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EF
...estão autorizados para uso em
alimentos industrializados pela
Anvisa; ‘ingredientes’ mantêm
o sabor e segurança, mas faltam
estudos de longo prazo sobre riscos
351aditivos
NATÁLIA CANCIANde brasília
Ácido ascórbico, nitrito e nitrato de potássio, ácido sór-bico. A recente polêmica em torno do uso dessas substân-cias por frigoríficos investiga-dos na Operação Carne Fra-ca trouxe dúvidas para quem ficou surpreso ao saber que tais “ingredientes” são, em certos limites, permitidos (e amplamente usados): afinal, o que mais é adicionado aos alimentos industrializados?
A resposta vem da Anvisa (Agência Nacional de Vigilân-cia Sanitária), responsável por regular o uso dos chama-dos “aditivos alimentares”.
São substâncias de origem natural ou sintética que po-dem ser adicionadas duran-te a fabricação dos alimentos não para nutrir, mas sim pa-ra manter ou alterar as carac-terísticas do produto.
Entre as funções, estão ga-rantir a segurança, manter a aparência ou dar maior sabor.
Hoje, há 351 aditivos dife-rentes autorizados no Brasil, distribuídos entre 301 catego-rias ou tipos de alimentos —
além das carnes, há regras para uso deles em molhos, óleos, pães, doces, sopas e até mesmo frutas embaladas.
Um número que, segundo a Anvisa, vem crescendo nos últimos anos. Nesta semana, nove aditivos que já faziam parte da lista de alguns ali-mentos ganharam aval para serem usados em outros. “O uso de aditivos é uma questão de necessidade e não de esco-lha das empresas”, diz Airton Vialta, assessor técnico do Ital (Instituto de Tecnologia de Alimentos de São Paulo).
Segundo Vialta, a quanti-dade de aditivos utilizada de-pende de fatores como o cus-to, quantidade de ingredien-tes, tipo de processamento e embalagem utilizada.
“No leite pasteurizado, por exemplo, não se usa aditivos. No leite UHT são usados ape-nas os estabilizantes citratos e ou fosfatos, pois o produto passa por tratamento térmi-co mais severo”, afirma.
Um exemplo é o bolo in-dustrializado. Além dos clás-sicos farinha, leite, ovo e açú-car, a receita pode levar co-rantes, estabilizantes, emul-
WALTER PORTOde são paulo
Em debate sobre ciência e tecnologia realizado na Folha na quarta (29), cientis-tas que chefiam algumas das principais organizações da área cobraram maior estabili-dade nas instituições de pes-quisa e não pouparam críticas às universidades públicas.
O evento marcou o lança-mento do livro “Um Aprendiz de Quixote” (ed. Verbena, 192 págs., R$ 35), autobiografia do físico Rogério Cezar de Cerqueira Leite, integrante do conselho editorial da Folha.
Além do autor, participa-ram do debate José Goldem-berg, presidente da Fapesp, Luiz Davidovich, presidente da Academia Brasileira de Ci-ências, e Helena Nader, pre-sidente da Sociedade Brasi-
leira para o Progresso da Ci-ência (SBPC). O debate foi me-diado por Marcelo Leite, co-lunista do jornal.
Cerqueira Leite abriu sua fala dizendo que lutou a vida inteira “contra a mediocrida-de que existe em institutos de pesquisa e universidades”. O físico criticou a “estabilidade precoce” dos docentes na car-reira universitária e a “demo-cratite aguda” que teria se ins-talado desde que foram insti-tuídas eleições para reitor.
“Anos antes da eleição, co-meça um jogo de poder em que todo mundo quer o seu pedacinho”, disse. “É preciso reduzir a burocracia imensa gerada pela ‘democratite’, uma doença boa, mas que não funciona num sistema que tem que dar valor para o ta-lento e não para os favores.”
A biomédica Helena Nader,
Cientistas cobram mais financiamento e reconhecimentoEvento na Folha que marcou o lançamento do livro de Rogério de Cerqueira Leite reuniu pesquisadores que chefiam entidades na área
da SBPC, disse que é impor-tante mexer na estrutura ad-ministrativa das instituições, mas que isso precisa estar ca-sado com um fluxo contínuo de financiamento. Ela aponta que flutuações no orçamento de pesquisa estão entre os fa-tores que mais prejudicam o avanço da ciência, apontan-do a Fapesp (Fundação de Am-paro à Pesquisa do Estado de São Paulo) como uma das poucas ilhas de estabilidade.
“Cobra-se que o Brasil seja a Coreia. Basta dar o dinheiro e eu vou ser. Projetos estrutu-rantes estão sendo ameaça-dos porque [o financiamento] não tem continuidade.”
O físico Luiz Davidovich, da UFRJ, mencionou seu Es-tado como exemplo negativo na ciência. “Lá há laboratóri-os de biologia que não podem mais importar insumos.”
Ex-reitor da USP (1986-1990), José Goldemberg dis-se que é necessário instituci-onalizar a ciência no país. A USP seria o melhor exemplo disso, graças ao orçamento assegurado. Ele lamentou, porém, que as universidades não tenham um teto para gas-tos com pessoal. “Autonomia orçamentária é para adultos. Aposto que as federais não querem esse regime.”
Para os debatedores, ainda falta reconhecimento da ativi-dade por parte da sociedade. “A maioria não percebe o pa-pel estruturante da ciência e tecnologia na construção do país”, disse Davidovich.
Cerqueira Leite disse que os jornais dão pouca importân-cia à área, mas porque o pú-blico não pede. “Nós, cientis-tas, temos a obrigação de atra-ir o interesse das pessoas.”
Keiny andrade/Folhapress
Rogério Cezar de Cerqueira Leite, que lançou novo livro
sificantes, umectantes e con-servantes (veja infográfico).
“Quando preparamos o bo-lo em casa, não usamos a maioria desses aditivos por-que não precisamos da pa-dronização, atratividade e que o produto dure tanto.”
Mas uma pesquisa do Idec (Instituto de Defesa do Con-sumidor) com 96 alimentos aponta que a quantidade de aditivos varia muito de uma marca para outra. Uma bar-rinha de cereal, por exemplo, pode ter de 4 a 17 aditivos.
E não dá para usar menos?“Depende do que vou fazer
com o alimento depois que está pronto. Um biscoito em-balado tem mais aditivos que um pão francês, não para ser mais prejudicial, mas porque precisa”, diz Ary Bucione, do Brafic (conselho brasileiro de informação sobre alimentos).
Já para a nutricionista Ana Paula Bortoletto, apesar de necessários para conserva-ção, há uso excessivo. “Se usassem matérias-primas de mais qualidade, não precisa-riam ter tantos aditivos.”
Outro ponto de embates ocorre em relação aos riscos.
Para Felix Reyes, professor de toxicologia da Unicamp, há muitos mitos sobre o tema. Ele ressalta que, antes de se-rem autorizados, os aditivos passam por avaliação dos ór-gãos reguladores, que consi-deram a toxicidade e dados de consumo dos alimentos.
Para ele, porém, é preciso maior fiscalização para saber se os limites estão sendo cum-pridos. “Um corante não deve ser usado para encobrir falhas de processamento.”
Já Bortoletto, do Idec, afir-ma que, apesar dos limites apontados para uso de alguns aditivos, faltam estudos que apontem os efeitos à saúde a longo prazo e a interação en-tre diferentes aditivos.
A preocupação é maior di-ante do aumento do consu-mo de alimentos ultraproces-sados em detrimento de ali-mentos in natura.
A Abia, associação que re-presenta a indústria de ali-mentos, diz que os aditivos seguem processos rigorosos de avaliação e desempenham papel importante na seguran-ça, sabor, aparência, textura e frescor dos alimentos.
Marcelo Viana
Arquimedes: gênio matemático e da guerrafolha.com/ciencia
SextA-FeirA, 31 De MArço De 2017 B8
ADICIONADOS AOS ALIMENTOS Veja exemplos do que pode ser acrescentado e quais as funções dos aditivos
Servem pararetardar aoxidação doalimento
Vitamina EVitamina C
Bolo Leite Manteiga Doces (como balas,caramelos, pastilhas)
Frutas (embaladas) Maionese Carne industrializada(embutidos)
ACIDULANTE/REGULADORDE ACIDEZ
Altera ou controlaa acidez do pro-duto, geralmentepara evitar bactérias
Ácido cítrico,carbonato de cálcio
ESTABILIZANTES
Impedem aseparação dosdiferentes ingre-dientes usados nosalimentos e bebidas
Goma xantana
CONSERVANTES
Impede ouretarda a altera-ção dos alimentosprovocada pormicroorganismos
Ácido sórbico,propionato
ESPESSANTE
Aumenta aviscosidade doalimento
Carragena
UMECTANTE
Deixa o produtoúmido
Sorbitol
REALÇADORESDE SABOR
Realça ouproporcionaaroma aosalimentos
Acetato deoctila
EDULCORANTESARTIFICIAIS
Confere sabordoce ao alimento
Aspartame,sacarina
CORANTES
Confere, intensifi-ca ou restaura acor de umalimento
Cúrcuma,tartrazina
ANTIOXIDANTES
Fonte: Anvisa; Airton Vialta, do Ital
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