Círculo de Viena - A Concepção Científica do Mundo (1929)

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  • 5/14/2018 C rculo de Viena - A Concep o Cient fica do Mundo (1929)

    A CONCEP

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    r

    6 flails J Ialin, Otto Neurath, Rudolf Carnaplada em colaboracao com aqueles a que diz respeito. Seu objctivo e oferecer urnpanorama da area de problemas em que trabalham aqueles que fazem parte ou sao pro-ximos do Circulo de Viena.Viena, agosto de 1929.Pela Sociedade Ernst Mach

    Hans HahnOtto Neurath Rudolf Carnap

    1 0 CiRCULO DE VIENA DA CONCEP

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    A Concepciio Cientifica do Mundo - 0 Circulo de Viena 7Cracas a cste espirito iluminista, Viena liderou a e du ca ciio p op ula r eientificamente

    orientada. Fundou-se e levou-se adiante entao, mediante 0 trabalho conjunto de VictorAdler e Friedrich JodI, a Associacao de Educacao Popular [l"olksbildungsverein 1 ;os cursos universitarios populares [volkstumlich Universitdtskursci e a "Casa do Povo"[Volksheim] foram instituidos pelo conhecido historiador Ludo Hartmann, cuja atitu-de antimetafisica e concepcao materialista da hist6ria se exprcssaram em toda a suaatividade. Provem igualmente deste espirito 0 movimento da "l.scola Livre" [FrcicSchulei, precursor da atual reforma de ensino.Nesta atmosfera liberal viveu Ernst Mach (nascido em 1838). que estivera em Vienacomoestudante e 'Privatdozent' (1861-64), e para hi voltou somcnt e em idade avan-cada. quando the foi criada uma catedra esnec+! de filosofia lias ciencias indutivas(1895). Mach esforcou-se especialmente por purificar a ciencia cmpirica, e em prirneiralinha a fisica, de ideias metafisicas. Lernbrem-se sua critica ao espaco absoluto, que 0

    tornou urn precursor de Einstein, sua luta contra a metafisica da coisa-ern-si e doconceito de substancia, bern como suas investigacoes sobre a construcao dos conceitoscientificos a partir de elementos ultimos, os dados dos sentidos. Sob alguns pontos 0desenvolvimento cientifico nao the deu razao, como, por exemplo, na sua oposicao aoatornismo e na sua expectativa de urn incremento da fisica met! iante a fisiologia dossentidos. Os pontos essenciais de sua concepcao foram, porcm, valorizados positiva-mente no desenvolvimento ulterior. A catedra de Mach foi ocupada posteriormente(1902-06) por Ludwig Boltzmann, que defendeu expressamentc idcias empiristas.A atuacao dos fisicos Mach e Boltzmann em uma catedra filosofica torna cornpreen-

    sivel 0 fato de reinar vivido interesse pelos problemas epistemologicos e logicos ligadosaos fundamentos da fisica. Tais problemas de fundamentos couduzirarn igualmente aesforcos pela renovacao da logica, No que tange a estes esforcos, 0 solo ja fora aplai-nado, em Viena, por alguem de posicao totalmente diversa: Franz Brentano (professorde filosofia na Faculdade de Teologia entre 1874-1880, mais tarde 'Dozent' na Facul-dade de Filosofia). Brentano, como sacerdote catolico , cornprccndia a escolastica eligou-se diretamente a logica escolastica e aos esforcos leibnizianos pela reforma dalogica, deixando de lado Kant e as filosofos idealistas sistematicos. Brentano e seusdiscipulos mostraram repetidamente sua compreensao por homens como Balzano(wissenschaftelehre, 1837) e outros, que buscavam uma nova c rigorosa fundarnen-tacao para a logica. Especialmente Alois Hofler (1853-1922) pos em primeiro planoeste aspecto da filosofia de Brentano diante de urn forum em que as partidarios daconcepeao cientifica de mundo eram fortemente representados, dcvido a influencia deMach e Boltzmann. Na So cie da de F ilo so fica da Universidade de Viena tiveram lugarsob a direcao de Hofler numerosas discussoes sobre questoes de lundamentos da fisicae sabre problemas episternologicos e logicos afins. A Sociedadc I;ilosofiea publicou as"Prefacios e Introducoes a Obras Classicas da Mecanica" ("Vorreden und Einleitungenzu klassischen Werken der Mechanik", 1899), bern como escritos individuais de Bal-zano (editados par Hofler e Hahn em 1914 e 1921). No circ ulo v icn en se de Brentanoviveu (1870-82)'0 jovem Alexius von Meinong (mais tarde professor em Graz), cujateoria dos objetos (1907) acusa pelo menos certo parentesco COIll as modernas teoriasdos conceit os, e cujo discipulo Ernst Mally (Graz) tambem trabalhou no dominio dalogistica. Do mesmo modo, os escritos juvenis de Hans Pichler (1909) provem destescirculos de ideias,

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    8 Hans Hahn, Otto Neurath, Rudolf CarnapAproximadamente no mesmo periodo de Mach, atuou em Viena seu contempora-

    nco e amigo Josef Popper-Lynkeus. Ao lado de suas realizacces tecnico-cientificas de-vern ser aqui mencionadas suas observacoes filos6ficas (1899), amplas, ainda que assis-ternaticas, bern como seu plano econ6mico racionalista (Aligemeine Nahrpflicht ; 1878).Popper-Lynkeus servia conscientemente ao espirito iluminista , como atesta seu livrosobre Voltaire. A recusa da metafisica era comum a ele e a muitos outros sociologosvienenses, como Rudolf Goldscheid. E digno de nota que em Viena, tambem no dorni-nio da Economia Politica , foi cultivado urn rigoroso metodo cientifico pela Escolada Utilidade Marginal (Carl Menger, 1871). Este metodo implantou-se na Inglaterra, naFranca e na Escandinavia, nao, porern , na Alemanha. Tarnbem a teoria marxista foicultivada e desenvolvida em Viena com especial enfase (Otto Bauer, Rudolf Hilferding,Max Adler e outros).

    Estas influencias provenientes de diferentes flancos tiveram por consequencia 0 fator=I de que em Viena, especialmente desde a virada do seculo, urn grande numero de pes-"?oas discutia frequente e calorosamente problemas em estreita ligacao com a ciencia

    ernpirica. Tratavam-se, sobretudo, problemas epistemologicos e metodologicos da fisi-ca, como 0 convencionalismo de Poincare, a concepcao de Duhem sobre 0 objetivo ea estrutura das teorias fisicas (seu tradutor foi 0 vienense Friedrich Adler, urn discipulode Mach, entao 'Privatdozent' de fisica em Zurique). Alern disso, tratavam-se questcesde fundament os da matematica, problemas de axiornatica, logistica e analogos. Dentreas correntes historicas da ciencia e da filosofia, uniram-se ali especialmente as seguin-tes. (Tais correntes serao caractcrizadas mediante aqueles dentre seus representantescujas obras foram mais lidas e discutidas.) ~1. Positivismo e Empirismo: Hume, Iluminismo , Comte, Mill, Richard Avenarius,Mach.2. Fundamentos, Objetivos e Metodos da Ciencia Empirica (hipoteses em fisica,geometria, etc): Helmholtz, Riemann, Mach, Poincare, Enriques, Duhern, Boltzmann,Einstein.3. Logistica e sua aplicacao a realidade. Leibniz, Peano , Frege , Schroder, Russell,Whitehead, Wittgenstein.

    4. Axiomdtica: Pasch, Peano , Vailati , Pieri, Hilbert.5. Eudemonismo e sociologia positivista: Epicure, Hume, Bentham, Mill, Comte, ~

    Feuerbach, Marx, Spencer, Muller-Lyer , Popper-Lynkeus , Carl Menger (pai).1.2 0 Ctrculo em torno de SchlickEm 1922, Moritz Schlick foi chamado de Kie1 a Viena. Sua atividade se ajustou bern aodesenvolvimento historico da atmosfera cientifica vienense. Ele proprio, originaria-mente fisico , despertou para uma nova vida a tradicao que havia sido iniciada porMach e Boltzmann e, em certo sentido , continuada por Adolf Stohr, urn pensador deorientacao antimetafisica. (Em Viena sucessivamente: Mach, Boltzmann, Stohr,Schlick; em Praga: Mach, Einsten , Ph. Frank).

    Em torno de Schlick re uniu-se com 0 passar dos anos um circulo que aliou os di-ferentes esforcos em direcao de uma concepcao cientifica do mundo. Produziu-semediante esta concentracao urn frutifero estirnulo reciproco. Os membros do circu-10 sao mencionados na bibliografia [nao reproduzida a qui ; 0 editor 1 na medida em que

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    A Concepcdo Cientifica do Mundo - 0 Circulo de Viena 9existem publicacoes suas. Nenhum dentre eles C 0 que se denomina urn filosofo "pu-ro" ; todos trabalharam em urn dominic cientifico particular, e na verdade pro vern dediferentes ramos da ciencia e originariamente de diferentes atitudes filos6ficas. Com 0correr dos anos, porem , aflorou uma crescente unidadc, efeito da atitude especifi-camente cientifica: "0 que pode ser dito, pode ser dito c1aramente" (Wittgenstein). Scill diferencas de opiniao , urn acordo e afinal possivel e, portanto, tambern requerido.Mostrou-se cada vez mais nitidamente que 0 objetivo comum a todos era nao apenasuma atitude livre de metafisica, mas antimetafisica.Ainda em relacao as atitudes frente as quest5es da vida percebeu-se uma nota velconcordancia, embora tais questoes nao estivessem em prirneiro plano entre os temasdiscutidos no Circulo. Estas atitudes mantern uma afinidade mais estreita com a con-cepcao cientifica do mundo do que a primeira vista, de urn ponto de vista puramente

    teorico, poderia parecer. Assim, por exemplo, os esforcos pela reorganizacao das rela-coes economicas e sociais, pela unificacao da humanidade, pela renovacao da escola eda educacao , mostram uma conexao interna com a concepcao cientifica do mundo.E manifesto que estes esforcos sao bem-vindos e encarados com simpatia pelos mem-bros do Circulo e tambem ativamente promovidos por alguns.o Circulo de Viena nao se satisfaz em realizar urn trabalho coletivo ao modo deurn grupo fechado., mas se esforca igualmente por entrar em contato com os movimen-tos vivos do presente, na medida em que estes sao simpaticos a concepcao cientificado mundo e renegam a metafisica e a teologia. A Sociedade Ernst Mach e hoje 0 lugarde onde 0 Circulo fala a urn publico mais amplo. Esta sociedade quer, como diz seuprograma, "incrementar e difundir a concepcao cientifica do mundo. Prornovera con-ferencias e publicacoes sobre 0 estado atual da concepcao cientifica do mundo, paraque se mostre a significacao da pesquisa exata para as ciencias sociais e naturais. Devemassim ser formados os instrument os intelectuais para 0 empirismo moderno, dos quaistambem se necessita para a configuracao davida publica e priv~" Mediante a es-colha de seu nome, quer a Sociedade caracterizar sua orientacao - mental: ciencialivre de metafisica. Com isso, porem, nao dec1ara urn acordo progr matico com as dou-trinas particulares de Mach. 0 Circulo de Viena acredita cumprir uma exigencia dopresente, colaborando com a Sociedade Ernst Mach: trata-se de elaborar instrumentosintelectuais para 0 quotidiano; para 0 quotidiano do erudito, mas tambem para 0 quo-tidiano de todos os que de algum modo colaboram na consciente configuracao da vida.A intensidade vital, visivel nos esforcos por uma transforrnacao racional da ordem so-cial e econornica , permeia tambem 0 rnovimento da ccncepcao cientifica do mundo.Corresponde a atual situacao em Viena que, ao ser fundada a Sociedade Ernst Mach,em novembro de 1928, fosse eleito como presidente Schlick, em torno de quem maisfortemente se concentrava 0 trabalho comum no dominio da concepcao cientificado mundo.Schlick e Philip Frank editam conjuntamente a colecao Escrito s pa ra a Conce pciioCieniifica do Mundo {Schriften zur wissenschaftlichen Weltauffassung], em que ateo momenta colaboraram preponderantemente membros do Circulo de Viena.

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    A Concepdio Cientifica do Mundo - 0 Circulo de Viena 11significativa no ambito da vida. 0 meio adequado a isso e , porern, a arte: a poesia 11-rica ou a musica, por exemplo. Se, em vez disso, se escolhe a roupagem verbal de umateoria, surge urn perigo: simula-se urn conteudo te6rico onde nao existe nenhum. Ca-so 0 metafisico ou 0 teologo queiram manter a roupagem Iingihstica habitual, devemter claro e reconhecer nitidamente que nao realizam descricao , mas expressao, que ~nao produzem teoria, isto e, comunicacao de conhecimento, mas poesia ou mito. Seurn mistico afirma ter vivencias que se situam sobre ou para alern de todos os concei-tos, nao se pode contesta-lo , mas ele nao pode falar sobre isso, pois falar significaapreender em conceitos, reduzir a fatos [Tatbestande] cientificamente articulaveis.A filosofia metaflsica e recusada pela concepcao cientifica do mundo. Como sedevem, porem. esclarecer os descaminhos da metafisica? Tal questao pode ser postaa partir de diferentes pontos-de-vista: sob os aspectos psicologico, socio16gico e logi-co. As investigacoes na direcao psicolcgica encontrarn-se ainda em estagio inicial. ~.Pontos de partida para uma explicacao mais radical se situam talvez na psicanalisefreudiana. A situacao e semelhante quanta as investigacoes sociol6gicas. Mencione-se ateoria da "superestrututura ideologica", Encontra-se aqui urn campo ainda aberto auma compensadora pesquisa futura.Mais desenvolvido esta 0 esclarecimento da origem logica dos descaminhos metafi-sicos, especialmente pelos trabalhos de Russell e Wittgenstein. Dois erros logicos fun-damentais encontram-se nas teorias metafisicas, e ja na posicao das questoes: urnvinculo demasiadamente estreito com a forma das l inguagens tradic iona is e a ausenciade clareza quanto a realizacao logica do pensamento. A lingua gem comum emprega,por exemplo, a mesma classe de palavras, 0 substantivo, tanto para coisas ("maya"),.corno para propriedades ("dureza"), relacoes ("amizade") e processos ("sono"), ~induzindo assim a uma concepcao objetual dos conceitos funcionais (hipostatizacao ,substancializacao). Podem-se mencionar numerosos exemplos semelhantes, onde a lin-guagem conduz a erros que foram igualmente fatidicos a filosofia.o segundo erro fundamental da metafisica consiste na concepcao de que 0 pensa-menta possa conduzir a conhecimentos a partir de si, sem a utilizacao de qualquermaterial ernpirico , ou que possa, ao menos, a partir de estados-de-coisa dados alcancarconteudos novos, mediante inferencia. A investigacao logica leva, porern, ao resultado ~de que todo pensamento, toda inferencia, nao consiste senao na passagem de proposi-coes a outras proposicoes que nada contem que naquelas ja nso estivesse (transforma-yao tautologica). Nao e possivel, portanto, desenvolver uma metafisica a partir do"pensamento puro".Deste modo, mediante a analise logica, supera-se nao apenas a metafisica no sentidoproprio e classico da palavra, especialmente a metafisica escolastica e a dos sistemasdo idealismo alemao , como tambem a metafisica oculta do apriorismo kantiano emoderno. A concepcao cientifica do mundo nao admite urn conhecimento incondi-cionalmente valido a partir da razao pura, "juizos sinteticos a priori", tais como osque estao a base da teoria do conhecimento kantiana e, mais ainda, de todaontologiae metafisica pre e p6s-kantianas. Os juizos da aritrnetica , da geornetria , certos princi-pios da fisica, que sao tornados por Kant como exemplos de conhecimento aprioristi-co, serao discutidos posteriormente. A tese fundamental do empirismo moderno con-siste exatamente na recusa da possibilidade de conhecimento sintetico a priori. A con-

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    12 Hans Hahn, Otto Neurath, Rudolf Camapcepcao cientifica do mundo admite apenas proposicoes ernpiricas sobre objetos detoda especie e proposicoes analiticas da 16gica e da matematica.Todos os partidarios da concepcao cientifica do mundo estao de acordo na recusa

    a metafisica , seja a dec1arada, seja a velada do apriorismo. 0 Circulo de Viena defende,porem, alern disso, a concepcao de que tambem os enunciados do realismo (critico)e do idealismo sobre a realidade ou nao-realidade do mundo exterior e do heteropsi-quico sao de carater metafisico.ja que estao sujeitos as mesmas objecoes a que estao osenunciados da metafisica antiga: sao destituidos de sentido porque nao verificaveis e ~sem conteudo fatico. Algo e "real" par estar enquadrado pela estrutura total dae xper ienc ia .A intuicdo , especialmente realcada como fonte de conhecimento pelos metafisicos,nao e recusada absolutamente pela concepcao cientifica do mundo. Exige-se, porem,e busca-se gradativamente uma justificacao racional ulterior de todo conhecimento

    intuitivo. 'Todos os meios sao perrnitidos ao pesquisador; 0 que for descoberto deve, ~porem , resistir a exame posterior. Recusa-se a concepcao que ve na intuicao uma espe-cie de conhecimento de valor mais elevado e de mais profunda penetracao, capaz deconduzir para alem dos conteudos sensiveis da experiencia, e livre das estreitascadeiasdo pensamento conceitual.Caracterizamos a cOl=f.iio cientifica do mundo essencialmente mediante duasdeterminaciies. Em pri~lugar, ela e empirista e positivista itsi apenas conhecimen-to empirico , baseado no i~tamente dado. Com isso de delimita 0 conteudo daciencia legitima. Em segu~gar, a concepcao cientifica do mundo se caracterizapela aplicacao de urn metoda determinado, 0 da analise logica. 0 esforco do trabalhocientifico tern por objetivo alcancar a ciencia unificada, mediante a aplicacao de talanalise 16gica ao material empirico. Do mesmo modo que 0 sentido de todo enunciadocientifico deve poder ser indicado por meio de uma reducao a urn enunciado sobre 0dado, assim tambem 0 sentido de cada conceito, pertencente a qualquer ramo daciencia, deve poder ser indica do por meio de uma reducao gradativa a outros conceitos,ate aos conceitos de grau minimo , que se relacionam ao pr6prio dado. Caso se em-preendesse tal analise para todos os conceitos, estes se enquadrariam em urn sistema de ~reducao, em urn "sistema de constituicao". As investigacoes visando a urn tal sistemade constituicao , a teoria da constituicda, configuram, assim, 0 quadro em que se aplicaa analise l6gica pela concepcao cientifica do mundo. A realizacao de tais investigacoesmostra muito cedo que a l6gica tradicional aristotelico-escolastica e totalmente insu-ficiente para este objetivo. Somente com a moderna 16gica simb6lica ("logi'stica")conseguiu-se obter a exigida precisao nas definicces conceituais enos enunciados,bern como formalizar 0 processo intuitivo de inferencia do pensamento comum, istoe, conduzi-lo a uma forma rigorosa e controlada automaticamente pelo mecanismosimb6lico. As investigacoes da teoria da constituicao mostram que os conceitos dasvivencias e qualidades autopsiquicas pertencem as camadas mais baixas do sistema deconstituicao. Sobre elas descansam os objetos fisicos. A partir destes constituem-se osobjetos heteropsiquicos e enfim os objetos das ciencias sociais. 0 enquadramento dosconceitos dos diferentes ramos cientificos no sistema de constituicao ja IShoje, em seusgrandes traces, reconhecivel, mas resta ainda muito a ser feito para que seja levado aefeito com maior exatidao. Com a demonstracao da possibilidade e a exibicao da

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    A Concepcdo Cientifica do Mundo - 0 Circulo de Viena 13forma do sistema completo dos conceitos, tornar-se-a simultaneamente reconhecivel areferencia de todos os enunciados ao dado e, com isso , a forma estrutural da dencia ~unificada.Nesta descricao cientifica , apenas a estrutura (forma de ordenacao) dos objetospode ser incluida, nao sua "essencia". 0 que une os homens na linguagem sao as for-mulas estruturais; nelas se apresenta 0 conteudo do conhecimento comum dos homens.I=)\s qualidades vivenciadas subjetivamente - a vermelhidao, 0 prazer , - sao, como tais,

    ~apenas vivencias, e nao conhecimentos. A optica fisica inclui apenas 0 que tambemurn cego pode, em principio , compreender.~3 DOM IN -lO S DE PROBLEMAS3.1 Fundamentos da AritmeticaNos trabalhos e discussoes do Circulo de Viena , trata-se urn grande mimero de diferen-tes problemas, oriundo de diferentes ramos cientificos. 0 empenho e 0 de conduziras diferentes direcoes de problemas iunificacao sistematica, para assim esclarecer asituacao dos problemas.Os problemas de fundamento da aritrnetica se tornaram de especial significacaohistorica para 0 desenvolvimento da concepcao cientifica do rnundo, pois forameles que deram 0 impulso para 0 desenvolvimento de uma logica nova. Apos 0 desen-volvimento extraordinariamente frutifero da matematica nos seculos XVIII e XIX,quando mais se atentou iriqueza dos novos resultados do que ao exame sutil dos fun-damentos conceituais, tornou-se enfim manifesta a inevitabilidade de tal exame, sobpena de que a matematica perdesse a sempre elogiada certeza de sua construcao.Este exame tornou-se ainda mais urgente quando surgiram certas contradicoes, os"paradoxos da teoria dos conjuntos". Teve-se logo de reconhecer que nao se tratavaapenas de dificuldades em urn dominio particular da matematica, mas de contradicoeslogicas gerais, "antinomias", que indicavam erros nos fundament os da logica tradicio-nal. A tarefa de eliminar estas contradicces deu urn impulso especialmente forte aodesenvolvimento ulterior da logica. Reunirarn-se assim os esforcos por urn esclareci-menta do conceito de numero e por uma reforma interna da logica. Desde Leibniz elambert, esteve sempre viva a ideia de dominar a realidade mediante uma elevadaprecisao dos conceitos e dos procedimentos de inferencia e de alcancar tal precisao pormeio de urn simbolismo irnitado ao matematico , Depois de Boole, Venn e outros,especialmente Frege (1884), Schroder (1890) e Peano (1895) trabalharam nesta tarefa.Com base nestes traba1hos previos, Whitehead e Russell (1910) puderam construir urnsistema consistente de logica em forma simbolica (''logi'stica''), que nao apenas evitavaas contradicoes da logica antiga, como tarnbem a superava de muito em riqueza eaplicabilidade pratica. Whitehead e Russell deduziram deste sistema logico os conceitosda aritmetica e da analise, para, deste modo, conferir imatematica urn fundamentoseguro na logica.Nesta tentativa de superacao da crise de fundamentos da aritmetica (e da teoria dosconjuntos), permanecerarn , todavia, subsistindo certas dificuldades que ate 0 presentenao encontraram solucao satisfatoria e definitiva. Atualmente tres orientacoes dife-

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    14 Hans Hahn, Otto Neurath, Rudolf Carnaprentes defrontam -se neste dominic. Alern do "logicismo " de Russell e Whitehead,encontra-se 0 "formalismo" de Hilbert, que concebe a aritmetica como urn jogo deformulas com regras determinadas, e 0 "intuicionismo" de Brower, segundo 0 qual osconhecimentos aritrneticos repousam em uma intuicao irredutivel de dualidade-uni-dade [Zwei-Einheit]. As discussoes entre estas tres orientacoes sao seguidas com 0maximo interesse pelo Circulo de Viena. Nao se pode ainda prever aonde a decisaofinalmente conduzira; em todo caso nela residirasimultanearnente uma decisao sobre aestrutura da logica. Dai' a importancia deste problema para a coricepcao cientificado mundo. Muitos sao da opiniao de que a distancia entre as tres orientacoes nao e taogrande quanta parece. Supoern que traces essenciais das tres orientacoes se aproxi-marao do desenvolvimento ulterior e que provavelmente, com a utilizacao das ideiasde grande alcance de Wittgenstein, se unirao na solucao final.A concepcao do carater tautologico da matematica , baseada nas investigacoes deRussell e Wittgenstein, e tambem defendida pelo Circulo de Viena. Observe-se que esta

    concepcao seopoe nao apenas ao apriorismo e ao intuicionismo, mas tambern aoempirismo mais antigo ( por exemplo, Mill) que pretendia, de certo modo, derivar amatematica e a logica de maneira indutivo-experimental.Em conexao com estes problemas da aritrnetica e da logica estao tambern as investi-gacoes sobre a natureza do metoda axiomdtico em geral (conceitos de cornpletude,independencia, monornorfia, nao-ambiguidade, etc.), bern como sobre a construcaode sistemas axiornaticos para dorninios matematicos determinados.

    3.2 Fundamentos da FisicaOriginariamente, 0 maior interesse do Circulo de Viena dirigia-se aos problemasmetodologicos das ciencias da realidade. Estimulados por ideias de Mach, Poincare,Duhem, discutiram-se os problemas de submissao da realidade mediante sistemascientificos e, especialmente, sistemas hipoteticos e axiorruiticos. Urn sistema axiornati-co pode ser encarado, em primeiro lugar, de modo totalmente desligado de qualqueraplicacao emplrica, como urn sistema de definicoes implicitas, Quer-se com issodizer que os conceitos que aparecem nos axiomas nao sao fixado s OU, de certo modo,definidos segundo 0 seu conteudo , mas apenas em suas relacoes reciprocas, por meiodos axiomas. Urn tal sistema axiomatico , contudo, sornente obtem significacao para arealidade mediante acrescimo de definicoes ulteriores, as "definicoes coordenativas"[Zuordnungsdejinitionen], mediante as quais se indicam os objetos da realidade quedevem ser considerados membros do sistema axiomatico , 0 desenvolvimento da cienciaernpirica , que pretende reproduzir a realidade com uma rede de conceitos e juizos 0mais uniforrne e simples possivel, pode ocorrer de dois modes, como se mostra histori-camente. As alteracoes necessarias devido a novas experiencias podem ser efetuadas ounos axiomas ou nas definicoes coordenativas. Com isso, se toea 0problema das conven-yoes, tratado especialmente por Poincare.o problema metodologico da aplicacao dos sistemas axiornaticos a realidade inte-ressa em principio a todos os ramos da ciencia. E, porern, cornpreensivel que ate 0 mo-mento as investigacoes tenham sido frutiferas quase exc1usivamente para a fisica, ja queno atual estaglo do desenvolvimento historico da ciencia, a fisica esta, de rnuito , afrente das outras ciencias no que tange a precisao e a finura da construcao conceitual.

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    A Coneepo Cientifica do Mundo - 0 Ctrculo de Viena 1 5A analise epistemol6gica dos conceitos principais da ciencia natural tern livrado

    sempre mais estes conceitos de misturas metafisicas que aderiram a eles desde temposprimitivos. Especialmente os conceitos de espaco, tempo, substdncia, eausalidade,probabilidade, foram purificados por Helmholtz, Mach, Einstein e outros. As doutrinasdo espaco absoluto e do tempo absoluto foram superadas pela teoria da relatividade.Espaco e tempo nao mais sao recipientes absolutes, mas apenas estruturas ordenadorasde processos elementares. A substancia material foi dissolvida pela teoria atornica epela teoria do campo. A causalidade foi despida de seu carater antropornorfico de uma"atuacao " [Einwirkung] ou "conexao necessaria" e reduzida a relacao de condiciona-lidade e coordenacao funcionaI. AMm disso, substituiram-se leis da natureza, tidascomo rigorosas, por leis estatisticas, e, com base na teoria quantica, ate mesmo aumen-tam as duvidas quanto a aplicabilidade do conceito de uma regularidade estrita aosfenornenos nas menores regioes espaco-ternporais. 0 conceito de probabilidade ereduzido ao conceito empiricamente apreensivel de freqiiencia relativa.Mediante a aplicacao do me toda axiomd tic o aos problemas mencionados, em todosos ambitos separam-se os componentes ernpiricos da ciencia dos meramente convencio-nais; 0 conteudo dos enunciados, das definicoes. Nao mais resta lugar para os juizossinteticos a priori. A possibilidade de conhecimento nao mais se baseia em que a razaohumana imprima sua forma ao material, mas em que 0 material seja ordenado de urndeterminado modo. Nada se pode saber de ante mao sobre a especie e 0 grau destaordem. 0 mundo poderia ser muito mais ou muito menos ordenado do que e, sem quese perdesse a cognoscibilidade. Apenas a pesquisa da ciencia ernpirica, penetrandogradativamente, pode-nos ensinar em que rnedida 0 mundo e regular. 0 metodo dainduoio , a inferencia do ontem para 0 amanha, do aqui para 0 la , e certamente validoapenas se subsiste uma regularidade. Este metodo nao repousa, contudo, sobre umapressuposicao aprioristica desta regularidade, e pode ser empregado, suficiente ouinsuficientemente fundamentado, onde quer que conduza a resultados frutiferos,Jamais garante certeza, mas a reflexao epistemol6gica exige que se conceda significa-

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    16 HansHahn, Otto Neurath, Rudolf Camappor Riemann (1868), Helmholtz (1868) e Poincare (1904). Poincare acentuou, sobre-tudo, a conexao da geometria fisica com todos os demais ramos da fisica: a questaoda natureza do espaco real so pode ser respondida no contexto de um sistema total deflsica. Einstein encontrou entao um tal sistema, mediante 0 qual se respondeu a estaquestao no sentido de um determinado sistema nao-euclidiano.Por meio deste desenvolvimento, a geometria Ilsica foi separada cada vez maisnitidamente da geometria matemdtica pura. Esta, por sua vez, foi gradativamente maise mais formalizada, mediante 0 desenvolvimento ulterior da analise logica, Em primei- ~ro lugar, foi aritmetizada, isto e , interpretada como teoria de urn determinado sistemanumerico. Foi, entao, axiomatizada, ou seja, apresentada por meio de urn sistemaaxiornatico que concebe os elementos geornetricos (pontos, etc.) como objetos inde-finidos e fixa apenas suas relacoes reciprocas. Finalmente, a geometria foi logicizada,isto e, apresentada como uma teoria de estruturas relacionais determinadas. A geome-tria tornou-se assim 0 mais importante dorninio de aplicacao do metoda axiomaticoe da teoria geral das relacoes, provocando, deste modo, 0 mais forte impulso para 0desenvolvimento destes dois metodos que entao se tornaram tao significativos para 0desenvolvimento da propria logica e, assim, por sua vez, para a concepcao cientificado mundo em geral.

    As relacces entre geometria matematica e geometria fisica conduziram naturalmen-te ao problema da aplicacao de sistemas axiornaticos a realidade, que, como foi men'cionado, tambem desempenha importante papel nas investigacoes mais gerais sobre osfundamentos da fisica.3.4 Problemas de Fundamentos da Biologia e da PsicologiaOs metafisicos sempre distinguiram com predilecao a biologia como urn dorninio es-pecial. Isto se expressou na doutrina de uma forca vital especial, no vitalismo, Osmodernos defensores desta doutrina esforcam-se em conduzi-la da forma obscura evaga do passado a uma versao clara, do ponto de vista conceitual. No lugar da forcavital, aparecem as "dominantes" (Reinke, 1899) ou "entelequias" (Driesch, 1905).Tais conceitos sao rejeitados como metafisicos pela concepcao cientifica do mundo,uma vez que nao satisfazem a exigencia de redutibilidade ao dado. 0mesmo vale parao chamado "psicovitalismo", que ensina uma intervencao da alma, urn "papel condu-tor do espiritual no material". Caso, porem, se desligue do vitalismo rnetafisico 0 nu-cleo empirico palpavel, resta a tese de que os processos da natureza organica decorremsegundo leis que nao podem ser reduzidas a leis fisicas. Uma analise mais exata mostraque esta tese equivale a afirmacao de que certos dorninios da realidade nao estariamsubmetidos a uma regularidade uniforme e radical.

    E comnreensivel que a concepcao cientifica do mundo possa mostrar confirmacoesmais rutidas de suas visoes fundamentais em dominios que ja atingiram precisao con-ceitual do que em outros dominies: no dominic da fisica mais do que no dorninio dapsicologia. As formas linguisticas em que ainda hoje falamos no dominic do psiquicoforrnaram-se em tempos passados, baseadas em certas representacoes metafisicas daalma. A formacao de conceitos no dominio da psicologia e dificultada, sobretudo,por tais deficiencias da linguagem: carga metafisica e incongruencia l6gica. A isto acres-cern ainda certas dificuldades faticas, A consequencia e que ate 0 momenta a maioria

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    A Concepcdo Cientifica do Mundo - 0 Circulo de Viena 17dos conceitos empregados na psicologia sao definidos deficientemente. Quanto a al-guns nao e nem mesmo certo se sao dotados de sentido ou se sao tomados como taisapenas pelo uso Iinguistico , Assim, para a analise epistemologica, quase tude ainda estapot ser feito neste dominio. Certamente a analise e aqui tambem mais dificil do queno dominic do fisico. A tentativa da psicologia behaviorista de abranger todo 0 psi-quico no comportamento de corpos e, portanto, em urn nivel acessivel a percepcao,esta proxima, em sua atitude fundamental, a concepcao cientifica do mundo.3.5 Fundamentos das C i encia s Soc ia isTodo ramo da ciencia, em especial da fisica e da matematica, e levado, em urn estagioanterior ou posterior de seu desenvolvimento, a necessidade de urn exame de seusfundamentos, a uma analise logica de seus conceitos. Tal e , portanto, 0 caso, tambernnos dominies cientificos sociol6gicos, emprimeira linha historia e economia politica.Ja lui cerca de urn seculo esta em curso nestes dominies urn processo de separacao demisturas metafisicas, Ainda nao se alcancou aqui 0 mesmo grau de purificacao alcan-cado na fisica. Por outro lado, talvez neste caso a tarefa de purificacao seja tambemmenos urgente. Segundo parece, em tal ambito 0 peso metafisico roo f01 particular-mente forte, mesmo no auge da metafisica e da teologia. Talvez isto se deva a que osconceitos desse dominic, como guerra e paz, importacao e exportacao, estejam maisproximos a experiencia imediata do que conceitos tais como atorno e eter. Nao e de-masiado dificil abandonar conceitos como "espirito do povo" e, em vez deles, tomarpor objeto grupos de individ uos de determinada especie. Quesnay, Adam Smith,Ricardo, Comte, Marx, Menger, Walras, Muller-Leyer , para citar pesquisadores das maisdiferentes orientacoes, atuaram no sentido de uma atitude empirista e antimetafisica.o objeto da hist6ria e da economia politica sao homens, coisas e sua disposicao,4 RETRO SPEC fW A E P ER S PE C fW AA moderna concepcao cientifica do mundo desenvolveu-se a partir dos trabalhosacerca dos problemas citados. Vimos como, na flsica, 0 esforco para obter resultadospalpaveis, inicialmente mesmo com urn instrumental cientifico insuficiente ou aindainsuficientemente esclarecido, viu-se forcado sempre mais a empreender tambem investi-gacoes metodologicas, Assim se processou 0 desenvolvimento do metodo de constru-yao de hipoteses e, posteriormente, 0 desenvolvimento do metodo axiornatico e daanalise Iogica. A construcao de conceitos alcancou, deste modo, clareza e rigor sempremaiores. 0 desenvolvimento da pesquisa de fundamentos nos dominies da geometriafisica, da geometria matematica e da aritmetica conduziu tambem, como vimos, aosmesmos problemas metodologicos. Foi principalmente destas fontes que se originaramos problemas com que os representantes da concepcao cientifica do mundo hoje seocupam preferencialmente. E cornpreensivel que no Circulo de Viena ainda perma-neca nitidamente reconhecivel a origem de seus membros a partir de diferentes dorni-nios de problemas. Devido a isso resultam tambem frequenternente diferen cas deorientacao de interesses e de pontos-de-vista, que levam a concepcoes diversas. E,porern, caracteristico que as divergencias diminuem mediante 0 esfor co pela formula-

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    18 Hans Hahn, Otto Neurath, Rudolf Carnapdiferenciacao nitida entre 0 conteudo teorico de uma tese e as meras representacoesacompanhantes [Begleitvorstellungen]. Gradativamente cresce 0 fundo de concepcoescomuns que constituem 0 nucleo da concepeao cientifica do mundo, a que se ligam,com divergencia subjetiva mais acentuada, as camadas exteriores.Retrospectivarnente torna-se-nos nitida a essencia da nova concepcdo c ientific ado mundo por oposicao a filosofia tradicional. Nao se estabelecem "proposi~oes fi-los6ficas" proprias, mas apenas se esc1arecem proposicces, e precisamente as proposi-yoes da ciencia empirica, como 0 vimos nos diferentes dominies de problemas ante-riorrnente discutidos. Alguns representantes da concepcao cientifica do mundo naomais querern aplicar a palavra 'filosofia' ao seu trabalho, a fim de acentuar ainda maisa oposicao a filosofia sistematica. Como quer que tais investigacces venham a ser desig-nadas, algo e certo: nao lu i jllosofia como ciencia fundamental ou universal, ao ladoou sobre os diferentes dominies da ciencia empirica. Nao lui carninho para conheci-mento de conteudo ao lado do da experiencia; nao lui urn reino das ideias, que estariasobre ou alem da experiencia. Todavia, 0 trabalho das investigacoes "filos6ficas" ou"de fundamentos". no sentido da concepcao cientifica do mundo, permanece impor-tante, pois 0 escIarecimento logico dos conceitos, proposicoes e metodos cientificos li-bera de preconceitos inibidores. A analise logica e epistemologica nao quer impor lirni-tacoes a pesquisa cientffica; pelo contrario, poe-lhe a disposicao urn dominio, 0 maiscompleto possivel, de possibilidades formais, do qual deve escolher a adequada a res-pectiva experiencia (por exemplo, as geometrias nao-euclidianas e a teoria da relativi-dade).Os representantes da concepcao cientifica do mundo postam-se decididamente nosolo da simples experiencia humana. Lancam-se confiantemente ao trabalho de remo-

    ver do caminho 0 entulho metaffsicoeteologico dos seculos; ou como pensamalguns,apos urn intervalo metaffsico , voltam a uma imagem unitaria e imanente (diesseitig)do mundo , como, em certo sentido, a que ja estava a base da crenca magica , livre deteologia, dos principios.o incremento da inclinacao metafisica e teologizante que hoje se verifica em mui-tas associacoes e seitas, em livrcs e periodicos, em conferencias e cursos universitarios,parece apoiar-se nas violentas lutas sociais e con6rnicas do presente. Urn dos grupos decornbatentes, mantendo-se preso ao passado no dornfnio social, cultiva tambem asatitudes tradicionais, frequenternente lui muito superadas, da metafisica e da teologia,enquanto outro grupo, voltado para a modernidade, especialmente na Europa central,recusa tais atitudes e se poe sobre 0 solo da ciencia empirica. Este desenvolvirnento seassocia ao do moderno processo de producao, que se configura de urn modo cada vezmais mecanizado e tecnico , deixando sempre menos espaco a representacoes metafisi-cas. Tal desenvolvimento se associa tambem a decepcao das grandes massas pela pos-tura daqueles que preconizam as doutrinas metafisicas e teologicas tradicionais. Resul-ta, assim, que, em muitos paises, as massas recusam estas doutrinas, agora muito maisconscientemente do que no passado, e se inc1inam por uma concepcao mundana e em-pirista, em conexao com sua atitude socialista. Em outros tempos, 0materialismo foia expressao desta concepcao. Entrementes, porern, 0 empirismo moderno se desenvol-veu a partir de muitas formas insuficientes e alcancou uma configuracao s6lida na con-cepciio cientifica do mundo.

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    A Concepcdo Cientifica do Mundo - 0 Circulo de Viena I 9Assim, a concepcao cientifica do mundo esta proxima a vida contemporanea, Na

    verdade, duras lutas e hostilidades certamente a ameacarn. Nao obstante, ha muitosque nao desanimam, mas, face a presente situacao sociologica, aguardam com esperan-< ; a 0 desenvolvimento futuro. Certamente nem todo partidario da concepcao cientifi-ca do mundo sera urn combatente. Aqueles que se comprazem na sol idao, levarao umaexistencia retirada, sobre as montanhas geladas da logica; alguns, talvez, ate mesmodesprezem a mistura com as massas e lament em a "trivializacao " inevitavel com adivulgacao. Mas suas realizacces tambern se inserem no desenvolvimento historico. Pre-senciamos a penetracao , em crescente medida, do espirito da concepcao cientifica domundo nas formas da vida privada e publica, do ensino, da educacao , da arquitetura, ea sua contribuicao na configuracao da vida econornica e social, segundo principios ra-cionais. A concepcdo cienttfica do mundo serve a vida, e a vida a acolhe.

    AP~NDICE1. Membros do Circulo de VienaGustav BergmannRudolf CarnapHerbert FeiglPhilipp FrankKurt G6delHans HahnViktor KraftKarl MengerMarcel NatkinOtto NeurathOlga Hahn-NeurathTheodor RadakovicMoritz SchlickFriedrich Waismann

    2. Simpatizantes do Ctrculo de VienaWalter DubislavJosef FrankKurt GrellingHasso HartenE . Ka llaHeinnrich LoewyF. P. RamseyHans ReichenbachKurt ReidemeisterEdgar Zilsel

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    20 Hans Hahn, Otto Neurath, RudolfCarnap3. Representantes Principais da Concepdio Cientifica do MundoAlbert EinsteinBertrand RussellLudwig Wittgenstein

    Tradufiia de:Fernando Pia de Almeida Fleck