MONITORAMENTO DE PEQUENOS E MÉDIOS MAMÍFEROS NA ESTRADA ... · MONITORAMENTO DE PEQUENOS E...
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ANA PAULA FERNANDA GUIMARÃES PEREIRA
MONITORAMENTO DE PEQUENOS E MÉDIOS MAMÍFEROS NA ESTRADA
BRAGANÇA – AJURUTEUA (RODOVIA PA-458), BRAGANÇA, PARÁ
BRAGANÇA 2004
ANA PAULA FERNANDA GUIMARÃES PEREIRA
MONITORAMENTO DE PEQUENOS E MÉDIOS MAMÍFEROS NA ESTRADA
BRAGANÇA – AJURUTEUA (RODOVIA PA-458), BRAGANÇA, PARÁ
BRAGANÇA
2004
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado
ao Colegiado do Curso de Licenciatura Plena
em Ciências Biológicas, da Universidade
Federal do Pará, Campus de Bragança, como
requisito parcial para a obtenção do Grau de
Licenciado em Ciências Biológicas (Modalidade
Biologia).
Orientador: Prof. Dr. Marcus E. B. Fernandes.
ANA PAULA FERNANDA GUIMARÃES PEREIRA
MONITORAMENTO DE PEQUENOS E MÉDIOS MAMÍFEROS NA ESTRADA
BRAGANÇA – AJURUTEUA (RODOVIA PA-458), BRAGANÇA, PARÁ
BANCA EXAMINADORA
Prof. Dr. Marcus E. B. Fernandes Campus de Bragança, UFPA
Profª Drª Cláudia Nunes Santos Campus de Bragança, UFPA M.Sc. José Antônio Renan Bernardi Campus de Bragança, UFPA
BRAGANÇA 2004
Este trabalho foi julgado com a obtenção do
Grau de Licenciado em Ciências Biológicas
(Modalidade Biologia) do Curso de
Licenciatura Plena em Ciências Biológicas
da Universidade Federal do Pará no
Campus de Bragança.
i
O rio atinge seus objetivos
porque aprendeu a
contornar obstáculos.
Lao-tsé
ii
Dedico este trabalho aos meus pais Paulo e Fátima, ao Marcel,
as minhas irmãs e tias, que através do amor, carinho e
compreensão fizeram com que esse sonho se
realizasse. O meu amor por vocês é eterno.
iii
AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus, pelo Dom da vida e que nos momentos mais difíceis não
me deixou fraquejar. Servindo de conforto nas muitas vezes em que me senti
só, mesmo não estando.
À minha família, aos meus pais Paulo e Fátima, pois acreditaram em mais
uma caminhada e que mesmo distantes me apoiaram e me mantiveram durante
esse período. Reconheço demais todos os esforços que vocês fizeram. As
minhas irmãs que também me apoiaram e nas vezes em que não tive tempo para
estar ao lado delas, elas deram um jeito para estar ao meu lado. A Jovelina que
durante os dois últimos anos cuidou de mim como se fosse sua filha. Ao meu
avô, todos os tios, tias, primos e primas que acreditaram nessa caminhada.
Ao meu amado Marcel longe durante várias semanas de curso, mas com um
amor que parecia aumentar e confirmar a família que somos hoje.
Ao João Victor por não ter me dado muito trabalho na hora em que mais
precisei.
Ao meu orientador Marcus Fernandes, mesmo tendo poucos momentos,
grandes advertências em busca do perfeccionismo e de Sábados de trabalhos,
soube ensinar, incentivar e terminar este longo estudo.
A Fernanda Andrade que esteve ao meu lado durante esses dois anos de
trabalho, ajudando, ensinando e, principalmente, se preocupando para que nada
desse errado.
Aos meus colegas de equipe Elaine, Stélio, Geovany, Daniela e André que
colaboraram muito com essa vitória.
Ao Sr. Puríssio pelas suas saídas cedo de casa e o enorme esforço por um
trabalho em que ele insistia em deixar claro que era “nosso”.
iv
As amigas Valéria, Andréia, Aline, Karla pelo esforço em ajudar, escutar e
incentivar na conquista desse curso.
A todos os meus colegas de curso que se tornaram uma nova família
durante esse longo caminho longe da família, parentes e outros amigos.
A todos os professores que contribuíram enormemente para esse aumento
de conhecimento.
E a todos aqueles que de forma direta ou indiretamente contribuíram para
essa longa caminhada. Muito obrigada!
v
SUMÁRIO
RESUMO............................................................................................................ vi
ABSTRACT........................................................................................................ vii
Introdução......................................................................................................... 01
Material e Métodos........................................................................................... 02
Área de Estudo..............................................................................................
Monitoramento...............................................................................................
Análise dos Dados.........................................................................................
Resultados........................................................................................................
02
04
04
04
Discussão.......................................................................................................... 08
Referências Bibliográficas............................................................................... 09
vi
RESUMO
O efeito da construção da rodovia PA-458 sobre a fauna de mamíferos associada
ao ecossistema manguezal foi monitorado, no intuito de quantificar o número de
acidentes letais ao longo do ciclo anual e identificar as espécies mais suscetíveis a
esses acontecimentos. Foram realizadas três visitas por semana nesta rodovia
durante o período de dezembro/2001 a dezembro/2003. Os mamíferos mortos por
atropelamento foram identificados, sexados, pesados, medidos e anotados os
locais de onde foram encontrados. Tendo como resultado o registro de 44
mamíferos de médio e pequeno porte, distribuídos em 3 ordens, 6 famílias, 7
gêneros e 7 espécies (Procyon cancrivorus, Cerdocyon thous, Eira barbara,
Cyclopes didactylus, Tamandua tetradactyla, Euphractus sexcinctus e Didelphis
marsupialis). A espécie registrada com maior frequência foi P. cancrivorus (n= 21),
sendo C. didactylus, E. barbara e E. sexcinctus as menos vitimadas. A análise de
variância mostrou que não houve diferença significativa entre o número de
indivíduos mortos nos dois anos de monitoramento (ANOVA, F=0,35; gl=1;
p>0,05). Por outro lado, a comparação do número de indivíduos mortos em cada
quilômetro da estrada foi bastante significativa (K-S, DM=0,22; p<0,01), sendo o
Kms 13 e 20 os perímetros onde ocorreram as maiores taxas de atropelamentos.
A comparação do número de atropelamentos entre o período chuvoso e o período
seco dos dois anos de estudo não apresentou diferença significativa ( ² = 0,151; gl
= 1; p>0,05). Contudo, os registros triplicaram durante os meses de junho e julho
desses dois anos. Considerando que durante esses meses ocorre um aumento no
tráfego de veículos na rodovia, em função do número elevado de turistas atraídos
pela praia de Ajuruteua, existente na Vila, é de se esperar que a taxa de
atropelamentos associados às florestas de mangue, também seja elevada durante
esse período do ano.
Palavras-Chaves: manguezal, mastofauna, mortes na estrada, Bragança, Pará.
vii
ABSTRACT
The effect of the PA-458 road´s construction on the associated mastofauna of
mangrove ecosystem was monitored, in order to quantify the number of lethal
accidents along the annual cycle and identify most susceptible species. The
monitoring was carried out three times a week from december/2001 to
december/2003. Killed road mammals were identified, sexed, weighted, measured
and noted the place where animals were found. Fourty-four medium and small-
sized mammals were recorded, being classified in three orders, six families, seven
genera and seven species: Procyon cancrivorus, Cerdocyon thous, Eira barbara,
Cyclopes didactylus, Tamandua tetradactyla, Euphractus sexcinctus and Didelphis
marsupialis. The most frequently species found was P. cancrivorus (n= 21), being
C. didactylus, E. Barbara and E. sexcinctus the least ones. The analysis of
variance showed that there was non significant difference between the number of
killed road individuals during both years of monitoring (ANOVA, F=0.35; df=1;
p>0.05). On the other hand, the comparison of the number of killed road individuals
at each kilometer along the road was very significant (K-S, DM=0.22; p<0.01),
being the Kms 13th and 20th the places which presented higher rates of lethal
accidents. The comparison of the number of kill road between the wet and dry
season of both years of study did not presented significant difference ( ² = 0.151;
df = 1; p>0.05). However, the records tripled during June and July of these years.
Considering that car traffic increases during these months, due to the increase of
turists attracted by the resort options in Ajuruteua, it is worthy to think that the rate
of kill road, associated to mangrove forests, will also increase during this period of
the year.
Key words: mangal, mastofauna, kill road, Bragança, Pará.
1
INTRODUÇÃO
O ecossistema manguezal possui vegetação característica, que se
desenvolve sobre solo lamoso, em áreas de interface entre os ambientes
terrestre e marinho (FERNANDES, 1997). As florestas de mangue
desempenham papel primordial na cadeia trófica, que é representada por
grande diversidade de espécies animais, tais como moluscos, crustáceos,
peixes, aves e mamíferos, além do que, os manguezais também servem de
áreas de abrigo, reprodução e forrageio para a maioria das espécies
características de vertebrados dos sistemas adjacentes (FERNANDES, 2000).
O Brasil possui uma das maiores diversidades biológicas quando
comparado aos outros países megadiversos do planeta (LEWINSOHN &
PRADO, 2002). De acordo com estes autores são conhecidas 4.650 espécies
de mamíferos no mundo, sendo que 524 espécies ocorrem no Brasil, e destas
70% ocorrem na região amazônica (FONSECA et al. 1996, 1999). Sendo
registradas, até o momento, apenas 19 espécies de mamíferos para o
manguezal, de acordo com o trabalho realizado por FERNANDES (2000).
Nos manguezais da costa norte do Brasil, a presença dessas espécies
parece ser determinada pelo seu ciclo de vida e pela utilização dos recursos
disponíveis no mosaico de ecossistemas contíguos. FERNANDES (2000)
propôs categorias de status de residência, tais como: a) residentes
permanentes (espécies dependentes dos recursos do manguezal durante
todo seu ciclo de vida); b) residentes de longo prazo (espécies dependentes
dos recursos do manguezal, utilizando mais do que um período sazonal ao
longo do seu ciclo de vida); c) residentes sazonais (espécies dependentes do
recurso em determinada estação do ano); d) residentes parciais (espécies
que não dependem necessariamente dos recursos do manguezal e se
movimentam por horas ou dias neste sistema) e e) visitantes esporádicos
(espécies que não dependem do manguezal e que ocasionalmente se
beneficiam deste ambiente para forrageio ou abrigo). FERNANDES (2000)
ressaltou que a utilização de diversos ecossistemas pelas espécies que
ocupam grandes áreas de vida, pode ser um dos resultados da pressão
ocasionada pela ocupação humana desses ambientes.
De acordo com VIVO (1996), a exploração desordenada e, muitas
vezes, predatória desses recursos naturais faz com que ocorra uma alteração
2
na biodiversidade local. Corroborando esta idéia, PANITZ & PORTO FILHO
(2003), afirmam que atividades antrópicas como poluição, desmatamentos,
construções de estradas e pontes causam um desequilíbrio ecológico,
comprometendo assim a qualidade do ambiente local.
Poucos estudos foram realizados sobre acidentes com animais em
rodovias ao redor do mundo (OXLEY et al., 1974; FISHER, 2002). Este último
trabalho, por exemplo, descreve um estudo de caso registrado para a rodovia
BR-262, localizada no Mato Grosso do Sul, cujos resultados confirmaram que
41,7% dos acidentes com choques nas estradas envolvem animais
domésticos ou silvestres.
No Pará, a construção da rodovia PA-458, que liga a cidade de
Bragança à vila de Ajuruteua, por exemplo, ocasionou a obstrução de canais
de maré, principalmente no Km 17, gerando um grande desequilíbrio no fluxo
hídrico e, conseqüentemente, afetando a vegetação e a fauna característica
de boa parte dos manguezais por onde a estrada foi construída
(FERNANDES et al., 2002). Além disso, o tráfego de veículos proporcionado
pela construção dessa rodovia, tem promovido contínuos acidentes letais com
diversas espécies de animais silvestres associadas às florestas de mangue.
Tendo em vista a necessidade de se monitorar o efeito da construção
da PA-458 sobre a fauna de mamíferos associada ao manguezal, este
trabalho tem como objetivos quantificar o número de acidentes letais por
atropelamento ao longo do ciclo anual e identificar as espécies mais
suscetíveis a esses acontecimentos.
MATERIAL E MÉTODOS
Área de Estudo
Este estudo foi realizado na rodovia PA–458, que liga a cidade de
Bragança à vila de Ajuruteua, com 36 km de percurso (Figura 1), sendo que
nos 10 primeiros quilômetros a área é caracterizada por capoeiras com
presença de casas em pequenas localidades, enquanto que os 26
quilômetros restantes a área é exclusivamente vegetada por bosque de
mangue e presença de campo salino.
Esta rodovia foi construída em 1974 (LARA & COHEN, 2003),
possuindo uma superfície asfaltada e em seu percurso seis pontes, onde nas
3
proximidades destas há ranchos, sendo que a última ponte dá acesso à vila
dos pescadores em Ajuruteua. De acordo com MARTINS & SOUZA FILHO
(2001), esta rodovia foi construída para escoar a produção dos pescados da
vila de Ajuruteua e desenvolver o ecoturismo potencial da região.
A região é caracterizada como de clima bi-sazonal, com uma média
anual de precipitação de 2.482 mm, ocorrendo no período de janeiro a junho
uma estação chuvosa e uma estação seca, que ocorre no período de
setembro a novembro, de acordo com estação meteorológica localizada na
cidade de Tracuateua, que fica a 16 Km da cidade de Bragança. (MEDINA et
al., 2001).
Figura 1 – Localização da rodovia PA-458 na península bragantina,
Bragança-Pará. Mapa modificado de Krause et al. (2001).
Rodovia PA-458
4
Monitoramento
O monitoramento ao longo da rodovia foi realizado três vezes na
semana, durante o período de dezembro de 2001 a dezembro de 2003.
Sendo este realizado de carro, a uma velocidade média de 60 km/h, sendo
que ocorreram várias contribuições de pessoas não envolvidas com o
trabalho, mas que traziam os animais atropelados para o laboratório.
Os mamíferos encontrados mortos na rodovia foram levados ao
laboratório no Campus de Bragança-UFPA, identificados, sexados (apenas os
indivíduos que não apresentavam estágio avançado de putrefação), pesados,
retiradas algumas medidas, tais como: o comprimento da pata traseira, da
cauda, do corpo, da cabeça e da orelha e registrado o local da rodovia onde o
indivíduo foi encontrado. A identificação dos espécimes coletados foi feita de
acordo com a classificação taxonômica de EMMONS (1997).
Análise dos Dados
Os dados foram testados quanto à normalidade utilizando-se o teste
Lilliefors (k amostras). A variação do número de indivíduos mortos por espécie
nos dois anos de monitoramento foi comparada através da análise de
variância ANOVA-um fator. O número de indivíduos mortos dos dois anos de
monitoramento foi somado, tanto para cada quilômetro da rodovia quanto
para cada mês do ano, sendo efetuada a análise de variância através do teste
de aderência não paramétrico de uma amostra, Kolmogorov-Smirnov (K-S).
Por último, comparou-se o período ao longo do ano onde foi registrado o
maior número de indivíduos mortos, através do teste Qui-Quadrado com duas
amostras independente. Toda a análise estatística foi realizada utilizando-se o
programa Bio.Estat 3.0 (AYRES et al., 2003).
RESULTADOS
Durante o período de dezembro de 2001 a dezembro de 2003 foram
registrados 44 mamíferos de médio e pequeno porte mortos por
atropelamento, sendo distribuídos em 3 ordens, 6 famílias, 7 gêneros e 7
espécies. Tabela 1
5
Tabela 1. Hierarquia taxonômica e nome popular das espécies de mamíferos mortas por atropelamento na rodovia PA – 458
Falta nome popular das espécies
Separando os registros para cada ano de monitoramento, no primeiro
ano (2002) foram coletados 26 espécimes de 6 espécies, enquanto no
segundo (2003) foram registrados 18 espécimes de 6 espécies (Tabela 2). Da
comparação dos dois anos de estudo, teve se no primeiro ano uma espécie
diferente que foi C. didactylus, ao passo que no segundo ano foram as
espécies E. barbara e E. sexcinctus.
A Tabela 2 também apresenta a espécie com maior número de
registros de atropelamento, P. cancrivorus, com 21 indivíduos mortos,
enquanto que C. didactylus, E. barbara e E. sexcinctus foram as espécies
menos vitimadas, com apenas um registro.
Tabela 2 - Número de espécimes e espécies registrados nos dois anos de
monitoramento da rodovia PA-458, Bragança-Pará.
Ordem Família Gênero Espécie
Carnivora Procyonidae Procyon P. cancrivorus
Canidae Cerdocyon C. thous
Mustelidae Eira E. barbara
Xenerthra Mymercophagidae Cyclopes C. didactylus
Tamandua T. tetradactyla
Dasypodidae Euphractus E. sexcinctus
Didelphimorphia Didelphidae Didelphis D. marsupialis
Espécies 2002 2003 Total
P. cancrivorus 13 8 21
C. thous 4 1 5
E. barbara 0 1 1
C. didactylus 1 0 1
T. tetradactyla 3 6 9
E. sexcinctus 0 1 1
D. marsupialis 5 1 1
Total 26 18 44
6
A análise de variância mostrou que não houve diferença significativa
entre o número de indivíduos mortos nos dois anos de monitoramento
(ANOVA, F=0,35; gl=1; p>0,05). Por outro lado, a comparação da variação do
número de indivíduos mortos ao longo de cada quilômetro da estrada foi
bastante significativa (K-S, DM=0,22; p<0,01), sendo os Kms 13 e 20 os
perímetros onde ocorreram as maiores taxas de acidentes letais (Figura 2).
A comparação do número de acidentes entre o período chuvoso e o
período seco entre os dois anos de monitoramento não apresentou diferença
significativa ( ² = 0,151; gl = 1; p>0,05). O mesmo resultado foi obtido quando
foi realizado o teste não paramétrico kolmogorov-Smirnov, utilizando-se o
número de atropelamentos ao longo dos meses de estudo para os dois anos
juntos (K-S, p>0,05), muito embora a frequência dos acidentes tenham se
concentrado nos meses de junho e julho (Figura 3). A curva formada com o
número de atropelamentos para todas as espécies ao longo do ano, de fato, é
influenciada pela curva de uma única espécie em particular, P. cancrivorus,
cuja flutuação define a curva para todas as outras espécies juntas (Figura 4).
Através dos resultados deste trabalho foi possível avaliar os efeitos da
construção da rodovia PA-458 sobre as espécies de mamíferos de médio e
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Rodovia PA-458 (Km)
No
. A
tro
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lam
en
tos
Figura 2 - Número de atropelamentos de mamíferos a cada quilômetro
da rodovia PA – 458, durante o período de dezembro/2001 a
dezembro/2003, Bragança - Pará.
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pequeno porte, as quais utilizam as florestas mangue e terra firme no entorno
desta rodovia.
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(2002/2003)
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Figura 4 - Número de atropelamentos por mês de Procyon
cancrivorus, dos dois anos de monitoramento juntos, rodovia PA-
458, Bragança-PA.
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(2002/2003)
Figura 3 - Número de atropelamentos de todas as espécies registradas
por mês, dos dois anos de monitoramento juntos, rodovia PA-458,
Bragança-PA.
8
DISCUSSÃO
Os dados aqui apresentados mostraram que os acidentes letais
envolvendo os mamíferos de médio e pequeno porte ocorreram por quase
todos os trechos da PA–458, sendo que o maior índice foi registrado para o
Km 13, que é próximo ao Furo do Taici (primeira ponte da estrada) e para o
Km 20, que se localiza próximo às “ilhas” de terra-firme. Isto pode ser
explicado devido a esses dois perímetros da rodovia serem os mais próximos
às florestas de terra firme, de onde os mamíferos são oriundos. Por outro
lado, os atropelamentos ao longo de todo o percurso da rodovia também
enfatizam a utilização das florestas de mangue da península bragantina por
essas espécies de mamíferos, já que segundo FERNANDES (1997), esses
animais provenientes das florestas adjacentes ao mangue são potencialmente
exploradores dos recursos disponíveis no manguezal.
Procyon cancrivorus, por exemplo, foi a espécie que apresentou o maior
número de acidentes letais. A presença desse carnívoro nos bosques de
mangue é bastante conhecida. De acordo com FERNANDES (2000), P.
cancrivorus apresenta um comportamento predatório sobre as populações de
caranguejos (Uca sp.), sendo reconhecido como uma das associações mais
especializadas de mamíferos com o ecossistema manguezal. O fato de esta
espécie ter sido registrada em doze pontos diferentes ao longo da rodovia,
desde o Km 03 até o Km 30, sugere a ampla utilização deste sistema por esta
espécie. Este mesmo autor afirma que os mamíferos exploram os recursos
do manguezal, tanto por longos períodos como através de pequenas visitas
durante um ciclo anual, classificando a mastofauna em diferentes status de
residência. Isto é o que provavelmente acontece com o restante das espécies
de mamíferos aqui registradas, cujas incursões no manguezal parecem ser
mais esporádicas do que de forma sazonal ou de longo termo.
Embora as análises estatísticas tenham demonstrado que não houve
diferença significativa entre os atropelamentos ao longo dos meses do ano, o
número de registros triplicou durante os meses de junho e julho nos dois anos
de estudo. OXLEY et al. (1974) consideram que as estradas juntamente com
alguns fatores como o tráfego, a superfície da estrada e a largura da mesma,
funcionam como uma barreira que inibe os movimentos de pequenos
mamíferos. Esses autores, em um estudo de caso nas estradas do Canadá,
9
comprovaram que somente o tráfego não inibe o cruzamento dos animais
pelas estradas, mas quando a quantidade e a velocidade dos veículos
também são elevadas, esta combinação de fatores acaba por provocar um
aumento da mortalidade dos animais. Esses mesmos autores apontaram para
o fato de que como a superfície da estrada influencia na velocidade e no
volume de veículos, a largura reduzida da estrada também aumenta o
movimento dos mamíferos nas mesmas, ocorrendo uma elevação das taxas
de mortalidade desses animais. Considerando que durante os meses de
junho e julho ocorre um aumento no tráfego de veículos na PA-458, em
função do número elevado de turistas atraídos pelas praias de Ajuruteua, é de
se esperar que a mortalidade dos mamíferos associados às florestas de
mangue também seja elevada durante esse período do ano.
FISHER (2002) considera a rodovia BR–262, no Mato Grosso do Sul,
uma das maiores barreiras ambientais, onde os números de acidentes por
atropelamento superam os números da caça predatória e comercial de
animais silvestres nessa região. OXLEY et al. (1974), assim como PANITZ &
PORTO FILHO (2003) acreditam que as construções de estradas devem ser
consideradas como um impacto do homem sobre o meio ambiente. Por fim, é
importante ressaltar que o presente estudo é a primeira análise do efeito da
construção da rodovia PA-458 sobre a mastofauna característica das florestas
de entorno, sendo ainda necessário um monitoramento de longo prazo para
que o impacto causado seja melhor avaliado.
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