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  • 7/27/2019 o essencial sobre Lingstica Fiorin

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    Coleco O EssencialCoordenao

    Maria Helena Mira MateusFaculdade de Letras da Universidade de LisboaILTECAlina ViIIalvaFaculdade de Letras da Universidade de Lisboa

    f8sw cialLINGuSTICAMaria Helena MiraMateus

    Alina Villalva

    Coleco O CssendalCoordenao Ma ' H I .na e ena Mlfa Mateus e Alina Vllalva

    CAMIN-IO

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    o ESSENCIAL SOBRE LINGuSTICAAutoras: Maria Helena Mira Mateus

    Alina ViIIalvaDesign grfico'da capa: Jos SerroIlustrao da capa: Reproduo de uma iluminura. da rvore de gramtica inclufda nas GrammaticesRudimenta, de Joo de Barros (c. 1540) Editorial Caminho, SA, Lisboa - 2006Tiragem: 5000 exemplaresImpresso e acabamento: Tipografia Lousanense, L.d.Data de impresso: Fevereiro de 2006Depsito legal: 238 708/06ISBN 972-21-1777-7www.editorial-caminho.pt

    o Essencial uma coleco dedicada divulgao doconhecimento que tem vindo a ser produzido no domnioda lingustica, particularmente no que diz respeito ao Por-tugus.

    Esta coleco constituda por vinte volumes que tra-tam independentemente matrias diversas, mas estoorganizados de acordo com uma estrutura comum. Emcada volume poder o leitor encontrar, na seco Antesdemais..., uma informao sumria sobre as questes pos-teriormente desenvolvidas. Perguntas interessantes& respostas conhecidas abre espao para a apresentaodos assuntos prprios de cada volume, segundo as esco-lhas do seu ou seus respectivos autores. A informaoaqui apresentada complementada pelo contedo doGlossrio, que dispe alfabeticamente os termos funda-mentais de cada disciplina. Os leitores que desejaremaprofundar os seus conhecimentos encontraro algumassugestes em Outras leituras.

    Esta srie destina-se a um pblico alargado com forma-o muito diversa, que procure consolidar um nvel m-dio de cultura geral. Destina-se, em particular, a todos osprofissionais que usam a lngua como ferramenta de tra-balho, dos professores de Portugus aos tradutores e dosjornalistas aos criadores literrios. Dada a profuso derelaes de interdisciplinaridade em que a lingustica par-ticipa, esta srie tambm dever interessar a profissionaisde diversas formaes e actividades, como psiclogos, so-cilogos, terapeutas da fala, agentes culturais e polticos.

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    NDICE

    11 Antes de mais...19 Perguntas interessantes & respostas conhecidas21 Como se sabe que uma lngua uma lngua?29 De onde vem a reflexo sobre a linguagem e as lnguas?39 Onde comea a lingustica?49 Ser a lingustica uma cincia?55 Do que trata a lingustica?79 Para que serve a lingustica?93 Glossrio

    101 Outras lei turas107 Referncias

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    ANTES DE MAIS ...

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    A reflexo sobre as lnguas vem de h muito tempo, mas alingustica uma cincia recente, pouco divulgada e mal conhe- .cida. Ainda menos conhecida a actividade dos que trabalhamem lingustica - os linguistas. Sero pessoas que sabem muitaslnguas? Ou sero aqueles cuja especialidade consiste apenas nadeciso sobre o correcto uso da lngua (escrita e oral), no conhe-cimento da origem das palavras ou na informao sobre se existeuma regio onde se fale 'bem' uma determinada lngua? certoque o linguista tem conhecimentos em qualquer um destes dom-nios, mas a sua actividade ultrapassa muitssimo este tipo de pro-blemas.

    Vejamos algumas perguntas a que a lingustica procura darresposta: Como aprendemos a falar? Quais as caractersticascomuns e as que diferenciam as lnguas? Como se relaciona ouso da lngua com a actividade do nosso crebro? Por que variamas lnguas, por que desaparecem umas e surgem outras? Emais,muitas mais so as questes com que se preocupam os que es-tudam a linguagem e as lnguas. Dar a conhecer o que constitui acincia da linguagem e a actividade dos linguistas o objectivo dacoleco que se inaugura comeste livro e que, para tal, constitudopor uma apresentao geral do que se entende hoje como lingus-tica. Comecemos, ento, por indagar como se define este termo.

    Quando procuramos uma definio de lingustica em dicion-rios gerais ou especializados, em enciclopdias ou em obras de-dicadas especificamente a esta rea, encontramos, em sntese,uma frase do t ipo: Iingurstica o estudo cientrficoda linguagem

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    humana e das lnguas naturais. Para quem nunca teve contactocom esta disciplina, a definio pode causar alguma perplexidade:

    ... lnguas naturais... Mas haver lnguas 'no-naturais'? E por-qu estudar s as naturais?Comecemos por esta questo das lnguas naturais. Este o

    dado a lnguas como o Portugus, o Francs, o Irlands ouo Arabe, j que podem ser aprendidas como lngua materna, masque tambm dado ao Latim1, que ainda hoje pode ser aprendidoe falado, mas que j no est disponvel como lngua materna' ouao Snscrito, que perdura na ndia apenas como lngua

    As lnguas artificiais. Integrado coleco Construir a Europa, Umberto Eco [081 pu-

    um. onde estabelece uma tipologia das ( lnguas cons- a.rtlflclalmentell com base na identificao dos seus objectivos.Eco distingue assim:

    as lnguas que buscam a perfeio estrutural ou funcional comoas lnguas filosficas criadas em Inglaterra nos sculos XVI" e XVIII(que procuravam substituiro Latim por outra lngua veicular), comoo Lo!ba.n (uma lngua oral criada com o propsito de eliminar a ou como o Ladan (que apresentada como umahngua mais adequada expresso das mulheres); as chamadas lnguas internacionais, como o Esperanto ou o Ido(que pretende ser um aperfeioamento do Esperanto);

    e aslrnguas ou cifradas, .como a Lngua dos Ps, quetem algum prestigio entre as crianas, ou o Minderico doscardadores e negociadores de l de Minde, no incio do sculo XVIII, lembrar os sistemas de criptologia q ue o s meios de comu-nlcaao actualmente disponveis tornam cada vez mais necessrios.Fora tipologia fic?m vrias lnguas artificiais, como, porexemplo, o Khngon, uma Ilngua Inventada para os alienrgenas do StarTrek.

    1 Latim um termo que recobre sistemas lingusticos muito distin-tos: do Lati.m dos textos literrios de autores consagrados, aoLatim EcleSIstiCO usado regularmente na liturgia catlica at ao incio dosculo XX, por exemplo.

    o ESSENCIAL SOBRE LlNGU{STlCA 15

    Ainda que a questo da origem das lnguas continue a fazerpar te da l ista dos temas em debate, o que se sabe que as ln-guas naturais (e mais especificamente, as protolnguas de queno existem registos materiais) so manifestaes espontneasda capacidade de linguagem, ou seja, no foram construdas 'pelo'homem, foram construdas 'com' o homem. Pelo contrrio, aslnguas artificiais foram arquitectadas deliberadamente por umapessoa ou por um pequeno grupo de pessoas, num tempo relati-vamente curto e, portanto, no se desenvolveram espontanea-mente numa comunidade de falantes, nem nuncaforam aprendidascomo lngua materna. Por outras palavras, as lnguas artificiaisso definidas partida, enquanto as lnguas naturais correspon-dem activao de um potencial inscrito no cdigo gentico hu-mano.

    O interesse da lingustica pelas lnguas naturais e o comple-mentar desinteresse pelas lnguas artificiais (embora haja algunstrabalhos de descrio da forma como estas lnguas se organi-zam) decorrem do entendimento da lingustica como uma cinciacognitiva, o que nos conduz segunda questo:

    ... linguagem humana... Mas haver linguagem 'no-humana'?E porqu restringir?Esta restrio pe fora do alcance da lingustica outros siste-

    mas de comunicao, como o das linguagens dos animais, queso igualmente naturais, mas se distinguem da linguagem huma-na (so clssicos os exemplos de comunicao entre abelhas ouentre gol finhos); ou o de formas de comunicao codif icadas,como a linguagem das flores, a linguagem dos tambores ou aindalinguagens de programao.

    Quando a 'linguagem' se acrescenta o adjectivo 'humana',o que se pretende referir exclusivamente a actividade que de-corre da existncia geneticamente determinada da faculdade dalinguagem. Ora, se este um mecanismo universal, ento a rela-o c om a g ra m ti ca da s l ng ua s tambm uni ver sa l, o queimplica que todas as lnguas possuem propriedades comuns.A estas propriedades d-se o nome de universais lingusticos: porexemplo, o conjunto de sons que podem ser utilizados pelaslnguas naturais universal; tal como a presena de elementos

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    16 MARIA HELENA MIRA MA TEUS I ALlNA VILLALVA o ESSENCIAL SOBRE LINGuSTICA 77(a l inguagem humana e as l nguas naturais) uma abordagemobjectiva, sistemtica, rigorosa e teoricamente enquadrada.No entanto, a demonst rao de que a l ingustica uma cincia,como sucede com qualquer outro domnio do conhecimento, e emparticular com as chamadas cincias humanas, uma tarefa exi-gente. A afi rmao serve, ento, para j, como uma declaraode princpios e a demonstrao vir um pouco mais adiante nestelivro.

    A natureza concisa das def in ies deixa ent rever que muitof ica de fora. Fecha-se ento, aqui, a def in io da enciclopdia eabre-se a porta a uma visita guiada pelas diversas dimenses destedomnio do conhecimento, que a lingustica.

    fundamentais na frase.como o sujeito e o pre-dicado . A par dos uni-versais l ingusticos.comuns a todas as ln-guas, h caractersticasparticulares que as dife-renciam: por exemplo,nem todas as lnguastm uma f lexo verbalto r ica como a do Por-tugus; nem todas aslnguas tm acento fixona ltima slaba de cadapalavra, como o Fran-cs.

    Compete, pois, lingustica contempor-nea estudar a capacida-de humana de falar e decompreender enuncia-dos lingusticos e esta-belecer a relao entrea faculdade da lingua-gem e as lnguas que aactualizam.

    A ltima das ques-tes suscitadas pela de-finio apresentada noincio diz respeito ao ca-rcter cientfico dos es-tudos lingusticos:

    ... estudo cientfico... Mas porqu 'cientfico'? E 'cientfico'por oposio a qu?Esta restrio serve, antes de mais, para garantir que a abor-

    dagem que a l ingus ti ca faz ao seu objecto de conhecimento

    --------------- ,A faculdade da linguagem

    O conhecimento dos processos cogniti-vos ligados s formas de comportamentohumano alcanou enormes progressos nasegunda metade do sculo xx. o que tornouposslvel afirmarque essesprocessos decor-rem de uma base gentica universal. Sendoa linguagem uma forma de comportamentohumano. j que todos os seres humanosfalam. deve ento tambm admitir-se aexis-tncia de uma capac idade do sistema cogni-tivo. inata e universal, que lhe est associada.essa capacidade. a que se d o nome defaculdade da linguagem. que permite a rea-lizao de actividade lingustica, ou seja, quepermite compreender e construir, com basenumas poucas dezenas de sons e numconhecimento gramatical implfcito. uma in-finidade de expresses lingusticas.A existncia da faculdade da linguagemno . porm. uma hiptese assenteapenasna constataoda universalidadedosproces-sos cognitivos e de que todos os homensfalam. Esta hiptese tambm sustentadapela forma como se processa aaquisio dalngua. Trata-se de um processo comum atodas as crianas. qualquer que seja o est-mulo lingustico a que so expostas. isto .qualquer que seja a Ifngua queouvem falar sua volta. Em tempo incrivelmente breve. eperante dados incompletos. a competncialingustica rapidamente adquirida. Essaaprendizagem no pode provir seno de ummecanismocognitivo universal egenticoes-pecialmente preparado para esse fim.

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    PERGUNTAS INTERESSANTES& RESPOSTAS CONHECIDAS

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    COMO SE SABE QUE UMA LNGUAUMA LNGUA?

    Se, entre outras competncias, lingustica cabe o estudodas lnguas, ento justifica-se reflectir sobre o que uma lngua econceitos relacionados, como dialecto, sociolecto, idiolecto e va-riedade.

    O entendimento comum destes termos faz com que se aceiteque dialecto identifica o sistema lingustico prprio de uma dadaregio (como o dialecto de Lisboa, por exemplo); que lngua re-mete para o sistema lingustico que conjuga todos os dialectosfalados num pas (o Portugus uma lngua); e que variedade sejainterpretada como a manifestao nacional que uma lngua fala-da em pases diversos assume em cada um deles (o PortugusEuropeu uma variedade do Portugus). Sociolecto fica fora destahierarquia de conceitos, embora se possa definir como um con-junto de idiolectos que corresponde a um recorte social da lngua(pode falar-se no sociolecto dos adolescentes, dos surfistas oudos economistas). O termo sociolecto tende a ser substitudo pordialecto (que ganha em generalidade), encontrando mesmo umadesignao especfica para algumas destas realidades, como noscasos de 'economs' ou de 'futebols'. Idiolecto, que identifica osistema lingustico de cada falante, individualmente considerado, um conceito praticamente desconhecido.

    O que o entendimento comum destes termos mostra que adefinio destes conceitos no assenta em critrios de naturezalingustica. Deste ponto de vista, uma lngua um sistema decomunicao que faz uso da faculdade da linguagem activada pelaexposio dos falantes a estmulos lingusticos, durante o cha-

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    Eduardo Paiva Raposo (*) [151

    (*) Os nmeros delimitados por parnteses rectos remetem para asreferncias bibliogrficas que encontra no final.

    A lngua portuguesaA realidade da noo de lnguaportuguesa, aquilo que lhe d umadimenso qualitativa para alm deum mero estatuto de repositrio devariantes, pertence, mais do que aodomnio lingUstico, ao domnio dahistria, da cultura e, em ltima ins-tncia, da poltica. Na medida em quea percepo destas realidades for

    variando com o decorrer dos tempose das geraes, ser certamente deesperar, concomitantemente. queaextenso da noo de lngua portu-guesa varie tambm.))

    o Portugus BrasileiroMuitos intelectuais brasileiros,particularmente no incio do scu-lo xx, procuraram atribuir ao Portu-gus Brasileiro o estatuto de lnguae de lngua distinta do Portugus Eu-ropeu. O carcter voluntarista destatentativa condenou-a ao fracasso.Em contrapartida, tem-se vindo avulgarizar, em Portugal, a opinio(algo pejorativa) de que a lnguafalada pela crescente comunidadeimigrante brasileira o 'brasileiro'.Talvez os portugueses ainda notenham compreendido as implica-es desta posio: de um ponto devista estratgico, a unidade lingus-

    tica entre Portugal e o Brasil interes-sa ao Brasil e interessa tambm aPortugal.

    Por outro lado, em deter-minadas circunstncias, o ter-m o l n gu a no chega paraidentificar o conceito, razopela qual a lingustica faz usode distines como lnguamaterna, lngua segunda, ln-gua estrangeira, lngua oficial,l ngua de trabalho, l ngua decomunicao, lngua franca oulngua grafa, para referir ape-nas alguns exemplos.Face a esta variedade ter-minolgica, no , pois, fcildeterminar o nmero de ln-guas existentes no mundo:tudo depende do que se con-s idera ser uma lngUa ou seclassif ica como dialecto. En-contram-se algumas refern-cias a um nmero prximo dos 3000, mas o The Ethn%gue [9l,uma base de dados sobre as lnguas do mundo, apresenta um totalde 6809, sendo que a Europa contribui com apenas 3% (ou seja230 lnguas, muitas das quais esto quase extintas). tambm inte-ressante notar que 96% das lnguas existentes no mundo so fala-das por apenas 4% da populao mundial; que cerca de 80% daslnguas so faladas apenas em um pas e quecerca de 20 lnguasso faladas por vrios milhes de pessoas em diversos pases.O interesse destes dados no meramente estatstico. O volu-me de Abr il de 2000 do The Courier [181 dedicado aos confli-tos e coexistncia das diferentes lnguas do mundo. A se chamaa ateno para o facto de metade da populao mundial usar ape-nas oito l nguas, enquanto um sexto das l nguas do mundo sofaladas apenas na Nova Guin. Omesmo documento refere o alas-t ramento do Ingls como meio de comunicao mundial (vistocomo resultado de um fenmeno de imperialismo cultural). Emen-c iona ainda o facto de grande nmero das chamadas l nguasminor itr ias estarem a desaparecer a um ritmo cada vez mais

    mado perodo de aquisio da l ngua. Ora, do ponto de vista dalingustica, o conceito de dialecto pode ser definido da mesmaexacta maneira.Tem, alis, sido defendido por muitos linguistas que devemser tratados no mbito de uma poltica lingustica. Os critrios ob-jectivos (como a inteligibi-lidade mtua, o nmero defalantes, a coeso geogr-fica e poltica da comunida-

    de de falantes) nem semprepermitem identificar comclareza o que uma lnguae o que um dia lec to .Na verdade, so muitos

    os casos em que sistemaslingusticos diferentes soclassificados ora como ln-guas diferentes, ora comouma l ngua e um dia lectodessa lngua. Por exemplo,o fac to de o Portugus e oGalego serem, por alguns,consideradas duas lnguas,. ainda que derivadas de um mesmo Galaico-Portugus sado damatriz latina, no pode deixar de ser relacionado com a soberaniados pases onde essas lnguas so originalmente faladas: o Galego,

    em Espanha; o Portugus, em Portugal. Em contrapartida, que oPortugus Europeu e o Portugus Brasileiro sejam considerados amesma lngua o resultado, por vezes contestado, de um dadopercurso histrico, quer por via da herana que Portugal partilhacom o Brasil , quer pela vontade que o Brasil senti r de manter aconexo com Portugal. A escolha do Portugus, lngua falada nassedes do poder polt ico desde o incio da colonizao europeia,poder servir esse fim.

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    Varedades d PortugusPortugus Falado. Documentos Au-tnticos [ 1O] um registo (com cerca de9 horas de gravao e transcrio orto-grfica alinhada com o som). quer deconversas informais quer de interven-es mais formais, exemplificativo doPortugus falado em todos os paises deexpresso oficial portuguesa.

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    PortugusFalado DOCUMENTOS .udlo com .Ilnh,adalInaola

    zao do uso de tecnologias multimdia, como a televiso, tendea esbater as diferenas dialectais.Por outro lado, ainda que o Portugus no seja a nica lnguaoficial de Portugal, esta a lngua falada por maior nmero defalantes e a que tem maiores possibilidades de crescimento. Asout ras l nguas oficiais so a Lngua Gestua l Por tuguesa e oMirands. A Lngua Gestual

    Portuguesa utilizada porboa parte da comunidadesurda portuguesa comolngua materna. Esta lnguas foi oficialmente reconhe-c ida em 2003, facto queveio a permi ti r, por exem-plo, a escolarizao dosseus falantes nesta lngua.O Mirands 3, que umalngua de origem asturo-Ieo-nesa e no galaico-portu-guesa (como o Portugus),tem estatuto de lngua ofi-ciai desde 1999, mas s fa lado por um pequenonmero de falantes, numaregio do Nordeste trans-montano, o que a caracte-riza como lngua minoritriae, a prazo , pode pr emcausa a sua sobrevivncia.Para alm das lnguas oficiais h, em Portugal, comunidades fa-lantes de lnguas estrangeiras, como o Crioulo Caboverdiano, oRomeno ou o Ucraniano.

    Por ltimo, a distribuio geogrfica das comunidades falan-tes do Portugus assegura a presena desta lngua na Europa (Por-tugal), em frica (Angola, Cabo Verde, Guin-Bissau, Moambique

    Repartio das lnguas por continentes

    frica 30%

    acelerado (sendo que comunidades lingusticas formadas por umnmero de indivduos inferior a 100 000 no asseguram a sobre-vivncia da sua lngua).

    O nome das lnguas outra das questes que pode suscitarcontrovrsia. Parece ser um facto pacfico, espervel at, que emPortugal se fale Portugus, mas que esse seja o nome da lnguafalada no Brasil um dado que s compreensvel luz do con-texto histrico de formao desse pas. Por outro lado, que umadas lnguas oficiais de Espanha seja o Espanhol, quando esse nomecorresponde a uma renomeao do Castelhano, um facto quemuitos dos falantes nativos das restantes lnguas oficiais de Es-panha (como o Catalo ou o Basco) tm dificuldade em aceitar.A caracterizao l ingustica de Portugal mostra-nos que acomunidade de falantes maioritariamente falante nativa do Por-tugus, o que significa que se trata de uma comunidade que no afectada por muitas tenses lingusticas. Por um lado, as des-cries da diversidade do Portugus no territrio de Portugal (cf.[06al e [07]) mostram uma diviso mais ou menos estvel entreos dialectos setentrionais (que incluem os dialectos transmonta-nos, minhotos e beires), os dialectos centro-meridionais (que in-cluem os dialectos do Centro e do Sul) e os dialectos insulares(dos Acores e da Madeira)2. Sabe-se, no entanto, que a general i-

    2 H registos sonoros dos dialectos portugueses em www.instituto-camoes.pt/cvc/hlp/geografia/mapa06.html 3 Sobre este assunto pode consultar-se mirandes.no.sapo.pt

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    4 Dados do Ethnologue Survey (1999), disponfveis em web.archive.orglweb/19990422030645/www.sil.org/ethnologueltop100.html

    A situao do Portugus , pois, complexa e merecedora deateno lingustica e poltica. No conjunto das lnguas do mundo,o Por tugus uma das mais faladas : embora a ordenao daslnguas varie de autor para autor, em funo dos dados considera-dos e das fontes util izadas, a graduao mostra com clareza queo Portugus ocupa uma das posies de topo. Vejamos o seguinteexempl04:

    Esta descrio do 'valor' do Portugus numa hierarquizaodas lnguas do mundo pode i nduz ir no er ro de que h lnguasmelhores ou mais importantes do que outras. No esse o senti -do que deve ser dado ao que acaba de ser dito: no por serfalada por mais pessoas, em mais pases ou em mais inst itu iesinternacionais que uma lngua ganha maior valor intrnseco. O queessas medidas asseguram a vital idade da l ngua e alguma ga-rantia da sua preservao, com o que isso pode signi f icar de van-tagem para as comunidades que a falam. Do ponto de vistal ingu s ti co , o nmero de falan tes de uma l ngua ou o prest g iointernacional que ela possa ter so critrios de comparao abso-lutamente vazios de significado.A presuno de que h lnguas melhores ou mais importantesdo que outras radica integralmente em raciocnios preconceituosos,semelhantes, alis, aos que tomam a norma de uma l ngua comoum dialecto mais 'correcto', ' respeitvel ' ou 'sofisticado' do que

    e So Tom e Prncipe), na Amrica do Sul (Brasil) e na sia (TimorLorosae e, residualmente, Macau). O reconhecimento do Portu-gus como l ngua de trabalho em organizaes internacionais,como a Unio Europeia, o Mercosul ou a Organizao de UnidadeAfricana, vem desta disseminao pelos diversos continentes. Acomunidade internacional falante de Portugus j encontrou,mesmo, uma insti tuio sua representante, a Comunidade dosPases de Lngua Portuguesa. A esta diversidade geogrfica cor-responde uma espervel diversidade lingustica.

    Os crioulos de base portuguesaA propsito da diversidade do Portugus no pode deixar dereferir-se o papel desta lngua na formao de um grande nmerode crioulos:Os crioulos so lnguas natUrais, de formao rpida, criadas pelanecessidade de expresso e comunicaoplena entre indivduosin-seridos em comunidades multilingues relativamente estveis. Cha-mam-se de base portuguesa os crioulos cujo lxico , na sua maioria,de origem portuguesa. No entanto; do ponto de vista gramatical, oscrioulos so lnguas diferenciadas e autnomas. I...)Em frica formaram-se os Crioulos da Alta Guin (em Cabo Ver-de, Guin-Bissau e Casamansa) e os do Golfo da Guin (em SoTom, Prncipe Ano Bom). Classificam-se como Indo-port\.lguesesos crioulos da India (de Diu, Damo, Bombaim, Korlai, Quilom,Cananor, Tellicherry, Cochim Vaipim e da Costa de Coromandel ede e os crioulos do Sri-Lanka, (Trincomalee eBattlcaloa, Mannar e zona de Puttallam). NaAsia surgiram ainda criou-los de base portuguesa na Malsia (Malaca, Kuala Lumpur eSingapura)' e em algumas ilhas da Indonsia (Java, Flores,remate,Ambom, Macassar e Timor) conhlcidos soba designaode Malaio-portugueses. Os criOlJlos de Macau eHong--Kong. Na Amrica encontramos ainda um crioulo que se poder con-siderar de base ibrica, j que o portugus partilha com o castelhanoa origem de uma grande parte do lxico (o Papiamento de Curaau,Aruba e Bonaire, nas Antilhas) e um outro brioulohO SlJriname, oSaramacano, que, sendo de base inglesa, manifesta no seu lxicouma forte influncia portuguesa.)

    Dulce Pereira [06 b]

    1. Chins, Mandar im2. Espanhol3. Ingls4. Bengali5. Hindi/Urdu6. Portugus7. Russo8. Japons9. Alemo

    10. Chins, Wu

    885,000,000332,000,000322,000,000189,000,000182,000,000170,000,000170,000,000125,000,00098,000,00077,175,000

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    outros ou aos que consideram que os crioulos no so lnguas ouso lnguas 'deficientes', ou ainda queles que afirmam que agramtica de uma dada lngua mais complexa ou difcil do quea de outra. No existe qualquer fundamento lingustico para ne-nhum destes raciocnios - trata-se de manifestaes de uma ideo-logia que reconhece aos detentores do poder direi tos que noreconhece aos restantes indivduos e que defende que o acessoao poder passa pela imitao dos poderosos.

    DE ONDE VEM A REFLEXOSOBRE A LINGUAGEM E AS LNGUAS?

    As notcias conhecidas sobre a origem das lnguas humanassituam-nos entre 100 000 e 20 000 a. C. Sabe-se que o tractovocal evoluiu de uma forma no-humana, de modo a permitir oestabelecimento de um sistema de comunicao rpido e eficaz,ainda que cus ta de uma perda de pro fi ci ncia no s is temarespiratrio e na deglutio. Tambm se sabe que o tracto vocalde um Neandertal semelhante ao de uma criana recm-nasci-da nossa contempornea, o que permite pr a hiptese de que asua acuidade lingustica seria idntica. A origem das reflexessobre as lnguas tem, naturalmente, de ser posterior. O que sesegue procura dar conta dos pontos de viragem na histria destedomnio do conhecimento.

    A INVENO DA ESCRITAPovos como os egpcios ou os sumrios, que inventaram for-

    mas de escrita numa poca longnqua situada entre o IV e o II mi-lnios a. C" tiveram necessariamente que tomar conscincia daestrutura da sua lngua para a escrever. A inveno da escrita teriaque levar a uma reflexo sobre a natureza da lngua, visto tratar-se de uma tcnica que deveria dar conta dos elementos da lnguafalada separando, pelo menos, as frases umas das outras. Tantoos egpcios quanto os sumrios escreviam j frases constitudaspor uma sucesso de smbolos que correspondiam s palavras.

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    Alfabetos

    3D MARIA HELENA MIRA MATEUS / ALlNA VILLALVA

    Alfabeto latino

    As primeiras descries lingusticas conhecidas foram produ-zidas em obras de gramticos hindus, no I milnio a. C. Na ndiaantiga, o Snscrito (palavra que significa 'perfeito') era conside-rado como uma lngua mgica e sagrada e, por essa razo, nopodia sofrer a menor alterao de pronncia ao ser usada nos ri-tuais religiosos. , pois, em consequncia de uma preocupaoreligiosa que as descries desta lngua vo surgir.O mais conhecido dos gramticos hindus Panini, que viveuno sculo V ou IV a. C. A descrio dos sons, a representaodas slabas por diferentes caracteres conforme as consoantes eas vogais que as constituem, as regras ou definies com que oautor explica a construo das frases ou dos nomes compostosmostram um conhecimento aprofundado do funcionamento doSnscri to. Esta preocupao com a preservao da pureza dalngua, ou seja, com as consequncias da mudana lingustica- atitude que caracteriza a gramtica de Panini e dos restantesgramticos hindus -, ir sendo retomada ao longo dos sculos epersiste ainda nas chamadas gramticas normativas, como, porexemplo, as gramticas escolares destinadas ao ensino da lngua.

    As PRIMEIRAS GRAMTICASo ESSENCIAL SOBRE LINGuSTICA 31

    OS GREGOS E OS ROMANOSO estudo das lnguas desenvolvido pelos gregos orienta-se emdois sentidos. Por um lado, a curiosidade e o interesse acerca daorigem da l inguagem, da mudana e da diversidade lingusticalevam a reflexes filosficas como as que encontramos em Plato(428-348 a. C.l e em Aristteles (384-322 a. C.). O ponto cru-cial destas reflexes situa-se na discusso entre a defesa, feitapor Plato no Crtlo [13], de que as palavras reflectem, por na-tureza, a realidade que nomeiam, e a convico aristotlica deque o seu significado resulta de um acordo entre os homens e,portanto, convencional [01].Outros autores procuraram alcanar um conhecimento maisaprofundado acerca do funcionamento da sua lngua. A anlisedo Grego em todos os seus nveis comea por permitir um aper-

    Alm disso, os hierglifos egpcios associavam frequentementeimagens de objectos reais a sons. Por sua vez, entre 1500 e 1000a. C., os chineses utilizavam ideogramas, ou seja, pequenos de-senhos que representam objectos ou conceitos e correspondema palavras monossilbicas,para representar outras pala-vras. Um dicionrio chinsdo sculo I a. C . regista 9000smbolos correspondentes a9000 palavras. H portanto,tanto num caso como nooutro, uma anlise, aindaque muito elementar, de cer-tas unidades bsicas das ln-guas como as f rases e aspalavras.

    Foram, porm, os fen-cos, que inventaram um al-fabeto de base font ica nasegunda metade do II milnioa. C., os primeiros a tomarconscinc ia dos sons queconstituam a sua lngua. Embora no possua caracteres que re-presentem as vogais, este sistema de escrita pode classificar-secomo um sistema de base font ica. E este alfabeto fencio,reinterpretado primeiro pelos gregos e pelos romanos depois, queest na base do alfabeto usado pela generalidade dos sistemasde escrita contemporneos:

    { 1 4 Y 8 L O 7 W t V ZA B CG D E F H IJ K L M N o P Q R S T U X Zvw

    Os alfabetos de base fontica solistas de smbolos grficos convencio-nalmente ordenados, que represen-tam sons. A estes smbolos d-se onome de grafemas.Um sistema de escrita de basefontica corresponde a um avano nahistria do conhecimento, j que a re-lao entre um som e um smbolo gr-fico pode ser mais universal do que arelao que envolve um conjunto desons associado a um significado, rela"o que s6 compreensvel numadada lngua particular.

    Alfabeto fencio

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    feioamento do alfabeto, mas tambm conduz elaborao degramticas. A autoria da primeira gramtica grega, que distingueoito partes do discurso5 - artigo, nome, pronome, verbo, partic-pio, advrbio, preposio e conjuno - atribuda a Dionsio deTrcia (170-90 a. C.l. A anlise sintctica do Grego desenvol-vida na obra de Apolnio Dscolo (sculo II d. C.) que, na esteirade Aristteles, considera que a estrutura da frase assenta em doiselementos fundamentais: o sujeito e o predicado.O conhecimento da lngua e o desenvolvimento da gramticaentre os gregos estiveram intimamente ligados preocupao coma interpretao dos textos dos poetas ant igos, sobretudo dosclebres poemas picos Ilada e Odisseia, atribudos a Homero(sculo IX ou VIII a . C.), dando, deste modo, origem criao dafilologia, disciplina que estuda as lnguas a partir de textos, liter-rios ou no.

    As obras dos gramticos gregos e a sua doutrina gramaticaltiveram repercusso sobretudo no oriente grego, chegando tar-diamente ao ocidente da Europa, atravs dos gramticos latinos.Nas palavras de Mounin, se Roma merece um captulo numahistria da l ingustica, bem menos por ter produzido que porhaver transmitido [12]. Na realidade, e apesar de as obras dosgramticos latinos serem mais demoradamente descritas na his-tria da lingustica do que as dos gregos, o seu mrito sobretu-do o de nos terem dado a conhecer as reflexes gramaticais efilosficas dos seus antecessores, na linha, alis, de outros ensi-namentos que Roma foi buscar Grcia subjugada.

    No entanto, tambm se deve ter em conta a importncia dosgramticos latinos, sobretudo porque muitas das suas obras apon-tam, originalmente, para uma finalidade diferente do estudo filo-sfico ou da doutrina gramatical. Note-se, por exemplo, que Varro(116-27 a. C.), um gramtico lat ino, distingue o uso da lnguacomum do uso literrio (considerado como o bom uso), presta umaateno especial s questes etimolgicas e procede a uma codi-

    5 Chama-se 'partes do discurso' ou 'partes da orao' s categoriassintcticas, como 'verbo', 'adjectivo' ou 'advrbio', que tambm podemser designadas categorias gramaticais.

    o ESSENCIAL SOBRE LINGUSTICA 33

    ficao das regras fundamentais da lngua latina. Por outro lado,a obra de Quintiliano (c. 40-100 d. C.), professor de retrica, des-tinava-se basicamente a formar o orador que utilizava a lngua paraconvencer o seu auditrio. E no se pode esquecer, por fim, EliusDonatus (sculo IV d. C.), autor da obra De Partibus Orationis,que se ocupa, como Dionsio de Trcia, da categorizao das pa-lavras.

    A IDADE MDIAOs gramticos latinos mantiveram-se como modelo durante

    toda a Idade Mdia. Nos pases nrdicos e anglo-saxnicos, asgramticas latinas foram as primeiras a ser sistematicamente boradas para o ensino de uma lngua estrangeira - neste caso oLatim que, durante sculos, cumpriu a funo de lngua franca.

    Nos pases de matriz romnica, o estudo das lnguas ver-nculas - como as vrias lnguas faladas na Europa Ocidental _era feito, at meados do sculo XVI, a partir de gramticas escri-tas em Latim e que seguiam o modelo das primitivas gramticaslatinas. A partir dessa altura, a alfabetizao recebeu um notvelimpulso, que prosseguiu com a possibilidade de difuso dos tex-tos escri tos, nos quais se incluam as gramticas. A partir daBblia de Mainz, com apenas 42 linhas e cujos cerca de 180 exem-plares foram impressos entre 1452 e 1455 nas o fi ci nas deGutenberg (ou talvez a partir da Ars Minor, uma gramtica esco-lar de Elius Donatus cuja edio pode ter antecedido a da Bbliade Gutenberg), a tipografia assegurou uma difuso muito maior amuitos mais textos. As gramticas das lnguas vernculas e es-critas nessas mesmas lnguas passaram, assim, a chegar maisfacilmente s mos dos estudantes da poca.Em Portugal, onde j se falava Portugus h alguns sculos,aGramtica da Linguagem Portuguesa que Ferno de Oliveira pu-blicou em 1536, e a Gramtica da Lngua Portuguesa (1540), deJoo de Barros, so as primeiras gramticas do Portugus, escri-tas em Portugus. Alm de se tratar de obras escritas em vern-culo, estas gramticas fornecem informaes sobre a construodas palavras e das frases. Mas a rea do estudo das lnguas que

    .f{.

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    34 MARIA HELENA MIRA MATEUS / ALlNA VILLALVA o ESSENCIAL SOBRE LINGuSTICA 35

    A Ortografiade Nunes de LeoAlguns exemplares esto dis-ponveis nos reservados da Bi-blioteca Nacional. A folha derosto aqui reproduzida provm daediodigitalizada, que pode serconsultada em purl.pt/15.A ediomaisrecente, que a 4. a, tem introduo, notas e lei-

    tura de Maria Leonor CarvalhoBuescu e foi publicada pela Im-prensa Nacional ... Casa da Moe-da, em 1983.

    tence aos primrdios do Renascimento e pode localizar-se no in-cio do sculo XIV, a parti r de um tratado de Dante sobre catorzedialectos italianos6 , que mostra a sensibilidade do poeta s dife-renas dialectais, embora as considere pouco dignas da verda-deira lngua italiana, t ambm no f inal da IdadeMdia e no incio do Renascimen-

    to que se d um inc remento doensino da lei tura e da escri ta emvernculo, correspondendo s ne-cessidades provocadas pelas cir-cunstncias histricas da poca(como por exemplo as v iagensmartimas e as consequentestrocas econmicas). Durante aprimeira metade do sculo XVI,surgem numerosas Cartinhas, ouCartilhas, para aprender a ler, ut i-lizadas em Portugal mas tambmenviadas para terras longnquas,como a Cartinha publicada emconjunto com a Gramtica deJoo de Barros, ou a indicao,datada de 1512, de um env iode livros para a fndia com a se-guinte informao Remete-seum caixote de Cartilhas paraCochim [111.

    A par ti r do sculo XVI publi-cam-se vrias Ortografias, dasquais vale a pena destacar a Or-tografia da Lngua Portuguesa, deDuarte Nunes de Leo (1576), as

    6 Apesar de escrito em Latim, no De Vulgari Eloquentia /1304-1305),Dante faz um elogio da lngua vulgar, que no seu caso o Toscano, ln-gua que est na base do moderno Italiano.

    conheceu maior desenvolvimento durante e a partir do sculo XVIfoi a fontica, em consequncia da importncia que se deu, pelaprimeira vez, lngua falada. A descrio que Ferno de Oliveirafaz das vogais e das consoantes do Portugus um interessan-t ssimo exemplo do lugar de relevo em que o autor colocava asquestes de art iculao dos sons.

    o RENASCIMENTO E O INTERESSE PELO VERNCULOCom o Renascimento desenvolveu-se, de forma sistemtica,o estudo das l nguas particulares. Afastando-se da tradicionalateno dada a aspectos gerais que ultrapassavam as lnguas in-dividuais (por exemplo, as definies genricas de 'sujeito' e 'pre-dicado' como partes indispensveis da orao), os gramticoscomearam a examinar as caractersticas que distinguiam as ln-guas entre si. O comeo do interesse pela variao dialectal per-

    A primeira gramtica portuguesaA primeira edio da Gramtica da Linguagem Portuguesa, de Fernode Oliveira, foi publicada em Lisboa, em 1536. O nico exemplar conhe-cido desta edio pertence Biblioteca Nacional, que, em 1981, editouum fac-simile. Mais recentemente foidisponibilizada uma verso integral naSrie Memria da Ungua da BibliotecaNacional Digital (purl.pt/120j, de queaqui se reproduz a folha de rosto.A terceira edio de 1933 efoipre-parada por Rodrigo de S Nogueira (Lis-boa: Jos Fernandes Jnior). Em 1975,a edio e notas preparadas por MariaLeonor Carvalho Buescu so publica-das pela Imprensa Nacional - Casa daMoeda. A edio mais recente, fixadapor Amadeu Torres e Carlos Assuno,foi publicada em 2000 pela Academia dasCincias de Lisboa.

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    36 MARIA HELENA MIRA MA TEUS / ALlNA VILLAL VA o ESSENCIAL SOBRE LINGuSTICA 37

    __________________ ___Il

    o Verdadeiro Mtodo de VieiraA.Srie Memria da Lngua daBiblioteca Nacional Digitaldisponibi-liza uma reproduo digitalizada da1. edio doVerdadeiro Mtodo de

    Estudar, em purl.pt/118.. uma edio em cinco vo-lumes, de. Antnio Salgado Jnior,publicada -pela S da CQsta .. Elntre1949 e 1952.

    A Gramtica FilosficaA Srie Memria da Lngua da Bi-

    blioteca Nacional Digital disponibilizauma reproduo digitalizada da 1.a edi-o da Gramtica Filosfica, publicadaem 1822, pela Academia das Cinciasde Lisboa (purl.pt/128).

    incluindo a 'ortografia brbara' ou a 'sintaxe solecista', termosusados para referir erros de ortografia e de sintaxe.

    A par desta perspectiva prtica do ensino e do estudo da ln-gua, os sculos XVII e XVIII foram prdigos em reflexes filosfi-cas sobre a linguagem humana e as caractersticas universais daslnguas. Tendo como exemplo a Grammaire Gnrale et Raisonedos franceses Arnault e Lancelot (1660), surgiram nos sculosseguintes, em vrias lnguas, gramticas filosficas que procura-vam os fundamentos da capacidade humana de falar e interpre-tavam as estruturas das lnguas de acordo com aspectos lgicosdo pensamento. Em Portugal, a obra mais notvel e conhecidaneste domnio foi a Gramtica Filosfica da Lngua Portuguesa,de Jernimo Soares Barbosa.

    Regras Gerais, Breves e Compreensivas da Melhor Ortografia, deBento Pereira (1666), e a Ortografia ou Arte de Escrever e Pronun-ciar com Acerto a Lngua Portuguesa, de Madureira Feij (17341.

    Entre os sculos XVI e XVIII, o ensino das lnguas vernculasocupou um espao progressivamente mais amplo. Em Portugal, apar das gramticas, das car tinhas e das ortografias, surgiramdicionrios e vocabulrios - so descries do lxico da lngua por-

    tuguesa em que o Latim ocupa-va j uma parte diminut a.Notvel neste domnio o Vo-cabulrio de Rafael de Bluteau,uma obra enciclopdica em dezvolumes, publicada entre 1712e 1721.Foi tambm no sculo XVIII,e com o firme apoio do Mar-qus de Pombal, que floresceue se imps a importncia daaprendizagem do Portugusnas escolas bsicas. Lus An-tnio Verney inicia o seu Ver-dadeiro Mtodo de Estudarpara ser til Repblica e Igreja, Proporcionado ao Estiloe Necessidade de Portugal(1746) pela afirmao de que necessrio aprender a gram-tica da lngua materna comobase e 'porta' para outros es-tudos. Foi, alis, a preocupaocom o ensino da 'norma culta 'e da correcta ortografia e sinta-xe que levou criao, no tem-po de Pombal, da Real MesaCensria, cuja funo consistiaem eliminar os textos que apre-sentassem aspectos censur-

    ____________ veis de contedo ou de forma,

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    ONDE COMEA A LINGuSTICA?

    Pode dizer-se que a especulao acerca da origem das lnguas quase infrutfera: no h registos e no h como contornar aefemeridade da produo lingustica. Os enunciados vivem enquan-to so produzidos e recebidos, pelo que deles mais no pode res-t ar do que a mem ri a nos f al an te s e nvol vi do s na situao deenunciao. Saber se a capacidade de linguagem nasceu com aespcie humana, ou se o desenvolvimento do homo loquens (ex-presso lat ina usada para refer ir a espcie humana dotada decapacidade de linguagem) posterior, e se todas as lnguas tmorigem num nico sistema lingustico ou se a diversidade umdado de partida, so desgnios to (in)alcanveis, para j, quantoo do conhecimento da origem e evoluo da prpria humanidade.

    A dificuldade de encontrar uma teoria satisfatoriamente ex-plicativa acerca da origem de todas as lnguas levou a Socit deLinguistique de Paris a aprovar, em 1866, uma moo proibindoqualquer referncia origem da linguagem nas suas reunies. Estaproibio no fez, contudo, desaparecer o interesse pela relaohistrica e genealgica entre as lnguas. Foi, alis, esse interesseque motivou a enorme aceitao com que foi recebida uma con-ferncia sobre o Snscrito, apresentada por William Jones, umestudioso de lnguas orientais, na Sociedade Asitica de Bengala,em 1786. Nessa conferncia, Jones afirmou que o Snscrito pos-sua uma estrutura maravilhosa, mais perfeita do que o Grego emais abundante do que o Latim, mas que, simultaneamente, evi-denciava um estreito parentesco no s com essas duas lnguasmas tambm com o Cltico, o Gtico e o antigo Persa. A existn-

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    ,I

    A palavra 'lingustica'Cabe aqui abrir um parntese sobre a utili-zao dotermo lingustica, j que alguma re-lao existe entre o seu uso e. a consideraoda lingustica como um domnio cientfico.'Sprachwissenschaft', 'Iinguistics', 'Iinguistique'e 'lingustica' so termos de lnguas diferentes(Alemo, Ingls, Francs e Portugus, respec-tivamente) que no comearam a ser usados si-multaneamente. Com os linguistas alemes, otermo Sprachwissenschaft surgiu apartir da se-gunda metade do sculo XIX. O uso dos termosequivalentes nas outras lnguas bem posterior.Vale como curiosidade referir que, at h bem

    tempo, a palavra inglesa 'Iinguist' signi-ficava, sobretudo, 'aquele que sabe lnguas'.A Romnia (designao que engloba o conjun-to dos parses romnicos) tambm foi muitorenitente na substituio da denominao tra-diCional de filologia (que estuda textos escritos)pela de 'lingustica' quando se tratava do estu-do das lnguas. Note-se, por exemplo, que nosanos 50 do sculo XX as disciplinas que trata-vam de lngua na Faculdade de Letras de lis-boa - mesmo quando j se falava do trabalhode Saussure - se chamavam 'Filologia Portugue-sa' e 'Gramtica Comparativa'.

    vivo que nasce, cresce e morre aproximou o seu estudo das hip-teses formuladas por Darwin sobre a origem das espcies e a suaevoluo por meio de uma seleco natural. No entanto, no foipor causa deste enfo-que histrico queessa poca foi enten-dida como a do nas-cimento da lingusticacomo cincia. Foi simem consequncia dadescrio sistemti-ca, rigorosa e compa-rada das unidadesfonticas e morfol-gicas das lnguas emanlise. No se tra-tava j de estudar as-pectos histricosou filosficos atra-vs das lnguas, mas,como di zi a FranzBopp [05], as lnguaseram estudadas por simesmas, como objec-to e no como meiode conhecimento.

    Este o momen-to em que se consi-dera que a lingusticase constitui como umdomnio do conheci- A.marca visvel aparece nos trabalhos de toda uma pliadede investigadores alemes e nrdicos, maioritariamente redigidos que fixaram a relao entre as lnguas indo-europeias,eVidenCiando as correspondncias fonticas e morfolgicasdetectadas na anlise das lnguas escandinavas e germnicas,do Grego e do Lat im, do Lituano, do Armnio, do Snscri to e doIraniano.

    cia de um tal parentesco poderia vir a mostrar que todas deriva-vam de uma fonte comum que talvez j no existisse, sendo por-tanto necessrio proceder a uma comparao do Snscrito comlnguas europeias, para que se pudesse ir mais longe no conheci-mento da sua origem e das suas caracterst icas gramaticais. Seesse parentesco viesse a ser provado, ento a lngua falada nandia antiga e as l nguas que estavam na base das lnguas euro-peias actuais teriam tido uma 'me' comum. A hiptese da existn-cia dessa protolngua desconhecida veio a ser aceite, tratando-sede uma recriao a parti r dos aspectos comuns que era possveldetectar entre as suas 'filhas' (as lnguas antigas da ndia e daEuropa), ou seja, entre as l nguas a que se podia ter acesso, fos-se directo, atravs de documentos escritos, ou indirecto, anali-sando as lnguas contemporneas. Essa protolngua passou a serdenominada Indo-europeu.

    Iniciou-se, ento, a grande empresa dos linguistas da pocaque, seguindo o interesse contemporneo pela descoberta dasorigens do pensamento e da religio, o estenderam ao estudo daslnguas, tomando em mos o trabalho de estabelecer sistemati-camente a comparao entre elas. Dos estudiosos comparatistascujas obras ainda hoje so merecedoras de ateno, destacam--se Rasmus Rask (1787-1832), fillogo dinamarqus, e Franz Bopp(1791-1867), f il logo alemo, que estabeleceram princpios emtodos para o estudo comparado das lnguas a part ir da anlisef i lolgica de textos. A estes nomes deve acrescentar -se o deWilhelm von Humboldt (1767-1835), l inguista e pol tico alemoque se interessou pela relao entre o homem e a linguagem (

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    7 A expresso latina a q uo significa 'data a partir da qual se comeaa contar um prazo'.

    A Lngua portuguesaA Srie Memria da Lngua da Bi-blioteca Nacional Digital disponibilizauma reproduo digitalizada da 1."

    edio de A Lngua Portuguesa, empurl.pt/141 e uma outra da 2." edio,de 1887, emendada e aumentadapelo autor, em purl.pt/30.

    A Esquisse de Leite de VaconcelosA Esquisse foi publicada em1901. Em 1987, o Centrode lingus-tica da Universidade de Lisboa patro-

    cinou uma reimpresso da 2." edio,que inclui aditamentos e correcesdo autor. A Srie Memria da Lnguada Biblioteca Nacional Digital dispo-nibiliza uma reproduo digitalizadada 2." edio em purl.pt/160.

    no t inham sido estudadossistematicamente.A orientao que toma-ram os estudos das lnguaselaborados pelos sucessoresdos linguistas da primeirametade do sculo XIX foicontestada pela geraoseguinte, a gerao dos neo-gramticos (uma traduodesajeitada do termo originalalemo - Junggrammatiker -que significava 'jovens gramticos'), cujas perspectivas se desen-volveram durante o f inal do sculo XIX e a primeira metade dosculo XX. Aceitando um ponto de vista eminentemente hist-rico, os neogramticos introduziram a hiptese da existncia deleis fonticas de carcter absoluto, como as leis de Grimm, queestabeleceram correspondncias fonticas a partir da evoluo depalavras cognatas em l nguas irms. Por exemplo: as palavrascomeadas por [f], no Portugus, correspondem com muita fre-quncia a palavras comeadas por uma consoante aspirada, noCastelhano: farinha / harina, filho / hijo). Estas leis eram apresen-tadas como universais, ou seja, aplicar-se-iam cegamente sobreos sons e explicariam as mudanas lingusticas de uma forma idn-tica para todas as lnguas. A atestao de pares de palavras comofogo / fuego veio a mostrar que a realidade um pouco mais com-plexa, dado que, neste caso, a evoluo fontica no gerou o re-sul tado previsto. Apesar de objeces deste t ipo, esta foi umapoca em que floresceram as gramticas histricas das lnguaseuropeias. As seguintes obras merecem especial relevo, pela in-dubitvel importncia que tm para o conhecimento da histriado Portugus: a Sintaxe His-

    trica Portuguesa de Epifnioda Silva Dias foi publicada em191 8 e o Compndio de Gra-mtica Histrica Portuguesade J os J oa qu im Nunes fo ipublicado em 1919.

    ._--------_.IA Srie Memria da Lngua daBiblioteca Nacional Digital disponi-biliza uma reproduo digitalizada da1." edio da Sintaxe Histrica empurl.pt/190.

    Importa agora sublinharduas importantes orienta-es que se manifestaram noestudo das lnguas durante asegunda metade do sculoXIX. A primeira resulta de umcrescente interesse pela des-crio das lnguas vivas, fa-ladas pelas populaescontemporneas. nestequadro que Adolfo Coelho publica A Lfngua Portuguesa: Fonologia,

    Etimologia, Morfologia e Sintaxe, sendo a data da sua publicao- 1868 - considerada por Leite de Vasconcelos (mdico de for-mao de base, mas notvel como etnlogo, arquelogo e fillogo)o limite a quo da filologia cientfica portuguesa7.A segunda orientao dominante est relacionada com o de-senvolvimento da fontica. Assente em mtodos experimentais,benef ic iou do progresso da fs ica e da anatomia que permitiu aconstruo de instrumentos adequados anlise do chamadocontnuo sonoro e dos movimentos articulatrios ligados pro-duo dos sons da fala. Em simultneo, com o progresso dosestudos fonticos, o estudo histrico ou diacrnico, que relacio-nava estados de lngua separados no tempo, era substitudo poruma abordagem sincrnica, que prestava ateno aos diversosfenmenos lingusticos que caracterizam um nico momento naexistncia de uma lngua. este o contexto que justifica que, naprimeira metade do sculo XX, os estudos de dialectologia e degeografia lingustica passassem a primeiro plano na ateno dadapelos linguistas lngua falada. Este interesse foi suscitado pelotrabalho de Jules Gilliron, dialectlogo de origem sua que, naltima dcada do sculo XIX, preparou o Atlas Linguistique de laFrance, publicado entre 1902 e 1923. Em Portugal, a Esquissed'une Dialectologie Portugaise, de Leite de Vasconcelos, deua conhecer as particularidades dos dialectos portugueses que ainda

    o ESSENCIAL SOBRE LlNGufSTlCA 45

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    44 MARIA HELENA MIRAMA TEUS / ALlNA VILLALVA

    \A lingustica portuguesa fora de portugal \O interesse pelo estudo do Portugus no tem fronteiras, ber;' Io demonstra o trabalho de Jules Comu, autor da primeira gramatica hlsto- irica do Portugus, publicada em 1888, em Alemo, com o ttuloGrammatik Ider portugiesischen Sprache; ou o livro Altportugiesisches: \de Joseph Hber, publicado e m 1 93 3 e traduzido em 1986 c om o titulo :Gramtica do Portugus Antigo; e ainda From Latm to Portuguese, queEdwin Williams apresentou em 1938 e que s em 1975 fOI traduzida com

    o ttulo Do Latim ao Portugus. . IPapel particularmente relevante neste domnio o que cabe ao I com linguistas como Said Ali. autor de diversos textos de A sua Gramtica Histrica [da Lngua Portugusa]. de 1931 (que reune dOIsvolumes anteriormente publicados - a Lexeologia do Portugus d e 1 92 1, e a Formao de Palavras e Sintaxe do Portugus de1923). foi, data da sua publicao, um trabalho inovador e mantem-se,at hoje, como uma referncia incontornvel.

    o SCULO XXDescobertas as relaes genticas entre as lnguas e algumas

    das bases fonticas da mudana lingustica, chega-se ao sculo xxe ao incio da pesquisa que olha para as lnguas na sua especifici-dade, como expresso de uma faculdade humana. Por reacoao positivismo dos neogramticos, e admitindo uma dimenso psi-colgica para alm da dimenso mecnica anteriormente reconhe-cida, surgiu na Europa, durante a primeira metade deste sculo,a corrente que iria ocupar durante largos anos o lugar mais im-portante no estudo da cincia da l inguagem e das demais cin-cias humanas. Trata-se do estruturalismo, corrente de pensamentoque se baseava na importncia que a 'forma' vinha assumindo narecm-criada psicologia, e na perspectiva de que a linguagem erauma actividade com uma estrutura especial, ou seja, uma activi-dade que funcionava em sistema. Enquanto, na Europa, essa ver-tente das teorias psicolgicas influenciou largamente a lingustica,nos Estados Unidos da Amrica foi a teoria do comportamento,que relacionava estmulo e resposta, o instrumento que os linguis-

    tas norte-americanos usaram para explicar o funcionamento dalinguagem.

    A estas duas ver tentes do estrutura lismo esto l igados osnomes de dois grandes linguistas: Ferdinand de Saussure (1857- na Europa [17], e Leonard Bloomfield (1887-1949), naAmrica do Norte [04]. Para a histria da lingustica um dos maisrelevantes movimentos da poca foi a criao, em 1926, do Cr-culo Lingustico de Praga, que estabeleceu uma coordenaco nosestudos da fontica e da fonologia das lnguas e umainovao nos mtodos de anlise estruturais. Os linguistas maisnotveis deste grupo foram o polaco Baudouin de Courtenay(1845-1929) e os russos Nicolai Trubetzkoi (1890-19381 e RomanJakobson (1896-1982).

    Para todos estes linguistas, 'estrutura' significa um conjuntode elementos que constituem um sistema pelas relaes que esta-belecem entre si. Assim, por exemplo, afirmar que as lnguas tmuma estrutura fonolgica significa que se servem de um conjuntode sons que funcionam nas palavras por contraste e na relacode uns com os out ros. O conce ito de est rutura uma constante nos trabalhos dos linguistas da poca, motivando acriao de mtodos e tcnicas de descrio e anlise prprios.Os dados em que assentam as descries das lnguas constituemo corpus que, na perspectiva estrutural, deve ser recolhido juntodos falantes para atestar as particularidades e os elementos quepertencem, na realidade, lngua em estudo. Os bons resultadosda investigao realizada no que diz respeito descrio das ln-guas, com metodologias de trabalho claras e sistemticas, e quese tornaram visveis no efectivo progresso do conhecimento lin- outras cincias humanas, como a antropo-logia, a sociologia e a arqueologia, a adoptar os instrumentos deanlise que a lingustica desenvolveu.. Portugal, a perspectiva estruturalista est presente, pela

    pr.lmelra vez, na obra de Jorge de Morais Barbosa (cf. [03]), pu- em 1965. No Brasil, tambm nos anos 60, distinguiu-seJoaquim Mattoso da Cmara Jr. , que, por oposico ao meca-nicismo reinante na poca na lingustica tomouento como referncia a viso mentalista desenvolvida Sapir(cf.[16]).

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    Esta uma representao formal extremamente elementar,mas que cobre todas as frases que integrem apenas um sintag-ma nominal e um sintagma verbal, como o caso de:

    O irmo do meu cunhado tem um carro descapotvel.[F [o irmo do meu cunhado]sN [tem um carro descapotvel]sv IF

    A vantagem de um modelo de anlise lingustica que utilizeeste tipo de representao face aos modelos no-formalizadosreside no acrscimo de capacidade explicativa e na melhoria daclassificao das estruturas complexas. A lingustica um dom-nio em que o objecto do conhecimento descrito por si prprio: a lngua que permite descrever a lngua. Sendo a ambiguidade8

    8 A ambiguidade uma propriedade das lnguas naturais. Neste sen-tido, ambiguidade no sinnimo de impreciso. O que esta propriedadequer dizer que determinadas unidades lingusticas permitemmais do queuma interpretao. o que sucede numa frase como o Joo trouxe umlivro do colgio, em que do colgio tanto pode ser '0 local deonde o Jootrouxe o livro', como '0 possuidor do livro'. Por vezes, o contexto permiteseleccionar a interpretao adequada, mas h circunstncias em que talno possvel.

    Ainda que seja equivalente anterior, a representao formaldas frases que mais se vulgarizou foi a dos chamados indicado-res sintagmticos, mais conhecidos como rvores. Os parnte-ses so substitudos por ramos que nascem no n que domina eterminam no(s) n(s) dominado(s). Os ramos que se unem na base,formando um tringulo, indicam que o constituinte que dominamno est plenamente analisado:

    SVem um carro descapotvelFSNirmo do meu cunhado

    A LINGuSTICA FORMALA lingustica foi precursora na adopo da abordagem estru-

    turalista, mas tambm recorreu a outros domnios do conhecimen-to, como a lgica, a estatstica e a computao, para encontrarinstrumentos de anlise.

    Foi durante o sculo XIX e o incio do sculo XX que a lgicaabandonou certos fundamentos que remontavam a Aristteles (porexemplo, a noo filosfica abstracta de 'forma' por oposio de 'matria') e, tomando a matemtica como modelo, construiuuma linguagem constituda por smbolos e regras para a expres-so do contedo do pensamento lgico.

    Na interaco da matemtica com a lgica foram adoptadosinstrumentos tericos como os sistemas formais ou a lgica de pre-dicados, que influenciaram profundamente os estudos lingusticosa partir de meados do sculo XX. OS linguistas passaram, desdeento, a recorrer a representaes formais das unidades e dosprocessos lingusticos. De uma forma muito simplificada, pode di-zer-se que os elementos concretos so substitudos por smbolosquepermitem representar, de um modo abstracto, as relaes entreos elementos dos sistemas lingusticos. A utilizao destes instru-mentos por linguistas norte-americanos desenvolveu, por exemplo,a anlise das frases em constituintes imediatos, ou seja, em unida-des menores do que a frase, como o sintagma nominal e o sintag-ma verbal (representados respectivamente por SN e SVI. e a anlisedos sintagmas em constituintes menores, at chegar s palavras.

    Quando se representa a unidade 'frase' por F, a unidade que incluio nome e os seus especificadores e modificadores por SN e o verboe seus complementos por SV, podemapresentar-se as relaes entreestas trs unidades atravs de uma representao, que faz usode parnteses rectos para mostrar os limites de cada constituintee as suas relaes hierrquicas. Por exemplo, em: [F [SNI [SVIlF: [SNI e [SVI so unidades do mesmo nvel, l inearmente dis-postas pela ordem apresentada: [SNI precede [SVI e [SVI precedido por [SNI;

    [FI domina [SNI e [SVI ou, inversamente, [SNI e [SVI sodominados por [FI.

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    uma das propriedades das lnguas naturais, s a utilizao de umsistema formal permite descrever os fenmenos lingusticos deforma inequfvoca.

    As rvores do conhecimentoO uso da metfora da rvore na representao das lingus-

    ticas no original. No domnio dos estudos lingusticos, arvore da gramtica, uma elegante iluminura includa nas GrammatlcesRudimenta, um manua l (incompleto) deensino de verbos, datado de 1538, que r.........- ..iJoo de Barros dedicou Infanta D. Ma- !ria. A primeira utilizao da rvore como finstrumento para a representao do f , contud?,.bastante mais I.antiga: a arvore de PortlrlO encontra-se I "na traduo para Latim que este fidlsdOfO I.l'fencio (sculo III a. C.) fez do trata o as , .,,1categorias de Aristteles [141. Na tradio : . ......generativa, as rvores (invertidas) mos- I tram a hierarquia dos constitUintes: os ra- Imos indicam relaes de domnio entrens (os pontos onde pode haver ramifi-cao), que so identificados por etique-tas categoriais.

    SER A LINGuSTICA UMA CINCIA?

    Esta dvida sobre o carcter cientfico da lingustica comuma todas as chamadas cincias sociais ou humanas. Tal como emrelao psicologia, sociologia ou antropologia, tambm nombito dos estudos da linguagem convivem diversas formas deconhecimento, que vo desde as abordagens filosficas e histri-cas s construes tericas e formalizadas, passando pelas des-cries pr-cientficas e pelas aplicaes em domfnios de grandediversidade, da sociologia informtica, s neurocincias ou aoensino. Esta multiplicidade de tratamentos decorre da prprianatureza da linguagem, que simultaneamente veculo de inte-grao social (a I fngua uma das formas de comunicao comos outros) e factor constituinte da construo do indivfduo: emboa medida, atravs da Ifngua que as pessoas vo integrando aexperincia da sua vivncia. Na verdade, a relao da actividadelingufstica com os factos histricos e socia is, com o universopsicolgico e com a criao artfstica, coloca o estudo da lingua-gem e das I fnguas no centro de uma constelao formada pormltiplas interaces com outras formas de comportamento hu-mano. Alm disso, como j foi d ito, a especif ic idade da l ingua-gem humana leva a uma coincidncia entre o objecto de anlise eo meio c om que se explicita e produz essa anlise: com pala-vras que se estudam as palavras. Estes aspectos particulares doestudo da linguagem permitem, estimulam e valorizam interpre-taes e anlises subjectivas e no-cientfficas.

    Por todas estas razes tem sido dif fc il o caminho de quemdefende que a lingufstica uma cincia. Para justificar esta afir-

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    A LINGuSTICA TERICA

    o ESSENCIAL SOBRELlNGU{STlCA 51

    Reflections on LanguageReflexes sobre a LinguagemLisboa: Edies 70Knowledge of Language. ItsNature, Origin and UseOConhecimento da Lngua, suaNatureza, Origem e UsoLisboa: Caminho

    1995 The Minimalist Program1999 O Programa Minimalista

    Lisboa: Caminho

    19941986

    19751971

    Chomsky em Portugus II1965 Aspects of the Theory of Syntax

    1975 Aspectos da Teoria da SintaxeCoimbra: Armnio Amado

    outros domnios que procedem de modo idnt ico - a l ingusticaterica um deles.

    Ainda que os anteriores paradigmas da anlise lingustica,como, por exemplo, o do estruturalismo, constituam quadros te-ricos coerentes, no incio da segunda metade do sculo xxque a lingustica terica conhece um desenvolvimento de maiorrelevo. Trata-se da Teoria Generativa, indissociavelmenteligada publicao, em 1957, do l ivro Aspects of the Theory ofSyntax, de Noam Chomsky.

    A relevncia da TeoriaGenerativa tr ibutria deum conjunto de factores.Antes de mais, esta propos-ta terica retoma e desen-volve a hiptese daexistncia de uma capacida-de especf ica do homem,denominada faculdade dalinguagem, que tem sidoentendida como um dos fac-tores princ ipais, seno omais importante, na distin-o entre o homem e osanimais.

    Na sequncia desta hi-ptese, a Teoria Generativadefende que todas as lnguas do mundo compreendem um mes-mo conjunto de princpios, a que d o nome de Gramtica Uni-versal (GU). Por outras palavras, as lnguas 'escolhem' o modode aplicao dos princpios da Gramtica Universal. E defendetambm que a diversidade lingustica resulta da seleco de umdos possveis modos de aplicao desses princpios, ou seja, daparametrizao dos princpios da GU. Este desenvolvimento daTeoria Generativa chamado Teoria dos Princpios e Parmetros.

    o CONCEITO DE CINCIA

    mao , pois, necessrio reflectir sobre as caractersticas essen-ciais do que se considera ser uma cincia e verificar se essascaractersticas tambm existem neste domnio do saber.

    Resta dizer que todos estes requisitos tm de ser cumpridosno quadro de uma dada escolha terica, que explicite um conjun-to de hipteses coerentemente formuladas que permitam descre-ver e analisar um dado domnio do conhecimento.

    Estas so caractersticas das reas habitualmente consideradas'cientficas', como a fsica, a biologia ou a matemtica, mas h

    Pode definir-se cincia como um conhecimento sistematizadodo que vulgarmente se denomina 'o real'. Para que seja consideradacientfica, a forma de produzir esse conhecimento deve obedecera um conjunto de requisitos que permitam, em idnticas circuns-tncias, a sua verificao. Esses requisitos incluem, entre outros: uma clara delimitao do objecto de estudo: no possvelestudar tudo ao mesmo tempo, preciso garantir que o estu-do seja exequvel;

    a escolha de uma metodologia de trabalho: necessrio defi-nir como se constitui um objecto de estudo e como se vaiestudar o que se pretende conhecer;

    uma descrio rigorosa dos dados, que permita uma repre-sentao formalizada das estruturas, das relaes e das fun-es das unidades que constituem o objecto de estudo, demodo a garantir que os mesmos dados possam voltar a seranalisados;

    a formulao de hipteses que dem a conhecer a poro de'real' analisada, sabendo-se que as hipteses validadas porum dado estudo cientfico podero vir a ser rejeitadas pelashipteses colocadas por um estudo posterior e que essa re-jeio no deve ser entendida como um retrocesso, mas simcomo um progresso no desenvolvimento do conhecimentocientfico.

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    o ESSENCIAL SOBRELINGuSTICA 53

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    oParmetro do Sujeito NuloNo Portugus. a presena de um sujeito foneticamente realizado

    pode ser dispensada. Vejam-se frases como:Eu fui praia. vs. Fui praia.Tu queres ir ao cinema? vs. Queres ir ao cinema?Em Ingls ou em Francs, a explicitao do sujeito obrigatria:I went to the beach. vs. *went to the beach.Tu veux aller au cinema? vs. * veux aller au cinema?No quadro da Teoria dos Princpios e Parmetros" o Portugus classificado como uma lngua de sujeito nulo. ou seja, como umalngua que marca positivamente o Parmetro do Nulo. Pelocontrrio, o Francs e o Ingls marcam estemesmoparametro nega-

    tivamente.

    Resta saber o que est na base dessas 'escolhas' que semanifestam nas diferenas entre lnguas. A diversidade resulta,por um lado, da evoluo que as lnguas tiveram sculos,pelo facto de serem faladas por comunidades que vIviam radas polt ica e geograficamente (assim aconteceu com as \In-guas romn icas e a sua diferenciao do Latim, ou com aslnguas germnicas, derivadas do antigo Germnico). Por outrolado a diversidade surge do contacto entre lnguas diferentes, em de movimentaes dos povos, ao longo da sua his-tria. Gramtica Universal pertencem categorias universais, como'vogal' e 'consoante', 'sujeito' e 'predicado' ou 'nome' e Mas estas categorias universais so concretizadas de forma dife-rente nas diversas lnguas. Por exemplo, em algumas lnguas, comoo Alemo ou o Lat im, o ' caso ', que uma categoria un ive rsal ,manifesta-se morfologicamente nos sufixos dos nomes e adjecti-vos indicando-se atravs desses sufixos se o nome ocorre como ou como 'complemento' da frase (em Lat im, rosa aforma sujeito, rosam a forma complemento directo); outras ln-guas, como o Portugus, manifestam o caso por meio da o do nome na frase (em a rosa bela, rosa ocorre na poslao

    de sujeito; em quero a rosa, rosa ocorre em posio de com-plemento directo) ou antepondo uma preposio (com a rosa,da rosa)9.Uma outra preocupao da Teoria Generativa consiste na pro-cura de uma adequada descrio do modo como o conhecimentolingustico est organizado no crebro dos falantes. Esta preocupa-o deu origem idealizao de um modelo de gramtica queexplicita os domnios que a integram, ou seja, os seus mdulos,e o modo como estes mdulos se relacionam. Em geral, e apesardas divergncias que as diferentes propostas tericas em confrontoencerram, um modelo de gramtica inclui um mdulo lexical - olxico; um mdulo que se encarrega da gerao das estruturasl ingusticas - a sintaxe; um mdulo que trata da interpretaosemntica dos enunciados - a semntica; e um mdulo que seencarrega da materializao dos enunciados - a fonologia. Umoutro aspecto fundamental na concepo do modelo de gramti-ca a hiptese de existncia de diferentes nveis de representa-o, que vo do mais abstracto - chamado representacosubjacente - a um nvel mais concreto, prximo da materializa-o do enunciado, com a representao de superfcie.Em suma,ao descrever uma lngua, a investigao lingusticadesenvolvida no quadro da Teoria Generativa, procura conheceros princpios da Gramtica Universal e os parmetros da variacoresponsveis pela diversidade lingustica. .A Teoria Generativa no a nica abordagem terica dispo-nvel para quem trabalha em lingustica, mas , sem dvida, a maisrelevante na segunda metade do sculo XX, quer pela coernciae dinamismo das hipteses que coloca quer pelo volume de tra-balho produzido sobre um grande nmero de lnguas, num gran-de nmero de pases.

    9 No Portugus, a pronominalizao mostra vestgios da variacocasual lexicalmente realizada. Assim, quando rosa sujeito, o pron;meque a substitui diferente daquele que ocorre quando rosa objecto di-recto:a rosa bela ela belaquero a rosa quero-a

    jI ii____J

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    I

    DE QUE TRATA A LINGuSTICA?

    J vimos que a l ingustica se ocupa do conhecimento dalinguagem e das lnguas humanas, mas, para ir mais longe na ex-plicitao do que o seu objecto de trabalho, essencial com-preender que essa no uma tarefa g lobalmente rea lizvel:nenhum linguista estuda a capacidade de linguagem ou uma ln-gua na su a totalidade, nem exaustivamente. O que os linguistasfazem delimitar um objecto de estudo, seleccionando um deter-minado aspecto de um determinado fenmeno, num determinadodialecto de uma determinada lngua, por exemplo.

    A primeira escolha recai geralmente sobre uma lngua ou umpequeno conjunto de lnguas. Imaginemos que a seleco recaisobre o Portugus. Globalmente considerada como sistema lin-gustico, a 'lngua portuguesa' uma abstraco necessria suadescrio enquanto lngua particular, que, nessa perspectiva, sedistingue e contrasta com as restantes lnguas naturais. Os seusdiferentes usos no espao e no tempo revelam a existncia devariao nos diversos mdulos da gramtica permitindo, assim,em funo quer de factores internos quer de factores externos lngua, a caracterizao de dialectos, de sociolectos e at deidiolectos.

    Simplificando, pode dizer-se que a lingustica reconhece, deforma mais ou menos estvel, um conjunto de diferentes discipli-nas. Em alguns casos, as disciplinas so fundadas a partir da iden-t i ficao de unidades de anlise (para os sons, a fonolog ia ea prosdia; para as palavras, o lxico e a morfologia; para asfrases, a sintaxe; e para o texto, a l ingustica textual). Noutros

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    OS SONS DA FONOLOGIA E DA PROSDIAAs mais pequenas unidades que se analisam em lingusticaso os sons. Para os estudar necessrio que o contnuo sonoroseja registado, o que, em geral, feito por transcrio fontica.

    Para mais facilmente poder ser reconhecida, a transcrio fontica delimi-tada por parntesis rectos (Le, [ J) e as representaes mais abstractas, ou seja,as representaes fonolgicas, so delimitadas por barras oblquas (i.e. / IJ.

    ...

    tuavp

    [uI[o][::lI

    [U] atum[] bom[w] pau[kl carro[gl gatolSl chave[31 j(PI venho[tI mal

    deparap

    banco

    tudoucaacasanovalhacarro

    [i][uI[aI

    !iiI

    [tI[d][sI[zl[nl[A:)[RI

    vivp

    pbemfvmolcaro

    Vogais nasaisf] sim[el pente

    Semivogais ou glidesUI pai

    Consoantes[pI[bl[f][v][mI[I][r]

    A transcrio fonticaA transcrio fontica uma representao dos sons da fala que utilizaum alfabeto fontico criado com base nas propriedades acsticas e art i-culatrias dos sons. Se especificar com pormenor as variaes de pronncia, uma 'transcrio fontica estreita'; se for pouco especificada, uma 'trans-crio fontica larga',OAlfabeto Fontico Internacional (AFI) tem como objectivotornar pos-svel a representao dos sons de todas as lnguas do mundo, fazendo cor-responder ao mesmo smbolo um mesmo som, qualquer que seja a Ifnguaem que ocorra. Os smbolos do Alfabeto Fontico Internacional necessriospara transcrever a norma-padro do Portugus Europeu so os seguintes:Vogais orais

    [i][e][e]

    casos , a identificao das discip l inas assenta na ateno dada construo do significado dos enunciados (como a semntica e apragmtica). Noutros ainda, a lingustica pode centrar a sua aten:co no conhecimento da variedade lingustica dominante (que e dialecto socialmente mais prestigiado, falado na contempora-neidade por um maior nmero de pessoas, e geralmente designa-do como norma-padro), ou no estudo da variao, quer no tempo(que cabe lingustica histrica) quer no espao (com a dialecto-logia e a l ingustica comparada),

    Os DOMNIOS DAS UNIDADES DE ANLISEOs enunciados lingusticos so contnuos sonoros, l imitados

    por pausas que podem ser motivadas por exigncias como a inspirao de ar, por razes de processamento COgnitiVO,como as hesi taces na escolha de uma palavra, ou ainda por ne-cessidades como as interrupes solicitadas pe-los interlocutores. O que as pausas no permitem a inequvocaidentificaco das unidades que a anlise l ingustica reconhece -essa operao realizada num determinado terico,o que explica por que razo nem todos os autores consideram asmesmas unidades ou as consideram do mesmo modo. Um dosexemplos clssicos de discordncia entre no respeito identificao das unidades de an li se , e o da deflnlaodo conceito de morfema: para os linguistas da escola norte-ame-ricana 'morfema' identifica a menor unidade portadora de signi-ficaco (a palavra livros, por exemplo, f ormada por trsmorfemas: livr-, -o e -sI; para os linguistas da escola europeia (par-ticularmente francesa) 'morfema' identifica apenas as unidadesmnimas que representam relaes gramaticais (como o -o e o -sf inais de livros).

    Vejamos, ento, como se caracter iza cada um dos domniosda lingustica que se fundam na segmentao do sono-ro, comeando pelas unidades menores, os sons, e terminandonas maiores, que so os textos.

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    Pares mnimosfigo -? fogo -? fungo mgoa -? gua -? guafila -? filha -? fita lado -? dado -? fado

    Classificao bsica dos sons '1O sistema de sons de qualquer lngua possui, IIobrigatoriamente. vogais e consoantes, e facultati-vamente semivogais que, em conjunto com as vo-gais, constituem os ditongos (em Portugus. aspalavras pau e pai tm ditongos em que as semi-vogais esto representadas pelas letras e

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    As PALAVRAS DA LEXICOLOGIA E DA MORFOLOGIAUm outro tipo de unidades lingusticas, talvez aquele que osfalantes mais facilmente identificam, o das palavras. Delas se

    ocupam duas disciplinas: a lexicologia, que estuda o lxico de umaln.gua, ou seja, o repositrio das palavras e de todas as suas pro-priedades; e a morfologia, que trata do conhecimento da estruturainterna e dos mecanismos de formao de palavras.A LEXICOLOGIA

    O lxico das lnguas uma entidade abstracta: ilimitada notempo, dado que integra todas as palavras, de todas as sincronias,da formao da lngua contemporaneidade; ilimitada no espa-o, dado que compreende todas as palavras de todos os dialec-tos; e irrestrita na adequao ao real, dado que inclui as palavrasde todos os registos de lngua. Mas ser que o lxico s contmpalavras? No, o lxico integra tambm unidades menores do queas palavras e que servem para formar novas palavras, como oradical eucalipt- e o sufixo -iz(ar), que se combinam no verboeucalptizar, um neologismo que os falantes conseguem interpre-tar porque conhecem as partes que o constituem. Por outro lado no que cabe o registo de expresses sintcticas cuja terpretaao requer uma aprendizagem especfica: esse conhe-cimento que faz com que brinco de princesa possa ser o 'nomed.e flor' e no um 'tipo de brinco', ou esticar o pernil sejaSinOnimo de morrer e no de 'alongar a perna'.

    A esta diversidade de t ipos de unidades lexicais (radicaisafixos, palavras e expresses sintcticas), que se junta tncia de fronteiras ou de filtros que limitem o conjunto do possvel,acresce todo o universo de neologismos trazidos por emprstimo os frequentes galicismos do sculo XIX, de que maquilhar um ou os anglicismos do final do sculo XX, cuja vita-lidade nao cessou ainda de crescer, o que atestado por formas! como secanear ou fidebeque - se forem estas as melhores grafias

    [ para palavras). acrescentar a formao morfolgica, res-i ponsavel pelo aparecimento de palavras como eucalptizar ou I ministricida, e a pura inveno de palavras, que um processoAmanh vens jantar c a casa? raro na formao de neologismos. A condio necessria para o

    "._.__. t :Jmanh vens jantar c a casa.

    trastar pelo tempo de pronunciao, sendo umas breves e outraslongas), e a altura ou tom (a sequncia de tons das vogais deuma palavra ou frase constitui a entoao).

    Porm, no Portugus, o tom e a durao no permitem dis-tinguir significados, ao contrrio de que acontece em outras ln-guas, como o Mandarim, em que a mesma sequncia de sons,por exemplo ma, pode ter significados diferentes se a vogal lalt iver um tom baixo ou um tom alto; ou como no Latim, em que adurao da vogal numa mesma sequncia pode indicar a funosintctica da palavra - rosa, com vogal final breve, nominativo(tem funo de sujeito) e com vogal final longa, ros, ablativo(tem uma funo complementar).

    Uma outra propriedade prosdica, a intensidade, est relacio-nada com o acento tnico da palavra e marca uma slaba que pronunciada com mais fora, tornando-se proeminente na sequn-cia de slabas que constituem a palavra. Em Portugus, todas aspalavras possuem acento, sendo possvel distinguir duas palavrascom as mesmas vogais mas com acento em slabas diferentes(por exemplo, dvida e duvida, em que o diacrtico (f ) marca olugar do acento na palavra esdrxula dvida, que assim se distin-gue de duvida).

    As unidades prosdicas contribuem largamente para o ritmoque caracteriza cada lngua. Em Portugus, a menor unidade pros-dica, que a slaba, tem caractersticas particulares (por exem-plo, s certas sequncias de duas consoantes podem pertencer mesma slaba: Ibrl integra a segunda slaba de pobre mas a se-quncia Istl pertence a duas slabas na palavra pasta). Pela funoque tm as unidades prosdicas na caracterizao e funcionamentodas lnguas, elas so o objecto de estudo da prosdia.

    Estas caractersticas prosdicas, ou traos prosdicos, rela-cionam a fonologia com outros mdulos da gramtica. Por exem-plo, ao estabelecerem a diferena de significado entre uma frasedeclarativa e uma frase interrogativa por meio de entoao dife-rente com que produzida a mesma sequncia de palavras:

    Frase declarativa Frase interrogativa

    ._--- - - - - - - . - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - . . . . , . . . - - - . . "

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    aparecimento de novas palavras reside na capacidade de c ad a u madelas vir a ser utilizada e compreendida pela comunidade lingus-t ica e no em factores de ordem gramatical.O lxico , pois, o mdulo que contm o que pode ser vistocomo a matr ia-prima para a construo e a compreenso deenunciados lingusticos e que, por esta razo, se relaciona comtodos os outros mdulos da gramtica. Mas no um mero repo-sitrio de formas: a cada unidade lexical est associado um con-junto de propriedades que vai permitir a sua integrao, quer emestruturas de palavras complexas quer em frases. Vejamos algu-mas destas propriedades: A categoria sintctica (i. e. adjectivo, preposio, etc.) uma

    das propriedades basilares da palavra. ela que condiciona asua distribuio na frase. Por exemplo, querendo modificar onome casa de modo a dar conta de duas das suas caracters-t icas, a idade e o mater ial de construo, pode recorrer-se aum adjectivo, como novo, ou a um nome, como pedra. Noprimeiro caso, basta pospor o adjectivo ao nome - casa nova;no segundo caso, o nome tem de ser integrado numa expres-so com preposio, como em casa de pedra.

    As categorias morfossintcticas esclarecem, por exemplo,acerca da natureza de palavra varivel (como os verbos) ouinvarivel (como os advrbios) e das categorias de variaoformal (gnero e nmero, para as palavras de natureza nomi-nal; tempo, modo, aspecto, pessoa e nmero para os verbos,por exemplo). A representao fonolgica, como I#kaz+a#l, de casa, ou

    I#man +u#l, de mo, permite, depois de processada pelafonologia, chegar a uma dada realizao fontica (['kazuJ e['mw], nos exemplos anteriormente considerados). A representao semntica garante que a cada conjunto desons corresponda um dado significado ('casa', por exemplo,receber uma informao semntica do t ipo ' inanimado' e'contvel' e uma parfrase, mais ou menos complexa, como'construo tipicamente destinada a habitao humana'). s palavras est ainda associada informao sobre o seu per-

    curso histrico. Como, por exemplo, a informao sobre a ori-gem das palavras, que geralmente chamada etimologia: umapalavra como livro est associada ao timo latino LlBER,aldeia tem como timo o rabe AD-DA YHA.Cada unidade lexical pode ainda ser portadora de outras in-formaes. o caso de restries quanto ao uso, como as indi-caes relacionadas com o registo de lngua em que as palavraspodem ocorrer (veja-se o contraste entre cara, face e focinho). tambm com base neste tipo de informao que se pode esta-belecer uma distino entre o lxico geral e lxicos de especiali-dade: o primeiro integra as palavras que podem ser utilizadas emqualquer contexto discursivo. Os lxicos de especialidade s en-contram adequao em contextos discursivos pr-estabelecidos.Note-se que uma palavra que se integre num vocabulrio geralconhecer menos restries de ocorrncia do que uma palavraespecificamente destinada a um uso mais formal, ou outra cuja

    ocorrncia possa at ferir a susceptibilidade de quem a ouve forade um contexto informal e no-familiar.Sendo o lxico formado por uma to grande quant idade deinformao, no pode deixar de obedecer a princpios de organi-zao interna. Na verdade, o lxico uma entidade multi-estrutu-rada, ou seja, estruturada de acordo com diversos princpios, semque nenhum deles exclua os restantes. Ainda que os falantespossam no ter conscincia dessa classificao, um dos princpiosde organizao do lxico o da categorizao gramatical. A in-formao crucial diz respeito categoria sintctica, que permite,por exemplo, distinguir os adjectivos dos advrbios, dos nomes,das preposies e dos verbos, para referir apenas as categoriasprincipais. Mas o lxico tambm se estrutura a partir de algumascategorias morfossintcticas: no caso do Portugus, o valor degnero dos nomes, que subdivide este grupo em dois novos con-juntos (o dos nomes femininos e o dos nomes masculinos) comconsequncias visveis nas marcas de concordncia sintctica(veja-se, por exemplo, que sendo carta, notcia ou mensagemnomes femin inos, no femin ino que ocorre um modif icadoradjectival - carta I notcia I mensagem secreta; em contraparti-da, sendo recado, bilhete ou apontamento nomes masculinos,

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    livr(o)) e palavras complexas (como livrar(a)): o radical das pala-vras simples no pode ser decomposto em unidades menores maso radical das palavras complexas formado por diversas des. Nestas se inclui, obrigatoriamente, um radical simples e umprefixo (cf. des-Ieal), um sufixo (cf. livr-ari(a)), ou mesmo outroradical (cf. insect-i-cid(a)).Simples ou complexas, as palavras do Portugus dividem-se

    ainda por dois grupos: o das palavras flexionveis, subconjun-to das palavras variveis, que apenas inclui aquelas que variamde forma sistemtica. No Portugus, este o caso dos nomesque variam em nmero (cf. livro-livros) e dos verbos que variamem tempo (cf. canto-cantei). O segundo o grupo das palavrasque nunca podem ser flexionadas, como os advrbios, por exem-plo.

    Identificados os constituintes morfolgicos, compete mor-fologia explicitar a forma como eles se estruturam, quer na dis-posio linear, quer no relacionamento hierrquico. No Portugus,por exemplo, a estrutura interna das palavras exige o reconheci-mento de que ao radical se associa um especificador morfolgicoque, nos verbos, a vogal temtica - (por exemplo, o -a final decanta) - e, nas outras palavras, o ndice temtico (por exem- o -e final em Em conjunto com o radical, este especi-ficador forma o tema. Ea esta estrutura que se juntam os sufixosde flexo, responsveis por boa parte da variao morfossintcticadas palavras.As FRASES DA SINTAXE

    A MORFOLOGIAPara alm das propriedades que as caracterizam e que condi-cionam a sua integrao em frases, as palavras so estruturasanalisveis em unidades menores, como o radical e os afixos. Estesltimos incluem, por sua vez, unidades de muito diversa nature-za, dos sufixos de f lexo (como o -s final de livros ou o -va e o-mos de estudvamos) aos sufixos derivacionais (como os queformam nomes agentivos, que -dor - programador - e -ista - es-teticista - exemplificam) ou aos prefixos modificadores (como in-, Para construir um enunciado, as palavras combinam-se emum prefixo de negao, que ocorre em inaceitvel), e das vogais frases, mas a relao entre as palavras e a frase no uma rela-de ligao (como o -i- de insecticida ou o -0 - de biodiversidade) ? directa: as palavras pertencentes a categorias principais, ouvogal temtica (como o -a da primeira conjugao, em cantar, o seja, os nomes, os adjectivos, os verbos, as preposices e os-e da segunda, em beber e o -i da terceira, em fugir) dos verbos. advrbios, constituem-se como ncleo de uma unidade'maior osA todas estas unidades se d o nome de con st it ui nt es m orf ol - s in ta gm as, f or ma nd o, r espe ct ivam en te , s in ta gm as gicos. verbais, preposicionais e adverbiais. Os

    No radical esto as propriedades nucleares da palavra, como Integram obrigatoriamente um ncleo, distinguindo-se, em segui-a categor ia sintct ica e o seu significado bsico. tambm no da, aqueles que exigem a presena de complementos, como osradical que se encontra a diferena entre palavras simples (como I verbos transitivos ou as preposies, daqueles que no exigem___ mU ._ .__ ummm m __ __

    no masculino que ocorre um modificador adjectival - recado // bilhete / apontamento secreto).

    Um outro princpio, de natureza semntica, reparte as pala-vras por categorias de significao, com base em relaes desemelhana, como a sinonmia (aluno e estudante so nomessemanticamente muito prximos), de oposio, como a antonmia(alto e baixo so qualificadores que se situam nos plos opostosde um mesmo eixo) ou de i nc lu s o, como a hipo nmia e ahiperonmia: por exemplo, vaca um hipnimo de bovdeo, ouseja o significado de vaca e st i nc lu d o no significado dohipernimo bovdeo, no sentido em que bovdeo a classe a quepertencem as vacas.Um terceiro princpio de organizao do lxico de naturezafontica, dando origem, por exemplo, ao subconjunto das pala-vras que comeam por uma consoante vibrante (veja-se a popu-laridade de um ' tr ava- l ng ua s' com o . ,. o r at o roeu a rolha dagarrafa de rum do rei da Rssia... ). provvel que a facilidade nodesenho de rimas varie em funo do maior ou menor grau depreponderncia deste princpio no lxico de cada falante.

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    complementos, como os verbos intransitivos e a generalidade dosnomes e dos adjectivos. Assim, porque incluem constituintesque exigem a presena de complementos que frases como *estamenina ofereceu 9 ou *esta menina ofereceu chocolates a nopodem ser consideradas como frases bem construdas no Portu-gus. , no entanto, muito frequente que o ncleo dos sintagmasseja acompanhado por especificadores e por modificadores li. e.,determinantes, como em a menina; pronomes possessivos, comoem minha amiga; demonstrativos, como em esta menina, ou ou-tros sintagmas, como em menina bonita ou menina de ouro).

    Qualquer que seja o seu grau de complexidade interna, os sin-tagmas que constituem a frase estabelecem entre si determina-das relaes gramaticais relativamente ao predicado verbal, comosujeito, objecto directo, objecto indirecto ou oblquo, com basenas quais estabelecida a ordem bsica das palavras na frase.No Portugus, em que a ordem das frases normalmente sujei-to-verba-objecto (pelo que se denomina uma lngua SVO), mui-tas frases so constitudas por um sujeito e um predicado verbal,que so as relaes gramaticais bsicas (por exemplo, o gato mia).Se o predicado verbal for transitivo, a frase integra ainda um com-plemento directo, ou objecto directo, que tambm uma relaogramatical central (por exemplo, a menina comeu um chocolate).Outra relao gramatical central o complemento ou objecto in-directo (por exemplo, a menina ofereceu um chocolate amiga).Alm destas relaes gramaticais, existem outras denomi