ANTONIO JOAQUIM DE MORAES CALDAS · 2012-03-27 · Escola MedicD-Girurgica do Porto DIRECTOR...

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Estudo sobre a Àciinomycese Inumana

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ESTUDO SOBRE A

ÂCTINOTOSE HUMANA TUSSE-RTÁÇAO INÁUGU-RAL

APRESENTADA Á

Escola Medico-Cirurgica do Porto

• POR

J O Ã O B L A I S E D ' O M V E I R A E C A S T R O

PORTO Typographia Coelho (a vapor)

Rua de Santo Ildefonso, lõ

1904

À> B\S £Hó

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Escola MedicD-Girurgica do Porto

DIRECTOR

ANTONIO JOAQUIM DE MORAES CALDAS LENTE SECRETARIO

CLEMENTE DOS S A N T O S P I N T O

CORPO DOCENTE Lentes cathedratlcos

Os Hl.mos e Ex.mo» Snrs.

l.ft Cadeira—Anatomia dcscripti-va o gerai Luiz de Frei tas Viegas.

2.» Cadeira—Physiologia . . . . Antonio Placido da Costa. 3.a Cadeira—Historia na tu ra l dos

medicamentos e mater ia me­dica Illydio Ayres Pereira do Valle.

1.» Cadeira—Pathologia externa e therapeut ica externa . . . Antonio J. de Mornes Caldas.

5.» Cadeira—Medicina operatória Clemente J. dos Santos Pinto. 6.» Cadeira—Partos, doenças das

mulheres de parto e dos re-ecmnascidos Cândido Augusto C. de Pinho.

7.» Cadeira—Pathologia in terna e therapeut ica in terna . . . . José Dias d'Almeida Junior .

8.» Cadeira—Clinica medica . . Antonio d'Azevedo Maia. 9." Cadeira—Clinica cirúrgica. . Roberto B. do Rosário Frias.

10.a Cadeira—Anatomia patholo-gica Augusto H. Almeida Brandão.

11.» Cadeira—Medicina legal . . Maximiano A. O. Lemos. 12.» Cadeira—Pathologia geral ,se-

meiologia e historia medica . Alberto Pereira P. d'Aguiar. 13.» Cadeira—Hygiene . . , . . J . L. da S. Martins Junior 11.» Cadeira—Histologia normal . José Alfredo M. Magalhães. 15.» Cadeira—Anatomia topogra-

phica Carlos Alberto de Lima. Lentes jubiladas

Secção medica José d'Andrade Gramaxo. Secção cirúrgica i P e d r 0 Augusto Dias.

1 Dr. Agostinho A. do Souto. Lentes substitutos

Secção medica i V a S a -I Vaga.

Secção cirúrgica 1 Antonio J - de Souza Junior . I Vaga.

Lente demonstrador Secção cirúrgica Vaga.

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I

A Escola não respondo pelas doutrinas expendidas na dis^ sertação e enunciadas nas proposições:

(Regulamento da Escola de 23 d'abril do 1840, art. 155.")

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A Jîeiïïom de men Pae

.

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&î njjaha dedicadíssima

e eslrenjosa 3ííae

Gratidão e admiração.

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A MINÇAS GENEROSAS TIAS

i

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jrfos meus parentes

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Aos meus condiscípulos e Amigos

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Á memoria do saudoso professor

o^fc móé Caiíoá cZc/ieó

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Ao E x . " Snr. Professor

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AO MEU ILLUSTRE PRESIDENTE DE THESE

O Ex.™° Snr. Professor

oflníonio a oTlzeveao zJiía aia

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íS^É^-sz^^^s

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PRObOGO

Tão rara ê, relativamente, a actinomycose humana que os novos casos que se deparam aos observadores saga­zes, fortalecidos com o exame bacteriológico, são pres­surosamente communicados ás sociedades scientificas e cuidadosamente archivados, quer para registo de prio­ridades d'um descobridor, para quem o caso foi uma surpreza, quer para avolumar uma estatística já ini­ciada, e da qual cada nação pretende ter a gloria do maior mundo.

Paizes reputados actinomycosiccvmente indemnes, têm sido successivainente conquistados pela bacteriolo­gia. Tão paralfela tem sido a fundação de laboratórios e o apparecimento do mal que actualmente se vae esta­belecendo a condicção de que a actinomycose é cosmopo­lita, não respeitando latitudes nem altitudes.

Apezar de só ter sido descripta na França em 1888, dez annos depois apparecia n'esta grande nação, um Tratado clinico d'esta doença, devido a Poucet e

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Bérard, o primeiro dos quaes ainda hoje está na bre­cha do movimento de investigação scientifica acerca das diferentes questões que se prendem com o assumpto.

Portugal não foi das ultimas nações a apontar ao mundo que também era a sede da actinomycose. Com efeito, data de 1894 o primeiro caso publicado, relativo a uma communicação do snr. dr. Nuno Por­to d Sociedade das Sciencias Medicas de Lisboa, caso bacteriologicamente informado pelo saudoso dr. Ga­mara Pestana, e a propósito do qual o snr. dr. Gre­gório Fernandes participou ter já observado um- caso também confirmado pelo mesmo professsor. Ultima­mente, dois outros casos foram objectos d'essa commu­nicação do eminente professor Souza Martins.

Depois, que me consta, mais nenhum caso foi re­gistado em Portugal, apezar de tudo levar a suppor que a doença não será tão rara como se suppõe, bas­tando reparar na frequência da actinomycose nas re-

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zes que dão entrada nos matadouros (pelo de Lisboa passaram em 1889 trinta rezes com actinomycose ma-xillar e, numero que seria mais avultado se os mar­chantes não tivessem o cuidado de deixar de apresen­tar os animaes que têm já ulceradas as lesões).

Sabendo-se que a doença é transmissível ao homem pelos vegetem e pelos animaes, estando averiguado que o numero de casos de actinomycose humana está na razão directa do numero de laboratórios installados, esperava eu que durante o meu 5.° anno do curso me­dico, algum dos milhares de doentes que annualmente transitam pelo Hospital Geral de Santo Antonio trouxesse a doença que a clinica diagnosticasse de acti­nomycose e que o Laboratório Nobre, onde affiuem centenas de analyses, poãesse confirmar a existência do parasita causador do mal.

Não suecedeu, porém, assim. Um único doente suspeito, esse mesmo não pôde

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ser inchado ríaquella rublica depois de ter sido o caso muito discutido na Sociedade de Medicina e Cirúrgica do Porto

D'esté modo fiquei privado de basear a minha di-sertação inaugural n'um caso clinico, facto que mais desvalorisa o'meu trabalho que não tem otdra preten­são que não seja o de cumprir, tão modesta e desata-viadamente quanto o comporta a escassez dos meus re­cursos scientificos, a obrigação que a lei tão duramen­te inflige no fim do curso medico.

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fl Minomyeose hamana iHTHODUGÇftO

A actinomycose é uma doença parasitaria commum ao homem e a varias espécies ani-maes e que é caracterizada pelo desenvolvi­mento, na economia, d'um cogumelo especial : o actinomyceo.

A principio confundia-se as suas lesões com as que eram produzidas por affecções suppura­tiva s ou neoplasicas (tuberculose, sarcoma ou osteosarcoma).

Mais tarde destinguia-se esta doença d'ou-tras, contentando-se em classifical-a com uma affecção até ahi desconhecida.

Em 1845, Langenbeck observa um phleg-mão prevertebral chronico parecendo de origem actinomycosica, mas que não foi reconhecido como tal senão em 1878 por Israel.

Em 1850, Davaine descreve um tumor dos ossos maxillares de boi contendo "pequenas massas d'uma materia amarella que não tem os caracteres microscópicos do tubérculo nem os do pus„.

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Trez annos mais tarde Robin e Laboulbene publicam 3 observações, no homem, d'uma af-fecção que, segundo a descripçâo e a figura junta ao texto, parece ligar-se á actinomycose.

Em 1857, Lebert descrevia no seu Tratado de anatomia pathologica conjunctos radiados que formavam grãos amarellos encontrados por elle, no pus d'um doente, desde o anno de 1848, mas não indicava qual fosse a significação d'es­ses pequenos corpos.

Em 1868 e Î875, Rivolta e Perroncito co­meçaram a suspeitar da natureza parasitaria da doença.

Passados dois annos, Bollinger, a quem se attribue a descoberta da actinomycose, de­monstra em certos tumores de apparencia sar-comatosa, tendo a sua sede no angulo da ma­xilla do boi, a existência de elementos particu­lares que submette ao exame do botânico Harz que os considera como cogumelos e dá-lhes o nome de actinomyces bovis.

Em 1878, Israël publica 2 casos de pyemia chronica no • homem, produzida por um cogu­melo formando grãos amarellados no pus, e approximava estes casos d'uma observação iné­dita de Langenbeck (1845).

No seguinte armo Ponfick, comparava o cogumelo observado por Bollinger e Harz no boi ao que Israel tinha encontrado no homem e identificava as duas lesões.

Em quanto que a actinomycose era frequen­temente observada e bem estudada n'outros paizes, na França e Portugal era praticamente desconhecida por ser excepcional. Só em 1884

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é que Nocard encontra um primeiro caso de actinomycose no boi o em 1888 publicou uma observação no homem em collaboração com Lucet.

No anno de 1885, Thomassen (d'Utrecht) indicava os excellentes resultados curativos que tinha obtido pela administração do iodeto de potássio na actinomycose do boi. Esta the-rapeutica tem sido applicada com successo na actinomycose humana por numerosos experi­mentadores, entre os quaes é preciso citar Da-rier, Gautier e sobre tudo Netter.

Até 1895, só estavam na França, assigna-lados quatorze casos ; no entretanto segundo di­zia Poncet, este pequenissimo numero de casos apontados não dependia da doença ser mais rara n'esse paiz do que n'alguns outros, mas simplesmente dos clinicos não convergirem a sua attençâo para este ponto. De então para cá já se encontram por dezenas o numero de observações inseridas na litteratura medica franceza. Em outros paizes são relativamente numerosas estas observações como se vê na se­guinte estatistica relativa aos cinco últimos an-nos e elaborada por Poncet e Thévenat ao (Buli. Ácad. méd., n.o 23, 1903).

Para a França

( 53 curas Actinomycose cervicofacial.. 67 1 ? m c l horas

) 4 mortes ( 7 resultados desconhecidos ( 1 cura

„ pleuro pulmonar 4 < 1 morte ( 2 resultados desconhecidos

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, 1 - 1 i ( 3 curas Actynomicosc abdominal protun- \ g m o r t o s da 9 4 resultados desconhecidos

das paredes do abdomen e do thorax 4-—4 curas cutanea e dos músculos 2—2 „

Papa a flllemanha

27 curas Actinomycose cervico-f acial.. 56 < 3 mortes

( 26 resultados desconhecidos

Actinomycose pulmonar 13 —13 mortos

i 4 curas abdominal prolan- \ ^ m o r t c s

' 2 resultados desconhecidos

das paredes do l 3 curas abdómen e tho- 5 3 mortes rax 7 ( 1 resultado desconhecido

cutanea o dos membros 3—3 curas

Para a Austria

> . , PJ ( 56 curas cervicofacial.. 61 j g r e s u l t a d o s desconhecidos

])leuro-pulmonar 3 — 3 mortes abdominal profun- ( 2 curas

da 3 ( 1 morte

d as paredes do tho- l 2 curas ràx e abdomi- J nal 3 ( 1 morte

cutanea e dos membros 3—3 curas do systema nervoso 1—1 morte

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Pai<a a Hussia

i 1 morte Açtmomycose cervicofacial.. 86 ] 2 curas

83 resultados desconhecidos

. 2 curas pleuro-pulrnonar41 ] 1 morte

38 resultados desconhecidos

abdominal profun- ( } c u r a

da .. 40 ) i m o r t e

( 38 resultados desconhecidos

das paredes do tho- l 3 curas rax e abdomen 6 ( 3 resultados desconhecidos

cutanea e dos membros 1 — 1 morto do systema nervoso 1 — 1 morto

Papa a flmerisa

corvico-facial.. 15—15 curas

pleuro pulmonar 3 I }, cura mortes

abdominal profun- ( l o u r a ; da. . 7 J mortes

( 3 resultados desconhecidos

parietal 2 — 2 curas do systema nervoso 1 — 1 morte

Pana a Inglateppa

í 9 curas cervico-facial 11. . j 1 morte

( 1 resultado desconhecido

plcuro-puhnonar 4 — 4 mortes

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Actinomycose abdominal profun- \ g m o r t e s

^ a ( 1 resultado desconhecido

parietal 1 — 1 oura „ cutanea e dos membros 1 — 1 morte

Para a Italia

. . . . 2 curas cervico-facial.. 5 3 r e s u l t a a o s desconhecidos

„ pleuro-pulmonar 1 — 1 resultado desconhecido „ cutanea e dos membros 1 — 1 cura

O estudo (Testas observações mostra-nos também a gravidade différente que reveste a doença, segundo a sua forma, e, sobre tudo, se­gundo a sua séde.

Temos tido apontamentos bastantes sobre 497 casos. A actinomycose cervicofacial, épor toda a parte a mais frequente, figura na esta­tística por 306 casos; 3 doentes melhoraram ; em 125, o resultado é desconhecido, ou porque se não fez menção nas observações, ou porque os doentes fossem perdidos de vista; 10 morre­ram e 168 curaram-se. Encontramos 1 morto para 1 6 curas pouco mais ou menos. Esta lo-calisação comporta pois um prognostico relati­vamente favorável.

Se se trata d'uma infecção da parede tho-raxica ou abdominal, o prognostico é já mais sombrio: 25 casos dão 16 curas, 4 mortese 5 re­sultados desconhecidos; isto é, 1 morte por 4 curas.

Bem différentes, ao contrario, são as locali-sações visceraes.

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Quando têm sedo sobre órgãos profundos do abdomen, a actinomycose conta, pouco mais ou menos, tantas mortes como curas. Sobre 84 casos, temos 16 curas, 17 mortes e 51 resulta­dos desconhecidos.

As formas pleuro-pulmonares são também das mais graves: nos 71 casos, ha 4 curas, 25, mortes, 42 resultados desconhecidos.

Já o dr. Jean Duvan, na sua these sobre : Le pronostic éloigné des différentes formes cliniques de Vactinomycose; statistique de 225 cas (Thèse de Lyon, 192), tinha mostrado que a mortanda­de geral da actinomycose humana era assim repartida :

10 % nas formas cervico-faciaes superfi-ciaes;

30 % nas formas temporo-maxilares pro­fundas ;

65 °/o abdominaes de origem intestinal; 85 % thoraco-pulmonares ; 100 % hepáticas; 100 % cerebro-espinaes ; A respeito da actinomycose humana em

Portugal, que saiba pouco lia escripto. O snr. Nuno Porto, communicando um caso á socieda­de das sciencias medicas de Lisboa (sessão de 1 de dezembro de 1894), disse que lhe parecia ser o primeiro caso bem averiguado de actino­mycose em Lisboa e talvez mesmo no paiz. O diagnostico foi confirmado j)elo exame micros­cópico praticado pelo fallecido prof. Camará Pestana. N'essa mesma sesão o snr. Gregório Fernandes referiu, que havia tempo, observara na sua enfermaria um doente, ao qual pelo sim-

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pies aspecto da lesão e estado granuloso do pus fizera o diagnostico de actinomycose, o que também foi microscopicamente confirmado pelo mesmo professor. O snr. Jones disse n'essa oc-casião que já em tempos se dirigira aos medi­cos da provincia para saber se elles tinham observado algum caso da doença. Posterior­mente, o professor Sousa Martins communicou á mesma sociedade dois casos de actinomyco­se humana, mas supponho não estarem publi­cadas as observações.

N'estes quatro casos que acabo de citar, parece-me que em nenhum se apurou a origem do mal. Sousa Martins referiu, porem, que um dos dois doentes lidava com gado cavallar.

No jornal da sociedade das sciencias medi­cas de Lisboa (N.os 11 e 12 Novembro e De­zembro 1896), o snr. professor Sousa Martins participa que tem actualmente na sua enfer­maria um novo caso de actinomycose. E' no maxillar superior, abrangendo o rebordo al­veolar, poupando toda a mucosa do paladar duro e localisando-se, como que por salto, no paladar molle e pilares.

Esta integridade de uma porção da mucosa bocal, entre duas zonas ulceradas, parece-lhe característica e capaz por si só, se não de fazer o diagnostico sem auxilio de microscópio, ao menos, de procurar logo n'esse auxilio a confir­mação ou informação do diagnostico.

Declara que o doente lidava com gado muar e tem trinta annos approximadamente.

Etiologia. — A actinomycose tem sido obser-

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vada em todos os paizes. E' mais frequente îi'uns do que n'outros.

As regiões húmidas e os annos pluviosos são-lhe favoráveis. Ataca indistinctamente os 2 sexos, em todas as idades. E' uma doença essencialmente rural, que se encontra muitas vezes nos camponezes.

Entre as espécies animaes succeptiveis de contrahir a actinomycose, é preciso collocar em primeiro logar os bovideos ; depois d'estes parece que os equideos são os mais atacados. Ha citados alguns casos em que o contagio ao homem proveio d'estes animaes ; tal é o de Is­rael, em que um cocheiro adquiriu a doença por ter bebido agua na mesma celha em que dessedentava um cavallo.

Dos factos da observação e cia experimenta­ção póde-se concluir que os vegetaes represen­tam um papel importante na transmissibilida­de do parasita ao homem e aos animaes. 0 exame das lesões tem mostrado, bastas vezes, a existência no seu interior de pequenos fra­gmentos de vegetaes, especialmente de gramí­neas. D'aqui a necessidade de cuidados espe-ciaes para as pessoas que manuseiam forragens, cereaes; etc., e de evitar o habito de palitar os dentes com palhas, hervas, etc.

Nos animaes como no homem a contamina­ção faz-se principalmente durante o verão, epocha da maturação das sementes das grami-neas. Se os primeiros symptomas da doença se manifestam mais tarde, é que o desenvolvi­mento das lesões é muito lento e que é preciso

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mezes, algumas vezes annõs para que. ellas se tornem apreciáveis.

O modo tie infecção implica, a presença do parasita sobre os vegetaes incriminados e, ape­sar de todas as averiguações que se tem feito para o encontrar, jamais se tinha podido obter um só resultado positivo. Dizia-se que podia o Actinomyceo viver sobre as gramíneas o principalmente nas praganas no estado sapro­phytic©, sob uma forma ainda ignorada e mui­to dissimilhante d'aquella que elle toma, n'um organismo vivo.

O sur. Godofredo da Silva Santos, n'um artigo publicado ria Agricultura Contemporânea (março, 1900), diz que se contam já numerosos os casos de observação que, juntamente com os poucos que a experimentação tem consegui­do, offerecem todo o fundamento á hypothèse da cumplicidade dos vegetaes na vehiculisação de semelhante parasita para, o organismo do homem, e dos animaes.

Assim é que tenclo-se manifestado extenso tumor na região umbilical de certo ceifeiro que, por motivo de excessivo calor, trabalhava nu até á cintura., mostrou a incisão do mesmo tumor que n'este se alojara, uma pragana de trigo, ao passo que o exame microscópico reve­lou a existência do Cladotriex actinomyces.

* * *

N'um-rapaz que. engulha uma espiga, de cevada espontânea, a chamada cevada d'os ra­tos, planta,, ao que se julga, muito das sympa-

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thias d'aquelle micro-organismo, que de prefe­rencia a escolhe para seu habitáculo e que por isso se torna uma das mais perigosas, formou-se, passado tempo, um abcesso entre a espá­dua direita e a columna vertebral. A sua aber­tura e exploração mostrou a presença de parte da espiga deglutida, constatando o exame microscópico a presença do parasita de que se trata.

* *

A um outro individuo que, bebendo agua, sentiu fixar-se-lhe na pharyngé uma espiga d'aquella mesma planta que havia caído no li­quido, originou-se-lhe, na região referida,, gran­de tumor em que a analyse microscópica encontrou o Cl. adinomyces.

Em alguns casos a doença tem sido inocu­lada por intermédio d'uma lasca de madeira ou d u m espinho, (Muller, Bostrom, Poncet).

Existem observações onde a doença parece ter sido transmittida por contagio. Elle ha-de fazer-se d'uni animal ao homem : tal é o caso de Hartmann referindo-se a um rapaz que con-trahe a doença espremendo todos os dias o abcesso actinomycosico d u m boi, para fazer sahir o pus. A transmissão de homem a homem tem sido egualmente observada ; um doente atacado de atinomycose contamina sua espo­sa, abraçando-a (Baracz). Nos animaes, sobre tudo, o contagio parece gozar um papel muito fraco.

A infecção de origem alimentar, não tem sido demonstrada por nenhum facto preciso.

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Entretanto Bollinger diz que o leite de vacca pode servir de vehiculo ao Actynomyceo e Ar­tault (Th. de Paris, 1893) encontrou este para­sita nos ovos de gallinha que estavam envolvi­dos na palha. Se existe perigo de, infecção actinomycosica pela alimentação, é preciso procural­o principalmente no consumo das car­nes que provêem de animaes doentes.

Como disse ■ acima, a espécie bovina é a mais atacada e por isso não é raro vemos nos­sos matadouros gado com esta doença.

O Alemtejo é a provinda em que se encon­tra maior percentagem de bovideos cora a doença de que nos occupamos ; n'essa região charaa­se Icágado ao tumor maxillar. Só no ma­tadouro de Lisboa, deram entrada no anno de 1899 mais de 30 rezes com actinomycose ma­xillar, numero que todavia está longe de re­presentar a, extensão do mal, visto que os mar­chantes teem o cuidado de afastar os animaes em que a, lesão jã se apresenta ulcerada. E' comtudo provável que a carne dos animaes doentes possa servir sem perigo para a alimen­tação, logo que se tenha o cuidado de não aproveitar as partes infectadas nem as circum­visinhas, visto que os tecidos na apparencia sãos; podem já estar invadidos.

Tem­se dado uma importância exagerada­ao traumatismo, como ponto de partida da doença. E' muito provável que seja causa adju­vante. Ha casos observados de actinomycose depois d u m a martelada no hypogastro (Hoche­negg), depois duma contusão da maxilla con­tra uma pedra (Roux), depois d u m a queda

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sobre o rebordo d'uni movei (Israël), mas isso não permitte formular uma conclusão afirma­tiva; não parece haver aqui senão uma sim­ples coincidência ; o que se pode, é accusar o traumatismo de ter creado um locus minoris re-sistentia.

Anatomia pathologica - As lesões anatómicas são sensi­velmente différentes, segundo o Actinomyceo se desenvolve n'um animal ou num homem. No boi faz-se um processo neo-plasico ciando o aspecto do sarcoma ou do tubérculo ; JIO ho­mem quasi sempre se produz uma cavidade purulenta. Diz-se que estasjlifferenças provem de que no homem trata-se sempre de infecções mixtas, os micróbios pyogeniços, hospedes habi-tuaes das cavidades naturaes, vêem'juntar-se ao Actinomyceo determinando suppuração em logar d'uma producção neopíasi-ca; nos animacs, a infecção actinomycosica ficaria pura porque elles apresentam uma receptividade muito menos que o homem aos agentes pyogeniços. Dá-se uma outra explicação a estas differenças, aventando que os organismos das diversas espé­cies animaes podiam reagir differentemente a uma mesma in­fecção parasitaria.

No boi, os tumores desenvolvem-se umas vezes no maxillar inferior onde cavam o osso, enviando prolongamentos aos al­véolos dentários, aos músculos visinhos e perfurando mesmo a pelle deixando orifícios fistulosos; outras vezes na lingua quo se transforma n'uma massa lenhosa, que não pode mover-se mais. E' o que os Aliemães chamam Holz-Zunge. (lingua de pau) e os Italianos mal ciei rosvo (mal de sapo).

Pflug observou um caso de genoralisação da doença n'uma vac ca; os pulmões estavam crivados de granulações cinzentas, translúcidas, análogas ás da tuberculose miliar aguda; ao cen­tro d'estas granulações encontrava ao microscópio o Actyno-myceo.

Desde que o parasita penetra nos tecidos, determina á roda d'elle uma irritação análoga á que se produz á roda de todo o corpo estranho. Porma-se um nódulo actinomycosico, um gra­nuloma cuja estruetura histológica é a seguinte: uma parte central mais ou mimos molle encerrando tufos de actinomyco-se, cellulas gigantes multiiiucleadas, cellulas epithelioides volu­mosas, o todo encerrado n'uma camada mais ou menos espessa de cellulas fusiformes dispostas concentricamente (Nocard).

A reunião d'estes nódulos forma uma massa neoplasica, o actikomycoma, que suppura promptamente. Produz-se então um abcesso que se reúne logo aos visinhos da mesma origem e o aspecto da lesão primitiva é profundamente modificado.'

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Na forma local o foco actinornycosico é essencialmente in­vasor, ganhando a pouco e pouco atravez de todos os tecidos. E' assim que um foco, cujo ponto de partida é á roda da cavi­dade boccal, podo subir pelos orifícios que dão passagem aos feixes vasculo-nervosos e penetrar na caixa craneana onde invado as meninges e o cérebro, ou ao contrario alcançar a columna vertebral e seguil-a descendo para se estender pouco a pouco ao mediastino, as cavidades pleuracs e ás vísceras tho-racicas, á cavidade abdominal e aos órgãos que ella contem, e mesmo estender-so á região inguinal. N'este longo percurso o foco primitivo divide-se frequentemente e envia trajectos fistu-losos para a pelle, que perfuram, ou para os ossos que esca­vam.

No pulmão, estas lesões formam focos peribronchicos e pneumonicos, uma inflamação chronica intersticial que se es­tende até ás pleuras.

No intestino, ou a lesão é superficial como no caso de Chiari que encontra placas esbranquiçadas redondas ou oblon­gas, de um centímetro de diâmetro sobre õ millimetros de es­pessura, com o actinomyceo nas glândulas de Liberkulim—ou o que é mais frequente, a parede intestinal estar invadida em toda a sua espessura, c a doença atacar as partes visinhas.

Mycologia.— Os grãos especiaes contidos nos líquidos se­gregados pelos focos actinomycosicos, teem diâmetro que varia de 0,mm01 a 2 millimetros; comparam-se a grãos de areia, de mostarda ou de milho miúdo. São arredondados, a sua superfi­cie é lisa ou muriforme; são muito friáveis e untuosos ao to­que. A côr é geralmente amarello enxofre; mas quando são de formação recente, apresentam-se cinzentos e translúcidos; os mais antigos são verdes, pardos ou vermelhos; podemos encon-tral-os negros no fígado. Podem soffrer uma infiltração calca-rea.

Estes grãos não se encontram constantemente nos exsuda-dos actinomycosicos; podem faltar quando a doença está ainda no começo. Em certos casos não são fáceis de descobrir por causa do seu fraco volume. E' preciso estender o pus em ca­mada delgada á superficie d'uma placa de vidro ; veem-se fazen­do uma leve saliência, como grãos do areia que teriam sido misturados no liquido. Em casos de actinomycose pulmunar pode haver grãos nos produetos da expectoração; mas são di-fficies de vêr. Para lá chegar, agita-se um fragmento da expe­ctoração 11'um vaso chato de vidro (um vaso de Petri por exem­plo) contendo uma pouca de agua e colloca-se o vaso sobre uma folha de papel preto, sobre o qual se destacam os grãos que foram postos em liberdade (Leker).

Achou-se egualmente o Actinomyceo nas matérias fecaes e na urina, em casos em que havia infecção intestinal ou abertu­ra d'uni foco na bexiga.

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Quando so trata simplesmente d'um exame microscópico destinado a confirmar um diagnostico clinico, podemo-nos con­tentar em examinar ao microscópio sem coloração um d'estes grãos directamente recolhido no pus ou tratado por algumas gottas de solução de potassa a 3 por 100, o que torna a prepa­ração mais limpa desembaraçando o parasita das cellulas que o rodeiam; basta esmagar o grão entre a lamella e a lamina porta-objecto. Um processo muito cominodo consiste ainda em esmagar e estender um grão sobre uma lamella; desseca-se a preparação pelo calor e deixa-sc banhar 2 ou 3 minutos no pi-ero-carmim. Lava-se rapidamente a lamella na agua e mergu-lha-se a preparação na glycerina: O parasita fica amarello, em-quanto que 'os elementos que o rodeiam ficam vermelhos. Vê-sc então que os grãos volumosos são formados d'um montão de grãos mais pequenos, listes grãos elementares mostram fila­mentos radiados terminados excentricamente em maça e con­vergindo no centro por uma massa fibrillar. Este aspecto ro­deado é característico e basta para reconhecer o Aetinomyceo.

Querendo estudar os detalhes, pode-se empregar os metho-dos de caloraçâo de Gram ou de Weigert ou ainda a safranina na agua anilada; depois a solução iodo-iodurada de Lugol, (Oornil e Babes). Vê-se então que a zona peripherica da granu­lação ó constituída por elementos em forma de maça allongada, cuja grossa extremidade arredondada está voltada para fora, em quanto que a parte afilada olha o centro. O comprimento ordinário d'estas maças é de 15 a 20 m. a sua maior largura é de 8 a 10 m. A extremidade afilada mede apenas 1 m. na sua ponta. Estes elementos são muitas vezes simples, outras vezes são ramosos e apresentam 2, 3, 5 ramos urnas vezes quasi se­melhantes, outras vezes muito desiguaes. As maças podem apresentar estrangulamentos, que as tornam monififormes. A parte central é constituída por um feltro de filamentos que são a continuação da parte afilada das maçãs, aos quaes se mistura elementos redondos de 7 a 10 m. de diâmetro medico, cujo es-peeto lembra o das maças. Os filamentos da parto central emit-tem ramificações lateraes.

Estes elementos arredondados, réfringentes e de curtos bastonetes, são semelhantes a hacillos e são geralmente consi­derados como esporos.

Para chegar a obter culturas puras do Aetinomycèo, o pro­cesso mais pratico consiste em recolher grande numero de grãos, 50 pelo menos, laval-OS varias vezes na agua estérilisada em pequenos vasos de Petri e semeal-os um por um, á distan­cia de 3 centímetros um do outro, pouco mais ou menos sobro uma dezena de placas de gélose peptonisada. Colloca-se estas placas na estufa a 37 graus e examinam-se cada dia á lupa. Cada vez que uma cultura se desenvolve ao nível d'um ponto da semeadura, verifica-se e transporta-se sobre um tubo do go-lose ou de soro golatinisado. Se esta nova semeadura não deu logar no fim d'uma semana a um desenvolvimento do bactérias estranhas, pode-se considerar a cultura como pura.

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O Actinomyceo cultiva-se sobre os cliff cientes moios corren­temente empregados nos laboratórios: gelatina, gélose, caldo, soro, batata, etc. E' ás vezes aerobio e anaeróbio. As colónias levam alguns dias a adquirir o seu completo desenvolvimento. Sobre gélose o soro gelatinisado forma-so colónias translúci­das, hemisphericas, brancas ou amarellas, resistentes. Os para­sitas no caldo agrupam-se em massas cinzentas que lembram os grãos característicos, bem que sejam mais volumosos e me­nos duras. Porma-se sobre a fatia das batatas uma espessa camada parda cobrindo-se d'uma lanugem branca. Liebman obteve uma cultura muito virolenta introduzindo o parasita n'iinii semente e fazendo germinar esta. Á medida que a plan­ta se desenvolvia, o Actinomyceo invadia-a completamente sob a forma de filamentos muito curtos. Esta experiência tem de novo sido tentada, sem sucesso por Bécue.

Quando se examina o parasita nas culturas, apresenta-so geralmente sol) a forma de longos filamentos entre-cruzados, rigidos ou ondeados; tomam mais raramente o aspecto baciUar. Não se encontra as formas em maça senão no estado isolado nas velbas culturas ou nas culturas muito abondantes.

As colónias desenvolvem-se bem de 33 a 37 graus ; ajuirtir de 40 graus a sua vitalidade diminue, depois cessa completa­mento; basta, urna exposição de dez minutos a 70 graus para matar as culturas.

Ao principio cousiderava-sc as tumefacções em maça como órgãos de fruetificação; mas as investigações de Bostrõm mos­tram que são ao contrario formas de involvimento dos elemen­tos mortos, tendo soffrido uma espécie de necrose. E'por isso que nas culturas não as encontramos senão quando as coló­nias são muito abondantes ou muito velbas, o meio nutritivo estando esgotado.

Se julgarmos que essas tumefacções são consideradas co­mo esporos, podemos dizer que elles resistem 14 minutos á elnillição e depois de 4 horas a unia, temperatura secca de 140 a, 145 graus. Elles são mortos pelo azul de methylene, na pro­porção d'uma gotta para dez centilitros de caldo de cultura, e pelo sublimado a 1 por 1000 em cinco minutos (Liebman).

O Actinomyceo parece perder a sua virulência passando pelo organismo do homem ou dos animaes, contrariamente ao que se passa na maior parte dos parasitas.

O parasita é ainda menos virulento, depois de ter passa­do pelos meios de cultura.

O Actinomyceo não é pyogeueo o a suppuração que acompa­nha » actinomycose é sempre devida a infecções secundarias. M. Netter considera-o como pyogenico, porque pode encontrar-se só no pus, sem associação microbiana.

Podemos encontral-o no estado soprophytico na agua e solo.

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Symptomaiologia. —D'um modo geral, a acti-nomycose do homem manifesta-se pela produc-ção de collecçôes purulentas com descolla-mentos extensos e trajectos fistulosos múltiplos. Não fica localisada n'uni ponto, ao redor da bocca, como nos bovidas : pode attingir todos os órgãos, todas as regiões da economia. As formas locaes mais frequentes são : a actino-mycose cervico facial, buccal, thoracica, abdo­minal e. cutanea.

Formas locaes frequentes. Actinomycose cervico­facial.— Toma muitas vezes o as2)ecto d'um phlegmão subagudo. Pode-se dividir a evolu­ção da doença em 3 periodos. No l.o observa-se uma tumofacção extensa da região com uma induração compacta de consistência lenhosa. Em alguns casos ha dores muito vivas que se attribue ao estrangulamento dos tecidos pela massa fibrosa que as encerra. No 2.o periodo este plastrão amollece em certos pontos, per-cebendo-se flluctuação ; incisa-se e corre pus contendo as sementes características. Algumas vezes, desde o começo d'esté periodo, a, doen­ça perde o aspecto phlegmonoso, e, em logar d u m a collecção purulenta, desenvolve-se nas camadas superficiaes da derme saliências for­madas de gommos fungosos. Ao seu nivel mos-tram-se abcessos miliares, a pelle é preforada e forma-se trajectos fistulosos, que penetram profundamente. 0 pus que d'ahi sahe contém sementes actinomycosicas. Se a doença for aban­donada, segue uma marcha invasora e pro­gressiva. Ella entra no 3.° período. Os museu-

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los são infiltrados cie fungosidades, algumas vezes, os grossos vazos do pescoço são penetra­dos e obturados ; os ossos da face são invadidos e estabelece-se unia cachexia rapidamente mortal.

Áctinomycose buccal. — Os symptomas são os d'uni phlegmão invadindo o pavimento da bocca, ou d'uma angina de Luduvig, sobrevin­do a morte, algumas vezes em menos de 6 dias por suffocação. Geralmente a doença desenvol-ve-se insidiosamente e lentamente. Algumas vezes a gengiva que encastoa um dente estra­gado ou um alvéolo cujo dente tem sido re­centemente arrancado tumefaz-se e forma-se n'este ponto uma collecção, que se abre e dei­xa um. trajecto fistuloso, d'onde salie um pus granuloso contendo grãos actinomycosicos.

Alem d'isso forma-se na face interna do maxillar inferior, muitas vezes perto do seu angulo posterior, uma induração, tornando-se pouco a pouco fluctuante no centro. Observa-se muitas vezes um trismo precoce, acompa­nhado d'uma dor viva da região, voltando por crises, sobretudo á noite ; nos ganglios não se apresenta reacção (Poncet). A pelle acaba por ser levantada, este plastrão desenvolve-se ; to­ma uma côr violácea e apresenta orifícios fistulosos, pelos quaes vê-se sahir uma pequena quantidade de pus seroso contendo grãos ca­racterísticos.

Chegado a este ponto, a doença pode curar expontaneamente, o que é excepcional. Pode ficar quasi estacionaria com oscillações suecos-

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sivas para bem ou para mal. Emfim vê-se tam­bém estencler-se progressivamente, ganhando todos os tecidos a pouco e pouco, infiltrando os músculos, adberindo aos ossos, mas ficando muito tempo sem os penetrar por invasão pa-rasquelettica indo fazer saliência no pescoço, na região sub-maxillar, ao nivel do pavimento da bocca e acabando por perfurar a mucosa buccal e a pelle na região sub-maxillar de nu­merosos orifícios fistulosos. Mas as desordens nem sempre foram alli; o foco pode ganhar a columna vertebral e descer ao thorax, abdo­men, etc. ou subir até á base do craneo e pene­trar na sua cavidade. N'estes casos, a menos que a invasão d'um órgão importante não ve­nha abreviar o curso da doença, o doente aca­ba por sucumbir a uma cachexia progressiva. A actinomycose limitada á lingua toma o as­pecto d'um pequeno tumor duro, de nodosida-des múltiplas ou d'um abcesso. Elle tem a sua sede geralmente na ponta.

Actinomycose pulmonar. — O parasita pene­tra n'este órgão durante a inspiração ou secun­dariamente pelo esophago. (Ponfick, Soltmann e muitos outros).

Distingue-se duas formas de actinomycose do pulmão. Uma catarrhal, superficial, outra attingindo e destruindo profundamente o po-renchyma pulmonar. A primeira forma não está ainda demonstrada anatomicamente, de modo que todo o interesse é dirigido para a segunda forma á qual se descreve 3 periodos, se a sua evolução for maligna.

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No ].° período forma-se pequenos focos á roda dos bronchios. O tecido connectivo proli­fera á roda d'elles, d'onde induração e mesmo ratrahimento do parenchyma pulmonar.

Os symptomas clínicos são tão pouco pro­nunciados n'este período que pouco auxiliam o diagnostico de modo que a doença é muitas vezes tomada por uma bronchite simples. Não é senão quando o processo invade uma parte extensa do pulmão que os signaes fornecidos pela auscultação e percussão denotam uma lesão do porenchyma pulmonar. Estes focos quasi nunca teem a sua sede primitivamente nos vertices, mas desenvolvem-se primeiro ua fossa sub-clavicular e um pouco para traz.

N'esta occasião pode-se algumas vezes achar nos escarros grãos actinomycosicos.

O segundo período ó caraçterisado pela in­vasão do pulmão até á sua superficie, com le­sões da pleura, adherencias entre os seus dois folhetos ou então formação d'um exsudado se­roso. Ao mesmo tempo sobrevem uma atele-ctasia, pulmonar em seguida á desaggregação dos tecidos com induração consecutiva. A con­comitância d!esta atelectasia e da formação d'um exsudado pleural recente é considerado como signal pathogiiomonico da actinomycose do pulmão. Mas o processo granuloso pode in­vadir o folheto parietal da pleura, extender-se para fora á parede thoracica, algumas vezes também para baixo para a bacia, ou então at-tingir o diaphragma e provocar phenomenos de péritonite, lesões hepáticas, etc. Pode tam­bém invadir o mediastino ou o pericárdio.

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N'este período nota-se já phenomenos febris. A auscultação e a percussão denotam lesões do parenchyma do pulmão e da pleura.

Ao mesmo tempo apparece uma tumefac-ção da parede thoracica, a princrpio muito dura, mas amollecendo gradualmente e indo até á fluctuação. Nos escarros encontra-se ainda que não sempre, o actinomyceo. As expectorações são muco-purulentas mistura­das algumas vezes de sangue. Não se encon­tram n'ellas fibras elásticas.

O 3.0 periodo é caracterisado pela aber­tura do abcesso thoracico e a formação d'u-ma fistula. Ao mesmo tempo observa-se me­tastases nos différentes órgãos. A pyohemia sobrevem á evolução lenta na maior parte das vezes, durando mezes e mesmo annos. A morte é causada pela prostração ou uma lesão d'uni órgão importante.

D'um modo geral a evolução da actino-mycose dos pulmões tem muita analogia pe­los signaes physicos e symptomas clinicos, com a tisica pulmonar. Não é senão a au­sência constante do bacillo de Koch nos es­carros e a presença do actinomyceo que permittem fazer o diagnostico differencial exacto. O que é ainda característico é a tu-mefacção da parede thoracica; á puncção das partes molles pode-se obter pus contendo grãos d'actinomycetos. Outras vezes o qua­dro geral da doença lembra uma pyohemia chronica e não é senão o exame dos exsu-dados que confirma o diagnostico.

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Àctinomycose abdominal.—Pode attingir pri­mitivamente o intestino, sem se manifestar por algum symptoma ou revelar-se por cóli­cas e diarrhea se as lesões forem extensas e supei'ficiaes a uma grande parte do intestino. Habitualmente as lesões são limitadas. Uma das sedes de predilecção é o cecum. Tem-se assim uma typhlite actinomycosica de mar­cha chronica ou aguda com todos os siguaes d'uni abcesso pericecal : febre, constipação, dôr localisada, empastamento da região, edema e vermelhidão da parede; o abcesso aberto, sabe uma mistura de matérias estercoraes e pus fétido. Estes focos encontram-se também ao nivel do recto onde podem por compres­são determinar occlusão.

Qualquer que seja o ponto do intestino invadido, faz-se a este nivel uma collocção purulenta encerrada e circumscripta nas adlie-rencias peritoneaes ; esta collecção, que se manifesta por um empastamento doloroso limitado, acaba por sahir para o exterior perfurando a parede abdominal. Observa-se algumas vezes tinia infiltração da parede abdominal estendendo-se do umbigo ao pubis, tão dura, que pode simular um tumor solido (Grlaser). O pus pode ainda espalhar-se por todos os pontos da cavidade abdominal, á roda do figado, baço ou rins, na bexiga, que perfura e onde se mistura á urina, na peque­na bacia, onde pode fazer abertura ao nivel da vagina.

O figado pode ser attingido primitivamen­te. No começo não se nota senão dôr no hy-

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pochondrio direito, depois do augmento do volume do figado ; emfim a superficie do órgão cobre-se de nosidades arredondadas, perceptí­veis á palpação. Pode-se observar um derra­me pleuretico na base direita, por irritação de visinhança; dores perihepaticas devidas a uma inflamação circumscripta do peritonei! da região.

Actinomycose cutanea. — Toma dois aspectos différentes: uma forma ulcero-fungosa com nódulos periphericos múltiplos e zona de cica­trização central, lembrando certas lesões cu­tâneas da syphilis terciária ou lupus tubercu­loso, mas apresentando sempre um cordão fibroso muito duro, partindo do foco cutâneo e adherindo profundamente ao esqueleto ; o systema lymphatico conserva-se intacto ; e uma forma anthracoide, mais rara, caracterisa-da pelo desenvolvimento de nódulos superfi-ciaes crivados de pequenos abcessos, cujo pus encerra grãos typicos.

A' roda dos focos cutâneos os pêlos cahem e a pelle fica secca, os folliculos pilosos e as glândulas sudoriferas estão escondidas no te­cido fibroso que se forma á roda das lesões. A actinomycose cutanea pode infectar todos os pontos do tegumento, principalmente as mãos e face.

Ao lado d'estas formas locaes em que a doença não se estende ao longe senão por in­vasão de visinhança, existe uma forma gene-ralisada na qual se faz uma infecção sangui-nea, é onde o parasita transportado i^ela,

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circulação a vários órgãos dá logar a uma es­pécie de pyemia chronica com abcessos metas-taticos.

Evolução clinica e prognostico. — A actinomy-cose é uma affecção essencialmente chronica e lenta, durando em geral alguns annos, a me­nos que a doença não seja bruscamente modifi­cada pela generalisação do parasita no orga­nismo.

Certas lesões ficam estacionarias ou curam espontaneamente, o que é raro, ou pelo facto duma intervenção cirúrgica.

Fora d'estes casos, os focos abandonados a si são progressivamente invasores com alguns tempos de paragem assignalados por uma me­lhora passageira, mas em pouco tempo segui­dos de novos signaes de extensão da doença, Durante annos (2 a 10) a propagação é cons­tante e a actinomycose encaminha-se, mais ou menos lentamente segundo a importância, dos órgãos attingidos, para a cachexia seguida do morte.

O prognostico torna-se menos sombrio gra­ças ao tratamento medico c cirúrgico.

"Diagnostico. — A actinomycose não tem ou­tro symptoma pathognomonico senão a presen­ça de grãos característicos no pus.

Fora d'esté signal liga-se grande importân­cia á lentidão da evolução, á zona de indura-ração lenhosa que limita os focos, á multiplici­dade dos orifícios fistulosos cheios de gommos

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cinzentos, á ausência de todo o engorgitamento ganglionar.

A actinomycose buccal pôde lembrar uma simples fistula dentaria, accidentes do dente do siso, uma epúlida, um tumor maligno do maxillar, a tuberculose ganglionar ou lesões syphiliticas ; a cervico-facial confunde-se com um adeno-phlegmão do pescoço; a thoracica confunde-se com a tuberculose pulmonar e pleu-resias de origem microbiana; a abdominal é difficil de destinguir d'um foco circunscripto de péritonite, d'uma appendicite, de abcessos pél­vicos ou abcessos por congestão de origem tu­berculosa; finalmente a cutanea tem muitas vezes o aspecto d u m lupus tuberculoso ou d'u-ma syphilis terciária, algumas vezes o d'um an­thrax.

Tratamento. — Deve ser prophylatico, cirúr­gico e medico.

Como medida prophylatica devemos indicar o perigo que ha em conservar na bocca semen­tes, hastes de cereaes, etc. E' necessário tam­bém recommendar cuidados antisepticos ás pes­soas que estão em contacto com animaes ata­cados de actinomycose. Enifim convém preve­nir os doentes de que podem contaminar as pessoas que os cercam por contacto directo ou por intermédio do pus que segrega o seu foco e inclicar-lhe as precauções a tomar para evitar o contagio.

Como medida sanitaria geral, Nocard acon­selha uma inspecção minuciosa das carnes de boi, de porco e carneiro, sobretudo quando es-

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tes animaes provem de paizes onde a actino-mycose é,frequente. Elle pensa que, nos oasos localisados, o órgão infectado deve ser destruí­do, mas o resto do animal ficar para ser consu­mido, se, ao contrario, a actinomycose deter­mina uma infecção geral, deve-se fazer uma ap-prehensão total.

0 dr. J. Reboul, de Nimes, synthetisou pelo modo seguinte, conforme eu passo a, traduzir litteralmente as precauções a adoptar para que o homem possa, com certa facilidade subtra-hir-se á acção do nefasto parasita.

"Aquelles que se expuzerem ás poeiras ve-getaes provenientes das forragens e dos cereaes devem fazer abluções abundantes e minuciosas.

"Toda a, escoriação, todo o ferimento por mais insignificante que seja., produzido por pa­llias ou por fragmentos de madeira, será trata­do com muita attenção antisepticamente.

"E' importante não deixar de prestar cui­dados hygienicos á bocca e aos dentes.

"E' perigoso ter o habito de empregar pa­lhas ou hastes de hervas á maneira de palito de dentes, e mascar folhas, hervas, grãos do cereaes ou bocados de madeira.

"Os grãos de cereaes alimentares só deve­rão ser utilisados depois do terem sido submet-tidos a, um forte calor do forno, ou a uma, ebul-lição prolongada.

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A preparação das forragens das palhas, a debulha dos cereaes nunca deve fazer-se em es­paços confinados ; e, rigorosamente, dever-se-hão proteger os orifícios bucco-nasaes por meio d'uma mascara, ou, então, pelo menos, fazer lavagens abundantes com agua quente, á boc-ca, garganta e fossas nasaes, quando se tenha estado exposto ás poeiras vegetaes.

"As casas, os telheiros em que se tiverem realisado semelhantes aperações serão lavados por meio de paimos molhados ou á lança, mas nunca varridos a secco."

As medidas preventivas que podem apro­veitar ao homem, são sem applicação pratica para os animaes, para os quaes a alimentação no todo ou em parte é constituída por vege­taes que, verdes ou seccosj não recebem pelo geral, a acção de qualquer temperatura supe­rior á do meio ambiente.

Não se podendo porém prevenir, poder-se-ha comtudo remediar.

Apparecida a lesão actinomycosica em um animal, é necessário cuidar da sua cura, insti­tuir um tratamento.

E entre nós a actinomycose nos animaes é bastante frequente, sobretudo na espécie bo­vina.

Até aos últimos ânuos nunca se obteve bons resultados senão com o tratamento cirúrgico : abertura, curretagem, excisão dos focos accessi-veis, laparotomia nos casos de actinomycose abdominal, trejíanação quando á formação de focos cerebraes. O tratamento medico consistiu

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simplesmente em administrar ao doente tóni­cos destinados a sustentar e a retardar o pério­de de cachexia.

Em 1885, Thomasson percebe que adminis­trando doses quotidianas de iodeto de potássio de 6 a 10 grammas a animaes atacados de acti-nomycose, obtinha-se rapidamente uma melho­ra das lesões, logo seguida duma cura comple­ta. A partir de 1892 este tratamento foi appli-cado á actinomycose humana e tem geralmente dado bons resultados. E' necessário clár sobre tudo no começo, fortes doses de iodeto, 6 a 9 grammas por dia, de modo a obter symptomas de iodismo. Reduz-se rapidamente a dose quo­tidiana a 2 ou 3 grammas. Ao fim de 5 dias, interrompe-se o tratamento durante 2 dias ; de­pois recomeça-se e assim successivamente até que a cura seja definitiva, (Netter). O iodeto não parece ter acção especifica sobre o parasi­ta, que se cultiva muito bem n u m meio de cul­tura contendo 1 por 100 de iodeto; a sua. ac­ção favorável exerce-se provavelmente sobre os elementos anatómicos. Parece pois que se pode esperar excellentes effeitos da medicação ioda­da só quando Os focos são inaccessiveis e da in­gestão do iodeto combinado a uma interven­ção cirúrgica, quando esta ó possivel. Algumas actinomycoses são rebeldes a este tratamento. E' para estes casos que Rydgier aconselha in­jecções intersticia.es repetidas todos os 4 ou 5 dias ou mais afastados segundo a, intensidade da reacção inflamniatoria, d u m a solução a 1 por 100 de iodeto de potássio ou sódio, na do­se crescente variando de 1 a 5 centigammas.

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OBSERVAÇÃO

Um caso de actinomycose por Nuno Porto. Communicação feita á sociedade das scieneias medicas de

Lisboa em sessão de 1 de dezembro de 1894 (Jornal da Socie­dade das Scieneias Medicas de Lisboa).

Em 14 de maio de 1891, fui chamado para tratar um doente que se achava em Canecas, onde tinha ido buscar melhoras a um tenaz soffrimento, acompanhado n'aquella epocha de uma anorexia absoluta. Oomquanto o ar do campo lhe tivesse trazido mais appetite, a doença nem sequer estacionava, e o doente F., de 45 annos, reclamava o meu auxilio profissional, narrando-me a seguinte historia.

Em 1889 recebeu um forte traumatismo (por bengalada) na região parietal direita, rasgando-lhe a orelha d'aquelle lado. Es­ta lesão em breve se reparou, porque sempre teve boa caruadu-ra; mas algum tempo depois formou-se-lhe um abcesso dentário na gengiva do ultimo dente malar direito da maxilla inferior, o qual se piopagou á amygdala do mesmo lado ; sendo necessária a intervenção cirúrgica. Deitou pus fétido cicatrizando tempo depois.

Passadas algumas semanas sentiu um grande calefrio, se­guido de febre e forte pontada no peito, o que attribue a um res­friamento de noite, por se ter levantado em camisa para fechar uma jauella. O medico que o tratou diagnosticou pneumonia do ápice direito. Esta doença porém deixou-lho sempre falta de ar, tosse, expectoração puro-sanguinolenta, anorexia e febre, que nunca mais o desamparou, emmagrecendo enormemente e perdendo as forças. Abaixo da clavicuía direita conservou sem­pre dôr forte, formando-se-lhe mezes depois n'essa região um

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abcesso muito doloroso, com a pelle roxa e endurecida, que ex-pontanearnente se abriu depois de muito tempo, deitando pus liquido de cór castanha, mas ficando sempre aberto coma pelle, retrahida e dura, de côr avinhada.

Algum tempo depois formou-se um pequeno abcesso simi-lhante acima da clavicula, com a mesma côr e dureza de tecido. Rompeu-se depois de muito tempo, deitando pus igual, e fican­do depois aberto, com a pelle retrahida e entaboada, corada de vermelho escuro. Successivamente se formaram mais cinco pe­quenos abcessos, acima da clavicula e no pescoço, e em baixo d'aquelle osso e por fora do primeiro ; alguns communicando entre si por trajectos fistulosos.

Depois de se tratar com vários medicos de Lisboa, tendo feito varias conferencias, em que foi confirmado o diagnostico de carie dos ossos da região e tuberculose pulmonar do ápice direito, foi-lhe aconselhado que retirasse para Canecas, onde a principio melhorou do estado geral, continuando, porém, em horrivel soffrimento.

Lavar os trajectos fistulosos e as suas aberturas com agua bórica era então toda a therapeutica em uso ; quizeram abrir-lhe os trajectos fistulosos e os abcessos, ao que sempre se op-poz por falta de coragem.

0 doente, tinha muito deteriorada a constituição. Durante a sua exposição conservava a face contrahida denotando gran­de soffrimento, o a cabeça immovel e inclinada como se tivesse um torticolis direito. Disse nunca ter tido syphilis, nem haver tuberculose na sua família. Fumava muito, e mais tarde soube que não tinha por habito, nem so recordava de metter alguma vez na bocca cereaes crus ou parcellas de plantas de campo, palhas, etc.

Historia actual

Descobrindo o pescoço e o thorax, observa-se do lado di­reito o seguinte :

A meio da região cervical acima e abaixo do esterno cleido-mastoideu, duas aberturas de trajectos fistulosos das dimen­sões de um bago de milho, de bordos pouco descolados ; a pelle que as circumda é violácea, estendendo-se a côr para os teci­dos sãos, e cambiando desde a côr roxa até á normal, passan­do pelo vermelho avinhado e o rubor inflammatorio. Todo este tecido retrahido e de consistência linhosa, que circumda cada um dos orifícios, occupa approximadamento superficie igual á de uma moeda de 500 róis. Na região supra-clavicular ha mais três aberturas com o mesmo aspecto, mas mais largas duas d'el-las. Acima e para fora, atrás do acromion, nota-se um pequeno

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abcesso com fluetuação franca, das dimensões de uma avelã, e de côr vermelha carregada.

Abaixo da clavicula, sobre a segunda costella e 2 centíme­tros para fora do bordo sternal, na outro orifício mais largo que o do primeiro abcesso, com as dimensões de uma moeda de meio tostão, bordos irregulares o descolados, cercado da mesma aureola, mas mais larga, violácea, fortemente deprimida e en­durecida como todas as outras. Algumas d'estas aberturas com-municam entre si e com o pequeno abcesso d'eseripto, por tra­jectos fistulosos irregularissimos a ponto de esta communicação se não poder executar com uma sonda delgada de prata pela tortuosidade e numerosos fundos de sacco em que estaca. Con-flrma-se, porém, tal communicação, injectando um d'elles, e vendo o liquido da injecção sair por outros.

Todos elles, entretanto, parecem dirigir-se para debaixo da clavicula que está apparontemente immune na parte que se of-forece a exame.

De todos os orifícios sáe pus com o mesmo aspecto, féti­do, de côr castanho rosado, mal ligado, com alguns pequenos grumos amarcllados, côr de gordura, sensivelmente iguaes em dimensões, parecendo cuboides, com um decimo de millimotro de aresta. De consistência carnosa esmagam-se entre os dedos facilmente.

A primeira impressão, ao examinar este pus é a que deixa o pus do osso, mas, reparando attentamente, os gromos são tão siinilhantes cm dimensões, que o espirito fica perplexo para tal affirmação.

0 que, muito impressiona é o aspecto geral do escarro ser approximadamente o mesmo que o do pus, embora se lhe não notem grumos á primeira vista; muito abundante a expectora­ção excede em muito a quantidade de pus que sae pelos orifí­cios fistulosos. Nas 24 horas enche quasi o escarrador.

A auscultação a respiração ou é silenciosa n'alguns pontos do vórtice, ou soprante ou sub crepitante, e mesmo cavcrnulosa n'outros, abrangendo a lesão o terço superior do pulmão.

0 coração funeciona regularmente e os outros órgãos e aparelhos igualmente. Exceptuando a anorexia, nenhuma outra perturbação se verifica no resto do arganismo.

Faço o diagnostico de empyema enkistado, com fistulas cu­tâneas e fistulas pleurobronchicas. Instituo tratamento interno tónico o desinfectante pela quina, vinho generoso e iodoformio, o local por injecções de agua sulfocarbonica, convidando-o a retirar para Lisboa, o que faz seis dias depois.

Proponho-lho uma conferencia com o snr. Souza Martins, a qual se réalisa a 28 do mesmo niez.

N'esta conferencia, s. ex.a concorda no diagnostico. Commu-nico-lhe as minhas apprehensões de que estejamos em presen­ça de um caso do actynomicose, o que nos reservamos confir­mar pela analyse microscópica do pus e escarro, quando che­gar do estrangeiro o sr. Camará Pestana.

Combinou-se administrar internamente o iodeto do potas-

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sio, alérn do tratamento que se estava empregando. Das injec­ções de agua sulfocarbonioa o doente tirara algum resultado na cicatrização de algumas fistulas.

A maior parte das vezes o doente sente durante o curativo o gosto d'aquella agua, cuja injecção pelas fistulas provoca em breve tosse e expectoração de escarros misturados com a agua, a despeito do maior cuidado.

O doente teve de suspender o uso interno do iodeto por lhe provocar iodismo.

Durante o mez de junho o doente não melhorou de manei­ra sensível, desenvolvendo-se-lhe no dorso, abaixo e para den­tro da ponta da espádua, um tumor com fluetuação das dimen­sões de meia laranja. Convencido por mim da necessidade de se incisar o tumor foi convidado o sr. Sonza Martins, a pres-tar-mo o seu valioso auxilio. Aberto largamente o abcesso sae pela incisão algum pus da natureza do precedente. O tecido cellular sub-escapular acha-se descolado n'uma grande altura, que não pode attingir-se com o dedo. Não se encontra conmm-nicação com a pleura em toda a região accessivel á exploração digital.

E' provável que o trajecto fistuloso siga até ao hombro, ao vértice do thorax, de onde partem todos os outros.

A expectoração e o pus são então analysados pelo ex.mo snr. Pestana com o resultado seguinte:

Analyse do pus e da expectoração de F.

PUS. Glóbulos vermelhos deformados, cellulas redondas em degenerescência granulo-gordurosa. Crystaes de ácidos gordos, gottas de gordura.

N'este pus, mal ligado e muito diiluente, existem granula­ções branco-amarelladas muito iguaes e muito numerosas, nas quaes a analyse microscópica deu o segninte resultado :

Dissecadas e coradas pelo methodo do Gram, e em seguida com a eosina via-se, com uma ampliação de 300 diâmetros, uma parte central muito granulosa, corada de violeta, c outra peri-pherica irregular de côr rosada, formada de pequenas granula­ções alongadas.

Com nma ampliação mais forte o pontuado central resolve-se n'uma serie de linhas irregulares, formando filamentos myce-lianos muito delicados, terminando nos corpos rosados em forma de pêra, gonidias.

Comprimindo a preparação as gonideas destacam-se do my-celeo, de maneira a poder-se ver perfeitamente a sua forma. Pelos caracteres do pus e pela observação, que acima descrevi, a classificação d'esté cogumello è clara. E' um actinomyceo.

Na expectoração encontrei as mesmas granulações de acti-nomyces, mas em menor quantidade.

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Não encontrei bacillos de Kock, nem no pus nem na expe­ctoração, ainda que tivesse empregado mcthodos de coloração diversos, (Erbet, Zichl e Lubineff).

Encontrei alguns estaphylococceus e bacillos curtos com as extremidades arredondadas, que não me parece que sejam pa­thogenies.

Lisboa, 9 de julho de 1891.—Camará Pestana. Mais tarde apparecem na boca do thorax pequenos abcessos

metastaticos, completamente independentes dos outros. 0 pus d'estes não apresenta grumos. 0 depauperamento de forças augmenta, como a dyspnea, e o

doente pede que o deixem ir morrer à terra da sua naturalidade, proximo a Coimbra, onde esse desenlace tem logar pelo mez de outubro.

Pseudo actinomycoses.—Hoje cm dia conhecem-sc affecções clinicamente muito análogas á actinomycose, dando logar a um escoamento de pus no qual encontramos egualmente grãos ama-rcllos ou vermelhos, mas devidos a parasitas muito différentes do Actinomyceo ; são as pseudo-actinomycoscs.

A mais curiosa é a affecção descripta com o nome de Pê de Madura muitas vezes observada na India e localisada so­bretudo nos pés, podendo attingir as mãos ou outras regiões. Principiando pela planta do pé, ella evoluciona como uma ver­dadeira cárie, atacando partes molles e duras; o pé apresenta-se cdematoso, a pelle espessa e pigmentada; á sua superficie abrem-se abcessos deixando trajectos fistulosos. No conteúdo d'estes abcessos encontram-se corpúsculos do volume d'um grão do milho, com côr branca avermelhada, cinzento negro, nunca amarello enxofre. A evolução da doença é lenta mas pro­gressivamente invasora, necessitando muitas vezes a amputa­ção.

Carter foi o primeiro a dizer que o microphyto especial ao qual se attribuia a doença, não era senão o actinomyceo, por­que se apresentava com a mesma rede filamentosa central, as mesmas tumescencias massiças periphericas.

Esta opinião, foi batida por outros auetores que só viram no facto de Carter uma simples coincidência. Depois vem casos de actinomycose onde o exame bacterioscopio revela a existên­cia d'um microorganismo différente do actinomyceo. E' assim que Hesse, n'um caso mortal, encontra um eladoltirix liqucfa-ciens e Gemy e Vincent observam na Algeria uma affecção do pé semelhante clinicamente ao Pé de Madura, mas causada por um microorganismo distincto do actinomyceo pelos seus cara­cteres morphologicos e reacções de cultura.

E' provável, como diz Brocq, que a doença do Madura te­nha por causa um parasita ainda mal definido, visinho do acti­nomyceo, sobretudo pelas suas manifestações mórbidas, - mas distincto pela sua morphologia.

Depois vem a botryomycosc que também tem analogia com a actinomycose.

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Poncet e Dór observaram varias vezes uma lesão cie apparencia neoplasica, que tinha a sua sede nos dedos em 2 casos, sobre a eminência thenar n'um terceiro caso, e ao nivel da parte mais saliente do coto da espádua n'um quarto caso. Tratava-se d'uma massa cogmnelosa ul­cerada, d'um volume variando dentro d'uma ervilha e o d'uma noz, constituida por gommos lisos uniformes, muito vasculares, ligados aos tecidos subjacentes por um pediculo delgado. O exame histológico mostrava que este tumor era formado por uni tecido inrlammatorio mui­to différente das affecções neoplasicas habi-tuaes, taes como o papilloma ulcerado, o hepi-thelioma, o sarcoma. As procuras bacteriológi­cas indicavam a presença de microorganismos e a inoculação de culturas deram resultados positivos.

Os veterinários designam esta doença com o nome de cogumelo de cavallo, ou ainda cogumelo de castração, porque é com efíeito, depois d'esta mutilação que se tem practicamente observado esta affecção no cavallo.

Nos três primeiros casos, ignoraram onde e como os individuos foram contaminados. Só no ultimo é que uma picadura pode ser invocada, e só um mez depois d'ella é que o tumor fez a sua apparição.

Sob o ponto de vista etiológico não á indi­cação precisa.

E' uma affecção mais benigna que a actino-mycose.

O único tratamento verdadeiramente cura­tivo é a ablação dos tecidos doentes. O iodeto

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de potássio é considerado como um agente the-rapeutico efncaz.

Diz Lignières, director do Instituto bacte­riológico de Buenos-Ayres, e Spitz, que a doen­ça estudada por elles com o nome cie actino-ba-cillose, lembra muito a actinomycose verdadeira; ella manifesta-se por signaes clinicos muito análogos : focos caseosos ou neoformações in-flammatorias encerrando também pequenos grãos moriformes cuja peripkeria está como er-riçada de tumescencias piriformes, coradas em amarello vivo pelo picrocarmim, como os da acti­nomycose; mas depois de ter dissociado estes pe­quenos grãos, se os tratarmos pelo Gram não somos bem succedidos querendo pôr em eviden­cia os filamentos ramificados que caracterisam o streptothrix de Harz. Lignières e Spitz mos­tram que estes grãos resultam da agglomeração d'um grande numero de cocco-bacillos, que não se coram pelo methodo de Gram ao contrario do que se dá para o Actinomyceo. Isolado em culturas puras, este cocco-bacillo reproduz a doença nos animaes que foram inoculados e en-contra-se nas lesões que elle provoca os tufos raiados que caracterisam a doença natural.

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BIBLIOGRAPHÎA

De l'actinomycose chez l'homme en France par Roussel

Manuel de médecine publie sous la direction de M M. Debove et Achard.

Traité pratique de bactériologie por E. Macé Revista balear de sciencias medicas La semaine médicale La médecine scientifique Jornal da sociedade das sciencias medicas

de Lisboa Agricultura Contemporânea.

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PROPOSIÇÕES

Anatomia — O peritonei! não desce mas sobe sobre a face anterior da bexiga distendida

Thisiologia — A excitabilidade muscular é uma propriedade inhérente á propria fibra

Materia medica — A pureza do ar influe no peso das gotas

_ Tathologia externa — A dilatação varicosa das veias espermaticas é mais frequente á esquer­da do que á direita,

Operações —Na laqueação da carótida pri­mitiva prefiro afastar para dentro o canal la­ryngotracheal do que o esterno-cleido-mastoi-deu para fora,

'Partos — Não ha febre gravidica ?afhalogia interna — Na "ulcera simples do es­

tômago nem sempre a dôr sobrevem immedia-tamente depois da ingestão

Anatomia pathologica — A cura da tuberculo­se pela calcificação integra da, substancia ca-seosa é possivel; mas rara

Medecina legai — Não podemos concluir, do facto de se encontrai' um corrimento gonococci-co n u m a creança, que elle resulte d'um conta­cto venéreo

"Pathologia geral — E' condemnavel a vaccina de braço a braço

Hygiene — A creação de camarás cl'observação é um complemento necessário ás medidas de isolamento.

Pode imprimir-se. Visto, O Director,

Azevedo Maia. Moraes Caldas.