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© Revista da ABRALIN, v. 7, n. 2, p. 243-271, jul./dez. 2008. O ESTATUTO DA LINGÜÍSTICA APLICADA NO CAMPO DAS CIÊNCIAS DA LINGUAGEM E O ENSINO DA ESCRITA 1 Manoel Luiz Gonçalves CORRÊA 2 USP RESUMO A Lingüística Aplicada caracteriza-se por uma contribuição aos estudos da linguagem necessariamente informada pelos dados que analisa. Neste trabalho, ao abordar o estatuto da Lingüística Aplicada no campo das ciências da linguagem, parto da reflexão sobre o ensino de língua materna para, em seguida, tratar do ensino da escrita. ABSTRACT Applied Linguistics is characterized by a contribution to language studies, necessarily informed by the data it analyzes. In this study, upon addressing Applied Linguistics in the field of Language Sciences, I begin by reflecting on the mother tongue teaching, and then continue to address the writing skill teaching. PALAVRAS-CHAVE Ensino de língua materna. Ensino da escrita. Currículo. KEY WORDS Mother tongue teaching. Teaching of writing. Curriculum. Introdução Meu primeiro impulso ao escrever o presente trabalho foi o de mostrar como poderia funcionar na escola uma concepção da escrita que levasse em conta a heterogeneidade da língua, da linguagem e da própria escrita.

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© Revista da ABRALIN, v. 7, n. 2, p. 243-271, jul./dez. 2008.

O ESTATUTO DA LINGÜÍSTICA APLICADA NOCAMPO DAS CIÊNCIAS DA LINGUAGEM E OENSINO DA ESCRITA1

Manoel Luiz Gonçalves CORRÊA2

USP

RESUMOA Lingüística Aplicada caracteriza-se por uma contribuição aos estudos da linguagemnecessariamente informada pelos dados que analisa. Neste trabalho, ao abordar o estatutoda Lingüística Aplicada no campo das ciências da linguagem, parto da reflexão sobre oensino de língua materna para, em seguida, tratar do ensino da escrita.

ABSTRACTApplied Linguistics is characterized by a contribution to language studies, necessarily informedby the data it analyzes. In this study, upon addressing Applied Linguistics in the field ofLanguage Sciences, I begin by reflecting on the mother tongue teaching, and then continueto address the writing skill teaching.

PALAVRAS-CHAVEEnsino de língua materna. Ensino da escrita. Currículo.

KEY WORDSMother tongue teaching. Teaching of writing. Curriculum.

Introdução

Meu primeiro impulso ao escrever o presente trabalho foi o de mostrarcomo poderia funcionar na escola uma concepção da escrita que levasseem conta a heterogeneidade da língua, da linguagem e da própria escrita.

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No percurso, porém, deparei com algumas questões prévias que melevaram a desviar o rumo da discussão. Adiei meu propósito, mas aexposição a seguir, se não servir – por óbvia que poderá parecer – aoslingüistas aplicados de formação, creio que servirá ao menos àqueles que,como eu, foram levados à área por força das escolhas profissionais (nomeu caso, a permanente ocupação com o ensino de língua portuguesa) eacadêmicas (uma tese, em Lingüística, sobre a escrita de vestibulandos,em que refleti também sobre o papel da escola e, mais recentemente, umpós-doutoramento no LIDILEM3, em didática da escrita).

Tomo, como ponto de partida, o livro Lingüística Aplicada etransdisciplinaridade: questões e perspectivas, organizado por Signorini eCavalcanti, em 1998. Mais especificamente, refiro-me aos artigos deSignorini (“Do residual ao múltiplo e ao complexo: o objeto de pesquisaem Lingüística Aplicada”) e de Kleiman (“O estatuto disciplinar daLingüística Aplicada: o traçado de um percurso, um rumo para o debate”),este último, em particular, no que se refere à abordagem crítica que fazda relação entre pesquisa e aplicação, por meio da qual a autora caracterizaa Lingüística Aplicada (doravante LA) em função da relevância socialque norteia as suas pesquisas. A necessidade de retornar ao tema é pessoale busca atender a uma demanda específica do ensino de língua portuguesa,questão com a qual trabalho.

Refletir sobre o estatuto da Lingüística Aplicada no campo das ciênciasda linguagem e propor, nesse campo, um lugar para o ensino (e, nopresente trabalho, para o ensino da escrita) não são tarefas fáceis nem,tampouco, novas, como exemplificam os títulos dos trabalhos a que acabode me referir4. Minha dificuldade pode ser ainda maior porque parto doestatuto da LA (itens 1 e 2, a seguir) para pensar a língua portuguesa naescola – como disciplina do currículo e como objeto de estudo/de ensino– (item 3, a seguir), fato que me impõe a busca de uma concepção decurrículo e de língua. Só então, passo à abordagem do ensino (e do ensinoda escrita, em particular - item 4, a seguir). Mesmo consciente dadificuldade, será esse o percurso que seguirei neste trabalho.

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A retomada do tema da relação entre pesquisa e aplicação provém deuma dúvida quanto à relação entre teoria e prática5 e entre objeto deestudo e objeto de ensino na constituição da LA. Como se sabe, entrelingüistas e outros não-especialistas, a LA já foi pensada como umaaplicação da Lingüística, lugar da prática, por oposição à Lingüística“pura(?)”, lugar da teoria. O esquema mais automático e recorrente parase pensar tal relação é a separação entre objeto de estudo (a “língua”, cujoestudo é atribuído à Lingüística) e objeto de ensino (as práticas didáticasde seu ensino, cuja investigação caberia à LA). Essa não é, porém, a visãodos estudiosos em LA, que vêem, em vez de uma relação de dependênciada LA em relação à Lingüística, uma grande distância entre elas. É o queenfatiza Kleiman, quando afirma: “Considero que a Lingüística Aplicadatem tanto, ou tão pouco, a ver com a Lingüística como a pesquisa médicaclínica sobre a senescência tem a ver com a neuroanatomia” (1998, p. 53).

Contra essa mesma idéia de aplicação da Lingüística, argumento nestetrabalho que, ao tratar da língua(gem) e de seu ensino, a LA se ocupa6,em dois sentidos, de um objeto complexo. Num primeiro sentido, essacomplexidade se deve ao fato de que a LA deve lidar com a língua(gem)como um objeto, ao mesmo tempo, de estudo/de ensino. Num segundosentido, ocupa-se, por um lado, de um objeto de estudo (língua/linguagem) complexo – lida com a língua em discurso e não simplesmentetomada como organização gramatical, sistema ou coisa equivalente. Poroutro lado, ocupa-se de um objeto de ensino complexo – na práticadidática, explora o caráter reflexivo e processual da linguagem (ênfasenas atividades lingüísticas/epilingüísticas) e não simples e tão-somente datransmissão de uma reflexão acabada sobre a linguagem (ênfase naatividade metalingüística7). Ainda para situar meu argumento e, ao mesmotempo, para mostrar como a separação que critico está entranhada naprópria LA, recorro a uma noção bem conhecida, a de transposição didática.

Por um lado, essa noção contradita a pecha de aplicadora que temsido imposta à LA, já que busca dar contornos teóricos à prática didática.Ora, tal tratamento dos dados lingüísticos, baseado na informação que a

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prática didática fornece à teoria, já permite pensar que a LA trabalhacom um objeto complexo, constituído no diálogo nunca acabado entreseus dois modos de abordar a linguagem: como objeto de estudo/deensino. Por outro lado, não deixa de ser verdade que a mesma pechapode ressurgir numa outra leitura da expressão transposição didática. Nelaparece manter-se a idéia de separação entre dois lugares de reflexão: umadimensão configurada num espaço-tempo (o da teoria) que, nummomento posterior, deverá ser levada (transposta) a uma outraconfiguração espaciotemporal (a da prática).

Para reafirmar essa flutuação e propor uma saída, retomo a definiçãoutilizada por Machado:

A transposição didática é por nós compreendida como o conjuntodas transformações que um determinado corpo de conhecimentoscientíficos invariavelmente sofre, com o objetivo de ser ensinado,implicando, necessariamente, determinados deslocamentos,rupturas e transformações diversas nesse conjunto de conhecimentos,e não como uma mera aplicação de uma teoria de referênciaqualquer. No nosso caso específico, os conhecimentos científicosde que nos servimos provieram, basicamente, (...) do chamadointeracionismo sócio-discursivo (2000, p. 1).

Destaco dessa definição menos a idéia de transformação, que aindamantém a de deslocamento entre dois lugares de reflexão isolados, e maisa recusa da “mera aplicação”. Nesse sentido, particularizo o destaque parao que a autora menciona como rupturas de conhecimentos, no meu modode ver, resultantes do acontecimento discursivo por meio do qual taisconhecimentos são postos à prova pela prática didática. Com essesdestaques, interessa-me defender a idéia de que a LA de fato estabelececontornos teóricos (não é apenas aplicação) para a prática didática, o quepermite reinterpretar as rupturas de conhecimentos como diálogo sempreaberto, constitutivo do objeto complexo de que se ocupa.

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1 Fato lingüístico e fatos sócio-históricos na LA

A história da Lingüística pode ser contada com base na relação que,desde seu surgimento, propõe entre fatos lingüísticos e fatos sociais ehistóricos. A própria lingüística saussuriana, nos seus contornos iniciais,define-se como uma parte da Semiologia, que, por sua vez, “constituiriauma parte da Psicologia Social e, por conseguinte, da Psicologia Geral”(SAUSSURE, 1975, p. 24). Ademais, Saussure, ao propor a língua comoum sistema de signos definidos por suas relações internas, espelha essaordem da língua na ordem da sociedade e, mesmo não respondendo àsquestões sobre o processo de construção do sentido no texto, tem, naprodução coletiva, social, o seu grau máximo de generalidade.

Dada a relação, ainda que contraditória, entre o fato lingüístico e ofato social (e mesmo o fato histórico na comparação entre sincronias),não é de estranhar que a Lingüística saussuriana tenha influenciadofortemente outras áreas de estudo no campo das ciências humanas, taiscomo a Teoria da Literatura, a Antropologia, o estudo dos sistemas demoda etc. Foucault (1969) lembra, também, a contribuição da Lingüísticano que se refere a uma Lógica Formal, para a qual, mais do que centrar oestudo em relações de causalidade, seria possível propor uma lógica doreal. O que está em jogo, nesse caso, é o abandono de um estudo dosdados do real que atentasse apenas para as relações baseadas em umatemporalidade meramente cronológica, em favor de uma lógica do real,baseada, sobretudo, nas relações que definem esses dados como tais. Dasrelações sistemáticas, surgiriam, portanto, os objetos de estudo e, a partirdaí, se poderia chegar a uma lógica do real.

No desenvolvimento que a Lingüística observou no decorrer do séculoXX, a relação entre fato lingüístico e fato social ganha novos contornos,de tal modo que as relações sistemáticas, embora no horizonte das novasdisciplinas nascidas como subáreas da Lingüística, deixam de ser oparâmetro único para construção dos objetos de estudo. Em diferentesperspectivas, passa-se a integrar como parte de seus objetos de estudo o

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traço mais trivial da linguagem ordinária, que é a sua ocorrência nomundo, vale dizer, o seu caráter de fato social e histórico. Tal ocorrênciaora vem tratada como uso (Sociolingüística Variacionista, por exemplo),ora como ato/na comunicação (Teoria da enunciação), ora como ato/naação pela linguagem (Pragmática), ora como prática (Análise do discurso).Disciplinas como a Sociolingüística, a Teoria da Enunciação, a Pragmáticae a Análise do Discurso derivam, pois, sua especificidade das diferentesperspectivas por meio das quais estudam o sistema da língua e suacolocação em funcionamento.

2 Fato lingüístico e fato sócio-histórico na LingüísticaAplicada

Diferente é o estatuto da Lingüística Aplicada. Tida, por muito tempo,como uma subárea da Lingüística8, a LA caracteriza-se por umacontribuição aos estudos da linguagem necessariamente informada pelosdados que analisa. Para dizer de outro modo, fato lingüístico e fato sócio-histórico se aproximam de uma forma especial nas pesquisas em LA, eessa aproximação traz questões que requerem uma contribuição tambémespecial de áreas vizinhas na constituição de seu objeto de estudo. Váriospesquisadores descrevem essa contribuição como uma relaçãotransdisciplinar, segundo a qual, assentadas num acordo teórico-metodológico que extrapola as fronteiras disciplinares, duas ou maisdisciplinas são mobilizadas para darem conta da formulação de um dadocomo objeto de estudo. A se considerar, radicalmente, o fato de que suascontribuições são informadas pelos dados que analisa, a LA pode obedecera diferentes ênfases, mais, ou menos, ligadas à Lingüística, o que lhe dáuma mobilidade que foge à disciplinarização tradicional do campocientífico das Ciências da Linguagem.

Se a LA ainda é, vez ou outra, desprestigiada por pesquisadores dedisciplinas vizinhas, creio que é em razão de ter sido posta na situação(ou de ter voluntariamente ocupado a posição) de simples aplicadora das

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descrições feitas em outros campos do saber formal. O caso mais gritanteé a sua relação com a própria Lingüística. A esse respeito, difere, porexemplo, da relação que uma disciplina como a SociolingüísticaVariacionista mantém com a Lingüística. Ao tomar a descrição da variaçãoe da mudança lingüísticas como preocupações centrais no estudo de umadada língua – seu objeto de estudo – restará, ao pesquisador, ao final deuma descrição, assumir ou não – como uma finalidade – a sua aplicaçãoao ensino. Nada de parecido ocorre com a LA. Instada a ocupar-se, desdea sua constituição, de um objeto de estudo complexo, cada vez mais seimpõe à LA a tarefa de constituí-lo em sua complexidade específica, istoé, em função de um tratamento da língua(gem) como objeto de estudo/de ensino. Para fazê-lo, o território disciplinar tradicional não basta.Ciências da Linguagem e Ciências Humanas de maneira geral deverãoser evocadas na construção de um objeto que é, ao mesmo tempo,lingüístico-discursivo, social e histórico. Refletir sobre os postuladosteóricos assumidos e, ao mesmo tempo, deixar que os dados informem(e sejam informados por) esses postulados é um modo de desnaturalizartanto a teoria como os dados empíricos e de não fugir à complexidade doobjeto a ser construído. Eis, a meu ver, o maior desafio da LA, mas,também, uma boa razão para marcar seu interesse como um fazer científicoque pode se constituir numa alternativa à disciplinarização exclusivista jáconhecida no campo das Ciências da Linguagem.

3 Ensino de língua materna: “língua portuguesa” comoobjeto complexo da LA

O objeto complexo que se impõe à LA e o tipo de relação que elamantém com outras disciplinas, pertencentes ou não ao campo daLingüística ou das Ciências da Linguagem, contribuem, a meu ver, parauma reflexão sobre o ensino de língua portuguesa no Brasil e, emparticular, sobre o ensino da escrita, na qualidade de legítimos objetos deestudo da LA. Comecemos pela expressão “língua materna”.

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A referência da expressão “língua materna” pode ser problematizada:ora por conter elementos estranhos à variedade lingüística “materna” dosalunos (basta lembrar a distinção entre alunos das chamadas classescultivadas e alunos vindos do restante da sociedade), ora pelo fato de queas línguas nem sempre são maternas do ponto de vista de sua constituiçãodiacrônica, do ponto de vista da intensidade dos contatos com outraslínguas ou mesmo do ponto de vista da memória discursiva que registram.A colagem desses pedaços de identidades, embora imperceptível no seuuso em uma dada sincronia, é tão artificial quanto a reconstrução deuma língua como o indo-europeu (língua de todos os falantes de umtronco lingüístico, mas de nenhum deles) ou de um sistema como osaussuriano, alheio aos seus exteriores. Segundo Tabouret-Keller:

...é necessário e suficiente que uma língua seja falada para que sediversifique e mude, esse sistema postulado é um sistema aberto. Econtinua: a menor observação de uma situação de contato delínguas, da aprendizagem de tipo escolar à alternância socialmenteintegrada, impõe a representação de uma inter-relação dinâmica.(1998, p. 164, tradução minha).

Contrariamente a essa representação dinâmica, parece haver uma lutaconstante para domar a heterogeneidade da língua. Seja no uso impensadode uma colagem sincrônica (de histórias, de contatos e de memóriasdiscursivas), seja na reconstrução diacrônica ou na construção teórica,neutralizam-se as diferenças em razão do efeito de homogeneidade criadopor esses procedimentos. Um movimento contrário que radicalizasse aatenção às diferenças, atentando, por exemplo, para as incompreensõesque iluminam as diferenças de identidade, teria o efeito de problematizara maternidade da língua materna. Ela deixaria, nesse caso, de ter comoelemento definidor o aprendizado no ambiente familiar, cujahomogeneidade só pode ser vista à custa do esquecimento dos parricídios.

Voltemos, no entanto, ao seu sentido rotineiro. Um aspecto centralno que se refere ao ensino de língua materna, e de língua portuguesa, em

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particular, é a diferença de formulação – entre a LA e as disciplinas vizinhas– no que concerne ao objeto comum “língua portuguesa” como objetode estudo. Esse aspecto advém dos objetos evocáveis pela expressão “línguaportuguesa”, entendida não só como uma disciplina curricular – construçãosocial cara às discussões feitas no campo das ciências da educação9 –, mastambém como um objeto construído (e... desconstruído) teoricamenteno campo dos estudos da linguagem. Diferentemente das disciplinasvizinhas, ambos os sentidos da expressão “língua portuguesa” compõemseu objeto, lembrando que também o seu “ensino” é, para a LA, umaquestão integrante.

3.1 Lingüística Aplicada e as teorias do currículo

Considerando que a LA se nutre de pesquisas de áreas vizinhas, busco,primeiramente, nas Ciências da Educação, um tema freqüentementedesconsiderado pelos estudiosos da linguagem, o do “currículo”, para,em seguida, discuti-lo no âmbito das ciências da linguagem e, emparticular, na LA.

Para situar a questão do currículo, parto de Bourdieu, em ensaio queinvestiga o alcance de uma sociologia da transmissão institucionalizada dacultura, tida pelo autor como um dos caminhos mais significativos dasociologia do conhecimento.

Bourdieu afirma que a cultura escolar propicia aos indivíduos um corpocomum de categorias de pensamento que tornam possível a comunicação(1967, 1982, p. 205). Ou seja, a Escola, incumbida de transmitir estacultura [a cultura erudita em sua qualidade de código comum, mas tambémde conjunto comum de esquemas fundamentais, previamente assimilados]constitui o fator fundamental do consenso cultural nos termos de umaparticipação de um senso comum entendido como condição de comunicação.Mesmo os desacordos, que opõem os intelectuais de uma época acercados ‘grandes problemas do tempo’, supõem um acordo nos terrenos dedesacordo, e os conflitos manifestados entre as tendências e as doutrinas

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dissimulam, aos olhos dos que deles participam, a cumplicidade em queimplicam e que choca o observador estranho ao sistema. Segundo o autor, osesquemas fundamentais constituídos pela cultura permitem articular umainfinidade de esquemas particulares diretamente aplicados a situaçõesparticulares. Desse modo, os topoi (que incluem pares de oposição comopensamento/ação, essência/existência, contínuo/descontínuo) não são apenaslugares-comuns mas também esquemas de invenção e suportes daimprovisação (op. cit., p. 206-8).

O estabelecimento do currículo escolar pode ser visto num quadrogeral aproximado ao que acabo de tentar compor com base em Bourdieu.As escolhas curriculares, determinadas historicamente, estão, pois, sujeitasà dinâmica das relações de poder. Com uma circunstância agravante emsociedades com fraca penetração das instituições: tais escolhas podem sefixar por períodos mais (ou menos) longos a depender de tipos de regimesque se estabeleçam ou de intervenções que visem a marcar a simplesalternância de poder dentro de um mesmo regime. De todo modo, semprerefletirão a hierarquia dos objetos de estudo legítimos para uma dada época.Segundo o sociólogo francês, essa

hierarquia dos objetos de estudo consegue impor-se de maneiratanto mais total por não haver a necessidade de ser explicitadauma vez que ela aparece como se estivesse depositada nosinstrumentos de pensamento que os indivíduos recebem no cursode sua aprendizagem intelectual (idem, p. 212-3).

Um exemplo brasileiro de construção de um campo de legitimidade éa proposta, para o ensino fundamental e médio, de “parâmetros”curriculares, parâmetros que se aplicam tanto à elaboração do currículocomo à interpretação do já estabelecido.

Uma boa ilustração a respeito dos Parâmetros Curriculares Nacionaisé a questão da educação indígena no Brasil. Do trabalho de Cavalcanti(1999, p. 395 e passim) sobre o ensino bilíngüe no contexto de minorias

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lingüísticas, destaco, por exemplo, a representatividade jurídica que aeducação indígena vem tendo nos últimos vinte anos, historicamentemarcados pelo processo de conquista das chamadas liberdadesdemocráticas. Cavalcanti lembra, naquele trabalho, que somente naConstituição de 1988, as comunidades indígenas têm, assegurado, odireito à educação bilíngüe. E continua:

Um parêntese é necessário, neste ponto, para lembrar que ‘somenteem 1991 a educação indígena foi introduzida na constituiçãobrasileira como sendo responsabilidade do governo’ (CAVALCANTI,1996a). Em 1994 orientações escritas para uma política educacionalindígena foram produzidas pelo Ministério da Educação (Ministérioda Educação e Cultura, 1994). E em 1998, foi publicado o ReferencialCurricular Nacional para Escolas Indígenas (idem, p. 395).

Apesar de fazer constar esses passos na direção de uma representatividadejurídica formal, Cavalcanti faz uma ressalva importante ao integrar aeducação indígena ao contexto maior do ensino bilíngüe:

Nos Parâmetros Curriculares, no entanto, as questões aquifocalizadas são mencionadas, porém, não são elaboradas ouenfatizadas. E entre aparecer no documento e ser efetivamente parteda escola existe uma distância grande e essa distância passa peloscursos de formação de professores assim como passa pelas decisõesde políticas lingüísticas e educacionais. (idem, p. 396).

Retomando o tema do currículo e a despeito dos questionamentosquanto à efetividade desses direitos formalmente conquistados, o campode legitimidade aberto pelos Parâmetros corresponde, como dizíamos, auma construção social que caracteriza um reconhecimento explícito deobjetos de estudo legítimos. Em outras palavras, “estabelecer parâmetros” éreconhecer um referencial “cultural” em torno do qual se firmam

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indicações para o estabelecimento do currículo e para a interpretação dojá existente.

Com efeito, é o que afirma Silva (2005), ao relatar uma contribuiçãocentral das chamadas teorias críticas do currículo e que, segundo o autor,permanece válida. Ainda segundo o autor, essa contribuição se especificano fato de que o currículo é produto de uma construção social de tal modoque a pergunta mais pertinente sobre ele não é “quais conhecimentos sãoválidos?”, mas sim “quais conhecimentos são considerados válidos?” Nopresente trabalho, não entro na importante discussão feita pelo autorsobre as passagens das teorias tradicionais para as teorias críticas e destaspara as teorias pós-críticas do currículo. Assumo, porém, o currículo comouma construção social e, também, a observação de Bourdieu (um dosrepresentantes das chamadas teorias críticas do currículo), formulada nosseguintes termos:

A escola não cumpre apenas a função de consagrar a ‘distinção’ –no sentido duplo do termo – das classes cultivadas. A cultura queela transmite separa os que a recebem do restante da sociedademediante um conjunto de diferenças sistemáticas: aqueles quepossuem como ‘cultura’ (no sentido dos etnólogos) a cultura eruditaveiculada pela escola dispõem de um sistema de categorias depercepção, de linguagem, de pensamento e de apreciação, que osdistingue daqueles que só tiveram acesso à aprendizagem veiculadapelas obrigações de um ofício ou a que lhes foi transmitida peloscontatos sociais com seus semelhantes [(1967, 1982, p. 221)].

Essa consagração da diferença por parte da escola aplica-seapropriadamente ao contexto brasileiro atual. Com essa crítica, ganhanovo significado a idéia, exposta pelo próprio Bourdieu, de que: “a culturaescolar propicia aos indivíduos um corpo comum de categorias de pensamentoque tornam possível a comunicação” (op. cit., p. 205). Da distinção entreclasses cultivadas e o restante da sociedade, conclui-se que o corpo comum

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de categorias de pensamento não chega a atingir igualmente a todos osalunos. A sugestão para solucionar esse impasse vem em obra posterior,publicada em 197010. Sirvo-me do comentário de Silva sobre a pedagogiaracional, proposta por Bourdieu e Passeron, que consiste em que as criançasdas classes dominadas tenham uma educação que lhes possibilite ter – naescola – a mesma imersão duradoura na cultura dominante que faz parte – nafamília – da experiência das crianças das classes dominantes (2005, p. 36).

Para encerrar esta breve menção às teorias do currículo, exemplificoum posicionamento que considero como francamente pós-crítico. Trata-se da oposição, proposta por Gallo, entre currículo disciplinar e currículorizomático. Segundo o autor:

...enquanto o currículo disciplinar é fechado, justamente por suporuma unidade (dada de antemão ou a ser recuperada posteriormente,tanto faz...), um currículo rizomático é aberto, sobretudo por seruma aposta na multiplicidade, sem almejar uma unidade dada oua ser construída mas, exatamente ao contrário, um investimentono desmonte de qualquer simulacro de unidade que nos é imposto(2004, p. 47).

Embora a abordagem lingüística que adoto neste trabalho possa, emalguns momentos, ser vista por alguns como mais próxima às chamadasteorias pós-críticas, atenho-me a pontos comuns entre teorias críticas eteorias pós-críticas do currículo. Desse modo, assumo, com ambas ascorrentes, que o currículo é uma construção social e, como tal, é umaquestão de saber, identidade11 e poder (SILVA, 2005, p. 147), tendo umpapel formativo (idem, p. 149). Há que se ressalvar as diferenças de enfoqueque, grosso modo, caracterizo como marcadas por sentidos totalizantesnas teorias críticas e particularizantes nas teorias pós-críticas.

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3.2 Lingüística Aplicada e a língua portuguesa comodisciplina do currículo

Pelo que acabo de expor sobre as teorias do currículo, creio ter ficadoclaro que a própria noção de currículo é polêmica. Proponho-me, nesteponto, aprofundar a polêmica, ao refletir sobre a não-naturalidade dainclusão da disciplina “língua portuguesa” no currículo das escolasbrasileiras e ao problematizar a sua construção como objeto de estudo.Parto da constatação de que a expressão “língua portuguesa” é entendida,com freqüência, simplesmente como se referindo a uma disciplina docurrículo. No campo da LA, um tal entendimento deixa a descoberto ofato de que a disciplina curricular “língua portuguesa” não se dá à análisecomo um objeto “natural”. E em dois sentidos: nem como disciplina docurrículo nem em sua materialidade lingüística de idioma histórico. Pelocontrário, do ponto de vista da LA, creio ser preciso construí-lo comoobjeto complexo.

Para seguir abordando a inclusão da língua portuguesa no currículo esobre a construção desse objeto pela LA, retomo o exemplo dos PCN (1ªa 4ª - Língua Portuguesa), que, como o próprio nome já diz, não sefurtam a enfrentar o assunto.

Pensando nas diretrizes dos PCN no que se refere a como tratar oselementos componentes do currículo nas escolas do Brasil, a inclusão deparâmetros para o ensino parece, à primeira vista, tão natural quanto ainclusão da própria língua portuguesa no currículo. A naturalidade desua presença no currículo e dos documentos a ela atinentes parece mesmoprescindir de explicitação, já que o objeto a que se refere (a línguaportuguesa) ocupa – para usar a terminologia de Bourdieu – alta posiçãona hierarquia de nossos instrumentos de pensamento. Estranho, portanto,seria não vê-la contemplada pelo documento oficial em questão. Menosevidente, porém, é a efetividade do mesmo documento, especialmenteno que se refere a outras línguas maternas. É o caso das línguas indígenasque só muito recentemente vem ganhando espaço próprio12.

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Já no que se refere ao papel dos Parâmetros quanto à interpretação doobjeto “língua portuguesa”, não se evidencia, nos PCN, a sua concepçãocomo um objeto complexo, no sentido que estamos dando a essaexpressão, ou seja, integrando o caráter de objeto de estudo/de ensino.Naturalmente, não me refiro, quando falo de objeto de ensino, à falta dediretrizes gerais sobre o trabalho em sala de aula, as quais de fato podemser inferidas do documento, mas faço referência ao sentido dessaintervenção. A meu ver, tais diretrizes partem de pressupostos já dadosem outros lugares teóricos – os das várias disciplinas reunidas em tornoda Lingüística – e não de um lugar teórico sustentado na relação entreobjeto de estudo/de ensino – trabalho transdisciplinar que a LA já defendehá algum tempo.

Quanto à abordagem teórica da língua portuguesa, diferentescontribuições sobre os modos de compreender a língua e seufuncionamento chegaram à escola e estão disponíveis nos Parâmetros.No entanto, em que pese o trabalho já consolidado na LA, é sintomáticoque não se registrem contribuições específicas desse campo de estudo, aomenos nos PCN (1ª a 4ª séries – Língua Portuguesa). É o que se podeobservar num trecho da introdução dos PCN (1ª a 4ª séries, volumededicado à língua portuguesa), em que se faz referência às contribuiçõesdas ciências da linguagem:

As condições atuais permitem repensar sobre o ensino da leitura eda escrita considerando não só o conhecimento didáticoacumulado, mas também as contribuições de outras áreas, como apsicologia da aprendizagem, a psicologia cultural e as ciências dalinguagem. O avanço dessas ciências possibilita recebercontribuições tanto da psicolingüística quanto da sociolingüística;tanto da pragmática, da gramática textual, da teoria dacomunicação, quanto da semiótica, da análise do discurso (1997,p. 15, grifo meu).

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Observe-se que são nomeadas, quase exaustivamente, várias disciplinasdo campo das ciências da linguagem. O que explicaria o esquecimentoda LA? Talvez a idéia de que seu trabalho devesse começar ao final dosparâmetros, isto é, no momento da “aplicação” ou, ainda, a idéia de que,defendendo a transdisciplinaridade, estaria em todas as disciplinas, nãohavendo, portanto, necessidade de mencioná-la. Em ambos os casos,caricaturas sobre um campo de estudo que, no entanto, é central para apesquisa e o ensino da língua e da linguagem.

No que se refere ao ensino de língua materna, a grande novidade daLA em relação às subáreas da Lingüística é que ela não pode isolar objetode estudo/de ensino para, só depois da fase de descrição, tomar o objetode ensino como uma finalidade a ser alcançada (a de aplicar umconhecimento no final do percurso). Seja, pois, quanto ao ensino ou aqualquer outra demanda social, sua primeira contribuição é a de dedicar-se à construção de objetos de estudo complexos, que, por essa razão, exigemuma formulação baseada nas regularidades das práticas sócio-histórico-discursivas e na relação transdisciplinar com áreas de estudos afins. Emuma palavra: uma contribuição que advém de seu modo particular defazer ciência.

Para ilustrar a dificuldade desse tratamento singular da linguagempor meio da constituição múltipla de um objeto, ao mesmo tempo deestudo/de ensino, sirvo-me da palavra de um pedagogo e historiadornuma passagem em que expõe seu modo de ver a organização do quechama currículo da contemporaneidade. António Nóvoa afirma que, nosúltimos vinte anos, mais precisamente a partir de 1985, com YvesChevallard, vulgarizou-se o conceito de ‘transposição didática’ para explicara passagem do ‘saber científico’ a saber ensinado. Segundo o autor: “a cadeiada ‘transposição didática’ explica a passagem dos saberes a currículo formal(objetivos e programas), depois a currículo real (conteúdos de ensino) e,finalmente, a aprendizagens feitas pelos alunos.” Destaca, ainda, a importânciadesses trabalhos: “na medida em que explicaram o processo de transformação(e não de mera transmissão) dos saberes.” Mas introduz uma ressalva: “tem

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faltado uma compreensão mais exata do trabalho docente.” E arremata:“... é por isso que, em vez de transposição didática, temos falado de transposiçãodeliberativa.” (2004, p. 27). Nessa sugestão do autor, leio o caráter múltiplodo objeto proposto, pois a transposição deliberativa abre para as situaçõesde ensino tomadas como acontecimentos discursivos em que podem surgirencontros imprevistos de saberes.

Para ser mais concreto, uma contribuição muito bem-vinda da LAseria a de discutir qual objeto de estudo/de ensino é esse que se nomeia ea que se dá estatuto de língua oficial do Brasil e que se impõe como partedo currículo. Retornamos, desse modo, à problematização sobre a expressão“língua materna”.

De que modo a LA, como participante das ciências da linguagem,abordaria uma questão como essa? A meu ver, de uma perspectiva plural,como faz Canut, no campo da Sociolingüística, ao tratar do nome daslínguas. Em trabalho de 2000, a autora, explorando ela própria a fronteiraentre a Lingüística, a Antropologia e a Sociolingüística, mostra que:

a denominação das línguas resulta de uma construção social, deuma vontade de homogeneização notadamente no interesse de duascategorias de “dadores de nomes”: as instituições (Igreja, Estado,Justiça, etc.) e os lingüistas, apesar de ser praticada de maneiratotalmente heterogênea e variante pelos locutores em função dassituações. (op.cit., p. 1-2, tradução minha).

A fixação da língua oficial do Brasil e daquela que constará no currículonão está, pois, desligada dessa construção social que é a atribuição de umnome à língua. Justamente porque são diferentes, as nomeações recortamdiferentemente o real, encarnando cada uma delas, nos termos de Bourdieu,um diferente consenso cultural em termos da participação num senso comumentendido como condição de comunicação (1967, 1982, p. 206-7).

Decisões teóricas importantes são, pois, tomadas no momento daescolha de um nome para a língua, já que, por meio dessa escolha, não se

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recorta apenas um objeto de estudo/de ensino, mas se legitima uma históriae se silencia(m) outra(s). Como se sabe, no Brasil, denominações comoLíngua brasileira, Português do Brasil e Língua portuguesa marcam pontosde vista bastante distintos quanto ao estabelecimento e à constituição dalíngua de Portugal no Brasil e também quanto ao seu vínculo com amatriz. Creio que não se pode tratar essa construção social do currículocomo objeto de ensino sem que nos perguntemos sobre a história que elalegitima. Esse é o ponto central que a questão do currículo traz para adiscussão do objeto complexo da LA. No momento em que se elege/excluiuma construção social sobre a língua, faz-se a passagem que define umapolítica lingüística, lugar onde se encontram objeto de estudo/de ensino.

Ao mesmo tempo, buscar essa história é dar historicidade ao objetocomplexo assim construído. Passa-se, portanto, da complexidade teórico-metodológica de constituição de um objeto complexo para acomplexidade de um objeto histórico. No caso do ensino de língua, dá-se um passo na direção da complexidade de um idioma histórico, queinclui, na palavra “histórico”, não só um sinônimo do adjetivo pátrio(idioma “brasileiro”, “do Brasil”, “português”) mas também a historicidadedos vários agentes do ensino e de seus saberes sobre a língua.

Portanto, na decisão sobre qual história legitimar, já estará presenteuma perspectiva teórica para se tratar o objeto complexo que se configura.Se essa escolha teórica fizer falar a história da constituição dessa construçãosocial, o objeto de ensino já estará ganhando corpo, de tal modo que osagentes da educação (penso, principalmente, nos alunos e professores,mas também nos demais agentes que participam e, de certo modo,regulam a efetivação da prática educacional) poderão atuar sobre ele, jánão mais como imposição disciplinar, mas como trabalho com alinguagem e com o próprio idioma histórico, o qual, no final das contas,é, para os não-especialistas, o objeto material mais concreto a que podematribuir as formas que tomam as suas vivências. Naturalmente, um taltrabalho com a língua e a linguagem será tanto mais efetivo quanto maisse considerar a relação entre fato lingüístico e fato sócio-histórico.

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4 O ensino da escrita em Lingüística Aplicada: entre aadequação e o acontecimento

No que se refere à formulação mais específica relacionada ao ensinoda escrita, a assunção da complexidade do objeto de estudo da LA podeser útil ao tratar da relação entre dois tipos de práticas lingüísticas: afalada e a escrita. Restringindo-me à produção escrita, retomo umaconcepção com que tenho trabalhado nos últimos anos e que se baseiana heterogeneidade das relações entre práticas de oralidade e deletramento.

Ocupar-se do trânsito entre práticas orais e letradas e com o diálogocom o já falado/escrito também é conceber o trabalho com a LA comoinformado pelos dados que analisa. Eqüidistante do já institucionalizadoe do ineditismo de práticas orais e letradas trazidas pelo escrevente, oprofessor/pesquisador poderá redirecionar a atenção do recurso à adequaçãosituacional do texto para fixá-la na “experiência do acontecimento”13. Emoutras palavras, poderá fixar sua atenção radicalmente nos processos e nãonos produtos.

4.1 Uma concepção de escrita

Para sintetizar minha posição sobre a escrita, recupero trabalho de 2001,em que proponho três modos de reconhecimento da heterogeneidade daescrita:

(A) por meio de aspectos da representação gráfica, já que, no processoda escrita, o escrevente oscila entre a tentativa de representação decaracterísticas fonético-fonológicas (segmentais e/ou prosódicas)detectadas em sua variedade lingüística falada e a convençãoortográfica institucionalizada, esta última baseada, como se sabe,na variedade submetida à normalização e posterior codificação;

(B) pela referência à heterogeneidade da língua, pois, se a admitimoscomo estruturalmente marcada no sistema – contribuição trazida

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pela Sociolingüística Variacionista – não há razão para não admiti-la na escrita, com a condição de que esta última seja vista como ummodo de enunciação e não apenas como uma tecnologia;

(C) pela circulação dialógica que o escrevente faz ao produzir o textoescrito, uma vez que lida: (a) com o que imagina ser a representaçãotermo a termo da fala pela escrita; (b) com o que imagina ser – apartir de suas experiências com a escrita e com a própria visão escolarsobre a escrita – o código escrito institucionalizado; e, finalmente,(c) com o que imagina ser a relação apropriada com a exterioridadeque constitui o seu texto: outros textos, a própria língua, outrosregistros, outros enunciadores, o próprio leitor.

4.2 Heterogeneidade da escrita: entre a novidade daadequação e a experiência do acontecimento

Mais recentemente (CORRÊA, 2007), partindo de Marcuschi (1998) ede Barzotto (2004) defendi, para o estudo da escrita, que há uma novidadena adequação, fato que põe um problema às recomendações tradicionaisde manuais, de gramáticos e mesmo de lingüistas no que se refere a adequara linguagem (falada ou escrita) às diversas situações. Aproximando anovidade da adequação à noção de acontecimento discursivo, recuso assumireste último simplesmente como virtualidade imprevista dos atos decomunicação. Proponho, ao contrário, entendê-lo como uma questãode experiência – tanto no sentido da novidade que toda experiência traz,quanto no sentido de retomada do já experimentado, o que permiteentender experiência também como memória.

Além disso, o “já experimentado” a que me refiro não é simplesmentea memória do já vivido empírico. Isto porque muitas vivências simbólicasescapam à remissão a uma ocorrência lingüística particular, mas podemser pensadas, por exemplo, como feixes de enunciados que, de idades ede espaços díspares, se cruzam e atuam sobre a dispersão das lembranças14

para compor uma memória. Abordar a escrita pelo prisma da experiência

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do acontecimento é, pois, fugir tanto quanto possível dos modelos e,também, da recomendação, na escrita escolar, da simples adequação,incluída a adequação aos gêneros discursivos, hoje bastante em moda nasescolas.

Reafirmo, desse modo, formulação anterior para a noção deacontecimento discursivo: não se reduz à situação, nem dá nome à atividadedo autor do texto nem à do seu leitor. Pelo contrário, só se materializa narelação que se estabelece entre as figuras do autor e do leitor. Quanto àsua materialidade, se às figuras textuais do autor e do leitor pode-se fazercorresponder um corpo, nenhum corpo se pode atribuir à relação entreelas. Nesse sentido, um texto como acontecimento a ler (PÊCHEUX,[(1988)]; 1990, p. 52) não é nem a matéria gráfica ou sonora nem osuporte em que elas se inscrevem; não se reduz, portanto, a esses corpos.Cabe à memória discursiva o acesso à materialidade dos acontecimentos,que é a do sentido, guardada nos “implícitos”15 de que sua leitura necessita(PÊCHEUX, [(1988)]; 1990, p. 52).

No que se refere à memória, recorro a Pêcheux, que recusa ao termo osentido psicologista da memória individual em favor dos sentidosentrecruzados da memória mítica, da memória social inscrita em práticas, eda memória construída do historiador (idem, p. 50). Para o autor: “a memóriadiscursiva seria aquilo que, face a um texto que surge como acontecimento aler, vem restabelecer os ‘implícitos’ (...) de que sua leitura necessita: a condiçãodo legível em relação ao próprio legível” (idem, p. 52).

Com essa apresentação, creio ter sido possível fazer um breve paraleloentre adequação e acontecimento e extrair dele as conseqüências para oensino da escrita.

4.3 As noções de adequação e de acontecimento e o ensinoda escrita

No que se refere ao ensino da escrita, defendo que se pense aheterogeneidade da escrita como uma forma produtiva de se observar aparticipação dos agentes da educação nos acontecimentos discursivos. Em

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vez de ser taxada, portanto, como uma escrita impura, imperfeita einadequada, proponho que seja vista em seu processo de constituição.Quando assim considerada, sua heterogeneidade se oferece como umaoportunidade efetiva de trabalhar, também, com o processo de escrita doaluno. É desse modo que entendo a concepção de ensino da escrita nocampo dos estudos do letramento, que, segundo Kleiman, esvazia a idéiado intermediador, na medida em que todos os participantes da interação sãopotencialmente mediadores, ao mobilizarem recursos de outros eventos, outrassituações, outras práticas sociais (KLEIMAN, 2006, p. 81).

Não proponho com isso que se comece do zero no que tange aocurrículo real (conteúdos de ensino), mencionado por Nóvoa. Em princípio,a novidade, por exemplo, para a produção e a leitura do texto e para otrabalho com os gêneros discursivos seria a consideração dos processos desua constituição e a valorização dos produtos percebidos16 como híbridos.Tais produtos, em seu modo de produção de sentido, retomam, a meuver, o dinamismo que marca a relação do sujeito com a linguagem. Bastaconstatar que os gêneros discursivos (orais e escritos) são produtos de relaçõesintergenéricas (BAKHTIN, 1992), as quais relativizam sua estabilidade eos repõem no dinamismo próprio da linguagem, o da mudança. Oesquecimento dessa heterogeneidade só faz ressaltar o aspecto daadequação repetidora e a estabilidade (na verdade, relativa) dos gênerosdiscursivos. No caso dos textos escritos percebidos como híbridos, rejeita-se, de fato, a participação de sujeitos/sentidos determinados em esferas deatividade tomadas pelo senso comum da prática didática como espaçosde adequação estabelecidos e estabilizados para sempre. Na verdade, aose rejeitarem alguns, afirma-se o lugar para outros sujeitos/sentidos, fatoque, naturalmente, não se justifica apenas pela linguagem. E a próprialinguagem prova isso. Quando na produção do texto, nos distanciamosminimamente dos estereótipos dos campos jurídico e administrativo, osquais marcam uma relação mais cristalizada entre os interlocutores e, porisso, uma fixação de modelos mais duradoura, deparamos com odinamismo da linguagem. É com esse dinamismo que a heterogeneidade

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da escrita permite trabalhar se ela não for vista simplesmente comoinadequação.

5 Considerações finais

Minha defesa de um objeto complexo para a Lingüística Aplicadanão vai muito além da sustentação, em vários níveis de reflexão, de umaatenção à linguagem como processo e não como produto. Neste trabalho,utilizando-me da relação entre fato lingüístico e fato sócio-histórico,procurei observar o estatuto da LA no interior do campo das ciências dalinguagem; situei a questão do ensino de língua materna em função docurrículo, entendido como registro de certas construções sociais e,finalmente, particularizei minhas observações para o ensino da escrita,tomando como referência a experiência do acontecimento.

No que diz respeito, portanto, ao objeto complexo que caracteriza ofazer teórico da LA, alinham-se, neste trabalho, uma série de recusasquanto à relação entre fato lingüístico e fatos social e histórico: nem orecurso à temporalidade cronológica (descartada também por Saussure),nem o recurso às relações sistemáticas (defendidas por ele), nem a buscade relações de causalidade (recusadas pela lógica formal com base nascontribuições da Lingüística), nem a busca de uma lógica do real(defendida pela mesma lógica formal com base em relações sistemáticasdos dados do real). Trata-se, ao contrário, de permitir que as relaçõesconstitutivas entre linguagem, sociedade e história informem – em suaexterioridade quanto a qualquer tipo de sistema fechado, em suaordenação não causal e em sua regularidade instável – a constituição dosobjetos de estudo.

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Notas

1 Um primeiro esboço deste texto foi apresentado como parte da mesa-redondade nº 140: Desafios teórico-metodológicos no campo aplicado dos estudos dalinguagem, no V Congresso Internacional da ABRALIN, realizado em BeloHorizonte (MG), entre 28 de fevereiro e 3 de março de 2007.

2 Pesquisador CNPQ - Processo 304236/2005-5. Projeto CAPES/COFECUB510/05.

3 Laboratoire de linguistique et didactique des langues étrangères et maternelles(LIDILEM) – Université Stendhal, Grenoble III (França).

4 Não menos relevantes para essa discussão são os trabalhos de Celani (1998) eSerrani-Infante (1998), ambos compondo, também, a obra organizada porSignorini & Cavalcanti.

5 Para uma posição crítica quanto à separação entre teoria e prática, conferir MoitaLopes (2006).

6 A exemplo do que costuma ocorrer em todos os campos que ganham contornosde disciplina científica, há, naturalmente, mais de um modo de entender a LA.situo, aqui, os contornos no interior dos quais tenho procurado fazer minhasreflexões nesse campo.

7 Sobre as atividades lingüísticas, epilingüísticas e metalingüísticas, conferir Geraldi(2003, p. 20-26).

8 Para a discussão de seu estatuto, não importa que as instituições de fomento àpesquisa ainda nos obriguem a tratá-la como uma subárea.

9 No campo das teorias do currículo, Silva afirma que foi com as teorias críticas docurrículo que pela primeira vez aprendemos que o currículo é uma construção social.Segundo o autor: o currículo é uma invenção social como qualquer outra: o Estado,a nação, a religião, o futebol... Ele é o resultado de um processo histórico (2005,p. 148).

10 BOURDIEU, P. e PASSERON, J. C. A reprodução. Elementos para uma teoriado sistema de ensino. 2 ed., Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1970.

11 Pinar, importante representante da crítica americana das concepções burocráticase administrativas de currículo, isto é, das teorias tradicionais do currículo, lembraque: “essa categoria – identidade – surgiu nos debates sobre multiculturalismo,

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mas promete nos levar a outros lugares também, inclusive a investigações do quesignifica educacionalmente ter sua identidade definida pelos outros.” (2006, p.147). Mais adiante, o autor continua: “ao estudar a política da identidade,descobrimos que quem somos está invariavelmente ligado a quem os outros são,bem como a quem fomos e a quem queremos ser.” (op. cit, p. 148). Como sesabe, a assunção da noção de identidade também não se dá sem polêmica, umavez que ela pode trair as diferenças e levar à homogeneização. Uma possívelcrítica a essa noção sustenta-se, portanto, na recusa à homogeneização e àcausalidade, ausentes quando se assume a perspectiva da singularidade históricados sujeitos na sua relação com a emergência (não-causal) dos acontecimentos.

12 Remeto novamente à crítica que Cavalcanti (1999) faz à desconsideração doensino bilingüe. Como vimos, ainda que registrando a existência formalizada dealguns direitos no Brasil, inclusive do Referencial Curricular para EscolasIndígenas, a autora questiona a sua efetividade até então. Como ilustração deprogressos recentes na direção da concretização desses direitos, registro que, em2002, o MEC lançou o Programa Parâmetros em Ação de Educação EscolarIndígena, com o objetivo de desenvolver as competências profissionais deprofessores indígenas em formação inicial e continuada. No final desse mesmoano, foi promulgada a Lei nº 145, que dispõe sobre a co-oficialização das LínguasNheengatu, Tukano e Baniwa, à Língua Portuguesa, no município de São Gabrielda Cachoeira/Estado do Amazonas. Mais recentemente, em 29/1/2007, o ConselhoUniversitário da Universidade Federal do Amazonas (UFAM) aprovou o cursode Licenciatura Indígena em Políticas Educacionais e Desenvolvimento Comunitário.Esse curso foi concebido para ser ministrado em línguas indígenas, tendo oportuguês como língua auxiliar. A duração será de quatro anos divididos emoito etapas presenciais e sete não-presenciais. Das 3.700 horas do curso, o alunodeve dedicar, obrigatoriamente, 1.600 horas para pesquisa (Cf. www.ipol.com.br).Essas ações vêm para cumprir o que prevê a constituição. Como lembra Born(2003), o artigo 13 da constituição de 1988 determina que a língua portuguesaé o idioma oficial da República Federativa do Brasil. Lembra, ainda, o autor que oartigo 210 concede que o ensino fundamental regular será ministrado em línguaportuguesa, assegurada às comunidades indígenas também a utilização de suas línguasmaternas e processos próprios de aprendizagem. Finalmente, cita o artigo 231,segundo o qual são reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas,crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam,competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.

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13 Tomo de Pêcheux [(1988), 1990] a noção de acontecimento.

14 Mas não atuam apenas sobre as lembranças. Segundo Brandão: “a memóriadiscursiva, exercendo (...) uma função ambígua na medida em que recupera opassado e, ao mesmo tempo, o elimina com os apagamentos que opera, a memóriairrompe na atualidade do acontecimento, produzindo determinados efeitos...Ainda segundo a autora (e é isto que pretendo destacar): esses efeitos de memóriatanto podem ser de lembrança, de redefinição, de transformação quanto deesquecimento, de ruptura, de denegação do já-dito.” (1995, p. 79).

15 Pêcheux interpreta esses implícitos como sendo, mais tecnicamente, os pré-construídos, elementos citados e relatados, discurso-transversos, etc. (op. cit., p. 52).

16 Refiro-me àqueles que o senso comum da prática didática julga apenas como“inadequados”, desconsiderando, portanto, a novidade da adequação. É bomlembrar, porém, contra esse tipo de julgamento, que a heterogeneidade éconstitutiva da escrita em geral.

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