacitao industrial", "Apoiar a tecnologia competitiva atravs de incentivos, financiamentos, participao no capital de risco, fundos de risco compartilhado, fundos de formao e aperfeioamento de recursos humanos especializados, e financiamentos especiais para a construo e implantao de centros empresariais de pesquisa e desenvolvimento"), e para a prpria rea de telecomunicaes ("Preservar a presena do setor pblico nas reas estratgicas das comunicaes e no desenvolvimento tecnolgico").

    Essas razes motivaram a incluso, no Projeto de Lei, de disposies especiais

    sobre o tema, como ser visto na parte seguinte. III. O Projeto de Lei Como j apontado na parte I desta Exposio de Motivos, determina a Constituio

    da Repblica, em seu art. 21, inciso XI, que a competncia da Unio para explorar, diretamente ou mediante autorizao, concesso ou permisso, servios de telecomunicaes, seja exercitada nos termos da lei, que dispor sobre a organizao dos servios, a criao de um rgo regulador e outros aspectos institucionais.

    O projeto que ora submetido apreciao de Vossa Excelncia objetiva dar

    cumprimento a essa determinao constitucional. Assim, em face da especificidade da

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    norma que embasa o delineamento do perfil jurdico de um novo ente, com status constitucional, e a organizao de todo o sistema de telecomunicaes, a orientao do Projeto no sentido de figurar os diversos assuntos em um s diploma legal, denominado Lei Geral das Telecomunicaes Brasileiras, compreendendo quatro livros, subdivididos em ttulos, captulos, e sees.

    LIVRO I

    Princpios Fundamentais

    Competindo Unio, por intermdio de um rgo regulador, organizar a explorao dos servios de telecomunicao - e a se incluem a execuo, a comercializao e uso dos servios e a implantao e o funcionamento de redes de telecomunicaes, bem como a utilizao do espectro de radiofreqncias e dos recursos orbitais (art. 1.) - estabeleceu-se que o objetivo bsico da regulao promovida pelo Estado deve ser a garantia do direito de toda a populao de acesso s telecomunicaes, a tarifas e preos razoveis e condies adequadas. o que prescreve o art. 2o.

    Esse objetivo bsico, da universalizao dos servios, decorre do princpio

    constitucional da isonomia. O Projeto procurou aperfeioar a normatividade da Constituio da Repblica, dando substncia conceitual aos princpios fundamentais aplicveis ao setor das telecomunicaes. Para tanto, fez imperativa a adoo de medidas que possam ampliar o leque dos servios, incrementar sua oferta e propiciar padres de qualidade, na forma e condies que sero estabelecidas pelas metas especficas de universalizao.

    Em linha com a premissa de que o novo modelo institucional das telecomunicaes

    brasileiras deve ter como referncia os direitos dos usurios dos servios, o art. 3o do Projeto relaciona esses direitos. Entre eles, o de acesso aos servios de interesse coletivo, com padres de qualidade e regularidade adequados sua natureza, o da liberdade de escolha de seu prestador de servio, o da inviolabilidade e do segredo da comunicao, e o da preservao de sua privacidade.

    O art. 4o elenca os princpios constitucionais que condicionam a validade da

    regulao, quais sejam: da soberania nacional, funo social da propriedade, liberdade de iniciativa, livre concorrncia, defesa do consumidor, reduo das desigualdades regionais e sociais, represso ao abuso do poder econmico e continuidade do servio prestado no regime pblico.

    Harmonizando os direitos do usurio e consumidor com o princpio da livre

    concorrncia e da justa competio, o Estado, pelo rgo regulador, dever ordenar as atividades privadas e organizar os servios pblicos de telecomunicaes, compatibilizando-os com a necessidade de desenvolvimento econmico e social.

    Nessa linha, h de se ter em conta que o princpio que rege a organizao dos

    servios de telecomunicao o da livre, ampla e justa competio, cumprindo