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Director: Henri Dieuzeide

Chefe da redacção : Zaghloul Morsy

Adjunto: Alexandra Draxler

Perspectivas publica-se também:

e m Árabe : Mustaqbal al-Tarbiya (Unesco Publications Centre, I Talaat Harb Street, Tahir Square, Le Caire, Egypte)

e m Espanhol ; Perspectivas, revista trimestral de educación (Santularia S. A . de Ediciones, calle Elfo 32, Madrid-27, Espagne)

e m Francês : Perspectives, revue trimestrielle de l'éducation (Unesco)

e m Inglês : Prospects, quarterly review of education (Unesco)

© Unesco, 1978

© para a tradução portuguesa. Livros Horizonte, Lda., 1978

Tradução realizada sob a responsabilidade de Livros Horizonte

Livros Horizonte R u a das Chagas, 17, l.°-Dto. — Lisboa — Portugal

Impresso em Portugal

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revista trimestral de educação Unesco

Vol. VIH N.° 2 1978

Sumário A planificação da educação antigamente e agora George Psacharcrpoulos

Reforma da educação e cooperação internacional nos anos oitenta Malcolm S. Adiseshiah

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Posições / Controvérsias

Por que não é a investigação pedagógica mais útil? Henry M. Levin 163

Elementos para u m dossier: Abordagem do não formal

A educação dos adultos como correctivo do insucesso da educação formal Asher Déleon 174

A educação não formal como conceito Marvin Granãstaff 184

A planificação da educação extra-escolar:

estratégias e obrigações Tim Simkins 190

Informação, orientação e consulta Paul H. Bertelsen 203

O ensino pela rádio, fase anterior à alfabetização Dwight W. Allen e Stephen Anzóleme, 212 A educação dos adultos, elemento da educação permanente na U R S S Victor G. Onouchkine e Evguénia P. Tonkonogaïa 223

Tendências e casos

A educação recorrente nos países da Europa Ocidental Dennis B. P. Kallen

O projecto húngaro para a escola do futuro Rozsa Ret

233

242

Notas e comunicações

Revista de publicações

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A O LJ3ITOR

De 197S a 1976 a versão espanhola da revista foi produzida por uma empresa editorial privada que lamentamos não ter podido assegurar em 1977 a publicação dos quatro números regularmente editados em Paris, em inglés e em francês.

Procurando manter a estrita periodicidade da revista e tam­bém corresponder ao voto dos Estados membros hispanófonos no sentido de serem aumentadas as publicações em espanhol a cargo do próprio Secretariado da UNESCO, a edição da revista nessa língua passará a ser feita sob a responsabilidade e a marca de edi­tor exclusivo da Organização a partir do primeiro número de 1978.

Um número especial intitulado Perspectivas/Selección agrupará um certo número de artigos publicados nos quatro números de 1977, sendo assim simultaneamente asseguradas a continuidade e a tran­sição.

Os leitores, antigos e modernos, a quem esta edição interesse devem dirigirse aos agentes de venda da UNESCO existentes em todos os Estados membros da Organização. A lista completa destes agentes figura nas últimas páginas de cada número da revista.

Os leitores que desejem assinar a revista directamente junto da Organização devem endereçar a fórmula que figura no fim deste número para: PUB/C, 7, place de Fontenoy, 75700 Paris (France).

O s artigos assinados exprimem a opinião dos seus autores e não necessariamente a da Unesco ou da Redacção.

P o d e m ser reproduzidos, sob reserva da autorização do redactor-chef e.

A redacção gostaria de receber para publicação contribuições ou cartas contendo opiniões fundamentadas, favoráveis ou nao, sobre qualquer artigo publicado e m Perspectivas ou sobre os temas abordadosi.

Toda a correspondência deve ser dirigida ao redactor-chefe, Perspec­tivas, Unesco, 7, Place de Fontenoy, 757i00i, Paris, France.

A s denominações usadas e m Perspectivas e a apresentação dos dados que figuram na revista não implicam qualquer tomada de posição da parte do Secretariado da Unesco quanto ao estatuto jurídico dos países, territórios, cidades ou zonas, ou das suas autoridades, n e m quanto ao traçado das suas fronteiras ou limites.

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George Psacharopoulos

A planificação da educação

antigamente e agora

George Psacharopoulos A melhor definição do presente ensaio seria: exame crítico do que se tem feito nos últimos vinte anos e m matéria de planificação da educação. Começo por delinear a evolução de certas teorias e metodologias fundamentais; faço, e m seguida, o ponto da situação.

A génese

Tudo começou com a descoberta do «elemento residual», pouco antes de 1960. Só e m 1955 foi decidido planificar o ensino (pelo menos no sentido e m que o entendemos)1. Vários estudos efec­tuados nos Estados Unidos da América, e m especial por Abra-movitz e Solow, tinham mostrado que a produção (avaliada e m termos de rendimento nacional) aumenta muito mais rapi­damente do que pode ser explicado pelo crescimento dos factores tradicionais de produção: equipamento, mão-de-obra, superfície explorada2. Este enigma aparente — pois nada resulta de nada/— começou por ser explicado pelo «progresso tecnológico». É gra­ças ao aperfeiçoamento das máquinas e das técnicas que bene­ficiamos de u m aumento da produção inexplicável pelos factores tradicionais mensuráveis.

Para certos espíritos curiosos, porém, esta explicação não era convincente. C o m o se efectua o progresso tecnológico? T . W . Sc­hultz foi o primeiro a abrir a «caixa negra da evolução técnica» e a pressentir qual o papel da educação no crescimento económico3.

1. Ver &. P S A C H A R O P O U L O S , «The tniacro-pltaning of education: a clarifi­cation of issues and a look into the future», Comparative education review, Junho de 1975-

2. Ver R . S O L O W , «Technical change and the aggregate production func­tion», Review of economics and statistics, Agosto de 1867; M . A B R A -MOVTTZ, Resources and output trends in the United States since ¿870> National Bureau of Economic Research, 1956 (Occasional papel n.° 52).

3. Ver T . W . S C H U L T Z , «Education and economic growth», Social factors influencing American education. National Society for the Study of 'Education, 1961.

(Grécia J. Economista especializado na planificação da educação e da mão-de-obra. Leccionou em Universidades americanas e, a partir de 1969, na London School of Economics. Autor de: Returns to education: an international comparison: Earnings aind education ta O E O D countries; numerosos artigos sobre economia e educação, repartição dos rendimentos e planificação da mão-de-obra.

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George Psacharopoulos

A partir daí, na planificação do desenvolvimento, verificou-se nitidamente a tendência para preferir os investimentos na edu­cação à formação de capital.

A Idade da Pedra

Inicialmente, os planos relativos à educação baseavam-se no m é ­todo das «comparações internacionais». C o m efeito, a maior parte dos países não dispunha de séries de 'dados cronológicos nacionais (mesmo transversais) permitindo utilizar outro método. O m é ­todo das «comparações internacionais» foi elaborado por Harbi­son e Myers 1. Estes autores, apoiando-se e m dados provenientes de vários países, «laboraram u m «índice compósito do desenvolvi­mento dos recursos humanos». E m seguida, repartiram os países do mundo por quatro grupos, de acordo com a sua posição neste índice (sendo as posições extremas ocupadas pelo Níger, com 0,3 pontos, e pelos Estados Unidos, com 261,3 pontos). Depois de terem estabelecido u m a correlação entre este índice, o rendi­mento nacional e outras características socioeconómicas dos diversos países, Harbison e Myers sugeriram aproximadamente a seguinte estratégia: para aumentar o seu rendimento nacio­nal, u m país deve começar por melhorar a sua posição sobre o índice de desenvolvimento dos recursos humanos.

Quase todos os países do mundo, e sobretudo os países e m desenvolvimento, adoptaram esta estratégia — u m dos resulta­dos foi a proliferação das Universidades de estilo britânico nos novos Estados independentes de Africa.

O método das comparações internacionais ainda é utilizado — erradamente, e m minha opinião — e m certos países. Ele sus­cita dois grandes problemas. E m primeiro lugar, admite u m a relação de causa a efeito e m sentido único entre a educação e o rendimento nacional, a qual existe, sem dúvida, embora não seja possível deduzir e m que medida a educação é influen­ciada pelo crescimento do rendimento nacional. C o m o não pode­m o s determinar e m que sentido se exerce a causalidade, nesta relação estatisticamente observada, basta esperar que o m e ­lhoramento deliberado da posição sobre o índice de Harbison e Myers origine u m aumento do rendimento nacional. E m se­gundo lugar, Harbison e Myers calculam o índice de desenvol­vimento dos recursos humanos unicamente na base dos efectivos do ensino secundário e pós-secundário 2. Excluem o ensino pri­mário, o que não constituiria u m grave problema n u m país avançado, onde a escolarização é universal ao nível primário. Esta negligência do ensino primário, típica daquilo a que chamo

1. Ver P . H A R B I S O N e C- A . M Y E R S , Education, mcmpower and economic growth, McGraw-Hill, 1964.

2. Este índice é igual a 1 S + 5 H , sendo S e H , respectivamente, os efec­tivos do ensino secundario e pré-secundário. O coeficiente 5 é u m coefi dente de ponderação arbitrário dos efectivos do ensino superior.

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A planificação da educação antigamente e agora

«a idade da pedra da planificação da educação», é, em parte, responsável pela expansão irreflectida das Universidades, espe­cialmente nos países em desenvolvimento 1.

A Idade Média

N a época em que Harbison e Myers prosseguiam as suas inves­tigações sobre as comparações internacionais, outros planifi­cadores dos recursos humanos estudavam as relações existentes no interior de u m país entre a educação, a estrutura do emprego e o rendimento nacional. Estes trabalhos permitiram elaborar u m método, baseado na estimação das «necessidades em re­cursos humanos» (ou na previsão do emprego), que exerceu sobre a planificação uma influência muito mais perdurável do que o método das comparações internacionais. Apresentamos em seguida u m resumo2. E m determinado país, existe, em qual­quer momento, uma relação entre a estrutura do emprego, o nível de instrução da população activa e o nível da produção (medida, em geral, pelo valor sectorial). Verifica-se, por exem­plo, que, para produzir material eléctrico no valor de u m milhão de dólares, se empregam, actualmente 50 engenheiros, com formação de nível universitário. Se o país procura elevar o seu rendimento nacional produzindo material eléctrico num valor de 1,5 milhões de dólares, necessita, segundo o método baseado na previsão do emprego, de formar mais 25 engenheiros a nível universitário.

E m I960, a planificação da educação recorria essencialmente a este métodos. A partir daí, u m número incalculável de mono­grafias foram consagradas à análise de matrizes «profissão--educação-actividade económica», com o fim de estabelecer constantes neste complexo de relações *.

O método baseado na avaliação das necessidades em re­cursos humanos conheceu u m grande sucesso e é ainda corren-

1. Por outras palavras, como se poderia preconizar u m a política de expan­são do ensino primerio se este não entra e m linha de conta para o índice de desenvolvimento dos recursos humanos? C o m o o onsino superior 'apresenta no índice u m coeficiente de ponderação igual a 5 (contra u m coeficiente de ponderação implícito igual a O para o ensino primiá-nio)¿ é natural que o planificador recomende u m a expansão do ensino pós-secundário, d'e modo a melhorar a posição do seu país sobre o índice de Harbison e Myers e a favorecer, assim, o aumento do rendimiento nacional.

2. A exposição mais clara sobre o método baseado na estimação das carên­cias e m recursos humanos encontra-se no estudo d'e H . S. P A R N É S , Besoins scolaires et développement économique et social, O C D E , 1962.

3. Ver o estudo da O C D E : Le projet régional méditerranéen: six pays en quête d'un plan. Rapports par pays (Itália, Grécia, Turquia, Espanha, Portugal e Jugoslávia).

4. Ver, por exemplo, o estudo da O C D E : Structures professionnelles et édu­catives et niveaux de développement économique, 1970«

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George Psaeharopoulos

temente utilizado na prática da planificação. Atribuo a sua difusão e a sua popularidade à simplicidade da fórmula: «Para aumentar a produção, são necessários mais engenheiros com formação universitária» — tão fácil de compreender para os administradores. N o entanto, examinando atentamente, este método apresenta quatro defeitos da maior importância, e que tornam a sua aplicação muito duvidosa.

E m primeiro lugar, supõe a existência de u m a relação fixa entre a educação (sem falar do emprego) e a economia. N u m e ­rosos estudos recentes sobre as «elasticidades de substituição» demonstraram que a economia pode perfeitamente progredir com diferentes estruturas do emprego 1. Para retomar o nosso exemplo, poderíamos igualmente aumentar a produção de m a ­terial eléctrico empregando 10 engenheiros com formação uni­versitária e 20 técnicos de nível médio.

E m segundo lugar, este método despreza o custo da for­mação de pessoal qualificado suplementar. N o nosso exemplo, é necessário, a todo o custo, formar 25 engenheiros suplemen­tares para poder aumentar a produção. M a s , embora seja igualmente possível fazê-lo com pessoal qualificado formado mais economicamente, este método origina perda de eficácia — ou seja, o contrário do efeito desejado.

O seu terceiro defeito deve-se ao facto das relações entre a educação e a economia, que servem de base às previsões, serem, e m larga medida, «determinadas pela oferta». Por outras palavras, se u m país possui u m grande número de diplomados e m direito, muitas profissões exigirão naturalmente u m a for­mação jurídica. Será necessário partir deste facto para prever o número de diplomados e m direito «que exige a realização dos objectivos de produção»? Certamente que não. Contudo, praticamente todos os especialistas e m previsão de emprego caíram, e m determinado momento, nesta armadilha.

Aqui, sou obrigado a fazer u m a digressão. Já se tentou, por vezes, fixar o nível mínimo de formação exigido por deter­minadas profissões. Considero este procedimento arbitrário e absurdo, pela simples razão de que u m a pessoa com o nível de formação superior ao mínimo (?) fixado pelo planificador exercerá a sua profissão mais eficazmente.

Finalmente, este método apresenta o defeito de conduzir regularmente a previsões erradas quanto ao efectivo de pessoal qualificado no ano-alvo do plano.

O erro não é pequeno; pode ser da ordem dos 100 por cento ou mais2, o que nada tem de surpreendente, tendo em

1. Ver G . P S A C H A R O P O U L O S , «Theoretical assumptions versus empirical evi­dence In manpower planning», The Economist, Novembro-Dezembro de 1973-

2. Para u m a comparação pormenorizada das previsões e ida realização efec­tiva dos planos relativos ao emprego e m certos países, ver B . A H A M A D e M . BLAUG, The practice of manpower forecasting, Elsevier, 1973.

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A planificação da educação antigamente e agora

conta as hipóteses e m que se baseiam as previsões do emprego. Trata-se, de certo modo, da prova indirecta e a posteriori de que as economias são suficientemente maleáveis para admitir diferentes estruturas do emprego, sem que a produção seja afectada.

A grande ilusão

Este relato ficaria incompleto se eu ignorasse u m método muito e m voga nos anos sessenta, m a s que parece já não o estar actualmente: o dos modelos ditos «matemáticos, eco­nométricos ou calculáveis» (sic). É evidente que todos os m o ­delos utilizados na planificação da educação o são mais ou menos. M a s , os modelos e m causa formam u m a categoria especial, fornecendo u m a análise muito pormenorizada das relações entre o emprego, a educação, a população e a acti­vidade económica 1.

A maior parte deles decorre da análise dos contactos inter­sectoriais e são do tipo utilizado pela previsão das necessidades e m recursos humanos, m a s alguns deles pertencem à categoria «previsão das necessidades de ordem demográfica e social».

E m minha opinião, estes modelos já não são utilizados devido ao facto de não se ganhar muito com u m a formulação porme­norizada. A preocupação do pormenor prejudica a utilidade prática, tendo e m conta, sobretudo, a escassez dos dados na maior parte dos países. Assim, os principais utilizadores deste modelo foram, até agora, estudantes especializados e m esta­tística, e m investigação operacional e e m economia, e não os próprios planificadores.

Talvez devesse assinalar, porém, dois modelos que, desde que devidamente simplificados, poderiam ser de utilidade prá­tica para a planificação. U m é atribuído a Tinbergen2. O seu interesse reside no carácter sequencial da solução (por etapas de seis anos), o que permite descobrir pontos de estrangula­mento, e m especial no que se refere à oferta de professores.

O outro modelo, elaborado por Stone, é útil na determinação da incidência dos factores demográficos sobre a procura de vagas no ensino obrigatório3.

1. Para uma série dte modelos deste tîpo, ver Modèles mathématiques pour la planification de l'enseignement, OCDE, 1969, e Modèles économétri­ques de l'enseignement, O C D E , 1965, assim coroo a obra de C. A . M O S E R e P. REDFERN, «Education and manpower: some current research», Models for decision, proceedings of a conference on computable models in decision making, English Universities Press, 1965.

2. TINBERGEN e H . C. Bos, Vn modèle de planification des besoms d'ensei­gnement en fonction du développement économique, O C D E , 1965<

3. Ver R. STONE, Comptabilité démographique et construction de modèles, O C D E , 197.1.

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George Psacharopoulos

O Renascimento

Tendo reconhecido os defeitos do método baseado na previsão das necessidades e m recursos humanos, os planificadores da educação voltaram à abordagem anteriormente proposta por Schultz e Becker, e m particular à análise da relação custos--vantagens, ou «da taxa de rendimento do investimento na educação» 1.

N a sua forma mais simples, esta abordagem é diametral­mente oposta ao método baseado na previsão das necessidades e m recursos humanos: dá prioridade ao desenvolvimento dos níveis do ensino que apresentam a relação custos-vantagens sociais mais favorável. Entre os custos sociais figuram, e m primeiro lugar, o custo real da educação — que é considerável, m e s m o quando o ensino é gratuito— e, e m segundo lugar, aquilo que a população escolarizada não ganha. A s vantagens sociais do ensino superior medem-se pela diferença entre as remunerações ilíquidas dos diplomados pela Universidade e dos diplomados pelo ensino secundário.

A análise custos-vantagens apresenta numerosos defeitos, dos quais o principal se deve à impossibilidade de medir exac­tamente as vantagens sociais dos investimentos nos vários níveis de ensino. Se considerarmos as vantagens monetárias, a política geral deveria opor-se à que indica o método baseado na previsão das necessidades e m recursos humanos: para pro­mover o crescimento económico e a eficácia, é necessário con­siderar prioritários os níveis inferiores do ensino2.

U m a nova repartição dos créditos concedidos à educação, favorecendo o ensino primário, e não o ensino superior, nos países e m que a escolarização não é universal no primeiro grau, teria o efeito de aumentar consideravelmente o rendimento nacionals.

A situação actual

Considerando a situação actual da planificação da educação, gostaria de estabelecer u m a distinção nítida entre a prática e a investigação teórica. N e n h u m observador, m e s m o superfi­cial, pode contestar que o 'método baseado na previsão das necessidades e m recursos humanos domina actualmente a prá­tica— o que julgo lamentável, pelas razões acima indicadas.

1. Ver T . W . S C H U L T Z , op. cit., e G . S. B E C K E R , «Underinvestment in college education?», American economic review, Maio de 1960.

2. Esta conclusão aplica-se a numerosos países, quase sem excepção. Ver G- P S A C H A R O P O U L O S , Returns to education, Elsevier, 1973u

3. Ver G . D O U G H E R T Y « G- P S A C H A R O P O U L O S , «The misallocation cost of investment in 'education», Journal of human resources, Outono de 1877.

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A planificação da educação antigamente e agora

Independentemente da ilusão que proporciona, de poder prever o numero de engenheiros que exige o crescimento eco­nómico, este método, a despeito das suas insuficiências no plano teórico, continua popular na prática, devido à sua como­didade. Os dados necessários à sua aplicação corrente são fáceis de recolher. E m quase todos os países do mundo, existe actualmente u m a matriz emprego-educação-actividade econó­mica, assim como u m plano nacional que fixa objectivos de crescimento até ao ano 2000. Efectuando u m centena de divi­sões e de multiplicações com a ajuda de u m ordenador, é possível estabelecer, e m poucos dias, u m plano de educação muito apresentável — e m todo o caso, aceitável para u m mi­nistro da educação que não dispõe do tempo n e m da compe­tência necessários para compreender e criticar o método de cálculo utilizado.

N o plano da investigação teórica, grandes aperfeiçoamentos foram recentemente introduzidos no modelo de base custos--vantagens acima descrito.

E m particular, tentou-se corrigir as estatísticas salientando a superioridade da formação universitária, ou a influência do meio socioeconómico e das diferenças genéticas1. Estes pro­blemas são analisados do ponto de vista das funções da remu­neração ou do desenvolvimento da carreira. O s dados requeridos são estabelecidos na base de observações referentes a amostras de indivíduos (e não a grupos), donde a impopularidade destes modelos junto dos planificadores da educação. Estes dados só há pouco tempo se encontram disponíveis na maior parte dos países e a sua análise exige tempo e esforço. N ã o se prestam a u m cálculo rápido.

Os progressos actuais neste domínio não dizem respeito unicamente aos modelos analíticos, m a s aos próprios objec­tivos da planificação. Nos último® vinte anos, o único objectivo da planificação da educação tem sido a eficácia económica ou o aumento do rendimento nacional. Actualmente, atribui-se cada vez mais importância aos princípios de equidade e de repartição. U m a estratégia da educação estabelecida com u m a preocupação de eficácia pode ser equitativa? Favorece o emprego? Estas questões são complexas e não comportam soluções fáceis ou únicas2.

li Apesar da controvérsia que se desenvolve nos meios especializados, o estudo de C . J E N C K S , Inequality, Basic Books, 1972, constitui u m bom exemplo de u m a abordagem combinando a sociologia, as ciências da educação, a genética e a economia. Ver também p . T A U B M A N , «The determinants of earnings: genetics, family and other environments; a study of white male twins», American economic review, Dezembro de 1976.

2, Ver G- P S A C H A R O P O U L O S , «Measuring the welfare effects of educational policies», em V . H A L B E R S T A D T e A . C U L Y E R (dur. pufol.), Public econo­mics and human resources, Cujas, 1977.

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George Psacharöpoulos

Para prosseguir as investigações, parece ser esta a via mais segura.

Porém, como os créditos concedidos à investigação se tor­n a m mais escassos, seria mais vantajoso, e m minha opinião, abandonar a análise tradicional das matrizes emprego-educação para estudar as relações de comportamento importantes para a plnificação da educação. Assim, não posso compreender qual o interesse de continuar a avaliar as taxas de rendimento no ensino primário, que sabemos serem elevadas, com toda a pro­babilidade, enquanto ignoramos, a priori, qual a rentabilidade social do investimento nos diverhos sectores do ensino superior.

Outro domínio que deveria ser objecto de u m a atenção profunda nos próximos anos é a análise das características pessoais e institucionais. U m a vez que somos incapazes de medir directamente as vantagens sociais da educação, devemos tentar, pelo menos, aperfeiçoar as medidas indirectas. N u m a economia de livre concorrência, a primeira é o nível de remu­neração, que convém considerar e m função de diversos fac­tores ligados à educação.

Para terminar, gostaria de dizer que a tendência actual favorece u m plano de educação flexível, evolutivo, facilmente adaptável às circunstâncias. Só poderemos elaborar este plano na base de u m a observação constante do complexo socioeco»-nómico-educativo. Sinais com as remunerações excessivas e m certas profissões ou o desemprego dos jovens diplomados de certas disciplinas universitárias, podem ajudar os responsáveis pela politica da educação a adoptar medidas correctivas. Con­tudo, como toda a política da educação tem efeitos a longo termo, eu preconizaria transformações progressivas, sem aba­los, e m vez de grandes perturbações na estrutura da oferta. E m matéria de planificação da educação, o objectivo supremo consiste, actualmente, e m formar homens capazes de dar provas de maleabilidade, de se reciclarem, de se adaptarem a u m Mundo e m constante transformação.

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Malcolm S. Adiseshiah

Reforma da educação

e cooperação internacional

nos anos oitenta

A reforma da educação nos anos oitenta

Seguem-se, e m matéria de preliminares, quatro propostas gerais respeitantes à reforma da educação nos anos oitenta.

GUSTO DA, REFORMA

A reforma da educação que é necessário realizar nos anos oitenta custará menos do que a educação — «deseducação» — ou ausência de educação — «não-educação» — que caracterizou os anos sessenta e setenta. Calculou-se, por meio de vários estudos, o custo da «deseducação» devida ao facto de W a s h ­ington, Karachi, Adis Abeba, Santiago e Beirute terem deci­dido empenhar-se, durante os anos sessenta e setenta, na via única de u m desenvolvimento da educação inspirado unicamente nos modelos escolares e universitários imediatamente disponí­veis, isto é, nos modelos tradicionais ou estrangeiros 1. Consi­derando unicamente o insucesso escolar, a inaptidão para qualquer função, o desemprego e o subemprego, o custo da «deseducação» representaria 50 a 60 por cento das despesas anuais do ensino. E m todo o mundo, que gasta todos os anos, com este fim, 275 mil milhões de dólares, esta despesa ultra­passaria a centena de milhões2.

O custo da não-educação dos 800 milhões de adultos anal­fabetos dos anos setenta e dos 820 milhões dos anos oitenta não foi calculado3. Estes analfabetos representam três quartos

li G O V E R N O D E T A M I L N A D U ( ÍNDIA) , Report of the Education Finance Committee, pp. 3 a 20, Madras, 1976; G A B I N E T E I N T E R N A C I O N A L D O T R A B A L H O , Matching employment opportunities anã expectations: a pro­gramme of action for Ceylon, Genebra, 1971; G . W A T S O N , Change in school systems, N E A , Washington, 1967; U N E S C O , Apprendre à être, (pp. 46-56, UNESCO-Fayard, 1972,

2, U N E S C O , Annuaire statistique, Paris, 1975. 3. U N E S C O , Alphabétisation 1969-1971. Progrès de l'alphabétisation dans

les divers continents, Paris, 1972, 143 p.; H . REIFF , The role of educa­tional planning in situations of unemployment, Paris, 1976, 23 p.

Malcolm S. Addseshiah (India). Antigo director geral adjunto da UNESCO. Reitor da Universidade de Madras. Presidente do Conselho Internacional Internacional da Educação de Adultos. Autor de Que mon pays s'éveille; B est temps d'e passer à l'action.

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Malcolm S. Adiseshiah

dos «pobres»: são os miseráveis, e também as vítimas do de­semprego e do subemprego, de tal modo que o custo da sua não-educação calculado do ponto de vista económico, isto é, da perda de produção e de produtividade (sem falar do custo, impossível de calcular, da sua não-participação na vida política e cultural do país), aproxima-se, sem dúvida, do da «desedu­cação». A s reformas e inovações actualmente consideradas para os anos oitenta custarão cerca de metade do que a per­severança na «deseducação» e na não-educação. Por conse­guinte, o argumento da despesa, invocado contra a reforma da educação não tem consistência.

AJDCANOE DA REFORMA

A o realizar planos para o III Decénio do Desenvolvimento, é necessário que este não seja concebido como crescimento unidimensional do rendimento, do produto bruto ou do produto líquido, ou qualquer outra coisa, mas como u m processo plu^ ridimensional no qual entram em jogo u m meio natural, relações sociais, u m a educação, u m consumo e u m bem-estar que res­ponde às necessidades e, e m primeiro lugar, às necessidades essenciais da maioria dos miseráveis (ou seja, hoje e m dia, 1200 milhos de homens, mulheres e crianças). Esta tomada de consciência deve acompanhar-se de u m a reestruturação e de u m a renovação da educação1. Exclui-se que esta se apoie, como nos anos sessenta e setenta, unicamente no sistema escolar e universitário. Basta considerar a dimensão do desen­volvimento, tal como a acabamos de definir, para ver a que ponto o que a escola e a Universidade, m e s m o reformadas, podem fazer de melhor, está longe de problemas como a con­servação da biosfera, a produção, a distribuição e a utilização dos bens de grande consumo e da realização do bem-estar pessoal e social que assenta na participação e nas decisões individuais. E m vez de assentar exclusivamente, do início até ao fim, na escola e na Universidade (calculou-se que, para escolarizar, até ao ano 2000, os 60 milhões de crianças dos 6 aos 14 anos, a índia deveria construir todos os dez minutos u m a escola com 250 lugares2, a educação será concebida Como u m a função permanente de todo o meio social. Ela não terá por domínio e por finalidade apenas o sucesso e o enriqueci­mento pessoais, mas também, ou até mais, o progresso da sociedade no seu conjunto; o que significa que, e m princípio, a educação seria u m a obrigação permanente de toda a socie­dade e m relação a cada u m dos seus membros, encarando

1. P. A . SAMÜELSON, L'économique, Paris, Armand Colin, 1969; M . S. ADISE-SHiAH, Que mon pays s'éveille, UNESCO, Paris, 1970; D A G H A M M A R S -KJÖLD FOUNDATION, What now: another development, Uppsala, 1975.

2. S. C. SËTH, An outlook for India's future (2000 AD), p. IV, Nova Deli, NCST, 1976-

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Reforma da educação e cooperação internacional noa anos oitenta

de frente a aprendizagem, o trabalho, a produção. N ã o se aprenderá unicamente nas escolas (possuímos, de resto, u m número suficiente de estabelecimentos se os utilizarmos 20 ou 24 horas por dia durante 365 dias por ano, e m vez de conti­nuarmos, como actualmente, a servirmo-nos deles 5 horas por dia durante 180 ou 200 dias por ano), m a s também nos novos anexos (biblioteca, laboratório, oficina, pátio de criação ou campo desportivo) que qualquer cooperativa agrícola ou fábrica, hospital ou gabinete incluirão. Nos anos oitenta, as despesas de educação deverão ser precisamente dedicadas à aplicação destas estruturas educativas, de modo a eliminar o fosso entre o mundo do trabalho e o mundo do saber, e a fabricar este novo ser, o trabalhador-estudante, o professor-aprendiz, que contribui directamente para o desenvolvimento, tal como o definimos.

FINALIDADE DA REFORMA

Nos anos oitenta, u m dos principais objectivos da reforma da educação consistirá e m lhe conferir u m a estrutura tal que se possam começar a corrigir as desigualdades que, no plano nacional e internacional, caracterizaram os sistemas de edu­cação dos anos sessenta e setenta, o que vai de encontro ao desejo da Organização das Nações Unidas que pretende eliminar, até meados do século xxi, a desigualdade de desenvol­vimento — mais u m a vez, tanto no plano nacional como inter­nacional — e contribuirá para a aeção a realizar 1. O impor­tante estudo, dirigido por Léontief, representa u m avanço real na análise e reflexão sobre o desenvolvimento; propõe diversos argumentos adaptados aos objectivos enunciados na Declaração referente à instauração de u m a nova ordem económica inter­nacional, segundo os quais a diferença de rendimentos entre países industrializados e países e m desenvolvimento, que era de 12 para 1 e m 1970, será apenas de 7 para 1 no ano 20002. O modelo mais frequentemente apontado e no qual se baseia esta conclusão compreende 45 sectores de actividade económica, 8 tipos de poluentes consideráveis e 5 tipos de actividades de redução da poluição e, de acordo com o mandato de que pre­cede, o estudo procura os meios de remediar a desigualdade dos rendimentos no plano internacional. O resultado é obtido, segundo este estudo, por inversão dos dados de desigualdade no interior de cada país. Assim, no sector «alimentação e agri­cultura» do modelo, são integradas a execução de «reformas agrárias e outras transformações sociais e institucionais» e a aplicação da enorme mão-de-obra subutilizada, condição a preen-

1. 1999. L'expertise de Wassily Léontief. Une étude de l'ONU sur l'écono­mie mondial future, p. 55, Paris, Dunad, 1977.

2. ORGANIZAÇÃO DAS N A Ç Õ E S UNIDAS, Resolução 3201 (S-VI) da Assembleia Geral, iNova Iorque, 1 de Maio de 1974.

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cher obrigatoriamente para superar os obstáculo® não tecno­lógicos à utilização mais extensiva dos solos e da produtividade; no sector do investimento e da industrialização, salientam-se as medidas especialmente destinadas a facilitar «uma repar­tição mais igualitária dos rendimentos nos países e m vias de desenvolvimento: os benefícios de u m aumento mais rápido do rendimento médio por habitante poderão, então, ser plena­mente partilhados» — e, e m primeiro lugar, pelas categorias mais desfavorecidas; os autores do estudo exigem, por fim, «reformas radicais nas estruturas sociais, políticas e institu­cionais dos países e m vias de desenvolvimento» que devem acompanhar «as modificações de ordem económica mundial». M a s , no estudo, faltam dois elementos ao educador. Trata-se, e m primeiro lugar, do papel que a educação deve desempenhar na realização do programa destinado a instaurar a nova ordem económica internacional, e, e m seguida, dos correctivos que convém introduzir, tanto no domínio da educação como nos outros, nas desigualdades existentes no plano interno e no plano internacional. Ora, no que se refere a este sector da educação omitido, de resto, no modelo, verifica-se que é invocado, indi­rectamente, por vezes de m o d o descuidado. Por exemplo, a propósito das condições que permitem assegurar o crescimento no sector da alimentação e da agricultura, o estudo aponta o aumento da produtividade da terra que, para atingir, nos países e m desenvolvimento, o nível actualmente alcançado pelas regiões desenvolvidas, exige u m a forte intensificação da inves­tigação e do desenvolvimento — e m especial com o fim de obter «as espécies vegetais e animais de rendimento optimal» nas condições naturais das regiões e países e m questão —, «a edu­cação dos camponeses» e a utilização da enorme mão-de-obra subempregada destas regiões para «intensificar o trabalho de melhoramento dos solos e de plantação». Convém desenvolver estas vagas alusões esporádicas e transformá-las n u m a verda­deira reforma da educação adaptada à nova ordem económica internacional, tal como é apontada pelos modelos estabelecidos pelas Nações Unidas. Esta reforma pretende inverter a ten­dência para as desigualdades crescentes em matéria de edu­cação entre países ricos e pobres, que marcou os anos sessenta e setenta. N o plano internacional, surgiram quatro tipos de desigualdades entre os dois grupos de países: desigualdade na repartição dos recursos para o ensino, desigualdade nas taxas de desenvolvimento da infra-estrutura, desigualdade nos resul­tados escolares e nível de instrução, desigualdade, por fim, no valor dos diplomas atribuídos. Nos anos oitenta, o fosso deveria começar a diminuir, de tal m o d o que, de acordo com o modelo económico internacional, esteja reduzido a metade no ano 2000 e completamente eliminado e m meados do século xxi. A outra série de desigualdades, igualmente graves, e m matéria de edu­cação situa-se no plano nacional. C o m efeito, existe, e m todos

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Reforma da educação e cooperação internacional nos anos oitenta

os países, desiguldade entre a repartição dos meios de ensino na cidade e no campo. N a verdade, o modelo escolar do meio industrial urbano é imposto às estruturas agro-rurais da socie­dade, e a educação é recusada à maioria dos adultos (60 a 90 por cento nos países e m desenvolvimento) ; existe desigual­dade entre rapazes e raparigas e m relação à escola, entre homens e mulheres na educação de adultos; existe, enfim, o preconceito de classe que marca o sistema escolar. Estudos sobre a repartição da educação n u m dos maiores países e m desenvolvimento salientam que 80 por cento daqueles que rea­lizam estudos escolares e universitários completos provêm de camadas sociais que constituem u m quinto da sociedade1. O facto desta desigualdade persistir m e s m o depois de se terem reservado, no momento das inscrições, 49 por cento das vagas disponíveis e m cada classe e cada disciplina para os que não tinham podido frequentar a escola, indica provavelmente que é inútil pretender assegurar a igualdade de acesso aos estabe­lecimentos escolares enquanto a colectividade sofrer de graves desigualdades socioeconómicas que não cessam de se acentuar. D e facto, as taxas de aproveitamento escolar e universitário reflectem a estrutura de classe da sociedade considerada, na qual 60 por cento dos indivíduos se situam abaixo do limiar de pobreza e e m que 20 por cento dos exploradores agrícolas possuem 70 por cento das terras aráveis. Neste contexto, á desigualdade e m matéria de educação alimenta-se e reforça-se a si mestma. A élite instruída assemelhanse a esse proprietário não residente ou a .esse fabricante possuidor de u m monopólio, os quais se encontram e m condições de assegurar u m rendi­mento que, no estado actual de desenvolvimento da educação nos diversos países, comporta u m elemento de renda capaz de perpetuar e reforçar as muralhas da desigualdade. N o inte­rior do país, a reforma da educação deve constituir u m dos elementos do combate travado pela maioria deserdada para aceder à igualdade e assegurar u m a participação e m todas as decisões de ordem política e económica ou referentes à edu­cação. Esta reforma, destinada a abolir as desigualdades, apre­senta ainda outro aspecto: o que consiste e m assegurar a igualdade de desenvolvimento da educação entre países e m desenvolvimento. A nova ordem económica internacional está votada ao insucesso se apenas alguns países e m desenvolvi­mento procederem às reformas necessárias da educação. A o nível mais elementar, se, por exemplo, a grande massa dos analfabetos continua a aumentar na maior parte dos países e m desenvolvimento, o mercado dos produtos industriais res-tringir-se-á necessariamente e atrasará o funcionamento e a industrialização dos países que se encontram e m condições de

1/ N C E R T , Field studies in the sociology of education, Nova Deli, 1971.

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avançar no plano económico e da educação. É por isso que se torna necessário que os anos oitenta marquem u m ponto de partida para a igualdade, no plano do desenvolvimento da educação, entre países ricos e países pobres, entre países do Terceiro M u n d o e, talvez mais ainda, entre os habitantes de cada país.

FUNDO D A REFORMA

Quanto ao fundo, a reforma da educação nos anos oitenta constituirá u m a reacção à transformação. Até agora, na ver­dade, a visão dos acontecimentos era muito simples. N o plano conceptual, equivalia a considerar todos os factos como enti­dades isoladas do contexto n u m modelo abstracto. Nesta espé­cie de quadro inamomível, a educação tinha u m carácter fun­damental da estabilidade, de continuidade sem imprevistos.

É este mundo que abandonamos, para entrar n u m universo e m vertiginosa mutação, do qual a Comissão Internacional da U N E S C O esboçou u m quadro tão vivo e m Apprendre à être1. Para ailém de tudo isto, existe o salto eim frente da ciência e da tecnologia tantas vezes descrito e a propósito do qual Apprendre à être nos diz que «tudo nos leva a crer que esta progressão do saber e dos poderes do h o m e m , que adquiriu u m aspecto vertiginoso nos últimos vinte anos, está apenas no início» 2. Até m e s m o u m a transformação de ordem puramente quantitativa — o facto, por exemplo, de a população mundial ter duplicado até ao fim deste século 3 — terá efeitos dramá­ticos sobre a oferta de produtos alimentares, a exploração dos recursos e a poluição, a educação, a saúde e a infra-estru-tura normal do desenvolvimento.

N o s países e m desenvolvimento, considera-se u m a derrota para o sistema de ensino e u m desonra para o sistema social pertencer ao número dos que abandonam, voluntariamente ou não, a escola antes do fim dos estudos. Estes países exer­cem grandes esforços sobre tudo o que pode contribuir para aumentar o poder de retenção do sistema escolar e, como não conseguiram, deste modo, dissipar o mal-estar resultante das desistências, voluntárias ou não, voltam-se actualmente para diversos programas de educação extra-escolar para proporcio­nar, para além do sistema, u m a instrução elementar mínima e possibilidades de estudos mais desenvolvidos e de educação permanente. Nos países industrializados, pelo contrário, a ideia de que a desistência dos estudos deveria constituir a regra e ser estimulada nos alunos mais velhos parece ganhar terreno. E m vez de preparar os jovens para a civilização industrial, a escola incita-os a sair da via de sentido único, a descer do

1. Apprendre à être, pp. 99 a 181, Paris, UiNESCO-FayaUd, 1972. 2. Ibid., p. 102. 3. De acordo com as projecções demográficas médias das Nações Unidas.

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Reforma da educação e cooperação internacional nos anos oitenta

tapete rolante que o sistema escolar representa, para seu b e m e da sociedade.

N ã o é, pois, unicamente a rapidez com a qual os aconte­cimentos se sucedem no nosso mundo que é excepcional; não é apenas a natureza destes acontecimentos, a qual não se adapta a nenhum dos sistemas conhecidos — astral, biológico ou eco­nómico — m a s corresponde a u m a série de roturas de sistemas, que é surpreendente; não é apenas o seu efeito sobre os valo­res morais e espirituais— e m especial a perspectiva do agra­vamento das desigualdades, da exploração e da iniquidade — que exige a nossa atenção : é todo este conjunto, ao qual deve­mos acrescentar aquilo a que chamamos a transformação, que faz, a partir de agora, parte integrante da vida quotidiana da nossa época e da nossa sociedade, a ponto de só podermos estar certos de que os anos oitenta não são como os anos setenta, de que a educação, neste contexto, pode e vai tornar--se u m a variável social independente e, paia o Terceiro Mundo , o instrumento e o reflexo de u m a sociedade mais madura e mais justa.

Cooperação internacional para a reforma da educação

DISSOCIAÇÃO

A cooperação internacional deverá, à partida, prosseguir o pro­cesso de dissociação nos contactos, análises e acções comuns interpaíses iniciada nas conferências regionais para a educação nos anos sessenta conducente à constituição de unidades e de subunidades mais homogéneas. A este respeito, o modelo da Organização das Nações Unidas poderia servir de inspiração. N a base do rendimento, este modelo subdivide a economia mundial e m quinze regiões e a economia de cada região é ven­tilada e m quarenta e cinco sectores de actividade. Regiões e sectores são, e m seguida, reunidos por u m mecanismo complexo de ligações n u m modelo de análise global. D o ponto de vista da reforma da educação, as cinco regiões tradicionalmente con­sideradas pela U N E S C O merecem ser subdivididas, desta vez e m função do nível de reestruturação, de renovação e de ino­vação atingido pela educação e m cada país. Se aplicássemos este critério à região da Ãsia, por exemplo, seria tentado a subdividir esta região e m cinco subregiões e a promover, no interior de cada u m a delas, os contactos, a elaboração de planos e programas e a execução de projectos comuns.

ENQUADRAMENTO

Quer tenha por objectivo o aumento da produtividade interna ou a renovação e a reestruturação exigidas pela teoria da educação permanente, ou ainda a redução das desigualdades no plano internacional e no plano nacional, ou pretenda trans-

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formar a educação n u m agente entre outros ou n u m agente único de transformação, a reforma da educação deve ser for­mulada e m diversos painéis a escolher pelo grupo de países interessados para os anos oitenta ou noventa, e até ao fim do século. Tendo e m vista os painéis a estabelecer para a edu­cação nos grupos de países dissociados acima apontados, talvez fosse mais fácil reter a divisão, nas quinze subregiões, operada pelas Nações Unidas, pois é necessário, para cada região, que o paiinejl da educação seja elaborado no âmbito e na linha do painel de desenvolvimento mais geral, estabelecido pelas Nações Unidas. O que significa, por exemplo, que será ne­cessário utilizar a cooperação internacional para estabelecer três ou quatro painéis aplicáveis a cada u m das 5 subregiões da região do Programa Asiático de Inovações Educativas Tendo e m Vista o Desenvolvimento (APEID) que corresponde à divi­são efectuada pelas Nações Unidas para esta região. Seria necessário que pelo menos u m dos painéis previstos para cada u m a destas subregiões conduzisse a u m a reforma capaz de reduzir para metade, até ao fim do século, as desigualdades e m matéria de educação no plano internacional. Deveria, então, ser possível deduzir o quadro para os anos oitenta. Este método do painel elimina o das projecções aplicado nos anos sessenta e setenta; enunciam-se, para o fim dos anos oitenta ou para o fim do século, finalidades e objectivos de ordem qualitativa, de acordo com os quais se fixam diferentes orientações da reforma para cada subunidade.

A COOPERAÇÃO ENTOE OS PAISElS DO TERCEIRO M U N D O

U m dos elos que falta no desenvolvimento internacional e no movimento mundial a favor da educação é a ausência quase total de cooperação entre os países do Terceiro Mundo . Até agora, esta cooperação reduziu-se a belas frases e a resolu­ções sem consequências. Ora, quando se trata de reforma da educação (contrariamente ao que se passa e m matéria de corentes de capitais, ou de contactos comerciais), a comunidade e a identidade de problemas e de soluções — sobretudo neste domínio fundamental dos programas destinados a corrigir as desigualdades e as injustiças da sociedade e da educação no plano nacional — militam a favor de u m a cooperação com o Terceiro Mundo e no seu interior. Tratando-se de u m domínio politicamente explosivo, socialmente delicado, impossível de relegar para último plano do ponto de vista moral e económico, só a cooperação com o Terceiro Mundo e no seu interior é pra­ticável e pode ser frutuosa. Os agrupamentos dissociados e os painéis efectuados proporcionam u m a base normal e natural à cooperação dos grupos e subgrupos de países do Terceiro M u n d o na reforma da educação.

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Reforma da educação e cooperação internacional nos anos oitenta

Estratégia internacional da reforma

Partindo destes enquadramentos subregionais dissociados, seria possível elaborar u m a estratégia internacional tendo e m vista a reforma da educação, a qual constituiria u m elemento da nova ordem económica internacional e da estratégia interna­cional do desenvolvimento para o III Decénio. Esta estratégia internacional para transformação da educação no mundo seria realizada a partir de u m conjunto de políticas concertadas de reforma que, por u m lado, completaria o esforço de integração económica regional previsto no estudo sobre o futuro da eco­nomia mundial realizado para as Nações Unidas e, por outro, consideraria a utilização e m c o m u m de toda a espécie de meios e de circuitos. Seguem-se alguns dos domínios e m que a re­forma rápida e profunda da educação exigirá necessariamente a gestão conjunta e a utilização colectiva de vastas infra--estruturas.

DEMOCRATIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO

O desenvolvimento quantitativo da educação escolar nos anos sessenta e setenta, devido a diversos estímulos, como bolsas de estudo, gratuidade ou preços subsidiados dos manuais, gratuidade dos uniformes escolares, das refeições durante o dia e de habitação, deverá ser completado de m o d o intensivo, ou até, e m certa medida, substituído: a) por u m programa de educação de adultos tendente, e m particular, a alfabetizar os 820 milhões de analfabetos que representarão, nesse m o ­mento, 29 por cento da população adulta — ltrata-se de pro­gramas a aplicar o mais rapidamente possível para lutar contra o desemprego e o subemprego de 300 milhões de pessoas1 e de programas que permitam iniciar o desenvolvi­mento rural integrado2, que constituem o programa de edu­cação e de alfabetização dos adultos; b) por u m sistema de educação extra-escolar com tudo o que implica de horas, locais, modos de aprendizagem e programas intensivos de estudos para todos aqueles que sie mantêm afastados da escola, por terem sido obrigados a deixá-la ou forçados a abandoná-la pela si!m-pfes razão de serem pobres ; c) por uim sistema de aprendizagem compensatório destinado aos inúmeros aprendizes da primeira geração, de tal modo que a igualdade de ajcesso à educação possa favorecer a igualdade da instrução adquirida. Todo este

1« GABINETE INTERNACIONAL D O TRABALHO, L'emploi, la croissance et les besoins essentiels. Problème mondial, Genebra, 1976.,

2. U N E S C O , L'éducation en milieu rural, Paris, 1974, 65 p.; Développe­ment économique et programmation de l'éducation rurale, Paris, ¡1966; G O V E R N O I N D I A N O , A programme of integrated rural development, Nova Deli, 1976, 22 p.; U N E S O O / P í N U D , Programme experimental mondial d'alphabétisation: évaluation critique, Paris, 1976, 231 p.

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trabalho de democratização representa u m dos nueios de come­çar a eliiiiiinar as desigualdades existentes e m matéria de edu­cação, tanto no plano internacional como nacional.

TECNOLOGIA E INFRA-BOTRUTURA DA EDUCAÇÃO

Para satisfazer a enorme clientela dos anos oitenta, será ne­cessário, por u m lado, utilizar colectivamente, no plano multi­nacional, toda a g a m a de instrumentos electrónicos e, por outro lado, empregar manuais e fichas de ensino programado para assegurar a grandes grupos u m a aprendizagem individualizada e progressiva. A rádio e a televisão poderão igualmente, graças a u m a organização colectiva da m e s m a ordem, proporcionar a cada estabelecimento e a efectivos de adultos e de alunos, cada vez mais importantes, u m a educação de qualidade e m ó ­dulos de aprendizagem variados, destinados a despertar o inte­resse, o que, actualmente, está reservado para certos estabele­cimentos de élite. Sobre este ponto, podemos remeternnos a u m programa de cooperação internacional para organizar a exploração colectiva de infra-estruturas importantes assentes e m sistemas de comunicação de técnica avançada, cuja utili­zação e m escala reduzida por países isolados não seria ren­tável, apresentando m e s m o efeitos negativos. Entre estas infra--estruturas colectivas poderiam figurar os satélites de recepção directa, os bancos de programas audiovisuais e a produção c o m u m de material de ensino e de aprendizagem. Além disso, será igualmente necessário apelar para a cooperação interna­cional para que, nos anos oitenta, os países e m desenvolvimento se libertem u m pouco da importação de produções industriais de carácter educativo que lhes chega, actualmente, dos países avançados. D e acordo com a divisão internacional do trabalho que reina actualmente, sociedades multinacionais fabricam e fornecem, ou montam através das suas filiais situadas nos países do Terceiro Mundo , certos produtos de carácter educa­tivo que reclamam u m a infra-estrutura industrial: papel, cane­tas e lápis, manuais e obras de consulta, aparelhos audiovisuais para filmes e bandas video, material científico simples ou com­plexo, laboratórios e bibliotecas ; seria necessário instaurar outra divisão do trabalho suscitando a criação, nas subregiões consi­deradas, destas indústrias educativas para alimentar o enorme mercado que oferecem os países da região e atenuar, assim, a hemorragia de recursos que a importação dos produtos de infra-estrutura educativa impõe actualmente a estes países e m desenvolvimento. Tratasse de u m domínio e m que é necessário realizar u m a política colectiva e concertada para proceder aos estudos de mercado e assegurar as contribuições necessárias e m capital e habilidade técnica tendo e m vista a criação desta indústria educativa destinada a satisfazer a procura massiva dos países e m desenvolvimento.

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Reforma da educação e cooperação internacional nos anos oitenta

ORDENAMENTO DOS PROGRAMAS DE ESTUDO

Neste domínio, os grandes problemas, de resto independentes, que exigirão o exercício da cooperação internacional são o desemprego, o desenvolvimento rural e a escala de valores. Nos países e m desenvolvimento, a relação entre o programa de estudos e os objectivos e m matéria de emprego dá origem a u m vasto debate. C o m o já vimos, este debate assume u m a nova acuidade dadas as perspectivas de desemprego massivo que atinge os países, os pais e os alunos. O problema não existe para os programas de educação de adultos e outras formas de educação extra-escolar porque preparam especifi­camente para determinados tipos de emprego e de ocupação independente. São os programas de estudo dos estabelecimentos escolares que devem absolutamente acomodar-se, pois a sua falta de relação com o emprego conduz a u m a redução dos efectivos. Neste aspecto, a utilidade da cooperação entre países consistirá e m substituir os produtos actuais do sistema escolar não utilizáveis por produtos garantidos utilizáveis graças ao estabelecimento de normas e de metodologias fixadas de c o m u m acordo. Além disso, é necessário considerar a relação dos pro­gramas de ensino com as necessidades do desenvolvimento rural. Por outro lado, deve substituir-se o modelo escolar actual­mente utilizado nos países e m desenvolvimento, resultante do complexo industrial urbano dos países industrializados. A o nível do ensino superior, a tarefa é mais complexa e poderíamos, e m primeiro lugar, tomar iniciativas a curto prazo, destinadas essencialmente a conferir às disciplinas tradicionais u m a orien­tação rural, isto é, a basear estas disciplinas nas necessidades da colectividade rural, completado-as com u m ensino prático e m relação com a matéria de base. O método de aprendizagem consistirá, então, para o estudante, e m aplicar os seus conhe­cimentos teóricos a u m a situação rural, trabalhando na exe­cução de projectos ou e m divulgação, o que é mais ou menos a prática das Universidades agronómicas. Neste sistema, por exemplo, o curso superior clássico de Ciências Políticas com­preenderia, a título subsidiário, o estudo da administração do desenvolvimento à escala da comunidade e do distrito; o curso de Economia Doméstica englobaria, secundariamente, a pro­dução alimentar, a tecnologia da conservação, e m especial das culturas, a utilização da energia e a reciclagem dos detritos; e o curso de Química estender-se-ia acessoriamente à análise dos solos e da água, à dosagem dos adubos e ao estudo dos pesticidas1. M a s , a mais longo prazo, a tarefa a que a coope­ração poderá, desde já, dedicar-se, é à instauração de novas especialidades — com os seus conceitos, quadros, métodos e

¡L M . S- A D I S E S H I A H , The university in 1975, p. 36, Madras, 1976; The uni­versity in 1976, p. 44, Madras, 1977.

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metodologias — que resultarão dos recursos de que são dota­das as diversas subregiões e m causa e o seu sistema de valores culturais.

FORMAÇÃO DOS ¡PROFESSORES

Foi objecto de u m a cooperação multinacional e internacional intensa nos anos sessenta e setenta, mas novas perspectivas se lhes abrirão nos anos oitenta. O papel do professor consis­tirá, mais, a partir de agora, e m facilitar a aprendizagem do que e m apresentar prodígios pedagógicos; ele será obrigado a preparar-se por si só e a preparar os alunos para abordar o futuro desconhecido, e m vez de lhes transmitir u m passado glorioso; ele representará o traço de união, por vezes o luta­dor, que eliminará dos programas de estudo o desfasamento entre a aparência — isto é, os belos discursos sobre a objec­tividade, a verdade, a igualdade, os direitos do h o m e m e a paz — e a realidade oculta, que favorece o statu quo, as desi­gualdades, o elitismo, e muitas formas de corrupção e de vio­lência individuais e sociais. Os diversos tipos de formação a fornecer aos professores para enfrentar estas necessidades do futuro exigem u m poder de animação central e u m a cooperação multinacional, pois os países não podem empenhar-se isolada­mente. E , para o ensino superior, coloca-se u m problema suple­mentar: contrariamente a u m a certa necessidade de «despro-fissionalização» que se faz sentir e m medicina, arquitectura e até e m engenharia, nos países e m desenvolvimento, torna-se necessário «profissionalizar», e m certa medida, o ensino técnico superior e o ensino universitário, pois, nestas sociedades, é a única profissão para a qual não existe nenhuma preparação. Ora, nos anos oitenta, os membros desta profissão constituirão u m a legião e exigirão poder manter-se à altura desta explosão do saber e da informação típica da época. Mais u m a vez, im­porta elaborar programas multinacionais de formação profis­sional dos professores do ensino superior.

AVALIAÇÃO E RECOMPENSAS

Entre as tarefas a realizar com a ajuda da cooperação inter­nacional, nada é mais urgente do que a abolição do sistema de exames seguidos de recompensas a que a sociedade está sub­metida e m todos os aspectos: o aluno que estuda não para aprender m a s para ser admitido a exame, o professor e os pais que exercem todos os seus esforços com este único fim, e o sistema das recompensas reservadas a estes sinais e a esta espécie de educação pelos empresários do sector público, e do sector privado, do sector industrial moderno e do sector agrí­cola tradicional. Neste caso, não se trata apenas de u m a vasta reforma do sistema de exames e da elaboração de u m sistema de avaliação que possa tornar-se instrumento de aprendizagem e de auto-educação acompanhando as vias pelas quais as pes-

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Reforma da educação e cooperação internacional nos anos oitenta

soas e os grupos pretendem enveredar, tanto do ponto das aquisições como das finalidades — materiais e intelectuais, in­dividuais e sociais. Facto mais grave ainda, o sistema de exames seguidos de classificações, certificados, diplomas, ao qual se liga u m sistema de recompensas irracional e anti-social, favo­rece e justifica as desigualdades no interior dos países e entre os países. O êxodo dos cérebros está relacionado com esta situação. N ã o seria possível começar, nos anos oitenta, a inte­grar a avaliação no processo de aprendizagem e a desligá-la dos sistemas injustos de recompensas actualmente e m vigor, inspirándole aproximadamente no que hoje e m dia se tenta fazer na China ou e m outros países socialistas?

GESTÃO E FINANCIAMENTO

O empreendimento da educação, só pela sua imensidade, apre­senta problemas particulares de organização e de gestão. Mais u m a vez, poderíamos, pelo menos, começar verdadeiramente a criar u m modo de organização adaptado à extensão da tarefa e às necessidades particulares do indivíduo que aprende, da uni­dade local de aprendizagem e do distrito. Assistimos sempre, e por toda a parte, ao dilema da conciliação entre, por u m lado, a centralização das directivas políticas e das estratégias decorrentes dos objectivos e finalidades de todo u m país ou subregião e, por outro, a descentralização das decisões que constitui u m pré-requisito indispensável a toda a aprendizagem. Os centros subregionais deverão empenhar-se na planificação destes novos sistemas de gestão, na formação que exigem e na sua exploração. N o que se refere às perspectivas finan­ceiras, sabemos que a aprendizagem é dispendiosa: u m sistema de educação descentralizado e renovado sê-lo-á ainda mais. Impõem-se, neste aspecto, duas observações, de resto ligadas entre si. E m primeiro lugar, o financiamento regular das re­formas da educação dependerá sem dúvida, e m certa medida, da assistência internacional, financeira e técnica, fornecida aos diversos programas de reforma multinacionais e nacionais, a qual deverá duplicar nos anos oitenta; m a s este financiamento será sobretudo, e muito mais eficazmente, assegurado pelas medidas que permitirão aos países e m desenvolvimento não produtores de petróleo reduzir o défice da sua balança de paga­mentos, que será da ordem dos 80 mil milhões de dólares no fim dos anos oitenta1. C o m efeito, este défice poderia consti­tuir o principal obstáculo à renovação da educação que aqui consideramos e a principal condição prévia destas reformas dos anos oitenta será a transformação de ordem económica mundial, tal como está prevista pellas Nações Unidas: a) os países e m desenvolvimento reduaem a sua taxa de dependência

<U 1999..., op. Cit., p. 33.

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Malcolm S. Adiseshiah

e m relação às importações e aumentam as saias exportações mundiais; fe) os países industrializados reduzem as barreiras tarifárias e outras no comércio internacional; c) redução do encargo financeiro provocado pelos investimentos estrangeiros nos países e m desenvolvimento (a saída de capital com destino aos países industrializados corresponde a 15 por cento do PIB destes países ou a três quintos das suas receitas de expor­tação) \ A nossa segunda observação é a seguinte: enquanto impor­tantes recursos, de origem nacional e estrangeira, forem mobi­lizados para financiar as reformas da educação nos anos oitenta, os países deveriam corajosamente estabelecer o balanço técnico, financeiro e administrativo da boa ou m á utilização dos re­cursos existentes — financeiros, materiais e humanos — no seu sistema de educação. C o m efeito, mais de 90 por cento das despesas de ensino destinam-se simplesmente a cobrir compro­missos de despesas renováveis há dez, vinte ou trinta anos: remuneração dos professores, administração, reparação e con­servação dos edifícios e do material, etc. N o Estado de Tamil Nadu, verificámos o seguinte: o) os compromissos de despesas renováveis aborvem 97 por cenito do orçamento anual da edu­cação; &) sob estas despesas de carácter permanente dissi­mula-se muita «inépcia» herdada do passado; c) a tradição decidiu financiar toda a modificação ou reforma através de créditos suplementares — é o que designamos por «proceder por adição» ; d) verificámos igualmente que era possível, desde já, libertar 20 por cento dos créditos destinados às despesas correntes, actualmente «desperdiçados», para financiamento dos programas de reforma e de inovação prontos a aplicar. A coope­ração internacional — ao nível subregional — poderia contribuir para a emergência destes recursos ocultos e enunciar direc­tivas para a sua exumação2.

1< M . S. A D I S E S H I A H , Some thoughts on Adam Smith's doctrine of division of labour: A. Ramaswamy Mudaliar lectures, p. 22, Trivandrum, Uni­versity of Kerala, 1976.

2, Government of Tamil Nadu: Report of the Education Finance Com/mOs-sion, Madras, 1975, 123 p.

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Posições / Controvérsias

Por que não é

a investigação pedagógica

mais útil?

Afirmar que dificuldades consideráveis invadem os nossos sis­temas educativos é certamente u m eufemismo. O s problemas causados pela expansão prodigiosa do ensino nos anos sessenta persistem no Terceiro Mundo e conjugam-se com os da desi­gualdade perante a educação e com a pletora dos diplomados nas sociedades industriais. Tem-se reflectido sobre a educação, seus métodos de financiamento, sua estrutura e organização, sobre os programas escolares e a formação dos professores e, nestes últimos anos, foi posta e m causa a opinião segundo a qual a escola pode ser utilizada para promover a transfor­mação social e a igualdade.

Perante estes problemas particularmente difíceis, muitas nações lançaram programas ambiciosos de investigação e de avaliação pedagógica, a fim de contribuir para a definição de u m a política da educação. Basearam os programas e m quesn toes de ordem prática — ordenamento dos planos de estudo, reforma do ensino, formação dos professores, utilização de técnicas pedagógicas — e e m questões de ordem mais .geral : como se processa a aquisição de conhecimentos no adolescente, quais os efeitos da educação sobre o rendimento e o nível pro­fissional, quais são os factores determinantes do nível de ins­trução, etc. Criaram-se instituições nacionais para coordenar e financiar a investigação e a avaliação pedagógica, na espe­rança de que investigações sistemáticas e bem conduzidas esclarecem as necessidades e os problemas educativos sobre os quais era necessário reflectir.

A fim de alimentar esta chama de interesse pela investi­gação e pela avaliação pedagógica, quase todas as sociedades, tanto nos países industriais como nos países e m desenvolvi­mento, instituíram programas com o fim de formar especia­listas e m investigação pedagógica. Procuraram novos métodos de investigação, de tal modo que o estudo tradicional de peda­gogia deu origem a contribuições cada vez mais importantes de disciplinas como a Psicologia, a Sociologia, a Antropologia,

Henry M . Levin

Henry ¡M. ¡Levin ((Estadas Unidos da América). Especialista em economia de educação e dos recursos humanos. Professor nos departamentos de educação e de economia da Universidade Stanford. Autor de numerosas publicações na sua especialidade, escreveu recentemente, em coperação com Martin Carnoy, The lioilts of educational reform.

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Henry M . Levin

a Economia, as Ciências Políticas e a Estatística. Esta evo­lução foi vivamente estimulada por instituições internacionais como a U N E S C O , a Organização de Cooperação e de Desenvol­vimento Económicos ( O C D E ) , o Instituto Internacional de Planificação da Educação ( U P E ) , o Conselho da Europa, o Banco Internacional para a Reconstrução e o Desenvolvimento ou «Banco Mundial», a Organização dos Estados Americanos ( O E A ) , assim como por numerosas fundações privadas. Estes organismos patrocinaram projectos de investigação e de for­mação com o fim de preparar pessoal especializado e de pro­ceder a certos estudos, patrocinaram conferências e publica­ções, a fim de que o conteúdo destas investigações e suas conclusões fossem objecto de debates e de ampla difusão. Além disso, lançaram alguns grandes projectos internacionais de in­vestigação comparativa sobre problemas de política geral, como o ensino pós-secundário, a escola secundária de tipo polivalente, o financiamento da educação, a educação permanente ou «al­ternada»; de todas estas actividades, a mais ambiciosa talvez tenha sido a avaliação internacional dos resultados da educação efectuada pela Associação Internacional da Educação, sob a direcção do psicólogo sueco Torsten Husèn. Nesta série parti­cular de estudos, examinaram-se, e m vinte e u m países, os factores que determinavam o sucesso escolar nas seguintes disciplinas: Matemática, Ciências, Línguas Estrageiras, Leitura, Literatura e Educação Cívica. Para dar u m a ideia da extensão desta empresa, durante as últimas fases do inquérito, recolhe-ram-se, e m 19 países, dados e m 14 línguas referentes a 9700 escolas, 50 000 professores e 258 000 alunos, e extraíram-se conclusões que foram publicadas e m nove grandes volumes dedicados a temas como a importância respectiva, nos países e m causa, do meio familiar e dos factores escolares sobre o nível de instrução atingido.

Contudo, apesar destes esforços e de alguns êxitos notáveis, o optimismo que tinha acompanhado inicialmente a expansão e o melhoramento da investigação pedagógica começa a ceder lugar a u m ceptimismo cada vez mais acentuado por parte dos responsáveis políticos, como testemunha o vigor com que exigem mais espírito prático do investigador pedagógico, criti-cando-o por não se interessar pelo que é verdadeiramente im­portante e exigindo-lhe remédios para os grandes problemas causados pela educação. C o m o testemunha, talvez ainda mais eloquentemente, a dificuldade cada vez maior com que a inves­tigação pedagógica disputa aos outros serviços públicos os fundos públicos e privados. Nos Estados Unidos da América, por exemplo, o National Institute for Education não conseguiu obter do Congresso novas aberturas de crédito, nem sequer para compensar a subida dos preços.

A investigação pedagógica parece, pois, entrar n u m a fase e m que deverá justificar a sua existência, devendo surgir pelo

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Por que não é a investigação pedagógica mais útil?

menos u m a questão: Por que não pode a investigação peda­gógica contribuir mais para a solução de problemas de política geral? Poderíamos limitar-nos a responder que a sua utilidade estará precisamente à medida do seu volume e da sua qualidade e que este volume e esta qualidade estão juntamente ligados a u m aumento dos créditos, à formação e à actividade dos investigadores. Esforçar-me-ei, porém, por mostrar que a «uti­lidade» da investigação pedagógica é u m problema que conti­nuará certamente a coloear-se, sejam quais forem a qualidade e o volume. Esforçar-me-ei também por mostrar que ele parece prender-se mais com as diferenças existentes entre a investigação e a política no que se refere ao seu contexto, aos seus métodos e ao seu próprio papel. Tentarei, por fim, descrever algumas destas diferenças e analisar as consequências que daí resultam.

Política da educação

Por política da educação entendo a orientação conferida ao sistema educativo, assim como a aplicação das decisões toma­das para realizar esta política. D e acordo com a organização da educação característica de determinada sociedade, este pro­cesso pode ser muito centralizado (à escala da nação ou da região, por exemplo), ou situar-se a u m a escala inferior, como o da academia, do estabelecimento ou até m e s m o da classe. E m cada u m destes níveis será necessário decidir da natureza e do alcance do sistema, determinar as necessidades e m pessoal, fixar os programas, avaliar as carências financeiras e definir os outros factores que influem sobre as modalidades e os resulta­dos da acção a desenvolver. Neste breve artigo, estudarei essen­cialmente a política de educação à escala nacional ou regional, podendo efectuar-se a m e s m a análise para as escalas inferiores.

N a s escalas superiores, as decisões são normalmente da competência dos homens designados para este feito pelo poder e m exercício e pelos seus serviços. Por outras palavras, os «decisores» mais importantes devem o seu lugar ao facto de pertencerem ao partido no poder; a sua política deve, portanto, ser compatível com a do governo. E m segundo lugar, são recru­tados e m u m ou dois ministérios ligados à educação; exercem, pois, pouco ou nenhum controle sabre outros doaxiinioa, coimlo a política da saúde, a habitação, o desenvolvimento económico, o fisco ou o trabalho. E m geral, não receberam formação e m matéria de investigação sobre a educação e as decisões a tomar referem-se a u m período relativamente curto. O que significa que não podem esperar durante muito tempo u m a resposta, e m particular quando o problema é urgente ou as eleições ou certas transformações políticas se aproximam.

Se este breve resumo do papel do responsável pela edu­cação é exacto, podemos perguntar e m que é que a investigação no domínio da educação pode ser útil à função política. Talvez

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seja conveniente apontar certos aspectos importantes. E m pri­meiro lugar, o investigador deve interessar-se pelos problemas que se apresentam ao responsável político.

E m segundo lugar, deve entregar-lhe as conclusões e m tempo útil, para que ele possa tomar a decisão adequada. E m terceiro lugar, deve enunciá-las e m termos compreensíveis para o h o m e m c o m u m . E finalmente, e m quarto lugar, não deve ignorar os condicionalismos de natureza política a que está sujeito o responsável político.

D o primeiro critério podemos concluir que investigações, m e s m o excelentes, m a s não centrados nos domínios e m que devem ser tomadas medidas devem ser consideradas sem in­teresse para o responsável político. Por outro lado, as in­vestigações mais úteis são as que o podem ajudar a resolver os seus problemas. O factor tempo também é muito importante. Se o responsável político dispõe apenas de algumas semanas para tomar decisões, a perspectiva de conhecer as conclusões do investigador e m vários meses ou vários anos não lhe pode prestar grande ajuda. Torna-se, pois, importante, que o inves­tigador seja capaz de iniciar u m trabalho de investigação e de o terminar rapidamente. E m terceiro lugar, como os res­ponsáveis políticos não estão, e m geral, habituados ao trabalho de investigação, têm dificuldade e m compreender a linguagem e as técnicas muito especializadas do investigador pedagógico. Os estudos deverão, portanto, ser-lhe apresentados de u m a maneira compreensível para u m não-iniciado.

Finalmente, as investigações pedagógicas serão úteis na medida e m que as suas conclusões e os seus prolongamentos convidem a tomar medidas que tenham e m conta os constran­gimentos a que está submetido o responsável político. U m ministro da educação que represente a ideologia e o partido político da classe dirigente não se sentirá atraído por conclu­sões que insistam na necessidade de modificar completamente as estruturas das grandes instituições políticas e sociais ou que dêem a entender que as condições de vida das massas deserdadas, e m especial no plano da educação, se devem essen­cialmente à exploração dos trabalhadores pelo patronato. Con-vencer-se-á de que a reforma da sociedade não é, de modo nenhum, da sua competência. D e facto, a investigação e m matéria de educação só será útil na medida e m que as con­clusões tendam a acentuar as orientações do governo no poder e lhe permitam resolver os seus problemas limitando-se a pe­quenas reformas marginais.

A investigação pedagógica

M a s , e m que é que estes critérios de utilidade que acabo de esboçar são compatíveis com a própria natureza da investigação pedagógica? Podemos afirmar que esta investigação representa

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Por que não é a investigação pedagógica mais útil?

u m a tentativa sistemática de definição, por u m lado, dos fac­tores e dos modos de organização que influem sobre os resul­tados escolares e, por outro lado, dos efeitos destes nos planos individual e social. O que poderá conduzir o investigador a examinar os factores que determinam, por exemplo, os resul­tados escolares, as mentalidades, os traços de carácter, o sen­tido cívico, a estudar a relação entre estes diversos elementos e os que marcam a vida do adulto, como o rendimento, o sucesso, a participação na vida política, as realizações artísticas ; poderá igualmente ser conduzido a estudar a relação entre os inves­timentos consagrados à educação e à formação e o crescimento económico e a que existe entre as transformações introduzidas nas possibilidades de educação e nas alterações na repartição do rendimento. A investigação pedagógica, no sentido lato do termo, refere-se essencialmente ao processo da educação como causa e consequência das características dos indivíduos, à orga­nização e às práticas do sector do ensino e às instituições da sociedade da qual é emanação.

O investigador poderá estudar a influência de determina­dos professores ou programas sobre os resultados dos alunos ou o efeito da integração étnica ao nível escolar sobre as atitudes culturais. Poderá concentrar o seu estudo sobre a in­vestigação dos métodos apropriados para avaliar os progressos dos alunos elaborando instrumentos que permitam medir os traços de carácter e os resultados escolares. Talvez procure saber por que é que certas escolas obtêm melhores resultados do que outras ou qual é o modo de funcionamento que permite alcançar os melhores resultados. Poderá igualmente tentar determinar de que m o d o os investimentos consagrados à edu­cação influem sobre o crescimento do rendimento nacional e modificam a sua repartição.

C o m o desempenhará estas diversas tarefas? Oferecem-se--Ihe quatro possibilidades, entre as quais escolherá, de acordo com a natureza do problema. Optará pelo método experimental sempre que possa respeitar as suas regras, isto é, sempre que possa submeter de maneira aleatória os alunos a diversos tipos de ensino e observar se os efeitos são diferentes tendo e m conta o resultado que se procura atingir (por exemplo, a aprendizagem da leitura). Este método pressupõe que é pos­sível aplicar os tipos de ensino e m questão durante u m período de tempo razoável a grupos diferentes, sem que os outros factores variem. Supõe igualmente u m a repartição aleatória dos alunos por estes grupos.

Ora, estas duas condições raramente se encontram preen­chidas. Só e m ocasiões excepcionais é possível submeter os alunos, indiferentemente, de modo aleatório, a longas expe­riências pedagógicas ou modificar sistematicamente as expe­riências ou tipos de ensino. É preferível tentar avaliar os efeitos das experiências pedagógicas e m curso sobre os alunos no seu

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meio educativo natural. Aplicando, então, u m método quase experimental, o investigador procura isolar, graças a métodos estatísticos e outros, a acção específica dos factores que influem sobre os resultados escolares. Foi o método seguido pelos in­quéritos internacionais sobre os resultados escolares, onde se procurou determinar as influências respectivas do meio familiar e da escola sobre os resultados obtidos pelos alunos em, diversas matérias. Podemos também aplicar este método para tentar descobrir os efeitos a longo termo da educação, muito depois do fim da escolaridade. Assim, tem-se procurado investigar os efeitos que os resultados escolares têm sobre os salários e o nível profissional, determinando a ligação existente entre múltiplos factores como o meio familiar e os resultados esco­lares, por u m lado, e os salários e as actividades profissionais do adulto, por outro lado. C o m o é evidente, seria impossível realizar u m a experiência e m que se submetessem crianças, de m o d o aleatório, a diversos tipos de ensino mais ou menos desenvolvidos para determinar os efeitos daí resultantes vinte anos mais tarde, quando forem adultas. N o entanto, podemos fornecer u m a resposta aproximada para este problema apli­cando u m método quase experimental e m que as influências pertinentes são controladas estatisticamente.

U m terceiro método é o do estudo analítico de carácter filosófico: o investigador esforça-se por fornecer u m a res­posta aos problemas apresentados traçando u m quadro lógico que lhe permita apreender as implicações das diversas pre­missas e poderá, e m seguida, combinar este método com u m dos métodos empíricos de que já falei. Suponhamos que se pre­tende, por exemplo, examinar como se deve abordar a educação moral e m determinada sociedade. O investigador começará por definir as premissas do comportamento moral apropriado e, depois, esforçar-se-á por relacionar este comportamento com certas experiências pedagógicas a que se ligam logicamente.

A investigação histórica constitui u m a quarta ma,neira de abordar a investigação pedagógica. O investigador esforça-se, neste caso, por observar como os movimentos e os aconteci­mentos históricos estão ligados à formação e à modificação dos sistemas educativos e como a educação influi sobre a transformação social. Procura, assim, apreender o processo de transformação da educação e de transformação social que daí decorre pela compreensão do seu contexto histórico.

Os investigadores que aplicam estas técnicas encontram-se provavelmente e m grandes universidades e organismos gover­namentais especializados, como os centros nacionais de inves­tigação. Tendo e m conta o alto nível de especialização que exigem estas investigações, trata-se provavelmente de pessoas que receberam u m a formação muito aprofundada, possuindo u m doutoramento ou tendo, pelo menos, sob qualquer forma,

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Por que não é a investigação pedagógica mais útil?

efectuado altos estudos universitários. Além disso, estão muitas vezes encarregados de formar outros especialistas da investi­gação neste m e s m o domínio. Devem, e m grande parte, a sua notoriedade a obras cuja qualidade é reconhecida no seu país e no estrangeiro, constituindo a frequência com que outros investigadores citam os seus artigos e as suas monografias u m índice certo desta notoriedade.

C o m o é evidente, acontece que alguns investigadores são muito comprometidos politicamente e sofrem imposições polí­ticas muito severas, mas , na maior parte dos casos, estas são menos parausantes do que aquelas a que é obrigado a subme-ter-se o responsável político. A qualidade dos seus trabalhos é avaliada, e m grande parte, pela comunidade nacional ou internacional dos investigadores e intelectuais e o nível do seu trabalho será julgado essencialmente pelo acolhimento que lhe reservarão os colegas.

Entre as necessidades do responsável político e as do espe­cialista da investigação no domínio da educação, parecem exis­tir certas divergências, muito acentuadas, que dizem respeito à própria natureza dos trabalhos deste último, assim como à sua formação e ao seu meio. O responsável político, recorde­mos, consideraria este tipo de investigação mais útil se ela estivesse e m ligação directa com os problemas que ele deve enfrentar, se ela fosse realizada na devida altura, tendo em conta o momento e m que é necessário tomar decisões, se ela fosse compreensível na sua apresentação e compatível com as obrigações políticas que lhe são impostas. O s especialistas da investigação pedagógica, pelo contrário, têm tendência, e m geral, para escolher temas e m função do interesse que os cole­gas sentem por problemas pedagógicos que lhes parecem im­portantes a longo termo. Contudo, a opção entre vários temas de investigação é, sem dúvida, simultaneamente mais ampla e mais limitada do que a que se apresenta ao responsável polí­tico. Assim, os estudos sobre o papel desempenhado pelo de­senvolvimento do ensino no mercado dq trabalho e e m matéria de desigualdade, terão, geralmente, maior alcance do que a decisão a tomar pelo responsável político, enquanto as inves­tigações destinadas a determinar a influência do bilinguismo escolar sobre a integração das minorias étnicas apresentam, talvez, u m alcance mais limitado, m e s m o quando os dois temas parecem estar e m relação com a política.

A s investigações, m e s m o quando apresentam repercussões políticas, não correspondem normalmente aos problemas espe­cíficos que deve resolver o responsável político, e o prazo exigido também é incompatível com as suas necessidades. E m geral, são necessários vários anos entre o início e o fim de u m projecto de investigação. C o m efeito, é necessário u m certo tempo para estudar as obras relacionadas com o assunto, para enunciar o problema, reunir os dados (o que exige, por vezes,

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numerosas tentativas e extensos inquéritos), analisar estes dados por métodos estatísticos aperfeiçoados e interpretar os resultados. Só nesta fase o investigador poderá redigir o seu estudo e submetê-lo à apreciação dos colegas e de todos os que se interessam pelo problema.

M e s m o após este longo período, os responsáveis políticos não poderão dispor normalmente do estudo e m questão en­quanto outros investigadores não o tiverem submetido a u m exame crítico para descobrir as suas falhas ou aspectos parciais. Quando as conclusões são particularmente importantes outros investigadores procuram plagiá-las utilizando dados diferentes. Só muito tempo depois de terminado o trabalho se poderão considerar as conclusões suficientemente fiáveis para utilizar com fins políticos. A extensão destes prazos impede o respon­sável político de encomendar investigações realmente válidas no período e m que deve actuar. A b e m dizer, só por acaso poderá dispor, e m devido tempo, das conclusões do estudo susceptíveis de influenciar a sua decisão.

Devido à complexidade deste tipo de investigação e da terminologia utilizada para informar os outros investigadores dos métodos seguidos e dos resultados obtidos, os estudos são, e m geral, redigidos n u m estilo dificilmente compreensível para o leigo. Além disso, o facto dos investigadores se dirigirem essencialmente aos colegas não os incita a redigir os seus tra­balhos tendo e m conta as pessoas com u m a formação diferente da sua. Considerando que as investigações são submetidas a u m a filtragem pelos outros investigadores, que examinam, e m primeiro lugar, os resultados, não surpreende que sejam escritos para eles e não para u m a audiência composta por políticos. Ora, este facto vai juntar-se às dificuldades encon­tradas pelos responsáveis políticos na compreensão da natureza da investigação e seus resultados.

Finalmente, as obrigações políticas e administrativas im­postas ao responsável político não se traduzem por constran­gimentos semelhantes para o investigador, embora considera­ções políticas possam ter influência sobre a escolha dos temas e suas conclusões se a sua situação pessoal e o financiamento dos seus trabalhos depender do Estado. Nos países que só autorizam o exercício intelectual na medida e m que ele se sub­meta a u m a ideologia, ser-lhe-ão igualmente impostas obri­gações muito estritas. N a maior parte dos casos, porém, terão menos constrangimentos políticos a suportar do que os res­ponsáveis oficiais pela escolha dos seus temas, métodos e con­clusões. N a medida e m que os investigadores demonstrem — como tantas vezes tem sucedido recentemente — que os problemas da educação reflectem o mal-estar profundo cau­sado pela pobreza ou pela repressão que alastram e m outros domínios da sociedade, os ministros ou funcionários da edu­cação pouco ou nada poderão fazer. Além disso, estas inves-

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Por que não é a investigação pedagógica mais útil?

tigações podem comprometer muito seriamente a sua intenção ao pretender provar que as políticas seguidas nada fazem para resolver os problemas urgentes no domínio da educa­ção.

Necessidades divergentes da investigação e da política

Podemos concluir das observações precedentes que existem certas diferenças de natureza entre o processo que conduz à elaboração de u m a política de educação e o que implica a in­vestigação neste domínio. Podem surgir conflitos entre as ne­cessidades de u m e o papel do outro. Já defendi que estas diferenças são inerentes a estes processos e que não são for­tuitas. É evidente que u m responsável político desejoso de eficácia poderia reagir, afirmando que não é assim e que este tipo de investigação se poderia tornar mais sensível às exi­gências da política, associando-se-lhe intimamente. Assim, na medida e m que o financiamento da investigação pedagógica é auase inteiramente assegurado pelo Estado, os responsáveis políticos poderiam fixar u m certo número de restrições. Pode­riam exisrir que os investigadores se consagrem a u m a lista precisa de problemas. Poderiam impor-lhes prazos estritos para entrega das conclusões, convidá-los a redisrir os trabalhos da maneira inteligível para o leigo, forçá-los a apresentar con­clusões politicamente aceitáveis.

C o m o é óbvio, estes elementos de coerção existem e m muitas sociedades, e é possível descobrir restrições e m toda a inves­tigação financiada pelo Estado, m e s m o auando estas restricõeg não são explícitas. N o entanto, a adopção destas medidas viria deformar o processo da investigação a ponto de a tornar inex-plorável auando se trata de tomar decisões. Todas estas res­trições teriam com efeito impedir trabalhos honestos e de boa qualidade, de tal modo aue, com o tempo, a investigação se tornaria u m meio reconhecido de prona^anda governamental ao oual se concedira o crédito habitualmente atribuído a seme­lhante função.

E m resumo, considero aue, e m matéria de educação é ine­vitável a tensão entre política e Ínvesferacão. Representam duas culturas diferentes com exigências próprias. A primeira é restritiva, baseada na tomada de decisões a curto prazo. A secunda, muito menos restritiva, pode fornecer dados oue sirvam para modelar o mundo de amanhã sesmndo u m a con­cepção mais generosa. M e s m o quando u m ministro de educação é desmentido por u m relatório aue prova que nas classes des­favorecidas o analfabetismo e o insucesso escolar são, e m grande parte, consequências da própria pobreza, é importante nue o governo e a sociedade tomem mais consciência das relações fundamentais que existem entre a situação económica da popu-

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Henry M . Levin

lação e o sucesso de toda a acção educativa. Por outras pala­vras, u m a investigação pedagógica relativamente independente constituirá provavelmente u m a crítica mais salutar dos dogmas prejudiciais e m determinado momento do que as investigações inteiramente controladas pelo Estado e pelo seu aparelho mi­nisterial.

U m último ponto assume u m a importância particular. Parece esperar-se, e m grande parte, que a investigação pedagógica resolva os problemas difíceis que surgem e m matéria de edu­cação, pois, são considerados problemas técnicos. Assim, trata--se o analfabetismo, a desigualdade dos resultados escolares, o desemprego de pessoas qualificadas, etc., como problemas que exigem soluções essencialmente técnicas e conclui-se que a in­vestigação pedagógica representa o método de investigação capaz de fornecer respostas adequadas no plano técnico. Ora, grande número destes problemas não têm nada de técnico; são políticos. Graças a u m a transformação radical de ideolo­gia política depois de 1959, Cuba conseguiu, e m menos de dez anos, passar de u m a das taxas de alfabetização mais baixas para u m a das mais elevadas da América Latina. D o m e s m o modo, muitas pessoas qualificadas continuarão a não possuir emprego enquanto for necessário u m vasto reservatório de mão-de-obra para que reine a ordem no mercado do emprego devido ao medo do desemprego e para manter os salários a baixo nível, e m proveito dos investidores nacionais e multina­cionais. Neste aspecto, a investigação pedagógica não pode re­solver problemas que são de natureza política e não pedagógica.

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Elementos para u m dossier

Abordagem do não formal

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Asher Deleon

A educação dos adultos

como correctivo do insucesso

da educação formal*

A educação é julgada e m toda a parte e a sua pertinência é criticada por toda a gente : pelos alunos e professores, pelos futuros candidatos e pelos que abando­n a m prematuramente os sistemas educa­tivos, pelos políticos e cientistas, pelos pais e diversos consumidores dos «pro­dutos» da educação.

M a s , será verdadeiramente a educação a acusada? N a realidade, é a nossa m a ­neira de viver, a estrutura da sociedade, as relações desumanas entre os homens, o sistema de valores da sociedade, as falsas aspirações, a incapacidade de atin­gir os fins desejados pela maioria, as contradições entre o humanismo e a re­volução científica, o nosso estilo de vida feito de esbanjamento, a ordem mundial injusta, os obstáculos ao desenvolvimento individual e colectivo, as nossas institui­ções caducas e o poder esmagador do establishment, as idiispairidades icresicenr tes e o igualitarismo que se desvanece. São estes os verdadeiros culpados, pois a educação limitasse a reflectir a socie­dade com as suas deformações.

Asher Deleon (Jugoslávia). Presidente da Comissão Internacional do Estudo Sobre os Problemas da Comunicação (Unesco). Anterior­mente secretário executivo da Comissão Inter­nacional Sobre o Desenvolvimento da Educação (Apprendre à être) e conselheiro da UNESCO em matéria de educação extra-escolar junto do governo da Índia.

O que não significa que a educação seja apenas u m a imagem mecânica e pas­siva da sociedade actual e que não possa libertar-se e influenciar, de certo modo, a ordem social e a estrutura da sociedade. O que também não significa que a edu­cação seja impotente para servir de antí­doto para tantas deformidades da nossa civilização. T a m b é m é ingénuo pretender, como muitos pensadores radicais fazem, por vezes, que a educação é responsável pelos «pecados» fundamentais e pelos insucessos do tempo presente. É irrea­lista esperar que a educação possa orde­nar u m mundo e m desordem, ou trans­formar u m m u n d o insensato n u m mundo equilibrado. A educação tem limitações — e limitações graves. É sob este aspecto e mantendo presentes no nosso espírito estas limitações que tentarei apresentar a educação dos adultos como u m «correc­tivo» do fracasso da educação formal.

Ninguém poderá negar que, do ponto de vista quantitativo, a educação formal não pode responder às esperanças gerais. Pensar que a educação universal pode ser realizada à escala mundial, graças,

* O presente 'artigo constitui u m a versão ligei­ramente modificada do texto publicado e m Discussion sur l'alphabétisation, tomo VI, número 3, 19T5. Reproduzamo-lo com a amá­vel autorização do director do Instituto In­ternacional Para os Métodos de Alfabetiza­ção dos Adultos, Teerãoj

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A educação dos adultos como correctivo do insucesso da educação formal

exclusivamente, às modalidades da edu­cação formal, traduz u m optimismo exa­gerado. D e acordo com u m relatório sobre a educação elementar na India: «Não foi possível fixar u m a data limite para a edu-cação gratuita e obrigatória das crianças com idades compreendidas entre os 6 e os 14 anos. Já foi dito que poderíamos atingir esse objectivo e m 1965/1966. Quando se tornou evidente que era im­possível, a data limite foi adiada para 1975/1976. Agora, nem isso parece ser realizável e esperamos atingir esse ob­jectivo durante o V I Plano (1979-198-i). O que talvez seja u m a ilusão.»

O estudo sectorial do Banco Mundial sobre a educação 1 é igualmente pessi­mista: e m 1985 ainda haverá provavel­mente, à escala mundial, menos crianças nas escolas primárias do que cá fora (350 contra 375 milhões). O que é ver­dade para a escola primária torna-se ainda mais evidente na educação se­cundária, técnica e superior. A s exigên­cias crescentes para os que saem das instituições educativas são despropor-cinadas e m relação às realizações do sistema formal. M e s m o nos raros países e m que a educação secundária é pratica­mente universal e onde a educação su­perior o será n u m futuro relativamente próximo, existe este mesmo fosso entre certas categorias da população, e m rela­ção às necessidades crescentes.

Ë por isso que a educação dos adultos representa u m substituto lógico para as limitações e oportunidades mal sucedi­das da educação formal. Parece absolu­tamente natural que as crianças e os jovens que atingiram a idade adulta anal­fabetos e não educados (porque os pais eram demasiado pobres para os enviar à escola, ou porque foram obrigados a começar a trabalhar demasiado cedo, ou porque certos preconceitos sociais cons­tituíram u m obstáculo para a sua edu­cação, ou porque pertencem a classes desfavorecidas da sociedade, etc.) com­

pensem a suas faltas aprendendo depois de atingida a idade adulta.

O que parecia «natural» foi posto e m prática de várias maneiras, como por exemplo: programas de alfabetização de massa n u m certo número de países; pro­jectos de alfabetização funcional para os adultos e m várias regiões rurais e urbanas; cursos nocturnos como medida de compensação tanto ao nível primário como secundário; diversos programas de educação comunitária, sobretudo e m cer­tos países asiáticos e árabes; programas educativos ligados aos projectos de de­senvolvimento rural; actividades espe­ciais organizadas por cooperativas, ou fazendo parte de projectos de recons­trução rural, ou ainda ligadas às re­formas agrícolas; programas educativos organizados e m empresas públicas e pri­vadas; o ensino pela rádio; programas multimedia e m alguns países, desenvol­vidos e e m desenvolvimento; cursos por correspondência para os operários adul­tos, para as donas de casa e, por vezes, para os camponeses; cursos preparató­rios para exames ; cursos televisivos para adultos. Todas estas iniciativas, bem como outras semelhantes, constituem exemplos vivos de u m a variedade de práticas da educação dos adultos.

Actualmente não existem países que não possuam alguma experiência no do­mínio da educação dos adultos. A maior parte das tentativas realizadas provaram que os adultos podem aprender, e apren­dem de facto, muitas vezes melhor e mais rapidamente do que as crianças. Penso que já não é necessário apresen­tar novos argumentos e m defesa das potencialidades da educação dos adultos. Estas potencialidades foram amplamente confirmadas de modo científico, opera­cional e pragmático. O s programas de educação de adultos podem certamente reduzir a diferença quantitativa resul-

1. Éducation. Politique sectorielle, Banco M u n ­dial, 1975.

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tante de sistemas de educação formal defeituosas, elitistas e hierarquizados que, na origem, eram concebidos para as classes privilegiadas e que, por conse­guinte, dificilmente poderiam ser adap­tados com o objectivo de u m a democra­tização real e profunda da educação.

Porém, embora m e pareça, agora, evi­dente que a educação dos adultos pode contribuir para reduzir as diferenças quantitativas, na verdade, ela não fez praticamente nada neste sentido. Exis­tem muito poucos exemplos de progra­m a s educativos de massa para adultos bem organizados e adequados que te­nham, efectivamente, introduzido modi­ficações apreciáveis na situação actual da educação. A educação dos adultos era e continua a ser, a despeito de to­das as suas realizações e do fervor dos seus promotores, u m a actividade edu­cativa e social marginal. A razão não é certamente pedagógica, nem andragó-gica, n e m metodológica. A s causas são sociais, económicas e financeiras. Resi­dem na própria natureza das nossas sociedades. O sistema de educação for­mal, actividade ligada ao tempo e ao espaço, processo definitivo «preparação para a vida», corresponde plenamente aos parâmetros fundamentais do nosso quadro de vida e nele encontra a sua justificação. Nestas circunstâncias, a educação dos adultos é ainda u m a acti­vidade inútil e aparentemente supérflua. A s forças poderosas da sociedade, na maior parte dos casos, não querem arris-car-se a perder a sua posição dominante, monopolista e privilegiada e alimentam u m vasto movimento democrático de educação de adultos. O mundo, tal como se apresenta, com os seus desequilíbrios e contra-sensos, pode necessitar das acti­vidades da educação dos adultos e tolera­bas como pequenos correctivos fragmen­tários, ou como projectos filantrópicos. M a s , a educação dos adultos como vasto movimento geral, verdadeiramente de­mocrático, corresponde a outro tipo de

sociedade e a u m mundo transformado. Algumas raras excepções existentes con­firmam a regra.

A educação só por si, tal como existe actualmente, não pode corrigir, nem m e ­lhorar seriamente as disparidades sociais, as desigualdades e as oportunidades da vida. Menos ainda do que a primeira, esta segunda afirmação não pode ser posta e m causa.

H á mais de u m século que grandes esperanças sociais foram incorporadas nos planos de desenvolvimento da educa­ção. E m particular, os movimentos de tra­balho internacional e de libertação nacio­nal nas diversas partes do mundo lutaram pela universalização da educação na espe­rança de assim reduzir consideravelmente as desigualdades sociais. Estamos muito menos certos do que outrora de que a educação possa alcançar tais resultados.

A concentração do poder, do capital e dos conhecimentos constitui, sem dú­vida, u m fenómeno mundial. O u melhor, a distribuição do poder, das riquezas e dos conhecimentos é tão desigual que as oportunidades e as vantagens da edu­cação constituem u m monopólio, tanto a nível mundial como no interior da maior parte dos países. Pensou-se du­rante muito tempo que a educação e a difusão do saber originariam u m a maior igualdade na distribuição do poder po­lítico e alargariam a divisão das van­tagens económicas. M a s tudo isto mal se chegou a produzir. Alguns pensadores radicais no domínio da educação defen­dem até a opinião de que a educação es­colar actual, institucionalizada como está, continua a reforçar e a desenvolver o monopólio da vida política e económica, e m vez de reduzir a diferença. Embora não se verifique e m todos os casos, não podemos negar que nas sociedades e m que as diferenças entre os rendimentos aumentam, e m que os cidadãos não to­m a m parte na vida política, a não ser de tempos a tempos e para escolher entre

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alguns candidatos seleccionados por apa­relhos políticos bem defendidos, e m que a dignidade do trabalho não existe e e m que a oposição entre o trabalho manual e o trabalho intelectual se acentua — e m todos estes países, e são numerosos, é ilusorio esperar que a educação intro­duza qualquer alteração fundamental ou u m a transformação dos valores de base.

A s escolas e as Universidades encon-tram-se profundamente integradas no sistema e, por conseguinte, não podemos esperar que desempenhem u m papel de transformação ou de revolução na de­mocratização da educação. Poderemos esperar que a educação de adultos de­sempenhe este papel?

Existem muitos exemplos de progra­m a s de educação de adultos cujos bene­ficiarios são sobretudo as classes des­favorecidas da população. E m geral, as associações e os movimentos de educa­ção de adultos possuem menos o espírito «classe média» do que a educação formal no seu conjunto. Muitos programas de alfabetização, sejam quais forem os seus resultados tangíveis, constituem prova­velmente dos melhores exemplos de u m a orientação «popular» ou «plebeia» das organizações de educação de adultos. Existem igualmente outros programas — alguns com u m certo sucesso quanti­tativo — nos bairros de lata, nas regiões afastadas, entre as tribos nómadas, para os agricultores sem terras, e m comuni­dades rurais recentes, para as mulheres grávidas pobres, entre ias castas mais baixas, para os «esquecidos» nas regiões desérticas ou nos altiplanos, nas minas de carvão, entre os que são política ou culturalmente oprimidos, para os coolies ou corredores de rickshaw. A s unidades da educação de adultos ligadas às uni­versidades atraíram, através dos cursos por correspondência ou dos programas de divulgação, muitos estudantes vindos de categorias da população que, habi­tualmente, não têm acesso à educação superior. N ã o existe praticamente ne­

n h u m país que não ofereça exemplos notáveis de indivíduos desfavorecidos que «subiram na escala social» graças à edu­cação de adultos. Nos países e m que ti­veram lugar transformações revolucio­nárias, eu e m que movimentos nacionais permitiram obter a independência, a edu­cação de adultos permitiu a emergência de camadas da população até então opri­midas e preparou novas forças sociais para desempenhar u m papel mais im­portante. Estes factos, e muitos outros semelhantes, não podem ser ignorados.

N o entanto, o seu impacto sobre a sociedade e sobre os indivíduos não foi apreciável. Se o objectivo destes pro­gramas consistia e m dispensar certos conhecimentos e competências técnicas, talvez tenham sido, de certo modo, bem sucedidos, mas , se pretendiam mudar as atitudes psicológicas e sociológicas, os resultados são parcos; se o objectivo con­siste e m adquirir privilégios outrora re­cusados à maioria, podemos comprovar alguns progressos, m a s se o que se pre­tende é a libertação dos indivíduos e a sua tomada de consciência, ainda há muito a fazer; se a educação dos adul­tos procura permitir que os indivíduos se adaptem à sociedade e às novas tec­nologias, muitos programas se podem gabar de ter atingido u m resultado tan­gível, m a s se pretendem modificar ver­dadeiramente o estatuto daqueles que são forçados a viver à margem da so­ciedade, o resultado é magro; se o papel dos programas de alfabetização dos adul­tos consiste e m iniciar milhões de pessoas nas primeiras letras, são visíveis alguns resultados, m a s se o seu objectivo com­preende a preparação dos analfabetos para u m papel e u m a responsabilidade diferentes na sociedade e no trabalho, ou, como disse Paulo Freire, ensinar-lhes a «1er» (isto é, compreender) a verdadeira realidade e a «escrevê-la», o que signi­fica orientá4a sobre o controle dos in­divíduos e transformá-la, os resultados estão ainda muito longe do fim.

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C o m o poderia ser de outro modo? A s forças sociais e políticas no poder não podem n e m querem, enquanto lhes for possível, suportar u m processo educativo e experiências educativas que modifi­quem a «ordem divina» ou as «relações estabelecidas». Mais do que isso : o mundo da educação, tal como se encontra ac­tualmente estruturado e concebido, não é c o m certeza favorável ao desenvolvi­mento da educação de adultos; ainda se acredita firmemente que a infância é o único período propício à aprendizagem; toda a aprendizagem que tem lugar para além dos sistemas escolares é suspeita; para muitos profissionais e aprendizes a educação é u m processo definitivo; o sa­ber deve ser dispensado e m instituições especializadas e por pessoas que perten­cem a u m a profissão especializada ; a edu­cação e o trabalho devem estar separados. Talvez seja exagerado afirmar que estes dogmas ainda dominam, mas toda a gente estará de acordo e m reconhecer que as características tradicionais continuam a invadir o palco da educação impedindo, sem sombra de dúvida, o desenvolvimento apropriado da educação dos adultos.

O sistema educativo formal constitui igualmente u m fracasso do ponto de vista do conteúdo.

O conteúdo da educação é escolástico e livresco. É u m facto reconhecido, que ninguém nega. O programa de estudos desactualiza-se, pois a ciência, a tecno­logia, o estilo de vida e o meio evoluem mais rapidamente do que as diversas matérias do sumário. Podemos condenar, e m particular, que o conteúdo da edu­cação seja sempre imposto de cima, do exterior, pela burocracia ou pelos «ben­feitores» da educação, sem atender às necessidades, aos desejos e às exigências dos interessados.

Por razões evidentes, o próprio con­teúdo da educação, a sua (substância, a sua interacção com o ambiente foram postos e m causa.

«O ensino sofre essencialmente com o desfasamento existente entre os seus conteúdos e a experiência vivida pelos alunos, entre os sistemas de valores que defende e os objectivos pretendidos pelas sociedades, entre a idade dos programas e a ciência viva1.»

Trata-se do programa de estudos tal como existe ¡actualmente, tal como é apresentado aos alunos e aos estudantes, é o conteúdo explícito que os interessa­dos devem absorver. M a s há igualmente algo de implícito no programa de estu­dos, algo que os interessados adoptam sem se aperceberem; qualquer coisa que deforma o ensino dos conhecimentos e que pode ser designado por «programa de estudos subentendido» z. N a realidade,

1. Apprendre à être, p. 80, Paris, U N E S C O / Fayard, 1972.

2, C o m o a noção de «programa de estuidos sub­entendido» não é multo conhecida, estas duas citações não serão certamente supérfluas:

«A fim de observar claramente as opções que se nos oferecem, devemos começar por estabelecer u m a distinção entre educação e escolarização, o que significa separar a in­tenção humanista do ensino do impacto da estrutura invariável da escola. Esta estru­tura oculta constitui u m curso definitiva­mente fora do controle do professor ou da comissão da sua escola. Transmite indelevel­mente a seguinte mensagem: só graças à escolarização u m Indivíduo se pode preparar •para a vida adulta na sociedade, o que não é ensinado na escola tem pouco valor e o que aprendemos fora da escola não vale a pena. Chamo-lhe programa de estudos sub­entendido porque constitui o quadro inalte­rável do sistema, nos limites do quial todas as modificações do programa de estudos são efectuadas.» ( W . Kenneth Richmond.)

O programa de estudos subentendido en­sina que... u m a aceitação passiva é u m a resposta às ideias mais desejável do que u m a atitude crítica activa. Descobrir o saber não está ao alcance dos estudantes e, de qualquer modo, é u m problema que não lhes diz respeito ... Devemos confiar mais e atri­buir mais valor à voz da autoridade do que ao julgamento independente. Os sentimentos não têm qualquer relação com a educação. Existe sempre u m a resposta correcta única, simples e clara para u m a pergunta.» (Teaching as a subversive activity, por Neil Postman.)

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a apresentação dos factos, a explicação dos diversos fenómenos, a exposição do saber necessário à compreensão baseiam--se sempre e m certos valores e transmi­tem inevitavelmente as intenções e as crenças dos responsáveis pelo conteúdo da educação. A abordagem marxista da teoria e da prática da educação pressu­põe, apoiando-se e m considerações filo­sóficas e e m observações sociológicas, que «a educação não pode ser neutra». Através do processo educativo, sem se aperceberem, os alunos são atraídos para u m a órbita de valores, de critérios e de normas que correspondem aos parâme­tros fundamentais de cada sociedade.

A educação dos adultos poderá contri­buir para sair deste labirinto? Os pro­gramas educativos são, pela sua própria natureza e finalidade, menos escolásticos do que os programas destinados a pre­parar as crianças e os adolescentes para os exames. E m muitos países, o conteúdo da educação dos trabalhadores repre­senta u m a combinação apropriada dos conhecimentos de base (particularmente e m ciências ¡sociais) e das condições e necessidades concretas do ambiente. Os programas de educação comunitária, e mais especificamente os programas de educação de adultos nas regiões rurais, estiveram muitas vezes à altura de preen­cher o fosso entre as intenções académi­cas dos educadores e a experiência real dos alunos. O m e s m o já não sucede com os programas tradicionais de alfabeti­zação dos adultos que procuram essen­cialmente transmitir a capacidade de 1er e escrever, sem relação com u m a pers­pectiva concreta socioeconómica, socio-política, sociocultural ou socioprofissio-nal. Vários programas de alfabetização funcional procuraram dar este passo e m frente. Fizeram-se várias tentativas u m pouco por todo o mundo para identificar u m conteúdo para a educação dos adul­tos com as necessidades reais da socie­dade e dos alunos — e existem indicações de que tudo isto pode ser mais facil­

mente realizado no que se refere aos adultos do que na educação formal. Os programas para carreiras iniciadas, cuja importância parece aumentar e m todo o mundo, constituem exemplos particular­mente interessantes de tentativas para vencer a rigidez, a esclerose, a uniformi­dade, a monotonia e a degradação do conteúdo da educação. N a índia, u m programa intitulado «Educação não for­mal para o grupo etário dos 15 aos 25 anos», projecto importante no V Plano Quinquenal, foi concebido, desde o início, como u m programa educativo descentra­lizado, diversificado e baseado no a m ­biente, o que constitui u m b o m presságio para a eliminação das contradições entre o que o programa de estudos procura introduzir e aquilo de que os alunos ne­cessitam. Deste modo, a educação dos adultos sofrerá menos com a falta de propriedade do seu conteúdo e os alu­nos adultos com a impossibilidade de utilizar e de aplicar os conhecimentos a aptidões adquiridos.

Assim, a educação pode realizar u m a certa regeneração do conteúdo da edu­cação. Pode provar que não é impossível alterar, e m certa medida, métodos esco­lásticos modernos, pois os educadores de adultos são menos inibidos do que os professores escolares e mostram-se m e ­nos interessados e m conservar intactos os programas de educação de adultos n u m mundo e m transformação.

Contudo, não nos devemos deixar e m ­balar por ilusões. A educação dos adul­tos está fundamentalmente associada às mesmas imposições sociais e culturais que a educação formal para crianças e adolescentes. Se, por vezes, consegue li-bertar-se das leis saciais rígidas, se al­guns educadores revolucionários são ca­pazes de inverter as fronteiras impostas, se algumas práticas da educação dos adultos atacam a inércia e o conservan-tismo da educação formal, estamos ainda longe da situação e m que é possível afir­mar que a educação dos adultos está

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liberta dos entraves dos programas de estudos explícitos e subentendidos, ine­rentes ao quadro que comanda e con­diciona todos os outros 'defeitos de base das sociedades industriais e agrárias con­temporâneas.

Existem muitos educadores de adultos, teóricos e profissionais que consideram que a educação dos adultos é «pura», «exorcizada», «verdadeiramente orien­tada para o progresso social», que está «livre das doenças da educação formal», etc. Nada m e parece mais prejudicial aos interesses do desenvolvimento da educação dos adultos. E m primeiro lu­gar, qual poderia ser a explicação so­ciológica ou antropológica, cultural ou política deste isolamento ou desprendi­mento da educação de adultos e m relação ao mundo que a rodeia, e cujo quadro geral é completamente diferente? A s de­formidades da educação formal não se devem acidentalmente a educadores in­competentes, são consequências lógicas e inevitáveis de grande número de fac­tores de condicionamento. D o m e s m o modo , u m a visão destituída de sentido crítico e m relação à educação dos adul­tos pode desviar a acção necessária dos problemas fundamentais para problemas marginais. E m segundo lugar, como po­deremos esperar que aqueles que fazem os regulamentos, os planificadores, os educadores e sobretudo os alunos, modi­fiquem o conteúdo e as práticas da edu­cação dos adultos, se as «práticas ina­propriadas da educação dos adultos» prosseguem no seu trabalho de sapa? N ã o podemos ignorar que, nas socieda­des e m contestação, a educação dos adul­tos deve constituir u m a actividade de contestação. Não podemos ignorar a per­sistência de práticas educativas destina­das a doutrinar os adultos e a justificar as desigualdades sociais que contribuem para u m a distribuição desigual dos re­cursos e para a subestimação da necessi­dade de u m a transformação social e que são susceptíveis de reforçar a discrimi­

nação e os privilégios sociais. Enquanto for esta a imagem realista e não idealista da educação dos adultos, a linha de acção não é difícil de identificar.

A educação formal baseia-se n u m prin­cípio hierárquico, n u m a relação autori­tária entre professores e alunos e n u m a relação entre o sujeito e o objecto do processo de ensino.

Trata-se certamente de u m dos defei­tos mais importantes das práticas da educação formal. N ã o obstante u m a crí­tica severa e u m a oposição activa a esta situação, e m todo o mundo, poucas modi­ficações se produziram 1. E tal não acon­tece não porque os educadores não quei­ram alterar práticas ultrapassadas e inadequadas, m as porque o autoritarismo e a hipocrisia na educação reflectem u m mundo e m que o autoritarismo, a buro­cracia, a tecnocracia, a concentração do poder e das riquezas, a ausência de de­mocracia fundamental e u m a oposição incansável à autodeterminação e à auto­gestão dominam ainda as relações inter­pessoais, sociais e internacionais.

A educação dos adultos tem mais pos­sibilidades de escapar e de se libertar da rigidez da relação professor/aluno

1. Paulo Freire descreveu do seguinte modo as atitudes e práticas dominantes dos docentes: «a) os docentes ensinam e os alunos recebem o ensino; b) o docente sabe tudo e os alunos não sabem nada; c) o docente pensa e os alunos são objecto de pensamientos; d) o do­cente fala e os alunos escutam humilde­mente; e) o docente disciplina e os alunos são disciplinados; / ) o docente escolhe e impõe a sua escolha, e os alunos submietem-^se; g) o docente age e os alunos têm a ilusão de agir através da acção do docente; h) o docente escolhe o conteúdo do programa e os alunos ('a quem não foi pedida opinião) adaptiam-se-lhe; i) o docente confunde a au­toridade do saber com a sua prclpria autori­dade profisíonal, que opõe à liberdade dos alunos; j) o docente é o sujeito do processo de aprendizagem, enquanto os alunos são sim-iples objectos.» (Pedagogy of the oppressed, The Seabury Press, Nova Iorque, 1974, p. 59.)

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A educação dos adultos como correctivo do insucesso da educação formal

do que o sistema formal. A menor dife­rença de idade entre os alunos adultos e os professores, a experiência acumulada pelos adultos, seja qual for o seu nível de educação, o estatuto social atingido por muitos alunos adultos que, mão obs­tante, procuram compensar as insufi­ciências dos seus conhecimentos e apti­dões, o respeito que os adultos, homens e mulheres, adquiriram durante a sua vida — tudo isto torna o processo de aprendizagem certamente menos corrom­pido pelo conceito sujeito/objecto e mais sensível a u m a verdadeira correlação de­mocrática. Os educadores de adultos são também menos rígidos porque aprende­ram — e estas lições foram, decerto, do­lorosas— que os adultos não se mani­pulam facilmente, nem são tão passivos e dóceis como seria de esperar.

O s educadores de adultos desenvolve­ram u m grande número de programas úteis (por exemplo: a alfabetização ba­seada na abordagem psicossocial, os pro­jectos de alfabetização funcional e m vá­rios países, a educação política integrada nas lutas antieoloniais, a educação para a autogestão, etc.) destinados ao empe­nhamento activo do aluno adulto. A for­mação profissional e técnica prática dos adultos (por exemplo, os programas para os artesão, os camponeses, os técnicos e os chefes de equipa no sector organi­zado da economia, a formação nas e m ­presas, os cursos para os beneficiários dos projectos de concessão de terras ou para aqueles que se estabelecem e m no­vas comunas, etc.) representa outro do­mínio da experimentação de métodos destinados a estimular os interessados. Devemos ainda mencionar alguns pro­jectos educativos (organizados por sin­dicatos, cooperativas, exércitos de liber­tação, partidos políticos, organizações de juventude, etc.) que não só transformam os adultos e m alunos activos, como ainda e m membros dos organismos responsá­veis pela organização dos projectos edu­cativos. D o m e s m o modo se acumularam

experiências interessantes na educação familiar, no planeamento familiar e na educação sexual dos jovens e dos adul­tos. Foi dado u m passo e m frente na qualidade quando o processo de apren­dizagem (nos programas de alfabetiza­ção ou de educação dos adultos) pre­cedeu e se ligou a u m a acção social concreta (como a reforma agrária, a criação de u m a organização de agricul­tores sem terras, a construção de u m a associação de auto-assistêneia, a elabo­ração de u m projecto de irrigação, etc.). Todas estas tendências fazem simulta­neamente parte da educação dos adultos, da investigação e de inquéritos educa­tivos, pedagógicos, andragógicos e so­ciológicos, embora e m qualidade e e m quantidade sejam ainda inadequados e limitados1.

•E assim sucede principalmente porque todas estas tendências são apenas expres­sões de não-conformismo e de inovação, ou manifestações excepcionais de u m espírito revolucionário ou reformista, m a s continuam a estar e m flagrante contradição com os aspectos dominantes das sociedades e m que vivemos. M e s m o quando estas contradições não são tão evidentes, as tendências que se agrupam na primeira fase necessitam de tempo e de apoio para ganharem e m presença e e m penetração. Ê por isso que os novos métodos utilizados na educação de adul­tos só terão oportunidade de influenciar a educação e m geral e o papel dos alunos e m particular se forem considerados no contexto mais vasto das transformações sociais.

A s novas tendências e oportunidades que surgem na educação dos adultos não podem realizar o milagre de transformar a educação e não podemos esperar de­masiado do que é muito limitado, tanto

1. Aâôm de vários estudos já conhecMos, a Uni­versidade do Estado de Michigan publicou trabalhos sobre a educação não formal que merecem ser especialmente mencionaidos.

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Asher Deleon

e m extensão como no raio de acção. Con­tudo, depois de tomar consciência desta limitação, não devemos subestimar o papel da educação dos adultos na com­pensação das insuficiências da educação formal. A educação não formal adaptada às necessidades do adulto que trabalha poderia ser essencial tanto para a trans­formação da educação como para o pro­cesso de desenvolvimento. A educação dos adultos, mais do que qualquer outro sector da educação, pode certamente ge­rar as ideias e as tendências que, pro­gressivamente, podem contribuir para a transformação da sociedade, assim como da totalidade do seu sistema educativo. A educação dos adultos como correctivo do insucesso da educação formal pode desempenhar não só estas funções di­rectas, como também u m a função indi­recta ao influenciar a educação escolar, a sua teoria e a sua prática.

C o m o certas modificações importan­tes actuam em relação à educação não formal e m geral e à educação dos adul­tos e m particular, o ramo formal do sis­tema educativo total não pode perma­necer como se nada se passasse à sua volta.

Naturalmente, muitas modificações surgem do interior, das práticas e dos próprios impasses da educação formal. Mas , muitos pontos de interrogação e alterações provêm também do mundo da educação dos adultos. A teoria geral da aprendizagem, particularmente a teoria do ensino, foi abalada pelas conclusões tiradas das práticas da aprendizagem, primeiramente no processo da educação dos adultos. O facto de tornar os estu­dantes activos, a combinação do trabalho e da aprendizagem, a aprendizagem pela acção, a abordagem problema-ôolução, a aplicação do conteúdo baseado no a m ­biente — todas estas abordagens se tor­n a m mais realistas e mais praticáveis graças às experiências no domínio da educação dos adultos. O conceito de edu­cação permanente deve a sua origem e

inspiração às práticas da educação dos adultos e a alguns círculos ligados a esta, apesar de, progressivamente, ter abrangido todo o processo educativo, do ponto de vista do indivíduo e da so­ciedade. A oposição que existia antiga­mente entre a educação das crianças e a dos adultos começa a desaparecer : a m ­bas necessitam do apoio e do desenvol­vimento da outra1. A sua interacção reforçar-se-á neste processo.

O processo de educação permanente foi largamente examinado sob todos os aspectos, elaborado e aceite e m todo o mundo. Mas , muitas vezes, foi também mal interpretado ou mutilado, sendo u m a das interpretações erradas a que o iden­tifica com a criação de u m sistema que constitui u m perigo para a liberdade do indivíduo, o risco de «obrigar toda a gente a u m a espécie de escola perma­nente, desde o berço até ao túmulo». É perfeitamente natural que esta inter­pretação provoque a oposição e o repú­dio da ideia não só da escola permanente, como também da educação dos adultos, u m a vez que estão intimamente ligadas 2.

1. «Ê importante nunca apor a educação dos 'adultos à educação das crianças e dos jo­vens: o conceito de unia educação global transcende esta aparente contradição e co-looa os seus dois pólos, paralela e simulta­neamente, ao serviço dos objectivos comuns da educação no sentido lato. Dal resulta que ia educação dos adultos não pode permanecer por mais tempo, em nenhuma sociedade, u m sector marginal e que lhe deve ser reservado u m lugar bem preciso nas políticas e orça­mentos da educação, o que implica unia articulação sólida entre o ensino escolar e a 'educação extra-escolar.» (Apprendre à être, p. 232, Paris, Unesco/Fayard, 1972.)

2. Três citações podem ilustrar esta tendência: «O processo de aprendizagem não está

limitado a u m a situação ou a u m ambiente particular. Como exige u m a certa abstenção <e u m a certa distanciação em relação a outras actividades, não se concebe que a educação possa ser u m processo permanente e contí­nuo. O conceito de educação "permanente" "contínua" ou "por toda a vida" em si pró­prio não exprime claramente, por conse-

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A educação dos adultos como correctivo do insucesso da educação formal

Por conseguinte, julgamos conveniente citar o relatório internacional Apprendre à être, cujos autores são conhecidos como promotores enérgicos da ideia da educação permanente, como «pedra angu­lar da sociedade desejosa de aprender».

«Todo o indivíduo deve ser capaz de aprender durante toda a sua vida» e «o advento da sociedade que aprende sempre implica que todo o cidadão tenha à sua disposição, e m todas as circunstân­cias, os meios de aprender, de se formar e de se cultivar, a fim de se encontrar n u m a posição fundamentalmente dife­rente e m relação à sua própria educa­ção».

Sendo assim, onde se encontra o risco de «transformar toda a sociedade n u m a vasta sala de aula do tamanho de u m planeta»? É muito mais perigoso pro­porcionar, neste planeta, possibilidades de educação de alta qualidade a u m a minoria e u m a educação inadatpada e claramente insuficiente à maioria.

Por todas estas razões, o desenvol­vimento e a transformação da educação dos adultos não constituem essencial­mente u m problema educativo. C o m o a

transformação da educação dos adultos e o seu papel de «correctivo» encontram numerosos obstáculos — todos de natu­reza sociopolítica, sociocultural e socio­económica— a luta pela educação dos adultos é essencialmente u m a luta polí­tica, ou que, pelo menos, faz parte das lutas políticas pela libertação dos povos e pela transformação do mundo.

N ã o pretendo observáJla sob outro as­pecto, n e m n u m a perspectiva diferente.

guinte, o que significa, pois permanece vaga a questão da maneira como as possibilidades da educação permanente serão procuradas, e a su'a interacção coin a aprendizagem na vida.» {Recurrent education: a strategy for lifelong learning, O C D E , 1973.)

«Opomo-nos à tendência da educação per­manente obrigatória por lei ou por pressão social. Não necessitamos de outros sistemas escolares.» (Extracto de u m a declaração feita por 25 pessoas de 14 países diferentes, reunidas em Cuernavaca, MéKico.)

«Estamos na altura de protestar por a "educação permanente" ainda não ter atin­gido toda a população adulta.» (Ivan ILLICH e Etienne V E R N E , «The trap of lifelong school», publicado em The documentation service, n.° 1, pela Direcção da Educação dos Adultos, iNova Deli.)1

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Marvin Grandstaff

A educação não formal

como conceito*

Qual o papel da educação não formal na planificação do desenvolvimento? É pro­vavelmente importante e sê-lo-á cada vez mais. Os limites do ensino de tipo clás­sico emergem com u m a clareza sempre crescente. C o m o se afirma na conclusão de Apprendre à être, a escola «será cada vez menos capaz de assumir isolada­mente as funções educativas da socie­dade. A indústria, a administração, as comunicações, os transportes podem e devem participar. A s colectividades lo­cais, liem como a comunidade nacional, representam instituições eminentemente educativas».

A composição não formal da educa­ção é, na maior parte das sociedades, bastante forte — por vezes m e s m o muito forte — e susceptível, além disso, de se desenvolver ainda mais. Pensa-se que cerca de metade do esforço educativo realizado actualmente nos países e m de­senvolvimento se deve ao sector não for­mal. Considerados no seu conjunto, os programas deste sector apresentam ca­racterísticas indispensáveis para o de­senvolvimento. Procuram, por exemplo, satisfazer necessidades imediatas, ba-seiam-se, geralmente, na acção e na uti-

Marvin Grandstaff (Estados Unidos da Amé­rica). Professor do Institute for International Studies on Education, Coliege of Education, Michigan State University.

lização directa, são mais frequentemente longos do que curtos, beneficiam de apoios variados, tanto públicos como pri­vados, e pretendem responder às exigên­cias das comunidades locais. M a s , so­bretudo, a educação não formal tem por vocação ajudar aqueles que têm menos oportunidades de aceder a u m a escolari­dade normal (os pobres, os isolados, os camponeses, os analfabetos, os desem­pregados totais ou parciais), de se de­senvolverem nos locais e m que os re­cursos são limitados e de se revelarem eficazes e m termos de tempo e dinheiro.

Contudo, só nos últimos anos a noção de educação não formal como ins­trumento para prosseguimento de ob­jectivos educativos reconhecidos — e m particular os que se referem ao desenvol­vimento nacional — surgiu e se tornou centro de interesse e de estudo. H á muito pouco tempo ainda, tanto nos países desenvolvidos como e m desenvolvimento, «educação» era sinónimo de «escolari­dade». Depois, nos anos sessenta, vimos surgir toda u m a série de análises de

* O estudo, de que o artigo que se segue é extraído, foi conduzido sob os auspícios do Programa de Estudos Sobre a Educação Não Formal da Michigan State University e com o auxílio financeiro do Serviço Para o Desen­volvimento Internacional dos Estados Unidos da América (USAID).

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A educação não formal como conceito

carácter económico, político, pedagógico que punham e m evidência os defeitos e as insuficiências da escolaridade ou, pelo menos, da escolaridade concebida como único veículo do ensino. A força destas críticas suscitou a procura de comple­mentos, suplementos e substitutos da escola. Esta investigação foi orientada n u m a frente muito ampla por pessoas de todas as opiniões e dos mais diversos horizontes. A s críticas dirigidas ao en­sino escolar encontraram eco muito par­ticularmente nos investigadores e nas instituições que se ocupam do desenvol­vimento e da assistência à escala na­cional. Foi nesta comunidade que nasceu o conceito de educação não formal. Tendo provado a inadequação da abordagem escolar tradicional dos problemas edu­cativos do desenvolvimento, instituições e indivíduos começaram a defender a mobilização das formas extra-escolares de educação para enfrentar as necessida­des das sociedades e m desenvolvimento e m matéria de ensino.

Tratava-se muito simplesmento de es­tudar a educação não formal, de a orga­nizar conceptualmente, de examinar os seus casos, de analisar o seu funciona­mento, as suas possibilidades e os seus problemas. O que se revelou u m a tarefa difícil e complexa, de tal m o d o que se­ria provavelmente correcto afirmar que agora compreendemos que, embora sai­bamos mais, sem dúvida, sobre o assunto do que há alguns anos atrás, existem ainda muitas coisas que continuamos a ignorar. C o m o quase sempre acontece, a exploração intensiva de u m determi­nado domínio origina, particularmente de início, muito mais problemas do que resolve. Ë por isso que não pretendemos formular conclusões sólidas ou princí­pios definitivos. Limitar-nos-emos a fa­zer u m a análise liminar, fruto de três anos de estudos marcados por muito3 passos falsos e pistas erradas e que, por­tanto, deve ser considerado como sus­ceptível de aperfeiçoamento, revisão ou

rejeição. Tudo o que esperamos é que possa servir de plataforma para u m tra­balho mais profundo e para u m estudo aprofundado de aspectos desprezados e importantes da tarefa educativa no seu conjunto.

N o momento da sua génese, a ideia da educação não formal foi avançada como u m conceito aberto e de definição vaga. Tratava-se, de certo modo , de u m a noção definida negativamente: « N e m toda a educação se realiza n u m estabelecimento escolar.» Processo bastante eficaz de ini­ciar u m a investigação, pois definindo-os primeiramente como alheios ao problema, não corremos o risco de esquecer factos importantes. N o entanto, a simples no­ção de actividades «extra-escolar» de­signa u m domínio vasto e mal determi­nado e não nos ajuda a diferenciar os dados que o compõem. C o m u m a defi­nição tão extensível, a questão que se apresenta constantemente é a seguinte: «O que é a educação não formal?» ou, n u m aspecto mais ideológico: «Entre to­das as actividades da educação extra--escolar, quais são as mais 'não for­mais'?» Trata-se, inevitavelmente, de questões obscuras. Já o eram de início e, e m certa medida, continuam a sê-lo. D e u m modo geral, poderíamos, pensa­m o s sem graves consequências, conten­táronos com a definição de actividade extra-escolar apresentada anteriormente, e m especial no domínio da educação, e abandonar a procura de u m a definição geral de educação não formal. Por outro lado, na situação e m que nos encontra­mos, a melhor maneira, e m nossa opi­nião, de avançar para a clareza concep­tual é situar o problema e m contextos específicos, isto é, considerar a definição procurada como u m a questão contextual ou funcional. Por outras palavras, admi-te-se que as actividades de educação não formal não são consideradas de m o d o global, com a esperança de descobrir ca­racterísticas gerais, m a s procuramos sa­ber, e m contrapartida, quais os critérios

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Marvin Grandstaff

(num dado caso) que distinguem o «for­mal» do «não formal». E m determinados contextos, os critérios escolhidos pode­rão levar-nos a qualificar de «formal» certas actividades, enquanto noutro con­texto, e m que se aplicam critérios dife­rentes, u m a actividade semelhante po­derá ser considerada «não formal». Este método contextual da definição permite--nos falar da educação não formal e m situações precisas com u m a clareza su­ficiente para nos permtir progredir, evi­tando o debate teórico sobre o que esta actividade é «realmente».

Podemos construir definições contex­tuais da educação não formal e m bases muito numerosas. A s que examinaremos aqui são parâmetros surgidos com certa frequência nas Jornadas de estudo do Estado de Michigan, m a s não constituem u m a lista exaustiva. Os diferentes cri­térios de diferenciação não parecem, na situação actual, formar u m todo conjun­tivo, isto é, não parece possível, neste momento, combiná-los de tal m o d o que a variação de u m elemento seja sempre seguida de u m a variação idêntica de to­dos os outros. A melhor maneira de os utilizar talvez fosse tratá-los como atri­butos discretos podendo ser, e m qualquer contexto, aplicados separadamente ao contexto, Seguem-se alguns dos critérios susceptíveis de serem utilizados para di­ferenciar os modos «formais» e «não for­mais» da educação.

A ligação administrativa

E m quase todas as sociedades, na maior parte das vezes no interior do dispositivo governamental, existe u m agente ou u m a instituição detentores de u m a responsa­bilidade máxima no domínio da «edu­cação». Tratasse, à escala nacional, de gabinetes, de serviços e de ministérios da educação e, à escala local, de funcio­nários do ensino, de directores de esta­belecimentos escolares e de professores. Estes agentes são, e m geral, facilmente

identificáveis. Mantêm, quase sempre, u m a relação qualquer com os estabele­cimentos escolares e, na maior parte dos casos, as suas funções são muito bem definidas, largamente conhecidas e cui­dadosamente delimitadas. E m quase to­dos os meios sociais, se perguntarmos: «Qual é o vosso sistema de ensino?», receberemos u m a resposta bastante com­pleta e precisa. (Naturalmente, seria mais correcto perguntar: «Qual é o vosso sistema escolar?»). Contudo, toda a gente sabe que, além da escola, ou­tras instituições, muito numerosas, pos­suem actividades educativas. U m a m a ­neira de caracterizar a educação não formal consiste e m afirmar que ela en­globa toda a actividade educativa que não decorre das instituições formalmente designadas para este efeito. Podemos apresentar ainda esta definição limitan-do-a a todas as actividades educativas «deliberadas» não desenvolvidas no â m ­bito do sistema escolar. Daqui resulta u m a terceira categoria referente à edu­cação não deliberada, por vezes classi­ficada de «informal», ou de «ocasional». N a utilização contextual do critério da ligação administrativa, acontece frequen­temente que outros factores entrem e m jogo e que a designação de educação não formal se aplique apenas às actividades educativas extra-escolares que, nas suas modalidades, se aproximam do ensino escolar propriamente dito. A distinção feita nestes casos referes-se mais ao modo de tutela do que ao m o d o de edu­cação em geral, atendendo a que se pode tratar de programas quase idênticos, com a pequena diferença de que u m de­corre do sistema escolar e o outro de­pende de u m a empresa, organismo pú­blico, Igreja, etc.

Embora a distinção baseada na liga­ção administrativa não comporte — e m especial quanto ao último sentido que examinamos—nenhuma referência clara à prática educativa considerada como tal, é este critério que parece aplicar- se

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A educação não formal como conceito

mais frequentemente. U m a grande parte da literatura consagrada à educação não formal trata de actividades «de tipo es­colar» decorrente de instituições alheias ao sistema escolar (formação profissio­nal, alfabetização, estágios de aperfei­çoamento agrícola, etc.). A s preocupa­ções práticas destas instituições giram, e m geral, e m torno de considerações como custo, acesso à clientela e eficácia da acção, e não e m torno de considera­ções de ordem pedagógica.

O estilo pedagógico

N a literatura especializada surge tam­bém frequentemente u m elemento muito diferente da dependência administrativa. Trata-se da distinção efectuada entre as abordagens pedagógicas muito «for­mais», rígidas, e m que o papel do pro­fessor é primordial e que são medidas e m função da adesão a normas e as que se referem essencialmente às «necessi­dades dos alunos», mais maleáveis, e que são geralmente medidas e m função da satisfação dos beneficiários. Esta forma de diferenciação que assenta e m critérios educativos é intrinsecamente indepen­dente do modo de tutela. É verdade que existe, provavelmente, u m a forte correla­ção entre a frequência de u m a pedagogia «formal» nos estabelecimentos escolares e a de u m a pedagogia «não formal» nas actividades alheias ao sistema escolar. M a s esta correlação talvez não seja sufi­ciente para que se possa concluir que existe u m a concordância entre definições que assentam e m critérios pedagógicos, ou e m modos de tutela.

A maior parte dos exemplos contex­tuais de definição da educação não formal utilizam o critério da ligação administra­tiva, ou o critério pedagógico, muitas vezes conjugado com u m ou mais crité­rios. (Algumas definições combinam tu­tela e pedagogia, geralmente com resul­tados pouco satisfatórios.) P o d e m o s , pois, considerar estas duas categorias de

critérios como representantes das duas «famílias» mais importantes de definição. Porém, vários outros tipos de critérios (geralmente, é certo, ligados de u m ou outro modo, às duas «famílias» princi­pais) entram e m jogo no tratamento contextual do conceito da educação não formal.

A função

A função da educação formal está cer­tamente muito longe de ser uniforme e m todas as sociedades, ou até estável no interior da m e s m a sociedade; no en­tanto, podemos atribuir ao sistema esco­lar u m núcleo sólido de funções não variáveis. Sejam quais forem as suas demais tarefas, ele é quase sempre obri­gado a ensinar os conhecimentos de base (leitura e escrita, cálculo, instrução ge­ral) e encontra-se ligado ao sistema so­cial de recompensa baseado na atribuição de diplomas. Por conseguinte, outra m a ­neira de estabelecer a distinção entre educação formal e educação não formal consiste e m atribuir a esta última as actividades educativas que não fazem parte do núcleo habitual das funções atribuídas ao sistema escolar. Podemos facilmente classificar este critério de ideológico, pois ele implica que só as funções que constituem o cerne do en­sino tradicional convêm à educação for­mal. C o m o sucede com a abordagem pedagógica, os factos traduzem, neste caso, u m a certa correlação entre o cri­tério funcional e o critério de tutela, u m a vez que as funções tradicionais da escola raramente são assumidas para além de u m quadro formal. A solidez desta correlação é, p o r é m , duvidosa. Existem, com certeza, casos concretos e m que u m a distinção baseada na função pode ser útil e este critério surge, efec­tivamente, na literatura especializada, e m especial quando se estudam as rela­ções existentes entre a educação formal e a educação não formal.

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Marvin Grandstaff

O s beneficiários

N a maior parte das sociedades, m e s m o desenvolvidas, o ensino — e m particular nos níveis mais elevados— é u m a e m ­presa de carácter bastante elitista. Os estabelecimentos escolares não se limi­tam a instruir, efectuam também u m a selecção na sua clientela, sempre a m e s m a . Daí a existência, e m quase to­das as sociedades, de grande número de pessoas que não são admitidas nas ins­tituições oficiais, formais, de ensino. Acontece também que grupos étnicos e populações rurais ou que residem longe das cidades não têm acesso à educação formal e constituem outros grupos de «excluídos da educação». Estas popula­ções representam, quase por definição, clientes potenciais para os programas de educação não formal e lê-se clara­mente, e m grande parte da literatura especializada, que, na aplicação prática deste conceito, se verifica a tendência para utilizar como critério distintivo os atributos dos beneficiários, e m particular o da sua exclusão do sistema educativo. Categorias como a «educação dos traba­lhadores» tornam-se, então, significativas e fecundas. Neste caso, como no das defi­nições estabelecidas e m função do modo de tutela, não existe u m a relação evidente entre o fundamento da distinção e a prá­tica educativa, embora haja razões para supor, e m particular, no que se refere à clientela rejeitada, que u m a pedagogia não formal tem possibilidades de ser mais eficaz. D e qualquer modo, a exten­são do problema apresentado, e m todos os países, pelas necessidades de popula­ções que não têm acesso à educação formal torna a utilização do critério da clientela frequente e útil.

O s sistemas de recompensa

C o m o já observámos, a educação formal está, na maior parte dos casos, parti­cularmente associada ao sistema de re­

compensa da sociedade. A s recompensas são, geralmente, mais globais do que específicas. Sancionam mais a escolari­dade como tal (ou a realização de deter­minado ciclo de estudos) do que a apli­cação dos conhecimentos adquiridos. Existe, aqui, u m a correlação importante que não poderemos tratar isoladamente e que é a seguinte: tendo e m conta que as recompensas ligadas à escolaridade são de ordem geral, o financiamento do ensino é muitas vezes considerado u m a «despesa social». Quando as recompen­sas da educação são muito específicas e ligadas aos conhecimentos adquiridos, observa-se que as despesas do ensino estão frequentemente a cargo do instru­mento e/ou do empresário. E m outros casos de instrução deliberada, as recom­pensas são imediatas, específicas e e m relação directa com o ensino recebido (emprego, melhor remuneração, rendi­mento agrícola superior). Existe u m a ligação bastante evidente entre a natu­reza da recompensa e as classificações correntes da educação formal e não for­mal. Neste caso, porém, o critério (a recompensa) é geralmente tratada como u m a característica anexa de u m a distin­ção que assenta e m outro critério e não como u m a base de diferenciação e m si.

A conformidade cultural

Finalmente, estabelece-se, por vezes, u m a distinção consoante o perfil geral do ensino é adaptado, ou não, às estruturas mentais da população beneficiária. Sa­bemos que os modos de aquisição dos conhecimentos variam de acordo com o meio cultural e que os programas edu­cativos implicam u m certo número de noções sobre a maneira como as pessoas «aprendem». Os postulados da educação e m matéria de aquisição dos conheci­mentos podem convir às estruturas m e n ­tais de u m grupo cultural dado ou ser--lhes totalmente alheios. Observa-se, na literatura especializada, u m a tendência

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A educação não formal como conceito

para associar o conceito de educação formal a situações e m que o ensino dis­pensado implica u m modelo de aprendi­zagem distinto daquele que caracteriza a população local e o conceito de educa­ção não formal a situações e m que os modelos da aprendizagem são conformes. Ë o que sucede, e m particular, quando o contexto é o de u m contacto educativo entre programas escolares e populações semi-analfabetas ou analfabetas. (Esta distinção tem pouco valor quando a po­pulação beneficiária é alfabetizada. Se a aplicássemos, por exemplo, às escolas americanas habituais, destinadas a u m a população cujo modo de aprendizagem é praticamente idêntico ao que implica o ensino dispensado, chegaríamos ao curioso resultado de que o ensino ame­ricano poderia ser citado como exemplo de educação não formal.) Esta distinção exige u m contexto muito especial, m a s pode ser, e m muitos casos, válida e fértil.

E m resumo, é evidente que não existe u m a maneira única e «correcta» de defi­nir o conceito de educação não formal. A sua definição depende do contexto e a escolha dos factores segundo os quais se distinguirá o formal do não formal será função do objectivo procurado. É provável que a investigação exija u m a selecção de critérios de certo modo dife­rente da requerida pela prática e que, tratando-se, por exemplo, de administra­ção, de financiamento ou de elaboração de programas, se possam considerar ex­tremamente úteis critérios relativamente pouco interessantes para u m professor. Importa, pois, que os critérios escolhidos se adaptem à tarefa proposta e não que se opte por determinada categoria de critérios.

É possível que, com o tempo, se adquira u m a ideia mais clara da interpretação mais fecunda do conceito de educação

não formal. Talvez, por exemplo, se des­cubra e m que medida existe u m a corre­lação entre as variáveis que se classifi­cam, respectivamente, na «família» do modo de tutela e na das abordagens pedagógicas. (Trata-se, pensamos, de u m a tarefa importante para o desenvol­vimento futuro da teoria.) Até lá, porém, o melhor método parece ser o que con­siste e m articular cuidadosamente os cri­térios que aplicaremos, n u m dado caso, para distinguir a educação formal da educação não formal e as utilizações bem delimitadas que contamos fazer com os resultados obtidos. A clareza e a coerên­cia da maneira de tratar o conceito são mais importantes do que o facto de pre­tender proclamar ideologicamente justa determinada definição entre as numero­sas opções plausíveis.

A conceptualização da educação não formal deve necessariamente englobar u m número importante de possibilida­des, das quais algumas podem ser difi­cilmente relacionáveis com as duas «fa­mílias» de definição que analisámos. N ã o menos importante é a necessidade de abordar o exame do conceito com u m objecto bem determinado. Trata-se de saber não o que «é» a educação não formal, mas o oue pretende, para oue é feita, o que está no cerne da definição contextual. Para estudar este modo de educação como conceito, devemos, e m primeiro lufar, possuir u m a noção da tarefa a realizar, tal como o fabricante de utensílios necessita de saber, antes de se lançar ao trabalho, para que ser­virá o instrumento aue vai talhar. A in­trodução do conceito de educação não formal mostra-nos (aue esta linha de re­flexão e m matéria educativa é válida — permite considerar diversas opções. Po­demos fabricar nós próprios os instru­mentos de que necessitamos e m vez de nos limitarmos a fazer o que podemos com aquilo que encontramos.

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Tim Simkins

A planificação

da educação extra-escolar:

estratégias e obrigações*

O s documentos e publicações que tratam da educação extra-escolar nos países e m desenvolvimento são actualmente muito numerosos. Tem-se escrito muito sobre os limites da contribuição do ensino es­colar para a realização do® objectivos nacionais e sobre as múltiplas vantagens que poderiam resultar da aplicação de programas extra-escolares b e m concebi­dos, particularmente no momento e m que se insiste sobre o desenvolvimento rural, o emprego e a igualdade de oportunida­des na sua aplicação mais ampla. Efec-tuaram-se numerosos estudos de casos referentes a programas específicos nos mais diversos países.

O que sobressai essencialmente de mui­tos destes escritos é que, para a maior parte dos países e m desenvolvimento, se impõe há muito u m a reorientação subs­tancial das prioridades nacionais e m m a ­téria de educação e que esta reorientação poderá atingir aproximadamente os seus fins desde que as alterações propostas sejam b e m planificadas e executadas. Ora, esta opinião apoia-se n u m a noção essencialmente técnica do processo de planificação que considera o contexto sociopolítico da educação de m o d o par-

Tim Simkins (Reino Unido). Especialista em educação de adultos e em planificação da edu­cação. Professor em Sheffield City Polytechnic, Sheffield.

ciai. N o presente artigo examinaremos u m certo número de meios através dos quais a educação extra-escolar pode ser introduzida nas estratégias nacionais da educação e expomos alguns dos proble­m a s que podem surgir se os planificado­res não tiverem suficientemente e m conta o poderoso conjunto de obrigações e m que os responsáveis pela política educa­tiva devem invariavelmente operar.

O m o d o mais simples de abordar o pro­blema da planificação da educação extra--escolar consistiria, como é evidente, e m não introduzir transformações ¡essenciais na estrutura do ensino. O sistema esco­lar tradicional continuaria a dominar, m a s redobrar se-iam os esforços para descobrir os meios de aplicar programas extra-escolares apropriados, a fim de au­mentar a eficácia do ensino no seu con­junto. C o m o indicou Callaway: «O que é necessário, agora, é reforçar os progra­m a s extra-escolares existentes e aplicar novos programas — se necessário revo­lucionários— perfeitamente estudados... Insistir, assim, na educação extra-escolar não significa que se reduza a importân­cia atribuída ao ensino institucionalizado.

* Este texto constitui u m a versão revista do capítulo 5 do estudo de T . J. S I M K I N S : Non--formal education and development: some critical issues (Monograph 8), Department of Adult and Higher Education, University of Manchester, 1977.

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A planificação da educação extra-escolar: estratégias e obrigações

Trata-se simplesmente de afirmar que as ocasiões de aprender devem ser estendi­das e oferecidas a u m a fracção muito mais importante da população.» 1

¡Esta concepção salienta «a obra ina­cabada da escola» 2 e considera a educa­ção escolar e extra-escolar como associa­das, indispensáveis u m a à outra. Neste contexto, atribuem-se frequentemente três funções à educação extra-escolar. E m primeiro lugar, ela pode completar o ensino escolar, por exemplo, por meio de actividades extra-escolares destinadas aos estudantes, como clubes de jovens rurais, ou de actividades relativas à edu­cação dos adultos tendo por objecto a intensificação do apoio dos pais às esco­las. E m segundo lugar, os programas extra-*seolares podem substituir o en­sino escolar proporcionando u m a forma­ção pré-profissional aos jovens que aban­donaram prematuramente a escola ou u m a formação durante o exercício da profissão destinada a proporcionar aos que saíram da escola as competências práticas necessárias para a indústria. Finalmente, os programas extra-escola­res podem constituir u m substituto viável do ensino escolar e m certos domínios particulares, como a alfabetização, e m especial quando os recursos a atribuir à expansão do ensino escolar são limi­tados.

Segundo esta concepção, os programas de educação extra-escolar constituirão essencialmente u m complemento que se vem juntar aos meios existentes de edu­cação escolar que, e m muitos casos, não deixarão de se desenvolver. D e facto, u m dos temas que encontramos na maior parte dos estudos sobre a educação extra--escolar, é a insuficiência dos recursos (em particular dos recursos públicos) consagrados aos programas de educação alheios ao sistema escolar 3 e a necessi­dade de os aumentar substancialmente. Neste contexto, a planificação exige que se determinem concretamente os progra­m a s extra-escolares susceptíveis de refor­

çar a eficácia do sistema educativo no seu conjunto.

A s análises deste tipo são frequentes nos trabalhos sobre a educação extra--escolar e fornecem-nos interessantes resumos. Assentam, porém, n u m a hipó­tese principal que apresenta dúvidas na situação que é a de muitas sociedades e m desenvolvimento. D « inspiração lar­gamente expansionista, têm tendência para considerar como certo que se en­contrarão recursos suplementares e m quantidade suficiente para as necessida­des da causa. Contudo, à medida que a percentagem dos orçamentos nacionais consagrada à educação continua a au­mentar, as possibilidades de expansão esgotam-sie e diminuem rapidamente. É certamente verdade que se poderiam encontrar outras fontes de financiamento para a educação extra-escolar, principal­mente no sector privado da economia, m a s é provável que qualquer aumento apreciável dos recursos públicos consa­grados à educação extra-escolar deva realizar-se à custa do sistema escolar. Seria utópico raciocinar de outro m o d o . Duvidamos de que exista e m muitas so­ciedades « u m amplo leque de programas extra-escolares que não entrem e m com­petição com o ensino escolar para atri­buição de créditos orçamentais 4. A escas­sez de recursos torna-se tão grave que as formas de ensino diferentes das escolares se tornam (e devem tornar) concorrentes

1. A . C A L L A W A Y , «Frontiers of out-off-schoiol education», em C. S. B R E M B E C K e T. J. T H O M P S O N , New strategies for educational development: a cross-cultural search for non-formol alternatives, p. 16, Lexington Books, 1973.

2. P. H. COOMBS, R. C. PROSSEK e M . A H M E D , New paths to learning for rural children and youth, pp. 27 a 29, International Council for Educational Development, 1973.

3. Ver, por exemplo: P. H . C O O M B S e outros, op. cit., p. 70; P. H . C O O M B S e M . A H M E D , Attacking rural poverty: how non-formal education can help, pp. 22-24, Johns Hop­kins University Press, 1974.

4. P. H . C O O M B S e M . A H M E D , op. cit., p. 247.

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cada vez mais temíveis na concessão de meios financeiros.

Nesta situação, é provável que só se­jam concedidos recursos suplementares de montante apropriado à educação extra-escolar quando se operar u m a m u ­tação significativa nas prioridades do sector da educação, de tal modo que a importância da educação extra-escolar surja claramente e sem ambiguidades. Vejamos agora as condições em que esta mutação de prioridades poderia ter lugar.

Talvez o incitamento mais forte viesse de u m a nítida tomada de consciência por existir, entre a procura de meios de en­sino suplementares e a oferta de recur­sos, u m desequilíbrio tão grande que a elaboração de u m a nova estratégia da educação represente a única solução pos­sível. A substituição dos esforços desen­volvidos para responder com u m ensino escolar de custo médio à massa das exi­gências da sociedade e m matéria de edu­cação por esta opção está, neste m o ­mento, a ser amplamente debatida sob a designação de «educação de base». Ocupa u m a grande importância nas refle­xões do Banco Mundial sobre o desenvol­vimento da educação e também é estu­dada pela U N E S C O . C o m o declara o Banco Mundial: «Os sistemas de educa­ção e de formação deverão ser concebidos para permitir que as massas que não foram abrangidas pelo crescimento do sector moderno participem no processo de desenvolvimento de trabalhadores mais produtivos — capazes de desempenhar eficazmente o seu papel de cidadãos, de membros da sua família, de dirigentes e de membros de grupos que participam na acção cooperativa comunitária, e muitos outros, o que significa, em última aná­lise, que todas as secções da população devem receber u m a educação e u m a for­mação sempre que os recursos o permi­tam e na medida e m que a marcha do desenvolvimento o exija.» 1

Por outro lado, formulou-se a seguinte recomendação: «As políticas educativas

dos anos setenta deveriam inscrever na primeira linha dos seus objectivos estra­tégicos a generalização da educação ele­mentar, sob formas diversificadas, e m função das possibilidades e das necessi­dades.» 2

A educação de base pode ser inter­pretada de diversos modos que apresen­tam, entre si, pontos comuns, É evidente que, e m muitas sociedades, a primeira fase do ensino do primeiro grau constitui o elemento essencial, m e s m o quando ou­tros assumem igualmente u m a grande importância. Phillips descreve assim a situação: «Por educação do "primeiro grau" ou de "base", entenderemos simul­taneamente o ensino primário na escola, especialmente a parte elementar do ciclo primário quando este é longo, e a acção de recuperação pela educação extra-esco­lar desenvolvida junto dos jovens que não completaram a escolaridade necessá­ria. A ideia consiste e m satisfazer as necessidades mínimas essenciais e m m a ­téria de aquisição de conhecimentos para que o indivíduo possa desempenhar u m papel na sociedade e no seu meio físico.» 3

A s estratégias da educação de base variarão entre as sociedades, de acordo com as suas necessidades e recursos. Assim, nas sociedades e m desenvolvi­mento, e m que o rendimento por habi­tante é relativamente elevado e a taxa de escolarização primária já importante, seria possível realizar a educação de base para todas as crianças (mas não para os jovens e adultos sem instrução) n u m futuro previsível, generalizando o ensino primário. Esta opção, porém, não

li Education sector working paper, pp. 14 e 115, Banco Mundial, 1974, reproduzido em INTER­NATIONAL B A N K FOE RECONSTRUCTION A N D D E V E L O P M E N T , The assault on world poverty: problems or rural development, education and health, John Hopkins University Press, 1975.

2. Apprendre à être, p. 218, Paris, Unesco/ /Payara, 1972.

3. H . M . PHILLIPS, Basic education: a world challenge, p. 6, Wiley, 1975.

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A planificação da educação extra-escolar: estrategias e obrigações

se oferece a muitos países pobres. Para eles, a educação de base para todos exige que se estabeleça «um sistema comple­mentar e não rival do ensino escolar des­tinado a dispensar u m a educação funcio­nal, maleável e económica àqueles que o sistema escolar não pode ainda atingir ou que já foram postos à margem» 1.

Seja qual for a estratégia adoptada, apresentará sempre u m certo número de características indispensáveis. E m pri­meiro lugar, deverá assegurar u m nível mínimo de educação a u m a massa de indivíduos. Isto é, deverá abranger todas as crianças e m idade escolar e, além disso, atingir os jovens e os adultos que não puderam beneficiar de u m ensino adequado no passado. Por conseguinte, m e s m o nas sociedades e m que representa u m objectivo possível de atingir, o ensino primário universal deve ser completado por outro tipos de programas educativos.

E m segundo lugar, a educação de base para as crianças, os jovens ou os adultos é concebida como u m fim para a maior parte das pessoas. Deve ser organizada de modo a responder às «necessidades mínimas essenciais e m matéria de aqui­sição de conhecimentos» dos grupos par­ticulares que pretendemos atingir. Estas necessidades serão definidas não na pers­pectiva do prosseguimento dos estudos dentro do sistema educativo, m a s e m função dos conhecimentos, competências e atitudes necessários a u m a participação total e eficaz do indivíduo na vida da sociedade. A s necessidades mínimas va­riarão consoante as sociedades e, a b e m dizer, no seio de cada u m a delas (por exemplo, entre zonas urbanas e rurais, ou entre zonas rurais de carácter dife­rente) ; as diferenças referir-se-ão à orientação da educação proporcionada e à duração do processo educativo neces­sário à satisfação adequada das necessi­dades2. A natureza da economia da maior parte das sociedades « m desenvolvimento e a falta de recursos de que sofrem le-vam-nos a crer que os programas de

«educação de base» serão, muitas vezes, de u m a duração muito mais curta do que o ciclo primário do ensino tradicional.

U m a estratégia de educação de base deve possuir como terceira característica a oferta de u m leque de possibilidades que garanta a todos os elementos da população o acesso à educação. Assim, embora seja possível não existir «nenhum meio de escapar à obrigação de melhorar, de renovar e de desenvolver o sistema escolar» s , a tarefa essencial consiste e m fornecer possibilidades apropriadas de educação extra-escolar a todos aqueles que o ensino de tipo clássico não pode atingir ou aos quais não se adapta. O s meios utilizados devem ser maleáveis para satisfazer as necessidades de grupos particulares e devem possuir u m a eficá­cia satisfatória e m relação ao seu custo, a fim de economizar os recursos.

D o exame destas características salien-ta-se que programas extra-escolares b e m escolhidos serão capazes de constituir u m elemento vital de toda a estratégia de educação de base. Nestas condições, o problema essencial da planificação resu-me-se a definir os limites para além dos quais o ensino de tipo escolar não pode ser materialmente prolongado e a deter­minar e elaborar programas extra-esco­lares apropriados para os grupos que não podem ser atingidos de maneira satisfa­tória pela educação escolar. N o entanto, podemos ir mais longe. Se a educação de base deve ser generalizada, é pouco provável que o problema das prioridades possa ser iludido na maior parte das so­ciedades. M e s m o quando o ciclo de edu­cação de base é mais curto do que o ciclo primário tradicional e quando escolhemos os métodos de educação exteriores ao sis-

1. B A N Q U E M O N D I A L E , «Education sector work­ing paper», op. cit., p. 29.

2. Poderão eneontrar-se indicações sobre u m a «bagagein minima» possível para os jovens das sociedades em desenvolvimento e m P . H . C O O M B S e outros, op. cit., pp. 14 e 15.

3. H . M . PHILLIPS, op. cit., p. 12.

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tema escolar tradicional mais eficazes e m relação ao seu custo, é provavelmente necessário redobrar os recursos atribuí­dos ao ensino escolar de nível pós-elemen-tar. A s incidências políticas desta estra­tégia podem ser consideráveis. C o m o é evidente, trata-se de redistribuir os re­cursos para benefício dos indivíduos, crianças e adultos que foram privados de instrução, e e m detrimento da educação pós-primária (ou até m e s m o da educa­ção primária completa) dos que já rece­beram u m a educação de base. C o m o co­rolário desta redistribuição, vemos que, pelo menos a curto prazo, as possibili­dades de progresso no interior do sistema escolar tradicional são reduzidas, daí re­sultando u m a concorrência mais forte no conjunto.

Existe, porém, outra incidência notá­vel. Nas sociedades e m que o ensino pri­mário para todos não é, devido ao seu custo, u m objectivo susceptível de ser atingido n u m futuro próximo, só será possível generalizar a educação de base proporcionando processos de educação diferentes, principalmente extra-escola­res, àqueles que não podem aceder às escolas primárias habituais. C o m o conse­quência, m e s m o que a educação de base generalizada seja obtida por este pro­cesso, é provável que obtenhamos u m duplo sistema de educação. A s crianças que tiverem acesso às escolas primárias ordinárias poderão, e m seguida, ingres­sar e m estabelecimentos pós-primários, enquanto esta possibilidade se encontra provavelmente vedada às que não te­n h a m recebido u m a educação extra--escolar. Talvez estas crianças tenham beneficiado de u m a educação muito mais adaptada às necessidades do desenvolvi­mento, mas a possibilidade de completar a sua instrução talvez lhes tenha sido recusada devido essencialmente ao grupo social ou à região geográfica e m que nasceram. Segundo Phillips, o problema consiste e m : «Escolher entre desenvolver o tipo de ciclo (primário) aparentemente

democrático já existente, o que talvez re­presente a medida mais popular devido à falta de informação sobre a extensão da diminuição dos efectivos e das repro­vações, ou enfrentar a realidade no plano educativo e social, o que equivale a con­jugar o máximo de alfabetização massiva e de educação de base com o desenvolvi­mento maximal das possibilidades.» x

Podemos, no entanto, perguntar se u m a estratégia que oferece diferentes tipos de educação a diferentes grupos de indivíduos pode conciliar os dois as­pectos concorrentes do objectivo que con­siste e m proporcionar u m mínimo de educação de base a todos, conseguindo simultaneamente que a possibilidade de abordar níveis superiores de ensino con­tinue igualmente aberta a todos.

Perante este dilema, duas reacções são possíveis.

U m a consiste e m ignorá-lo delibera­damente considerando que a única solu­ção é u m sistema educativo tradicional, dominado pelo ensino escolar, o que con­tinuará, por falta de meios financeiros, a privar u m grande número de pessoas de toda a instrução. U m mínimo de edu­cação de base, dir-nos-ão, m e s m o quando não proporciona ao indivíduo a possibili­dade de prosseguir os estudos deve ser preferida à ausência total de educação que, por definição, exclui até m e s m o a possibilidade do aumento do nível de vida elementar e, com maioria de razão, de elevação na escala social. Este argu­mento, porém, não atende às realidades políticas da orgnização do ensino. C o m efeito, é extremamente improvável que u m sistema educativo que incorpore sis­tematicamente a desigualdade de opor­tunidades nas suas estruturas possa apresentar-se como politicamente aceitá­vel à massa da população.

Outra solução para este problema consiste e m criar estruturas educativas que procuram manter abertas as portas

1. H . M . PHILLIPS, op. cit., p. 176.

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A planificação da educação extra-escolar: estratégias e obrigações

que dão acesso à educação, m e s m o para aqueles que recebem u m a educação de base para além do sistema escolar tra­dicional. O que pressupõe a elaboração de mecanismos de selecção que não im­peçam estes indivíduos de aceder a níveis superiores do sistema de ensino de tipo escolar se as suas capacidades o justi­ficarem; pressupõe igualmente a criação de «escalas», de «ciclos» e de «pontes» para facilitar o movimento dos indivíduos entre tipos e níveis educativos1. É evi­dente que esta estratégia fornece u m a solução possível para o dilema. O verda­deiro problema consiste, porém, e m saber se esta solução pode ser aplicada na presença de imposições políticas que se exercem na maioria das sociedades e m desenvolvimento. D e v e m o s , portanto, perguntar se é possível pôr e m funcio­namento u m sistema deste tipo, de m a ­neira suficientemente democrática na realidade, e também se a massa da popu­lação a quem seria recusado, e m primeiro lugar, o acesso aos estabelecimentos de ensino tradicionais, teria confiança na democracia do sistema para aceitar as possibilidades de instrução extra-escola­res que lhes seriam oferecidas. A expe­riência limitada adquirida no campo de estratégias deste tipo parece indicar que nenhuma destas condições seria preen­chida na maior parte das sociedades. É o que contribui, na opinião de muitas pessoas, para explicar o sucesso limitado das políticas de educação de base de paí­ses como o Alto Volta, o Afesranistão, Madagáscar e Benim2 , e também que «poucos países, para além das Repúbli­cas Populares Socialistas, tenham, até asrora, atribuído a maior importância à educação de base mínima» 3.

Embora pareça representar u m a solu­ção técnica apropriada para os problemas inextricáveis da penúria de recursos, o princípio da educação de base tem, con­sequentemente, incidências políticas que suscitam problemas graves quanto às suas possibilidades de aplicação na maior

parte das sociedades e m desenvolvimento. Estes problemas são resumidos por Col-clough : « A criação de u m sistema duplo de educação vai justamente contrariar o objectivo procurado que consiste e m assegurar a igualdade de oportunidades no domínio educativo e social. Esta polí­tica destina-se a legitimar as diferenças sociais e de classes existentes e a ins­titucionalizar as desigualdades... Além disso, a discriminação implícita que as possibilidades de educação oferecidas opera entre as famílias, consoante se trata de famílias urbanas ou rurais, ricas ou pobres, foi a principal razão do insu­cesso das tentativas passadas destinadas a criar u m duplo sistema de educação. É lícito, portanto, supor que novas ten­tativas realizadas com o m e s m o espírito falhariam igualmente sob o efeito de pressões semelhantes.» *

A característica dominante das estra­tégias de educação de base é o facto de atribuírem u m a função essencialmente residual aos programas extra-escolares no interior de u m sistema de educação duplo. A principal razão pela qual se procura proporcionar a certos grupos e indivíduos u m a educação de base através de meios extra-escolares é a insuficiência dos recursos disponíveis, o que impede o necessário desenvolvimento do ensino do tipo escolar para generalizar a educação de base unicamente através deste meio. A educação extra-escolar é necessária, porque não existe nada de melhor. D o ponto de vista da planificação o pro­blema consiste, afinal, e m saJber como se podem elaborar estratégias de educação que, além de explorarem a fundo os pro­gramas extra-escolares, os levem a gozar de u m a situação e de u m prestígio que nada fique a dever ao ensino escolar.

1¿ Mam* Ibidem, cap. 1Q. 2. C . C O L C L O U G H , «Basic education: Samson or

Delilah?», em Convergence, vol. 6, n.° 2, 11976.

3. H . M . PHILLIPS, op. cit., p. 138. 4. C. COLCLOUGH,- op. cit., p. 59.

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E m princípio, o conceito de «capacidade» do sistema é a resposta.

Este conceito, e o seu interesse para o planificador, foram expostos por Grands-taff : «Tentámos rodear o problema (da planificação de meios de educação alheios ao ensino escolar) utilizando diversas ex­pressões como "as utilizações estratégi­cas da educação extra-escolar" ou "o problema da localização da função". O único mérito da expressão empregada —> "capacidade do sistema" — reside no facto de parecer u m pouco mais nitida­mente centrada no objectivo do que as outras. A ideia geral é que todo o meio educativo pode conseguir certas coisas, m a s não outras. A g a m a de objectivos que u m meio (um "sistema") pode obter constitui a sua capacidade. U m traço essencial da planificação e da concepção da educação consiste, então, e m determi­nar e m que medida u m a certa função educativa "se enquadra" nos sistemas propostos como candidatos à execução desta função. D e maneira u m pouco dife­rente, a concepção pode, por vezes, com­portar a análise de u m a função, a fim de determinar como construir u m sistema que lhe seja adaptado. Finalmente, pode­m o s considerar u m sistema como dado e perguntar quais as diversas funções que ele seria capaz de desempenhar.» 1

O ponto capital do raciocínio é que, devido às características respectivas, a educação escolar e a educação extra--escolar são capazes, tanto u m a como outra, de realizar certas tarefas educa­tivas de u m modo satisfatório, e outras de modo medíocre. C o m o consequência da predominância actual da educação escolar na maior parte das sociedades, é provável que esta forma de educação seja chamada a realizar numerosas tare­fas para as quais se encontra mal adap­tada. O objectivo do planificador deve, portanto, consistir e m localizar estas ta­refas e incluí-las n u m a diversidade de programas extra-escolares que as reali­zem melhor. O resultado será provavel­

mente u m sistema e m que a balança da educação dispensada penderá de modo decisivo para o lado oposto ao ensino escolar e onde a harmonia entre a capa­cidade e a função seja o principal factor a determinar onde se situa a linha de separação.

Que critérios práticos poderiam ser aplicados para destinar tarefas concretas a determinado tipo de programa educa­tivo ? Grandstaff2 sugere três : o rendi­mento económico; a adequação de «es­tilos de aprendizagem» particulares a determinado grupo; e a relação entre a forma de educação e a estrutura das necessidades de grupos determinados. Poderiam, com certeza, estudar-se cri­térios suplementares. Estas questões vão ao fundo do problema da planificação e indicam a divergência que existe entre esta concepção do papel dos programas extra-escolares e m estratégias globais da educação e a ideia de «educação de base». Esta última baseia-se na hipótese de que a educação de tipo escolar continuará a dominar na organização da educação e que os programas extra-escolares contri­buirão com o essencial unicamente pe­rante os grupos aos quais, por falta de recursos, o ensino escolar não pode efec­tivamente ser estendido. O conceito de «capacidade do sistema» economiza esta hipótese. E m princípio, pelo menos, a educação deve ser reordenada a fim de que o esquema global seja optimal, e m atenção às necessidades de determinada sociedade.

1. M . G R A N D S T A F F , «Systematic capacity as a problem in the design of alternatives to for­mal education», Non-formal education as an alternative to schooling, p. 22, Michigan State University, 1974 (Discussion paper n.° 4, Programme of Studies in Non-Formal Edu­cation).

2. M . G R A N D S T A F F , «Are formal schools the best place to educate?», em C. S. B R E M B E C K e T . J. T H O M P S O N , New strategies for educa­tion as an alternative to schooling, Lexington Books, 1973.

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A planificação da educação extra-escolar: estrategias e obrigações

D o ponto de vista do planificador, esta abordagem é a única verdadeiramente racional. N o entanto, enfrenta as mes-m a s dificuldades que a ideia de educação de base. O problema é que o processo de planificação provoca, na realidade, u m a tensão constante entre os dois factores essenciais que são a racionalidade e a política. A solução para u m problema determinado que se apresenta teorica­mente como a mais racional pode ser absolutamente inaplicável na prática. É perfeitamente racional, de acordo com o tipo de análise já exposto, transferir recursos dos programas de tipo escolar para os programas extra-escolares. Poli­ticamente, porém, só será realizável se as prioridades sociais e individuais rela­tivas ao sector da educação forem fun­damentalmente modificadas, de tal modo que a importância da educação extra--escolar, do ponto de vista político, se torne claro e sem equívoco. O reordena­mento das prioridades proclamado pelos governos (e, com maioria de razão, pelos planificadores) não basta. A s prioridades dos indivíduos também devem ser modi­ficadas, pois, de contrário, a procura po­pular de meios suplementares de educa­ção escolar continuará a aumentar e as realidades políticas tornarão o desdobra­mento dos recursos destinados ao ensino escolar extremamente improvável. A s prioridades individuais, como é evidente, só terão oportunidade de mudar quando o esquema dos incentivos sociais for modificado, de m o d o a reduzir as van­tagens relativas decorrentes do ensino de tipo escolar e a garantir que os indi­víduos capazes, oriundos de u m meio rural ainda não beneficiado, n e m por isso sejam impedidos de se guindar a situa­ções de responsabilidade invejáveis e re­muneradas de m o d o compatível.

Muitos estudos respeitantes à educa­ção extra-escolar supõem que se encon­tra resolvido este problema capital entre todos. Afirmam que o desenvolvimento de u m esforço massivo de educação rural

no Terceiro M u n d o exige no essencial, previamente «... transformações funda­mentais na atitude e m relação à educa­ção por parte dos alunos, dos pais, dos empresários, dos professores, dos admi­nistradores e dos dirigentes. Se não fo­rem capazes de considerar a educação como aprendizagem e não apenas coimo escolaridade e de reconhecer que os valo^ res reais residem no que se aprende e não na maneira de aprender, não poderá baver solução adequada para as imensas necessidades não satisfeitas das socieda­des rurais» 1 ,

A resposta dada ao problema Ide saber se u m a forte expansão da educação rural extra-escolar seria economicamente rea­lizável nos países e m desenvolvimento é : «certamente que sim —desde que as condições políticas sejam favoráveis.» 2

Esta cláusula afasta qualquer hipótese de discussão sobre o que está no cerne do problema. U m a planificação realista exige u m a análise das transformações da infra-estrutura socioeconómica neces­sárias para tornar possível a realização de grandes programas de educação ex­tra-escolar. D e contrário, é necessário definir as possibilidades que existem real­mente de criar formas de educação dife­rentes das escolares, na ausência destas transformações. Procuraremos, e m se­guida, aprofundar estas questões.

Consideremos, e m primeiro lugar, a si­tuação mais corrente, tendo e m conta que é provável que se modifique o es­quema dos incentivos sociais ou o papel desempenhado pelo sistema escolar na concessão de títulos susceptíveis de per­mitir que o indivíduo se eleve na hie­rarquia social, até ocupar empregos do sector moderno e, por vezes, de elite. Nesta situação, será extremamente difícil realizar u m a inversão das prioridades nacionais e m proveito da educação extra--escolar. Pelo contrário, as pressões polí-

1. P. H . C O O M B S e outros, op. cit, p. 79. 2. P. H . C O O M B S e M . A H M E D , op. dt., p. 202.

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ticas existentes procurarão que a massa dos recursos atribuídos à educação con­tinue a ser consagrada ao sistema escolar e os meios de substituição eventualmente à disposição terão cada vez mais dificul­dade e m sobreviver, ou e m se manter fiéis aos objectivos e ideais iniciais. O s programas extra-escolares previstos para os jovens encontrar-se-ão n u m a posição de concorrência extremamente desvanta­josa e m relação à educação de tipo esco­lar. C o m efeito, o b o m senso tradicional decreta que o privilégio da educação escolar como meio de ascensão social deve ser largamente reservado aos jovens e que, como consequência, são as aspi­rações dos jovens e não as dos adultos que estão ligadas a u m a educação esco­lar. Este argumento aplica-se aos diver­sos programas de educação não formal que podem substituir o sistema escolar, ou completá-lo com o fim de reorientar para empregos produtivos, de preferên­cia para u m trabalho independente e m meio rural, os alunos que abandonaram prematuramente a escola. Muitos estudos de casos salientam que se exercem fortes pressões para que estes programas con­duzam à concessão de «pergaminhos» e outras honras ligadas à educação escolar (ver os centros politécnicos de aldeia do Quénia e as brigadas do Botswana) e se as autoridades não cedem a esta tenta­ção, estes meios de educação perdem ra­pidamente o seu prestígio e m relação às escolas tradicionais (ver os centros de educação rural do Alto Volta), i

Neste género de situações, a educação extra-escolar terá provavelmente as m e ­lhores possibilidades de ser aplicada com sucesso, e m dois contextos. E m primeiro lugar, quando a penúria dos recursos obriga os governos a grandes dificulda­des na resposta à procura sempre cres­cente de educação escolar, os programas extra-escolares concebidos para permitir a obtenção por outros meios de títulos oficialmente reconhecidos são susceptí­veis de agradar ao público e de ser fir­

memente defendidos. Os cursos por cor­respondência e diversas categorias de cursos nocturnos ou a tempo parcial que utilizam as instalações escolares e a par­ticipação dos professores apresentam a vantagem de completar e não de concor­rer com o sistema escolar, e a menor preço (custo marginal, e m particular). É a «procura excedentária» massiva de ensino escolar e m todo o Terceiro Mundo que provocou a emergência das institui­ções de ensino por correspondência e m numerosos países e que suscita, para a Universidade aberta, o interesse que se liga a u m modelo possível. Estas insti­tuições exercem u m a função educativa e contribuem para a realização de u m a espécie de «educação popular». N o en­tanto, só com sérias reservas poderemos qualificá-las de verdadeiramente «extra--escolares» e elas têm pouco e m c o m u m com o objectivo de u m desenvolvimento rural generalizado. Além disso, a quali­dade do ensino oferecido por estes pro­gramas fica a dever muito, e m geral, ao ensino de tipo escolar.

O segundo contexto e m que existem possibilidades reais de recurso à educa­ção extra-escolar como solução de subs-tuição é aquele e m que os objectivos são qualitativamente diferentes dos do ensino escolar. Deve ser possível continuar a criar diversos tipos de meios de educação extra-escolar e m domínios e m que, como é evidente, não existe concorrência com a educação escolar, o que traduz u m esforço largamente concentrado nos adul­tos, e m particular nos das regiões rurais, cujas perspectivas de exercer u m e m ­prego na cidade são habitualmente redu­zidas. Este domínio é obviamente aquele e m que a educação extra-escolar sempre foi mais desenvolvida, graças aos servi­ços de divulgação agrícola ou outras iniciativas análogas do Estado e existem ainda, sem dúvida alguma, possibilidades de expansão. C o m o indicam Colclough e Hallak: «. . .Agora parece evidente que muitos programas de ensino, organizados

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A planificação da educação extra-escolar: estrategias e obrigações

para além do sistema escolar oficial, te­n h a m influenciado o comportamento das pessoas. Resulta dos esforços feitos pelos serviços de divulgação agrícolas e m vá­rios países diferentes que a produtivi­dade agrícola pode ser aumentada utili­zando métodos de vulgarização, desde que as disponibilidades e m outros re­cursos não constituam u m obstáculo insu­perável. Recentemente, foram igualmente feitos progressos apreciáveis no domínio da formação de gerentes e pequenos pro­prietários, utilizando, para este efeito, métodos de vulgarização que tiveram efeitos nitidamente positivos sobre a pro­dutividade. D o m e s m o modo, as campa­nhas a favor da educação dos adultos utilizando meios de comunicação de massa, campanhas durante as quais as relações com os estudantes foram bas­tante reduzidas, revelaram-se, e m certos casos, capazes de influenciar sensivel­mente o comportamento e a tomada de consciência dos rurais. A u m nível dife­rente, do ponto de vista da organização, é importante notar a formação estrutu­rada dispensada "no trabalho" por u m conjunto de métodos não formais e infor­mais que prepara para as profissões exercidas nas zonas rurais e peri-urbanas e que exige u m a tecnologia caracterizada por u m fraco grau de capitalização. D e facto, é possível que tenha sido, no pas­sado, este o principal modo de influência do ensino não institucional sobre o bem--estar e a produtividade dos rurais nos países e m desenvolvimento.» *

O principal problema suscitado por qualquer tentativa séria destinada a alar­gar o alcance destes programas extra--escolares consiste, como é evidente, e m encontrar os recursos necessários. A s pesadas exigências do sistema escolar absorvem automaticamente créditos de ensino que poderiam ser melhor utili­zados noutras circunstâncias. Para que estes programas obtenham u m a parte razoável dos recursos nacionais consa­grados à educação, é necessário portanto,

abandonar a hipótese de que não se podem produzir alterações no esquema dos incentivos ou no papel dominante desempenhado pela educação de tipo es­colar na estratificação social. É necessá­rio considerar as situações e m que se procura seriamente modificar o statu quo no que se refere aos objectivos do desenvolvimento, ao esquema das incita­ções sociais e ao papel da educação no processo de desenvolvimento.

Raros foram os países que tentaram aplicar, e não apenas propor, reformas tão radicais, m a s é evidente que dois elementos principais são comuns às es­tratégias deste tipo. E m primeiro lugar, reconhece-se que só podem ser atingidos novos objectivos e aplicadas novas prio­ridades se forem estabelecidos novos es­quemas de estímulos sociais que apoiem e reforcem os movimentos a favor destes objectivos, o que exige u m a acção explí­cita tendente, por exemplo, a modificar as disparidades entre zonas urbanas e rurais e a romper a ligação íntima que existe entre os títulos escolares e as re­compensas socioeconómicas. E m segundo lugar, os aspectos afectivos da educação são reconhecidos de m o d o muito mais explícito. A educação é considerada não só como susceptível de contribuir para o desenvolvimento sob o aspecto mate­rial, permitindo que os indivíduos façam, as coisas mais eficazmente, m a s tambélm como tendo repercussões sobre o que são os indivíduos — sobre as suas ati­tudes, motivações e concepção do mundo . Nesta situação, a tarefa do planificador e do responsável pela política da edu­cação está longe de se limitar a conceber e aplicar programas extra-escolares efi­cazes, embora também seja importante; é igualmente necessário que tentem «des-formalizar» a própria escola para redu-

1. O . C O L C L O U G H e J. H A L L A K , «A problemática ida educação rural: equidade, eficácia e em­prego», Perspectives, vol. VI, n.° 4, 1976, pp. 562 e 553-

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zir a sua capacidade de isolar os seus clientes da vida e do trabalho e m meio rural. O s governos que tentaram conce­ber estratégias da educação deste tipo consideraram a situação, e m grande parte, de u m ponto de vista radical ou revolucionário. Examinaremos, e m se­guida, dois casos.

Depois do acesso à independência, a República Unida da Tanzânia demons­trou, acerca do desenvolvimento, u m a concepção mais «radical reformista» do que revolucionária. N a sua reflexão sobre o papel da educação no desenvolvimento, o presidente Nyerere dedicou-se explici­tamente aos problemas de transformação de atitude e de formação dos valores. C o m efeito, a sua Education for self--reUance continua a ser u m a das expo­sições mais concisas dos problemas que se colocam quando pretendemos que a educação contribua para os objectivos de desenvolvimento que são cada vez mais firmemente preconizados no plano inter­nacional: «O sistema educativo da Repú­blica Unida da Tanzânia», escreveu Nye­rere, «deve salientar o esforço colectivo e não o avanço individual ; deve valorizar o conceito de igualdade e o sentido do serviço a associar a qualquer aptidão especial, quer se trate do domínio da marcenaria, da criação de gado ou de trabalhos científicos. E m particular, a nossa educação deve combater a tenta­ção de arrogância intelectual, pois esta atitude leva aquele que recebeu u m a boa instrução a desprezar os que não pos­suem disposições para o estudo ou apti­dões especiais, sendo apenas seres h u m a ­nos.» 1

Estas linhas contêm u m a crítica implí­cita ao ensino tradicional, a qual será expressa muito mais formalmente e m outros escritos do presidente da Repú­blica Unida da Tanzânia. A política pro­posta, e que foi seguida por este país, compreende a elaboração de programas extra-escolares eficazes destinados a sa-tifazer necessidades específicas, assim

como reformas radicais do sistema esco­lar com o objectivo de o reorientar e m função das necessidades da maioria e a impedir que os jovens sejam desligados do seu meio. O alcance e a diversidade dos programas extra-escolares aplicados na República Unida da Tanzânia, e des­tinados particularmente aos adultos, são notáveis 2 ; a maior parte foram conce­bidos de m o d o a responder a objectivos ¡claros, tanto no plano afectivo como cognitivo. A reforma da escola, que deve­ria retirar-lhe muitas das suas caracte­rísticas «formais» indesejáveis, enfren­tou, contudo, resistências. O próprio Nyerere definiu os problemas do se­guinte m o d o :

«... Devemos, porém, reconhecer, pen­so, que não fizemos tudo o que seria necessário. F o m o s demasiado tímidos — mostrámo-nos pouco libertos — para transformar radicalmente, como seria necessário, o sistema que tínhamos her­dado. ..

«... O primeiro problema que ainda não resolvemos foi o de termos sufi­ciente confiança e m nós mesmos para recusar as coisas consideradas como as melhores do Mundo —seja qual for o sentido desta expressão— e escolher, pelo contrário, as que mais se adaptam à nossa situação...

«O segundo problema é o de parecer­m o s incapazes ou pouco desejosos de integrar realmente a educação na vida, assim como na produção.

«Além disso, e é este o nosso terceiro fracasso, não conseguimos destruir a con­vicção de que os resultados escolares de u m a criança — ou de u m adulto — a tor­n a m particularmente digna de elogios e lhe dão direito a u m a situação social privilegiada...

1. J. K . N Y E R E R E , Ujamaa: essays on socialism, p. 52, Oxford University Press, 1968.

2. E . H A L L , «Adult education and the develop­ment of socialism in Tanzania», ¡East Afri­can Literature Bureau, 197o.

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A planificação da educação extra-escolar: estratégias e obrigações

«Mais u m a vez, trata-se não só de u m fracasso do nosso sistema escolar, como de u m fracasso de toda a socie­dade. .. » 1

Assim, a despeito da clareza e do ca­rácter radical dos seus objectivos, da prioridade concedida à reforma da edu­cação e da firmeza da sua direcção, a República Unida da Tanzânia tem mui­tas dificuldades e m «desformalizar» o seu sistema escolar. A s pressões sociais contrárias revelam-se de grande impor­tância. Resta saber se, a médio e a longo termo, estas contradições poderão ser superadas e se a reforma da educação poderá ser efectivamente realizada.

U m segundo caso que nos pode servir de ilustração é o de Cuba. A s reformas da educação que se seguiram à revolu­ção atribuíram u m interesse crescente aos objectivos afectivos e, e m particular, à criação do «novo h o m e m socialista», segundo Che Guevara, pelo desenvolvi­mento da conciencia, isto é, da consciên­cia no sentido psicológico e no sentido moral, «noção que engloba o conheci­mento imediato de si e da realidade, a honestidade e o sentido das responsa­bilidades» 2. A pon t a m - s e igualmente exemplos de programas extra-escolares cujo sucesso foi notável, e m especial a célebre campanha de alfabetização de 1961. A lém disso, como podemos supor, tendo e m conta a filosofia revolucionária de Cuba, dasenvolvem-se sérias tentati­vas para «desformalizar» a escola e, e m particular, para reduzir a dicotomia en­tre educação e trabalho. A palavra de ordem começou por ser «as escolas para os campos»; agora, é «as escolas nos campos». Pensamos que não existem dú­vidas de que esta última fórmula, e m particular, pressupõe u m a substancial transformação do conceito tradicional da escola. Contudo, m e s m o e m Cuba, onde as reformas económicas e sociais foram importantes, o trabalho escolar continua muito ligado às formas e a avaliação dos resultados, segundo critérios tradicionais

baseados nos exames, parece constituir a regra. Podemos deduzir que, m e s m o nas sociedades que conheceram u m a re­volução, os obstáculos que impedem a «desformalização» do ensino continuam a ser verdadeiramente importantes3.

N o presente artigo tratámos dois temas que se assemelham. E m primeiro lugar, analisámos diferentes abordagens da introdução de elementos extra-escolares nas estratégias nacionais da educação; e m seguida, estudámos a importância das imposições sociopolíticas que tornam u m a reforma fecunda da educação extrema­mente difícil de realizar. Considerando as estratégias e m primeiro lugar, empe-nhamo-nos essencialmente e m analisar duas maneiras de abordar a planificação da educação nos países e m desenvolvi­mento: o método da «educação de base» e o que utiliza o conceito de «capacidade do sistema». A m b o s se apoiam na racio­nalidade da planificação: o primeiro, no sentido restrito da procura de soluções de substituição pouco dispendiosas, quando o prosseguimento da expansão do ensino segundo os métodos tradicionais já não é possível por falta de recursos; o se­gundo, no sentido mais fundamental de tentativa de optimalização da organiza­ção global da educação e m função dos objectivos do desenvolvimento. A nossa análise das imposições leva-nos a pen­sar, contudo, que as abordagens globais

1. J. K . N Y E K E K E , «A educação para a liber­dade e m Africa», Perspectives, vol. V , a." 1, 1975, pp. Il e 12.

2. Oitad© e m A . G I L L E T T E , Cuba's educational revolution, p. 9, Fabian Society, 1972.

3. Encontrar-se-á u m estudo miais pormenori­zado do «complexo do certificado» que se apoia nestes e outros exemplos e m R . D O R E , The dvplom-a disease: education, qualifica­tion and development, Allen and Unwin, 1976. Ë interessante notar que, miesmo na sociedade chinesa, a miais revolucionária que existe, a tensão entre as diferentes concep­ções da educação foi u m elemento prepon­derante da «revolução cultural» e continua a ser importante.

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da planificação têm poucas possibilidades de sucesso na maior parte das sociedades e m desenvolvimento porque privilegiam o aspecto técnico e m prejuízo do polí­tico e, por conseguinte, não têm plena­mente e m conta o facto das aspirações dos indivíduos e m matéria de educação poderem não coincidir com as dos plani­ficadores. E m todos os sistemas que não conseguem romper a ligação estabelecida entre o ensino escolar, os títulos atribuí­dos e as recompensas socioeconómicas, será extremamente difícil elaborar pro­gramas extra-escolares eficazes que re­presentem verdadeiras soluções de subs­tituição para a educação dos jovens, ou «desformalizar» a escola de m o d o a adaptar melhor a educação que ela pro­porciona às necessidades nacionais de educação. A s pressões populares preci­pitarão a institucionalização ou a desva­lorização dos programas extra-escolares aplicados, ou desmantelarão qualquer tentativa de envergadura destinada a re­formar a própria escola.

Devem ser procuradas soluções e m qualquer das direcções possíveis. C o m o é evidente, devemos começar por nos

empenhar nas reformas que apresenta­rem mais possibilidades de êxito, o que consistirá principalmente e m desenvol­ver mais os programas extra-escolares destinados aos adultos sempre que as pressões exercidas para concessão de certificados e, por conseguinte, para a institucionalização, não forem muito for­tes. Esta abordagem pode parecer exa­geradamente modesta se considerarmos a enorme importância que foi concedida e m escritos recentes, à educação não for­mal e o grande número de vantagens certas que os programas extra-escolares de diversos tipos oferecem e m relação ao ensino escolar. Para ser eficaz, porém, qualquer aplicação mais extensa da edu­cação extra-escolar exige u m a segunda solução que englobe reformas muito mais fundamentais. Estas só serão possíveis se forem introduzidas modificações radi­cais na sociedade e na economia de u m a maneira geral e, m e s m o quando estas transformações tiverem lugar, a reforma da educação, e m particular no interior do sistema escolar, não será tarefa fácil, como provam o caso da República Unida da Tanzânia e de Cuba.

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Paul H . Bertelsen

Informação, orientação

e consulta

Se pretendemos transformar a educação permanente n u m a realidade, é indis­pensável desenvolver os serviços de in­formação, de orientação e de consulta destinados aos adultos que continuam, ou poderiam continuar, a estudar.

O que pressupõe que as crianças e os jovens estejam preparados, intelectual e moralmente, para continuar a aprender durante toda a vida e que os adultos, quer tenham sido preparados, ou não, pela escola, para receber u m a educação complementar, tenham acesso, e m qual­quer momento da sua existência, a u m ensino que corresponda aos seus inte­resses ou às suas necessidades.

Embora as possibilidades que se ofe­recem no momento da escolarização ini­cial sejam estritamente limitadas, as da educação escolar e extra-escolar diver-sificam-se à medida que se avança na vida. Torna-se então difícil não só esco­lher, m a s também obter informações sobre as possibilidades existentes.

Para assegurar democraticamente a igualdade de acesso a todos os membros

Paul ff. Bertelsen (Dinamarca). Director da Secção da educação dos adultos no seio da Divi­são de alfabetização, da educação dos adultos e o desenvolvimento rural (Unesco). Longa ex­periência no domínio da educação dos adultos, em especicã no Gana e na República Unida da Tanzânia.

de u m m e s m o grupo etário ou de grupos etários diferentes, será necessário que a maior parte dos países, senão todos, to­m e m inúmeras medidas sociais. N o en­tanto, o presente artigo refere-se unica­mente ao que podem fazer os serviços de informação, de orientação e de con­sulta, primeiramente para facilitar aos adultos o acesso à educação e, e m se­guida, para os ajudar a superar os obs­táculos que os impedem de atingir os objectivos educativos que se fixaram.

Neste artigo, o termo «informação» designa as informações respeitantes às possibilidades de educação disponíveis e, neste caso, as condições prévias que é necessário preencher para delas poder beneficiar. O termo «¡orientação» designa o facto de ajudar alguém a optar e m matéria de educação. N o sentido e m que aqui é utilizado, este termo não implica julgamento exterior, n e m directivas pa­ternalistas. Ele é a expressão das possi­bilidades que correspondem à situação do indivíduo tal como decorrem de u m diálogo e que permite que este indivíduo tome pessoalmente as suas decisões na medida do possível e com conhecimento de causa. Por «consulta», entendemos as soluções, obtidas igualmente a partir de u m diálogo, propostas para os problemas encontrados pelo interessado na via que escolheu. C o m o é evidente, por vezes pode ser difícil distinguir claramente en-

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Paul H . Bertelsen

tre estes conselhos e consultas terapêu­ticas. Por muito importantes que sejam, estas últimas não se incluem no âmbito do presente artigo.

Situação actual

Embora os serviços de informação e de consulta estejam muitas vezes ligados na prática, é não só possível como tam­b é m desejável distingui-los. A maior parte das informações sobre as possi­bilidades de educação organizadas ema­n a m dos organismos que as proporcio­n a m e estes têm tendência, por vezes, para confundir informação e propaganda.

N u m a pequena sociedade homogénea — a aldeia tradicional, por exemplo — as possibilidades de participação n u m processo de educação talvez sejam raras, mas , pelo menos, toda a gente as conhece. N u m a sociedade mais complexa — como a grande cidade — as possibilidades são muito mais numerosas, m a s é muito difí­cil para u m indivíduo obter informações sobre as actividades existentes, e, a for­tiori, sobre as que são susceptíveis de corresponder às suas necessidades, inte­resses, formação, etc.

Se até m e s m o os que efectuaram es­tudos prolongados experimentam dificul­dades e m encontrar o que desejam, quer dizer dos menos instruídos, dos que aca­b a m de completar os estudos ou dos que, de qualquer modo , se encontram e m con­dições de inferioridade ? N a verdade, são muitas vezes os que mais necessitam de educação que sentem maiores dificulda­des de acesso.

A necessidade de divulgar amplamente a informação relativa às possibilidades de educação e aos serviços de orientação é desde já evidente, m a s tornar-se-á, sem dúvida alguma, cada vez mais imperiosa, atendendo às crescentes necessidades e possibilidades de educação.

Os meios de informação modernos per­mitiram a aplicação de novas técnicas, que muito facilitam a aprendizagem indi­

vidual sem professor. M a s , para que estas técnicas sejam largamente utili­zadas, não bastam que existam aqui ou além. É necessário que o aluno possa ter facilmente acesso ao material de en­sino de que carece, quer se trate de li­vros, de bandas magnéticas, de documen­tos, de ilustrações, etc.

Consequentemente, é indispensável a elaboração dos mecanismos que permi­tam responder ao desejo de educação, formulado ou não, explorando melhor as possibilidades existentes e criando outras.

A informação — ou a publicidade — apresenta-se sob numerosas formas : car­tazes, brochuras policopiadas ou impres­sas, anúncios mais ou menos sistemati­camente difundidos na grande imprensa e revistas destinadas a determinados gru­pos, textos de carácter descritivo e/ou persuasivo inseridos na imprensa ou fa­zendo parte das emissões de rádio ou de televisão. O s organismos à altura de utilizar estas técnicas, como fazem as empresas comerciais e m relação aos pro­dutos, são relativamente pouco numero­sas e, embora certa publicidade revele boa qualidade técnica, grande parte dela poderia certamente ser melhorada.

Se é verdade que os contactos pessoais desempenham u m papel importante na publicidade e no recrutamento, também é certo que, e m geral, parecem mais completar do que substituir os outros processos.

A s experiências suecas F O V U X , que implicam o emprego de muitois funcio­nários que se incluem entre os indivíduos com mais elevado nível de estudos, obti­veram resultados notáveis, m a s trata-se já de u m caso e m que a consulta com­pleta o processo de informação.

Apoiada e m personalidades reconheci­das pela opinião pública, a informação torna-se duas vezes mais eficaz. Lalage B o w n cita o caso, na Nigéria, de u m a campanha de educação sanitária que, orientada pelos meios de informação de massa, obteve resultados decepcionantes,

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Informação, orientação e consulta

enquanto as explicações fornecidas, e m seguida, ao chefe da comunidade, para serem transmitidas pelos meios de comu­nicação tradicionais permitiram obter resultados espectaculares. É do conheci­mento público que as comunidades religio­sas, os partidos políticos e os sindicatos podem fazer muito para estimular — ou 'desanimar— a participação dos seus membros e m programas de educação.

Convém salientar a informação essen­cialmente destinada aos intermediários entre os organismos e os alunos, isto é, às associações de voluntarios, aos traba­lhadores sociais e aos empresários. Esta informação desenvolver-se-á, sem dúvida, pois as ofertas tornar-se-ão demasiado numerosas para se destinarem directa­mente ao grande público.

Finalmente, não devemos esquecer os serviços que não fazem parte de u m or­ganismo de educação dos adultos, m a s que se dedicam exclusivamente à infor­mação do público e, n u m a medida variá­vel, à orientação e à consulta. Citemos, e m particular, o notável exemplo de M é -trodoc, e m Toronto (Canadá), que m a n ­tém actualizada u m a lista, estabelecida por ordenador, de todas as possibilidades de educação assinaladas e m Toronto (mais de 80 000), e para as quais os catálogos impressos se encontram dispo­níveis e m todas as bibliotecas públicas da cidade.

Os serviços de informação polivalentes serão cada vez mais necessários, e m especial nos grandes centros urbanos, simultaneamente para responder aos pe­didos individuais de informação e para reunir os dados que servirão de base ao desenvolvimento de serviços de consulta.

ORIENTAÇÃO E' 'CONSULTA FORNECIDAS ¡BEILOS CEINTROS DE EDUCAÇÃO D E ADULTOS

O s actuais serviços de orientação e con­sulta são insuficientes. N a maior parte das vezes desenvolveram-se como anexos de outras actividades.

Para os responsáveis pela educação de adultos, é evidente que o professor chega antes da aula e permanece, e m seguida, à disposição dos alunos que desejem for­mular questões particulares; muitas ve­zes, esta entrevista transforma-se e m consulta. Durante as aulas fornecem-se igualmente conselhos que são integrados no processo de ensino. Os alunos tam­bém podem reunir-se para além das ho­ras de aula, para se aconselharem m u ­tuamente.

Embora as inscrições sejam, na maior parte das vezes, objecto de consulta, mui­tos centros de educação de adultos efec-tuam-nas por correspondência ou con-fiam-nas a pessoal administrativo que nem sempre se encontra e m condições de fornecer opiniões válidas. N o Insti­tuto de Educação de Adultos de Dar es Saalam (República Unida da Tanzânia), manda a tradição que os professores a tempo integral assistam às inscrições e que não só dêem conselhos sobre a admis­são às aulas do Instituto, como ainda assinalem aos candidatos as possibilida­des de educação mais interessantes entre as que oferecem os outros centros de educação dos adultos da cidade; exercem, assim, u m a verdadeira função de orien­tação.

D a consulta indissociável da participa­ção nas aulas e ligada à inscrição, aos serviços de consulta assegurados, e m permanência, nos centros de educação dos adultos por pessoal docente ou por conselheiros especiais, vai apenas u m passo, geralmente ultrapassado nos casos e m que os alunos são obrigados a fazer u m a opção que os empenhe por muito tempo e a empreender, com fins profis­sionais ou outros, estudos conducentes a qualificações reconhecidas.

A s instituições cuja principal razão de ser consiste e m proporcionar íserviços de orientação e de consulta aos alunos e ao público e m geral constituem u m a excepção.

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SERVIÇOS DE ORIENTAÇÃO E DE CONSULTA FORNECIDOS POR OUTROS ORGANISMOS

Muitos conselhos relativos à educação são igualmente fornecidos por organis­mos , serviços, associações, etc., cujo prin­cipal objectivo não é de carácter edu­cativo.

A s agências de emprego fornecem, cada vez mais, informações sobre as possibilidades 'de formação profissional e aconselham directamente, ou remetem para organismos de consulta, as pessoas interessadas. D o m e s m o modo , os cen­tros de testes profissionais, que subme­tem os trabalhadores a testes e os clas­sificam por categorias, orientam para u m curso de formação apropriada os que desejem qualificar-se para u m a catego­ria superior. N o entanto, muitas vezes, parece existir u m a solução de continui­dade entre a possibilidade de adquirir u m a formação profissional e a de obter o género de cultura geral necessária para aceder aos meios de formação e deles beneficiar, o que se deve não só à insuficiência dos conselhos fornecidos, como também à ausência de meios de instrução necessários.

A s empresas, e e m particular as gran­des, onde o serviço de pessoal se encon­tra largamente desenvolvido, fornecem muitas vezes conselhos sobre as possi­bilidades de educação proporcionadas tanto pela empresa como pelo exterior.

O s sindicatos associam-se, por vezes, a este serviço, mas , além disso, fornecem frequentemente os seus próprios conse­lhos no que respeita à formação profis­sional, à formação ¡sindical ou a qualquer outro tipo de educação.

N ã o é raro que os trabalhadores sociais se sintam obrigados a fornecer conselhos sobre a educação dos adultos, Encon-tram-se mais ou menos e m condições de o fazer. M a s , por vezes, é suficiente saber orientar o público para o serviço com­petente.

Os conselhos dados no âmbito dos ser­viços médicos dizem respeito, como é evi­dente, à educação sanitária, e também à readaptação das pessoas que, devido a u m acidente ou a u m a doença, devem adquirir novos conhecimentos ou compe­tências. Esta readaptação pode ser difícil quando a educação de base é insuficiente, mas pode igualmente ser coroada de su­cesso. U m trabalhador francês de cons­trução civil, obrigado a abandonar a profissão devido a reumatismo, foi sub­metido a u m a série de testes; revelou possuir u m a inteligência excepcional. In-dicaram-lhe u m curso de formação apro­priado; foi nomeado contramestre e di­rige actualmente o trabalho de sessenta pessoas.

A s bibliotecas são frequentemente uti­lizadas como centros de informação e de orientação e m matéria de educação e muitos bibliotecários apreciam vivamente a possibilidade que lhes é oferecida de ajudarem o público.

N u m a última categoria, e não das menos importantes, as inúmeras espé­cies de associações voluntárias fornecem implícita e explicitamente conselhos aos seus membros, que incitam a participar nas actividades educativas organizadas pela própria associação ou por outros organismos, por vezes após pedido ex­presso de u m a associação. Além disso, as associações de voluntários desempe­nham, por vezes, u m papel na escolha dos participantes e m estágios de forma­ção e m regime de internato; algumas fornecem ainda apoio financeiro ou aju­d a m os candidatos a obter bolsas de estudos.

O s serviços de orientação e de consulta integrados n u m a estrutura de conjunto

O facto dos serviços de informação, de orientação e de consulta estarem organi­zados com o objetcivo de fornecer u m serviço directo aos alunos e ao público

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Informação, orientação e consulta

e m geral, não deve levar-nos a perder de vista o lugar que ocupam na estrutura de conjunto ou no sistema de educação dos adultos.

O s serviços de consulta podem ter, por retroacção, u m a influência importante na elaboração e avaliação dos programas. C o m efeito, as reacções dos alunos ao que lhes é oferecido e ao que não encon­tram são, então, conhecidas. D e resto, verificanse já u m a maior participação dos alunos na avaliação. A informação de retorno fornecida pelos serviços de consulta pode contribuir utilmente para esta forma de avaliação e para o m e ­lhoramento dos programas que daí de­corre.

A tarefa encontra-se facilitada quando os conselhos são dados n u m estabeleci­mento de ensino. M a s , quando a consulta é organizada no âmbito de u m serviço independente, é necessário tomar dispo­sições particulares para transmitir a in­formação aos níveis do sistema e m que são tomadas as decisões respeitantes à elaboração dos programas.

O s serviços de informação e de con­sulta não se limitam a informar sobre determinadas possibilidades de educação : dirigem-se ao grande público. Encon-tram-se, pois, bem colocadas para pros­pectar, de certo modo, o mercado. A o re­gistar os pedidos respeitantes às diversas possibilidades de educação, os serviços consultivos polivalentes podem aperce-ber-se das lacunas, das sobreposições e dos eventuais duplos empregos e dos factores sociais que entravam o acesso aos estudos comprometendo o seu su­cesso, quer se trate de obstáculos eco­nómicos, de imposições de tempo e de transporte ou de u m problema de assis­tência a crianças. Além disso, existem muitas vezes pré-requisitos, mencionados ou não, que condicionam o acesso a u m a informação.

Para democratizar a educação e de­senvolver a educação permanente, inte­

ressa identificar os obstáculos que se opõem à passagem de u m nível de ensino para outro e à mobilidade horizontal entre as diferentes vias educativas, como, por exemplo, entre o ensino de cultura geral e a formação profissional, a fim de poder construir as «pontes» necessá­rias sob forma de cursos preparatórios ou intermédios.

Os serviços de consulta podem, além disso, fornecer informações importantes sobre o modo como os jovens e os adultos reagem à sua formação anterior, escolar e extra-escolar. Esta informação de re­torno pode, portanto, não só influenciar a planificação da educação dos adultos, como também fornecer preciosas indica­ções sobre o funcionamento do sistema de ensino.

Quase todas as formas de ensino deve­riam comportar implicitamente u m ele­mento de consulta. Diz-se que u m b o m professor deve dominar a sua especiali­dade, mahter-.se ao corrente de diversos métodos entre os quais possa escolher o mais apropriado e, sobretudo, conhecer os seus alunos — o auditório a quem se dirige. E m medicina, parece natural for­mular u m diagnóstico antes de começar u m tratamento, mas , e m educação, ve­mos, muitas vezes, que o professor co­meça imediatamente a ensinar sem ter avaliado os antecedentes, as necessida­des, os gostos, etc., do aluno.

O desenvolvimento deliberado das ser­viços de consulta, como parte integrante do ensino e como função distinta, pode contribuir para elaborar u m a abordagem do ensino com diagnóstico melhor cen­trado no indivíduo, a fim de que o ensino corresponda à situação dos alunos. Con­selheiros experimentados deveriam par­ticipar na formação dos professores e outro pessoal de educação, a fim de que os professores pudessem desenvolver o aspecto consultivo do seu trabalho e pas­sar mais facilmente do ponto de vista do professor para o do aluno.

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Paul H . Bertelsen

A consulta no domínio da educação e e m outros domínios

Embora seja inegável que certos adultos procuram adquirir conhecimentos e com­petências por si mesmos, muitos deles sentem^se motivados por outras preo­cupações, como, por exemplo, encontrar u m emprego ou obter u m aumento de ordenado, resolver certos problemas fa­miliares, tomar parte activa nos assuntos públicos, ou preencher os seus tempos livres.

O desejo ide aprender pode resultar de inúmeras preocupações e funções. Quando u m indivíduo procura u m a opinião fora do seu meio, dirige-se mais facilmente a u m a agência de empregos, a u m serviço social ou a u m a associação voluntária do que a u m organismo de educação de adultos.

O adulto duvida, por vezes, da sua ca­pacidade de continuar a aprender e a desenvolver-se. Ê o que sucede, e m parti­cular, com os que — e são numerosos — adquiriram a maior parte dos seus co­nhecimentos e competências fora do sistema de ensino e que experimentam enormes dificuldades e m comparar as suas aquisições ou o seu potencial com os das pessoas que efectuaram estudos aprofundados.

E m período de rápida mutação econó­mica, quer se trate de expansão ou de recessão, os serviços de consulta sobre o emprego assumem u m a importância particular tanto para o indivíduo como para a sociedade. Ninguém pode preten­der que a existência de u m a formação geral e profissional e de serviços de con­sulta poria fim a u m a crise económica, mas as consequências do desemprego se­rão tanto mais graves quanto maior for a mobilidade da mão-de-obra. Por exem­plo, não parecem existir dúvidas de que o sistema sueco de educação orientado para o mercado de trabalho, que pressu­põe u m volume considerável de consultas sobre as carreiras e a educação, contri­

bui, de modo não desprezível para conter o desemprego.

Verifica-se muitas vezes que os di­versos serviços de consulta funcionam mais ou menos independentemente uns dos outros. Aumentar as trocas de in­formações e de dados poderia competir aos comités locais para educação dos adultos. A existência de u m serviço poli­valente de informação e de orientação sobre a educação dos adultos pode con­tribuir muito para a promoção da coope­ração no plano local e, e m especial, para ajudar os serviços especializados, pondo à sua disposição documentação e organi­zando sessões de introdução e de for­mação.

O papel das escolas e das universidades

Se, antigamente, ao sair da escola, os alunos eram quase sempre obrigados a escolher irrevogavelmente entre conti­nuar os estudos a tempo integral ou pro­curar u m emprego, actualmente podem mais facilmente retomar os estudos a tempo parcial ou até integral.

E m muitos países cujas limitações do sistema de ensino permitem que apenas u m a fracção dos alunos passe do pri­mário para o secundário, ou do secun­dário para o superior, a escola e o pro­fessor podem desempenhar u m papel útil informando os alunos do último ano sobre as possibilidades que lhes são ofe­recidas de continuarem a instruir-se para além do sistema escolar e estimulando-os a aproveitar estas possibilidades. Esta informação pode igualmente ajudá-los a libertar-se do complexo de insucesso que, muitas vezes, sentem.

 medida que se eliminam as barreiras entre o sistema escolar e a educação extra-escolar, e que se multiplicam as possibilidades de educação permanente, os serviços consultivos dependentes de u m a escola devem assumir u m papel mais importante, ajudando os alunos e os pais a escolher entre o prosseguimento dos

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Informação, orientação e consulta

estudos a tempo integral ou u m a dosa­g e m estudo-trabalho, tendo e m vista, tal­vez, estudos ulteriores a tempo integral.

N o s países e m desenvolvimento que não dispõem de estruturas suficientes para permitir o desenvolvimento da educação dos adultos, a participação do sistema escolar na sua educação constitui u m a solução relativamente eco­nómica e que, além disso, apresenta a vantagem de aproximar o aluno da vida da comunidade. N a República Unida da Tanzânia, o facto dos pais participarem nas actividades de educação dos adultos organizadas nas escolas reforçou con­sideravelmente o interesse que demons­tram pela educação dos filhos e facilitou a reforma dos programas. Se o professor é, e m todos os sistemas, aquele que se consulta e m matéria de educação, é evi­dente que o seu papel de conselheiro adquire mais importância n u m sistema integrado.

N o ensino superior, verifica-se, desde há alguns anos, u m a tendência para a diversificação na idade e na formação anterior dos estudantes. C o m o sucede noutros casos, esta evolução aumenta as necessidades e m matéria de informação e de consulta.

Os organismos que se ocupam da edu­cação dos adultos — e mais particular­mente os serviços polivalentes de infor­mação, de orientação e de consulta sobre a educação dos adultos — deverão fornecer aos serviços consultivos das es­colas e das universidades documentação sobre as possibilidades de educação ex­tra-escolar e elaborar u m sistema que permita orientar o público para os ser­viços complementares mais apropriados.

Pessoal e formação

A s principais categorias de pessoal necessárias para aconselhar os alunos adultos são as seguintes: conselheiros profissionais a tempo integral especiali­zados e m opiniões relativas à educação

dos adultos; conselheiros profissionais não especializados e m educação dos adul­tos, m a s relacionados com este domínio no âmbito das suas actividades profis­sionais; especialistas e m educação dos adultos destinados a fornecer conselhos no âmbito das suas tarefas docentes ou de administração e todos os que traba­lham a tempo parcial ou exercem gra­tuitamente actividades no seu local de trabalho, no seu bairro ou no seio das associações de que são membros.

N o s países que não dispõem de número suficiente de conselheiros profissionais, é não só possível como desejável desen­volver os serviços de informação, de orientação e de consulta, utilizando o pessoal pertencente às duas últimas ca­tegorias mencionadas. O tempo urge e a experiência adquire^se no próprio tra­balho.

Justificar se-ia a inclusão de pelo m e ­nos alguns rudimentos da teoria e da metodologia da consulta nos cursos de formação de educadores adultos, pois todos os educadores são obrigados a for­necer alguns conselhos. Quando se dispõe de conselheiros profissionais, é conve­niente convidá-los a participar nesta for­mação. Além disso, seria certamente muito útil prever para todos os educa­dores de adultos e m formação u m pe­ríodo consagrado a estas actividades de consulta.

N a formação profissional de conselhei­ros que se ocupam de outros domínios alheios à educação dos adultos, parece igualmente desejável que figurem algu­m a s indicações sobre o m o d o como os adultos aprendem e sobre as possibilida­des oferecidas pelos países ou localidades e m matéria de educação dos adultos.

N o que se refere à categoria diversi­ficada dos que trabalham a tempo par­cial — e muitas vezes gratuitamente — poderia ser assegurada u m a formação inicial no decorrer de reuniões de infor­mação. C o m o as disposições pessoais e o carácter assumem u m a grande im-

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Paul H . Bertelsen

portância, é necessário escolher cuida­dosamente os candidatos, e m especial para evitar que a orientação seja auto­ritária.

Embora não seja desejável que os con­selheiros e m educação de adultos cons­tituam u m grupo fechado, só existem vantagens e m desenvolver o profissiona­lismo neste domínio, assim como a coope­ração interdisciplinar entre os profissio­nais da consulta e os da educação de adultos, o que permitirá, com efeito, reunir u m conjunto de conhecimentos e de experiências destinados a apoiar os conselheiros não profissionais que — por muito competentes que sejam — ganham e m eficácia quando auxiliados por pro­fissionais e quando possuem documen­tação. Notemos igualmente que a con­sulta não é necessariamente u m domínio e m que se deva fazer carreira.

Organização, administração e financiamento

Tendo e m conta que os serviços de orien­tação e de consulta devem, e m primeiro lugar, ser facilmente acessíveis e m a n -ter-se e m contacto com os alunos e suas preocupações, será não só possível, m a s também indispensável, organizar u m grande número de serviços deste tipo. Simultaneamente, seria extremamente importante que existisse u m a interacção e u m a cooperação entre os diversos ser­viços de orientação e de consulta da lo­calidade. Ninguém pode saber tudo e é por esta razão que se torna necessário recorrer a outros serviços. Estabelecer o inventário das possibilidades de educa­ção, definir as modalidades de informa­ção e de formação dos responsáveis, organizar campanhas conjuntas de publi­cidade e de recrutamento são tarefas que exigem u m a acção c o m u m .

N o plano da organização, é necessário levar os serviços de informação às pe­quenas comunidades e às populações dis­persas, e m particular nas zonas rurais.

É necessário utilizar os sectores exis­tentes: sistema escolar, rádio, coopera­tivas e outros organismos e m contacto com a população. A s cidades e m que se realizam mercados podem igualmente servir de base à divulgação entre as re­giões rurais.

N o entanto, a informação e a orienta­ção são particularmente necessárias onde o «mercado do saber» é menos trans­parente, isto é, nas cidades. Ê também aí que se encontram as melhores pers­pectivas para o desenvolvimento da cooperação inter-instituições e criação de serviços de formação e outros serviços comuns.

É igualmente necessário que estes ser­viços sejam bem visíveis. Nas grandes cidades deve, pois, procurar-se u m local central e fácil de notar, de preferência com montras, como u m a loja, ou fazer publicidade para que todos os habitantes saibam e m que local podem obter infor­mações e conselhos. O acolhimento dis­pensado aos recém-chegados é de grande importância.

E m muitos países seria útil instalar pelo menos u m centro polivalente de in­formação, de orientação e de consulta especializado e m educação de adultos cujo funcionamento seria comparável ao de u m centro hospitalar universitário e m que fosse possível tratar os doentes, for­m a r pessoal e fazer investigação. O papel deste centro consistiria e m fornecer ao grande público u m a extensa g a m a de serviços de informação, assim como serviços de apoio aos órgãos de con­sulta menos importantes, e m formar médicos e e m efectuar investigações e trabalhos experimentais, desenvolvendo simultaneamente os mecanismos de re-troacção.

Excluirse a possibilidade de centralizar a administração de todos os serviços de informação, de orientação e de consulta, cuja natureza e funções são muito dife­rentes. A educação dos adultos não cons­titui excepção. Ä luz da experiência,

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Informação, orientação e consulta

criaram-se, e m muitos países, órgãos de coordenação ou de harmonização, ora no seio de u m ministério, na maior parte das vezes o da educação, ora independen­temente dos serviços oficiais, m e s m o quando vários ministérios participam juntamente com organismos voluntários. N ã o existem regras na matéria: no in­teresse do público, deve procurar-se ape­nas que os diferentes serviços de in­formação, de orientação e de consulta abranjam todos os domínios de educa­ção de adultos e que o sistema de orien­tação inter-serviços e as outras formas de cooperação sejam suficientes para assegurar a eficácia do conjunto. O modo de atingir este objectivo dependerá das estruturas da administração nacional e do grau de desenvolvimento geral da educação dos adultos.

A s principais despesas originadas pelo funcionamento dos serviços de informa­ção, orientação e consulta dizem respeito aos ordenados do pessoal profissional a tempo integral. A consulta é u m a activi­dade que exige muita mão-de-ofora e, quando esta é assegurada por pessoal remunerado, o montante total das gra­tificações pode tornar-se considerável.

U m a das primeiras tarefas a realizar parece consistir e m estabelecer o m a p a dos serviços existentes, apontando a sua maneira de operar e as dificuldades en­contradas.

A nível local, as actividades podem iniciar-se modestamente. Onde existirem estruturas de cooperação e de apoio re­cíprocas entre os diversos organismos, deveria ser fácil organizar serviços de orientação interorganismos e campanhas comuns de informação e de publicidade — poderia, por exemplo, começar-se por u m a «Semana das inscrições» que, por diversas razões, deveria coincidir c o m o início do ano escolar ou universitário. Os que já participam nos programas de educação de adultos poderiam ser esti­mulados a empreender à sua volta acti­vidades de recrutamento e a endereçar aos organismos u m relatório sobre as reacções verificadas. O s educadores po­deriam também ser imediatamente in­formados sobre a maneira de integrar as consultas no âmbito do seu ensino.

Aos níveis regional e internacional, é necessário que as associações de educa­ção dos adultos assegurem a promoção de estudos comparados e inscrevam esta questão na ordem do dia das suas reu­niões.

Por muito úteis que possam ser os contactos internacionais, é evidente que a acção deve começar por ser empreen­dida aos níveis nacional e local, tanto mais que se trata de serviços que se des­tinam a indivíduos cujas preocupações devem encontrar eco onde quer que se encontrem.

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Dwight W . Allen e Stephen Anzalone

O ensino pela rádio,

fase anterior à alfabetização

É sabido que a U N E S C O renunciou, e m 1977, à atribuição dos dois prémios anuais que tinha instituído para recompensar os que mais notavelmente 'tivessem con­tribuído para a luta contra o analfabe­tismo. N ã o obstante os esforços concer­tados desenvolvidos nos últimos vinte anos e o declínio geral da percentagem de analfabetos na população mundial, o número absoluto de iletrados não cessa de aumentar. Passaram a ser mais 26 milhões nos últimos três anos. Esta de­cisão da U N E S C O e o desânimo criado, e m 1976, pela publicação dos resultados do seu vasto Programa Experimental de Alfabetização ( P E M A ) poderia levar--nos a pensar que o Mundo está prestes a renunciar à alfabetização. A simples menção desta eventualidade suscita u m certo sentimento de desespero. Interro-

Dwight W. Allen (Estados Unidos da Amértea). Professor do departamento de educação da Universidade do Massachusetts. Antigo conse­lheiro técnico chefe da UNESCO no Lesotho National Teatcher Training College. Foi um dos primeiros a interessar-se pelo microensimo assim coimo por outras inovações educativas em do­mínios próximos.

Stephen Anzalone (Estados Unidos da Amé­rica) prepara actualmente um doutoramento na Universidade de Massachusetts. Antigo mem­bro da UNESCO e trabalhador voluntário das Nações Unidas no Lesotho.

gamo-nos sobre as razões que poderão conduzir os países e m desenvolvimento a não desejarem investir mais energia e recursos no esforço de alfabetização universal e a consciência internacional a abandonar u m objectivo de u m a im­portância tão evidente como o do advento de u m mundo alfabetizado.

M a s , talvez devêssemos efectivamente renunciar à alfabetização. O nosso objec­tivo já alguma vez foi verdadeiramente a alfabetização? O que pretendemos é concretizar o direito de todo o indivíduo à educação — tal como está definido no artigo 26 da Declaração Universal dos Direitos do H o m e m — e colocar ao al­cance da Humanidade a soma dos conhe­cimentos que possui a sociedade do sé­culo xx, assim como os meios materiais e técnicos de utilizar estes conhecimentos para melhorar a qualidade de vida. Po­rém, a ideia que possuímos da educação de base que deve garantir-se a todo o in­divíduo tem-se fundamentado, até agora, no conceito de alfabetização. Sem se tor­nar propriamente sinónimo de educação de base, a alfabetização foi claramente considerada como a chave da instrução, como u m a primeira etapa obrigatória do processo de instrução de todo o indivíduo e m toda a sociedade.

Se a educação de base dos milhões de indivíduos pobres cuja maioria vive nas zonas rurais dos países e m desen-

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O ensino pela rádio, fase anterior à alfabetização

volvimento deve necessariamente passar pela alfabetização, o futuro apresenta-se muito sombrio. Os esforços que desenvol­vemos actualmente são provavelmente ainda mais infrutuosos do que indicam as sombrias estatísticas oficiais. O Con­selho Internacional Para o Desenvolvi­mento da Educação verificou que «.. . n u m país com u m a taxa global de escolariza­ção de cerca de 50 por cento ao nível do ensino primário, existem todas as possi­bilidades de, e m certas zonas rurais par­ticularmente pobres, pelo menos 90 por cento do conjunto dos jovens (e, e m especial, as raparigas), atingirem a idade adulta sem saber 1er n e m escrever» 1.

Ë impossível negar a pobreza dos re­sultados fornecidos, na prática, pelo pro­grama de alfabetização. Contribuímos apenas para a alfabetização de u m nú­mero muito limitado de pessoas e à custa de despesas exorbitantes e sem reais es­peranças de poder fornecer aos alfabe­tizados os meios de utilizar os conheci­mentos adquiridos. Recordemos que o P E M A pretendia abranger u m milhão de adultos, dos quais apenas 120 000 atingiram, de facto, segundo as estima­tivas, o estádio da alfabetização 2. Outros programas n e m sequer permitiram obter estes resultados. O s insucessos devidos, nos projectos de alfabetização, à elevada percentagem de desistências durante os estudos agravam-se com o decorrer dos anos porque muitas pessoas alfabetizadas caem novamente no analfabetismo. Este fenómeno adquire, por vezes, proporções dramáticas. Verificou-se que, n u m país da Ásia, a maior parte dos alunos que tinham efectuado quatros anos de es­tudos primários se tornavam analfabetos ao fim de três anos3. A elevada taxa de desistências durante os estudos tende a gerar anomalias de ordem financeira. Manzoor A h m e d cita u m caso e m que a elevada taxa destas desistências (49 e m 50 alunos) originou u m a despesa de 1600 dólares por alfabetizado, despesa que poderia ter sido reduzida para 32,80

dólares se todos os alunos tivessem pros­seguido até ao fim dos estudos 4. Exis­tem naturalmente programas que obtêm mais sucesso, m a s não fornecem os re­sultados que o seu custo permitiria es­perar.

Torna-se necessário elaborar u m pro­grama de educação de base destinado às massas rurais que carecem de escolas. Urge igualmente proceder a u m a nova avaliação do papel que cabe à alfabe­tização n u m programa como este. Exi­gimos que seja elaborado u m vasto programa de ensino pela rádio para subs­tituir a alfabetização entre as populações rurais pobres compostas por pessoas que, m e s m o quando sabem 1er, não têm possibilidades de acesso aos textos im­pressos. Trata-se de pessoas cujas ne­cessidades muito particulares e 'até agora desprezadas merecem ser objecto de u m a atenção prioritária nas estratégias m o ­dernas de desenvolvimento.

R e s u m o histórico da alfabetização

Fossem quais fossem as necessidades de educação, a alfabetização apresentou-se sempre como u m obstáculo a trans­por — à semelhança de u m rito de ini­ciação — para penetrar no mundo da instrução. Verificámos que poucas pes­soas conseguem ultrapassar este obstá­culo e que muitos dos que o conseguem sofrem desilusões ao perder os conhe­cimentos que adquiriram c o m tantas dificuldades, por não poderem ter acesso aos textos susceptíveis de corresponder

1< Philip H . C O O M B S , Roy C . P R O S S E R e M&nzooir A H M E D , New paths to learning for rural children and youth, p. '29, Nova Iorque, ICED, 1973.

2. Programme expérimental mondial d'alpha­bétisation: évaluation critique, p. il, Paris, Presses de l'Unesco e PINUD, 1976.

3. Manzoor A H M E D , The economics of non-• formal education: ressources, costs and benefits, p. 7, Nova Iorque, Praeger Publis­hing, 1976.

4. Idem, ibid., p. 92.

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Dwight W . Alien e Stephen Anzalone

aos seus gostos e necessidades. A alfabe­tização apresenta-se, pois, muitas vezes, não c o m o u m a porta de acesso ao saber, do qual dependem o bem-estar e o de­senvolvimento, m a s como u m a porta de ferro que bloqueia, s e m que o tenhamos desejado, o acesso ao saber. N a s regiões afastadas das cidades e fora das escolas, a alfabetização continua a ser, a despeito das melhores intenções e dos mais ar­dentes esforços, de certo m o d o quimé­rica, por ainda não se ter tornado uni­versalmente funcional.

N ã o é difícil compreender a tendência para considerar a alfabetização u m a pa­naceia destinada a responder às necessi­dades de educação de base dos países e m desenvolvimento. A partir do m o ­mento e m que o Ocidente penetrou, por ocasião dos seus empreendimentos evan­gélicos e coloniais, e m muitos dos países que hoje se encontram e m desenvolvi­mento, a extensão da alfabetização tor-nou-se, do ponto de vista humanitário e prático, u m a necessidade real. A alfa­betização revelou-se essencial para a compreensão das Escrituras e, mais tarde, para a realização das tarefas su­balternas exigidas pela administração colonial. O s missionários e os governos coloniais distribuíram pelas populações locais muitos textos de leitura para asse­gurar a conservação de u m nível de alfabetização adaptado aos seus objec­tivos e aos imperativos do crescimento.

M a s tudo se modificou muito, visto que, actualmente, as novas nações pro­curam, depois de ter conquistado a inde­pendência, alargar os objectivos, o con­teúdo e a clientela da educação. N u m a sociedade de tradição oral e m que os textos de leitura são muitas vezes raros e não apresentam nada de c o m u m c o m a vida das pessoas, a aptidão para 1er e escrever já não assume a m e s m a im­portância. Contudo, apesar das provas, cada vez mais numerosas, da fraca efi­cácia da alfabetização como meio de acesso à instrução, não conseguimos

ainda rever as nossas sacrossantas con­cepções.

É fácil ironizar c o m a atitude que con­sidera a alfabetização u m dos pré-requi-sitos da educação de base no seio das sociedades de tradição oral dos países e m desenvolvimento. Antes da invenção da impreensa, não considerávamos im­portante saber 1er e escrever. O ensino era u m processo totalmente oral. Basta recordar os sábios que, na Idade Média, defendiam, nos seus debates, que a ver­dadeira instrução deveria ser dispensada por u m professor e que os livros eram totalmente inaptos para responder às ncessidades da educação. Muito antes desta época, os Gregos da Antiguidade emitiam reservas e m relação à utilidade da expressão escrita no processo de ins­trução. Sócrates, n u m diálogo c o m Fedra, fala-nos de u m mito no qual o inventor da escrita, o deus egípcio Tot, é fria­mente acolhido pelo rei T a m u z que con­sidera que, com a escrita: «...é a seme­lhança (com a sabedoria) que ensinas aos teus alunos e não a realidade: na verdade, quando os teus alunos trans­bordarem de conhecimentos, e não de ensino, parecerão aptos a julgar mil coisas, embora, na maior parte das vezes, se encontrem desprovidos de qualquer julgamento; além disso, tornar-se-ão in­suportáveis porque fingirão ser homens instruídos, e m vez de serem verdadeira­mente homens instruídos! *» Muita coisa m u d o u entretanto.

N o m u n d o actual as aplicações de al­fabetização são numerosas e evidentes. Talvez tenha sido esta a razão que con­duziu inevitavelmente à ideia de que a alfabetização pode e deve ser a chave de tudo. N ã o surpreende que os nossos esforços de desenvolvimento reflictam a aparente omnipotência da alfabetização. N a s estratégias de desenvolvimento li­li P L A T O N , Phèdre, p. 88 (Platon, oeuvres com­

plètes), traduzido por Léon Robin, Paris, Société d'édition «Les belles lettres», 1938.

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O ensino pela rádio, fase anterior à alfabetização

gou-se a introdução dos novos métodos de cultura da terra à alfabetização dos agricultores. A alfabetização era neces­sária, dizia--se, para permitir a leitura das brochuras sobre a agricultura ou, mais simplesmente, para facilitar as re­lações com os responsáveis pela divul­gação agrícola. Esta crença encontra-se tão espalhada que a hipótese contrária já foi, pelo menos u m a vez, objecto de análises particulares. U m estudo refe­rente aos agricultores do Brasil permitiu verificar que não existia u m a relação directa entre a alfabetização ou o nível de instrução escolar e os comportamen­tos favoráveis ao desenvolvimento. D e -monstrou-se que a alfabetização ou o nível de instrução escolar não influi de m o d o nenhum sobre os contactos com os técnicos agrícolas e exerce u m a in­fluência muito moderada sobre a medida e m que o indivíduo é atingido pelos ins­trumentos («não impressos») da divul­gação agrícola1.

Alguns defendem também que a indus­trialização de u m país e m desenvolvi­mento será entravada pela existência de u m a mão-de-obra analfabeta. Ora, esta correlação, é muitas vezes, mais aparente do que real e decorre de u m a visão idên­tica à que prevaleceu durante a indus­trialização que os Estados Unidos da América conheceram no século XIX. B o w ­les e Gintis citam o exemplo de u m in­dustrial que, no século xix, sublinhava a importância da alfabetização nos se­guintes termos: «Se o rendimento de u m a fábrica ou de u m a oficina se reve­lasse insuficiente, 'começaria por m e in­formar sobre as características do pes­soal, e, se esta insuficiência persistisse durante muito tempo, estou certo de que encontraria muitas folhas de pagamento assinadas de cruz por os interessados não serem capazes de escrever o seu nome.»

O s autores formulam, a este respeito, a seguinte observação: «É interessante saber que os registos de u m a fábrica

praticamente idêntica à deste industrial foram conservados e que u m estudo mi­nucioso de número de peças produzidas por cada operário (pago à peça) não salientou nenhuma relação estatística entre a produtividade de u m operário e o seu carácter de alfabetizado ou ile­trado, como pode ser comprovado pela presença nas folhas de pagamento por u m a assinatura ou por u m a cruz2.»

A necessidade da alfabetização como pré-requisito do processo de desenvolvi­mento também foi contestada por outros observadores. Hornik, M a y o e M c A n a n y escrevem, por exemplo: «Ainda recente­mente, a aptidão para 1er e escrever era considerada indispensável ao h o m e m e, sem ela, os conhecimentos modernos não poderiam difundir-se; sem alfabetização as comunidades rurais permaneceriam, pensava-se, condenadas ao isolamento e ao subdesenvolvimento. Actualmente, a alfabetização continua a ser considerada u m instrumento essencial de promoção dos indivíduos pelo seu amor próprio e de incitamento às populações rurais no sentido de adpotarem comportamentos e atitudes 'modernas', m a s a maior parte dos peritos e m desenvolvimento parecem concordar e m reconhecer que as popula­ções rurais podem progredir considera­velmente m e s m o que continuem analfa­betas 3.»

Estes factos não podem conduzir-nos a negar o papel importante que a alfabe­tização pode desempenhar no desenvolvi-

1. Frederick C. FLIEGEL, «Literacy and expo­sure to instrumental information among farmers in Southern Brazil», Rural socio­logy, vol. 31, n.° '1, Março de 1966, p. 27.

2. Samuel B O W L E S e Herbert GINTIS, Schoo­ling in capitalist America, p. llfy Nova Iorque, Basic Books Inc. 1976.

3. Robert H O R N I K , John K . M A Y O e Emile G- M C A N A N Y , «The mass media in rural •education», em Philip F O S T E R e James R .

• SLEFPIELD (dir. publ.), The world year-book of education 197%. Education and rural deve­lopment, p. 80, Londres, Evans Brothers Ltd., 1973.

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mento da educação ou da sociedade, n e m a pretender que determinados países re­nunciem aos esforces desenvolvidos na alfabetização dos seus compatriotas. Pre­tendemos apenas sublinhar que, e m nossa opinião, a educação de base não passa necessariamente pela alfabetização.

Pensamos que o mundo ainda não admitiu, como deveria fazer, que a al­fabetização não é tão indispensável ao processo de desenvolvimento como ou­trora se pensava. É evidente que foi a falta de eficácia prática de diversos programas de alfabetização—entre os quais o P E M A — que arrefeceu o en­tusiasmo e m torno desta campanha m u n ­dial de alfabetização total das massas cuja realização teria respondido às es­peranças expressas pelo Secretário Geral das Nações Unidas antes da Assembleia Geral que se realizou há cerca de dez anos. Por outro lado, a Conferência Geral da U N E S C O parece ter reafirmado, du­rante a 19.a sessão, a sua fidelidade a u m ideal de alfabetização mundial. C o m efeito, de acordo com a resolução 1192 desta sessão:

«A Conferência Geral, «Considerando que o estado de anal­

fabetismo e m que vivem quase u m bilião de habitantes do globo constitui u m a afronta para toda a humanidade,

Reconhecendo que os analfabetos, por não se encontrarem e m situação de be­neficiar das experiências culturais da humanidade, são vítimas de discrimina­ção sob todos os aspectos,

Convida o Director Geral a prever... u m a aceleração considerável da luta con­tra o analfabetismo destinando, eventual­mente, u m decénio da U N E S C O para a alfabetização...»

A preocupação aqui expressa é profun­damente sentida, e com toda a razão. M a s é possível que a acção proposta se revele mal adaptada aos seus objectivos. O Mundo parece-nos estar a ser convi­dado a lutar contra u m falso problema.

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Não é o analfabetismo propriamente dito que representa u m a afronta para toda a Humanidade, m a s antes a impossibili­dade e m que se encontram tantos ha­bitantes do mundo de aceder a u m a educação de base. Pensamos que os anal­fabetos podem beneficiar do património cultural da Humanidade e que, efectiva­mente, beneficiam, embora de maneira nitidamente insuficiente. Introduzir mais igualdade na participação deste patri­mónio deve constituir u m dos objectivos essenciais da educação de base; a possi­bilidade desta participação deve ser pro­porcionada a todos os membros da co­munidade mundial, quer sejam instruídos ou analfabetos.

Educação de base

«As políticas educativas dos anos se­tenta deveriam inscrever na primeira linha dos seus objectivos estratégicos a generalização da educação elementar, sob formas diversificadas, e m função das possibilidades e das necessidades 1.»

U m a concepção particular da «edu­cação de base» ou «educação elementar» tem vindo a salientar-se, nos últimos anos, nos debates internacionais sobre educação. É lamentável que, apesar das perspectivas de alfabetização mundial se terem tornado sombrias, a generalização da educação de base continue a estar subordinada à alfabetização. A «educa­ção elementar» de hoje não parece fun­damentalmente diferente da «alfabetiza­ção funcional» de ontem, que talvez tenha sido enriquecida com alguns ornamentos a fim de poder, sob u m a designação nova, encontrar lugar entre as estratégias de desenvolvimento rural. Este artifício verbal poderia perfeitamente reflectir o reconhecimento de que a generalização do ensino primário ainda não se encon-

1. «Recomendação da Comissão Internacional Sobre o Desenvolvimento da Educação», em Apprendre à être, Paris, U N E S C O , 1972.

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O ensino pela rádio, fase anterior à alfabetização

tra assegurada nos países pobres, onde as crianças deverão, por vezes, juntar-se aos adultos para beneficiar com eles dos programas extra-escolares de alfabeti­zação funcional.

Este recente interesse pela educação de base testemunha, pelo menos impli­citamente, u m certo desejo de eliminar os métodos que fracassaram no passado. M a s , não basta. Devemos redefinir o que entendemos por educação de base. Sob este aspecto, a definição proposta pelo Banco Mundial constitui u m b o m ponto de partida:

«Dispensar u m a educação de base é tentar, não obstante as graves limitações impostas pela modicidade dos recursos, responder às necessidades de importan­tes grupos de população que não têm acesso à mínima possibilidade de instru­ção. Trata-se, de completar, e não de suplantar, o sistema de ensino escolar e de fornecer aqueles que este ensino ainda não abrangeu ou que deixou de lado, u m a instrução funcional, maleável e pouco dispendiosa. É possível que, e m muitos países, o instrumento principal desta instrução seja o nível primário, m a s difere da 'instrução primária universal' e m três pontos de vista importantes:

'«i) Os objectivos e o conteúdo da edu­cação de base definem-se, de u m ponto de vista funcional, como as 'necessidades de instrução mínima' de grupos deter­minados e não como graus de ensino no sentido e m que se entende, por exemplo, o grau primário.

ii) A s 'populações alvo' abrangidas pela educação de base não são necessaria­mente as crianças e m idade escolar. São grupos etários variados (crianças, jovens, adultos) e de características socioeconó­micas diferentes (grupos rurais ou urba­nos, mulheres, participantes e m progra­m a s de desenvolvimento particulares).

iii) Os 'sistemas administrativos' que permitem dispensar a educação de base assumirão diversas formas e m diversos países (escolas primárias reestruturadas,

programas não escolares ou combinações variadas das duas fórmulas) segundo as necessidades das pessoas a que se destinam e as limitações impostas pelos recursos disponíveis. A s despesas desem­penharão u m papel preponderante na escolha das pedagogias utilizadas nos programas dos ensinos de base.»

O Banco acrescenta: « U m estudo re­cente, redigido pela Unicef, define estas necessidades (as necessidades de instru­ção mínima) como o limiar de instrução a partir do qual u m indivíduo é capaz de participar nas actividades económicas, sociais e políticas. Estas necessidades de instrução essenciais incluem a alfa­betização e o cálculo funcionais, os conhecimentos e as qualificações ne­cessários para exercer u m a actividade produtiva, o planeamento familiar e a higiene, a assistência à infância, a ali­mentação, o saneamento e tudo o que é necessário saber para participar na vida cívica. D e u m ponto de vista opera­cional, podemos defini-las como o 'total de instrução mínima' acessível a todos, semelhante ao 'limiar de probreza' no que se refere ao rendimento mínimo fa­miliar 1.»

O que podemos criticar essencialmente na definição do Banco é o facto de assen­tar na ideia de que a principal de todas as «necessidades de instrução mínima» é a alfabetização funcional. Es'ta ideia integra-se, sem qualquer dúvida, na tra­dição e o Banco não é, de resto, o único a defendê-la. C o m efeito, u m a reunião de peritos convocada, e m 1974, pela U N E S C O , chegou a conclusões semelhan­tes: «É evidente, lê se no seu relatório, que o ciclo de base deve fornecer a todas as pessoas u m certo número de instru­mentos fundamentais do conhecimento; é necessário aprender a 1er, a escre­ver...»2 É natural pensar que enquanto

1. Éducation, politique sectorielle, p. 37, W a s ­hington, Banco Mutídial, 1975.

2. Perspectives, vol. v, n.° 1, 1975, p. 136.

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o papel atribuído, no passado, à alfabe­tização, não for explicitamente modifi­cado, a alfabetização, considerada como u m a das «necessidades de instrução mí­nima» a satisfazer ao nível do ciclo de base, continuará a ser o trampolim ne­cessário para aceder a qualquer outro nível de instrução e poderá comparar-se a u m a moeda susceptível de permitir a aquisição de outros conhecimentos. Caímos sempre no m e s m o impasse e en-contramo-nos constantemente na impos­sibilidade de escolher outra solução dife­rente da que consiste e m desenvolver os efectivos do ensino primário e e m mul­tiplicar os projectos de alfabetização funcional esperando que, entretanto, a alfabetização possa tornar-se funcional para todos graças a u m a surpreendente colecção de textos impressos circulando abundantemente pelas zonas rurais mais longínquas. Deparamos sempre com a barreira que impede o acesso à instrução sem passar pela alfabetização. Parece continuar a exercer-se sobre a instrução u m direito de preempção, u m a vez que as pessoas que não podem alfabetizar-se ou manter-se alfabetizadas se encontram na impossibilidade de obter ou de con­servar os meios necessários para aqui­sição de u m a instrução cada vez mais desenvolvida.

Embora não pensemos que a alfabe­tização deva ser considerada u m a «ne­cessidade de instrução mínima», não podemos deixar de reconhecer a impor­tância considerável que assumirá sempre que se apresentar com u m carácter fun­cional. Definir a alfabetização afirmando que ela constitui, n u m a sociedade, de tipo tradicional, o «limiar de pobreza» abaixo do qual não pode haver educação' equi­vale não a fixar este limiar demasiado alto ou demasiado baixo, m a s a trans­formá-lo, devido à adopção de critérios errados, n u m obstáculo capaz de bloquear o acesso às informações e conhecimentos de que dependem o bem-estar e o desen­volvimento. E m vez de considerar a alfa­

betização como u m a das condições pré­vias da educação de base ou como o único passaporte susceptível de permitir o acesso à instrução, seria preferível con­siderá-la u m a das etapas intermédias do processo de instrução, ou antes, obri­gá-la a entrar no jogo no momento em que o acesso aos textos impressos se torna realmente necessário, por exem­plo, quando o interessado está prestes a ingressar n u m sistema regular de en­sino ou quando a aptidão para 1er e escrever se torna realmente indispen­sável na vida prática.

Excluindo o problema da alfabetização, a noção de «necessidades de instrução mínima» fornece, tal como foi adoptada pelo Banco, u m quadro útil à definição do conteúdo eventual dos programas de educação de base. Já se realizaram lon­gos debates sobre muitos problemas liga­dos à educação de base. Procurou saber--se até que ponto os pobres das regiões rurais seriam capazes de participar na formulação das suas próprias necessida­des e m matéria de educação. Surgem também interrogações sobre o modo de dispensar a educação de base. Por exem­plo, seria politicamente possível ou dese­jável reestruturar o ciclo primário, redu­zir o número de anos que engloba e antecipar a idade de entrada nas escolas primárias? H á pessoas que duvidam do papel que podem desempenhar na edu­cação de base os programas de alfabe­tização funcional e outros programas não formais. T a m b é m há quem pergunte se a educação de base é capaz de favorecer a equidade social. H á pessoas que pen­sam que a educação de base acentuará a dualidade do sistema de educação, no seio do qual encontraremos, por u m lado, u m ensino escolar regular permitindo que certos privilegiados acedam a esta­belecimentos de nível cada vez mais ele­vado, assim como às prerrogativas so­ciais decorrentes da sua instrução e, por outro lado, u m ensino extra-escolar de segunda ordem destinado às massas e

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O ensino pela rádio, fase anterior à alfabetização

que é interrompido a u m nível bem deter­minado. C o m o é evidente, certas preo­cupações são solidamente fundamenta­das. Não é tomando os seus desejos pela realidade nem multiplicando as exporta­ções morais que a comunidade interna­cional poderá reduzir os riscos a correr ou as incertezas existentes. Temos a impressão de que os problemas que se apresentam não poderão ser resolvidos a contento de todos enquanto não se tive­rem estudado e experimentado as estra­tégias susceptíveis de ser utilizadas na aplicação de u m programa de educação de base. N ã o pretendemos resolver, aqui, estes problemas; pretendemos apenas propor — como já apontámos — que, nos próximos debates respeitantes à educa­ção de base, seja posta e m causa a per­tinência da ligação até agora estabelecida entre a alfabetização e este tipo de edu­cação.

Pensamos que existem outras soluções para o problema da educação de base e prontificamo-nos a recomendar instan­temente que seja elaborado u m vasto programa de ensino pela rádio, como principal meio de difusão da educação de base.

Utilização da rádio na educação da base

A possibilidade técnica de utilizar a rá­dio para a educação das massas não ofe­rece dúvidas. Pouco dispendiosa, simples e fiável, a rádio encontraria u m a boa aplicação. A Comissão Faure já tinha assinalado, e m 1972, o que podemos es­perar do ensino pela rádio e é surpreen­dente que o emprego da rádio com objec­tivos de educação de base ainda não tenha sido objecto de nenhuma proposta séria. N o relatório da Comissão Faure pode ler-se o seguinte: «A rádio, única técnica de comunicação avançada que se incorporou realmente no Terceiro Mundo, foi amplamente difundida e aculturada sempre que as condições o permitiram.

Pensamos que este meio quase univer­sal de difusão tem sido insuficientemente utilizado para fins educativos. Parece ter sido preterido pela eficácia superior atri­buída a outros meios que, no entanto, apresentam o inconveniente, e m relação à rádio, de não ir conhecer tão ampla difusão durante muito tempo ainda. C o m a miniaturização e a transistorização, que permitem despesas muito reduzidas e asseguram u m a fiabilidade suficiente, e m todos os climas, a rádio tem-.se reve­lado cada vez mais como u m instrumento particularmente bem adaptado a cultu­ras baseadas na transmissão oral e nos valores não escritos.» 1

Pensamos que, no passado, o desprezo pelas possibilidades educativas da rádio se ficou a dever ao facto da atracção superior da televisão se ter começado a exercer nos países desenvolvidos pouco depois de 1950, isto é, no preciso m o ­mento e m que os aparelhos de rádio a pilhas e a transistores começavam a apa­recer e e m que a rádio se espalhava pelos recantos mais longínquos dos paí­ses e m desenvolvimento. Actualmente, õ número de aparelhos de rádio por habi­tante é, tanto nos países desenvolvidos como nos países e m desenvolvimento, superior ao número de exemplares de jornais diários por habitante. Wilbur Schramm sublinhou os efeitos a esperar da expansão da rádio : «Se existe u m b o m instrumento de educação não formal, é certamente a rádio. A razão é-nos for­necida por Paul Théroux no seu estudo sobre a radiodifusão rural no Uganda. Este autor salienta que 87,8 por cento das famílias sobre as quais se efectuou o inquérito não possuíam electricidade, embora 86,3 por cento possuíssem u m aparelho de rádio. Por outras palavras, a rádio é u m instrumento de longo al­cance que permite difundir facilmente mensagens e eliminar os obstáculos que se opõem mais frequentemente à instru-

1, Apprendre à être, op. cit., p. 139.

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ção nas regiões particularmente longín­quas.»

{Desconhecemos que se tenha realizado qualquer avaliação geral dos múltiplos serviços prestados pela rádio educativa. M a s , por outro lado, existem muitos casos particulares e m que as possibilidades da rádio como meio de instrução foram cla­ramente salientadas. N o Japão, é possí­vel receber, pela rádio, u m a instrução secundária completa. N o Reino Unido, a rádio desempenha u m papel importante nos serviços que presta à Universidade aberta. N a Colômbia, a Radio-Sutatenza é frequentemente citada como exemplo da influência que a rádio pode exercer na educação dos adultos. N a Nicarágua, o projecto de ensino radiofónico da M a ­temática apresenta actualmente, segundo os relatórios, excelentes resultados e o governo parece ter decidido utilizar a rádio para todo o ensino primário e m certas províncias do país. Vários Estados pediram ajuda para empreendimentos semelhantes. Poderíamos citar muitos outros exemplos: a feliz realização, no México, de projectos respeitantes ao en­sino das línguas ou à instrução elemen­tar; funcionamento de tribunas radiofó­nicas rurais e de clubes de escuta e m diferentes países de Africa, ampla uti­lização da radiodifusão educativa nas escolas da Tailândia, projecto «Radio Mensaje» destinado aos agricultores do Equador, serviços extra-escolares asse­gurados pela Radio-Santa Maria na Re ­pública Dominicana.

M a s , embora a rádio tenha sido ampla e eficazmente utilizada com fins educa­tivos, a exploração sistemática das pos­sibilidades que oferece viu-se entravada pela modéstia das nossas esperanças; na verdade, nunca esperámos muito da rádio. Por falta de imaginação foi-lhe atribuído, muitas vezes, u m papel pura­mente complementar que a impediu de se desenvolver segundo a sua dinâmica própria. Consequentemente, o carácter do ensino pela rádio tende a reflectir

o do ensino tradicional ministrado nas aulas ; parece decorrer de u m a adaptação do ensino ao instrumento que a rádio representa e não de u m esforço para orientar para a educação u m dos gran­des meios m o d e r n o s de informação. A apresentação dos programas foi, mui­tas vezes, lamentavelmente monótona e mal adaptada às características especiais da rádio. O carácter concreto e vivo que podem assumir as emissões radiofónicas não foi aproveitado e as ondas limita-ram-se a difundir fastidiosos «monólogos do professor». N a renovação da radiodi­fusão educativa, os fracassos do passado revelar^se-ão certamente tão instrutivos como os êxitos.

Tendo e m conta os resultados já for­necidos pelo emprego da rádio com objec­tivos de instrução —e os resultados ainda maiores que nos permitimos espe­rar — defendemos que é financeiramente possível assegurar pela rádio u m a edu­cação de base de conteúdo verdadeira­mente rico. A principal característica desta educação de base residiria na im­portância essencial que atribuiria a pro­cessos orais análogos aos que regem as relações sociais nas sociedades de tipo tradicional. N ã o é necessário ser alfa­betizado para beneficiar do ensino pela rádio. M a s , como é evidente, a alfabeti­zação das pessoas capazes de aprender a 1er e a escrever ocuparia u m certo lugar. Essencial é que, na maior parte das vezes, a alfabetização suceda à edu­cação de base, e m vez de a preceder. Ela deixaria, assim, de se apresentar como o único meio de acesso à instrução.

O ensino pela rádio seria assegurado por meio de u m conjunto de programas susceptíveis de responder às necessidades de u m público muito variado. A rede de radiodifusão de u m país dado deveria poder apresentar simultaneamente pro-'gramas que, diferindo uns dos outros pela forma e pelo conteúdo, seriam capa­zes de responder às necessidades de auditórios que não apresentem as mes-

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O ensino pela rádio, fase anterior à alfabetização

m a s aptidões nem os mesmos gostos. Deveria dar-se prioridade à satisfação das «necessidades de instrução mínima» dos adultos e crianças não escolarizados incluídos na população rural. Mas , a maior parte dos programas de ensino pela rádio conviria igualmente a auditórios urbanos. Seria desejável, de resto, que os progra­m a s de ensino péla rádio se articulassem com os programas escolares normais, o que contribuiria para o melhoramento destes e, simultaneamente, para a redu­ção do fosso que pode existir entre o meio escolar e o meio familiar.

E m nossa opinião, o ensino pela rádio não deveria constituir u m «apêndice» do sistema de educação não formal, m a s sim u m elemento essencial da reorgani­zação deste sistema, do qual, de resto, faria parte integrante. O desenvolvi­mento das capacidades funcionais do ensino pela rádio deve beneficiar de toda a prioridade na elaboração das estraté­gias da educação de base. Para ser efi­caz, o ensino pela rádio deve formar u m todo, ou, por outras palavras, assentar, como foi indicado, n u m conjunto de pro­gramas capazes de responder às múlti­plas necessidades de instrução de u m público variado. Para poder, inscrevendo--se no quadro da educação não formal, bastar-se a si mesmo , o ensino pela rádio deverá apresentar-se como u m processo contínuo de instrução; deverá permitir que certos alunos ultrapassem a fase das «necessidades de instrução mínima» para atingir o da alfabetização e que outros acedam, pela única via não formal, a u m ensino secundário formal. O ensino pela rádio não deve apresentar-se como u m simples «apêndice» do sistema de edu­cação não formal, m a s também não deve, na fase inicial, deixar-se submergir por «apêndices» dos quais alguns poderão revelar-se úteis n u m a fase ulterior. Entre estes «apêndices» citemos, por exemplo: a distribuição de textos impressos rela­cionados com as emissões; a avaliação dos resultados; o emprego de monitores

nos pontos de escuta; as emissões e m duplex. Por muito desejáveis que possam parecer estas inovações, é necessário evi­tar, desde o início, que a integridade e a capacidade de autonomia do programa radiofónico de educação de base possam ser comprometidas por u m a excessiva complexidade do sistema.

U m programa radiofónico de educação de base pode, desenvolvendo^se suficien­temente, servir de eixo à reorganização de todo o sistema de educação não for­mal. Pensamos, com efeito, que os pro­gramas de educação não formal teriam necessidade de se tornar mais «formais». Até agora ainda não adquiriram o carác­ter institucional capaz de garantir o seu futuro ou de lhes permitir tornar-se parte integrante do mosaico formado pela edu­cação. A educação não formal parece ter estado, até agora, condenada a sofrer de u m a constante precaridade financeira, a manter-se à margem das preocupações administrativas; ou a morrer tempora­riamente e m caso de compressão orça­mental. N o passado, os projectos de educação não formal responderam efi­cazmente a necessidades particulares e m domínios como a agricultura, a saúde, a nutrição, o planeamento familiar, o bem-estar, o desenvolvimento comunitá­rio. Mas , e m geral, o seu alcance foi convencionalmente limitado. A reorgani­zação do sistema de educação não for­mal e m torno do elemento essencial que constituiria a educação de base pela rádio revelasse actualmente indispensável se quisermos que este sistema atinja, graças a u m a amplificação das suas fun­ções, u m público nitidamente mais lato. Incorporándole na educação não formal, o ensino pela rádio contribuiria com u m quadro institucional maleável, próprio para favorecer u m a melhor integração dos seus diversos elementos; ajudaria a reduzir o duplo emprego e a assegurar aos interessados a instrução requerida para aceder a outros tipos de educação não formal. À medida que os auditórios

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aumentassem, este ensino tornar-se-ia cada vez mais rentável, assim como os resultados se tornariam, com a experiên­cia, cada vez melhores.

O ensino pela rádio assim concebido tornar-se-ia o sustentáculo do sistema de educação não formal. Os projectos de alfabetização funcional, os projectos de desenvolvimento comunitário, os esforços desenvolvidos e m prol da formação pro­fissional, os projectos orientados para o enriquecimento cultural ou para a pre­servação da cultura e, eventualmente, as actividades destinadas à reorganização e ao alargamento da instrução primária combinar-se-iam, no quadro deste sis­tema, de modo diferente, consoante os países. Mas , u m dos traços comuns aos sistemas de educação não formal dos diversos países poderia ser a presença do mecanismo de integração que consti­tuiria, no seu seio, o ensino pela rádio.

Estamos longe de pretender ter apresen­tado o esboço de u m programa de edu­cação de base capaz de responder às necessidades das massas rurais. A nossa única preocupação consistiu e m sugerir a adopção de u m a nova fórmula que permita pôr fim ao determinismo que pretendeu que a educação de base esti­vesse subordinada à alfabetização e que os esforços da alfabetização fossem vo­tados ao insucesso. Necessitamos clara­

mente de u m antídoto para vencer a melancolia que experimentamos diante dos magros resultados dos esforços de­senvolvidos há dezenas de anos, melan­colia suficientemente profunda para que os mais preserverantes se encontrem paralisados. N ã o nos devemos tornar indiferentes às necessidades de educação das populações rurais desfavorecidas, m e s m o que tenhamos adquirido u m «rea­lismo» que nos permita avaliar com pre­cisão as dificuldades do passado. Pode­mos certamente, atendendo à capacidade de organização e aos meios técnicos exis­tentes, pensar n u m a generalização da educação de base, tal como fez, e m 1972, a Comissão Faure. É evidente que se trata de u m enorme empreendimento para cuja planificação será obviamente necessário recorrer tanto a visionários como a técnicos. Esperamos que, nos próximos anos, os prémios instituídos pela U N E S C O para recompensar os es­forços de alfabetização sejam atribuídos a particulares ou a grupos capazes de abalar a nossa inércia, de nos obrigar a renunciar aos erros do passado para nos conduzir por caminhos tão novos como variados e de se dedicar totalmente à tarefa a realizar para que o acesso de todos à educação não continue a ser u m a quimera ou u m a ficção, m a s se torne u m a realidade que possa, u m dia, não surpreender ninguém.

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Victor G . Onouchkine e Evguénia P . Tonkonogaïa

A educação dos adultos, elemento

da educação permanente na URSS

U m a sociedade socialista desenvolvida caracteriza-.se essencialmente pelo ele­vado nível das forças produtivas e pela maturidade das relações socialistas que criaram as condições de u m desenvolvi­mento tão completo quanto possível da educação, factor de desenvolvimento da personalidade.

O artigo 25 da Constituição proclama: «Na U R S S existe e aperfeiçoa-se u m sistema único de instrução pública que assegura a formação geral e profissional dos cidadãos, serve a educação comu­nista, o desenvolvimento físico e intelec­tual da juventude, a sua preparação para as actividades profissionais e sociais.»

A educação dos adultos faz parte inte­grante do sistema único de educação nacional desde os primeiros anos do poder soviético, e aperfeiçoa-se à medida que a sociedade socialista descobre soluções para os problemas que surgem nas dife­rentes fases do seu desenvolvimento.

Victor G. Onouchkine (URSS). Licenciado em economia, professor, director do Instituto de Investigações Sobre a Educação dos Adultos da Academia das Ciências Pedagógicas.

Evguénia P. Tonkonogaïa (URSS). «Candi­data» a Ciências Pedagógicas, im/oestigadora, chefe de secção do Instituto de Investigação Sobre a Educação dos Adultos da Academia das Ciências Pedagógicas.

Novas funções da educação dos adultos

A revolução científica e técnica, que se desenvolve n u m a sociedade socialista que atingiu a maturação, caracteriza-se por u m progresso rápido da investigação, pela aplicação dos resultados da activi­dade científica e técnica a todos os sec­tores da economia nacional e pelo laço orgânico que une a ciência à produção. Esta revolução modifica profundamente os factores objectivos da produção. Si­multaneamente, o progresso científico e técnico, ao introduzir a tecnologia m o ­derna e m todos os ramos da economia nacional, exige muito do elemento indi­vidual ou subjectivo da produção social.

A s transformações da produção e da vida social exigem que os conhecimentos adquiridos nos bancos da escola sejam constantemente completados e actualiza­dos. Durante o X X I V Congresso, o Par­tido Comunista da União Soviética insis­tiu particularmente no facto da educação recebida na primeira infância constituir apenas u m a base, devendo os conheci­mentos adquiridos ser constantemente completados1. N a actual fase do desen­volvimento do socialismo, a educação prolongou-se no tempo. Ultrapassando

1. Actas do X X r v Congresso do F O U S , p. 86, Moscovo, Politiadat, 197il.

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Victor G . Onouchkine e Evguénia P . Tonkonogaïa

o quadro do ensino geral e profissional directo, empenhasse a partir de agora e m elevar o nível das qualificações das diferentes categorias de trabalhadores, assim como o seu nível cultural, ideoló­gico e político, e pode considerar-se u m a educação permanente alargada a toda a vida activa do h o m e m .

« N o m u n d o m o d e r n o » , declarou L . I. Brejnev no relatório do Comité Central do P C U S para o X X V Con­gresso do Partido, «quando o volume dos conhecimentos que o h o m e m deve adqui­rir aumenta rapidamente e e m propor­ções consideráveis, deixa de ser possível contar com a assimilação de u m a certa soma de factos. Interessa ensinar o ho­m e m a completar os seus conhecimentos pelos seus próprios meios e a orientar-se na massa das informações científicas e políticas.» *

Esta proliferação das tarefas que in­c u m b e m à educação e dos domínios que ela deve abranger exige u m estudo mais profundo do problema da educação dos adultos no quadro da educação perma­nente.

N a U R S S , a educação dos adultos é u m dos principais instrumentos utilizados para resolver os problemas estratégicos formulados no programa do Partido C o ­munista da União Soviética: criação da base material e técnica do comunismo; aperfeiçoamento das relações socialistas e sua transformação e m relações comu­nistas; formação do h o m e m pertencente à sociedade comunista.

Desenvolvendo os ensinamentos de Marx e de Engels sobre o desenvolvi­mento da personalidade nas condições concretas das transformações revolucio­nárias do nosso país, Lenine não limitava o conceito de «educação» à infância e à adolescência. Considerava a educação no seu aspecto social e essencialmente como u m a formação permanente dos trabalha­dores de todas as idades porque, pen­sava, só u m a educação entendida neste sentido lato pode constituir u m a condi­

ção necessária da revolução cultural e dar ao socialismo u m a base económica fundada na propriedade social.

U m a das tarefas prioritárias e essen­ciais do jovem Estado soviético consistiu e m eliminar o analfabetismo, a fim de inserir milhões de homens na vida activa. « U m analfabeto», escrevia Lenine», «si-tua-se fora da política. Ë necessário co­meçar por lhe ensinar o A B C . » a

U m dos primeiros decretos do governo soviético, relativo à «eliminação do anal­fabetismo entre a população da R S F S R » previa já a instrução obrigatória de todos os cidadãos com idades compreendidas entre os 8 e os 50 anos. Nos termos deste decreto, esta tarefa incumbia não só às escolas e aos professores, m a s tam­b é m às organizações sindicais e às orga­nizações do Partido e da juventude comu­nistas. D e acordo com os desígnios de Lenine, com as directivas dos congressos do Partido Comunista e com as portarias do Comissariado do povo junto da ins­trução pública, organizou-se u m sistema de Estado de educação de adultos no país, logo nos primeiros anos do poder soviético. Tornou-se parte integrante do sistema geral de educação e manteve-se sempre ligado aos estabelecimentos es­colares propriamente ditos.

O sistema de educação dos adultos compreendia, e m primeiro lugar, escolas de ensino geral: escolas elementares e médias e faculdades operárias 'ligadas aos estabelecimentos de ensino superior. A continuidade do ensino estava assegu­rada entre as escolas de todas as cate­gorias e os alunos podiam passar de u m nível para outro e aceder, pelo canal das faculdades operárias, aos estabelecimen­tos de ensino superior. O ensino era gra­tuito e m todos os tipos de escola. Os adultos inscritos nas faculdades Operá­

is Actas ~áo X X V Congresso do PCUS, p. 77, Moscovo, Politizdat, 1976,

2. V. I. LENINE, Œuvres complètes (edição russa), voh 44, p. 174,

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A educação dos adultos, elemento da educação permanente na U R S S

rias eram dispensados do seu trabalho durante todo o período de formação e beneficiavam de urna bolsa do Estado. A educação dos adultos assentava nos seguintes grandes princípios: formação geral largamente politécnica, associação do ensino ao trabalho produtivo e ligação estreita à vida quotidiana e à prática da construção socialista.

'Nos anos vinte, surgiram, paralela­mente aos diferentes tipos de ensino es­colar para adultos (escolas de ensino geral, escolas do partido, faculdades operárias), diversas formas de activida­des culturais e educativas para adultos (salas de leitura rurais, numerosos cír­culos, clubes, etc.).

Assim, o sistema de educação nacional previa, desde a sua criação, não só a educação das crianças como também o ensino dispensado aos adultos, o qual era planificado pelo Estado, estava li­gado ao ensino propriamente dito (esco­las para crianças) e manifestava-se sob formas institucionais e não institucio­nais; por outras palavras, este ensino organizava-se e desenvolvia-se como u m sistema de educação permanente.

M a s , se a educação dos adultos serviu, nessa época, principalmente de instru­mento para eliminar o analfabetismo, para elevar o nível de instrução geral da população adulta e para formar qua­dros, as suas funções actuais modifica-ram-se e alargaram-se sensivelmente. N u m a sociedade socialista desenvolvida, a educação dos adultos, embora conserve a sua função «eterna» de formação pro­fissional, tem essencialmente por objecto elevar o nível da formação geral dos trabalhadores jovens e adultos, assegu­rar o ensino secundário obrigatório de todos os jovens e elevar o nível das qua­lificações profissionais dos trabalhadores de todas as categorias. Simultaneamente, a educação dos adultos, por intermédio de instituições especias (universidades populares, centros de conferências, casas de educação política, palácios de cultura,

teatros populares, bibliotecas, associações desportivas), exerce funções de educação social, política, ideológica, moral, esté­tica e física dos adultos.

O alargamento do papel social e da importância da educação dos adultos, as suas funções cada vez mais comple­xas, os laços que a unem a processos sociais tão complexos como a revolução científica, técnica e cultural, constituem outros tantos factores que exigem u m estudo científico das suas formas concre­tas, dos princípios da sua organização, da especificidade do seu conteúdo e das modalidades e métodos pedagógicos a aplicar nos estabelecimentos para adultos.

A s investigações sobre a educação dos adultos

A s investigações sobre a educação dos adultos no quadro da educação perma­nente dependem do Instituto de Investi­gações Sobre a Educação dos Adultos, criado e m 1960 junto da Academia das Ciências Pedagógicas. Referem-se aos três seguintes temias: a) melhoramento do ensino secundário geral dispensado aos trabalhadores jovens e adultos que frequentam as escolas e m regime de des­dobramento (vulgarmente chamadas es­colas nocturnas) ; b) melhoramento do sistema de aperfeiçoamento do pessoal docente; c) melhoramento do ensino ge­ral pós-escolar e da auto-instrução dos adultos.

INVBSTTGAÇOEIS SOBRE A EDUCAÇÃO ESCOLAR DOS ADULTOS

O desejo que experimenta a população adulta do nosso país de completar a sua instrução é satisfeito por diversos meios : escolas com desdobramento de horários, cursos por correspondência e estabeleci­mentos de ensino superior.

O nono período quinquenal que acaba de terminar (1971-1975) marcou u m a etapa decisiva na via da generalização

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Victor G . Onouchkine e Evguénia P . Tonkonogaïa

do ensino secundário do nosso país. O nú­mero de alunos que, tendo completado oito anos de estudos nas escolas de en­sino geral, prossegue estudos secundários passou de 78,5 por cento, e m 1970, para 96,5, e m 1975. A s escolas de ensino geral contam actualmente com mais de 47 mi­lhões de alunos, dos quais 42,2 milhões de crianças. Para estender o ensino se­cundário ao conjunto da população, foi necessário multiplicar e generalizar as escolas com desdobramento de horários. Durante o nono período quinquenal, o número de alunos que frequentavam estas escolas e os cursos por correspon­dência aumentou de 1,2 milhões. E m 1975/1976, 14 700 escolas com desdobra­mento de horários contavam com cerca de 5 milhões de alunos1 dos quais 60 por cento de jovens trabalhadores com menos de 20 anos, compondo-se os restantes 40 por cento por pessoas mais velhas. Colocando-se e m segundo lugar quanto ao número de alunos, as escolas secun­dárias com desfasamento de horários atribuíram, durante o nono período quin­quenal, 3 458 000 diplomas de estudos secundários, ou seja, u m quarto do nú­mero total. Mais de 1,5 milhões de jovens, rapazes e raparigas, obtiveram o certifi­cado de oito anos de estudos.

U m a análise do nível de instrução geral da população laboriosa permite concluir que, embora durante os próximos quinze ou vinte anos devamos contar com u m a certa redução do ensino dispensado aos indivíduos que já exercem u m a profissão, este tipo de educação n e m por isso deixa de conservar, no essencial, toda a sua importância. Este ensino é objecto de grande atenção e as condições objecti­vas necessárias ao melhoramento dos seus indicadores qualitativos encontram--se reunidas: vantagens concedidas pela lei aos trabalhadores que desejam pros­seguir os estudos sem interromper a sua actividade, elaboração de formas e regi­mes diversos de ensino adaptados ao orçamento-tempos livres, etc. A escola

com desdobramento de horários dispensa u m ensino de nível equivalente ao dos estabelecimentos escolares normais e con­fere aos seus diplomados os mesmos direitos de prosseguimento dos estudos e m todos os estabelecimentos pós-escola-res. N ã o obstante as suas particularida­des, os planos e os programas de ensino desta escola são essencialmente os mes­m o s que os da escola de ensino geral. N ã o existe, pois, solução de continuidade entre a escola com desdobramento de horários e a escola de ensino geral ou o estabelecimento de formação profis­sional.

Tendo e m conta o papel importante que já desempenha a escola com desdo­bramento de horários para adultos e o que virá a desempenhar durante o dé­cimo período quinquenal (1976-1980), foi necessário efectuar u m a série de inves­tigações sobre os aspectos sociológicos e psicológicos da educação dos adultos e elaborar as bases didácticas deste en­sino. O Instituto de Investigações Sobre a Educação dos Adultos orientou u m estudo sobre os «aspectos sociopedagó-gicos da educação dos adultos». Este estudo procura salientar as condições optimais necessárias para incitar os adul­tos a beneficiar das diferentes formas de educação e de auto-instrução. Neste contexto, estudou-se a atitude dos jovens trabalhadores e m relação à educação (motivação), assim como os factores objectivos e subjectivos que determinam esta atitude e indicaram-se os processos de regulação sociopedagógica de u m a motivação durável.

Os resultados deste inquérito permi­tiram prever o comportamento dos adul­tos e m matéria de educação, por u m lado, de acordo com o estatuto social, as qua­lificações profissionais, o nível do a m ­biente cultural e a qualidade do ensino

1Í Naroãnoe obrazovanie, nauka i kultura V SSSR (A Instrução Pública, a Oiência <e a Cultura na U R S S ) , p. ¡11&.

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A educação dos adultos, elemento da educação permanente na U R S S

dispensado pela escola e, por outro lado, de acordo com a posição subjectiva do indivíduo, que é a resultante da expe­riência adquirida durante os estudos an­teriores, a formação da sua escala de valores e os seus projectos e aspirações. Neste contexto, os projectos de futuro, que constituem o factor determinante do comportamento do indivíduo e m matéria de educação, devem ser interpretados si­multaneamente como motivações e como objectivos.

A conclusão mais geral do estudo diz--nos que é necessário elaborar meios de acção sociopedagógicos susceptíveis de motivar o indivíduo durante as diferen­tes etapas de u m programa de ensino. Atendendo a que, e m geral, o h o m e m age essencialmente e m função das suas neces­sidades essenciais e n u m a situação que, para ele, é significativa, é necessário proceder de modo que ele considere a educação como o maior valor de ordem prática, espiritual e vital.

Estes princípios essenciais permitiram obter conclusões científicas e práticas a diferentes níveis: 1. O incitamento dos trabalhadores jo­

vens e adultos para que prossigam os estudos passa necessariamente por u m a sensibilização dos indivíduos. Esta sensibilização para a vida social constitui, portanto, o principal pro­blema sociopedagógico.

2. Para suscitar nos jovens trabalhado­res u m a atitude activa perante a vida e a educação, é absolutamente neces­sário conjugar os esforços de diversas instituições sociais: família, escola, produção.

3. Para criar esta atitude, é igualmente necessário introduzir métodos de re­gulação sociopedagógica nos diferen­tes sectores de actividade dos jovens e dos adultos, o que exige u m a difusão maximal dos conhecimentos pedagó­gicos entre a população.

. O Instituto realizou outro estudo sobre a evolução, de u m ano para o outro, das

funções psíquicas dos adultos dos 18 aos 40 anos. Salientaram-se as modificações que se operam, segundo a idade, na memória, na atenção, no pensamento, na função psicomotora, na neurodinâmica e no intelecto no seu conjunto. Estas m o ­dificações foram examinadas era relação à aquisição dos conhecimentos.

O estudo mostrou que as funções psí­quicas dos adultos continuam a desen­volver nse depois da maturação biológica do organismo. Este desenvolvimento é assegurado pela modificação das relações estruturais entre os componentes de cada função psíquica e das que unem as fun­ções entre si, isto é, pelas modificações que intervêm nas relações interf uncionais ou na estrutura global do intelecto hu­m a n o .

O desenvolvimento das funções psíqui­cas e do intelecto no seu conjunto pode ser considerado u m processo complexo e contraditório e m que alternam m o m e n ­tos de amplificação, de enfraquecimento e de estabilização. O s enfraquecimentos verificados e m certas funções na idade adulta não resultam da sua involução, correspondem aos «períodos de incuba­ção» ou de reestruturação latente que precedem a continuação do desenvolvi­mento psíquico.

O estudo dos aspectos psicológicos e sociológicos desempenhou u m papel im­portante na elaboração de u m a teoria pedagógica adaptada aos adultos e na re­solução dos problemas didácticos susci­tados pelas escolas c o m desdobramento de horário e pelos cursos por corres­pondência.

D e acordo com estudos experimentais e com a síntese de numerosos dados acumulados pela pedagogia durante todo o período durante o qual se desenvolve­ram as escolas com desdobramento de horários e atendendo igualmente aos dados recentemente obtidos nas discipli­nas associadas à pedagogia dos adultos, foi possível salientar os princípios meto­dológicos e sociopsicológicos da educa-

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ção e da instrução dos trabalhadores jovens e adultos e elaborar u m a teoria do ensino geral dispensado a indivíduos no exercício de u m a actividade. Esta teoria baseia-se e m factores objectivos evidenciados durante o estudo e que de­terminam as particularidades do processo de ensino adoptado nas escolas com des­dobramento de horários, isto é, a estru­tura dos efectivos por sexo e por idade, o estatuto social dos alunos, o seu horá­rio de trabalho e o seu orçamento tem­pos-livres, os aspectos psicológicos da sua personalidade, as particularidades das funções psíquicas cognitivas e a sua dis­posição inicial para prosseguir os estu­dos sem deixar de trabalhar. Foi esta­belecido que estes factores actuam sobre o processo de ensino não isoladamente m a s através de u m efeito conjugado, embora alguns desempenhem u m papel predominante. A acção de factores socio-pedagógicos determinados ao nível da escola com desdobramento de horários cria contradições próprias destes estabe­lecimentos no processo de ensino: entre a redução do tempo livre e o volume de matérias a ensinar ; entre os horários de trabalho variáveis dos alunos e os horários de estudo; entre o nível insufi­ciente dos conhecimentos iniciais de apoio e a necessidade de assimilar e m toda a sua extensão e profundidade os princí­pios fundamentais das disciplinas ensi­nadas.

São os factores objectivos, assim como as contradições que impõem ao processo de instrução, que determinam a escolha do conteúdo do ensino e idas formas e métodos de trabalho, assim como as características qualitativas do processo propriamente dito.

A segunda parte das investigações didácticas é formada pelo estudo da «in­teracção do nível de instrução geral e da formação profissional da população activa». Fundamentando-se n u m a análise das bases científicas, técnicas e econó­micas da produção, determinou-se o con­

teúdo e a estrutura dos conhecimentos de acordo com as disciplinas e as maté­rias do ciclo de ensino profissional cuja aplicação, nas classes de desdobramento de horários e nos cursos consagrados às técnicas de produção, permite ligar a instrução geral à formação profissional. Tomando como exemplo u m certo nú­mero de profissões, analisaram-se as di­ferentes formas de actividade de u m operário que frequenta as aulas e m re­gime de desdobramento e estudaram-se as possibilidades que oferecem de rea­lizar esta interacção. Verificou-se que os melhores resultados se obtêm nos grupos de instrução mista e m que o en­sino geral é associado ao ensino espe­cializado. Os horários das classes destes grupos foram estabelecidos tendo e m conta o número de operários das e m ­presas (grandes, médias e pequenas), a natureza dos processos de produção e a organização de trabalho (processo contínuo, descontínuo e cíclico; traba­lho e m cadeia, livre ou comandado; tra­balho individual). Após este estudo ela-boraram-se princípios de organização e de método que permitem ligar o ensino geral e a formação profissional dos jo­vens trabalhadores e determinar os tipos de aulas mais aptos para manter esta ligação. Convém atribuir u m a importân­cia particular aos cursos sobre as bases científicas da produção e sobre a reso­lução de problemas tecnológicos com­plexos.

A organização da educação dos adultos das regiões rurais coloca u m problema didáctico importante devido à irregulari­dade dos tempos livres (criadores de gado, agricultores, pescadores, etc.). O estudo permitiu formular recomendações sobre a organização de «sessões» desti­nadas a reunir, de tempos a tempos, os alunos dos cursos por correspondência, assim como sobre os métodos de ensino utilizados para certas matérias no decor­rer destas sessões. Este sistema entrou na prática corrente.

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A educação dos adultos, elemento da educação permanente na U R S S

Paralelamente aos princípios didác­ticos do ensino dispensado nas escolas com desdobramento de horario, o insti­tuto elabora os métodos gerais de ensino das diferentes materias, que constituem u m novo tipo de ajuda para o professor. Baseiam-se nas realizações e nas teorias das ciências metodológicas corresponden­tes, que se adaptam às condições con­cretas e m que determinadas matérias são ensinadas nas escolas com desdobra­mento de horários. Estes métodos defi­nem as particularidades das diferentes formas de ensino dispensado aos jovens trabalhadores nas escolas com desdobra­mento de horárias: cursos directos, cur­sos por correspondência, etc.

A s investigações sobre os problemas de organização e de pedagogia e sobre o funcionamento das escolas assumem u m a importância especial. A este res­peito, o «melhoramento da rede e da estrutura das escolas com desdobramento de horários» encontrasse mais particular­mente na ordem do dia. O estudo permi­tiu elaborar os princípios gerais da orga­nização racional de u m a rede de escolas.

INVEISTTQAÇÕES SOBRE A EDUCAÇÃO PÔS-ESCOL.AR DOS ADULTOS

N a União Soviética, a educação pós-esco-lar desenvolve-se e m duas direcções: o) elevação do nível das qualificações profissionais dos trabalhadores; &) ele­vação do nível ideológico, político, edu­cativo e cultiural nas diferentes formas de organização e de autodidaxia.

iGraças a u m conjunto de estabeleci­mentos especializados, foi possível criar, e m todos os ramos da economia nacional e no sector dos serviços, u m sistema de aperfeiçoamento profissional dos traba­lhadores ao longo do seu período de acti­vidade. Estes estabelecimentos são: a) as faculdades que, nas escolas seciun-dáirias e nos estabelecimentos de ensino superior, dispensam u m ensino e m re­gime de desdobramento de horários e

cursos por correspondência ; b) os ims-titutos especiais de aperfeiçoaniento do pessoal das diversas categorias ligadas aos ministérios e departamentos; c) as faculdades especiais de aperfeiçoamento ligadas às escolas secundárias especiali­zadas e aos estabelecimentos de ensino superior; d) os centros e 'agrupamentos de formação dias grandes empresas; e) os cursos sobre a experiência de van­guarda e a escola de economia aíberta a todas as empresas; / ) as universidades populares de aperfeiçoamento.

Entre os meios próprios para elevar o nível profissional, mencionaremos os cursos de reciclagem (organizados todos os cinco anos), os seminários permanen­tes, as sessões de trabalhos práticos, etc., assim como a auto-instrução. Aberto a todos, o aperfeiçoamento profissional dos trabalhadores faz, na verdade, parte in­tegrante do sistema de educação per­manente.

O Instituto de Investigações Sobre a Educação dos Adultos, que define a edu­cação permanente n u m a sociedade socia­lista desenvolvida tomou como modelo, para o estudo deste elemento da edu­cação permanente, o aperfeiçoamento das diversas categorias de pessoal docente. Este estudo tem por objecto a definição das bases científicas do conteúdo, das formas e dos métodos de formação deste pessoal, tendo e m conta o nível de quali­ficação e as qualidades pessoais dos es­pecialistas da profissão docente exigidas pela sociedade moderna. Para avaliar a importância deste estudo, basta citar al­guns dados estatísticos: na União So­viética as escolas de ensino geral com horário normal empregam, só por si, 2 399 000 professores, incluindo os direc­tores do estabelecimento. O sistema de ensino com desdobramento de horários conta com mais de 300 000 professores r .

d.,, Narodnoe obrazovanie, natika i kitltura v SSSR. Statisticeski sbornik (A Instrução Pública, a Ciência e a Cultura na U R S S . Resumo estatístico), p. 977v

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A formação profissional dos professores é assegurada e m 200 Institutos Pedagó­gicos, 57 Universidades e 409 Escolas Normais.

A reciclagem do pessoal docente efec­tuasse e m 187 institutos e e m mais de 4000 centros metodológicos municipais e de bairro.

O s directores das escolas secundárias de ensino geral aperfeiçoam-se e m facul­dades especiais criadas segundo o m o ­delo dos principais Institutos Pedagó­gicos do país. Estas faculdades são, actualmente, e m número de 25. O pessoal de direcção pertencente às outras cate­gorias frequenta estágios de aperfeiçoa­mento e m institutos especiais, criados para este fim, nas diversas repúblicas e e m seminários organizados pelos minis­térios da educação nacional das repú­blicas da União.

N o estudo dos problemas colocados pelo aperfeiçoamento dos professores, o Instituto parte do princípio de que, para elevar o seu nível profissional, é neces­sário, e m primeiro lugar, procurar que o nível das suas qualificações corres­ponda, e m qualquer momento, às cres­centes exigências da sociedade e m maté­ria de instrução e de educação do h o m e m novo e do melhoramento do processo edu­cativo e da escola no seu conjunto. Para que o sistema de reciclagem dos profes­sores seja eficaz e assente e m bases científicas (quanto ao conteúdo, aos m é ­todos e às formas de organização), é necessário, e m primeiro lugar, determinar e m que é que as exigências actuais e m relação às actividades profissionais e à personalidade do docente (professor, educador, director do estabelecimento) não correspondem às suas qualificações profissionais. Esta discordância só pode ser estabelecida c o m a ajuda de u m a comparação entre u m modelo de refe­rência daquilo que deve ser u m profes­sor dos tempos modernos ou, por outras palavras, u m perfil profissional, e u m modelo empírico, isto é, a ideia que se

tem das qualidades profissionais da per­sonalidade de u m professor (educador, director de estabelecimento, etc.) tal como existe na realidade. Durante a pri­meira fase do estudo, éfectuou-se, por­tanto, a análise e a síntese das exigências da sociedade moderna e m relação à per­sonalidade e à actividade profissional dos professores de diversas categorias, defi­nindo e limitando as suas tarefas e deter­minando os conhecimentos e as aptidões que devem possuir para exercer as suas funções.

Para elaborar os princípios de estabe­lecimento de u m novo tipo de perfil pro­fissional destinado a elevar o nível dos professores, optou-se pela análise da acti­vidade pedagógica pelo método estru-turo-funcional e enunciou-se o princípio da compatibilidade entre o volume e a natureza dos conhecimentos e das apti­dões, por u m lado, e das tarefas a exe­cutar, por outro lado.

N a segunda fase do estudo (1976--,1980), trata-se sobretudo de construir u m modelo do conteúdo da formação dos professores e dos directores de estabele­cimentos escolares, assegurada e m insti­tutos de aperfeiçoamento e nas faculda­des de reciclagem criadas no seio dos Institutos Pedagógicos, assim como de obter os meios próprios para favorecer a auto-instrução dos professores entre os períodos de estágio. Para resolver este problema, estudam-se as características sociodemográficas do indivíduo (idade, formação, antiguidade, experiência pro­fissional, etc.), as faculdades cognitivas e o sentido do concreto, o desejo e a necessidade de alargar e actualizar os seus conhecimentos e de completar a sua competência pedagógica. U m estudo por­menorizado destes factores permitiu construir u m modelo empírico do indiví­duo examinado e comipará-lo, por u m lado, ao modelo de referência (perfil profissional) e, por outro lado, ao con­teúdo, às formas e aos métodos de ensino

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A educação dos adultos, «elemento da educação permanente na U R S S

dispensado nas diferentes fases do sis­tema de aperfeiçoamento.

O estudo do que desejam os profes­sores com u m a certa antiguidade e as dificuldades que experimentam mostra­ram que eles pretendem aumentar e com­pletar os seus conhecimentos científicos e teóricos, enquanto os jovens sentem mais necessidade de u m a formação di­dáctica e metodológica geral.

O s investigadores do instituto pude­ram, assim, estabelecer planos e progra­m a s temáticos de aperfeiçoamento dos professores e dos directores de estabe­lecimentos escolares, o que constitui u m a inovação.

Depois de terem sido objecto de u m a experiência preliminar, estes planos e programas eneontranvse actualmente e m aplicação.

E S T U D O DOS MEIOS PRÓPRIOS P A R A ELEVAR O INIVEL IDEOLÓGICO, POLITICO E C U L T U R A L DOS T R A B A L H A D O R E S

A o contrário do que sucede com as qua­lificações profissionais, cujo aperfeiçoa­mento é essencialmente assegurado por meios institucionis, a elevação do nível ideológico, político e cultural dos adultos decorre da autodidaxia dirigida por cer­tas instituições ou pelo próprio indivíduo. N a U R S S , todos os indivíduos podem es­colher a orientação e o conteúdo da sua educação pós-escolar de acordo com os seus gostos e necessidades espirituais. O cidadão soviético dispõe de múltiplas possibilidades para se instruir pelos seus próprios meios: bibliotecas, clubes, palá­cios e casas de cultura, Cet S cto das artes e do artesanato, casas de professores, de médicos e outros especialistas, salas de leitura rurais, etc. Existem muitos cen­tros de conferências, CcLSctS de educação ipolítica, universidades populares cujo nú­mero ultrapassa actualmente os 28 000 1.

A s universidades populares mostram--se muito activas e m matéria de educa­ção e o seu desenvolvimento figura entre

,os objectivos enunciados pelo X X V Con­gresso do Partido. Tendo e m conta o seu número e o papel eminente que desem­penham na acção educativa e cultural exercida junto dos adultos, o Instituto estuda a maneira como as universidades são organizadas, assim como o conteúdo, as formas e os métodos de ensino que dispensam.

Antigamente, a pedagogia abordava muito raramente este género de proble­m a s . O próprio objecto do estudo sobre a universidade popular como estabeleci­mento de ensino extra-escolar para adul­tos não estava claramente definido. Im­portava, pois, por princípio, determinar as funções da universidade popular no sistema de educação do país. Estabele-ceu-se que a universidade popular, que é u m a forma de estabelecimento de ensino público, tem por principal função orga­nizar a educação permanente extra-esco­lar e a auto-instrução dos adultos. Asse­gura simultaneamente a difusão dos conhecimentos políticos e científicos en­tre a população e organiza os tempos livres dos trabalhadores de forma a ele­var o seu nível educativo e cultural. Todas as universidades populares acumu­lam estas funções.

A s universidades populares apresen­tam todos os sinais exteriores de u m estabelecimento de ensino, m a s são cria­das por iniciativa da opinião pública. O conteúdo do ensino e a organização dos cursos não se encontram subordi­nados a nenhuma norma e a admissão dos auditores é voluntária e não se submete a nenhuma restrição. A univer­sidade popular é autogerida e a activi­dade dos professores assume u m carác­ter social.

O estudo mostrou que, nestas condi­ções, a rede de universidades populares, asim como o conteúdo e a organização

1; Narodnoe obrazovamáe, nauka i kiãtura v SSSR (A Instrução Pública, a Ciência e a Cultura na U R S S ) , p. 303.

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do ensino dispensado, são determinados não só pelas necessidades da sociedade, m a s também pelas necessidades e gostos dos interessados, ou seja, por u m a com­binação dialéctica destes factores. O Ins­tituto está a elaborar critérios de dife­renciação das universidades populares e a estabelecer variantes de planos e de programas de ensino, tendo e m conta as diferentes categorias de alunos; pro­cura igualmente tornar mais eficazes as formas e os métodos de ensino.

O desenvolvimento das universidades populares, o aumento do número de au­ditores que atraem entre a população adulta, a elaboração do conteúdo do

ensino, o aperfeiçoamento dos métodos utilizados para guiar a auto-instrução — todos estes factores contribuem para transformar as universidades populares e m centros de educação permanente dos adultos. O estudo dos problemas teóricos complexos provocados pela educação dos adultos no m u n d o moderno, a qual deve manter^se e m ligação com a vida quoti­diana, e a assistência prática que importa conceder aos diversos estabelecimentos de ensino para adultos, constituem as vias das ciências da educação para con­tribuir para a resolução do problema social suscitado pela educação perma­nente dos adultos.

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Tendências e casos

A educação recorrente nos países

da Europa ocidental*

Dennis B . P . KaJlen

Ainda não há muito tempo, teríamos julgado absurdo e demasiado prematuro tentar avaliar as implicações económicas e financeiras da educação — isto é, da educação escolar. C o m efeito, embora todos estivessem geralmente de acordo e m reconhecer, há já algum tempo, que a educação é u m sector essencial do sistema económico e financeiro de u m país, o trabalho de investigação teórica e de documentação prática necessária a esta avaliação ainda mal tinha começado. Actualmente, os primeiros pioneiros da «economia da educação» ainda não atin­giram a idade da reforma. Muitas «esco­las de pensamento» desenvolveram-se e fundamentaram-se e m postulados incom­patíveis. N o início dos anos sessenta, o investimento na educação com o fim de promover o crescimento económico, ideia fortemente defendida pela Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Económicos ( O C D E ) , tornou-se u m dos grandes princípios da política da educa­ção dos países ocidentais. A noção de «capital humano» surgiu nas directivas concretas relativas ao desenvolvimento da educação, que deixou de ser conside-

Dennia B. P. Kalen (Holanda). Professor no Departamento de Educação da Universidade de Amsterdão. Actualmente, é membro do Insti­tuto de Educação da Fundação Europeia da Cultura, em Paris.

rada, do ponto de vista económico, como u m a simples actividade de consumo, e passou a ser u m investimento produtivo. Embora estes postulados continuem a ser fortemente atacados, as conclusões das análises efectuadas, principalmente nos Estados Unidos da América, foram acei­tes praticamente sem críticas tanto no mundo capitalista como nos países socia­listas. Serviram de justificação principal ao grande aumento do orçamento da edu­cação registado e m todos os países, fosse qual fosse o seu regime económico e polí­tico. Quanto às eventuais contradições entre os objectivos gerais da política da educação e a aplicação directa do® méto­dos e das técnicas da economia da edu­cação à planificação e à elaboração de políticas da educação, não foram sequer apontadas.

Só alguns anos depois o exame e a crítica dos fundamentos teóricos e do quadro socioeconómico e político dos as­pectos económicos e financeiros da edu­cação vieram completar e contrabalançar o desenvolvimento dos métodos e das técnicas, assim como a recolha dos dados necessários. C o m o é evidente, importa sublinhar os progressos realizados nes-

* O artigo que se segue é uma versão ligei­ramente alterada de uma comunicação efec­tuada pelo autor na conferência actual da British Association for Adult Education que se realizou •em Brighton, &m 1974.

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tes dois domínios. D o ponto de vista dos métodos, das técnicas e da recolha de dados, a economia da educação dispõe actualmente de todo u m arsenal de pla­nificação e de elaboração de políticas da educação. N ã o obstante os numerosos contratempos sofridos, ela permite que os governos planifiquem com suficiente precisão o desenvolvimento da educação, embora o façam, na maior parte das vezes, na base da «iprocura social» e não das «necessidades e m mão-de-obra» da educação — sendo a abordagem tradicio­nal baseada na «taxa de rentabilidade» muito mais raramente utilizada.

N o entanto, tornou-se manifesto que a elaboração das políticas e da planifi­cação da educação não pode ser efec­tuada n u m a base estritamente econó­mica, independentemente dos outros objectivos da educação, do processo de tomada de decisões políticas e do quadro institucional do ensino. Por outras pala­vras, a planificação da educação não pode dividir-'se e m compartimentos estanques, dos quais u m seria consagrado ao as­pecto económico. Ela deve ser, desde o início, u m a 'empresa interdisciplinar e não apenas durante a fase de integração dos resultados das diferentes análises.

O que iremos tratar e m seguida tor-nar-se-ia certamente mais claro se m e detivesse mais longamente no desenvol­vimento da teoria e da prática da eco­nomia da educação e das suas implicações na planificação e na elaboração das polí­ticas da educação. Espero, porém, que estas breves considerações sejam sufi­cientes para situar as observações limi­nares que gostaria de formular.

Primeiro. Ainda não chegou o m o ­mento de estudar de m o d o aprofundado as implicações económicas e financeiras da educação recorrente não só porque ainda não chegámos a acordo sobre o que o novo conceito engloba, m a s também porque os instrumentos teóricos e meto­dológicos necessários a essa análise ainda não estão suficientemente elaborados.

Por outras palavras, tudo o que eu pu­desse dizer sobre as eventuais implicações económicas da educação 'recorrente esta­ria sujeito a controvérsia u m a vez que eu seria obrigado a adoptar postula­dos teóricos que muitos poderiam con­testar.

Segvmdo. O estado' das implicações eco­nómicas da educação recorrente deve evi­tar os erros cometidos nos primeiros tempos da economia da educação. Exige u m a óptica integrada e global do sistema, asim como u m conhecimento profundo da sua organização, do seu funcionamento, do seu contexto social, económico e polí­tico. Infelizmente, trata-se de condições muito mais difíceis de satisfazer no caso da educação recorrente —supondo que ela já funciona — do que no caso da educação escolar tradicional. C o m efeito, a educação recorrente caracteriza-se pre­cisamente pela sua forte integração na colectividade e na sociedade; ela deve constituir u m sistema largamente «des-colarizado», m a s talvez não exactamente no sentido e nas proporções estabelecidas por Illich.

Terceiro. Podemos avaliar as implica­ções financeiras e económicas de u m subsistema social, seja ele qual for, sem fazer referência à política seguida. N a planificação da educação, a expressão «planificação da política» remete-nos para este contexto. A «elaboração da política» implica que se façam opções, que se estabeleçam prioridades. C o m o é óbvio, determinam-se estas prioridades — idealmente — depois de ter analisado as suas implicações e cria-se a possibili­dade de introduzir ajustamentos na base dos ensinamentos obtidos a partir da experiência prática. N o entanto, o pla­nificador só poderá empenhar-se no trabalho quando o responsável pela ela­boração da política tiver terminado o seu.

N o caso da educação recorrente —e admito que se aplica igualmente à edu­cação permanente— ainda nenhum país

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formulou u m a política global. Talvez seja a Suécia o país mais próximo de o fazer, pois as implicações financeiras (isto é, as despesas) e o financiamento desta fórmula já foram objecto de estudos aprofundados.

Quarto. A inf onnação sobre1 os pro­gramas de educação de adultos eim curso é muito incompleta, embora melhore muito rapidamente. M a s não nos permite avaliar o custo e as vantagens da edu­cação recorrente. N o que diz respeito ao custo, os dados confundem-se muitas vezes com os dos estabelecimentos de educação escolar. Quanto às vantagens, não tenho conhecimento de dados fiáveis relativos às repercussões económicas ge­rais de determinado tipo de formação. A justificação económica destes progra­mas , que são essencialmente de formação profissional, é suficientemente evidente para não ser posta e m causa ou anali­sada. O outro tipo de formação situa-se fora da grande corrente económica, prin­cipalmente no sector sociocultural. É eon-derado como u m a actividade de consumo pública ou privada e as suas implicações económicas nunca são estudadas.

Educação recorrente e política da educação

A O C D E considera a educação recorrente não como u m elemento a juntar aos pro­gramas escolares e aos programas de edu-ção de adultos existentes, m a s como u m a política de educação diferente, destinada a substituir progressivamente a política actual. E m termos mais gerais, trata-se de u m a política a longo termo do con­junto da educação, para os jovens e para os adultos, escolar e extra-escolar, para a qual deveriam progressivamente con­vergir os esforços desenvolvidos nos di­versos ramos da educação. N u m a pri­meira fase, a educação recorrente deve essencialmente guiar a evolução da polí­tica actual da educação. Propõe não u m a série de objectivos educativos e sociais

inteiramente novos, m a s u m a nova estra­tégia susceptível de permitir que se atin­jam melhor os objectivos actuais. Só n u m a segunda fase ela deve fornecer igualmente u m quadro no qual os objec­tivos serão avaliados de maneira crítica e reformulados e onde os participantes poderão fixar objectivos inteiramente novos. É proposta como u m a estratégia de emancipação, isto é, como u m a estrar tégia capaz de libertar os estudantes e o sistema de entraves do seu ambiente e de lhes fornecer os meios sociais e intelectuais 'que lhes permitem modelar a sociedade a seu bel prazer. U m a defi­nição tão absoluta transforma-a, sem dúvida, n u m a utopia. Pretendemos ape­nas dizer que a educação recorrente será melhor do que as políticas actuais da educação. Melhor do que a educação esco­lar, pois os estudantes sentir-se^ão ver­dadeiramente motivados e os estudos adaptar-se-ão melhor às suas necessida­des. Melhor também do que a actual edu­cação dos adultos, pois ela permite que esta desempenhe o seu verdadeiro papsl, o qual consiste e m proporcionar novas possibilidades de educação e não e m re­mediar os desgastes causados pela edu­cação escolar. Dotada dos necessários recursos, enquadrada por u m a série de medidas respeitantes ao m u n d o do tra­balho ou da economia, apoiada por polí­ticas sociais e culturais que garantem aos estudantes desejosos de recomeçar ulteriormente os estudos u m ambiente apropriado, constituirá u m excelente ins­trumento.

O contexto social e económico

A crise económica actual pôs sinigular-mente e m causa as previsões e as espe­ranças respeitantes ao futuro dos países desenvolvidos e dos países e m desenvol­vimento e, e m particular, a perspectiva do prosseguimento do crescimento eco­nómico, que já tinha perdido grande parte dos seus atractivos e possibilidades

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depois da publicação do relatório do Clube de R o m a .

Nestas condições, qualquer previsão económica é arriscada. Poderíamos dedu­zir que convém abandonar, de momento, a elaboração das estratégias a longo termo, como a educação recorrente, para procurar encontrar ajustamentos a curto termo ao sistema escolar e extra-escolar actual, visando, talvez, o favorecimento dos múltiplos programas de educação de adultos e o reforço da selectividade do ensino.

Penso que existem várias razões para não tomar esta decisão. Estou firme­mente convencido, pelo contrário, de que foi precisamente a incerteza actual quanto ao futuro da economia que tor­nou mais do que nunca necessária a elaboração de u m a estratégia a longo termo da educação. A s razões são as seguintes.

E m primeiro lugar, a margem de m a ­nobra que permite o ajustamento do sis­tema de educação escolar é muito limi­tada. N a verdade, este sistema comporta simultaneamente u m a força de inércia e u m a dinâmica intrínsecas que é difícil modificar quando não se dispõe de solu­ções de alternativa. C o m o prova a re­cente barragem à entrada do ensino su­perior resultante de regras de numerus clausus ou de numerus ßocus e m ramos determinados. Que podem fazer os jovens cuja educação é orientada para estudos superiores, além de se inscreverem nas faculdades ou instituições onde o acesso ainda não é limitado e onde, por vezes, se limitam a esperar a possibilidade de serem admitidos nas faculdades restri­tivas? O u , se não o podem fazer, acabam por encontrar u m emprego para o qual mão são qualificados, onde ocupam o lu­gar de alguém que recebeu u m a formação adequada, mas menos prestigiosa.

E m segundo lugar, seja qual for a so­lução a curto prazo para a crise actual, as modificações a longo termo que daí resultam inevitavelmente para o mundo

social e económico exigem que revejamos as nossas atitudes e m relação ao cresci­mento económico, ao trabalho e à ética do trabalho. Embora estas modificações possam ser aceleradas pela crise econó­mica actual, não resultam dela.

N o s países desenvolvidos, a escala dos valores está e m vias de se transtformar : a «qualidade da vida» prevalece sobre o crescimento económico e o conforto material. Progressivamente, esta noção vaga precisa-se e m propostas concre­tas: trata-se, por exemplo, de ser mais livre na escolha do modo de vida e da carreira e m qualquer período da vida, de beneficiar, na vida profissional, de u m a maior maleabilidade que permita, e m certa medida, de se libertar das limita­ções de tempo impostas pelo trabalho, de reabilitar outros modos de vida ou­trora agrupados sob o rótulo pejorativo de «tempos livres» e de propor meios de quebrar o círculo sacrossanto trabalho--rendimento-nível de vida.

E m terceiro lugar, desenliare lenta m a s seguramente u m a tendência para a participação no processo de tomada de decisão e para a autogestão, tanto na vida económica como na vida social e política. Talvez ainda estejamos muito longe de u m a verdadeira «sociedade de participação», mas, por toda a parte, os trabalhadores e os cidadãos exigem u m a maior participação e m todos os assuntos que eram geralmente decididos sem que eles fossem consultados. O que acompa­nha a emergência política e m numerosos países e, e m especial, nos países desen­volvidos, da reivindicação de u m poder regional e local. A incidência potencial desta evolução sobre a vida económica e social é considerável. Os trabalhadores pretendem participar na elaboração das políticas de recrutamento e de despedi­mento, nas políticas de salários e de pre­ços, nas políticas financeiras e comer­ciais. O s cidadãos pretendem fazer ouvir as suas vozes nos problemas respeitan­tes ao habitat, à poluição e aos trans-

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portes; organizam-se e m grupos de acção para defender o que consideram os seus direitos, desafiando, muitas vezes, os re­presentantes eleitos nos conselhos muni­cipais.

É possível que estas tendências sejam reforçadas ou, pelo contrário, refreadas pela exacerbação das dificuldades econó­micas, mas penso que sobreviverão a qualquer crise e que prefiguram algumas das características essenciais da socie­dade do futuro, seja ela qual for, no plano económico. Ainda não as mencionei todas: existe ainda a diminuição da idade da reforma, a possibilidade de «afasta­mento» por períodos mais ou menos lon­gos ou de mudar de via u m a ou mais Vezes durante a vida activa.

A longo termo, a educação sofrerá fortemente as consequências desta evo­lução, que deverá constituir u m processo maleável, preparando os jovens para u m a vida profissional igualmente maleável e para mudanças de via no decurso da carreira ; será igualmente necessário que prepare os jovens para outros modos de vida, de «tempos livres», como já apontei.

A s relações entre a educação e a eco­nomia deverão mudar. Actualmente, o desenvolvimento da educação, do ponto de vista do número e do tipo de diplo­mados a produzir, é função das previsões de mão-de-obra; amanhã, as aspirações e as esperanças formadas durante o pro­cesso educativo constituirão u m dos fac­tores de influência sobre o crescimento económico selectivo.

Algumas implicações económicas e financeiras

Parece cada vez mais evidente que a era do ajustamento da educação à política económica e às necessidades do pro­gresso tecnológico está ultrapassada; multiplicam-se os sintomas de u m a nova ordem económica. Além disso, estou con­vencido de que u m novo estilo de edu­

cação terá u m papel a desempenhar na instauração de u m a nova ordem econó­mica e social. A educação permanente pode igualmente beneficiar u m a nova élite tecnocrática e meritocráJtica e ¡tor-nar-se u m utensílio muito mais eficaz do que o sistema de educação actual.

Nestes últmos anos, as investigações respeitantes à educação permanente exerceram-se principalmente sobre dois aspectos: a licença de estudos e o pro­blema do financiamento que daí decorre, por u m lado, e o melhoramento das con­dições de vida profissional, por outro lado.

LICTJNÇAS DE ESTUDO E FENANOIAMEBMTO

E m vários países tomam-<se ou toma-ram-se disposições respeitantes à con­cessão de licenças de estudo pagas, tanto no âmbito de acordos tarifários, como na República Federal da Alemanha, como no âmbito de u m a legislação de conjunto, como e m França.

A primeira fórmula apresenta a van­tagem de definir com clareza os grupos interessados e as modalidades de aplica­ção decorrentes do carácter impositivo dos acordos. Além disso, permite, e m geral, a concessão de períodos relativa­mente longos de licenças inteiramente pagas, ou quase.

N o entanto, comporta 'grandes incon­venientes que são, e m minha opinião, redibitórios. Por exemplo, os regulamen­tos diferem consideravelmente consoante os casos e favorecem, e m geral, as cate­gorias socioprofissionais superiores, as quais obtêm, frequentemente, facilidades para recomeçar qualquer tipo de estu­dos. A necessidade de períodos de es­tudos e, portanto, de licenças suficiente­mente prolongadas é menor quando o interessado possui u m a formação mais elevada e, assim, esta fórmula apro­funda geralmente o fosso que existe entre as diferentes categorias sociopro­fissionais.

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Além disso, como o poder de negocia­ção dos grupos interessados é o elemento decisivo, os mais fortes obtêm inevitavel­mente as condições mais favoráveis e os mais fracos, mais u m a vez, encontram-se impedidos de beneficiar das vantagens da educação recorrente. Finalmente, como os programas são habitualmente finan­ciados pelos grupos aos quais se atri­buem licenças pagas, os que não exercem nenhuma actividade profissional são, de facto, excluídos da educação recorrente. Consequentemente, n u m a preocupação de equidade, e também no interesse dos países, como se compreende, e para u m a repartição do acesso ao saber melhor do que a que decorre da consolidação da situação actual, pronuncio-me fir­memente a favor de soluções legisla­tivas.

O exemplo da França mostra simulta­neamente as possibilidades e os obstá­culos e perigos que apresentam estas soluções. Embora a lei de 1971 tenha criado u m quadro jurídico, permitiu dis­posições pormenorizadas e modalidades de aplicação extremamente maleáveis e mais ou menos à mercê das forças do mercado. Sendo assim, os quadros de direcção e os membros das categorias socioprofissionais superiores são fre­quentemente os principais beneficiários e o fosso entre a élite instruída e os outros, ou talvez entre os econo­micamente fortes e os economicamente fracos, cava-se ainda mais profunda­mente.

N o entanto, esta lei francesa apresenta certas repercussões positivas. Obrigou as instituições do sistema educativo a tomar consciência da necessidade de se dirigirem a u m a nova clientela, de abri­rem as portas aos adultos e de elabora­rem, e m sua intenção, programas apro­priados. O que se tornou, de resto, mais evidente nas universidades — pelo menos e m algumas delas— do que mo secun­dário, por razões que facilmente se com­preendem. Esperamos que se venha a

verificar u m a adaptação dos métodos do ensino superior a u m a nova clien­tela.

Além disso, nasceu u m a indústria da «educação permanente», cujos aspectos comerciais são certamente, muitas vezes, prejudiciais à qualidade do serviço forne­cido. A este respeito, seria muito útil u m controle público eficaz das normas e das políticas.

O problema da licença de estudos in­teiramente paga pode transformar-se numa questão à parte, desligada da polí­tica geral respeitante à educação perma­nente. A aplicação das disposições que se lhe referem seria, então, mais ditada pelo jogo de forças e m presença e pelos mecanismos do mercado do que por con­siderações de equidade e de eficiência sociais.

Penso, pois, que muitos argumentos militam a favor da intervenção do Es­tado na educação permanente. E m mui­tos países, as autoridades evitam desde sempre intervir directamente no vasto sector da educação dos adultos e da for­mação industrial, excepto quando, neste domínio, se trata de indivíduos muito jovens. A s políticas de educação adopta­das e m França e na República Federal da Alemanha estão de acordo com a tra­dição de intervenção minimal do Estado nestas questões. Gostaria de sublinhar que, segundo os dados disponíveis nos dois países sobre a aplicação da licença de estudos paga, seria desejável que o Estado interviesse muito mais directa e claramente e m matéria de educação permanente, o que implica, e m parti­cular, que fixe prioridades quanto aos grupos sociais que devem, e m primeiro lugar, beneficiar da educação perma­nente, assim como dos princípios direc­tores respeitantes aos meios materiais a aplicar — encarregamdo-se, eventual­mente, de os fornecer directamente se não estiverem disponíveis.

É a política adoptada na Holanda pelo comité da .escola aberta. N o seu primeiro

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relatório aos ministros da educação e da cultura, este distinguiu três grupos prio­ritários: os adultos activas que possuem u m fraco nível de instrução e de forma­ção, os jovens activos (até aos 25 anos) e as mulheres casadas.

U m a política destinada a concentrar recursos limitados e m grupos prioritarios específicos parece-me a única possível, se considerarmos a educação permanente como u m meio de instaurar u m a socie­dade e m que a educação constitui u m instrumento de justiça social e não u m a sociedade c m que o crescimento e a efi­ciência económicos representam o único factor determinante.

A designação dos menos instruídos como grupo prioritário também tem con­sequências quanto à natureza dos pro­gramas e dos meios a proporcionar. C o m efeito, estes grupos serão geralmente pouco motivados e será necessário inves­tir muito nas actividades de recruta­mento e de orientação — na Suécia, «actividades periféricas». Deverá permi-tir-se que os participantes consagrem muito tempo —incluindo tempo de tra­balho — aos estudos, o que u m a regula­mentação geral das licenças de estudos determinará. O aperfeiçoamento profis­sional e a mobilidade social constituirão u m a forte motivação, ou até o móbil principal da participação. E m certo sen­tido, poderá talvez constituir u m obstá­culo à realização dos objectivos mais vastos definidos no momento da escolha destes grupos prioritários.

A s políticas adoptadas e m matéria de licenças de estudos pagas devem favore­cer de m o d o selectivo grupos específicos se pretendemos que permitam, efectiva­mente, atingir os grandes objectivos sociais geralmente reconhecidos da edu­cação recorrente.

Além disso, exigem u m a intervenção do Estado mais vigorosa e mais directa. Devem ser menos «liberais», pois, embora todos sejam livres de escolher consoante as suas necessidades, estas dependem,

e m grande parte, das forças do mercado. Finalmente, as licenças de estudos pagas contrariam a equidade social se não se inscreverem n u m conjunto e m que os grupos de população que não participam activamente no progresso económico — e que estão muito longe de constituir u m a quantidade desprezível — se in­cluam nos grupos prioritários.

MELHORAMENTO DAS CONDIÇÕES DBi VIDA PROFISSIONAL.

O segundo domínio no qual a evolução destes últimos anos foi rápida refere-se ao melhoramento das condições de vida profissional. O interesse potencial que apresenta para a educação recorrente é evidente, apesar de raramente ser apontado ou mencionado de maneira ex­plícita. N o entanto, tal como as licenças de estudo pagas, favorece, geralmente, os grupos economicamente fortes.

Gostaria de sublinhar a complemen­taridade potencial que existe entre este aspecto e as licenças de estudo pagas. Estas devem ser concedidas da maneira selectiva, e m primeiro lugar a grupos definidos como prioritários, o que não significa que eu m e oponha a u m regime jurídico geral de licenças de estudo pa­gas, m a s duvido de que haja muito a esperar, de momento. E m minha opinião é necessário, portanto, completá-lo atra­vés de disposições específicas a favor de grupos prioritários, que talvez sejam dispendiosas e m geral, e para o Estado e m particular.

Se o melhoramento das condições de vida profissional encontra as suas moti­vações e origens na aspiração de activi­dades diversas, também abre perspecti­vas muito interessantes à educação. M a s , para tal, deve preencher certas condições. E m particular, deve corresponder às ne­cessidades de educação do trabalhador. O s que possuem u m a formação mínima beneficiarão muito mais de períodos de estudo relativamente longos do que de aulas diárias. A s políticas de educação

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devem igualmente ser coordenadas com as medidas tomadas tendo e m vista este melhoramento. Por outras palavras, os programas devem ser organizados e m períodos e e m locais e m que os benefi­ciarios das medidas de melhoramento possam participar.

Além disso, o melhoramento das con­dições de vida profissional tomou-se, e m muitos ramos, u m problema menor em relação às reduções do tempo de trabalho impostas pela crise económica. Seria in­teressante estudar se todo este tempo livre não poderia igualmente ser utilizado com fins educativos, m a s talvez seja exi­gir demais aos especialistas do mercado do trabalho. Mais u m a vez. seria neces­sário conhecer as necessidades particula­res de grupos específicos e tomar rapi­damente medidas para (proporcionar a estes grupos cursos apropriados, o que exige, bem entendido, u m sistema educa­tivo capaz de se adaptar rapidamente a estas novas necessidades. Sob este as­pecto, a educação dos adultos eneontra--se melhor colocada do que a educação escolar, m a s os seus responsáveis hesi­tam, muitas vezes, e m empreender este género de novas operações, que parecem afastar-se da sua função habitual.

Para terminar, gostaria de fazer algu­m a s observações sobre as outras impli­cações económicas e sociais de u m sis­tema de educação permanente no quadro da política global já mencionada.

E m primeiro lugar, o nosso sistema de educação actual obriga os jovens a esco­lher a sua carreira de modo quase irre­versível n u m momento e m que esta esco­lha ainda não pode ser convenientemente motivada. Daí resultam numerosas frus­trações e u m desperdício de recursos do ponto de vista social. Toda a política de educação capaz de proporcionar aos jo­vens a possibilidade de escolher a sua carreira e m função de elementos racio­nais e pertinentes reduz este risco de frustração e desperdício.

A solução que consiste e m adiar o prosseguimento dos estudos, a nível su­perior, e m particular, até ao momento e m que o interessado tenha adquirido u m a verdadeira experiência da vida pa­rece, pois, muito recomendável e deve­ria ser activamente estimulada, ou até imposta.

E m segundo lugar, e m muitos países desenvolvidos, mais de metade dos jovens abandonam a escola sem qualquer qua­lificação profissional. Proporcionar à maior parte destes jovens u m a segunda oportunidade é u m a necessidade social e económica da sociedade de amanhã, quer se encontre e m pleno crescimento ou e m franca estagnação económica.

A sua bagagem intelectual e social é geralmente reduzida. Além disso, a ex­periência profissional que adquiriram e m cinco ou dez anos n e m sempre decorre do seu nível de instrução. Proporcionar--Ihes a possibilidade de tentar novamente u m a oportunidade, representa mais do que assegurar-lhes u m a formação no exercício da sua actividade.

Devemos consagrar u m lugar à parte àqueles que não encontram trabalho. E m 1973, nos Estados Unidos, a taxa de desemprego no grupo 16-17 anos era de 17,3 por cento e no grupo 18-19 anos, de 12,3. Entre estes jovens desempre­gados, muitos viram-se relegados para a base da escala social. Só u m a nova possibilidade de se instruírem, como a que oferece a educação recorrente pode ajudá-los a melhorar a sua situação so­cial. A s disposições tomadas em matéria de licenças de estudos não possuem, para eles, qualquer utilidade.

E m período de estagnação económica, o acesso dos jovens que interrompem os estudos a empregos de futuro, de nível intermédio, é muito limitado. C o m efeito, a geração precedente, que ocupa estes empregos, não se encontra e m con­dições de aceder a postos superiores e os despedimentos atingem primeiramente os «novos».

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E m terceiro lugar, talvez seja errado pensar que a educação não melhore. O adiamento dos estudos pode ser útil e economicamente rentável porque os cursos dispensados podem ser melhor preparados amanhã para u m a actividade profissional ou para outras funções do que actualmente ou há x anos.

N ã o m e referi ao aspecto financeiro, isto é, ao custo de u m a política como a que esbocei. A s despesas ocasionais seriam certamente enormes se os^idultos activos obtivessem generosos direitos de educação e salário a tempo integral.

Prejudicamos a causa da educação permanente ou recorrente divulgando es­timativas de despesas exorbitantes que não se increvem n u m projecto global de política da educação permanente. N o âmbito desta política, serão concedidos

longos períodos de licenças de estudo a grupos desfavorecidos específicos. Os in­teressados talvez sejam numerosos, m a s as despesas eventuais serão relativa­mente fracas. Além disso, as despesas economicamente globais e, e m particular, as despesas adicionais, poderão transfor-mar-se e m vantagens, especialmente se os encargos sociais e os subsídios de desemprego diminuírem.

Finalmente, é necessário considerar o custo deste sistema relativamente ao da educação escolar e das economias poten­ciais que podem ser realizadas, directa­mente, devido à diminuição da expansão, no encurtamento dos estudos e à redu­ção do tempo desperdiçado e, indirecta­mente, graças à pertinência de estudos escolhidos com u m objectivo preciso e não como única solução.

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Tendencias e casos

O projecto húngaro

para a escola do futuro

Bozsa Bet

C o m o e m todos os países socialistas, na Hungria, a economia populär inscreve-se cada vez mais no quadro de u m sistema integrado de economía planificada, para­lelamente a todas as outras instituições governamentais. É natural, portanto, que a investigação científica, fundamento cul­tural da sociedade, assim como o ensino ao nível escolar e superior, sejam inti­mamente integrados neste grande sis­tema social.

A planificação é feita por estratos su­cessivos, tanto no que se refere ao tempo como às instituições. Planos a longo termo, elaborados por períodos de quinze a vinte anos, definem as grandes orien­tações do desenvolvimento sem perder de vista a construção do socialismo. Pla­nos a médio termo (quinquenais) preci­sam tarefas concretas, cuja execução dá lugar a planos anuais para os diversos ramos de actividade industrial, e de mo d o mais desenvolvida ainda para as empre­sas e as instituições. A este nível, os objectivos preestabelecidos são atingi­dos a partir de parâmetros determinados no centro e de iniciativas locais.

N o nosso contexto, o factor tempo desempenha o papel mais importante, pois os trabalhos de investigação reali-

Rozsa Ret (Hungria). Secretária da Comissão do Ensino Público, da Academia das Ciências da Hungria e do Ministério da Educação.

zados sobre o desenvolvimento da edu­cação inscrevem-ise n u m a das grandes orientações definidas no Plano nacional a longo termo de investigação científica elaborado no início dos anos setenta1.

Sob o efeito do fenómeno de acelera­ção do tempo, das correntes de informa­ção, da rapidez da especialização nas ciências, da intensificação concomitante das tendências interdisciplinares e de muitos outros factores, o problema sus­citado pela educação da nova geração ocupa u m lugar de primeiro plano não só na Europa m a s e m todo o mundo. Após vários meses de preparação minu­ciosa, o Partido dos Trabalhadores Socia­listas Húngaros estudou todos os aspec­tos do ensino público n u m a sessão de 1972. Após u m a análise profunda da situação, recapitulou as tarefas a reali­zar, a longo termo, até aos anos oitenta. N u m resumo do que era necessário fazer para servir os interesses da sociedade húngara, os objectivos fixados pela reso­lução estavam essencialmente ligados a dois temas principais: a necessidade de actualizar os programas de ensino no sentido das grandes orientações fixadas

1. Este plano, aprovado pelo governo, reservou u m local especial, até 1990, a dois temias de investigação prioritários dos quais u m , o n.° 6, se refere ao desenvolvimento do ensino público.

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para a educação no seu conjunto e a necessidade imperativa de chegar a u m a reforma da estrutura escolar.

Tomando urna iniciativa que marcava u m a etapa importante do processo de aplicação da resolução, os responsáveis pelo Ministério da Educação pediram à Academia das Ciencias da Hungria, du­rante o Verão de 1973, que organizasse u m concurso científico de alto nível para preparar a modernização dos programas no quadro da reforma escolar a longo termo e para efectuar, a médio termo, u m a reforma parcial do ensino respei­tante unicamente aos programas de es­tudo.

iNa sessão de Setembro de 1973, o Pre­sidium da Academia decidiu nomear u m a comissão de alto nível para se ocupar deste problema. Presidida por u m neuro-biólogo afamado, o doutor Janos Szentá-gothai, então vice-presidente (actual­mente presidente) da A c a d e m i a , a comissão do ensino público do Presidium iniciou os trabalhos, com a ajuda de três subcomissões.

A o escolher os membros de cada sub­comissão, prociurou-se que elas fossem chefiadas por cientistas de elevada com­petência e que os colaboradores fossem designados após amplas consultas nos principais domínios do ensino público.

Durante os primeiros meses, os m e m ­bros das subcomissões (encarregados, respectivamente, de estudar os aspectos pedagógicos da Matemática, das Ciên­cias Sociais e das Ciências Exactas e Naturais) não forneceram ideias muito claras sobre a natureza da ajuda a pres­tar à causa do ensino público, nem sobre o método de trabalho a adoptar. M a s , u m a coisa surgiu nitidamente: os parti­cipantes começaram a dar provas de u m entusiasmo raramente verificado até à data na Academia. Cientistas, professo­res e m actividade e homens políticos res­ponsáveis pela política da educação ti­veram, desde o início, as mesmas ideias não só na análise crítica da escola actual,

como também quanto às principais orien­tações a seguir para determinar os ob­jectivos.

O trabalho organizou-ise e m duas di­recções: por u m lado, o sistema de co­missões foi estabelecido de cima para baixo, os académicos 1 que presidiam às três subcomissões eram membros de pleno direito da comissão de alto nível, e os três secretários (jovens investiga­dores) participavam a título de membros convidados. Fortalecidas por este prin­cípio, as subcomissões criaram, quando necessário, pequenas equipas de trabalho para resolver problemas concretos.

Por outro lado, n u m a construção de baixo para cima, a organização era cons­tituída, na outra extremidade, por pro­fessores e m actividade que já tinham procurado fazer qualquer coisa, no seu domínio de acção mais ou menos limi­tado, para modernizar as escolas e ga­rantir u m a escolha mais franca dos va­lores do socialismo na educação. Alguns deles, no seu entusiasmo, pretendiam redigir de novo as partes ultrapassadas dos manuais escolares, tirando partido do seu saber recentemente adquirido. Outros desejavam substituir por u m clima democrático o autoritarismo habitual do professor tradicional; outros ainda pre­conizavam novos métodos inspirados na pedagogia moderna. Estas ideias, avan­çadas por indivíduos, ou por equipas, estavam logicamente de acordo com o trabalho de grupo que ganhava consis­tência na Academia2.

1. Os membros ordinários e os membros cor­respondentes da Academia das Ciências da Hungria chamam-se acaldêmicos,

2. A Academia das Ciências compreende duas secções principais. O corpo cientifico inclui os «imortais» que dirigem as diferentes co­missões cientificas e outros pelouros com a função de coordenar a investigação, de esta­belecer previsões científicas, etc. O ramo administrativo orienta as activM'aldes dos institutos de investigação, das equipas de investigação idos departamentos universitá­rios— com faz o C N R S (Centro .Nacional de Investigação Científica), e m França.

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Graças a u m a apreensão bastante rá­pida das perspectivas a longo termo de­pois da realização do projecto, u m exame aprofundado do conteúdo do ensino pú­blico permitiu fundamentar, e m bases conceptuais sólidas, as acções que tinham sido desenvolvidas n u m a ordem mais ou menos dispersa e o esforço de reflexão suscitado pela concepção global ajudou a perceber melhor a correlação idos por­menores.

A primeira consulta da comissão de alto nível e de todas as subcomissões, que se reuniu à porta fechada durante três dias, passou a ser considerada u m a das pedras angulares do projecto. Até 1977 realizaram-se mais três reuniões fecun­das. Organizada segundo o modelo das conferências científicas, esta série de en­contros acolheu igualmente u m certo número de peritos afamados, diversas personalidades da inspecção do ensino público, muitos académicos e investiga­dores eminentes — cerca de cinquenta pessoas no total. Graças à abordagem interdisciplinar adoptada pelos partici­pantes e ao elevado nível de consciência social que caracteriza os seus trabalhos, a conferência obteve resultados que ul­trapassaram todas as expectativas. Após u m a reflexão c o m u m de três dias sobre os problemas, os trabalhos da comissão começaram a apresentar u m a fisionomia b e m definida: ôlaborou-ise u m texto re­lativo ao nível de instrução que deveria atingir u m indivíduo húngaro culto no final do século e ao m o d o como o ensino público poderia dar forma a estes conhe­cimentos — pelo menos no estado actual do saber.

Este texto definia idealmente a natu­reza dos conhecimentos que pode for­necer u m ensino geral como parte inte­grante da personalidade; afirmava-se que:

«Os jovens alunos das nossas escolas deverão :

a) Conhecer as leis fundamentais que regem as .transformações que intervêm

na natureza e na sociedade, assim como os princípios fundamentais do pensa­mento lógico; considerar o M u n d o que nos rodeia como u m a etapa no processo de desenvolvimento sociohistórico que vai do simples ao complexo; compreender as correlações entre o desenvolvimento e as leis da natureza e da sociedade; apreender a interacção dos processos na­turais e 'societais' e, baseando^se neste conhecimento, construir u m a ideologia dialéctica e histórico-materialista, atin­gindo assim u m a Weltanschauung;

b) Ser capazes de utilizar a língua materna de m o d o original, lógico e de­licado e m todos os tipos de comunicação ; aprender pelo menos u m a língua estran­geira e poder adquirir o domínio de outra e m pouco tempo; tornar-se aptos para o pensamento matemático e para resol­ver os problemas por dedução lógica; saber avaliar exactamente o seu lugar no ambiente natural e social e assimilar, de modo activo e fecundo, os impactos do M u n d o exterior; ser capazes de in­tegrar as informações e os novos conhe­cimentos n u m pensamento uniforme, m e s m o depois de ter terminado os es­tudos; possuir os conhecimentos reque­ridos sobre os métodos científicos graças aos quais a humanidade sonda o uni­verso; poder tirar partido destes méto­dos na esfera de actividade que lhes é própria;

c) Saber encontrar a sua vida na N a ­tureza e na sociedade, tendo e m conta as condições modernas da vida industrial, técnica e científica; poder encontrar a sua realização pessoal na criação e na expressão, sobretudo efectuando u m tra­balho útil, empregando u m a linguagem precisa e criando obras científicas, téc­nicas e artísticas; por outras palavras, adquirir a faculdade de moldar tanto a Natureza como a sociedade e os próprios indivíduos; sentir profundamente a ne­cessidade de u m a actividade social e de u m a participação na sociedade funda­mentada n u m a base ideológica sólida;

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esforçar-se por modelar as relações pri­vadas (familiares e sexuais) e as rela­ções publicas segundo as normas da ética socialista, tanto dentro do país como no estrangeiro.»

C o m o fim de realizar, a longo termo, u m nível suficientemente elevado de co­nhecimentos pelo ensino, a comissão de alto nivel da Academia sugeriu que se fixassem sete domínios de ensino reco­mendando a adopção de u m novo modo de comunicação do saber susceptível de substituir matérias que não tinham sido praticamente modificadas desde o sé­culo xvni ou xix.

É interessante assinalar que algum tempo depois destes domínios iterem sido propostos à Academia, se verificou que as ideias húngaras se encontravam muito perto de u m a proposta francesa já pu­blicada na época e que alguns porme­nores destes dois projectos, tal como os assuntos decorrentes dos domínios de ensino, eram idênticos.

Segundo a declaração da comissão, os conhecimentos essenciais nestes sete do­mínios podiam ser uniformemente adqui­ridos aplicando aos estudos os conceitos modernos da linguagem e da comunica­ção, da matemática, da ciência, da his­tória e das ciências políticas, da estética, da somatología e da técnica. Embora os relatores tenham transmitido expressa­mente os aspectos educativos de cada domínio de ensino, encarregou^se u m a equipa distinta de estudar as correlações entre a actividade prática de instrução na escola e o conteúdo científico-ideoló­gico do ensino, entre o processo educativo escolar como sistema autónomo, por u m lado, e este m e s m o processo como sis­tema aberto (ou aparentemente aberto) e m contacto directo com vários sectores da vida social, por outro lado.

Redigido primeiramente e m termos ge­rais, sob a forma de declaração, o pri­meiro relatório foi seguido de u m pro­fundo trabalho de investigação e de coordenação, no termo do qual é lícito

esperar que u m documento contendo a definição moderna da pedagogia socia­lista esteja pronto antes de 1980.

Gostaríamos de apresentar, nos desen­volvimentos que se seguem, o quadro tipo particularmente novo e m que se inscrevem os sete domínios do ensino público e fornecer u m resumo dos ca­racteres essenciais do projecto.

A originalidade da sua forma e do seu modo de organização deve-se ao facto de u m corpo social ter sido criado fora do campo coberto pelo sistema governa­mental que impera sobre a educação e até, e m certa medida, independentemente dele, e de ser patrocinado pela própria Academia das Ciências. A Academia não desempenha u m papel oficial neste do­mínio. Este corpo, este movimento, cons­tituiu motivo de u m encontro científico e corporativo donde partiu a maior cam­panha intelectual c o m u m da nação, cen­trada n u m a única tarefa concreta: con­seguir reformar o ensino público. Este encontro proporcionou a peritos teóricos e a especialistas profissionais, e também a professores, confrontados com as con­tradições existentes entre matérias de ensino e métodos pedagógicos ultrapas­sados e com as esperanças 'de progresso social que surgem diariamente na escola, u m a ocasião de se exprimirem e de par­ticiparem na concepção da escola do futuro, embora, de momento, esta con­cepção seja apenas teórica.

Outra característica original deste tra­balho era o facto de (contrariamente às práticas locais) as comissões disporem de certos meios reservados, geralmente, ao ramo executivo dos poderes públicos. Para assegurar a independência finan­ceira do projecto, foram concebidos fun­dos importantes, inicialmente pela Aca­demia e, ulteriormente, pelo gabinete interdepartamental dos projectos, encar­regado, pelo governo, de se ocupar do título n.° 6, relativo ao ensino público. Os autores de estudos diversos e de notas

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de curso destinadas a substituir os m a ­nuais foram remunerados com fundos que serviram igualmente para financiar a experimentação de projectos pedagó­gicos já suficientemente elaborados. To­dos estes projectos nasceram de inicia­tivas das subcomissões e a sua execução foi gerida por u m secretariado formado por muito pouco pessoal.

Depois de ter realizado este trabalho durante três anos lectivos sucessivos, a comissão publicou, e m Abril de 1976, u m documento com cerca de vinte folhas que fornecia u m resumo do modelo de estudos aprovado pelo Presidium da Aca­demia das Ciências da Hungria1.

Encontraremos a seguir u m a breve exposição dos diversos aspectos do con­teúdo do ensino cuja introdução é reco­mendada ao Ministério da Educação.

Digamos e m primeiro lugar que o ideal do ensino aqui esboçado não .poderá ser realizado por u m só indivíduo, isolado, m a s que o será por toda u m a geração. Julgamos também dever salientar qué, no espírito dos seus criadores, os sete domínios de ensino devem constituir u m processo integrado de educação, come­çando na escola infantil e prosseguindo até aos 18 anos, sejam quais forem a estrutura fixada ou a data e o ponto de partida para determinado aluno.

Os peritos que elaboraram o projecto d^ ensino da linguagem da comunicação inspiraramHse, nos seus trabalhos, e m várias grandes tendências que parecem marcar profundamente a linguística con­temporânea. Os estudos efectuados neste domínio deveriam conduzir à compreen­são, por parte da criança, de que o pen­samento só pode exprimir-se através de palavras, de que a u m a situação linguís­tica dada corresponde sempre u m a socie­dade e de que o emprego da linguagem fornece a medida da personalidade e do nível cultural do locutor. Estes estudos baseiam-se e m dois objectivos principais : completar o ensino da língua materna e proporcionar o domínio de duas línguas

estrangeiras (uma a nível médio, outra a nível elevado). Recomendarse que o es­tudo desta última língua se inicie aos 8 anos, isto é, no terceiro ano da escola primária do sistema actual de educação.

Embora a Academia, na sua recomen­dação, tenha considerado o ensino da lin­guagem e da comunicação u m processo integrado incluindo vários aspectos, a subcomissão encarregada deste problema ainda não pôde definir u m conceito geral do ensino da língua materna e das lín­guas estrangeiras. Limitou-se, até agora, a algumas tentativas de sincronização da teoria e da prática neste domínio.

Procurou saber-se se o estudo da lín­gua materna assentava em fundamentos científicos sólidos, pois alguns peritos pretendiam reformar os métodos de en­sino consoante as orientações da linguís­tica tradicional, enquanto outros subli­nhavam a necessidade de adoptar os métodos mais modernos de ensino de línguas.

U m a equipa elaborou, no Instituto de Linguística da Academia, u m a proposta de plano de estudo do húngaro nos es­tabelecimentos de ensino secundário. A criação de u m programa de quatro anos de gymnasium2, acompanhado por brochuras de preparação indispensáveis, forneceu u m impulso suficiente para ela­borar o plano de estudo a adoptar no final do século. Após quatro anos de ex­perimentação prática nas escolas, u m a parte bastante importante das matérias de estudo, inicialmente previstas para estabelecimentos de nível secundário, re-velou-se totalmente ao alcance das crian­ças do grupo etário dos 10 e 11 anos.

N o que se refere à reforma do con­teúdo e dos métodos de ensino da mate' mática, realizam-se, na Hungria, traba-

1. Declaração e Recomendações d'à AJcaJdemi'a idas Ciências da Hungria sobre o conteúdo a longo termo do ensino e do desenvolvimiento da educação escolar, Budaipeste, 441 paginas.

2. Estabelecimento secundário que comporta alunos dos 14 aos 18 anos.

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lhos sistemáticos de investigação e de experimentação, desde meados dos anos sessenta. Qualificado inicialmente de «complexo», o novo programa de estudo da matemática foi progressivamente in­troduzido e m todas as escolas primárias do país entre 1974 e 1978. A subcomissão da matemática, que inclui vários mate­máticos que preconizaram vigorosamente a aplicação de métodos inovadores, gos­taria de que o desenvolvimento do pen­samento matemático e da capacidade de resolver os problemas por dedução ló­gica se transformasse na quinta-essência da educação.

Os métodos modernos de ensino refe­rence à teoria dos conjuntos, à lógica, à aritmética, aos algoritmos, à álgebra, às relações, às funções, às séries, aos elementos de análise, à geometria, à aná­lise combinatória, às matemáticas apli­cadas e à informática, ao cálculo das probabilidades e à estatística. U m dos princípios essenciais da metodologia afirma que a aprendizagem da matemá­tica deve basear-se na experiência do aluno e que o ensino deve ser orientado de modo que lhe permita adquirir a maior parte dos conhecimentos graças ao seu esforço pessoal.

Aplicando esta concepção geral ao en­sino, como tal considerado, a subcomis­são da matemática comprometeu-se e m preparar, nos estabelecimentos secundá­rios, o prosseguimento do estudo das m a ­térias e do emprego dos métodos que acabavam de ser introduzidos nas escolas primárias. A s experiências que se rea­lizaram e m vários gymnasium enfren­taram as dificuldades sentidas pelos alu­nos a quem a matéria tinha sido ensinada pelos métodos antigos. Além disso, as complicações ligadas à compreensão dos novos métodos foram ainda maiores por estes deverem ser aplicados às matérias mais importantes do novo programa de estudos. N o entanto, estas experiências foram coroadas de sucesso e surgiu u m novo programa para o ano lectivo 1977-

1978 com o fim de assegurar o prosse­guimento do enprego dos novos métodos de ensino da matemática e m u m ou mais estabelecimentos secundários.

Enquanto se desenvolviam as novas ideias, dois pontos deram lugar a contro­vérsias. Ê conveniente ensinar a teoria das probabilidades na escola? Acabou por se decidir que sim, tanto a nível do primário como do secundário, desde que se descubram métodos de ensino eficazes. O segundo ponto e m discussão referia-se à dupla função da matemática no pro­cesso de ensino escolar tendo e m vista, por u m lado, a autonomia da sua estru­tura lógica e, por outro lado, a sua apli­cação ao estudo das ciências exactas e naturais e das ciências sociais. Chegou-se à conclusão de que estas duas funções podiam ser concebidas de tal maneira que cada u m a delas tivesse e m conta as exigências da outra e que os criadores deviam considerar as duas funções si­multaneamente nos seus trabalhos, como tinha sucedido aquando de experiências tentadas e m certas escolas primárias.

A educação científica é considerada u m processo integrado que parte da ex­periência para chegar à apercepção de correlações e de leis gerais, assim como à ordem e à aplicação criadora dos conhe­cimentos, recorrendo a modelos. Todos sabemos que as crianças criam laços afectivos com o ambiente durante os seis primeiros anos de vida; a escola deve intensificar esta tendência e não quebrar os laços estabelecidos. Deve desenvolver e m todos a aptidão para remodelar a natureza de maneira reflectida. É neces­sário que as crianças compreendam e, por conseguinte, a m e m a matéria, a na­tureza e a tecnologia e sejam capazes de modelar o mundo objectivo e m benefício da sociedade humana.

O s métodos de aquisição do saber são a observação, a experimentação, a mode­lização, a ordenação sistemática dos co­nhecimentos, a teorização e a verificação dos resultados e sua aplicação. O ensino

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escolar refere-se a matérias como as leis universais do movimento da matéria, as propriedades das estruturas materiais, o desenvolvimento da matéria e as quali­dades específicas da matéria viva.

A subcomissão das ciências tomou a iniciativa de desenvolver a elaboração do conceito já fixado, preconizando u m a aplicação mais audaciosa na prática. Con-cebeu-se u m sistema no qual todos os ramos das ciências exactas e naturais susceptíveis de ser introduzidas no en­sino (física, química, biologia, ciências da Terra) são, e m parte, integrados e, também e m parte, coordenados com pre­cisão, n u m programa com estrutura e m espiral.

A necessidade de u m a coordenação das matérias científicas ensinadas é reconhe­cida pela maioria dos académicos e esta ideia começa a penetrar entre os profes­sores. A s recomendações a longo termo poderiam, portanto, exercer u m a influên­cia sensível sobre a escolha das matérias de ensino para os anos oitenta ou, pelo menos, estimular u m a coordenação mais estreita. C o m o o papel da integração não está ainda definido, a Academia re­comendou que u m tema de estudo misto denominado «Estrutura do mundo mate­rial» e incluindo a Física e a Química, seja introduzido, para já, no primeiro ano de estudos secundários.

A s experiências realizadas sob a orien­tação da subcomissão forneceram resul­tados particularmente interessantes não só nos gymnasium, como também nos quatro primeiros anos do primário, onde se substituiu, e m várias escolas de di­ferentes regiões do país, o ensino da matéria denominado aproximadamente «estudo do ambiente», pelo que u m a questão homogénea e integrada refe­rente a estudos da Natureza.

N o estudo dia história, das ciências e da arte sociopolíticas, o conhecimento da história assume tanta importância como a soma dos conhecimentos sobre o estado actual da sociedade, as determinantes dos

movimentos na colectividade e os facto­res que influem sobre o comportamento humano. O ensino desta matéria terá por objectivo criar u m a ideologia marxista--leninista no espírito dos jovens e desen­volver a sua aptidão para a acção na base de u m a tomada de consciência cien­tífica.

O ensino moderno desta matéria re­fere-se não só à história do mundo e à história nacional, m a s também à evolu­ção cultural, científica, social e econó­mica, incluindo informações indispensá­veis sobre a organização política actual e u m certo conhecimento do comporta­mento humano. U m ensino concomitante da filosofia, da psicologia e da geografia ajudará, e m certa medida, a efectuar a síntese das ciências exactas e naturais e das ciências sociais.

N a elaboração deste sector do pro­grama e dos métodos a aplicar não foram considerados os precedentes que tinham complicado o trabalho nos três domínios já indicados. Era evidente que os m é ­todos tradicionais de ensino da história não se aplicavam ao estudo de todos os ramos das ciências sociais. C o m a ini­ciativa da subcomissão das ciências so­ciais, o conteúdo do ensino da história e os seus métodos foram radicalmente modificados e este ensino, na sua nova forma, pode englobar a maior parte dos conhecimentos e m ciências sociais. Rea-lizaram-se experiências e m pequena es­cala segundo este esquema, procurando introduzir novos métodos no ensino tra­dicional, essencialmente para fornecer u m a visão dos séculos passados mais completa, e enriquecendo com noções de etnografia e de sociologia o núcleo cen­tral constituído pelos problemas econó­micos e políticos, sem desprezar even­tualmente, neste esquema, as descobertas mais recentes da arqueologia.

C o m o os peritos desejosos de moder­nizar esta matéria estavam de acordo e m considerar que a história e as ciências sociais deveriam ser ensinadas durante

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toda a escolaridade, optou-se por u m a matéria denominada «Conhecimento da sociedade», apresentada sob diversas va­riantes, para o grupo etário dos 6 aos 10 anos. Só foi possível decidir sobre o que era necessário ensinar aos alunos dos dois últimos anos do secundário (grupo etário dos 17-18 anos) após u m debate bastante animado. Recomenda-se, neste documento, que se ensine a Filosofia no último ano do secundário, segundo u m plano que inclui três variantes, entre as quais se poderia escolher, eventualmente, consoante o tipo de estabelecimento. U m destes planos baseava-se na sociologia e na psicologia social ; outro, na economia e no futuro; o terceiro, «O h o m e m na sociedade», constitui u m a tentativa de síntese dos dois primeiros e inclui igual­mente noções de antropologia, de direito civil e de administração pública.

A educação estética, cuja forma tra­dicional é o ensino da literatura, serve para enriquecer a personalidade do aluno com u m a actividade simultaneamente es­colar e extra-escolar e oferece a vanta­g e m capital, entre outras, de desenvolver saudavelmente a vida afectiva do aluno. O ensino desta matéria tem essencial­mente por objectivo dar a compreender as obras de arte aos alunos, ensinando--lhes a sentir prazer perante o belo, atra­vés da literatura, da música e das artes, inserindo as obras no seu contexto his­tórico.

A educação estética possui outro objec­tivo importante: desenvolver a criativi­dade no aluno pela prática, individual ou e m grupo, do canto, da música instru­mental, da visita a museus de pintura, da crítica estética de filmes, etc., ou ainda pela análise da estética do a m ­biente e dos aspectos técnicos e estéticos dos media a van nível suficientemente elevado.

Recomenda-se, no plano conceptual ge­ral, que se aplique u m programa com­plexo de educação estética sob a forma de u m ensino das artes, de u m a «gramá­

tica» das artes, ou de u m a história geral da arte. M a s , a aplicação prática de todas estas variantes enfrentou obstáculos de­correntes do facto dos métodos de edu­cação visual e musical não serem ainda suficientemente elaborados, daí resul­tando quie apenas duas formas deste en­sino complexo tenham sido experimenta­das nos quatro primeiros anos de escola primária. Estas duas experiências — e as outras variantes baseadas na litera­tura e destinadas a ser aplicadas nos quatro últimos anos do primário e na escola secundária — caracterizam-se pela defesa da teoria do ensino da música de Zoltan Kodály, que deveria ser desenvol­vida, procurando apoiar- se mais na acti­vidade e na criatividade do aluno e retirar ao ensino destas matérias o que ele pode conter de desorganização.

C o m o os horários escolares são muito densos, é provável que a educação esté­tica Seja dispensada fora da escola, no futuro, como já o é actualmente; m a s talvez seja possível tirar melhor partido das ocasiões oferecidas.

iA educação somática tem por objectivo optimizar a educação do corpo e do es­pírito, desenvolver a aptidão da criança para descobrir o corpo, melhorar o seu estado de saúde geral, proporcionar-lhe a aquisição, graças aos desportos, de u m a condição física satisfatória sob todos os aspectos, modelar a sua personalidade e desenvolver a capacidade de trabalho. Importa ainda, como para as outras m a ­térias já evocadas, que esta actividade se inicie na escola infantil e prossiga até ao fim dos estudos secundários.

Notemos que muitos jovens, na H u n ­gria como e m outros países, temtendencia para desprezar completamente o plano físico e psicológico, sendo os resultados deste m a u hábito agravados pelo mal--estar geral e por u m a vida pouco sau­dável. Para evitar consequências eviden­temente desastrosas, é absolutamente necessário conceber a cultura física na escola n u m espírito moderno e científico.

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Assim, o problema da educação somática foi tratado n u m plano muito amplo pela equipa de trabalho expressamente cons­tituída para este efeito. O s seus membros julgaram dever introduzir neste módulo os seguintes elementos : conhecimento da natureza biossocial do h o m e m ; hábitos de movimento; expressão corporal de base; arte de modelar a vida para pro­teger a saúde e capacidade de prepara­ção física independente. Recomenda-se, no programa, que se desenvolva o aluno, no plano físico, até ao limite de tolerân­cia e que seja associado à prática dos desportos graças a u m a preparação re­gular.

Inicialmente, tinham sido feitas algu­m a s propostas tendo e m vista u m a ini­ciação à higiene mental e m ligação com a educação somática na escola. M a s não foi possível elaborar nenhum conceito que englobe a pessoa humana e a sua saúde n u m a unidade psicossomática.

Inspirando-se nos dados científicos e técnicos fornecidos pelo Instituto de In­vestigações da Escola de Educação Física da Hungria, a equipa, antes de elaborar u m a proposta, começou por lançar as bases teóricas gerais dos seus trabalhos e por analisar os resultados de testes fisiológicos. D e acordo com as bases teó­ricas assim realizadas, efectuaram-se al­gumas experiências n u m a perspectiva longínqua — e m pequena escala, de m o ­mento.

O objectivo da edwcação técmca con­siste e m inculcar conhecimentos actuali­zados sobre agricultura, biotécnica, tec­nologia agrícola, e noções de organização e de ecologia; pretende igualmente de­senvolver certos talentos manuais de base, elementos essenciais de u m a educa­ção moderna b e m compreendida. O pro­grama foi concebido para estabelecimen­tos de ensino geral.

O s conhecimentos técnicos fazem parte integrante da cultura geral e não podem ser considerados inferiores a nenhum outro ramo do saber. Possuem u m a rela­

ção estreita com as ciências exactas e naturais, pressupõem u m certo conheci­mento da sociedade e ajudam a integrar os diversos ramos da ciência. A tecnologia é mais do que o total dos conhecimentos de que tira partido e, ao contrário do que sucede com a análise científica centrada e m fenómenos, baseia-se essencialmente na síntese. O papel do ensino desta m a ­téria consiste e m ensinar aos alunos a realizarem, eles próprios, sínteses.

A secção do projecto da Academia con­sagrada à educação técnica tem por fim substituir o ensino politécnico, que não era muito eficaz. O s peritos do Instituto Central de Investigação Física da Aca­demia das Ciências forneceram u m au­xílio útil à subcomissão, e a nova ideia de ensinar a tecnologia na escola compete aos físicos, economistas e engenheiros investigadores, estando a aplicação pe­dagógica a cargo do respectivo depar­tamento.

Foi sobretudo graças ao estado de es­pírito de que resultava e à sua aptidão para transformar os hábitos de pensar do aluno que o plano foi b e m acolhido do ponto de vista teórico. Quanto à sua aplicabilidade na escola, o problema li­tigioso ficou a dever-se ao facto de, na ideia da subcomissão das ciências, o es­tudo desta matéria poder ser substituído, nas escóis secundáris, por trabalhos de laboratório de ciências naturais. N o en­tanto, prevaleceu a opinião da equipa de tecnologia, o que deu origem a que esta matéria fosse prevista a todos os níveis do ensino público.

A recomendação da Academia sobre o conteúdo dos estudos escolares foi com­pletada por outros documentos1. U m i

1. Existe u m a certa analogia, oeste aspecto, c o m o que foi realizado na Folómi'a, ond'e uima comissão efectuou inquéritos socioló­gicos a pedido do Parlamento; esta comis­são, dirigida por Sczepanski, m e m b r o da Acaidemia, ocupou-se igualmente do ensino público e goaa de grande audiência na socie­dade.

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Tendencias e casos

délies intitulado Exposição do desenvol­vimento da actividade educativa nas es­colas, resume o novo papel da educação socialista na escola, sublinhando a ne­cessidade de transformar os alunos e m cidadãos conscientes das suas responsa­bilidades, e m peritos altamente qualifi­cados na sua profissão e e m pessoas privadas imbuídas do espírito do socia­lismo e que pretendem completar os seus conhecimentos durante toda a vida.

A propósito do objectivo da reforma do ipapel do ensino público, esta exposição sublinha a importância de conhecimentos de base extensos e sólidos adquiridos graças a u m ensino uniforme, que ga* ranta, contudo, u m a diferenciação ade­quada. Entre as características do desen­volvimento a longo termo, salienta a tendência .indicativa de transformação nas partes atribuídas ao trabalho inte­lectual e ao trabalho físico e sublinha, simultaneamente, a necessidade de pre­parar o aluno para pensar por si próprio, desenvolvendo a sua aptidão para tra bälhar com as mãos. D e acordo com o documento, a escola típica do fim do século seria u m a instituição democrática aberta à sociedade, cooperando com as famílias no interesse dos alunos, assim como os organismos locais de ensino pú­blico e organizações sociais diversas, desempenhando u m a função geral de higiene do espírito.

O documento fala igualmente da m o ­dernização dos métodos de ensino, da reorganização do sistema escolar e, final­mente, da consideração de que a escola e os professores gozam na sociedade.

Baseando-se e m inquéritos compara­tivos, a comissão de alto nível elaborou igualmente u m a recomendação sobre as proporções a realizar a longo termo no que diz respeito aos beneficiários do en­sino público. D e acordo com esta reco­mendação, as proporções estabelecidas para os diferentes níveis deveriam ser consideradas constantes, mesmo se o sis­tema escolar for modificado.

O s inquéritos comparativos referiam--se a doze anos lectivos e não escapou aos seus autores que alguns domínios de ensino necessitavam cada vez de menos horas, à medida que os alunos passavam para classes de nível mais elevado no ensino de línguas, por exemplo, enquanto a tendência era inversa para as matérias de opção. Os domínios de ensino foram repartidos por três grupos, para os quais as proporções foram fixadas e m 35, 35 e 30 por cento. O primeiro engloba os estudos sociais e a educação estética, assim como u m a pequena fracção do en­sino das línguas (35 por cento) ; o se­gundo, o ensino científico, tecnológico e matemático (também 35 por cento) ; o terceiro (desportos, línguas e matérias de opção), ocupando o resto do tempo (30 por cento) 1. C o m o é evidente, estas pro­porções não constituem números a res­peitar e m absoluto; possuem apenas u m valor indicativo para os organizadores: C o m o mostraram as experiências, a in­teracção das diferentes matérias acen-tuar-se-á certamente quando os estudos e os métodos forem planificados e coor­denados de tal modo que, nas escolas que esperamos ter no fim do século, a divisão entre os domínios de ensino seja muito menos acentuada do que actual­mente.

O mandato da comissão de alto nível expirou ao fim dos três anos lectivos 1973-1976. A o elaborar u m projecto que parece realista sobre a educação a longo termo, destinado ao ministério, a acade­mia tinha cumprido a sua missão. N o entanto, tendo e m conta o papel primor­dial da educação na sociedade, a Aca­demia pretendia prosseguir a sua activi­dade neste domínio, tanto mais que serão necessários muitos anos para verificar, pela experiência, a razão de ser da teoria.

1. Os cursos de opção podem ser utilizados para ensinar matérias escolhidas pelos alunas nos três últimos anos de gymnasium (15 por cento do horário total).

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Tendencias e casos

O organismo que substituiu a comissão de alto nivel da Academia foi criado con­juntamente pela Academia das Ciências da Hungria e pelo Ministério da Edu­cação, e m Julho de 1976. Esta nova «comissão do ensino público» decidiu continuar a trabalhar no sentido das orientações teóricas da que a tinha pre­cedido, sendo as três antigas subcomis­sões substituídas por três comités de trabalho independentes. Estes comités, cada u m dos quais estava encarregado de u m dos sete domínios de ensino que já descrevemos, compreendiam, e m par­ticular, representantes do ministério; a sua actividade era completada pela de u m a «equipa central de trabalho sobre a educação» tendo por função estudar a vida escolar no seu conjunto do ponto de vista da educação prática. Todos os comités de trabalho têm por missão geral assegurar a actualização regular do modelo de ensino por métodos científicos e determinar os pontos e m que pode ser realizada u m a síntese entre os diferentes domínios de ensino.

D e acordo com os planos estabelecidos, todos os anos de trabalho adoptam como centro de interesse u m problema com­plexo de grande interesse. E m 1976-Í977 tratou-se, e m primeiro lugar, de exami­nar as correlações entre o conteúdo de estudos modernos e a transformação optimal a longo termo do sistema es­colar. A s comissões de trabalho ocupa-ram-se, por diversas vezes, deste pro­blema, dedicando-se aos aspectos teóricos que se prestavam a u m a generalização.

Os debates baseavam-se e m estudos cujos autores tinham recomendado que se ali­viasse o sistema escolar actual criando u m regime de ensino primário geral com dez níveis, ou que se mantivesse o sis­tema actual de oito níveis no primário e quatro níveis no secundário, ou, final­mente, que se adoptassem diversas va­riantes combinando estes dois sistemas. Os autores justificavam, evidentemente, com razões científicas, os modelos que recomendavam. Este problema foi tra­tado e m Janeiro de 1977 n u m a sessão de 3 dias, tendo dado origem a interpre­tações de ordem sociológica, económica e pedagógica.

Os dois anos seguintes do período de estudo basear-se-ão, u m na reciclagem dos professores e o outro na especiali­zação dos conhecimentos e no seu en­sino.

A comissão do ensino público e todos os comités de trabalho continuam a (pa­trocinar as experiências de que a Aca­demia tomou a iniciativa durante o pe­ríodo precedente. Estas experiências, que se estendem por longos espaços de tempo, facilitam a análise dos resultados obti­dos, apoiando a reforma do ensino pú­blico a médio prazo e permitindo que os criadores tirem ensinamentos das acti­vidades escolares assim empreendidas, o que terá, certamente, benéficas incidên­cias sobre o conteúdo dos planos a longo temo, assegurando que os estudos m o ­dernos associem o rigor de u m controle científico e a preocupação das realidades quotidianas da educação prática.

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Notas e comunicações

Revista de publicações

Viviane e Gilbert de L A N D S H E E R E . Comment définir les objectifs de l'édu­cation. (Como Definir os Objectivos da Educação). Paris, Presses <uni-vesltaires de France, e Liège, Editions Georges Thon«, 1975.

Neste livro, Viviane e Gilbert de Landsheere reûneim as grandes posições e propostas for­muladas a partir de 1955 no domínio da defi­nição dos objectivos da educação. O tema é importante, dado o papel capital atribuído aos «objectivos» n u m grande número das actuais abordagens da educação: ensino individualizado, pedagogia docente, curricula baseados ena ob-pedagogiia docente, curricula baseados era objec­tivos, coordenação do ensino e m equipa, ava­liação de referência criteria!, bancos de itens.

O s autores distinguem três níveis d'e defi­nição dos objectivos: objectivos e finalidades da educação; objectivos definidos de acordo com as grandes categorias comportamentais: as taxonomías; objectivos operacionais.

N o quadro proposto pelos autores, cada u m destes três níveis corresponde a u m a fase do processo de definições que, partindo das grandes considerações filosóficas que presidem à deter­minação dos objectivos da educação, passa pela elaboração do curriculum baseado e m objectivos gerais (derivados das taxonomías) fixados a diversos domínios de conteúdo para atingir & planificação do ensino na base de objectivos definidos e m termos de comportamentos para diversas unidades de u m domínio de conteúdo.

A secção respeitante aos «objectivos e fina­lidades» passa e m revista as concepções dos especialistas americanos do curriculum (R. Tyler, J. Goodlad) e os pontos de vista de certos europeus (A. Clausse, M . Reuchlin, e m especial) sobre os factores — sociais, políticos, culturais, fisiológicos ou psicológicos — que influem sobre a formulação dos objectivos, muito gerais, que deve atingir u m sistema de ensino. O s autores estudam, e m seguida, dois exemplos da evolu­ção dos objectivos da educação a partir de u m a analise de documentos históricos. O primeiro é u m estudo realizado por V . Isambert-Jamati sobre as relações entre as flutuações dos fins declarados dos liceus franceses e as modifica­ções do contexto social de 1860 a 1960. O se­gundo, que é u m a análise efectuada pelos pró­prios autores, refere-se aos objectivos oficiais do ensino primário belga de 1897 a 1973.

N a secção intitulada «Os objectivos definidos de acordo com as grandes categorias compor­tamentais: as taxonomías», os autores exami­

n a m os numerosos quadros taxonómicos que foram propostos para a definição dos objectivos do curriculum nos três domínios: cognitivo, afectivo e psicomotor. Procedem a u m a des­crição pormenorizada e a u m a avaliação crítica das taxonomías, actualmente b e m conhecidas, elaboradas por americanos (em particular, por Bloom, Krathwohl, Gagné e Merrill, Harrow) e fornecem alguns exemplos das propostas for­muladas por diversos investigadores europeus: por exemplo, o método de Horn destinado a fixar objectivos às categorias da taxonomía de Bloom, o quadro de D e Corte baseado no modelo do intelecto de Guilford, a reformulação, por de Landsheere, da taxonomía de Krathwohl.

A secção intitulada «Os objectivos operacio­nais» refere-se a u m certo número de questões abordadas nas obras pedagógicas sobre os ob­jectivos. Depois de ter descrito os métodos que preconizam Mager e outros investigadores para definir os objectivos do ensino e m função dos comportamentos observáveis que são produzidos e m condições precisas e correspondem a cri­térios preestabelecidos de aceitabilidade, os au­tores apresentam conceitos, provenientes de outras fontes, que podem ser utilizados para modificar ou alargar a estreita óptica behavio­rista das propostas de Mager. Inspiram-se essencialmente nos conceitos de Gagné e de Eisner para diferenciar os graus de precisão operacional que Interessa obter quando se defi­n e m diferentes tipos de objectivos: os objectivos docentes (atingir resultados de aprendizagem fundamentais), os objectivos de transferência (desenvolver capacidades que serão aplicadas e m diversos contextos) e os objectivos de ex­pressão (favorecer actividades criadoras nas mais diversas situações). Esta secção termina com o estabelecimento de u m paralelo entre as vantagens que podem ser retiradas da definição operacional dos objectivos e das críticas que foram formuladas, sobretudo no que diz respeito âs abordagens simplistas e atomizantes da ope-racionalização.

U m dos principais méritos deste livro reside na sua exaustividade: quase todas as grandes posições e propostas formuladas e m obras re­centes sobre os objectivos são Incorporadas n u m a secção. Além disso, trata-se de u m dos

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Notas e comunicações

raros estudos sobre este tema cujas fontes de informação são tanto europeias como america­nas. Tendo em conta a grande diversidade do material estudado, felicitamos os autores pela clareza da apresentação. Não podemos também deixar de lhes agradecer o facto de fornecerem, contrariamente ao que sucede com muitas pu­blicações em francês no domínio da educação, u m a vasta bibliografia incluindo mais de 120 referências.

N o entanto, devemos igualmente mencionar as limitações desta obra. Embora o quadro a três níveis proposto nas primeiras páginas seja utilizado como meio de organizar o material estudado, os autores não atribuíram uma grande importância às articulações entre estes níveis. Exceptuando algumas generalidades do tipo «as taxonomías parecem unir a filosofia e a tecno­logia da educação» (p. 195), as explicações são raras, assim como os exemplos que ilustram as operações a efectuar para transformar os objectivos, obrigando-0'S a passar de u m nível de generalidade/especificidade para outro.

Quando examinam os diferentes níveis de definição, os autores ultrapassam a compilação das propostas existentes e da avaliação dos seus pontos fortes e pontos fracos. As suas conclusões reflectem igualmente u m a tendência para o ecletismo pragmático: por exemplo, no que respeita às diversas taxonomías que es­tudaram, afirmam: «nenhuma parece perfeita

E m Abril de 1976, 230 pessoas de 29 países reu-niram-se na Universidade aberta de Milton Key­nes, na Inglaterra, para discutir os probelmas suscitados pela avaliação dos programas edu­cativos transmitidos pela televisão e pela radio­difusão. Esta reunião tinha sido organizada por iniciativa da Universidade aberta que se em­penhou, tanto no plano financeiro como no plano teórico, na via do telensino, embora já não constitua, muito longe disso, essa «uni­versidade das ondas» cuja ideia tinha suscitado tanto entusiasmo no Reino Unido no início dos anos sessenta. Entre os participantes, conta-vam-se 50 professores, técnicos de radiodifusão è investigadores da universidade aberta; as outras 180 pessoas repartiam-se da seguinte maneira: 73 por cento de responsáveis pelas políticas ou de investigadores e 18 por cento de realizadores, enquanto os utentes só repre­sentavam 9 por cento. Os debates e as comu­nicações apresentadas basearam-se, pois, es­sencialmente na investigação e avaliação no domínio da educação e se esta obra apresenta

mas pratiioajmente todas... ajudam a clarificar, a guiar a reflexão» (p. 260). Embora sejamos muitas vezes forçados, pelo menos na fase ac­tual, a adoptar uma abordagem pragamática e ecléctica dos problemas que se colocam no domínio da educação, interessa reconhecer que esta abordagem pode substituir a elaboração de modelos coerentes e bem definidos. Quando lemos, entre as recomendações finais dos auto­res, «todas as instâncias (encarregadas da defi­nição dos objectivos da educação) seriam sis­tematicamente iniciadas ena metodologia da definição dos objectivos» (p. 271) (palavras sublinhadas por m i m ) , perguntamo-nos, perante a 'multiplicidade dias propostas não articuladas estudadas na obra, se esta (metodologia já existe.

E m resumo, se o livro de Viviane e Gilbert de Landsheere não contribui praticamente com nada de original para a conceptualização do processo de definição dos objectivos, faz o ponto da Situação de maneira coerente e exaustiva. Nos países francófonos, será certamente muito utilizado com© texto de base no ensino univer­sitário da pedagogia e nos programas de for­mação dos professores. Além disso, poderá ser útil como obra de consulta para os investiga­dores e para os que trabalham na elaboração e na avaliação do curriculum.

Linda K . A L L A L Universidade de Genebra

u m interesse efectivo para os professores ou para aqueles que trabalham com professores ou investigadores, na realização de programas para os media, parece referir-se essencialmente à investigação sobre os media, considerada como profissão e modo de vida.

E m termos técnicos de comunicação, a sim­ples transcrição dos debates de conferência raramente fornece textos de fácil leitura. Falar perante u m grupo ou u m auditório é estabelecer u m contacto directo e interacções com pessoas; escrever e 1er dependem, pelo contrário, de u m domínio diferente e exigem uma linguagem de natureza diferente. O relatório interessante e perfeitamente «legível» dos debates da confe­rência que se realizou na Universidade aberta não apresenta este defeito. Muito judiciosa­mente, Tony Bates e o seu eminente comité de direcção procuraram que as principais comuni­cações fossem impressas e distribuídas previa­mente. A própria conferência dedicou-se essen­cialmente ao estudo directo dos temas tratados nestes textos. Os três primeiros dias foram

Tony Bates e John Robinson (dir. publ.) Evaluating educational television and radio (Avaliação da Televisão e da Rádio EducativasJ. Milton Keynes (Reino Unido), Open University Press, 1977, *10 pp-

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Notas e comunicações

reservados ao exame de u m grande problema: resultados das investigações, metodologia e re­lações entre os investigadores e os responsáveis pelas decisões. Depois de ter ouvido, sobre cada u m dos três problemas, uma exposição liminar de u m a hora para os animadores — Edward Palmer, Richard Hooper « Stem Sture Alle­beck —, a Conferência cindiu-se em três gru­pos de trabalho que se reuniram durante o resto do dia; no último dia, os relatores — Vi-venne Gliikman, Etail McAnany e Brian Groom-bridge — apresentaram u m resumo dos tra­balhos dos grupos. A conferência tinha sido aberta por Donald Grattan da B B C ; o encerra­mento foi proferido por Henri Dieuzeide da UNESCO.

Entre as 80 comunicações apresentadas, 75 figuram no volume sob a forma de «resumos longos» que ocupam 309 das 410 páginas que a obra comporta. Estes textos profundos e com­pletos formam o pano de fundo das outras 100 páginas constituidas pela reprodução integral das exposições liminares dos animadores e dos resumos apresentados pelos relatores à con­ferência. Neste quadro, o estilo falado destas intervenções tem a sua importância e razão de ser e confere ao volume o tom animado de uni colóquio. O relatório dos debates no seio dos grupos de trabalho não se encontra reproduzido

U m a das dificuldades que enfrentamos quando consideramos a educação como objecto de estudo, resulta do facto de muitos daqueles que a praticam terem tendência para examinar u m a situação particular pensando que ela re­presenta u m caso tipo de todos os problemas colocados por u m vasto conjunto. O que é par­ticularmente evidente quando a discussão se refere aos media e alguns participantes que contribuíram para a realização deste volume não escaparam a esta armadilha. E certamente por esta razão que os que fazem investigação em matéria de educação têm dificuldade e m integrar u m caso isolado no seu contexto e esta dificuldade é muitas vezes evocada na obra. O que é novo, por outro lado, é que se começa a ter consciência deste facto; a quantificação extrema de situações atípicas ou estatistica­mente desprezíveis tem causado imensos pre­juízos e explica que muitas vezes se tenham reclamado, no decorrer da conferência, ava­liações «esclarecedoras», «rápidas e rudimen­tares» ou outras abordagens que se aproximam de relatos anedóticos. Cada problema de edu­cação é específico e diferente dos outros; acon­tece o mesmo e m relação a cada professor e a cada aluno; por conseguinte, todas as difi­culdades a resolver e m educação se assemelham mais à biologia do que às ciências físicas e, a todos os níveis da prática, a educação aproxi-ma-se mais da vida social de todos os dias do que das técnicas de laboratório.

U m a das vantagens de ter criado, na Univer­sidade aberta, u m Instituto de Tecnologia da Educação cujos membros participam em todas as etapas da planificação dos programas de ensino, é certamente o facto dos teóricos serem obrigados a coabitar com os seus colegas pro­fessores e a ouvi-los quando exclamam que «na vida as coisas passam-se de modo diferente». O apelo a favor de relatos simples dos pro­blemas educativos e das suas soluções já foi ouvido e é interesante notar que u m dos mais ardentes defensores deste método é u m membro do pessoal da avaliação da Universidade aberta. Convém igualmente notar que Richard Hooper, que foi, até u m a data recente, o mais antigo animador de u m vasto inquérito sobre o ensino assistido por ordenador no Reino Unido, mani­festou alguma desconfiança em relação às ava­liações «iluminadas».

O volume contém exposições de realizadores e de analistas de programas educativos trans­mitidos pelos media, os quais trabalham em condições muito diferentes. Muitos problemas continuam, pois, por resolver. Algumas pessoas supõem, de modo bastante surpreendente, que todos os filmes ou programas educativos tele­visivos são realizados no mesmo estilo; outros, estbelecem generalizações a partir de filmes ou gravações video realizadas no interior de u m campus universitário ou de u m grupo fechado e falam da utilização do material pára emissões à distância de verdadeiro telensino — se bem que ã distinção tenha sido efectuada em 1972, por Mcintosh e Bates da Universidade aberta, alguns participantes ainda a mantêm implici­tamente afastada.

Como é evidente, os professores encarregados de formar realizadores de programas para os media eram pouco numerosos para lemíbrar aos investigadores que se preocupam, de facto, muito com. a eficácia do seu trabalho e que, em muitos casos, tudo se deve à imaginação. Quanto ao aluno, ele não teve, pensamos, oca­sião de fazer ouvir a sua voz.

O cientismo que, actualmente, caracteriza a maior parte das investigações e estudos sobre a educação e a comunicação polde facilmente desumanizar o assunto estudado. Ë correcto considerar que a investigação no domínio dos media se orienta em três direcções: a formação, a recapitulação e a elaboração de u m a política ; mas dizer que todos os administradores da edu­cação, todos os professores e todos os que rea­lizam material educativo são os que «tomam decisões», é generalizar demasiado e correr o risco de arrastar o debate para u m terreno to­talmente alheio às realidades.

Quem realiza, então, o trabalho, senão os que tomam decisões? Não procuro desculpar este argumento já antigo, mas, na sua exposição final, Henri Dieuzeide afirmou que eles «utili-

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Notas e comunicações

zarti a investigação como os bêbados se servem dos postes de iluminação, para se apoiarem». E Dieuzeide prossegue dizendo que todo o pro­cesso educativo é profundamente irracional, o que parece implicar que nós ainda não o com­preendemos.

O s livros deste género são caros, hoje era dia, m a s este volume deve certamente encontrar o seu lugar e m toda a biblioteca destinada aos estudos sobre a educação. Os resumos das 75 comunicações, as exposições liminares apresen­tadas por personalidades eminentes, u m a biblio­grafia internacional, assim como os nomes e os países de origem dos 180 participantes trans-formam-no n u m a obra de consulta muito útil. Ê u m a obra de leitura particularmente agra­dável e o panorama que contém dos programas realizados pelos medias e dö ensino à distância e m muitos países fornece, muitos apanhados, embora incompletos, e suscita novas ideias. Existem, porém, omissões surpreendentes: nada sobre o trabalho da N H K , no Japão, nem sobre

O livro de Gillette sobre a educação na Repú­blica Unida da Tanzânia, recentemente publi­cado, v e m enriquecer muito seriamente o nosso conhecimento sobre o que representa e educação extra-escolar no Terceiro M u n d o .

Parte de u m exame profundo dos programas de educação de adultos e de educação extra--escolar da República Unida da Tanzânia, ba­seado e m documentos provenientes dos serviços oficiais, de institutos como o Institute of Adult Education e de organizações internacionais, so­bre a investigação pedagógica efectuada na República Unida da Tanzânia e sobre as entre­vistas com profissionais tamzanian'os e estran­geiros.

Gillette analisa a evolução dos programas de educação escolar e extra-escolar, desde o pe­rlado pré-colonial até aos nossos dias. Estuda as transformações que se produziram desde a época e m que perdominavam o ensino africano tradicional e o ensino islâmico. Estabelece igual­mente u m paralelo entre a educação escolar e a educação extra-escolar, evocando as suas se­melhanças e diferenças. O ensino colonial ba-seava-se e m objectivos individualistas; e m 1967, a declaração de Aruxha, intitulada «A educação para a auto-suflciência» (Education for self-reliance) marcou u m a viragem: os objectivos da educação passariam a estar adaptados a u m modelo socialista de desenvolvimento endógeno. Outros factores contiUbuíram para revolucionar a educação na República Unida da Tanzânia,

as ligações radioeléctricas por satélite entre as ilhas do Sul do Pacífico.

Para todos os que se interessam pelo ótesen-volvdoiento da educação à distância, esta obra constituirá u m maravilhoso ponto de partida, pois todos desejarão que se estabeleçam dis­tinções mais subtis entre os diferentes tipos de estudantes, de matérias, de media e de difusão. Implicitamente, porém, este livro marca o início de u m a série histórica. Apereebeimc-nos actual­mente, de que, e m muitos locais, investigadores independentes, percorreram os mesmos cami­nhos e, como Wilbur S c h r a m m afirma na sua exposição liminar, «as suas actividades atin­giram agora o ponto e m que podem fundir-se para constituir verdadeiramente u m domínio de estudo».

Michael C L A R K E (Reino Unido) Director do Oentro Audiovisual

da Universidade de Londres

e m particular a reforma dos programas e dos métodos e a adopção de u m a língua nacional (o kiswahili) como veiculo do ensino primário.

Os programas de educação extra^escolar de­correm de maás de dez instituições, o que não simplifica a tarefa. O autor parece pensar que o seu agrupamento sob a égide de u m a institui­ção única dotada da necessária maleabilidade responderia melhor às necessldadies da Repú­blica Unida da Tanzânia e de outros países do Terceiro Mundo*

¡Na parte intitulada «Os recursos: acelerado­res e travões», o autor dá-nos u m a ideia dos esforços desenvolvidos pela República Unida da Tanzânia para transferir e modificar os programas de educação extra-escolar. Assinala muito particularmente a utilização de u m pe­queno material disponível de imediato. Embora «divergência e convergência» coexistam, a R e ­pública Unida da Tanzânia conseguiu submeter a primeira à segunda, graças, por exemplo, aos «centros comunitários» (centros polivalentes ao nível da aldeia).

A partir de 1973, os programas extra-escola­res atingiram u m quinto do orçamento da educa­ção. O financiamento da educação por intermé­dio dos centros comunitários poderia constituir u m factor de estabilização das despesas globais da colectividade. M a s , a produção económica efectiva das escolas nos centros comunitários parece ser ainda fraca e m relação às despesas de equipamento.

G I L L E T T E , Arthur, Lavery. Beyond the non-formal fashion towards educa­tion revolution in Tanzania. Amherst, Massachusetts, Centre for Interna­tional Education, Hüls South, University of Massachusetts, 1977, 321 pp.

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Notas e comunicações

N o que diz respeito à evolução da influência estrangeira sobre a educação na República Unida da Tanzânia e no Terceiro Mundo, a tendência é previsível: a ajuda concedida aos programas extra-escolares — e m particular à alfabetização — prosseguirá, m a s a «utilidade de u m a boa parte desta ajuda é constestável» ; a ajuda faz parte do que a colonização roubou aos países e m desenvolvimento e as condições de concessão são mais favoráveis a quem dá do que ao beneficiário.

Gilette faz oportunamente u m a advertência que m e parece essencial: «Esta influência es­trangeira negativa parece ter-se exercido si­multaneamente sobre o plano da alfabetização e sobre o do ensino técnico. M e s m o quando a política que preside aos programas está de acordo com os objectivos da educação para a auto-suficiencia, a influência estrangeira pode ser inoportuna, como no caso da formação de cooperantes» (p. 293).

O livro de Gillette contém alguns pontos fra­cos: não propõe modelo de avaliação dos pro­gramas extra-escolares (alfabetização) na R e ­pública Unida da Tanzânia, n e m estruturas que permitam reagrupar estes programas sob a égide de u m a instituição única. A interpretação fornecida pelo autor sobre «ensino africano tradicional» (em especial no que se refere à educação) não corresponde às normas socio­lógicas da África dos nossos dias.

Gillette escreveu u m a obra de base muito interessante sobre a educação escolar e extra--escolar na República Unida da Tanzânia, que poderá ser proveitosamente consultada por to­dos aqueles que trabalham neste domínio da educação.

Yosiah D - M - B W A T W A Departamento de pedagogia

da Universidade de Dar es Salaam, República Unida da Tanzânia

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PERSPECTIVAS Já publicada nas línguas francesa, inglesa, espanhola e árabe, Perspectivas estará a

partir de agora também ao alcance de todos os leitores de língua portuguesa. Ela irá constituir decerto u m importante elo de comunicação entre os países de expressão lusíada e a corrente universal votada aos problemas do desenvolvimento da educação.

Perspectivas, revista de publicação trimestral editada pela Unesco, pretende estlmu. a renovação da educação, proporcionando oportunidade para u m intercâmbio de experiências com vista a facultar u m mais perfeito esclarecimento face às diversas opções e a fomentar as ini­ciativas de cooperação internlacional,.

Os pediídos de assinatura devem ser endere­çados para

L I V R O S H O R I Z O N T E Rua das Chagas, 17, l..°-Dto. • Telef. 36 69 17

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P E R S P E C T I V A S — Revista Trimestral de Educação

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