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i MINERAIS E VITAMINAS NO METABOLISMO ANIMAL Félix H. D. González Sérgio Ceroni da Silva Laboratório de Análises Clínicas Veterinárias Faculdade de Veterinária Universidade Federal do Rio Grande do Sul Porto Alegre, Brasil 2019

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MINERAIS E VITAMINAS NO METABOLISMO

ANIMAL

Félix H. D. González

Sérgio Ceroni da Silva

Laboratório de Análises Clínicas Veterinárias

Faculdade de Veterinária

Universidade Federal do Rio Grande do Sul

Porto Alegre, Brasil

2019

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Revisão textual: Carlos Batanoli Hallberg

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Os autores

Félix H. Diaz González é médico veterinário formado pela Universidade Nacional da Colômbia

(Bogotá, 1979), com mestrado em Fisiologia Animal pela Escola de Pós-Graduação ICA/UNC

(Colômbia, 1985) e doutorado em Bioquímica Animal pela Universidade Federal de Viçosa

(Brasil, 1990). De 1983 a 1995 foi professor e pesquisador da Faculdade de Medicina Veterinária

e Zootecnia da Universidade Nacional da Colômbia, nas áreas de Bioquímica e Fisiologia Animal,

onde participou como orientador no Programa de Pós-Graduação em Saúde e Produção Animal.

Desde 1996 atua em docência, extensão e pesquisa na Faculdade de Veterinária da Universidade

Federal do Rio Grande do Sul, em Porto Alegre, onde atualmente é Professor Titular e orientador

do Programa de Pós-Graduação em Ciências Veterinárias na área de metabolismo animal e

transtornos metabólicos. Foi professor convidado na Universidade de Los Llanos (Colômbia), na

Universidade de Santiago de Compostela (Espanha), na Universidade Nacional (Colômbia), e na

Universidade de la República (Uruguai).

Sérgio Ceroni da Silva é médico veterinário formado pela Universidade Federal do Rio Grande

do Sul (Porto Alegre, 1982), com mestrado em Genética e Biologia Molecular pela UFRGS (Porto

Alegre, 1986) e doutorado em Biologia Molecular pela Universidade de Glasgow (Reino Unido,

1993). Desde 1987 é professor de Bioquímica Clínica Veterinária na Faculdade de Veterinária da

Universidade Federal do Rio Grande do Sul, atuando também como pesquisador no Laboratório de

Biologia Molecular Aplicada desta mesma faculdade.

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Dedico com amor: Laurita, Lupita, Rezinha, Rosita

FHDG

v

Prefácio

Minerais e vitaminas são compostos essenciais com múltiplas funções no metabolismo

animal. Apesar de diferirem na sua estrutura e origem (minerais são biomoléculas inorgânicas,

vitaminas são orgânicas), cumprem funções similares, principalmente no que se refere à ação de

muitas enzimas. Os minerais, adicionalmente, têm importante papel na estrutura de tecidos.

Frequentemente estes dois grupos de biomoléculas são estudados de forma tangencial nos cursos

de bioquímica, o que deixa a impressão, nos estudantes de ciências veterinárias e biomédicas em

geral, que não seriam tão importantes. É por isso que o presente livro tem seu foco nesses

compostos, tão essenciais como fundamentais no contexto das rotas e processos de controle

metabólico. Muito embora a lista de minerais exceda aos aqui considerados, são vistos aqueles

metabolicamente mais importantes. A revisão prioriza conceitos em animais domésticos relativos

às funções e às deficiências dessas biomoléculas. A publicação pretende servir como texto de apoio

nas disciplinas de bioquímica, nutrição e transtornos metabólicos para alunos de Medicina

Veterinária e Zootecnia.

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Sumário

Introdução 1

Minerais 2

Cálcio 5

Funções do cálcio 6

Controle da calcemia 7

Transtornos da paratireoide 9

Hipocalcemia nas vacas leiteiras 11

Hipocalcemia da cadela (Eclampsia) 14

Raquitismo 15

Osteoporose 16

Toxicidade 17

Fósforo 19

Funções do fósforo 20

Deficiência de fósforo 20

Hemoglobinúria 22

Toxicidade 23

Abordagem do status de Ca e de P 23

Magnésio 25

Funções do magnésio 25

Deficiência de magnésio 26

Tetania das pastagens 27

Toxicidade 28

Sódio 29

Funções do sódio 30

Deficiência de sódio 31

Transtornos de manutenção da natremia 31

Toxicidade 31

Potássio 33

Funções do potássio 33

Deficiência de potássio 34

Transtornos de manutenção da calemia 34

Toxicidade 35

Cloro 36

Funções do cloro 36

Deficiência de cloro 36

Transtornos de manutenção da cloremia 36

Toxicidade 37

Enxofre 38

Funções do enxofre 38

Deficiência de enxofre 39

Toxicidade 39

Ferro 40

Funções do ferro 41

Deficiência de ferro 41

Toxicidade 42

Zinco 44

Funções do zinco 45

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Deficiência de zinco 45

Toxicidade 46

Cobre 47

Funções do cobre 48

Deficiência de cobre 48

Toxicidade 49

Iodo 52

Funções do iodo 53

Deficiência de iodo 54

Toxicidade 55

Cobalto 56

Funções do cobalto 56

Deficiência de cobalto 56

Toxicidade 57

Manganês 58

Funções do manganês 58

Deficiência de manganês 58

Toxicidade 59

Selênio 60

Funções do selênio 60

Deficiência de selênio 61

Toxicidade 62

Molibdênio 63

Funções do molibdênio 63

Deficiência de molibdênio 63

Toxicidade 64

Cromo 65

Bibliografia sobre minerais 66

Vitaminas 69

Vitamina A 72

Funções da vitamina A 74

Deficiência de vitamina A 76

Toxicidade 76

Vitamina D 78

Funções da vitamina D 81

Deficiência de vitamina D 82

Toxicidade 83

Vitamina E 84

Funções da vitamina E 86

Deficiência de vitamina E 87

Toxicidade 88

Oxidação e antioxidantes 88

Vitamina K 93

Funções da vitamina K 94

Deficiência de vitamina K 96

Toxicidade 97

Tiamina (vitamina B1) 98

Funções da tiamina 99

Deficiência de tiamina 100

Toxicidade 101

Riboflavina (vitamina B2) 102

Funções da riboflavina 103

viii

Deficiência de riboflavina 104

Toxicidade 105

Niacina (vitamina B3) 106

Funções da niacina 107

Deficiência da niacina 108

Toxicidade 109

Piridoxina (vitamina B6) 110

Funções da piridoxina 110

Deficiência da piridoxina 111

Toxicidade 112

Ácido pantotênico 113

Funções do ácido pantotênico 113

Deficiência do ácido pantotênico 114

Toxicidade 115

Biotina 116

Funções da biotina 116

Deficiência de biotina 117

Toxicidade 118

Folacina (ácido fólico) 119

Funções do ácido fólico 120

Deficiência do ácido fólico 121

Toxicidade 121

Cianocobalamina (vitamina B12) 122

Funções da vitamina B12 124

Deficiência da vitamina B12 125

Toxicidade 126

Colina 127

Funções da colina 128

Deficiência da colina 128

Toxicidade 129

Ácido ascórbico (vitamina C) 130

Funções da vitamina C 131

Deficiência de vitamina C 131

Toxicidade 132

Carnitina 133

Funções da carnitina 133

Deficiência da carnitina 134

Toxicidade 134

Bibliografia sobre vitaminas 135

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Introdução

Os minerais já eram conhecidos desde tempos ancestrais como nutrientes necessários para o

metabolismo animal. Entretanto, até o início do século 20 acreditava-se que apenas os nutrientes

mais abundantes, isto é, proteínas, lipídeos, glicídeos e minerais, eram suficientes para um

adequado crescimento e manutenção dos organismos. No último século ficou evidenciada a

necessidade de alguns fatores que eram necessários em pequenas quantidades para as funções vitais

e assim foram sentadas as bases do metabolismo das vitaminas.

Minerais e vitaminas são biomoléculas que sobressaem no metabolismo animal por estarem

comprometidas como cofatores enzimáticos. Os minerais são biomoléculas inorgânicas essenciais

que têm também importância na estrutura de tecidos, no controle de vias metabólicas (como

ativadores da ação hormonal) e da pressão osmótica e o equilíbrio ácido-básico. Eles se encontram

em proporção de 2 a 5% do peso corporal. As vitaminas, por sua vez, diferem dos minerais por

serem moléculas orgânicas, mas compartilham algumas características funcionais, como estarem

no organismo em quantidades pequenas, e por algumas delas participarem como cofatores

enzimáticos.

As deficiências de minerais e vitaminas podem levar a doenças comprometidas com o

metabolismo. Embora a maioria das vitaminas deva ser consumida na dieta, assim como os

minerais, algumas delas podem ser sintetizadas no organismo (vitamina C, vitamina D, niacina,

carnitina) e uma grande parte pode ser sintetizada por bactérias intestinais.

2

Minerais

Apesar de transtornos relacionados a deficiências e intoxicações com minerais terem sido

descritos na literatura científica desde a antiguidade, apenas no século 20 foram estudados em

profundidade aspectos metabólicos e nutricionais, após o desenvolvimento de técnicas de

determinação de minerais nos fluidos e tecidos animais, tais como a espectrofotometria óptica e de

absorção atômica e a fotometria de chama.

Os minerais podem ser divididos em macrominerais e microminerais (estes últimos também

chamados de oligoelementos ou minerais traço), o que faz relação à sua proporção no organismo

animal e aos requerimentos nutricionais. Os macrominerais estão em maior concentração no

organismo animal e seus requerimentos são expressos em percentagem. Os macrominerais e sua

proporção aproximada no organismo animal são os seguintes: cálcio: 1,33%, fósforo: 0,74%,

potássio: 0,19%, sódio: 0,16%, enxofre: 0,15%, cloro: 0,11% e magnésio: 0,04%. O cálcio responde

por 46% e o fósforo por 29% de todos os minerais no organismo. O restante dos macrominerais

perfazem cerca de 24,7% do total de minerais.

Os microminerais estão em concentrações bem menores (respondem por 0,3% do total

mineral) e seus requerimentos são expressos em partes por milhão (ppm). Entre eles estão: cobre,

zinco, iodo, selênio, ferro, cobalto, manganês, molibdênio, flúor e cromo. Poderiam ser

classificados como “novos minerais traço” aqueles que ainda estão em menor quantidade e que têm

seus requerimentos expressos em partes por bilhão (ppb). Entre eles se contam: arsênico, boro,

chumbo, lítio, níquel, silício, estanho e vanádio. Desses elementos, não são essenciais para as

plantas cálcio, iodo, cobalto, selênio e cromo, havendo com frequência deficiências deles na

alimentação baseada em pastagens. Os requerimentos médios na alimentação, a concentração

plasmática e as principais fontes dos minerais são mostrados na Tabela 1.

Os ossos constituem o maior local de armazenagem dos minerais (85% do total de minerais,

basicamente de cálcio, fósforo e magnésio). A tireoide se caracteriza por armazenar ao menos 80%

do total de iodo do organismo. Os demais minerais se distribuem uniformemente nos vários tecidos

do corpo animal.

As deficiências mais frequentes de macrominerais nos animais são as de fósforo e as de

sódio, principalmente nos animais mantidos a pastejo. A deficiência de cálcio, embora menos

frequente, cobra importância nos bovinos de leite de alta produção e nas cadelas em amamentação.

Deficiências de enxofre são de importância em ruminantes, relacionadas com a síntese de

aminoácidos sulfurados (metionina, cisteína, cistina e taurina).

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Quanto aos oligoelementos, as deficiências mais comumente observadas em animais são as

de cobre, cobalto e zinco, seguidas de selênio e iodo. Os graus de deficiência, porém, variam

bastante, desde estados carenciais leves ou subclínicos que afetam principalmente a produtividade

e a fertilidade até estados graves com sintomatologia específica.

Em geral, as deficiências minerais se manifestam de forma clínica quando ultrapassam a

situação marginal, tendo sinais inespecíficos, tais como perda e/ou despigmentação do pelo,

alterações na pele, aborto, diarreia, anemia, perda de apetite e de peso, anormalidades ósseas, baixa

fertilidade e alotrofagia (consumo de material estranho). É importante a definição do diagnóstico

de deficiência mineral devido à confusão com outras desordens que podem ter manifestações

semelhantes, tais como deficiência de proteína, parasitismos, efeitos de plantas tóxicas ou doenças

infecciosas.

Tabela 1 – Concentração plasmática, requerimentos na alimentação e fontes de macro e

microminerais

Mineral Concentração

plasmática

Requerimentos

(na matéria seca)

Fontes

Ca 8,7-11 mg/dL 0,4-0,9% Leite, leguminosas, farinhas de peixe, carne e osso,

fosfato bicálcico

P 4,0-8,0 mg/dL 0,4-0,7% Leite, cereais, farinhas de peixe, carne e osso, fosfato

monossódico

Mg 1,8-3,5 mg/dL 0,03-0,04% Trigo, leveduras, farelos de algodão e linhaça, trevo,

farinha de ossos, óxido de Mg

Na 137-148 meq/L 0,6-1% Produtos de origem animal, principalmente marinhos,

sal comum

K 3,8-5,2 meq/L 0,5-0,8% Cloreto de K, bicarbonato de K, iodeto de K

Cl 97-107 meq/L 0,1% Farinhas de peixe e carne, sal comum

Fe 57-233 g/dL 150-200 ppm Leguminosas, sementes, farinhas de sangue e fígado

Cu 60-200 g/dL 15-30 ppm Sementes, pastagens, farinhas de sangue e fígado

Zn 70-150 g/dL 10-20 ppm Leveduras, cereais, farinhas de soja e algodão

Co 10-30 ng/dL 0,2-0,3 ppm Pastagens, sulfato de Co, cloreto de Co, carbonato de

Co

Mn 50-100 ng/dL 5-10 ppm Pastagens, trigo, farinha de carne, sulfato de Mn

Se 0,2-7,0 g/dL 0,05 ppm selenito e selenato de Na, selenato de Ba

I 10-40 g/dL 0,03-0,05 ppm Iodeto de K (no sal)

Mo 0,2 g/dL 1-4 ppm Soja

As deficiências de minerais podem ser estudadas a partir da análise do solo e da forragem

onde os animais estão localizados. Porém, devido às variações na disponibilidade, aos custos das

análises e as interferências dos diferentes minerais, o diagnóstico de deficiência mineral no animal

deve preferencialmente ser abordado a partir da análise de fluidos, principalmente sangue e urina,

para obter uma ideia mais aproximada do balanço metabólico de um determinado mineral. A

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melhor forma de obter um diagnóstico de deficiência mineral é avaliar a resposta à suplementação

do mineral específico. Porém, este pode ser um método que envolve alto custo e tempo, além de

metodologia adequada. Um claro objetivo da pesquisa em minerais é obter métodos de análise que

possam indicar situações de deficiência. A concentração do próprio mineral em sangue pode ser

um bom indicador, mas também podem ser usados indicadores indiretos, como por exemplo,

tiroxina sérica como indicador de iodo, glutation peroxidase intraeritrocitária como indicador de

selênio, metilmalonato urinário como indicador de cobalto, ou ceruloplasmina e metalotioneína

como indicadores de cobre e zinco, respectivamente.

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Cálcio (Ca)

Credita-se o descobrimento do Ca a Sir Humphrey Davey em 1808, ao que se seguiram várias

pesquisas sobre a composição do osso, durante o século 19. Foi assim estabelecido que ¾ partes

dos ossos está composta por hidroxiapatita e fosfato de Ca, com pequenas quantidades de carbonato

de Ca (10%) e sais de Mg (15%). Em 1842, Choussat realizou um dos primeiros experimentos

sobre a função do Ca. Ele alimentou pombas com dietas a base de trigo e viu que morriam com

ossos muito frágeis, mas quando eram alimentadas com carbonato de Ca, os ossos ficavam normais.

A necessidade de Ca na alimentação para mães lactantes foi estabelecida no início do século 20. O

Ca é o mineral mais abundante no organismo animal e está intimamente associado ao metabolismo,

apesar de que quase 99% do Ca do organismo esteja no esqueleto e nos dentes.

No plasma, existem duas formas de Ca, a forma livre ionizada (cerca de 45%) e a forma

orgânica, associada a moléculas tais como proteínas, principalmente albumina (cerca de 45%) ou a

ácidos orgânicos (cerca de 10%). O Ca que exerce funções vitais se encontra nos tecidos corporais

na forma ionizada (Ca2+). O Ca total, forma como rotineiramente é medido no sangue, contém a

forma ionizada que é biologicamente ativa, e a forma não ionizada. Estas duas formas estão em

equilíbrio e sua distribuição final depende do pH sanguíneo e da concentração de albumina. Quando

existe acidose, a tendência é aumentar a forma ionizada de Ca. Uma queda no nível de albumina

causa diminuição do valor analisado de Ca sanguíneo. Pode ser utilizada uma fórmula para corrigir

a concentração de Ca com base na concentração de albumina, assim:

Cacorrigido = [0,8 𝑥 albumina normal

albumina medida] + Camedido

Nesta equação deve se considerar que a albumina “normal” (referência) pode variar

conforme o estado fisiológico do animal, a espécie, a idade, entre outros fatores. O teor de Ca total

no plasma/soro da maioria das espécies animais é bastante constante, localizando-se entre 8 a 12

mg/dL. O Ca ionizado, geralmente medido por potenciometria (eletrodos íon-seletivos) está entre

4,5 a 4,9 mg/dL. Considera-se que o Ca ionizado reflete melhor o metabolismo do Ca do que os

níveis de Ca total.

Os grãos em geral (cevada, trigo, milho, sorgo, aveia) contêm muito pouco Ca (0,02-0,1%),

enquanto as pastagens e o feno possuem valores intermediários (0,31-0,36%) e as leguminosas são

alimentos com boas fontes de Ca (1,2-1,7%).

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Funções do cálcio

O Ca é um dos minerais que mais funções exerce no metabolismo animal. Formando parte

da matriz óssea do esqueleto, o Ca se encontra em duas formas: cristalina como fosfato de Ca,

similar a hidroxiapatita, e não cristalina, amorfa, importante durante o crescimento do osso. Essa

fração de Ca ósseo está em condição dinâmica, sendo permanentemente reciclado e servindo como

depósito, a partir do qual pode ser extraído para manter a homeostase do Ca. O Ca é necessário

para ter um eficiente ganho de peso, sendo particularmente importante na produção de leite e de

ovos, devido às altas quantidades de Ca que contêm esses produtos. Os requerimentos de Ca na

alimentação animal são da ordem de 0,5% (base seca), sendo maior em vacas leiteiras em produção,

em fêmeas em gestação e lactação e em animais em crescimento. Em galinhas de postura, o

requerimento de Ca é da ordem de 3,5%.

O Ca é essencial no processo da coagulação sanguínea, sendo ele mesmo um fator (fator IV),

e ativando algumas proteases ou zimogênios. Os zimogênios da coagulação sanguínea, fatores I

(fibrinogênio), II (protrombina), VII, VIII, IX e X, têm como característica importante a presença

de resíduos de -carboxiglutamato, os quais contêm dois grupos carboxilas (COO-) que servem para

que o Ca2+ se una no processo da ativação enzimática. O Ca pode também atuar diretamente como

fator para ativar os fatores V e XI, que também são proteases do processo da coagulação.

No processo da contração muscular, o Ca participa através de sua ligação com proteína

troponina c. Quando é produzida uma onda estimulatória nervosa para a contração, ocorre

despolarização da fibra muscular e o Ca é liberado no citosol da célula muscular a partir do retículo

sarcoplasmático. A ligação do Ca à troponina c induz uma mudança conformacional nesta proteína,

permitindo a saída da tropomiosina, proteína que na ausência de Ca bloqueia a formação de uma

ponte entre a miosina e a actina, necessária para a contração. A energia para a contração muscular

é fornecida pela ação ATPase da miosina, a qual é regulada pelo próprio Ca e pela actina. No

músculo liso, o Ca atua mediante outro mecanismo, pois neste tipo de músculo a troponina está

ausente. A contração nesse tecido inicia também com um aumento da concentração de Ca

intracelular, mas é regulada em dois níveis: um nível envolve a quinase da cadeia leve da miosina

(MLCK), cuja atividade está modulada pelo nível de Ca; esta enzima fosforila a subunidade leve

da miosina para provocar a interação miosina-actina e, portanto, a contração muscular. Outro nível

de controle envolve a adrenalina, que induz a fosforilação da MLCK, inativando esta enzima e

inibindo, portanto, a fosforilação da miosina e a contração muscular.

Na transmissão do impulso nervoso, ocorre o potencial de ação, ou seja, a variação na

condutividade elétrica devida à despolarização da membrana, havendo entrada de Na+ no interior

7

da célula. O Ca extracelular favorece a passagem dos íons de Na+ mediante a regulação do limiar

com o qual se obtém um aumento da condutividade do íon Na+. A condução nervosa também requer

uma concentração de Ca intracelular da ordem de 0,3 M. O Ca entra provavelmente aproveitando

os canais para Na+, sendo depois expulso em troca de Na+.

Algumas enzimas utilizam a proteína calmodulina como mediadora de sua ação. A

calmodulina é uma proteína ubíqua de 148 aminoácidos rica em resíduos de glutamato e aspartato,

cujos grupos COO- servem para unir-se ao Ca em 4 sítios. A concentração de Ca intracelular é 103

a 104 vezes menor do que a concentração extracelular; desse modo, qualquer aumento nos níveis

intracelulares de Ca torna-se um sinal para modificar a ação de algumas enzimas. O mecanismo de

ação do Ca sobre a regulação de enzimas Ca-dependentes compreende duas ativações sucessivas.

Primeiro, quando a concentração de Ca intracelular atinge determinado limiar, o Ca se une à

calmodulina, modificando sua estrutura e tornando-a ativa. Depois, o complexo Ca-calmodulina

interatua com a enzima para ativá-la. As duas reações de ativação são reversíveis. Dessa forma,

quando a estimulação termina, os níveis de Ca voltam a seu nível basal, separando-se da

calmodulina e causando a inibição da enzima.

Alguns hormônios utilizam o Ca como segundo mensageiro da sua ação. Quando esses

hormônios interagem com seus receptores, causam elevação da concentração de Ca intracelular, o

qual atua como sinal iniciador de algumas reações enzimáticas. Na maioria dos casos, o aumento

da concentração de Ca intracelular está associado com a hidrólise do fosfatidil-inositol, fosfolipídeo

componente da membrana plasmática, que gera diacilglicerol (DAG) e inositol-trifosfato (ITP), os

quais contribuem para a liberação de Ca do retículo endoplasmático para o citosol.

Controle da calcemia

Em razão das importantes funções do Ca no organismo, existem mecanismos que mantém a

sua homeostase plasmática. A absorção de Ca é realizada de forma ativa e passiva no intestino

delgado e a eficiência de absorção depende de alguns fatores como a idade (melhor em jovens),

solubilidade (favorecida em condições ácidas), necessidades (maior com mais demanda) e

quantidade de Ca ingerida (diminui com maior consumo). A vitamina D ativa é necessária para

uma correta absorção de Ca intestinal. A absorção de Ca no intestino também é afetada por outros

fatores, tais como a relação Ca:P nos alimentos (a relação ótima é de 2:1), a quantidade de proteína

na dieta (deficiência de proteína causa diminuição da absorção de Ca), e a ingestão excessiva de

Mg, o qual interfere com a absorção de Ca, por competição nas células intestinais.

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O sistema endócrino, envolvendo a vitamina D3, o paratormônio (PTH) e a calcitonina, é

responsável pela manutenção dos níveis sanguíneos de Ca de forma bastante eficiente para ajustar-

se à quantidade de Ca disponível no alimento e às perdas que acontecem, principalmente na

gestação e na lactação. O eficiente controle endócrino do Ca faz com que seus níveis variem muito

pouco (em torno de 17%) comparado com as variações do fósforo (variação em torno de 40%) ou

do magnésio (57%).

Por causa dos mecanismos homeostáticos, o nível sanguíneo de Ca não é bom indicador do

equilíbrio deste mineral, muito embora em casos de deficiência ou desequilíbrios severos possa ser

observada hipocalcemia. O hormônio da paratireoide (PTH) atua sobre os túbulos renais e os ossos

quando há diminuição do Ca plasmático. Seu efeito imediato é elevar a calcemia e diminuir a

fosfatemia. No rim, estimula a reabsorção de Ca e a excreção de fósforo nos túbulos distais. PTH

também aumenta a excreção urinária de K+, HCO3-, Na+, cAMP e de aminoácidos, ao tempo que

diminui a excreção de H+, Mg+ e NH3.

Um efeito adicional do PTH é sobre a formação de 1,25-dihidroxi-colecalciferol (1,25-DHC)

no rim mediante a estimulação da enzima 1-hidroxilase, localizada nas mitocôndrias das células

epiteliais dos túbulos contornados proximais. Esta enzima hidroxila o 25-hidroxi-colecalciferol

(25-HCC) para formar o metabólito ativo 1,25-DHC (vitamina D3), o qual aumenta a absorção de

Ca e P em nível intestinal. Nos ossos o PTH tem a sua ação mais duradoura para manter a calcemia,

uma vez que são órgãos que contém a maior quantidade de Ca armazenada. A saída de Ca dos ossos

para a circulação se conhece como ressorção ou desmineralização óssea. O mecanismo para este

efeito compreende a inibição de síntese de colágeno nos osteoblastos, o aumento da

desmineralização óssea pelos osteócitos (osteólise osteocítica), o aumento da osteólise osteoclástica

e o aumento da taxa de maturação das células precursoras de osteoblastos e osteoclastos. O

resultado de todos esses efeitos é uma diminuição na capacidade do osso para captar Ca e uma

desmineralização (erosão) dos ossos, aumentando a liberação de Ca do osso com perda dos

proteoglicanos da matriz óssea, devido a uma alta atividade colagenolítica. Esses eventos ocorrem

mediante ação de cAMP. Nos túbulos renais, o cAMP favorece os mecanismos de reabsorção de

Ca e desfavorece a reabsorção de fósforo. Na célula óssea, o aumento de cAMP causa a síntese e

liberação de enzimas lisossomais, que levam à desmineralização óssea.

Embora a concentração de fósforo sanguíneo não tenha influência reguladora direta sobre a

síntese e secreção de PTH, uma hiperfosfatemia pode estimular indiretamente à paratireoide devido

a seu efeito redutor do Ca sanguíneo. O íon Mg+ tem um efeito similar ao do Ca2+ sobre a secreção

de PTH, embora de forma muito menos potente, pelo qual se considera que o magnésio tem uma

função secundária no controle paratireoidiano. A vitamina D, por sua função estimuladora sobre a

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absorção intestinal de Ca, cumpre função hipercalcemiante. Pode então considerar-se que o PTH e

o 1,25-DHC são os hormônios garantidores da manutenção da calcemia. Após a sua síntese nos

rins, o 1,25-DHC é transportado por uma proteína específica para as células-alvo (células do

epitélio intestinal) onde estimula a absorção de Ca e fósforo ingeridos na dieta mediante

mecanismos de transporte ativo. Embora a vitamina D não tenha seu efeito primário sobre os ossos,

considera-se que tem um efeito de mobilização de Ca e fósforo sobre a matriz óssea e a fração

mineral óssea através de um efeito osteolítico. Aparentemente a vitamina D requer a presença do

PTH para este efeito (efeito permissivo). Sobre o rim, a vitamina D pode diminuir a excreção de

Ca e fósforo.

O papel da vitamina D sobre a mineralização ou calcificação dos ossos em animais jovens é

reconhecido, porém o seu mecanismo não está esclarecido. Os animais jovens com deficiência de

vitamina D e/ou mantidos sem irradiação solar desenvolvem raquitismo devido à falta da normal

mineralização da matriz cartilaginosa. Quando a calcemia atinge níveis apropriados pelas ações

conjuntas do PTH e do 1,25-DHC, atua um mecanismo hipocalcemiante através do hormônio

calcitonina, produzido pelas células parafoliculares da tireoide. A calcitonina diminui os níveis

sanguíneos de Ca e fósforo fundamentalmente por ação sobre os ossos, embora tenha também

alguma ação sobre a função renal. No osso, a calcitonina inibe a desmineralização óssea, enquanto

no rim diminui a reabsorção de Ca e fósforo nos túbulos. A calcitonina não tem efeito sobre a

absorção de Ca a nível intestinal. Apesar das ações biológicas estabelecidas para a calcitonina, a

tireoidectomia não provoca maiores anormalidades na homeostase do Ca, diferentemente do que

ocorre com a paratireoidectomia.

Os estrógenos também têm efeito sobre a calcemia, mas o efeito de maior interesse é sobre

a ressorção (desmineralização) óssea. As ações são complexas, mas o principal efeito dos

estrógenos é a inibição da ressorção, de forma que sua presença estimula a mineralização óssea e

sua ausência pode induzir osteoporose. Os efeitos parecem estar mediados por fatores de

crescimento e interleucinas. A interleucina 6 é um potente estimulador da ressorção óssea e os

estrógenos bloqueiam a síntese dessa interleucina ao tempo que antagonizam os seus receptores.

Por outra parte, a apoptose dos osteoclastos (células responsáveis pela ressorção óssea) é regulada

pelos estrógenos. Quando há deficiência de estrógenos, os osteoclastos vivem mais tempo causando

maior saída de Ca dos ossos.

Transtornos da paratireoide

O hiperparatireoidismo pode ser primário, secundário renal e secundário nutricional. No caso

10

primário, ocorre uma lesão funcional na glândula paratireoide que causa uma secreção contínua de

PTH, apesar do aumento de Ca sanguíneo. A ação prolongada do PTH sobre o osso causa

desmineralização, onde a fração mineral é substituída por tecido conectivo fibroso, causando

osteodistrofia fibrosa. A lesão primária sobre a paratireoide pode ser um adenocarcinoma, frequente

em animais idosos, mas também pode ser devida a hiperplasia das células principais ou a defeitos

herdados, causados por mutação do gene do receptor de Ca2+ na glândula, como tem sido relatado

em cães da raça Pastor Alemão. Os animais afetados apresentam enfraquecimento ósseo com

tendência a fraturas, especialmente dos ossos longos, afrouxamento ou perda dos dentes, disfunção

motora por desmineralização das vértebras e fraturas de compressão, rengueira e apatia. A

hipercalcemia pode causar enfraquecimento muscular por diminuição da excitabilidade

neuromuscular, cálculos renais por mineralização dos túbulos renais, depressão, anorexia, vômito

e constipação. O excesso de PTH também causa hipofosfatemia devido à inibição da reabsorção

renal de P. A atividade da enzima fosfatase alcalina se observa elevada no plasma nesses casos

devido à atividade compensatória osteoblástica, como resposta à tensão mecânica exercida pelos

ossos enfraquecidos pela desmineralização excessiva. O tratamento consiste em extirpar

cirurgicamente a neoplasia.

O hiperparatireodismo secundário renal é uma complicação da insuficiência renal crônica,

observada em cães e gatos idosos principalmente, onde ocorre retenção excessiva de fósforo,

levando a hiperfosfatemia. A diminuição da relação Ca/P no sangue, provocada pelo alto teor de

fósforo, estimula-se a hipersecreção de PTH. O excesso de fósforo sanguíneo também deprime a

atividade da enzima 1-hidroxilase do rim, diminuindo assim a produção de 1,25-DHC e,

consequentemente, a absorção intestinal de Ca. Em casos de falha renal crônica, também se deve

considerar que a síntese da enzima 1α-hidroxilase está comprometida pela função renal diminuída,

o que agrava a situação deficitária de absorção de Ca intestinal. O hiperparatireodismo secundário

é um mecanismo compensatório em resposta a desequilíbrios minerais crônicos, causados por

dietas que podem ter baixa relação Ca/P, excesso de fósforo ou deficiência de vitamina D3. O

resultado é uma diminuição da relação Ca/P no sangue, que leva a uma estimulação prolongada da

paratireoide. O efeito da falta de vitamina D envolve a diminuição da absorção intestinal de Ca e a

consequente hipocalcemia. Este transtorno é frequente em gatos e cachorros jovens alimentados

com dieta predominante de carne ou fígado, tecidos que têm baixo conteúdo de Ca e alto de fósforo

(relação Ca:P de 1:20 a 1:50). É frequente também observar o problema em animais de zoológico,

especialmente em felinos enjaulados e também em cavalos alimentados com grãos e forragem de

má qualidade, em ocasiões agravado pelo consumo de pastagens ricas em oxalatos, que formam

complexos insolúveis com o Ca, desfavorecendo a sua absorção intestinal. Os primeiros sinais

11

clínicos revelam transtornos na locomoção, apatia, rengueira e dor óssea à palpação, causados pela

progressiva diminuição do córtex dos ossos longos em função da desmineralização prolongada.

O hipoparatireoidismo é uma condição rara, que se observa em cachorros de raças pequenas

(Schnauzer, Terrier) e em gatos. Caracteriza-se pela baixa secreção de PTH ou pela falha deste

hormônio para interagir com suas células-alvo. Na etiologia desta doença aparecem causas

congênitas, idiopáticas, iatrogênicas (cirurgias da tireoide, irradiação), metabólicas (falha para

produzir cAMP nas células alvo) e neoplasias. Clinicamente se observa incremento da

excitabilidade neuromuscular e tetania, além de hipocalcemia. Os níveis de fósforo aumentam

devido ao aumento da reabsorção tubular.

Hipocalcemia nas vacas leiteiras

A quantidade total de Ca em uma vaca adulta está em torno de 6.000 g, 90% dos quais

armazenados nos ossos. Cerca de 1% (60 g) está no sangue e nos tecidos moles, sendo que na

corrente circulatória há cerca de 8 g. Considerando que o percentual de Ca no leite é de 0,12% (0,12

g em 100 mL ou 1,2 g/L), uma vaca que produza 30 L de leite perde diariamente cerca de 36 g de

Ca, isto é, mais de 4 vezes a quantidade de Ca sanguíneo. Estima-se que durante o período de uma

lactação, cerca de 18% do mineral do esqueleto é perdido. Portanto, a taxa de reposição deve ser

rápida o suficiente para cobrir a demanda e evitar a hipocalcemia. Qualquer interferência com a

absorção intestinal e a mobilização óssea do Ca pode ser fatal.

A paresia puerperal das vacas foi descrita em 1897 por Schmidt, que sugeriu tratar-se de um

problema do úbere. Infusões intramamárias de iodeto de potássio, de água ou a simples insuflação

davam resultado na cura do problema, o que fortaleceu a teoria de Schmidt. Em 1925, Dryerre e

Greig comprovaram a associação da deficiência de Ca com a paresia puerperal e a doença também

foi chamada de febre do leite. Esses autores utilizaram com sucesso o tratamento com gluconato de

Ca, o qual foi substituído pelo boroguconato de Ca, sintetizado por Hayden em 1934, sendo o

tratamento utilizado até hoje.

A hipocalcemia é uma doença metabólica aguda caracterizada por baixo Ca sanguíneo e

paralisia que se apresenta no período puerperal, mais comumente na 1ª semana após o parto,

geralmente em vacas de alta produção de leite. A vaca pode apresentar um quadro comatoso com

decúbito. A doença é mais comum em vacas com maior número de partos e algumas raças, como a

Jersey, são mais suscetíveis que outras. Contudo, a maioria dos casos é observada em vacas de raça

Holandesa, em função de sua maior produção de leite. A causa da hipocalcemia, além da volumosa

perda de Ca pelo leite em animais de alta produção, parece envolver uma falha da homeostase do

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Ca no início da lactação. No desencadeamento da doença estão envolvidos o estresse do parto e a

ruptura do padrão normal de alimentação. Embora a maioria das vacas se adapte ao desafio

metabólico da lactação, de 5 a 20% das vacas não se adaptam e podem desenvolver hipocalcemia.

O problema parece ser uma falha de resposta das células-alvo do osso a altos níveis de PTH, de

forma que ocorre pouca desmineralização óssea nas vacas suscetíveis. A hipocalcemia intempestiva

é uma consequência direta do desequilíbrio entre a saída de Ca no leite e os mecanismos que

mantém a calcemia. O mais comum é que o quadro clínico ocorra em vacas do segundo ao quinto

parto, e nas primeiras 72 horas após o parto. A situação pode agravar-se se no período do pré-parto

for fornecido Ca.

Três seriam os fatores desencadeantes da hipocalcemia: perda de Ca no leite maior que a

capacidade de absorção no intestino e de mobilização óssea, transtorno intestinal que comprometa

a absorção de Ca e mobilização de Ca óssea insuficientemente rápida para manter a calcemia. Entre

os fatores predisponentes da hipocalcemia estão: o maior número de partos, o maior nível de

produção, a raça Holandesa, mudanças do meio ambiente, aporte de Ca no pré-parto, disfunção

paratireoidiana, anorexia e desequilíbrios ácido-básico. Não tem sido encontrada relação entre parto

distócico e hipocalcemia.

O ajuste do metabolismo ao balanço negativo de Ca no início da lactação é obtido mediante

aumento da absorção intestinal e da remoção de Ca dos ossos. Entretanto, vários fatores podem

afetar negativamente a capacidade do ajuste, entre os que podem ser citados os seguintes: (a)

individualidade do animal, uma vez que a produção per se não é fator para a apresentação do

problema, pois muitas vacas de alta produção não sofrem o problema; (b) a idade, pois com os anos

diminui o intercâmbio de Ca nos ossos, bem como a capacidade de absorção de Ca no intestino;

raramente uma novilha apresentam hipocalcemia; (c) consumo de Ca no pré-parto, pois estimula a

síntese de calcitonina e inibe a síntese de PTH de 1,25-DHC; (d) estase alimentar decorrente do

estresse do parto, onde há interrupção do fluxo alimentar; alimentação com silagem ou

concentrados predispõe à estase alimentar, enquanto forragens e feno são benéficos; (e)

desequilíbrios alimentares, como dietas consideradas alcalinogênicas, isto é, com excesso de

cátions (Na+, K+, Ca2+, Mg2+) predispõem à hipocalcemia; dietas ricas em fósforo (> 80 g/dia)

também têm o mesmo efeito, que acontece porque a alta concentração de fósforo sanguíneo inibe

a enzima 1-hidroxilase, diminuindo a produção de 1,25-DHC; dietas deficientes em magnésio

causam inibição da mobilização de Ca por efeito direto sobre o metabolismo dos ossos, interferindo

com a absorção intestinal de Ca e estimulando a secreção de calcitonina.

A hipocalcemia leva inicialmente a uma hipersensibilidade dos nervos condutores e dos

músculos, causando hiperexcitabilidade e tetania, estágio considerado prodrômico da doença. Neste

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estágio a temperatura corporal é normal, caracterizado por anorexia, agalactia, estase ruminal, que

pode causar timpanismo e espasmos musculares na região da escápula e do trem posterior. A vaca

procura não se movimentar, mas ainda não apresenta decúbito. Na segunda etapa, os sinais são mais

evidentes, acontecendo decúbito esternal por paralisia muscular com temperatura subnormal e

pulso débil. A paralisia muscular pode ser explicada porque a hipocalcemia causa aumento da

permeabilidade celular a cátions, fazendo com que o K+ saia e o Na+ entre na célula, ou seja, afeta

a diferença de potencial elétrico das células. A vaca em decúbito esternal fica com a coluna

vertebral levemente curvada em S, colocando a cabeça para frente e bastante deprimida. A situação

evolui a uma paralisia do trem posterior com estímulos ausentes. Isto pode acontecer por vazamento

de fosfato das células, levando a degeneração e necrose das fibras musculares, o que explicaria

porque há vacas que não respondem ao tratamento com Ca. O quadro pode complicar-se ainda mais

quando acontece hipomagnesemia ou lipidose hepática. É típica a posição da cabeça inclinada sobre

o dorso (“autoauscultação”). Também se observa bradicardia, hipotensão, reflexo palpebral

positivo, coma, perda da consciência, necrose muscular, perda do apetite, odontocrise, relaxamento

de esfíncteres, ressecamento do globo ocular e paralisia lingual. Neste estágio se observa

hipotermia e severa hipocalcemia. O terceiro estágio é a depressão profunda com decúbito lateral

em completa flacidez muscular, com meteorismo gasoso por falta de eructação, sinal de atonia

ruminal. A hipotermia se acentua (36ºC) sendo possível perceber orelhas, extremidades e pele frias.

O quadro termina em colapso circulatório.

O diagnóstico da hipocalcemia na vaca está baseado nos sinais clínicos, na anamnese de

parto, o nível de produção de leite, a idade e a concentração de Ca no sangue (geralmente abaixo

de 7,0 mg/dL). A hipocalcemia pode cursar com hipofosfatemia e hipomagnesemia concomitante.

Se o quadro clínico se mantiver por 48 ou mais horas, o prognóstico é desfavorável devido ao

maciço dano muscular produto da necrose. Nesta situação valores plasmáticos elevados das

enzimas creatina quinase (CK) e aspartato transaminase (AST) indicarão que o animal dificilmente

se recuperará. A doença é aguda e letal caso não seja corrigido o déficit de Ca. Em alguns casos, a

hipocalcemia pode vir acompanhada de ruptura de tendões, fraturas pélvicas, hematomas e

traumatismos mamários, como consequência das frequentes quedas que sofre o animal. É

necessário o diagnóstico diferencial com cetonemia, desnutrição, osteomalacia, tetanias e

eclampsias por deficiência de Mg, paralisias traumáticas ou nervosas, coma hepático, endometrite

séptica, linfosarcoma, miopatia degenerativa, mastite aguda ou gangrenosa e tripanosomiase.

Em torno de 80% dos casos de hipocalcemia da vaca respondem ao tratamento com injeção

intravenosa lenta de borogluconato de Ca (800 mL de solução de 25%). Em alguns casos podem

ser necessárias uma ou mais doses. Um bom sinal de recuperação é a eructação que indica reinício

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das contrações ruminais. A administração oral de gel de Ca (em torno de 300 mL de cloreto ou

propionato de Ca) é útil para evitar recorrência do quadro clínico. A dosagem de enzimas

sanguíneas, principalmente CK, é útil para avaliar a extensão da lesão muscular e determinar o

prognóstico. Quanto maiores forem os valores de CK acima de 90 U/L, pior será o prognóstico. A

prevenção da hipocalcemia envolve uso de dietas baixas em Ca nas duas semanas anteriores ao

parto com suplementos de vitamina D3 (600 g de 1,25-DHC) 24-48 h antes do parto. As vacas

com dietas baixas em Ca no pré-parto apresentam maiores níveis de PTH, tornando-as menos

suscetíveis à diminuição da absorção intestinal de Ca, resultante da anorexia e da estase intestinal

associadas ao parto.

Dentro da estratégia de diminuir a relação Ca/P, pode ser usado fosfato de sódio na dieta,

sempre antes do parto. Uma alternativa preventiva é usar sais aniônicos ou “acídicos”, fornecidos

no pré-parto, os quais tendem a induzir uma acidose metabólica leve. A base desta medida é o

conhecimento de que a saída de Ca dos ossos é estimulada em um pH diminuído. A

desmineralização óssea é estimulada na acidose devido à tentativa do osso de neutralizar o pH

sanguíneo, mediante a saída de carbonato de Ca. Os sais acídicos contêm sulfatos e cloretos de

amônia, Ca ou Mg. O uso de dietas com diferenças cátion-ânion [DCAD= (Na+ + K+) – (SO4= + Cl-

)], da ordem de –100 a –200 meq/kg MS nas últimas quatro semanas de gestação, não somente

reduzem a incidência de hipocalcemia clínica e subclínica, mas também reduzem problemas de

edema de úbere e aumentam a produção de leite em até 8%.

Hipocalcemia da cadela (Eclampsia)

Também conhecida como tetania puerperal, a eclampsia pode ser observada, além das

cadelas, em éguas, principalmente raças de trabalho, e em porcas, associada à síndrome MMA

(mastite-metrite-agalactia). Sua apresentação pode ocorrer desde alguns dias antes até três semanas

após o parto. Em cadelas é mais frequente em raças pequenas e excitáveis como Chihuahua, Poodle

Toy e Terrier, embora também tenha sido relatada em cães de raças maiores e em gatos. A

hipocalcemia puerperal na cadela causa tetania neuromuscular, enquanto que na vaca se apresenta

paresia. Isto revela diferenças fisiológicas na união neuromuscular nestas duas espécies. A

liberação de acetilcolina e a transmissão dos impulsos nervosos são bloqueadas pela hipocalcemia

nas vacas, produzindo paralisia. Na cadela, pelo contrário, a hipocalcemia mantém por tempo

anormal a excitação-secreção na placa motora terminal. A tetania ocorre como resultado de cargas

repetitivas espontâneas sobre as fibras nervosas motoras. Devido à hipocalcemia, as membranas

nervosas se tornam mais permeáveis a íons (entre eles o Mg2+) requerendo um estímulo de menor

15

intensidade para a despolarização. É possível que o quadro clínico agrupe mais de um agente

etiológico, entre os quais se menciona um desequilíbrio iônico em nível intra e extracelular. A

hipomagnesemia e a hipocalcemia são relatadas como causadoras do quadro clínico. Não há

evidência certa para considerar a tetania puerperal nas espécies em que ocorre como sendo

transtorno relacionado com a secreção de PTH, uma vez que vários trabalhos relatam que os níveis

desse hormônio podem estar normais ou até aumentados em resposta à hipocalcemia.

A apresentação do evento de tetania pode durar desde poucos minutos até duas horas. Sinais

premonitórios incluem intranquilidade, arquejo excessivo e comportamento excitável. O pulso na

fase inicial é normal, variando depois para um pulso fraco. Em poucas horas, os sinais podem

progredir para ataxia, tremores, tetania muscular e convulsões. Os animais sofrem perda da

consciência exibindo forte contração dos músculos cervicais, da cabeça e das extremidades. Ocorre

copiosa salivação e odontocrise, nistagmo contínuo e excitação permanente. Hipertermia

(temperatura até 42°C) está associada ao aumento da atividade muscular. Achados bioquímicos no

sangue incluem hipofosfatemia, hipocalcemia, hipomagnesemia, hipoglicemia e valores elevados

de CK, os dois últimos como resultado da intensa atividade muscular associada à tetania. Como

tratamento tem sido usado tranquilizante e soluções eletrolíticas que incluam Ca. A única prevenção

clara é a necessidade de manter os animais de produção protegidos com vacina antitetânica a fim

de facilitar a diferenciação clínica, muito embora o quadro de eclampsia esteja sempre associado

ao final da gestação e ao parto. A administração endovenosa lenta (para evitar fibrilação ventricular

e parada cardíaca) de uma solução a 10% de Ca orgânico (gliconato de Ca) resulta em rápida

melhora clínica. Em cadelas pesando de 5 a 10 kg, é suficiente a aplicação de 10 mL da solução.

Os filhotes devem ser removidos por 24 horas para reduzir a perda de Ca, período em que devem

ser alimentados com sucedâneos lácteos. Administração suplementar de Ca e vitamina D é útil na

prevenção de recidivas. Como prevenção, recomenda-se que durante a gestação a dieta possua uma

relação Ca/P de 1,0 a fim de evitar um excesso de Ca e manter ativo o mecanismo endócrino de

mobilização óssea.

Raquitismo

Tipicamente, o raquitismo e a osteomalácia são transtornos da mineralização dos ossos

devidas à deficiência de vitamina D, mas também podem ser causadas por deficiência de fósforo

ou de Ca ou por falta de exposição ao sol. Em animais jovens o raquitismo envolve uma baixa

concentração de Ca e de fósforo na matriz de cartilagem e do osso. A osteomalácia, contrapartida

do raquitismo em animais adultos, uma vez que a cartilagem não cresce mais, a diminuição de Ca

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e fósforo atinge apenas a matriz óssea. A deficiência de vitamina D tende a ocorrer mais em animais

confinados, enquanto a deficiência de fósforo ocorre mais por causa de alimentação exclusiva com

pastagens de má qualidade. Animais confinados com dietas de crescimento rápido são mais

suscetíveis. Nos animais jovens os sinais são mais evidentes, incluindo baixo crescimento, perda

de peso e de apetite, manqueiras e fraturas e, em casos severos, malformação de ossos longos. As

costelas adquirem nódulos nas articulações costocondriais, os dentes retardam sua erupção e a

mandíbula se desalinha. As articulações aumentam de tamanho e os ossos se curvam e deformam,

impedindo a adequada mobilização. Nos adultos, a osteomalácia pode ocasionar dor intensa nas

articulações.

Outras causas de raquitismo incluem: (a) defeitos no metabolismo da vitamina D,

basicamente por falhas na hidroxilação em C-1 e/ou em C-25; (b) acidose, uma vez que o pH

apropriado para a mineralização é de 7,6; e (c) inibição da mineralização do osso por fluoretos ou

por difosfonatos. O perfil sanguíneo pode mostrar níveis baixos de fósforo e, às vezes, de Ca, sendo,

via de regra, que os sinais clínicos aparecem quando o produto Ca*P (mg/dL) é menor de 30 (IR

40-80). A correção da dieta e dos fatores predisponentes e a administração de vitamina D

geralmente recupera o animal, embora possam persistir algumas lesões por um tempo.

Osteoporose

É um transtorno ósseo frequente em vacas de alta produção em decorrência do excessivo

gasto de Ca no leite, unido à deficiência no consumo. Também é observado em animais com

deficiente consumo de Ca e fósforo, principalmente se forem idosos. Na osteoporose ocorre um

desequilíbrio no qual a desmineralização do osso ocorre a uma maior velocidade do que a formação

de osso. Nas vacas leiteiras, a osteoporose constitui uma típica doença de produção que pode ter

entre outras causas as seguintes: (a) deficiência de Ca, fósforo ou vitamina D; (b) alta produção de

leite; (c) desequilíbrios nas proporções Ca/P; a relação Ca/P no osso é de 2:1, no leite é de 1/1 e

nos alimentos pode exceder 3/1; (d) interação com outros minerais, principalmente por excesso de

magnésio que diminui a disponibilidade de Ca e de fósforo; (e) biodisponibilidade diminuída dos

minerais, por fatores como idade, relação Ca:P e tipo de alimento. Em animais jovens, a

disponibilidade de Ca é de 100% e a de fósforo de 90%, valores que em adultos caem para 45% e

55%, respectivamente. Alimentos com relação Ca/P abaixo de 1,0, como nas dietas a base de

cereais, ou acima de 4,0, como nas pastagens em solos muito encalados, a disponibilidade de Ca

torna-se desfavorável. As forragens têm menor disponibilidade de Ca, enquanto que cereais têm

maior disponibilidade de Ca e de fósforo. Outras condições, tais como hipertireoidismo,

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hipogonadismo, hiperadrenocorticismo, deficiência de vitamina C, diabetes e acromegalia podem

ser causa de osteoporose. A osteoporose é uma doença crônica e insidiosa, isto é, não é aparente

por um longo período de tempo até chegar a um ponto crítico, em que os sinais começam a ficar

evidentes. Ocorre enfraquecimento dos ossos, deformações, dor e tendência a fraturas espontâneas,

diminuição da capacidade para se locomover e conseguir alimento. Nos ossos longos observa-se

inflamação das articulações e manqueira. Outros sinais associados, especialmente quando há

deficiência de fósforo, são perversão do gosto e infertilidade. No perfil sanguíneo os níveis de Ca,

fósforo e atividade de fosfatase alcalina podem estar normais, mas os ossos mostram perda da

densidade. O tratamento da osteoporose consiste na suplementação mineral adequada, sendo

necessário, em ocasiões, administrar vitamina D3 via parenteral e analgésicos para combater a dor.

Toxicidade

O Ca consumido em excesso não é considerado tóxico, uma vez que a taxa de absorção

intestinal é regulada conforme às necessidades e o excesso pode ser excretado. Entretanto, um

consumo excessivo crônico de Ca ou vitamina D pode levar a uma hipercalcificação. A vitamina

D mobiliza as reservas de Ca dos ossos e aumenta a sua absorção a nível intestinal. O excesso de

consumo de Ca pode ser consequência de dietas desequilibradas, por exemplo, em casos de touros

alimentados com rações para vacas leiteiras. O excesso de Ca leva a uma hipercalcemia que induz

a secreção permanente de calcitonina da tireoide, a qual com o tempo podem sofrer hiperplasia e

eventualmente neoplasia. O resultado é a calcificação dos tecidos macios. Os animais afetados

sofrem manqueira, dor e rigidez articular, causando muitas vezes impotência coeundi nos

reprodutores. Também deve se considerar que um consumo excessivo de Ca pode interferir com a

utilização de outros minerais e resultar em deficiência de elementos essenciais como fósforo,

magnésio, ferro, iodo, zinco e manganês. Em suínos tem se relatado um efeito antagônico entre um

excesso de Ca com a vitamina K que pode causar síndromes hemorrágicas. O nível máximo de

tolerância de Ca é de 2% (matéria seca) na dieta de ruminantes.

As intoxicações com vitamina D podem ter várias causas, tais como tratamentos excessivos

para prevenir hipocalcemia em vacas ou consumo de plantas tóxicas que contém compostos de

intensa atividade de vitamina D (glicosídeo de 1,25-DHC). No Brasil, plantas como espichadeira

(Solanum malocoxylon) que crescem em solos úmidos ou alagados podem causar o problema,

especialmente quando não há disponibilidade de forragem. O perfil sanguíneo pode mostrar níveis

de Ca superiores a 13 mg/dL e de fósforo maiores de 12 mg/dL. A intoxicação pode demorar até

um ano para ficar manifesta, mas a mortalidade é alta (60%). Pode ocorrer calcificação do endotélio

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das artérias e do coração, bem como osteopetrose (calcificação excessiva dos ossos).

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Fósforo (P)

O P é o 2º elemento mais abundante no organismo animal (80-88% em ossos e dentes na

forma de hidroxiapatita). Na realidade, ele não existe como elemento livre, pois é muito reativo e

sim na forma de fosfatos. No organismo, a forma solúvel (não óssea) existe como fosfato

monobásico (H2PO4-) e dibásico (HPO4

=), referido no plasma e no espaço intracelular como

“fosfato inorgânico”. Em geral, as pastagens das regiões tropicais são pobres em P, acentuando-se

em solos com altas concentrações de alumínio e Fe, uma vez que formam complexos que tornam o

P indisponível para absorção na planta. A deficiência de P foi inicialmente descrita em bovinos sul-

africanos por Theiler nos anos 1920, quem a relacionou com sinais de manqueira, infertilidade,

crescimento retardado e depravação do apetite (pica), que levava os animais a osteofagia e risco de

contaminação com bactéria botulínica. Posteriormente diferentes pesquisadores no mundo

relataram casos similares sempre ligados à deficiência de P nas pastagens. O P chega ao animal nas

formas de mono, di e trifosfato inorgânico e na forma de compostos orgânicos (fitatos, fosfolipídeos

e fosfoproteínas). Pela ação do suco gástrico os fosfatos insolúveis e solúveis são dissolvidos e

atingem o intestino delgado para sua absorção. O P é encontrado na saliva e sua concentração é

afetada diretamente pela concentração de P plasmática. Esta é uma importante via de excreção e

ocorre em grandes quantidades, sendo reabsorvido no intestino, reestabelecendo um ciclo

importante para a homeostase deste mineral. Os requerimentos de P estão entre 0,2 e 0,7% da

matéria seca, sendo maiores em animais em crescimento. Em animais monogástricos, os

requerimentos de P aumentam na medida em que aumenta a proporção de fitatos na dieta, o que

não ocorre nos ruminantes, que possuem a enzima fitase bacteriana no rúmen. Em regiões tropicais

e subtropicais, o P nas pastagens atinge níveis menores que 0,07% na matéria seca, devendo ser

suplementado para cobrir a exigência.

Nos tecidos macios, o P está em maior concentração que o Ca. Por exemplo, no músculo há

2-3 g de P/kg e 0,1 g de Ca/kg. Aproximadamente 12% do fosfato plasmático está unido a proteínas.

A concentração de fosfato plasmático varia entre espécies, mas em geral está entre 2,6 a 7,5 mg/dL.

Considera-se uma hipofosfatemia quando a concentração está abaixo de 2,5-3,0 mg/dL. Infusões

intravenosas de soluções glicosadas em pacientes em fluidoterapia ou injeções de insulina em

pacientes diabéticos podem causar diminuição dos níveis de fosfato plasmático. Hipofosfatemia

também pode ser observada em casos de deficiência de vitamina D e em raquitismo.

Hiperfosfatemia pode ser observada em hipervitaminose D (por aumento da absorção intestinal) e

no hiperparatireoidismo secundário (excesso de P na alimentação ou na doença renal crônica). De

70 a 90% do fosfato ingerido na dieta é absorvido por meio de um transporte ativo. A vitamina D

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melhora a absorção de P no intestino, porém não é absolutamente essencial para a sua absorção,

como é o caso do Ca. O fosfato inorgânico no plasma se excreta via renal por influência do PTH,

sendo mais facilmente difusível através do glomérulo do que o Ca. A principal rota de excreção do

fosfato inorgânico é o rim, enquanto que para o Ca o controle básico da homeostase é através do

PTH, que envolve reabsorção renal, absorção gastrointestinal (mediado pela vitamina D) e

ressorção (desmineralização) óssea. O P também se excreta em grandes quantidades pela saliva,

sendo em grande proporção reabsorvido pelo intestino, estabelecendo um ciclo importante para a

homeostase do P. A presença de P na saliva é importante como tampão para manter o pH ótimo no

rúmen, sendo vital para a atividade e crescimento dos micro-organismos ruminais.

Funções do fósforo

O P, junto como o Ca, são os minerais mais importantes na estrutura de ossos e dentes, onde

a relação Ca/P se mantém em torno de 2. A maioria do P não esquelético concentra-se nas hemácias,

nos músculos e no tecido nervoso. O P faz parte de praticamente todas as reações do organismo,

sendo considerado o mais versátil dos bioelementos. O P auxilia na manutenção do equilíbrio ácido-

base, sendo o principal sistema tamponante intracelular, na forma de fosfatos. No metabolismo

energético, o P atua na utilização e transferência de energia via ATP, GTP, AMP, ADP,

creatina-fosfato, glicídios fosfatados, além de que todos os monossacarídeos precisam estar

fosforilados para entrarem nas vias metabólicas. O P faz parte dos ácidos nucleicos e na atividade

da bomba Na/K. O P está envolvido em quase todas as fases do metabolismo, como na utilização

de lipídeos, glicídeos, proteínas e nucleotídeos envolvidos na ação hormonal (cAMP, cGMP). Atua

como componente estrutural e ativador de coenzimas (NAD, NADP), essenciais no metabolismo.

Outras biomoléculas que têm P na sua estrutura, tais como os fosfolipídeos, mantêm a integridade

da membrana celular. O P está envolvido no controle do apetite, na eficiência da utilização do

alimento e no metabolismo e crescimento das bactérias ruminais, especialmente as celulolíticas.

Também é necessário para a secreção láctea, a síntese de tecido muscular, a formação dos ovos.

Assim, qualquer limitação no fornecimento de P resulta em alterações gerais do metabolismo.

Deficiência de fósforo

A deficiência de P é o distúrbio mineral mais comum e economicamente o mais importante

em bovinos mantidos em regime de campo, devido às múltiplas funções que desempenha no

organismo e à deficiência generalizada em solos e forrageiras, além do elevado custo de sua

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suplementação. Em animais alimentados com ração é rara a deficiência de P devido à presença

ampla do mineral nos alimentos em geral. O efeito primário da deficiência de P em ruminantes é a

redução no consumo de alimento, o que pode causar, especialmente em bovinos e ovinos,

transtornos na fertilidade e no crescimento, queda da produção e, em casos avançados, falhas na

digestão e lesões ósseas. Um sinal avançado de falta de P é depravação do apetite (pica), que leva

o animal a ingerir material estranho e ao risco de intoxicações por Clostridium botulinum

(botulismo) por ingestão de ossos de carcaças contaminadas. Alguns autores mencionam que a

causa da doença conhecida como “cara inchada” ou osteodistrofia fibrosa dos bovinos é uma

deficiência complexa envolvendo Ca, P e Zn. A suplementação de P pode ser na forma orgânica,

como farinha de ossos, ou principalmente na forma inorgânica, como fosfato bicálcico ou fosfato

de rocha. Este último, entretanto, tem menor biodisponibilidade e pouca palatabilidade, além de

possuir, em ocasiões, altos teores de F.

Uma forma de diagnosticar a deficiência de P é mediante a determinação do seu teor no

sangue. O P existe em combinações orgânicas dentro das células, mas o interesse principal no perfil

metabólico reside no P inorgânico que se apresenta no plasma ou no sangue total. A manutenção

do nível de P do sangue é governada pelos mesmos fatores que promovem a assimilação do Ca.

Porém, na interpretação do perfil os dois minerais indicam diferentes problemas. Por outro lado, o

controle da concentração de Ca via endócrina é mais rigoroso e o nível de P inorgânico no plasma

sanguíneo dos bovinos geralmente oscila bem mais que o nível de Ca. Os níveis de P são variáveis

também em função da grande quantidade que se recicla via saliva e sua absorção no rúmen e

intestino. A interrupção do ciclo leva a hipofosfatemia. A perda de P nas secreções digestivas chega

a 10 g/dia. A disponibilidade de P alimentar diminui com a idade (90% em bezerros, 55% em vacas

adultas). Daí que os níveis sanguíneos de P sejam menores em animais mais velhos.

Deficiências no P não têm efeitos imediatos, como é o caso do Ca, porém em longo prazo

podem causar crescimento retardado, osteoporose progressiva, infertilidade e baixa produção. A

deficiência severa de P, manifestada por níveis sanguíneos de < 3,0 mg/dL, conduz a depravação

do apetite (pica). As hipofosfatemias são observadas em dietas deficientes em P, mais comumente

em solos deficientes em P, principalmente durante o outono/inverno e em vacas de alta produção.

Visto que a deficiência de P pode ser confundida com outros estados deficitários devido aos sinais

clínicos e que deficiências marginais não são facilmente detectáveis, o fator determinante para

caracterizar a deficiência deste mineral é a resposta favorável no desempenho do animal frente à

suplementação com fontes de P.

22

Hemoglobinúria

A hemoglobinúria ocorre em vacas leiteiras por uma drenagem excessiva de P pela glândula

mamária e pode estar ligado a hipocalcemia e hipomagnesemia. Está associado com excesso de

fertilização nas pastagens, elevado consumo de forrageiras altamente proteicas (azevém) e alta

produção de leite. O leite drena até 1,5 g de P por litro, o que pode provocar um quadro de

deficiência deste mineral. O transtorno é mais frequente em vacas nas primeiras 5 semanas de

lactação. A doença pode aparecer também no período de pré-parto, mas não afeta animais jovens

nem vacas de corte. A deficiência aguda de P apresenta dois sinais clássicos: hemoglobinúria e

anemia, que ocorrem devido a uma hemólise intravascular como consequência do aumento da

fragilidade dos eritrócitos pela deficiência de ATP intracelular. Geralmente o animal entra em

decúbito por fraqueza devida à anemia, ficando alerta e se arrastando na conhecida “posição de

foca”. A cor do leite pode ficar avermelhada e a produção pode cair abruptamente. O decúbito

prolongado provoca úlceras, estase da circulação periférica, necrose muscular e endotoxemia que

leva a paralisia dos proventrículos, alcalose ruminal e degeneração celular. Outros sinais são

hipertermia (pela presença de hemoglobina livre no sangue), pulso cardíaco aumentado,

desidratação, dispneia e, na fase final, icterícia. Em casos de destruição maciça de eritrócitos ocorre

hipotermia, que desencadeia um colapso com morte rápida. O sangue pode mostrar níveis

subnormais de P sérico (< 1,0 mg/dL), aumento de atividade de fosfatase alcalina e anemia

normocítica-normocrômica. O diagnóstico diferencial deve incluir babesiose, hemoglobinúria

bacilar, hematúria essencial e leptospirose. Deve-se fornecer ao animal P de alta biodisponibilidade

(como glicerofosfato de Na), glicose, antioxidantes e protetores musculares (Se e vitamina E) e

soluções mistas de P e Mg. É totalmente contraindicada a aplicação de Ca porque a hipercalcemia

estimula a saída de K do músculo e agrava o quadro de debilidade muscular.

Como prevenção deve evitar-se a sobrealimentação no pré-parto, não ocasionar sobrecarga

hepática que possa levar a fígado gorduroso, realizar um adequado programa de secagem,

especialmente em vacas de alta produção, controlar o consumo de crucíferas (couve, nabo, repolho,

colza) e, finalmente, providenciar mesclas minerais com suficiente quantidade de P disponível

(mínimo 12%). As plantas crucíferas contêm sulfóxido de S-metilcisteína, que no rúmen é

metabolizado a dimetilsulfóxido, composto que em circulação provoca lipoperoxidação da

membrana eritrocitária. O prognóstico depende da gravidade dos sinais. Em casos de anemia severa

e decúbito prolongado com necrose muscular o melhor é decidir pelo sacrifício do animal. Deve

monitorar-se a contagem eritrocítica para estabelecer a recuperação. Sinais moderados são

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compatíveis com contagem de até 2,5 milhões/L, enquanto que na forma severa a contagem pode

chegar a menos de 1,5 milhões/L.

Toxicidade

O P, de forma similar ao Ca, não é considerado tóxico quando ingerido esporadicamente em

grandes quantidades, embora possa ser observada diarreia. Grandes quantidades consumidas por

longos períodos, entretanto, podem causar problemas metabólicos relacionados com o Ca, como é

o caso do hiperparatireoidismo secundário nutricional, de especial importância em gatos (consumo

exclusivo de carne) e cavalos (consumo exclusivo de cereais). Nesses casos, o excesso de P

bloqueia a síntese de vitamina D3 o que pode levar a hipocalcemia. Em cordeiros, um consumo

excessivo de P pode levar a urolitíase. Níveis máximos de tolerância na dieta (matéria seca) são de

0,6% em ovinos e 1% em bovinos.

Abordagem do status de Ca e de P

A relação Ca/P nos alimentos é o primeiro indicador para considerar o status desses minerais

no organismo. A relação ideal deve estar entre 1 a 3. Os ruminantes toleram relações Ca/P mais

amplas, desde 1 a 7. A deficiência de Ca provoca ossos quebradiços, tendência a fraturas, baixo

crescimento, baixa produção de leite, tendência a sofrer tetania ou paralisia, dependendo da espécie

animal. A severa deficiência de P também provoca ossos frágeis, perda de peso, emaciação, baixo

rendimento produtivo, principalmente em relação a fertilidade, com a adição de alotrofagia.

Indicadores do status de Ca e P utilizados incluem dosagem sanguínea dos dois minerais,

sendo que no caso do P recomenda-se avaliar também o P total do sangue e no caso do Ca as formas

total e livre (Ca2+). Adicionalmente é útil medir a atividade da enzima fosfatase alcalina no soro

sanguíneo, uma vez que em casos de severa ressorção ou mineralização óssea os valores podem

aumentar. Valores de referência para P sérico em animais adultos são de 3,5 a 7,0 mg/dL, sendo

que em animais jovens podem chegar a 8,0 mg/dL. No sangue total os valores são de 18 a 20 mg/dL.

Em casos de deficiência de P os valores séricos podem cair para 2-3 mg/dL. Em vacas com

hemoglobinúria puerperal podem estar em 1-2 mg/dL. Como critério de deficiência de P em

ruminantes se estabelece um valor sérico de P como ponto de corte < 3,0 mg/dL. O uso de P sérico

pressupõe adequado manejo pré-analítico, principalmente em relação a fatores de estresse,

hemólise, temperaturas extremas e tempo de separação do soro. Vários pesquisadores recomendam

avaliar o conteúdo de P nos alimentos para diagnosticar a deficiência de P, recomendando-se

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valores médios mínimos de 0,20% como adequados. A concentração sérica de Ca obedece a

controle homeostático mais rigoroso que o P, estabelecendo-se um valor médio referencial de 8,0-

10 mg/dL em mamíferos e de 20-30 mg/dL em galinhas poedeiras. Devido à relativa estabilidade

da calcemia, o valor de Ca não é considerado sensível para diagnosticar uma deficiência deste

mineral, salvo em situações de hipocalcemia com sinais clínicos (casos da febre do leite ou da

eclampsia puerperal). Alguns pesquisadores sugerem a determinação de Ca e P ósseo (costelas)

como método mais acurado de diagnóstico de deficiência destes minerais.

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Magnésio (Mg)

Davy em 1808 isolou o Mg em sua forma metálica. No início do século 20 várias pesquisas

apontaram ao caráter essencial deste mineral em todas as espécies animais. Em 1932 Kruse induziu

deficiência de Mg em ratos e percebeu os sinais clínicos decorrentes: convulsões, irritabilidade e

morte. Foi por essa época que se descobriu um transtorno metabólico devido à deficiência de Mg

em bovinos, que foi batizado como “tetania das pastagens”, em função dos sinais clínicos

observados. O Mg é um dos elementos mais abundantes na crosta terrestre (2%) e também é comum

na maioria dos alimentos. No organismo animal representa 0,05% do peso total, estando em grande

parte (65%) no esqueleto e o restante em tecidos macios (33%) e fluidos extracelulares (1%).

Constitui o 2º maior cátion (depois do K) do espaço intracelular. No soro sanguíneo a sua

concentração está entre 2 a 4 mg/dL. Na análise de Mg no plasma/soro, especial cuidado deve ser

tomado no processamento para evitar a hemólise, pois as hemácias contêm muito mais Mg do que

o plasma. No sangue, a maior parte do Mg (55%) está em forma livre ionizada e fisiologicamente

ativa, 30% está unido a proteínas (principalmente albumina) e 15% está complexado com ânions.

Os requerimentos de Mg vão desde 0,04% da matéria seca em cães até 0,4% em gatos. Em

ruminantes são em média de 0,15%, sendo maior em vacas leiteiras. A maioria dos cereais são boas

fontes de Mg (0,13-0,22% base seca). Em geral, os alimentos possuem uma quantidade de Mg que

dificilmente resultaria em deficiência. O problema é que a disponibilidade de Mg nas pastagens é

baixa, da ordem de 5 a 30%, enquanto que nos concentrados é maior (10-40%). O Mg nos

ruminantes é absorvido no rúmen por mecanismo ativo de transporte e a sua absorção é interferida

por altos teores de K, N e ácidos graxos orgânicos. Como o metabolismo dos ossos não está muito

envolvido na homeostase do Mg, o animal depende mais do Mg da dieta e o organismo utiliza o

rim para controlar os níveis sanguíneos. O excesso de Mg é excretado pela urina, de forma que os

níveis urinários e os níveis sanguíneos de Mg são bons indicadores do equilíbrio ingestão/gasto no

animal.

Funções do magnésio

O Mg tem múltiplas funções no organismo. No esqueleto e nos dentes mantém a integridade

estrutural. Nos demais tecidos, o Mg é componente ativo de pelo menos 300 sistemas enzimáticos.

É também ativador essencial de enzimas que têm a tiamina pirofosfato como cofator e de enzimas

que transferem grupos fosfato, tais como ATPase, mioquinase e CK, entre outras. O Mg ativa a

piruvato carboxilase, a piruvato oxidase e várias enzimas do ciclo de Krebs. É essencial na

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respiração celular, onde o Mg forma complexos com ATP, ADP e AMP. Nesse sentido, cumpre

papel essencial em todas as ações e reações que demandam energia, tais como a contração muscular,

transporte ativo, síntese de proteínas, lipídeos, ácidos nucleicos e glicídeos, na fosforização

oxidativa e em muitas outras funções. O Mg também participa na manutenção do potencial de

membrana das células nervosas e da placa neuro-muscular. O Mg é necessário para o adequado

funcionamento da bomba Na-K-ATPase, de maneira que uma deficiência pode causar aumento no

Na intracelular e permite o vazamento de K do interior das células para o espaço extracelular. Como

isso também acontece nas células tubulares renais ocorre perda de K causando hipocalemia.

O Mg afeta a homeostase do Ca através de dois mecanismos. Em primeiro lugar, muitos

canais de Ca dependem do Mg. Assim, quando há alto teor de Mg, o transporte de Ca para dentro

da célula e do retículo sarcoplásmico é inibido. Em deficiência de Mg ocorre o processo oposto

aumentando a concentração de Ca dentro da célula. A diminuição do Mg plasmático (valores <

1,2 mg/dL) provoca tetania, a principal manifestação clínica da deficiência deste mineral. Isto é

devido a que o mecanismo pelo qual o Ca retorna aos compartimentos de armazenagem na célula

muscular após o impulso nervoso, envolve um sistema Ca-Mg-ATPase. Faltando Mg, o sistema

não funciona e mantém a excitabilidade e a contração muscular pela presença de Ca intracelular.

Em segundo lugar, o metabolismo do Ca e do Mg estão intimamente relacionados através da ação

do PTH, uma vez que os níveis de Ca e Mg são aumentados pela ação desse hormônio. Uma

deficiência de Mg pode prejudicar a produção de PTH, o que leva a uma hipocalcemia.

Deficiência de magnésio

A importância do Mg se vislumbra quando se observam alterações relacionadas com sua

deficiência, em aspectos como crescimento, imunidade, contração muscular, sobrevida das

hemácias, aparecimento de neoplasias, metabolismo do colágeno e funções do Na e do K. Não

existe um rigoroso controle homeostático do Mg, portanto sua concentração sanguínea reflete

diretamente o nível da dieta. O controle renal de Mg está mais direcionado para prevenir a

hipermagnesemia, mediante a excreção do excesso de Mg pela urina. Diante de uma deficiência de

Mg, seus níveis na urina caem a praticamente zero. Assim, os níveis de Mg na urina são indicadores

da ingestão do mineral nos alimentos. Sinais relacionados com a deficiência de Mg incluem

irritabilidade, fraqueza muscular, náusea e desordens mentais. Quadros de hipomagnesemia (Mg <

1,5 mg/dL) podem ser observados, além de consumo inadequado de Mg, por má absorção, diarreia,

perda renal (uso de diuréticos) e, em humanos, por alcoolismo. Hipomagnesemia é frequentemente

concomitante com hipocalcemia e hipocalemia.

27

Tetania das pastagens

A hipomagnesemia é um transtorno metabólico dos ruminantes conhecido desde 1929,

quando Sjollema e Seekles a descreveram como sendo um quadro nervoso agudo de animais em

pastoreio que chamaram tetania das pastagens. É relatada pouca incidência (< 2%), porém fatal na

maioria dos casos. Não está necessariamente relacionada com o parto, embora as vacas lactantes

sejam mais suscetíveis devido à demanda de Mg no leite. A hipomagnesemia tem sérias

consequências para os ruminantes, podendo conduzir à morte, enquanto que a hipermagnesemia

não causa maior transtorno. A tetania hipomagnesêmica geralmente é causada pela baixa ingestão

de Mg na dieta, associado a fatores que interferem na absorção e utilização do mineral. O Mg é

absorvido no intestino mediante um sistema de transporte ativo que pode ser interferido pela relação

Na:K e ainda pela quantidade de energia, de proteína (N), de Ca e de P presentes no alimento. A

hipomagnesemia também pode ser consequência de uma excessiva lipólise em decorrência de uma

deficiência de energia.

Alguns procedimentos de manejo podem favorecer a apresentação desta patologia, tais como

adubo excessivo das pastagens com N e K, que impedem a absorção de Mg pela planta, elevado

consumo de material verde e alta umidade ambiental, que causam efeito laxante com perdas de Mg.

Algumas condições nutricionais como o elevado consumo de proteína, que leva a aumentar o nível

de amônia no rúmen, podem gerar sais (fosfato amônico-magnésico) que reagem com ácidos graxos

de cadeia longa e formam precipitados de sabões insolúveis. Desequilíbrios minerais,

especialmente de Ca, podem precipitar o transtorno uma vez que o transportador sanguíneo é o

mesmo para os dois minerais e um excesso de Ca pode ocasionar um déficit de Mg. Os animais

confinados e alimentados com concentrados dificilmente são afetados. Outros fatores

predisponentes, que podem causar surtos de tetania das pastagens, são: estresse por transporte,

longas caminhadas, manejo excessivo, pastagens de baixa qualidade e mudança súbita na

alimentação, por exemplo, de alimentação de inverno para pastagens suculentas da primavera, os

quais têm menor disponibilidade de Mg e maior conteúdo de N e/ou K.

O nível de Mg no perfil metabólico pode indicar estados subclínicos antes de surgir o

problema, sendo especialmente útil antes do parto para evitar problemas de tetania no pós-parto,

geralmente complicados com febre de leite. Configura-se hipomagnesemia com níveis abaixo de

1,75 mg/dL. Os níveis de Mg na urina podem ser indicativos de deficiência quando estão abaixo de

0,5 mg/dL (IR 10-15 mg/dL). É aconselhável fazer monitoramento dos níveis de Mg no sangue ou

na urina ao longo do ano para prevenir hipomagnesemia. O leite é relativamente deficiente em Mg

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(0,015%), portanto recomenda-se suplementar aos bezerros lactentes, os quais necessitam de 5

g/dia.

A hipomagnesemia pode causar, além da tetania, hiperexcitabilidade, retenção de placenta,

bem como anormalidade da digestão ruminal e diminuição da produção de leite. Também predispõe

à apresentação de febre do leite em vacas após o parto, devido ao fato de que níveis baixos de Mg

reduzem drasticamente a capacidade de mobilização das reservas de Ca dos ossos. Existem duas

formas do transtorno, clínica e subclínica. Na forma subclínica ocorre tremor muscular permanente,

incoordenação e nistagmo ocasional. Neste estado, fatores como o estresse podem levar à forma

clínica, caracterizada por decúbito, paralisia espástica das extremidades, prolapso da 3ª pálpebra,

opistótono, reflexos exaltados, hipersensibilidade auditiva e visual, contrações e convulsões e,

finalmente, a morte do animal. Clinicamente é difícil detectar a doença, pois na maioria dos casos

é tão rápida que apenas pode se observar o animal já colapsado em tetania para morrer logo em

seguida. Nos casos agudos também se apresenta hipertermia e batimentos cardíacos irregulares e

fortes, bem como hiperestesia e espasmos tetânicos. A confirmação diagnóstica é obtida pelo

histórico, sinais clínicos e por valores muito baixos de Mg na urina ou no humor aquoso ou vítreo

(< 0,5 mg/dL), hipomagnesemia (< 1,0 mg/dL) e, quase sempre, hipocalcemia.

O tratamento consiste em administrar solução de sulfato de Mg 10% via endovenosa. De

forma oral não funciona bem, pois pode haver dificuldade de absorção. Para evitar recorrência é

importante manter a suplementação oral de Mg e, se necessário, repetir a dose. Preventivamente,

deve melhorar-se a ingestão de Mg. Tem sido usada magnesita calcinada (MgO) misturada no

alimento, pulverizada na pastagem, mesclada com melaço ou até em forma líquida. A dose de

proteção é de 60 g/dia. Outras medidas preventivas incluem: diminuir a fertilização com K e ureia,

diminuir a movimentação e o estresse dos animais, fornecer feno ou forragem fibrosa para melhorar

a digestão e proteger os animais contra mudanças bruscas da temperatura, em especial contra o frio.

O prognóstico é geralmente desfavorável por causa da rapidez de apresentação dos sinais clínicos.

Toxicidade

É difícil ocorrer intoxicação de Mg considerando os alimentos naturais, mas é possível uma

toxicose devido à excessiva suplementação de Mg. Sinais clínicos de uma toxicose por Mg incluem

letargia, problemas na locomoção, diarreia, anorexia, baixo rendimento, sonolência e até a morte.

Ruminantes podem tolerar 0,5% de Mg na alimentação.

29

Sódio (Na)

O Na costuma ser estudado junto com o cloro (Cl) devido a que compartilham uma mesma

fonte (cloreto de Na, sal comum ou NaCl) e similares funções no metabolismo. Numa abordagem

nutricional, Na, Cl e potássio devem ser vistos paralelamente. Nesta revisão, no entanto, os minerais

Na e Cl serão considerados separadamente, salvo quando forem feitas menções diretas ao sal

comum. O sal, desde tempos imemoráveis, tem sido alvo de desejo por humanos e animais. Em

algum tempo foi moeda de troca, ao ponto que o termo “salário” deriva da expressão latina salarium

argentum, que significa “pagamento em sal”. O valor do sal como suplemento em gado foi

demonstrado por Boussing em 1847, e Babcock, em 1905, realizou experimentos de privação de

sal em vacas leiteiras. O Na forma 2,8% da crosta terrestre, sendo o principal cátion na hidrosfera.

Entretanto, é um mineral que não aparece livre na natureza, mas ligado ao Cl e ao P. O sal (NaCl)

abunda na natureza, não somente no mar (2,68%) mas também em depósitos de rocha salina.

Aproximadamente 0,2% do peso do organismo está constituído de sal, onde existe em forma inerte

no esqueleto, mas a grande maioria se encontra nos fluidos extracelulares cumprindo importantes

funções metabólicas. O equilíbrio do Na é controlado mediante o sistema renina-angiotensina-

aldosterona e pelo hormônio antidiurético. Quando consumido em excesso, o Na é excretado na

urina. Quando é deficitário, a excreção renal de Na é limitada, tendo o organismo uma

surpreendente capacidade de conservar este mineral. A saliva é importante no equilíbrio de Na,

pois de 50 a 100 L de saliva são produzidos por dia e a maioria do Na é reabsorvido pelo trato

digestivo. Durante a lactopoiese, os íons de Na são extraídos diretamente do sangue, donde são

transportados ativamente. O Na também passa através da placenta para o feto mediante difusão

passiva.

O sal nos alimentos e nos suplementos minerais é fácil e rapidamente solubilizado e

absorvido pelo trato gastrointestinal. O Na é absorvido por transporte ativo, através de um sistema

de bomba Na-K-ATPase. Cerca de 80% do Na que entra no trato digestivo provém de secreções

internas, tais como saliva, fluidos gástricos, bile e suco pancreático. Os requerimentos de Na são

maiores em ruminantes, principalmente lactantes (em torno de 0,18% base seca) do que em

pequenos animais (em torno de 0,06%). A maioria dos alimentos contêm baixas quantidades de Na

(< 0,06%), de forma que a falta de suplementação com sal comum, principalmente em animais em

pastejo, pode resultar em deficiências. As pastagens de regiões tropicais acumulam menos Na do

que pastagens temperadas.

30

Funções de sódio

Juntamente com o potássio (K) e o Cl, o Na está envolvido na manutenção da pressão

osmótica e dos sistemas tampão nos fluidos intra e extracelulares, no transporte de nutrientes e na

transmissão de impulsos nervosos. O Na perfaz 90% do total de cátions e Cl ⅔ dos ânions no

sangue. Os dois minerais são cruciais na manutenção da relação entre o volume circulante e a

pressão osmótica do plasma sanguíneo. A presença de Na é indispensável para a adequada absorção

intestinal de glicídeos e aminoácidos. É por isso que, na deficiência de Na, diminui a utilização

energético-proteica dos nutrientes ingeridos. A absorção intestinal de algumas vitaminas

(riboflavina, tiamina e ácido ascórbico) está acoplada ao Na. Propriedades particulares do Na

incluem o seu efeito sobre a capacidade de expansão das proteínas coloidais, a manutenção,

juntamente com o K, da atividade normal do músculo cardíaco, e a participação no processo de

excitação nervosa e muscular.

Deficiência de sódio

A deficiência de Na é a mais comum das deficiências minerais, principalmente nos animais

em pastejo, devido a que os vegetais, em geral, contêm baixos teores do mineral. Os animais mais

predispostos a sofrer de deficiência de Na são aqueles que estão na fase de crescimento e recebendo

dietas baseadas em cereais ou forragens com baixo teor de Na. Também merecem suplementação

os animais em lactação, os que executam trabalho e os que em condições de altas temperaturas. Os

principais sinais da deficiência de Na em ruminantes são alotrofagia (consumo de material

estranho), pelo áspero e seco, baixa produtividade, exaustão, atraso no crescimento em animais

jovens, diminuição da produção de leite, perda de apetite e perda de peso. Nas mastites também

aumentam as perdas de Na no leite. Sinais mais severos da deficiência incluem incoordenação

motora, irritação, fraqueza e arritmia cardíaca, que pode levar o animal à morte.

O tratamento consiste na suplementação com sal contendo 20 a 35% de NaCl, na quantidade

de 45 a 50 g/animal/dia. A deficiência de Na é rara na dieta normal dos animais monogástricos,

pois a suplementação com sal é prática comum. Uma forma de monitorar a possível deficiência de

Na é a determinação da relação Na/K na saliva. Em deficiência são observados baixos valores de

Na e altos de K, fazendo com que a relação Na/K seja menor que 10. Na, K e Cl podem ser

determinados por espectrofotometria de emissão de chama ou por eletrodos íon-seletivos. Uma

alternativa prática para dosar ao pé do animal é o analisador automático (i-STAT, Abbott), que

permite analisar os três minerais de forma rápida.

31

Transtornos de manutenção da natremia

A concentração de Na no plasma sanguíneo pode estar alterada em várias situações

patológicas que alteram a osmolaridade no plasma. Hipernatremia (aumento de Na no sangue) pode

ocorrer em animais desidratados quando as perdas de água excedem às perdas de eletrólitos como

em casos de vômito, diarreia crônica, na doença renal e em queimaduras cutâneas; também por

causas iatrogênicas, como no uso exagerado de diuréticos, nutrição parenteral inadequada,

administração de solução salina hipertônica ou bicarbonato de Na, com restrição de água de beber.

Pode haver também hipernatremia em intoxicação com sal combinada com falta de água, em

situações de calor ou exercício físico intenso, por causa da perda de K pelo suor e pela respiração,

na diabetes insípida e na diabetes mellitus, se ocorrer restrição de água, quando há restrição de água

de bebida, e no hiperaldosteronismo.

Uma hiponatremia (diminuição de Na no sangue) se configura quando a concentração de Na

no plasma é < 140 mmol/L, tendo como principais causas perdas no volume efetivo circulante,

como resposta neuro-hormonal, que resulta em aumento do consumo de água (hiponatremia

compensatória), em hemorragias, compensadas por aumento no consumo de água, no sequestro de

fluidos que contenham Na em cavidades (ascite, peritonite, obstrução intestinal, efusão pleural,

ruptura da bexiga), quando há consumo excessivo de água devido a problemas psicogênicos

(polidipsia primária), na doença renal com deficiente reabsorção de Na+ e quando há deficiente

secreção de vasopressina (ADH), não ocorrendo reabsorção de água e de Na+.

Toxicidade

Toxicidade por Na pode ocorrer, sendo os maiores fatores a ingestão de sal e a

disponibilidade e a ingestão de água pelo animal. Na presença de bom fornecimento de água, os

animais podem tolerar quantidades relativamente altas de sal na dieta. Os níveis máximos de sódio

na dieta são de 1,6% para bovinos lactantes e de 3,5% para bovinos de corte e ovinos. Os sinais da

intoxicação por Na incluem aumento exagerado do consumo de água, anorexia, perda de peso,

edema, inquietação, paralisia, depressão, ataxia, mioclonia e coma. Dependendo da espécie, por

exemplo, em suínos, podem aparecer sinais neurológicos, devido ao edema do córtex cerebral por

aumento do fluido cerebro-espinhal, como incoordenação e convulsões, podendo levar à morte.

Esses sinais aparecem quando a concentração plasmática de Na atinge níveis superiores a 170

32

mmol/L (IR= 132-155 mmol/L) e são devidos à desidratação neuronal (água se desloca para o

espaço extracelular).

33

Potássio (K)

O K é o 3º mais abundante mineral do organismo animal depois do Ca e do P. Foi isolado

por Sir Humphrey Davey em 1807, um ano antes de isolar o Ca. Foi Sydney Ringer quem, em 1883,

reconheceu a importância do K no organismo animal. Ele demonstrou que o coração deve ter um

adequado balanço de Na, K e Ca para funcionar corretamente. Ficou mais conhecido pela invenção

da solução salina Ringer. Por muito tempo, a pesquisa sobre K ficou relegada, pois os alimentos,

em geral, têm boa presença deste mineral. Mas a descoberta recente de que alguns alimentos tem

menos teor de K do que se esperava tem estimulado pesquisas sobre os efeitos da deficiência de K.

Apesar da ampla distribuição de K no solo, o elemento é incluído como fertilizante em muitos tipos

de solos para melhorar o crescimento das plantas.

O K representa em torno de 0,3% do peso dos organismos animais (peso seco) sendo que ⅔

dele se localizam no tecido muscular e na pele. Constitui o cátion mais abundante (75%) do espaço

intracelular. O K é absorvido em todos os segmentos do trato digestivo através do processo de

difusão. A entrada do K nas células requer transporte ativo, através de bomba Na-K-ATPase e o

seu balanço depende da taxa de absorção intestinal e de sua excreção via renal, estimulado pela

aldosterona e em menor quantidade (13%) das fezes. A homeostase do K é finamente regulada pela

excreção de K pelo rim. Em ruminantes, a saliva, com altas quantidades de K, serve de importante

fluido de reciclagem do mineral, processo particularmente importante quando o gado é alimentado

com pastagens de inverno, contendo baixas concentrações de K. Nas vacas lactantes, perto de 12%

do K do organismo pode ser excretado pelo leite. Os requerimentos de K se situam entre 0,4-0,6%

do alimento (base seca) sendo maiores em animais ruminantes, relacionado com a função do K na

fermentação ruminal, e em animais sob estresse calórico, devido às perdas de K pelo suor. Em

vacas lactantes os requerimentos de K podem chegar a 1%.

Funções do potássio

O K, da mesma forma que o Na, participa da manutenção do equilíbrio ácido-básico e da

pressão osmótica das células. Este mineral é cofator da enzima piruvato-quinase, que transfere o

grupo fosfato do fosfoenolpiruvato para o ATP, na fosforilação em nível de substrato que ocorre

durante a glicólise. Também, o K ativa várias enzimas do metabolismo, incluindo ATPase,

hexoquinase, fructoquinase, anidrase carbônica e amilase salivar. O K, juntamente com o Na, são

responsáveis pelo potencial de membrana nas células do sistema nervoso central e dos músculos.

Baixas concentrações de K diminuem a frequência cardíaca, ao passo que altas concentrações

34

provocam arritmias cardíacas e afetam o transporte de O2 e CO2 pela hemoglobina. Nos ruminantes,

o K participa do sistema tamponante do rúmen, favorecendo o crescimento e a função das bactérias

ruminais, particularmente as de tipo celulolítico.

Deficiência de potássio

A deficiência de K não é muito comum, a menos que a alimentação contenha níveis muito

baixos deste mineral. Uma situação de diarreia, acompanhada de balanço negativo de K na dieta,

podem levar a uma severa deficiência. Os sinais de deficiência de K incluem atraso no crescimento,

inapetência, ataxia, fraqueza muscular, paralisia, atonia intestinal, queda na produtividade e

diminuição do débito cardíaco. Em deficiência, os níveis de K no sangue e no leite diminuem e os

de Na aumentam, ocorrendo o contrário na urina. O hematócrito pode estar aumentado. Os

ruminantes são mais propensos a sofrerem de deficiência de K, devido aos maiores requerimentos

em relação aos monogástricos. Fornecimento adequado de K pode ser obtido em dietas contendo

grãos e soja. Quando suplementação de ureia com melaço é usada em ruminantes, o melaço

constitui uma boa fonte de K (4%). A determinação de Na e K na urina em relação à creatinina

urinária tem sido usada como estimativa da ingestão desses minerais na dieta.

Transtornos de manutenção da calemia

As mudanças na concentração de K têm profundos efeitos neuro-musculares causados por

mudanças no potencial de membrana das células. Em geral, a hipocalemia (diminuição da

concentração plasmática de K) aumenta o potencial de membrana, produzindo um bloqueio por

hiperpolarização, que resulta em debilidade muscular e paralisia. A hipercalemia (aumento da

concentração plasmática de K) diminui o potencial de membrana, causando hiperexcitabilidade. A

concentração de K no plasma (IR: 3,5-5,5 mmol/L) pode revelar tanto fatores internos de equilíbrio

do K através das membranas celulares entre os fluidos extra e intracelulares, quanto fatores externos

de equilíbrio entre o consumo e a excreção de K. Na determinação de K no sangue, deve preferir-

se a dosagem no plasma, devido à liberação de K pelas plaquetas durante a coagulação, o que faz

com que a concentração de K no soro seja ligeiramente maior do que no plasma.

Na acidose, há uma tendência a que o H+ em excesso entre no espaço intracelular com a

equivalente saída de K, causando hipercalemia. Hipercalemia também pode ser observada na

deficiência de insulina, e em situações que comprometam a excreção renal de K, tais como falha

renal aguda, insuficiência renal crônica, hipoadrenocorticismo, obstrução uretral e ruptura da

35

bexiga. Situações iatrogênicas causadoras de hipercalemia incluem fluidoterapia com K em excesso

ou em pacientes com função renal comprometida e diuréticos poupadores de K ou em alterações

musculares, como necrose, lesões ou exercício exagerado. Na hipercalemia se observam arritmias

cardíacas e fraqueza muscular. O aumento de K causa diminuição do potencial da membrana

muscular, afetando a sua repolarização e diminuindo a excitabilidade do músculo.

A hipocalemia é relativamente frequente nos animais domésticos como resultado da perda

dos depósitos de K ou da redistribuição de K entre os espaços extra e intracelulares. A concentração

de K no plasma geralmente reflete o depósito de K no organismo. Configura-se hipocalemia quando

a concentração plasmática de K é < 3,5 mmol/L. Entre as principais causas de hipocalemia estão

perdas de origem gastrointestinal por vômito e diarreia, perdas renais por alteração da função

tubular renal, alcalose, uso exagerado de diuréticos, hiperadrenocorticismo (com aumento do Na)

e tratamento inadequado de insulina em pacientes diabéticos. A hipocalemia pode causar, além da

alteração (aumento) no potencial de membrana, diminuição no volume intracelular e alteração do

pH intracelular, o qual é acidificado pela entrada de H+ para compensar a saída de K. Também há

alterações da atividade de enzimas dependentes de K+. Os sinais clínicos incluem debilidade

muscular, arritmias cardíacas, rabdomiólise, alterações renais (poliúria) e cãibras.

Toxicidade

A toxicidade com K pode ocorrer quando animais são alimentados com pastagens

abundantemente fertilizadas com esterco. A toxicidade está caracterizada por uma diminuição da

função reprodutiva, particularmente se a dieta também estiver deficiente em Na. Outros sinais da

toxicidade com K incluem espasmos musculares, diminuição do aporte sanguíneo aos tecidos,

edema das extremidades e morte. O nível máximo tolerável de K na dieta é de 3% (base seca).

36

Cloro (Cl)

A história do Cl se confunde com a história do Na por formarem parte do sal, que é a forma

mais amplamente distribuída na natureza. O metabolismo dos dois íons está bastante relacionado.

Assim, quando há um excesso de Na, ocorre excreção renal tanto de Na quanto de Cl. Entretanto,

a excreção de Cl é também influenciada pelo íon bicarbonato de forma oposta: um aumento de

HCO3 resulta em excreção renal equivalente de Cl. O Cl presente na alimentação animal,

geralmente na forma de cloreto (Cl-), é rapidamente absorvido no trato gastrointestinal, porém

necessitando de um limiar mínimo para que isto ocorra. A maior concentração de Cl no organismo

está nas células da mucosa gástrica. O Cl das secreções gástricas, como HCl, é obtido através do

sangue e, normalmente, reabsorvido durante a última fase da digestão no intestino grosso. No

intestino delgado, o Cl é necessário para a ativação da amilase pancreática. O Cl é excretado através

da urina e, juntamente com Na e K, através da transpiração. Os requerimentos de Cl são levemente

superiores aos de Na, em torno de 0,20% (alimento em base seca), sendo bastante menores em cães

(0,04%). Os requerimentos diários de sal (NaCl) são da ordem de 0,4% em vacas leiteiras, de 0,20%

em vacas de corte, de 0,50% em pequenos ruminantes e em cavalos e de 0,14% em cães e gatos.

Funções do cloro

O Cl é o principal ânion do fluido extracelular. Assim como o Na, o Cl é também responsável

pelo equilíbrio ácido-básico e pela manutenção da pressão osmótica. A concentração de Cl é afetada

indiretamente por mudanças na concentração de Na e, parcialmente, de K. O ADH intensifica a

excreção de Cl e reduz a sua absorção pelos túbulos renais.

Deficiência de cloro

É muito mais frequente que ocorra uma deficiência de Na do que de Cl. Os sinais de

deficiência de Cl, estão intimamente ligados com os sinais de deficiência de Na. A suplementação

com sal mineral ou sal comum se faz necessária para que não ocorra nenhuma das duas deficiências.

Transtornos de manutenção da cloremia

A cloremia deve estar em torno de 112 mmol/L. Hipercloremia (aumento do Cl no sangue)

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com aumento proporcional de Na, é observada na desidratação. A hipercloremia sem aumento

proporcional de Na é observada na acidose metabólica e na alcalose respiratória compensada. Para

entender estas alterações do Cl deve considerar-se que a sua concentração varia inversamente com

a concentração de bicarbonato (HCO3-). Assim, na alcalose respiratória há diminuição da pCO2 e a

compensação inclui a excreção renal de bicarbonato, a qual está associada com o aumento da

reabsorção de Cl. A acidose metabólica hiperclorêmica pode estar associada com uma diferença

aniônica normal ou baixa e pode ser vista como uma resposta compensatória a uma alcalose

respiratória primária.

Casos de hipocloremia (diminuição do Cl no sangue) com diminuição simultânea de Na são

observados na sobreidratação. Quando não há diminuição proporcional na concentração de Na, a

hipocloremia está associada a uma alcalose metabólica (aumento de bicarbonato se relaciona com

diminuição de Cl) ou à compensação de uma acidose respiratória. Na acidose respiratória há

aumento da pCO2 e a compensação é feita pelo aumento da retenção de bicarbonato, com perda de

Cl.

Toxicidade

O Cl, assim como o Na, costuma ser tóxico quando ingerido em excessivas quantidades, e

os animais não dispõem de água para beber ou a água é limitada. Níveis máximos de tolerância de

NaCl e outros minerais podem variar conforme a espécie, adaptação, idade e condição física do

animal. A toxicidade do Cl é caracterizada pelo aumento no consumo de água, anorexia, perda de

peso, edema, sinais nervosos, paralisia e uma infinidade de outros sinais que são dependentes da

espécie animal envolvida.

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Enxofre (S)

O S é um dos elementos mais abundantes na natureza, mas nos organismos animais é

estudado por sua relação com os aminoácidos sulfurados, tais como metionina, cisteína, cistina e

taurina, e das vitaminas sulfuradas, biotina e tiamina, fazendo parte, portanto, de proteínas,

enzimas, hormônios, coenzimas e pigmentos que fazem parte da respiração celular.

Funções do enxofre

As funções do S, na verdade, são remetidas às funções dos compostos sulfurados. Assim, o

aminoácido sulfurado metabolicamente mais importante, a metionina, é uma fonte específica de

grupos metilas utilizados na síntese de colina, acetilcolina, adrenalina e creatina. Cisteína e cistina

não são estritamente aminoácidos essenciais, uma vez que podem ser sintetizados no fígado a partir

de metionina. A cisteína é precursora da coenzima A e participa da síntese do glutation, juntamente

com o ácido glutâmico e a glicina. O glutation pode estar nas formas reduzida (GSH) e oxidada

(GS-SG) e participa nas reações de defesa contra os agentes oxidantes nas membranas celulares.

O S também é encontrado na forma de sulfato, fazendo parte do sulfato de condroitina, um

importante componente de cartilagem, ossos, tendões e paredes dos vasos sanguíneos. A heparina,

o anticoagulante natural, é um éster sulfúrico de um polissacarídeo. Grupos sulfato, principalmente

de origem hepática, são importantes para conjugar substâncias hidrofóbicas e assim permitir a sua

solubilidade no plasma com fins de excreção. O S é absorvido pelo intestino delgado. Os

aminoácidos sulfurados são absorvidos diretamente sem decomposição, mediante transporte ativo.

Os sulfatos inorgânicos são absorvidos tão somente no intestino delgado. No rúmen, o S é essencial

para os micro-organismos responsáveis pela digestão da celulose, pelo aproveitamento das fontes

de nitrogênio não proteico e pela síntese das vitaminas do complexo B. As bactérias ruminais

podem incorporar S inorgânico, presente nas plantas, em componentes orgânicos. A absorção e a

assimilação dos aminoácidos sulfurados são determinadas pelos níveis de proteína e energia no

alimento.

O requerimento de S pelo organismo animal é parcialmente suprido pelo S contido nos

compostos sulfurados. O S em excesso é excretado pelas fezes e pela urina. Poderia se dizer que os

requerimentos mais essenciais de S são para o funcionamento normal das bactérias do rúmen,

principalmente para a digestão da celulose. A maioria dos alimentos contém níveis de S adequados

para o crescimento das bactérias ruminais. Níveis de S adequados para ruminantes estão entre 0,16

a 0,30% (base seca). Os requerimentos de S em bovinos têm sido expressos em relação aos

39

requerimentos de N, recomendando-se uma relação N/S de 15. Para ovinos esta relação é de 10, em

função das maiores exigências de S para a síntese de lã.

Deficiência de enxofre

A deficiência de S está definida pela necessidade de metionina, aminoácido limitante que

pode estar em quantidades mínimas na dieta. A deficiência de metionina inibe o crescimento e o

desenvolvimento de animais jovens e diminui a produtividade em animais adultos. Contudo, a

adição de metionina em dietas deficientes deste aminoácido só é benéfica se a dieta contiver níveis

adequados de energia. Sinais importantes da deficiência de S incluem inapetência, ganho de peso

reduzido, pobre crescimento de lã nas ovelhas, baixa produção de leite, lacrimejamento,

embotamento, fraqueza, emaciação e morte. Quando se usa ureia como fonte nitrogenada em

ruminantes, é necessária a suplementação com S (na forma de sulfato) para não haver deficiência.

Recomenda-se suplementar 3 g de S inorgânico para cada 100 g de ureia. Considera-se o lactato no

sangue como um indicador indireto da deficiência de S em ruminantes, uma vez que a falta deste

mineral reduz significativamente a quantidade de bactérias ruminais, tendo como consequência

uma menor utilização de lactato no rúmen e a sua absorção à circulação sanguínea.

Toxicidade

É mais provável de ocorrer intoxicação por S em animais suplementados com substâncias

que contenham o mineral, tais como sulfato de amônia, para fornecer nitrogênio não proteico, ou

sulfato de Ca, como fonte de Ca. A causa da toxicidade é a formação de ácido sulfídrico (H2S) pela

flora gastrointestinal, composto que deprime a motilidade ruminal e causa transtornos nervoso e

respiratório. Em ovelhas, foi determinado um valor de 0,4% como nível tolerável de S na dieta.

Sinais de intoxicação por S incluem anorexia, perda de peso, constipação, diarreia, depressão, e por

vezes a morte. O S, assim como o Mo, tem relação com o metabolismo do Cu, de forma que quanto

maior for o teor de S e Mo, maior serão os requerimentos de Cu. Assim, um excesso de S pode

induzir quadros similares à deficiência de Cu.

40

Ferro (Fe)

A deficiência de Fe tem sido historicamente reconhecida principalmente em suínos e em

humanos. Leitões criados em solos de concreto e apenas a base de leite têm possibilidade de sofrer

de anemia ferropriva. Nas demais espécies animais, a deficiência de Fe é rara, a menos que esteja

presente uma severa infestação parasitária ou uma doença concomitante. Na história da

humanidade, o uso de Fe era aplicado pelos gregos em forma de poções para recuperar a saúde de

doentes. Monarde, no século 16, foi o primeiro a relacionar Fe e sangue. A aplicação terapêutica

do Fe foi relatada por Syndenham em 1681 para tratar a chamada “doença verde” ou “clorose”,

frequente em mulheres adolescentes, caracterizada pela apresentação de pele na cor verde-

amarelada. No final do século 19 a doença foi identificada como anemia. Concomitantemente, foi

a época em que Zinoffsky descobriu que a hemoglobina equina continha 0,33% de Fe, em que

Boussingault postulou a necessidade do Fe como um nutriente em animais e em que Braasch

descreveu a anemia dos leitões. No início do século 20, McGowan e Chrichton trataram com

sucesso leitões anêmicos mediante óxido de Fe.

O Fe é o segundo metal mais abundante na crosta terrestre (5%) depois do alumínio (7,5%).

Na crosta terrestre o mineral mais abundante é o silício (26%), sendo o segundo elemento mais

abundante nesse lugar depois do oxigênio (50%). Todos os seres vivos possuem Fe na sua estrutura

como componente importante de algumas metaloproteínas não enzimáticas, tais como

hemoglobina, mioglobina, ferredoxina, transferrina, hemossiderina e ferritina, e também de

algumas enzimas como citocromos, citocromo-oxidase, peroxidases, catalase e xantina oxidase. As

pastagens geralmente contêm quantidades adequadas de Fe (50-300 ppm) para os requerimentos

do animal (por volta de 50 ppm base seca). Entretanto, os níveis de Fe podem cair

significativamente em pastagens velhas e no inverno. Além disso, a disponibilidade de Fe nas

forrageiras varia muito (10-40%) e a absorção intestinal do elemento é baixa, sendo menor nos

adultos (5-15%) do que nos jovens (15-20%). A principal fonte vegetal de Fe na natureza são as

folhas de leguminosas. A farinha de sangue contém alta quantidade de Fe, porém de difícil

utilização. As sementes de cereais e o leite são pobres neste elemento.

A homeostase do Fe ocorre primariamente por ajuste da absorção intestinal, de forma que a

taxa de absorção está limitada às necessidades e afetada pela idade, a condição do trato

gastrointestinal e a disponibilidade do Fe. Em casos de parasitismos e infecções intestinais

aumentam as exigências de Fe. A disponibilidade deste mineral, que se absorve no intestino na

forma reduzida (Fe2+), é maior como carbonato de Fe e sulfato ferroso e menor na forma de óxido

férrico. Altas quantidades de oxalatos, fitatos, Cu, Co, Ca e Cd interferem negativamente na

41

absorção de Fe. A teoria de “bloqueio na mucosa” estabelece que apenas é absorvido o Fe intestinal

que o organismo necessita e que o restante não é absorvido quando os estoques estão cobertos. O

Fe absorvido é transportado pela ferritina até o fígado, onde se armazena em maior quantidade,

principalmente ligado às proteínas ferritina e hemossiderina. Outros órgãos de armazenamento de

Fe são o baço e a medula óssea. A ferritina contém 23% de Fe, enquanto a hemossiderina contém

37% de Fe. Outros órgãos armazenadores de Fe são baço, músculo esquelético, coração, cérebro e

medula óssea. O Fe ligado à ferritina está em forma mais solúvel e disponível que o Fe ligado à

hemossiderina. Quando os estoques de Fe estão baixos, aumenta a proporção do mineral

armazenado como ferritina e quando a quantidade de Fe aumenta, a proporção na hemossiderina

aumenta. A principal proteína transportadora de Fe no sangue é a transferrina, a qual leva o Fe na

forma oxidada (Fe3+). Em cães a concentração de Fe sérico é menor nos machos (115 µg/dL) do

que em fêmeas (150 µg/dL). Nos tecidos, o Fe3+ é reduzido a Fe2+ para formar parte das

metaloproteínas. O Fe está distribuído no organismo em três compartimentos: 65% fazendo parte

das metaloproteínas; 20% nas proteínas transportadoras e armazenadoras de Fe (transferrina,

ferritina e hemossiderina); e 15% nos tecidos macios.

Funções de ferro

O Fe cumpre importantes funções em várias enzimas responsáveis pelo transporte de elétrons

(citocromos), pela ativação de O2 (oxidases, oxigenases) e pelo transporte de O2 (hemoglobina,

mioglobina). As formas como o Fe existe no organismo incluem formas complexas unidas a

proteínas (hemoproteínas), compostos heme (hemoglobina, mioglobina), enzimas heme

(citrocromos, catalase, peroxidase) e compostos não heme (flavoenzimas, transferrina, ferritina).

Deficiência de ferro

Uma vez que a maioria do Fe do organismo está fazendo parte da hemoglobina nos

eritrócitos, uma deficiência desse mineral leva inevitavelmente a anemia. Os animais lactentes,

especialmente leitões, são os mais suscetíveis a uma eventual deficiência em função do pouco teor

de Fe no leite. As reservas de Fe no fígado do neonato são suficientes para 2 a 3 semanas. Em

bezerros a incidência pode ser alta, até 35%, pois as necessidades diárias de Fe são de 50 mg e uma

dieta de leite só fornece apenas 2 a 4 mg. Animais confinados alimentados com dietas inadequadas

tornam-se especialmente suscetíveis a sofrer de deficiência de Fe. No caso dos humanos, a OMS

determinou em 1991 que ao menos 1,3 bilhão de pessoas sofria de anemia, principalmente devida

42

à deficiência de Fe, e grande parte delas nos países subdesenvolvidos. É difícil de ocorrer

deficiência de Fe em animais em pastejo devido à quantidade adequada deste mineral nas plantas.

A anemia ferropriva (geralmente microcítica e hipocrômica) pode causar baixo crescimento e

aumento da suscetibilidade a sofrer doenças infecciosas, como pneumonia e gastroenterite. Palidez

das mucosas, perda de apetite, fadiga, intolerância ao exercício, fraqueza e dispneia são sinais

típicos da anemia ferropriva. No perfil sanguíneo, a anemia é compatível com valores de

hemoglobina menores de 8 g/dL e hematócrito menor de 26%. Entretanto, esses dois indicadores,

embora úteis, não são conclusivos para determinar uma deficiência de Fe. É imprescindível

descartar a anemia que ocorre por processos inflamatórios crônicos. Outros indicadores mais

específicos incluem a ferritina, cujos valores diminuídos (< 1,2 µg/dL) em conjunto com baixos

valores de hematócrito e hemoglobina são evidência inequívoca de deficiência de Fe. A proteína

transferrina, principal proteína transportadora de Fe, pode aumentar em casos de anemia (IR em

cães: 2,4 a 2,8 g/L). A capacidade total de ligação de Fe (CTLF) é outro parâmetro indicador que

aumenta na deficiência de Fe. Os valores devem ser < 400 µg/dL para não considerar deficiência

de Fe (IR em cães: 330-380 µg/dL).

É necessário suplementar os animais afetados com Fe na alimentação (30 ppm na matéria

seca). Os leitões e outros animais lactentes devem ser medicados com injeção de Fe intramuscular,

geralmente como Fe-dextrano. No gado, outras causas de anemia, diferentes à falta de Fe devem

ser consideradas no diagnóstico diferencial, tais como hemoglobinúria do pós-parto, infestações

parasitárias e intoxicação com plantas crucíferas (repolho, couve).

Toxicidade

Raramente ocorre toxicidade pelo Fe em animais. A maioria das vezes acontece por

suplementação exagerada ou tratamentos com Fe, como no caso dos leitões, que recebem soluções

injetadas de Fe-dextrano. Em ruminantes o nível máximo tolerável é de 1.000 ppm. Em humanos

existe uma condição genética conhecida como hemocromatose idiopática, em que há uma excessiva

absorção intestinal de Fe e o organismo não consegue excretar o Fe excedente. A hemocromatose

pode levar a cirrose hepática, pigmentação cutânea, lesões pancreáticas e cardiomegalia. Nesses

casos o tratamento mais efetivo tem sido flebotomias frequentes (remoção de sangue). Existe uma

preocupação dos órgãos de saúde humana pelo consumo indiscriminado de suplementos minerais

contendo Fe, que pode resultar em siderose (toxicidade pelo Fe). Os sinais característicos de uma

siderose incluem anorexia, baixo crescimento, baixa eficiência de conversão, oligúria, diarreia,

43

hipotermia, acidose metabólica e até a morte. Valores de ferritina superiores a 20 µg/dL indicam

sobrecarga de Fe. Na hemocromatose esses valores podem chegar a 70 µg/dL.

44

Zinco (Zn)

A essencialidade nutricional do Zn foi demonstrada em 1934 por Bertrand e Bhattacherjee

em camundongos e por Todd em ratos. Pouco depois, em 1940, Keilin e Mann descobriram que a

enzima anidrase carbônica continha 0,33% de Zn. Em meados do século 20 foi demonstrado que o

Zn previne e cura a paraqueratose em suínos, uma condição caracterizada por lesões da pele com

excesso de queratinização da epiderme. A absorção de Zn ocorre no rúmen e, em animais

monogástricos, no duodeno. A quantidade absorvida é menor nos monogástricos (7-15%) do que

nos ruminantes (20-40%), podendo ser afetada pela interação exercida por outros elementos como

Ca, Cu e Fe. A absorção de Zn é favorecida pelo Mg, fosfatos e vitamina D. O excesso de ácido

fítico, presente principalmente nas forrageiras, nos cereais e nas sementes de oleaginosas (soja,

algodão), diminui a absorção do mineral, devido à formação de um complexo insolúvel de fitato de

Zn, podendo causar deficiência. As dietas a base de concentrados geralmente contêm suficiente Zn

para garantir os valores nutricionais ótimos, ou seja, 40 ppm nos bezerros e 90 ppm em vacas em

produção. Alimentos especialmente ricos em Zn são cereais, farinha de ossos e melaço. Entretanto,

as pastagens brasileiras são geralmente deficitárias no mineral, sendo recomendada a sua

suplementação em animais em pastejo. É interessante que nunca ocorre deficiência de Zn quando

se usam tubulações e tanques galvanizados para a distribuição de água.

O nível sanguíneo normal de Zn está entre 80 a 120 g/dL, tendo como limiar indicador de

deficiência 60 g/dL. Cuidado deve ser dado para não haver hemólise nas amostras, pois a

concentração de Zn nas hemácias é cerca de 10 vezes a concentração no plasma/soro. Cerca de ⅔

do Zn circula ligado à albumina e o restante à α-2 macroglobulina. Assim, na hipoalbuminemia

pode haver diminuição do valor de Zn em ausência de deficiência do mineral. Um indicador

alternativo ou concomitante para avaliar o nível de Zn é a metalotioneína, proteína sintetizada pelo

fígado que se une avidamente a Zn através de seus numerosos resíduos de cisteína, cuja atividade

diminui quando o Zn está deficitário. A metalotioneína parece servir não só como armazenadora

de Zn, mas como detoxificante por unir cádmio, mercúrio e outros metais pesados. É mencionado

também que a atividade da enzima fosfatase alcalina sérica (Zn-dependente) pode diminuir na falta

de Zn. O Zn parece ter um controle homeostático bastante eficiente, mediante diferenças na taxa

de absorção no intestino, a qual pode aumentar a 100% em situações de deficiência. A capacidade

de armazenagem de Zn no fígado e nos ossos é limitada e contribui pouco para a homeostase. A

excreção do Zn é feita principalmente pelas fezes (secreção pancreática, biliar e gastrointestinal),

com pequenas quantidades sendo eliminadas pela urina e pelo leite.

45

Funções do zinco

O Zn participa como cofator ou ativador de várias enzimas, principalmente DNA e RNA

polimerases, sendo, portanto, participante de processos de proliferação celular e síntese de

proteínas, com notório efeito sobre tecidos de rápido crescimento (funções reprodutivas). O Zn,

sendo constituinte da anidrase carbônica, atua no equilíbrio ácido-básico e na calcificação dos ossos

e, nas aves, na formação da casca do ovo. Outras enzimas e principais órgãos afetados quando

ocorre deficiência de Zn incluem fosfatase alcalina (plasma), álcool desidrogenase (fígado),

timidina quinase (tecido conectivo) e carboxipeptidase A (pâncreas). O Zn participa na produção,

armazenagem e secreção de alguns hormônios, tais como insulina, testosterona e cortisol, além de

ativar os seus sítios receptores nas células-alvo. Outra função do Zn está relacionada com a

integridade do sistema imunológico, principalmente pela sua participação na proliferação de

linfócitos. O Zn mantém a concentração de vitamina A no plasma, pois é necessário na síntese da

proteína carreadora de retinol (RBP). Adicionalmente, a metaloenzima (Zn) álcool desidrogenase

da retina catalisa a reação de interconversão do retinol em retinal, essencial para a visão normal.

Deficiência de zinco

A deficiência de Zn está relacionada com a apresentação de eventos como baixo crescimento

(participação na proliferação celular e síntese de proteínas), cicatrização retardada, infertilidade

(em machos ocorre falha na espermatogênese, em fêmeas falhas na ovulação e na sobrevivência

embrionária), hipogonadismo, crescimento retardado, atraso na puberdade, diminuição da

competência imunológica (produção de imunoglobulinas), paraqueratose, particularmente em

suínos, alopecia, despigmentação do pelo e perda de lã, falha de crescimento de cascos e chifres,

com lesões, deformações, laminite e claudicações, diminuição da síntese de proteínas plasmáticas

causando hipoalbuminemia e hipoglobulinemia, inflamação das articulações, fotofobia, anorexia e

queda da produção de leite. Tem sido mencionado que a fotossensibilização, causada em bovinos

por toxinas ligadas ao fungo Pithomyces chartarum (esporodesmina), presente em espécies do

pasto Braquiaria, responde ao tratamento com Zn, sem que se tenha esclarecimento sobre este

efeito. A suplementação de Zn pode ser feita em forma química como carbonato, sulfato, cloreto

ou óxido de Zn.

46

Toxicidade

Na maioria das espécies, a toxicidade por Zn é rara, mas pode aparecer quando a dieta contém

níveis acima de 1.000 ppm. As espécies mais tolerantes são suínos, aves, bovinos e ovinos. O

conteúdo de Ca, cobre, cádmio, selênio, manganês e Fe no alimento influi no efeito tóxico do Zn

por interferir na sua absorção intestinal. Causas de intoxicação por Zn incluem mastigação de barras

galvanizadas, ingestão de fungicidas ou uso excessivo de suplementos de Zn. O excesso de Zn pode

deslocar o cobre do fígado, causando deficiência deste mineral, mas também pode evitar o efeito

tóxico do cobre em intoxicações, principalmente em ovinos. Em cães e gatos, a toxicidade tem sido

observada pela ingestão de moedas, observando-se vômito, anorexia, anemia e alterações

pancreáticas.

47

Cobre (Cu)

O cobre, além de ser um elemento essencial, pode ser tóxico, principalmente em ovinos. No

alvorecer do século 19 foi encontrado em plantas e animais, inicialmente acreditando-se que sua

presença era contaminante, mas no século 20 foi descoberta sua função essencial no crescimento e

na formação de hemoglobina por Hart. Mais adiante foi relacionada a deficiência de cobre com a

presença de ataxia enzoótica em cordeiros, doença da vaca caída, ruptura de aorta em coelhos,

suínos e frangos e despigmentação de pelo e lã, assim como transtornos ósseos. Na maioria das

espécies, a taxa de absorção de cobre pelo intestino é baixa, sendo de 5-10% em adultos e de 15-

30% em jovens. Como no caso do Zn, a taxa de absorção está influenciada pela necessidade do

organismo, pela forma química do elemento e pela quantidade de outros minerais, que podem

exercer efeito antagônico. Neste sentido, o molibdênio (Mo) é um importante fator no caso do

cobre. Níveis a partir de 10 ppm de Mo no alimento causam interferência na absorção intestinal de

cobre. A relação Cu/Mo, ideal para evitar interferências, deve ser ao menos de 4. Hipocuprose pode

se manifestar quando a relação Cu/Mo é menor de 2,8. O S inorgânico e ainda o excesso de

aminoácidos sulfurados também limitam a absorção do cobre. Mo, principalmente em presença de

S, reduz a deposição de cobre nos órgãos e diminui a síntese de ceruloplasmina. O cobre e o S, por

sua vez, reduzem a deposição de Mo no fígado e aumentam a sua excreção urinária. O excesso de

Ca, bem como de proteína total, também interfere com a absorção de cobre. O lugar de maior

concentração de cobre no organismo está no fígado, diminuindo com a idade. Os ovinos constituem

uma exceção, pois a concentração de Cu hepático aumenta com a idade.

O cobre é transportado do fígado para os órgãos periféricos pela ceruloplasmina, uma

-globulina plasmática que atua como armazenadora e transportadora para manter a homeostase

do cobre. A ceruloplasmina contém uma porção oligossacarídica, à qual se une ao cobre nas suas

duas formas de oxidação (Cu+ e Cu2+). A concentração média normal de cobre no sangue é de 80-

120 g/dL. Um nível de cobre no sangue menor de 50 g/dL é indicador de deficiência. A

determinação de ceruloplasmina plasmática ou da enzima superóxido dismutase dos eritrócitos, que

possuem uma alta correlação com os níveis de cobre sanguíneos, são também usados para detectar

estados carenciais deste mineral. O cobre é excretado principalmente nas fezes, a partir da fração

não absorvida e secundariamente por via biliar. A excreção de cobre pela urina é muito pequena.

Os requerimentos de cobre (base seca do alimento) são maiores em ruminantes (entre 7 a 11 ppm)

do que em pequenos animais (2 a 5 ppm). Altos níveis de Mo, Fe e Zn no alimento diminuem a

absorção de cobre aumentando o requerimento. Considera-se adequado um nível de cobre no

alimento de 6-8 ppm, quando o teor de Mo é menor de 1 ppm. As melhores fontes de cobre são

48

sementes de leguminosas e farinhas de oleaginosas (15-30 ppm), seguidas de cereais (4-8 ppm) e

pastagens (5 ppm).

Funções do cobre

O cobre é importante componente de algumas metaloproteínas, muitas das quais são enzimas

que participam de reações de óxido-redução, tais como citocromo-oxidase, monoamino-oxidase,

superóxido dismutase, galactose-oxidase, lisil-oxidase, ceruloplasmina (ferroxidase), tirosinase,

uricase, catalase e DOPA-oxidase. A pigmentação de pelos e de lã também depende do cobre. O

cobre participa ainda da mineralização dos ossos, da formação e integridade do sistema nervoso

central e da manutenção da estrutura do miocárdio. O cobre não faz parte da estrutura da

hemoglobina, como o Fe, mas é necessário para a síntese do grupo heme, além de participar na

absorção intestinal e mobilização de Fe. A deficiência de cobre causa anemia de tipo hipocrômico.

Em muitos casos, a doença é insidiosa, ou seja, clinicamente silente, causando perdas na produção

e infertilidade.

Como o cobre tem uma importante função no sistema citocromo-oxidase, sua deficiência

causa transtornos no metabolismo oxidativo, o que pode manifestar-se de múltiplas formas, entre

elas, por perda de condição corporal, crescimento retardado, queda da produção e má absorção

intestinal, que leva a diarreia, constituindo esta um sinal típico de deficiência. A função do cobre

na osteogênese faz com que, diante de uma deficiência, ocorra depressão do metabolismo dos

osteoblastos com crescimento defeituoso dos ossos, claudicações e osteoporose. O papel do cobre

na síntese de melanina e de tecido conjuntivo leva, na carência do mineral, a transtornos na pele

como aspereza, alopecia, perda de pigmentação do pelo (acromotriquia) e perda da ondulação na

lã. Casos graves de deficiência de cobre em bovinos podem levar a degeneração do miocárdio por

falha na oxidação do tecido cardíaco, que causam degeneração fibrosa progressiva e podem levar

a morte súbita.

Deficiência de cobre

Depois do Na e do P, a deficiência de cobre é a mais severa limitação em animais em pastejo

nas regiões tropicais. Os principais sinais da deficiência de cobre incluem anemia, diarreia,

transtornos ósseos, falhas na reprodução, transtornos nervosos e cardiovasculares (falha cardíaca),

acromotriquia e falha na queratinização de pelo e lã. A lã pode aparecer sem as ondulações

características, no que se conhece como lã fibrosa ou de aço. A deficiência de cobre afeta os

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linfócitos T e B, os neutrófilos e os macrófagos, de forma que sua deficiência causa

imunodepressão. Em carneiros e cabras jovens, a deficiência de cobre causa falha na mielinização

dos neurônios, devido à diminuição na síntese de esfingolipídeos, provocando incoordenação e

problemas para caminhar (ataxia neonatal). Em potros neonatos de mães com deficiência de cobre,

tem sido observada osteodisgênese, uma doença relacionada com má formação dos ossos que causa

claudicação, tendência a fraturas e inflamação das articulações dos membros.

A deficiência de cobre tem sido detectada em muitos países. No Brasil, foi detectada

deficiência de cobre unida a deficiência de cobalto em vacas e ovelhas da região nordeste, em um

transtorno conhecido como mal do roncado, caracterizado por baixo crescimento dos animais. Em

geral, pastos com menos de 3 ppm de Cu podem desencadear deficiências, o que pode ser agravado

se tiver excesso de Mo, S, Fe, Ca ou de proteínas. Podem ser esperadas deficiências quando o Mo

excede 3 ppm e o Cu está abaixo de 5 ppm. Consumos excessivos de Fe e Zn também podem

induzir deficiência de cobre. Dietas baseadas em concentrados geralmente têm suficiente teor de

cobre para evitar deficiências. Entretanto, as pastagens em quase todo o Brasil são deficitárias em

cobre. Quando existem riscos de deficiência de cobre resulta útil suplementar preventivamente, de

forma a garantir 10 ppm na matéria seca do alimento, como sulfato de Cu, tomando cuidado para

evitar sobredosificação, às vezes fatal, especialmente em ovelhas, que são animais mais sensíveis

ao excesso de cobre. Em casos de deficiência com sinais clínicos manifestos, o melhor é medicar o

cobre via parenteral.

Toxicidade

Há bastante variação de tolerância ao cobre dependendo da espécie animal. Os ruminantes e,

em especial, as ovelhas, são a espécie mais suscetível de sofrer intoxicação com cobre, ocorrendo

inclusive em animais em pastejo com altos índices de cobre e baixos de Mo no solo. O nível de

tolerância de cobre em bovinos é de 100 ppm e em ovinos é de 25 ppm. A raça Merino é bem mais

tolerante ao cobre do que as outras raças ovinas. O consumo excessivo de cobre leva ao acúmulo

nos tecidos, principalmente no fígado, sem que sejam observados sinais clínicos. O excesso de

cobre compromete os mecanismos antioxidantes das células. Em situações de estresse, e quando o

fígado esgota a sua capacidade de armazenamento, o cobre é liberado rapidamente para o sangue,

causando uma crise hemolítica, caracterizada por hemoglobinúria, icterícia e hemorragias

generalizadas.

A intoxicação por cobre em ovinos pode ser de dois tipos, aguda ou crônica. A intoxicação

crônica é caracterizada por duas fases, subclínica e aguda. Na fase subclínica, ocorre o acúmulo de

50

cobre no fígado por semanas ou meses. Na fase aguda, ocorre a liberação do cobre acumulado no

fígado para a corrente sanguínea, causando hemólise e anemia. A intoxicação crônica por cobre

pode ser primária ou secundária. A intoxicação crônica primária é causada pela ingestão de

elevados níveis de cobre, sendo através da alimentação ou via parenteral. Na intoxicação crônica

secundária, pode ocorrer a intoxicação crônica fitógena, onde se tem a ingestão normal de cobre

pelo animal, porém ocorre o acúmulo no fígado em consequência da ingestão de pastagem com

baixo teor de Mo. Pode ocorrer ainda intoxicação crônica hepatógena, onde o cobre é ingerido em

quantidades normais, mas ocorre o acúmulo em consequência de lesões hepáticas causadas por

plantas tóxicas. Para que ocorra a intoxicação por cobre o animal deve ingerir uma quantidade

acima de 150 ppm. A intoxicação crônica por cobre possui três fases: pré-hemolítica, hemolítica e

pós-hemolítica. Na fase pré-hemolítica, ocorre o acúmulo gradativo de cobre no fígado e rins, sem

provocar sinais visíveis. Os sinais podem aparecer por volta dos últimos 10 dias desta fase, porém

esse período pode variar de um mês a dois anos. Os sinais clínicos observados são anorexia, sede,

depressão, isolamento do rebanho, sonolência, icterícia e diarreia com fezes líquidas e escuras.

Outros sinais observados na intoxicação por cobre são náusea, vômito, gastroenterite severa com

dor abdominal, hipotermia, convulsões, paralisia, taquicardia, colapso e morte em 24 horas.

Quando o cobre satura no fígado, torna-se livre dentro do hepatócito, levando a necrose. Esse

processo é sinalizado pela liberação das enzimas hepáticas (GGT, AST), sendo detectados

aumentos no plasma três semanas antes da crise hemolítica. Na fase hemolítica, o cobre livre

penetra no interior da hemácia e combina-se com glutation, oxidando-o, provocando lesões nas

hemácias e ocorre liberação de cobre e radicais livres na corrente sanguínea. Nesta fase podem

ocorrer quadros de meta-hemoglobinemia, quando o cobre que está presente no interior da hemácia,

provoca a oxidação do Fe e, como consequência, uma incapacidade da hemoglobina carrear o

oxigênio. Este processo pode atingir até 35% das hemácias. O cobre livre pode provocar também

modificações oxidativas na hemoglobina, provocando o aparecimento dos corpúsculos de Heinz e

a retirada das hemácias de circulação. Com isso, pode-se ter a redução de 70% das hemácias

circulantes, provocando anemia. A hemoglobina livre aumenta a produção de bilirrubina, que se

acumula nos tecidos, levando a um quadro de icterícia. Na fase pós-hemolítica, pode ocorrer a

morte ou a sobrevivência do animal. Neste último caso, a recuperação é lenta com redução dos

quadros de hemoglobinúria, icterícia e anemia. A necropsia revela sempre severa necrose hepática.

A intoxicação com cobre pode ocorrer não somente pela administração exagerada para prevenir

deficiências, mas por outras causas, tais como consumo de plantas retentoras de cobre (Heliotropum

europeum, Senecio spp., Echium plantagineum), cama-de-frango, drogas antifungicidas, drogas

antiparasitárias, substâncias usadas para erradicação de caracóis e por poluição industrial. O Mo e

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o S podem ajudar nos casos de intoxicação por cobre, ajudando a diminuir a sua absorção,

administrados de forma oral como molibdato de amônia (100 mg) junto com sulfato de Na (1 g)

em 20 mL de água, durante 5-6 semanas ou na forma intravenosa, como tetratiomolibdato de

amônia. Dietas altas em Zn (100 ppm) protegem contra a intoxicação por cobre, principalmente em

animais monogástricos. Outros tratamentos incluem D-penicilamina via oral ou parental. Em

situações onde são utilizadas rações com níveis de Cu > 10 ppm, se preconiza a adição de Mo até

7,7 ppm. Para evitar a intoxicação fitógena recomenda-se a fertilização com 70 kg/ha de uma fonte

de Mo.

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Iodo (I)

Courtois isolou o I em 1811 a partir de cinzas de algas marinhas. O I, depois do Fe, foi o 2º

elemento reconhecido por ser essencial para a saúde. O metabolismo do I está estreitamente

relacionado com a tireoide, pois é o único órgão que pode acumular I em altas quantidades e

incorporá-lo nos hormônios tireoidianos (HT). Embora o I na circulação seja captado quase

exclusivamente pela tireoide, outros tecidos podem também concentrar I, como a glândula

mamária, a placenta, as glândulas salivares e o estômago. As plantas marinhas são boas fontes de

I, mas as plantas terrestres não o contêm, existindo amplas regiões do planeta que são deficientes

em I e que constituem áreas de risco de bócio.

Atualmente, com a iodação do sal, é menos frequente encontrar bócio. A relação entre I e

bócio nos humanos e nos animais foi observada desde início do século 19, quando foi encontrado

por Proust e, independentemente, por Coindet, que o I prevenia e curava o problema e que a

incidência de bócio endêmico estava inversamente relacionada com os níveis de I no solo e na água,

embora naquele momento não fossem conhecidas a estrutura e nem a função dos HT. A iodação do

sal como método para prevenir o bócio foi proposto por Boussingault, em 1831 na França, mas a

prática apenas foi massificada para uso humano em Michigan (EUA) em 1924 e cinco anos depois

para animais de produção.

O I deve ser incorporado no sal em proporção de 15 a 45 ppm de sal. Contudo, as principais

fontes do elemento, iodetos de K, Na e Ca, podem ser lixiviados e evaporados na mistura de sal em

condições de temperatura e umidade elevadas. Desta forma, não seria raro observar deficiências de

I por diminuição da concentração deste elemento no sal. Em média, a quantidade diária requerida

de I na alimentação de animais é de 0,5 ppm (base seca). O leite não era considerado uma fonte

adequada de I, porém nos últimos anos, devido à suplementação adequada de sal iodado nas vacas

leiteiras (em forma orgânica) e ao uso de desinfetantes iodados para a higienização dos tetos

mamários, pode-se considerar uma boa fonte, contribuindo com até 50% dos requerimentos de

humanos adultos. Plantas contêm, em geral, baixas quantidades de I: farinhas de soja, algodão,

linhaça e amendoim têm entre 0,1-0,2 ppm, cereais contêm até 0,1 ppm. Os peixes marinhos são

excepcionalmente ricos em I (entre 0,3 a 3 ppm base úmida), se comparados com os peixes de água

doce (0,02-0,040 ppm). Com níveis normais de ingestão de I, a concentração de iodeto inorgânico

no plasma do cão é de 5 a 10 g/dL.

A absorção intestinal de I é eficiente em quaisquer das formas do mineral. O I pode estar nas

formas de iodeto inorgânico (I-), que é a forma mais comum, ou de iodato (IO4-) ou bem unido a

formas orgânicas. Na vaca, 80% do I ingerido é absorvido no rúmen e 10% no omaso.

53

Aproximadamente 25 a 30% do I ingerido na dieta é captado pela tireoide, onde ingressa mediante

um mecanismo de bomba de I, processo no qual participa uma Na-K-ATPase dependente de ATP.

A captação do I na tireoide é estimulada pela TSH e inibida por determinados íons que concorrem

com o I, como o tiocianeto (SCN-), o perclorato (ClO4-) e o nitrato (NO3

-). Esta inibição pode ser

revertida com altas dosagens de I. Todavia, em condições normais, o excesso de I pode também

inibir a própria captação de I pela tireoide. A eficiência da captação do I por parte da tireoide é a

fundamentação da prova de fixação de I radiativo (131I) usada para avaliar a função tireoidiana. Em

aproximadamente 48 horas, cerca de 40% do I administrado endovenosamente deve estar fixado na

tireoide do animal normal.

O excesso de I é excretado principalmente pela urina ou pelo leite. Pequenas quantidades

podem ser excretadas via saliva, lágrimas e suor. Nos ruminantes, as fezes servem de significativa

via de excreção de I. Para avaliar o balanço de I no organismo podem ser medidos seus níveis no

sangue, na urina e/ou no leite. Considera-se que, na vaca, níveis de I no leite abaixo de 8 g/dL são

indicadores de deficiência. No plasma do suíno, o limiar indicador de deficiência é de 2 g/dL. O

I pode ser dosado por método potenciométrico, porém, sendo uma análise pouco rotineira nos

laboratórios de análises clínicas, a forma mais prática para avaliar o equilíbrio de I é mediante a

dosagem dos hormônios tireoidianos, principalmente a tiroxina (T4) no plasma.

Função do iodo

A única função conhecida do I é a sua participação na estrutura dos HT na tireoide. Na

tireoide deve ocorrer a oxidação do iodeto, etapa obrigada para a organificação do I, isto é, para a

sua incorporação em resíduos de tirosina dentro da proteína tireoglobulina, abundante no coloide

do folículo tireodiano. Os níveis de I orgânico na tireoide são muito variáveis, podendo ser de 10 a

40 mg/100 g de tecido. O I está na forma de monoiodotirosina (MIT), diiodotirosina (DIT),

triiodotironina (T3) e tiroxina (T4) ligados à estrutura da tireoglobulina. A oxidação do íon iodeto é

realizada pela enzima peroxidase que contém um grupo heme e requer H2O2 como agente oxidante.

O H2O2 é produzido por uma enzima NADPH-dependente. O processo de oxidação do iodeto é

estimulado pela TSH e inibido por compostos tireotóxicos como a tioureia e o tiouracilo. O produto

da oxidação é um radical livre (I•) que se une quase instantaneamente aos resíduos fenila das

tirosinas da tireoglobulina nas posições 3 e 5, para formar MIT ou DIT. As iodações não causam a

separação dos resíduos de tirosina de suas uniões à tireoglobulina. A relação tireoide/plasma de I é

de 20, podendo ir até 500 por estímulo da TSH ou cair para 1 por ação dos inibidores tireoidianos,

que concorrem com o I pelos mecanismos de transporte. Os HT participam do metabolismo

54

intermediário afetando a termorregulação, o crescimento, a reprodução, a circulação e a função

muscular, entre outras ações.

Deficiência de iodo

A deficiência de I causa diminuição da atividade tireoidiana e, em casos avançados, o bócio,

que é a hiperplasia não neoplásica e não inflamatória da tireoide. O bócio pode ser observado em

todos os mamíferos, sendo causado, além da deficiência de I, pela ingestão de substâncias

bociogênicas, pelo excesso de I na dieta, ou por falhas genéticas de enzimas da via biossintética

dos HT. Todas estas causas diminuem a secreção dos HT, o que leva a uma elevada secreção

compensatória de TSH da hipófise, provocando hiperplasia e hipertrofia das células foliculares da

tireoide. As substâncias bociogênicas são aquelas que alteram a síntese, liberação ou ação dos HT.

Entre elas estão os tiocianetos, que se produzem no rúmen pela digestão de plantas com glicosídeos

cianogênicos (trevo branco, gergelim, soja, mandioca), a goitrina produzida pelas plantas crucíferas

do gênero Brassica (repolho, couve, brócolis, couve-flor, colza, nabo), substância bociogênica

derivada dos glicosinolatos destas plantas, que inibe a organificação do I. Outras plantas, como a

leguminosa Leucaena leucocephala, contêm mimosina, alcaloide tóxico para a tireoide. O excesso

de I na alimentação pode ocorrer por consumo de algas secas ou excesso de suplementação de I,

podendo causar bócio, pois interfere na biossíntese dos HT ao inibir a proteólise da tireoglobulina

nos lisossomos.

Clinicamente os sinais do hipotireoidismo revelam diminuição da taxa metabólica. O animal

aumenta de peso, se observa inativo, incoordenado, letárgico e com problemas para suportar o frio,

de forma que procura lugares quentes. Também pode ser observada perda de pelo e, em alguns

casos, alopecia simétrica bilateral, hiperqueratose e hiperpigmentação, especialmente nas áreas de

alopecia, diminuição da frequência cardíaca, anemia e, no hipotireoidismo crônico, mixedema

(acumulação de mucina na epiderme). A mucina provoca acumulação de água e engrossamento da

pele, especialmente evidente no rosto e na cabeça. Também é observada diminuição da libido e

diminuição da concentração espermática nos machos. Nas fêmeas podem ocorrer transtornos nos

ciclos estrais, tais como anestro e aciclia, com diminuição da taxa de concepção. Em alguns casos

se observa constipação com produção de fezes duras e secas. Na deficiência de I, os níveis

plasmáticos dos HT em cães podem cair, no caso da T4, para menos de 8 ng/mL e, na T3, abaixo de

0,5 ng/mL. A determinação de I no sangue não é comum para monitorar o balanço do mineral no

organismo, mas a concentração de I no plasma e no leite pode ser útil para diagnosticar sua

deficiência. Nos humanos, a deficiência de I cobra aspectos mais dramáticos pelo efeito que causa

55

sobre a falta de desenvolvimento do cérebro no feto de mães com deficiência de I, produzindo

cretinismo. Segundo a Organização Mundial da Saúde, calcula-se em quase 6 milhões o número de

cretinos no mundo devido à deficiência de I, a grande maioria nos países subdesenvolvidos.

Toxicidade

Em geral, os animais toleram quantidades de I muito além dos seus requerimentos (que são,

em média, de 0,5 ppm). Assim, bovinos e ovinos toleram 50 ppm, suínos 400 ppm, frangos 300

ppm e cavalos, sendo os mais suscetíveis, toleram até 5 ppm. O consumo excessivo de I por

períodos prolongados leva a tirotoxicose, podendo induzir bócio, uma vez que a organificação do I

é bloqueada diante do excesso do mineral (concentração plasmática de I acima de 25 µg/mL). Sinais

de toxicidade por I incluem anorexia, fraqueza, lacrimejamento excessivo, descascamento da pele,

dificuldade para engolir e tosse seca. Costuma ocorrer toxicidade de I não somente por

suplementação elevada, mas quando se usam compostos iodados para prevenir doenças, como

podridão dos cascos e actinomicose, ou pelo uso de soluções antissépticas com concentrações

elevadas de I.

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Cobalto (Co)

O Co foi reconhecido como componente das plantas em meados do século 19 e como

componente dos tecidos animais no alvorecer do século 20. Apenas em 1935 o Co foi considerado

como sendo essencial para os ruminantes. A essencialidade do Co não foi determinada até a

descoberta da vitamina B12 em 1948 por Smith, na Inglaterra, e simultaneamente por Rickes, nos

Estados Unidos. O Co se armazena no organismo principalmente nos músculos (43%) e nos ossos

(14%). O requerimento de Co é de 0,1-0,2 ppm (base seca).

Funções do cobalto

O valor do Co nos animais é como componente da estrutura da vitamina B12

(cianocobalamina), da qual constitui 4,5%. Esta vitamina é precursora da coenzima B12, importante

cofator enzimático que participa de várias reações do metabolismo, como na transferência de

grupos metila, síntese de purinas e pirimidinas, síntese de proteínas e no metabolismo de glicídeos

e lipídeos. Em ruminantes participa da rota metabólica de utilização do ácido propiônico, de grande

valor por ser este ácido graxo a fonte mais importante de glicose via gliconeogênese. Nessa rota, a

coenzima B12 participa na conversão de metilmalonil-CoA em succinil-CoA, reação catalisada pela

enzima metilmalonil-CoA isomerase. A vitamina B12 também participa da formação dos eritrócitos,

participando na síntese da protoporfirina, e na manutenção do sistema nervoso. Nos ruminantes a

fonte de vitamina B12 são os micro-organismos do rúmen, sempre que houver suficiente Co

disponível. Ruminantes têm maiores requerimentos de vitamina B12 devido à participação desta

vitamina no metabolismo do propionato e à baixa eficiência de absorção no aparelho digestivo. Não

há síntese de vitamina B12 nos tecidos do organismo, de forma que os ruminantes dependem da

flora bacteriana ruminal e os monogástricos dependem da incorporação da vitamina na dieta.

Deficiência de cobalto

Existe deficiência de Co em muitas partes do planeta, embora seja difícil de detectar devido

à falta de um método rápido e barato para a dosagem do Co, o qual se determina por

espectrofotometria de absorção atômica ou da vitamina B12 no sangue, determinada por

radioimunoensaio. Junto com Na, P, e Cu, é a deficiência mineral mais importante em ruminantes

em pastejo. Valores plasmáticos menores de 200 pg/mL de vitamina B12 estão relacionados com

deficiência desta vitamina em pequenos ruminantes. Um método indireto para detectar estados

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deficitários é mediante a determinação de ácido metilmalônico na urina, pois este metabólito se

acumula, excretando-se pelo rim quando falta vitamina B12. A pastagem torna-se deficitária com

concentrações de Co inferiores a 0,08 ppm. No Brasil, principalmente na região centro-oeste, as

forrageiras costumam ser deficientes em Co. A situação se complica em solos alcalinos porque o

pH elevado interfere com a absorção de Co pela planta. O excesso de Mn no solo também atua

como inibidor da disponibilidade de Co pelas plantas. Os níveis sanguíneos normais de Co são da

ordem de 300-400 g/mL. Níveis menores de 250 g/mL indicam deficiência. Sinais de deficiência

de Co em ruminantes reúnem-se no que tem sido definido como marasmo enzoótico, tendo recebido

também nomes como peste de secar, mal-do-colete, chorona, toca e pela-rabo. Os animais com

deficiência de Co/vitamina B12 sofrem anemia, hipoglicemia, queda da produção, perda de apetite,

pele e pelagem ásperas, emaciação, letargia, infertilidade, cetose e, ocasionalmente, morrem.

Bezerros nascidos de vacas deficientes em Co nascem fracos e morrem em poucos dias.

Nos monogástricos não é mostrada com clareza uma deficiência de Co, uma vez que nesses

animais a carência mais comum é de vitamina B12, a qual precisa ser absorvida no estômago com a

participação de uma proteína transportadora conhecida como Fator Intrínseco. A deficiência de

vitamina B12 nos humanos se manifesta por anemia megaloblástica (anemia perniciosa) e sinais

neurológicos. Em outros animais monogástricos não há manifestação de anemia, mas perda de peso,

baixo consumo e conversão alimentar. Nos suínos há diminuição do tamanho da leitegada e da

sobrevivência dos leitões e em aves piora na taxa de eclodibilidade. O tratamento nos ruminantes

consiste na suplementação adequada de Co necessariamente por via oral, de forma a garantir um

nível de 0,1 ppm na matéria seca. A administração parenteral de Co ou oral de vitamina B12 é

ineficaz no tratamento da deficiência. Nos monogástricos e em alguns casos de ruminantes, pode

ser necessária a injeção intramuscular de vitamina B12.

Toxicidade

Em geral, os animais toleram altas quantidades de Co e/ou vitamina B12 na dieta. Sinais de

toxicidade de Co incluem anemia (em ruminantes policitemia), emaciação, fraqueza e aumento de

Co no fígado.

58

Manganês (Mn)

Bertrand, no início do século 20, demonstrou que o Mn é um mineral essencial em plantas e

animais. Deficiências de Mn costumam ocorrer em suínos, ruminantes e, principalmente, em aves,

espécie mais suscetível. O Mn é único no sentido de que se absorve muito pouco, não mais de 1%

no intestino, e tem níveis sanguíneos muito baixos (5-10 ng/mL). O teor de Mn no plasma não é

considerado um bom indicador do status do mineral. Uma vez que o teor de Mn é maior nas

hemácias, é preferível medir o Mn no sangue total para avaliar o status do Mn em animais. A

absorção ainda pode ser diminuída por níveis elevados de Ca e P. Seu transporte no sangue é feito

principalmente pela transferrina e sua distribuição é maior em ossos, fígado, rins e pâncreas. As

reservas corporais são baixas e diante de um excesso de Mn na dieta, diminui a eficiência de

absorção e aumenta a excreção, principalmente nas fezes (98%). O nível de Mn considerado

apropriado nos alimentos é de 50 ppm. Os requerimentos nas diferentes espécies variam entre 20 a

40 ppm, sendo os gatos menos exigentes (5 ppm) e as aves mais exigentes (60 ppm). Pode ocorrer

deficiência em solos pobres em Mn (< 3 ppm), situação que se agrava em solos alcalinos e com

altos teores de Ca, P e Fe.

Funções do manganês

O Mn atua como cofator enzimático nas vias relacionadas com síntese de ATP, tanto no ciclo

de Krebs, como na fosforilação oxidativa e nas reações da fosfatase alcalina e a piruvato oxidase.

Além disso, é ativador de metalo-enzimas como glicosiltransferases, arginase, tiaminase, piruvato

carboxilase, enolase, Mn-superóxido dismutase e dipeptidases intestinais. O Mg2+, cátion bivalente,

pode substituir parcialmente ao Mn2+ com pouco ou nenhum prejuízo da atividade enzimática. O

Mn é essencial no desenvolvimento da matriz orgânica dos ossos, composta basicamente por

mucopolissacarídeos. Quando ocorre deficiência de Mn, o sulfato de condroitina, da cartilagem

epifisiária, diminui acentuadamente, possivelmente por falha na ativação das enzimas

glicosiltransferases, participantes da síntese de polissacarídeos e glicoproteínas. O Mn também

parece estar relacionado com o desenvolvimento dos órgãos genitais e o funcionamento do corpo

lúteo e do tecido nervoso. Também participa da síntese de colina e de colesterol.

Deficiência de manganês

A deficiência de Mn é difícil de detectar, mas pode causar redução do crescimento, tendência

59

a fratura dos ossos, ataxia, fraqueza muscular e problemas de infertilidade, basicamente falha na

concepção, ovários subdesenvolvidos, transtornos do estro e diminuição da sobrevivência

embrionária. Nos bezerros neonatos, a deficiência de Mn é manifestada por inflamação e

deformações nas articulações, manqueira, baixo peso corporal e aumento da mortalidade. As aves

são consideradas mais suscetíveis à deficiência de Mn do que os mamíferos por terem maior

requerimento deste mineral. Em pintos, a deficiência de Mn provoca uma condição denominada

perose, caracterizada pela má formação da articulação tíbio-metatarsiana com encurtamento do

tendão de Aquiles, fazendo com que a porção final da tíbia e a porção proximal do tarso-metatarso

escapem da articulação dos côndilos e levem a torção do membro posterior. Em aves poedeiras, a

deficiência de Mn manifesta-se por queda na produção e na eclodibilidade e diminuição da

qualidade da casca. Os sais de Mn são de baixo custo e podem ser suplementados na forma de

cloreto, sulfeto, carboneto e como dióxido de Mn. A dosagem de Mn no plasma não é considerada

um confiável diagnóstico de deficiência, como é o caso do Cu ou o Se, mas os níveis de Mn podem

decair em situações de deficiência para menos de 20 ng/mL em plasma e < 6 ppm no fígado.

Toxicidade

O Mn pode ser considerado como o menos tóxico dos oligoelementos. Os níveis máximos

de Mn toleráveis nos animais estão entre 400 a 2.000 ppm, sendo mais tolerantes os frangos e mais

sensíveis os suínos e os coelhos. Com mais de 2.000 ppm (teor encontrado em certos solos de

origem vulcânica) observa-se depressão do apetite, crescimento retardado, infertilidade, anemia,

lesões gastrointestinais e sinais neurológicos.

60

Selênio (Se)

O Se foi considerado primeiro como mineral tóxico, nos anos 1930, e hoje é reconhecido

também como mineral essencial. Os alimentos para animais podem conter tanto concentrações

tóxicas (> 5 ppm) como deficientes (< 0,1 ppm), problemas que afetam principalmente animais em

pastejo. De qualquer maneira, as áreas deficitárias são mais abundantes que as tóxicas. O Se foi

descoberto pelo químico sueco Berzelius em 1818 e, no início, o interesse por este mineral focou

sua toxicidade. Vários relatos observados em animais que pastavam certo tipo de plantas que

causavam queda e deformações de cascos em cavalos e vacas foram relacionados à selenose. Em

humanos foi relatada queda de unhas e cabelo por causa de selenose crônica. Os limites entre níveis

essenciais e tóxicos do Se são bastante estreitos, mas a essencialidade deste elemento foi

reconhecida desde 1957, como fator preventivo da degeneração do fígado em ratos, a diátese

exudativa dos pintos e a distrofia muscular dos bezerros e cordeiros. Muitos solos, especialmente

os derivados de rochas ígneas (vulcânicas) e os solos ácidos são deficientes em Se, tendo

concentração de Se nas plantas abaixo de 0,1 ppm quantidade considerada crítica para que ocorram

casos clínicos de deficiência, que podem levar à chamada distrofia muscular enzoótica ou doença

do músculo branco.

O nível adequado de Se no alimento está por volta de 0,1 a 0,3 ppm (vacas leiteiras são mais

exigentes). A castanha-do-pará (Bertholletia excelsa) pode chegar a ter 29 ppm de Se. A

concentração de Se no plasma/soro varia em função da espécie, sendo um bom índice do status de

Se no organismo: em cavalos é de 26 g/mL, em gado de corte pode estar entre 19 a 48 g/mL, em

ovelhas o nível mínimo deve estar em 0,1 g/mL, sendo que níveis abaixo de 0,05 g/mL no sangue

são compatíveis com sinais de deficiência. A absorção de Se nos ruminantes é menor do que nos

monogástricos, devido à redução das formas biologicamente ativas no rúmen. A excreção de Se é

principalmente via fecal, seguido das vias urinária, biliar, salivar e pulmonar. No leite também

aparece Se.

Funções do selênio

Junto com a vitamina E, o Se tem função protetora antioxidante das membranas plasmáticas

contra a ação tóxica dos peróxidos lipídicos (peroxidação dos ácidos graxos insaturados ligados a

fosfolipídeos de membrana). O Se participa como componente da enzima glutation peroxidase

(GSH-Px), proteína que contém 4 resíduos de Se-cisteína, que está presente em grande quantidade

61

nos eritrócitos e é responsável pela destruição de peróxidos. O conteúdo de Se no organismo está

positivamente relacionado com a atividade da GSH-Px no sangue ao ponto de se considerar a

atividade desta enzima nas hemácias como um índice funcional do status de Se em longo prazo. A

atividade da GSH-Px no plasma é muito baixa (2% de Se em forma de GSH-Px) comparada com a

atividade nas hemácias (75% de Se em forma de GSH-Px). A vitamina E limita a peroxidação dos

ácidos graxos insaturados. O Se apresenta interação com esta vitamina em relação a seu efeito com

os aminoácidos sulfurados, via cistina-glutation, embora o mecanismo bioquímico não esteja

esclarecido. Em alguns casos, a vitamina E reduz a necessidade de Se, e vice-versa. O Se também

participa como cofator nas enzimas desidrogenase fórmica, glicina redutase e iodotironina 5´-

desiodase (que converte o hormônio T4 em T3 nas células). Funções adicionais do Se têm sido

descritas incluindo formação de uma selenoproteína do espermatozoide, incorporação a bases

purínicas e pirimidínicas, participação na síntese de prostaglandinas e no metabolismo de ácidos

graxos essenciais, proteção contra metais pesados (Cd, Hg, Ag) e, junto com a vitamina E,

participação da resposta imune.

Deficiência de selênio

A deficiência de Se/vitamina E causa acúmulo de peróxidos nas membranas celulares

causando necrose, com posterior fibrose e calcificação, principalmente nos músculos esquelético e

cardíaco. O consumo de ácidos graxos insaturados (de óleos vegetais) e a deficiência de vitamina

E podem precipitar o problema. Também, a armazenagem de cereais úmidos ou tratados com ácido

propiônico em silos causa destruição da vitamina E, produzindo silagem deficiente. No Brasil sabe-

se que existem tanto regiões pobres em Se, como regiões seleníferas (com excesso de Se), porém

falta adequada demarcação. Entretanto, a pesquisa disponível mostra que a maior parte do território

é pobre neste mineral.

Os animais mais afetados são as aves, as ovelhas e os ruminantes jovens em rápido

crescimento. A distrofia muscular enzoótica ou doença do músculo branco, definida como uma

doença degenerativa em bovinos e ovinos, devido à deficiência de Se/vitamina E, pode apresentar

uma forma pré-natal, em que bezerros e cordeiros nascem mortos ou têm morte neonatal repentina,

principalmente após esforços, e uma forma mais comum entre 3 a 6 semanas de idade em cordeiros

ou 1 a 4 meses em terneiros, que causa necrose seguida de fibrose da musculatura esquelética e

cardíaca. Às vezes pode acontecer morte súbita devido a lesões no músculo cardíaco (distrofia e

calcificação no miocárdio). De forma menos aguda, pode ocorrer queda da produção, diminuição

do crescimento e diarreia, fraqueza generalizada, degeneração muscular com claudicação e

62

decúbito. Também pode ser notado edema, principalmente no mesentério, pulmão e tecido

subcutâneo. Nesses casos, menos severos, o tratamento com Se/vitamina E costuma dar respostas

terapêuticas positivas.

O aumento na incidência de retenção placentária tem sido mencionado em vacas como efeito

da deficiência de Se, devido a que a suplementação com Se/vitamina E tem diminuído tal

incidência. Existem evidências que mostram que o Se e a vitamina E melhoram a

imunocompetência, demonstrado pelo aumento de produção de imunoglobulinas. Em vacas, a

deficiência de Se/vitamina E predispõe a sofrer de síndrome de fígado gorduroso, talvez devido ao

dano sobre as membranas dos hepatócitos causado pelos peróxidos. Na deficiência de Se, além de

uma diminuição da atividade da enzima GSH-Px nas hemácias (níveis críticos abaixo de 60 U/g

Hb em vacas), o perfil sanguíneo mostra aumento da atividade das enzimas indicadoras de dano

muscular, principalmente CK e AST. O Se pode ser suplementado no alimento (0,1 ppm) na forma

de sais inorgânicos (selenito e selenato de Na) ou de formas orgânicas (Se-metionina, Se-cisteína,

Se-levedura). Também pode ser administrado em injeção intramuscular (0,1 mg de Se/kg de peso

e 70 UI de vitamina E), sempre tendo cuidado com provocar uma intoxicação, pois uma dose de 1

mg/kg de peso (10 vezes a dosagem indicada) pode ser mortal.

Toxicidade

O Se pode chegar a ser um mineral muito tóxico. O intervalo entre o nível essencial e o nível

tóxico é estreito (0,2 e 5 ppm, respectivamente). Em regiões seleníferas ocorre intoxicação por Se,

conhecida como “doença alcalina” ou seleniose. Plantas do gênero Astragalus podem acumular Se

em quantidades entre 100 ppm até 9.000 ppm. Consideram-se níveis acima de 5 ppm como

causadores de sinais clínicos de selenose. A doença se caracteriza por perda ou alongamento dos

cascos, perda de pelo, cegueira, marcha cambaleante, anorexia, vômito, atrofia e cirrose hepática e

morte. O consumo alto de proteína pode diminuir os efeitos tóxicos de uma selenose graças à

formação de complexos Se-sulfitos que favorecem a excreção de Se. O arsênico também favorece

a excreção do Se via bile.

63

Molibdênio (Mo)

O Mo foi descoberto em 1782, mas o seu interesse biológico veio em 1938 quando se

descobriu que seu consumo em excesso provocava diarreia e enfraquecimento em gado. A

observação de que a doença respondia a tratamento com sulfato de Cu, pôs em evidência a estreita

relação do Mo com o Cu. Posteriormente, em 1953, foi determinada a essencialidade do Mo ao

comprovar que a enzima xantina oxidase (uma flavoproteína) requer Mo para atuar. Após, foram

descobertas mais enzimas dependente de Mo. O Mo se encontra em pequenas quantidades nos

tecidos animais: 1-4 ppm no fígado e 0,1 ppm no músculo. Apesar de ser essencial nos animais, a

sua importância em humanos é incerta, pois não é reconhecido um estado deficitário com sinais

clínicos.

O Mo interfere com a utilização do cobre. Estes dois minerais oferecem mutuamente

proteção contra intoxicações. O mecanismo está relacionado com a ação inibidora do Mo sobre a

síntese de ceruloplasmina no fígado, tornando o cobre não disponível, além de que altos teores de

Mo e também de sulfatos reduzem a solubilidade e, portanto, a absorção de cobre no intestino. Por

outro lado, aumentos de cobre na dieta reduzem a deposição de Mo no fígado, e aumentos de sulfato

incrementam a excreção de Mo na urina, diminuindo a sua deposição tecidual. A absorção média

de Mo no intestino é de 20% e as reservas nos tecidos são pequenas, sendo maiores nos ossos e no

fígado. A principal via de excreção do Mo é a urina e, em menor medida, na bile. O teor de Mo no

sangue está na faixa de 1 g/dL.

Funções do molibdênio

A ação bioquímica do Mo está ligada à ação de algumas enzimas, como xantina oxidase,

aldeído oxidase, sulfito oxidase e nitrato redutase. Estas enzimas estão envolvidas com o

metabolismo de purinas, pirimidinas, pteridinas e aldeídos, bem como na cadeia de transporte de

elétrons e na oxidação de sulfitos. A ação da enzima sulfito oxidase é essencial para metabolizar o

enxofre em sulfato e permitir a sua excreção. A deficiência desta enzima pode ser letal.

Deficiência de molibdênio

A deficiência de Mo é pouco provável em animais devido a que as necessidades do mineral

são muito pequenas (0,2 ppm). Praticamente não têm sido identificados sinais de deficiência de Mo

que não estejam relacionados com excesso de Cu. Contudo, tem sido relatada deficiência em ovinos

64

produzindo cálculos renais de xantina. Em aves, ocorre diminuição da eclodibilidade e distúrbios

da plumagem. Acredita-se que uma deficiência de Mo é conseguida com altos teores de minerais

interferentes, principalmente tungstênio (W), que é antagônico com Mo, além de Cu e S.

Toxicidade

O Mo foi inicialmente pesquisado como mineral tóxico. Os limites entre toxicidade e

necessidade para este mineral são bem estreitos, sendo ovinos e bovinos as espécies mais sensíveis

a altos teores de Mo, e equinos os mais resistentes. Pastagens com mais de 20 ppm de Mo podem

provocar sinais de intoxicação. Com suficiente Cu na dieta, aumenta a tolerância do organismo a

altos valores de Mo. Os níveis tóxicos também estão relacionados com o teor de cobre, sulfatos,

Zn, chumbo e tungstênio na dieta. Entre os sinais de intoxicação por Mo estão crescimento

retardado, perda de peso e inapetência. Em bovinos se relata diarreia, osteoporose, tendência a

fraturas, transtornos articulares, falha na fertilidade, e em machos falta de libido, lesões testiculares

e falha na espermatogênese. Animais monogástricos são muito mais resistentes à toxicidade por

Mo, de forma que sob as condições atuais de alimentação, apenas os ruminantes são afetados pelo

excesso de Mo, sempre em relação a uma depleção das reservas de cobre, produzindo diarreia,

anorexia, anemia e outros sinais associados à deficiência de cobre.

65

Cromo (Cr)

O Cr é um mineral traço essencial. Em 1957, Schwarz e Mertz identificaram o Cr como parte

essencial do Fator de Tolerância a Glicose (GTF), composto que potencializa o efeito da insulina

sobre a glicose. Na verdade, o GTF tem sido considerado como uma vitamina uma vez que contém,

além do Cr, ácido nicotínico, glicina, glutamato e cisteína, tendo maior função biológica que o Cr

sozinho. Este papel é comparável a que cumpre a vitamina B12 com relação ao Co.

A deficiência de Cr causa em animais e humanos aumento de glicose (por deficiência na

ação da insulina), diminuição do teor sérico de colesterol e aumento do LDL-colesterol. Pode haver

uma falha na utilização de glicose e de aminoácidos. Trabalhos em vacas leiteiras têm mostrado

que a suplementação de Cr melhora a resposta diante de uma cetose subclínica, diminuindo a

concentração de corpos cetônicos. Também tem sido usado na prevenção do estresse.

Não é considerado um mineral tóxico. Sendo um mineral que se absorve muito pouco (0,5-

3%) é utilizado como marcador de consumo voluntário em ruminantes, na forma de óxido crômico

(Cr2O3) em quantidade de até 3.000 ppm sem que sejam observados efeitos deletérios. Em

humanos, a exposição de Cr por contaminantes industriais pode causar dermatite, úlceras cutâneas,

e aumentar a incidência de carcinoma broncogênico.

66

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69

Vitaminas

A primeira doença reconhecidamente devido a deficiências nutricionais foi a cegueira

noturna, que no antigo Egito e na China ancestral era tratada com aplicações tópicas de fígado sobre

os olhos. No século 18, o médico James Lynn, da marinha britânica, demonstrou os efeitos

curativos de frutas e vegetais frescos sobre o escorbuto que afetava os marinheiros em longas

viagens. No século 19 foi descoberta a relação entre pelagra e dieta de milho. Esses três exemplos

plantaram as bases do conhecimento do que posteriormente foi chamado de vitaminas

(respectivamente, vitamina A, C e niacina). Em 1911, Casimir Funk, um jovem bioquímico polonês

do Lister Institute de Londres, isolou, da casca do arroz, uma substância cristalizada que possuía

uma função amina, e que se revelou capaz de prevenir e curar o “beribéri” (polineurite)

experimental em frangos, razão pela qual Funk a chamou de “vitamina”, para salientar que era uma

amina indispensável à vida. Tratava-se do que posteriormente foi identificado como tiamina.

Embora nem todas as vitaminas sejam aminas, o termo prevaleceu.

Não existe uma definição totalmente satisfatória das vitaminas. A definição de substâncias

orgânicas presentes em quantidades muito pequenas nos alimentos e essenciais para o metabolismo,

cuja deficiência provoca doenças, pode não ser específica, pois se pode aplicar a outros compostos.

As vitaminas são um grupo de compostos orgânicos que não se ajustam à classificação de

macronutrientes. Não são quimicamente relacionadas entre si, estando distribuídas nos reinos

vegetal e animal. Embora necessárias em pequeníssimas quantidades na alimentação, as vitaminas

são consideradas essenciais, ou seja, que o organismo não as sintetiza ou as sintetiza em baixas

quantidades, sendo necessário seu consumo na alimentação. Algumas vitaminas podem ser

sintetizadas pelo organismo, como é o caso da niacina (a partir de triptofano), ácido ascórbico (a

partir de glicose, exceto em primatas) e vitamina D (a partir de colesterol). Assim, estes compostos

em algumas espécies e condições fisiológicas podem não preencher, a rigor, a definição clássica de

vitamina.

As vitaminas são classificadas quanto à solubilidade, em vitaminas lipossolúveis e

hidrossolúveis. Onze vitaminas (tiamina, riboflavina, niacina, piridoxina, ácido pantotênico,

biotina, ácido fólico, cianocobalamina, colina, ácido ascórbico e carnitina) são classificadas como

hidrossolúveis, enquanto quatro vitaminas (A, D, K e E) são lipossolúveis. As vitaminas

hidrossolúveis constituem um grupo de compostos estrutural e funcionalmente independentes que

compartilham a característica de serem essenciais para o metabolismo animal, participando como

coenzimas. De maneira geral (salvo a cianocobalamina), não são armazenadas em quantidades

70

significativas no organismo, sendo o excesso rapidamente excretado via urinária, o que leva muitas

vezes a necessidade de um suprimento diário dessas vitaminas.

As vitaminas lipossolúveis são compostos constituídos de unidades de isopreno e

desempenham papéis essenciais no metabolismo ou na fisiologia dos animais. São encontradas na

fase lipídica nos alimentos e sua absorção intestinal está regulada pelos mesmos mecanismos de

absorção de lipídeos. Exceto pela vitamina K, as vitaminas lipossolúveis podem ser armazenadas,

principalmente no fígado. A vitamina A fornece o pigmento fotossensível dos olhos dos vertebrados

e é um regulador de expressão gênica durante o crescimento das células epiteliais. A vitamina D é

precursora de um hormônio que regula o metabolismo do Ca. A vitamina E funciona na proteção

dos lipídeos de membrana contra o dano oxidativo, e a vitamina K é essencial no processo de

coagulação sanguínea. Estas vitaminas podem se acumular e, ocasionalmente em casos de excesso,

podem causar transtornos. Na Tabela 2 constam as principais vitaminas, suas funções essenciais e

fontes alimentares.

71

Tabela 2. Principais vitaminas, suas funções e fontes e nível plasmático de deficiência

Vitamina Função Fontes Nível plasmático

de deficiência

Vitamina A Visão, transcrição gênica,

manutenção dos epitélios,

desenvolvimento ósseo

Plantas contendo

carotenos, fígado < 20 µg/dL

Vitamina D Manutenção da calcemia (absorção

de Ca)

Peixes, ovos, fígado,

carne < 25 ng/mL

Vitamina E Antioxidante Óleos vegetais, sementes,

folhas verdes, castanhas < 0,5 µg/mL

Vitamina K Coagulação sanguínea, formação de

osteocalcina

Plantas verdes, gema do

ovo, leite < 0,5 ng/mL

Tiamina Metabolismo de glicídeos,

decarboxilação do piruvato,

transmissão nervosa

Sementes, castanhas,

carne, leveduras < 2 µg/dL

Riboflavina Cofator enzimático de reações de

óxido-redução (coenzimas FAD,

FMN)

Leite, carne, ovos,

castanhas, sementes < 0,1 µg/dL

Niacina Cofator enzimático de reações de

óxido-redução (coenzimas NAD,

NADP), poliadenilação

Alimentos ricos em

triptofano, leite, carne < 0,5 µg/mL

Piridoxina Transaminação, decarboxilação,

síntese de heme

Leveduras, carne, germe

de trigo < 0,5 µg/dL (PLP)

Ácido

pantotênico

Transporte e transferência de

grupos acila (formação de

coenzima A)

Leveduras, plantas, grãos,

ovos, carne < 100 µg/dL

Biotina Carboxilação, desaminação Leveduras, gema de ovo,

carne, grãos < 100 ng/dL

Folacina Transferência de unidades de

carbono, síntese de purinas e

pirimidinas, hematopoiese

Plantas verdes, carne,

ovos, queijo < 0,3 ng/mL

Cianocobalamina Coenzima de enzimas mutases,

hematopoiese, transferência de

grupos metila

Leite, peixe, ovos, carne

< 150 pg/mL

Colina Transporte de lipídeos, fator

lipotrópico, neurotransmissão,

síntese de metionina e creatina

Cereais, carne,

leguminosas, gema de

ovo

< 1 µg/mL

Ácido ascórbico Antioxidante, síntese de colágeno,

proteção de membranas

Frutas cítricas, vegetais < 0,5 mg/dL

Carnitina Transporte de ácidos graxos na

célula (intramitocondrial)

Carne, fígado < 30 µmol/L

72

Vitamina A

Doenças relacionadas à deficiência de vitamina A e seus benefícios são descritas ao longo

da história. Os egípcios observaram que problemas de cegueira noturna e xeroftalmia

(ressecamento da conjuntiva), típicos sinais da deficiência de vitamina A, eram curados com a

ingestão de fígado de animais. Hopkins e Stepp, no início do século 20, observaram que um fator

estimulante do crescimento podia ser extraído do leite, o que finalmente levou à identificação da

vitamina A. A presença desse fator promotor de crescimento foi descrita também na gema do ovo,

manteiga e óleo de fígado. McCollum e Davis, em 1915, descreveram um “fator A” de gordura

animal, que tinha efeito estimulante do crescimento. Mais tarde, Drummond propôs que o fator A

deveria ser chamado de vitamina A. Moore, em 1929, observou que os carotenos de origem vegetal,

podiam ser convertidos em vitamina A no organismo animal.

A estrutura química da vitamina A (retinoides e carotenoides) foi determinada em meados

do século 20, e em seguida estudos sobre sua função biológica e a síntese comercial dessa vitamina

foram rapidamente desenvolvidos. O termo retinoide refere-se à classe de compostos que inclui

retinol e seus derivados químicos, com quatro unidades de isoprenoides. A vitamina A engloba um

grupo de carboidratos insaturados, incluindo retinol e compostos relacionados, bem como alguns

carotenoides. A atividade da vitamina A em tecidos animais é encontrada predominantemente sob

a forma de retinol, retinal e, em menor quantidade, ácido retinoico (Figura 1).

Figura 1. Moléculas do retinol, retinal e ácido retinoico

73

O retinol é um álcool primário que contém um anel β-ionona com cadeia lateral insaturada,

sendo encontrado em tecidos animais como éster retinila com ácidos graxos de cadeia longa. O

retinal é o aldeído derivado da oxidação do retinol. O retinal e o retinol podem ser facilmente

interconvertidos. O ácido retinoico é o ácido derivado da oxidação do retinal. Este ácido não pode

ser reduzido no organismo e, assim, não pode originar retinal ou retinol.

A maior concentração de vitamina A nos animais é no fígado, principal órgão armazenador

(90% do total), no qual o retinol e seus ésteres são as principais formas presentes. A vitamina A

como tal não está presente nas plantas, porém elas contêm seus precursores, os carotenoides, os

quais podem ser convertidos em vitamina mediante reação enzimática no intestino dos animais. Os

carotenoides contribuem significativamente para a atividade da vitamina A em alimentos tanto de

origem animal como vegetal. Frutas, plantas e vegetais amarelos e verde-escuros são boas fontes

dietéticas de carotenos. Dos 600 carotenoides conhecidos, cerca de 50 apresentam alguma atividade

de pró-vitamina A. Alimentos de origem vegetal contêm β-caroteno, que pode ser clivado

oxidativamente no intestino em duas moléculas de retinal. Entre todos os carotenoides, o β-caroteno

é o que apresenta maior atividade pró-vitamínica A (Figura 2).

Figura 2. Molécula do β-caroteno

Para ocorrer a conversão metabólica de caroteno para vitamina A, o β-caroteno deve ter o

anel β-ionona livre. A conversão ocorre por ação de duas enzimas: a primeira (β-caroteno-15, 15´-

dioxinase) cliva o β-caroteno produzindo duas moléculas de retinal. A segunda enzima

(retinaldeído redutase) converte o retinal em retinol. Gatos não possuem a enzima clivante e,

portanto, não podem usar carotenos como fonte de vitamina A. O potencial de pró-vitamina A em

plantas é mais bem preservado quando pastagens são conservadas sob a forma de feno, porém há

declínio quando a armazenagem é realizada na ausência de oxigênio. Grãos, com algumas exceções

(por exemplo, milho amarelo), são menores fontes de pró-vitamina A. Dentre os grãos de

leguminosas, o grão-de-bico tem a melhor fonte carotenoide. A fonte mais rica de carotenos é o

74

óleo de palma vermelha. Fontes ricas de vitamina A estão nos óleos de peixe. Embora haja a

possibilidade de serem produzidas duas moléculas de vitamina A, por cada molécula de β-caroteno,

a ineficiência desse processo contribui para que o β-caroteno exiba apenas 50% de atividade da

vitamina A.

Na maioria dos animais, a absorção da vitamina A varia de 70 a 90%, mas a eficiência na

absorção de carotenoides adicionados à dieta é de 40 a 60%, dependendo do carotenoide. As

espécies que absorvem carotenos (bovinos, equinos, aves, humanos) podem apresentar tecido

adiposo amarelo, uma vez que os carotenos se armazenam no fígado e na gordura. As espécies que

clivam totalmente os carotenos no intestino (ovinos, caprinos, suínos, caninos) possuem gordura

branca. As vacas da raça Holandesa têm mais eficiência na clivagem de carotenos no intestino,

tendo gordura e leite de cor branca, enquanto as raças Jersey e Guernsey absorvem mais carotenos

e possuem leite e tecido adiposo amarelados.

Nos animais, a vitamina A está presente, em grande quantidade, como ésteres lipídicos no

fígado e no rim, mas também é encontrada na gordura do leite e na gema de ovo. No plasma, a

vitamina A é transportada desde seus estoques no fígado até os tecidos na sua forma álcool (retinol)

ligada a uma proteína ligante de retinol (RBP). Quando há deficiência de vitamina A, ocorre

bloqueio da secreção de RBP hepática e os níveis plasmáticos desta proteína diminuem. Os

requerimentos e vitamina A na dieta estão em torno de 3.000 UI/kg (matéria seca). Caprinos e

felinos têm requerimentos maiores (cerca de 5.000 U/kg). Os requerimentos aumentam em animais

expostos a condições estressantes e a doenças.

Funções da vitamina A

A vitamina A é essencial para a visão, reprodução, crescimento e a manutenção dos tecidos

epiteliais. O ácido retinoico, derivado da oxidação do retinol da dieta, é intermediário da maioria

das ações dos retinoides, exceto para a visão, que depende do retinal (derivado aldeídico do retinol).

A deficiência de ácido retinoico causa defeitos na reprodução e na diferenciação dos epitélios. As

ações do ácido retinoico sobre a regulação da transcrição de muitos genes têm levado a considerar

este composto como um hormônio. A função fisiológica da vitamina A sobre a visão é a mais

entendida do ponto de vista bioquímico.

No ciclo visual ou ciclo do retinol (Figura 3), a vitamina A é componente dos pigmentos das

células cones e bastonetes da retina. A rodopsina, o pigmento visual dos bastonetes na retina, é

originada do 11-cis-retinal ligado especificamente à proteína opsina. Quando a rodopsina é exposta

à luz, ocorre uma série de isomerizações fotoquímicas, as quais resultam no desbotamento do

75

pigmento visual e a liberação de trans-retinal e opsina. A energia deste processo origina um impulso

nervoso, que é transmitido pelo nervo óptico para o encéfalo, provocando o efeito da visão. A

deficiência de vitamina A causa cegueira noturna (nictalopia), típico sinal clínico em animais. A

regeneração da rodopsina necessita da isomerização do trans-retinal, formando novamente o 11-

cis-retinal. O transretinal, após ser liberado da rodopsina, é isomerizado a 11-cis-retinal, que se

combina espontaneamente com a opsina, para formar a rodopsina, completando o ciclo.

A vitamina A é necessária para a manutenção dos epitélios, de forma que sua deficiência

causa falhas de queratinização e de funcionalidade principalmente nas células epiteliais dos tratos

gastrointestinal, respiratório e urogenital, além do olho. A possível relação da vitamina A com a

manutenção dos epitélios pode estar no papel desta vitamina na formação de glicosamina, composto

que faz parte dos mucopolissacarídeos, componentes do muco epitelial.

A vitamina A também tem um papel no desenvolvimento normal dos ossos, através da

atividade exercida sobre os osteoclastos do epitélio da cartilagem. Na deficiência de vitamina A, a

atividade osteoclástica é reduzida e podendo causar crescimento desorganizado dos ossos e

inflamação das articulações. Na reprodução, a vitamina A tem importante função na manutenção

do epitélio germinativo e nos túbulos seminíferos nos machos e na sobrevivência embrionária. Em

algumas espécies, a deficiência de vitamina A pode causar retenção de placenta. Nas vacas, a

vitamina A e os carotenos têm importante função na proteção contra numerosas infecções,

incluindo mastite.

Figura 3. Ciclo da visão

76

Deficiência de vitamina A

A deficiência de vitamina A leva ao menos a quatro tipos de lesões diferentes: diminuição

de visão por falha na formação de rodopsina, defeitos no crescimento ósseo, falhas na reprodução

(espermatogênese diminuída e morte embrionária ou fetal) e defeitos no crescimento e

diferenciação dos tecidos epiteliais (resulta em queratinização). A deficiência prolongada de

vitamina A leva à diminuição da visão, principalmente à noite (nictalopia) por bloqueio do ciclo do

retinol e ausência de rodopsina. A deficiência grave leva a xeroftalmia, o ressecamento patológico

da conjuntiva e da córnea. Se não for tratada, a xeroftalmia resulta em ulceração da córnea e, por

fim, cegueira devido à formação de tecido de cicatrização opaco, quadro que pode ser observado

em bovinos e suínos, nos quais a carência da vitamina A pode causar também queratinização

epitelial.

Na derme, a falta de vitamina A resulta em uma sobrecamada escamosa, que leva à perda da

funcionalidade da célula epitelial. Nos pulmões, a deficiência de vitamina A pode causar

diminuição da secreção mucosa, o que facilita o estabelecimento de infecções. No intestino, a

queratinização induz à perda de função prematura dos enterócitos e síndrome de má-absorção,

causando diarreia. Além disso, a carência de vitamina A resulta em uma diminuição da taxa de

crescimento e do desenvolvimento ósseo em animais jovens. Quantidade adequada de vitamina A

na dieta garante a normal resistência a estresse e infecções. Entretanto, um consumo além das

necessidades desta vitamina não garante uma maior resistência na prevenção de infecções. Outros

sinais clínicos observados na deficiência de vitamina A incluem perda de apetite e de peso, descarga

nasal, conjuntivite, lacrimejamento, fertilidade reduzida, aborto e aparência emaciada, entre outros.

A deficiência de vitamina A pode resultar indiretamente de deficiência de Zn, uma vez que

este mineral é necessário para a síntese da proteína transportadora de retinol (RBP). Uma

diminuição de RBP tem como consequência uma deficiência de vitamina A.

Toxicidade

A vitamina A pode ser problema tanto em sua deficiência como em seu excesso. Os

ruminantes são mais tolerantes a altas doses de vitamina A devido à degradação desta vitamina no

rúmen. Os principais sinais da hipervitaminose A incluem malformações ósseas, fraturas

espontâneas, hemorragia interna, perda de apetite e de peso, engrossamento da pele, incremento do

tempo de coagulação, anemia e conjuntivite. A toxicidade da vitamina A pode ser classificada sob

77

três categorias: aguda, crônica e teratogênica. Quando uma única dose de vitamina A (maior do que

100 mg) é injetada em animais de 20-50 kg de peso corporal, aparecem sinais como náusea, vômito,

aumento de pressão do fluido espinhal e fragilidade muscular. A toxicidade crônica pode ser

induzida por doses 10 vezes acima do recomendado. Essa dose pode levar à alopecia, ataxia, dores

ósseas e musculares e prurido.

Embora gatos tenham alta tolerância a doses excessivas de vitamina A, ocorre

hipervitaminose A em animais que possuam dieta baseada em fígado. Gatos afetados apresentam

deformação no esqueleto, particularmente exostose de vértebras cervicais. A vitamina A é também

um poderoso teratogênico. Uma dose excessiva única (100 mg), durante a gestação, para animais

que pesem entre 20 e 50 kg, pode resultar em malformação fetal. No caso dos humanos, a

hipervitaminose A está relacionada ao abuso das suplementações e às automedicações. Ao contrário

dos retinoides, os carotenoides geralmente não são tóxicos, e muitos animais os ingerem sem efeitos

deletérios. A eficiência da conversão de caroteno em vitamina A diminui quando há aumento da

vitamina, o que se considera um mecanismo de controle homeostático que protege de um excesso

de caroteno.

78

Vitamina D

Desde a antiguidade, o raquitismo era conhecido como uma doença que causava deformação

dos ossos e que estava relacionada com o fato de não receber sol. Sniadecki, em 1822, foi o primeiro

a propor que o raquitismo ocorria pela falta de exposição à luz solar. A maioria dos cientistas à

época não acreditavam que uma doença podia ser curada apenas pela exposição ao sol. Em 1921,

Sir Edward Mellanby reportou a indução de raquitismo em cães através da manipulação da dieta (a

base de farinha de aveia e – sem que ele o planejasse – em ausência de luz solar). Ele descobriu

que a doença podia ser revertida com óleo de fígado de bacalhau, pelo qual erroneamente pensou

se tratar de deficiência de vitamina A. McCollum, em 1922, reportou que o fator curativo do óleo

de fígado de bacalhau não era a vitamina A, mas sim outra substância lipossolúvel, que

posteriormente foi identificada como vitamina D. A observação de que a irradiação de alimentos

(leite, manteiga) resultava na produção de um fator antirraquitismo, levou à identificação da

vitamina D2 a partir da pró-vitamina ergosterol e da vitamina D3 a partir da pró-vitamina 7-

deidrocolesterol. Em 1932, a estrutura da vitamina D2 foi determinada simultaneamente por

Windaus, na Alemanha (quem a chamou vitamina D2) e por Askew, na Inglaterra (quem a chamou

ergocalciferol). Em 1936, Windaus também determinou a estrutura da vitamina D3.

A atividade da vitamina D está associada a vários esteroides, incluindo o colecalciferol, de

fontes animais, e o ergocalciferol, uma forma exclusivamente sintética de vitamina D, a qual é

formada pela irradiação do fitoesterol (esterol vegetal), com luz ultravioleta, comumente

adicionada ao leite e à manteiga como suplemento alimentar para humanos. O ergocalciferol e o

colecalciferol são fontes de vitamina D pré-formada e diferem pela presença de uma ligação dupla

adicional e de um grupo metila no esterol vegetal (Figura 4).

Na década de 1960 começou um novo patamar no estudo da vitamina D, quando se

reconheceu que ela é o precursor do hormônio esteroide 1,25-di-hidroxi-colecalciferol (1,25-

DHCC). De Luca, em 1966, demonstrou que o colecalciferol é convertido em 25-hidroxi-

colecalciferol (25-HCC) no fígado, e no início dos anos 1970 se determinou que o 1,25-DHCC era

produzido no rim. A partir daí, a vitamina D e seus derivados adquiriram a categoria de hormônios.

O colecalciferol é formado na pele mediante a exposição à luz solar. Esse processo é constituído

de várias etapas, as quais envolvem a modificação fotoquímica do 7-dehidrocolesterol seguida por

isomerização não enzimática. Por esse motivo, na síntese in vivo, as exigências de vitamina D da

dieta dependem da exposição à luz solar. Apesar de a maioria das espécies animais possuírem o 7-

dehidrocolesterol, de forma abundante na pele, gatos, cães e outros carnívoros contêm apenas

79

pequenas quantidades deste composto, o que não permite uma adequada síntese de vitamina D,

fazendo com que dependam quase que exclusivamente da dieta.

Figura 4. Estrutura do ergocalciferol e colecalciferol. Setas indicam a

presença de um grupo metila no esterol vegetal e a sua ausência no

esterol animal

O ergocalciferol e o colecalciferol não são biologicamente ativos, mas são convertidos in

vivo na forma ativa da vitamina D por reações sequenciais de hidroxilação (Figura 5). A primeira

reação ocorre na posição 25 e é catalisada por uma hidroxilase específica, no fígado. O produto da

reação, 25-HCC, é a forma predominante da vitamina D no plasma e a principal forma de

armazenamento da vitamina. Essa forma é posteriormente hidroxilada na posição 1 pela 25-

hidroxicolecalciferol-1α-hidroxilase específica, encontrada principalmente no rim, resultando na

formação de 1,25-DHCC (vitamina D3 ativa ou calcitriol). Essa hidroxilase, assim como a 25-

hidroxilase, no fígado utiliza citrocomo 450, oxigênio molecular e NADPH. O 1,25-DHCC é o

mais potente metabólito da vitamina D e está envolvida na regulação da absorção e do metabolismo

do Ca. Sua formação é regulada pelos níveis plasmáticos de P e Ca. Nos tecidos, o 1,25-DHCC

pode ser catabolizado mediante a enzima 24-hidroxilase a ácido calcitroico, composto inativo

biologicamente que é excretado pela bile.

A atividade da enzima 25-HCC-1α-hidroxilase aumenta diretamente em função de baixo P

plasmático, ou indiretamente por diminuição do Ca no plasma, que dispara a liberação do hormônio

paratireoidiano (PTH), o qual induz a síntese da enzima no rim. Assim, a hipocalcemia causada por

deficiência ou balanço negativo de Ca na dieta resulta em aumento da secreção de PTH, o que

posteriormente deriva em níveis elevados de 1,25-DHCC no plasma pela ação estimuladora do PTH

sobre a síntese da enzima 1α-hidroxilase renal. A atividade de 1α-hidroxilase é diminuída por

80

excesso de P e de 1,25-DHCC. Outra enzima do rim pode hidroxilar o 25-HCC na posição 24,

formando o composto 24, 25-di-hidroxi-colecalciferol (24,25-DHCC), composto inativo, quando a

atividade da 1α-hidroxilase está reduzida, isto é, quando há níveis plasmáticos normais de Ca e de

P.

Figura 5. Reações da biossíntese da vitamina D3

A vitamina D é suscetível à degradação pela luz. Nos alimentos, essa degradação pode

ocorrer durante o armazenamento. De modo geral, no entanto, a estabilidade da vitamina D em

alimentos, em especial em condições anaeróbicas, não é uma preocupação importante. A vitamina

D é encontrada em maiores quantidades em peixes, particularmente, de água salgada, como salmão,

sardinhas e no óleo de fígado de peixe. No plasma, a vitamina D é transportada por uma proteína

hepática específica, denominada proteína ligante de vitamina D (DBP) ou transcalciferina. A

maioria dos animais, salvo os carnívoros, não tem requerimento de vitamina D desde que tenham

disponível suficiente luz solar. Os requerimentos na dieta estão entre 200-400 UI/kg (base seca).

81

Funções da vitamina D

Inicialmente, a vitamina D foi identificada como um cofator para reações que serviam para

manter os níveis de Ca e P. Nas décadas de 1960 e 1970 uma série de descobertas levou a ampliar

o conhecimento do metabolismo da vitamina D. A vitamina D pertence a um grupo de esteroides

que apresentam funções semelhantes às dos hormônios e sua ação precípua é na estimulação da

absorção intestinal de Ca e de P. A vitamina D regula a expressão gênica interagindo com receptores

nucleares específicos das células epiteliais do intestino, que induzem a síntese de transportadores

de Ca e P.

O 1,25-DHCC entra na célula intestinal e liga-se a um receptor citosólico. O complexo 1,25-

DHCC-receptor move-se para o núcleo, onde interage seletivamente com o DNA celular

estimulando a síntese de calbindina, proteína ligadora de Ca específica, que atua estimulando a

absorção intestinal de Ca. O 1,25-DHCC também estimula a produção de ATPases dependentes de

Ca e Na, que facilitam o movimento vetorial de Ca para fora da célula intestinal e para dentro da

circulação. Além disso, o 1,25-DHCC é indiretamente requerido para a mineralização óssea durante

o crescimento do esqueleto. Receptores de vitamina D nos ossos estão localizados nos osteoblastos,

que controlam a síntese e secreção de proteínas específicas nos osteoblastos como osteocalcina,

osteopontina, colágeno e fosfatase alcalina. Sobre os ossos, os efeitos da vitamina D são similares

ao PTH, mobilizando Ca e P da matriz óssea e da fração mineral através de um efeito osteolítico.

Aparentemente, o hormônio requer a presença do PTH para atuar no osso (efeito permissivo). Como

sua ação é bloqueada pela actinomicina D, acredita-se que a transcrição para formar mRNA e

sintetizar proteína é um requerimento para poder causar seu efeito. Sobre o rim, o 1,25-DHCC

diminui a excreção renal de Ca e P, poupando esses minerais no organismo.

Os receptores de vitamina D são encontrados em um grande número de células, desde células

do músculo esquelético até células importantes para a imunidade e funções fagocíticas, como os

macrófagos. No raquitismo dependente de vitamina D, doença genética causada pela alteração de

um gene autossômico recessivo, observada em suínos e em humanos, ocorre falha na síntese da

enzima 1α-hidroxilase, não podendo sintetizar 1,25-DHCC, embora o organismo tenha as

moléculas precursoras. As recentes pesquisas sobre receptores da vitamina D em diferentes órgãos

revelam que os metabólitos desta vitamina podem estar exercendo outras funções, além das

reguladoras sobre o metabolismo do Ca e do P. Existem, por exemplo, evidências de regulação de

crescimento e diferenciação de vários tipos de células, bem como de regulação da hematopoiese e

dos sistemas imunes. Em humanos tem sido relatado que a deficiência de vitamina D pode

promover câncer de próstata por mecanismos não esclarecidos.

82

Deficiência de vitamina D

A deficiência de vitamina D causa a desmineralização dos ossos (diminui concentração de

Ca e de P na matriz orgânica da cartilagem e nos ossos), resultando em raquitismo nos animais

jovens e em osteomalacia nos adultos. O raquitismo caracteriza-se pela formação contínua de

matriz de colágeno nos ossos, mas com mineralização incompleta, resultando em ossos flexíveis e

maleáveis. Os ossos se apresentam frágeis, com possibilidades de fraturas espontâneas, além de

terem seu crescimento alterado, principalmente observável nos ossos longos como o fêmur, tíbia,

úmero e costelas. Os ossos longos das extremidades tendem a se arquearem, ocasionando defeitos

de aprumo (postura) desses animais e inflamação das articulações, devido à fragilidade desses

ossos. Por ser de ocorrência na fase do crescimento, tais defeitos de aprumo são praticamente

insanáveis na vida adulta. Na osteomalácia, existe desmineralização de ossos preexistentes, porém

com matriz orgânica normal (diferente da osteoporose em que está diminuída tanto a mineralização

quanto a matriz proteica dos ossos). Quando a massa óssea reduz, perde-se o suporte mecânico e a

integridade do esqueleto, aumentando a suscetibilidade a fraturas. Outros sinais de raquitismo

envolvem perda de peso, inibição do crescimento, rigidez na marcha, dispneia, irritabilidade,

fraqueza e diminuição do apetite. Em fêmeas gestantes, a osteomalacia pode produzir

malformações congênitas em recém-nascidos e lesões ósseas na mãe.

Em vacas leiteiras, a deficiência de vitamina D pode causar diminuição da produção de leite

e inibição do estro. Nestes animais, a idade é um fator predisponente para sofrer febre do leite,

transtorno em que ocorre uma hipocalcemia em função da alta produção de leite, que pode estar

sendo induzido tanto por uma síntese diminuída como por uma baixa resposta dos órgãos alvo ao

1,25-DHCC (baixa síntese de receptores em ossos e rim).

O raquitismo renal (osteodistrofia renal) resulta de insuficiência renal crônica e, portanto, da

diminuição na capacidade de produzir a forma ativa da vitamina D. A administração de 1,25-DHCC

é uma terapia de reposição eficiente. No hipoparatireoidismo a ausência do PTH causa

hipocalcemia e hiperfosfatemia. Esses pacientes podem ser tratados com qualquer forma de

vitamina D, juntamente com o PTH. Vitamina D deve ser suplementada a animais em crescimento

ou em produção que recebem pouca luz solar em dias nublados ou por manejo em confinamento.

Em vacas leiteiras, devido à toxicidade da vitamina D3 em gestantes, não é recomendável usar

vitamina D3 para prevenir febre do leite em injeções no pré-parto. Nesses casos, é preferível usa

vitamina D2.

83

Toxicidade

A vitamina D é a mais tóxica das vitaminas. Como composto lipossolúvel, a vitamina D pode

ser armazenada no organismo, sendo metabolizada lentamente. A maioria dos animais requer no

máximo 5 μg de vitamina D por 1.000 Kcal da dieta. Quando a ingestão excede 5 a 10 vezes essa

quantia, há risco de toxicidade. A hipervitaminose D se caracteriza por hipercalcemia e calcificação

de tecidos moles, particularmente articulações, membranas sinoviais, pulmões, rins, artérias, córnea

e miocárdio. A hipervitaminose D pode causar calcificação ectópica, como consequência do

aumento da desmineralização óssea. Os ossos tornam-se frágeis e suscetíveis de fraturas. São

observadas hipercalcemia e hipercalcinúria, com concentrações normais ou diminuídas de P. Os

efeitos da hipervitaminose D são devidos ao 25-HCC, pois o 1,25-DHC está regulado de forma

rigorosa, a menos que seja diretamente administrado no organismo via parenteral. Doses muito

altas de vitamina D (100 vezes o requerimento) podem resultar em balanço negativo de Ca, porque

a ressorção óssea é acelerada, além de sinais como perda de apetite, náuseas, sede e estupor.

Apesar de que os vegetais não contêm vitamina D2, algumas plantas (Solanum malacoxylon

[espichadeira], Cestrum diurnum [dama-da-noite] e Trisetum flavescens [aveia amarela]) contêm

compostos com atividade de vitamina D (um glicosídeo hidrossolúvel de 1,25-DHCC) e o seu

consumo por animais herbívoros pode levar a toxicidade, causando calcinose, manifestada por

deposição de Ca nos tecidos moles, que em casos severos pode levar a insuficiência cardíaca e

pulmonar agudas. A toxicidade da vitamina D3 é 10 a 20 vezes mais tóxica que a vitamina D2.

84

Vitamina E

Em 1922, Herbert Evans e Kathryn Bishop observaram que ratos desenvolviam problemas

reprodutivos quando alimentados com dieta contendo gordura rançosa, a menos que fossem

suplementados com alface, alfafa ou gérmen de trigo. Mais tarde, foi descoberto que óleo de gérmen

de trigo continha um princípio ativo que parecia ser responsável por melhorar o desempenho

reprodutivo. O composto foi designado como vitamina E por Sure (1924) e Evans (1925), e mais

tarde foi batizado como α-tocoferol, do grego tokos que significa nascimento. Ao longo da década

de 1920, a vitamina E foi reconhecida apenas como um fator que era necessário para a reprodução

dos ratos, mas em 1931, Pappenheimer e Goettsch observaram que a vitamina E também era

requerida para evitar degeneração muscular em coelhos e cobaias e encefalomalacia em frangos.

Posteriormente, outros sinais foram identificados na deficiência de vitamina E, incluindo diátese

exudativa em frangos, e necrose hepática e anemia hemolítica em outros animais. Com a elucidação

da estrutura do α-tocoferol por Fernholz, em 1938, estudos demonstraram que a deficiência de

vitamina E podia resultar em falha embrionária. Em 1957, Schwartz descobriu que levedura de

cerveja (que não contém vitamina E) era efetiva, assim como a vitamina E, em prevenir necrose

hepática. Após este descobrimento, se encontrou que o Se era o ingrediente ativo da levedura de

cerveja nesta função e para prevenir a diátese exudativa em frangos e a degeneração muscular em

bezerros.

Os tocoferóis e os tocotrienóis, que são os principais compostos com atividade de vitamina

E nos alimentos, são derivados do composto original tocol, que apresenta um ou mais grupos metila

nas posições 5,7 ou 8 da estrutura do anel cromano (Figura 6). As formas α, β, γ e δ de tocoferol e

tocotrienol diferem conforme o número e a posição dos grupos metila e, portanto, diferem

significativamente quanto à atividade de vitamina E. O α-tocoferol apresenta a maior atividade de

vitamina E tendo função antioxidante. Os três carbonos assimétricos (2´, 4´ e 8´) da molécula de

tocoferol e a configuração estereoquímica dessas posições na vitamina E influenciam na atividade

vitamínica do composto. Os tocoferóis e os tocotrienóis são muito apolares, existindo

principalmente na fase lipídica dos alimentos. Todos os tocoferóis e tocotrienóis, quando não

esterificados, têm a capacidade de agir como antioxidantes. Eles desativam radicais livres, doando

um H+ fenólico e um elétron. Os tocoferóis são constituintes naturais de todas as membranas

biológicas. Acredita-se que eles contribuam para a estabilidade da membrana devido a sua atividade

antioxidante. Os tocoferóis e os tocotrienóis de ocorrência natural também contribuem para a

estabilidade de óleos vegetais altamente insaturados, por meio de sua ação antioxidante. Os

compostos vitamínicos E apresentam estabilidade razoável na ausência de oxigênio e lipídeos

85

oxidantes. Tratamentos anaeróbicos no processamento de alimentos, como os enlatados

autoclavados, exercem pouco efeito sobre a atividade de vitamina E. Em contrapartida, a taxa de

degradação da vitamina E aumenta na presença de oxigênio molecular, podendo ser particularmente

rápida quando radicais livres também estão presentes.

Figura 6. Estruturas da vitamina E: tocoferol, tocotrienol e tocol

A vitamina E se armazena no organismo em todos os tecidos, mas os maiores depósitos são

fígado, tecido adiposo e músculo. Os requerimentos de vitamina E na dieta das diferentes espécies

estão entre 15 a 60 UI/kg (base seca) com valores que podem atingir 80 UI/kg em animais em

crescimento. Esses requerimentos podem aumentar em situações de estresse, exercício, infecções e

trauma. Os requerimentos de vitamina E e Se são mutuamente substituíveis. A vitamina E reduz as

necessidades de Se de duas maneiras: prevenindo perdas corporais de Se e prevenindo a

peroxidação dos lipídeos de membranas poupando glutation peroxidase (GPx), que contém Se. Por

sua vez, o Se pode reduzir as necessidades de vitamina E de três formas: preservando a integridade

do pâncreas para a normal digestão das gorduras e, portanto, da absorção de vitamina E, reduzindo

a quantidade de vitamina E requerida para manter a integridade dos lipídeos de membrana via GPx,

e facilitando a retenção de vitamina E no plasma. A vitamina E está amplamente distribuída na

86

natureza, mas as fontes mais ricas são óleos vegetais, óleos de cereais particularmente no gérmen,

ovos e fígado.

Funções da vitamina E

Os tocoferóis são os únicos, dentre as vitaminas, que agem primariamente como

antioxidantes, ou seja, eles não servem como cofatores e não estão envolvidos diretamente como

fatores específicos na regulação celular. Primariamente, essa vitamina protege os ácidos graxos

insaturados da camada fosfolipídica da membrana celular. A fração quinona dos tocoferóis é capaz

de desativar radicais livres, como os radicais de hidrogênio (H·), radicais superóxido (O2·), radicais

hidroxila (OH·), peróxido de H (H2O2) e outros radicais derivados de lipídeos. As membranas

celulares contêm vitamina E na concentração de 1 mg a cada 5-10 g de lipídeos de membrana, uma

concentração suficiente para retardar a oxidação dessas membranas. A vitamina E atua como um

agente eliminador dos radicais livres à custa da sua depleção. Quanto mais gordura insaturada

contiver a dieta, mais vitamina E vai ser utilizada, podendo precipitar uma deficiência. Os

tocoferóis, antes de serem absorvidos, integram micelas no intestino. Depois da absorção, a

vitamina E é transferida para a circulação linfática associada aos quilomícrons, similarmente ao

que ocorre com outras vitaminas lipossolúveis. A vitamina E penetra na célula através de receptores

de membrana para LDL. Uma vez na célula, a vitamina é incorporada à membrana lipídica. Em

torno de 40% da vitamina E é encontrada nas membranas nucleares e 60% é dividida entre as

membranas lisossomais, mitocondriais e outras.

A vitamina E, como composto antioxidante, está associada com o aumento da resposta

imune, por manter a integridade estrutural e funcional das células do sistema imune e estimular a

síntese de anticorpos (IgG). O tocoferol também participa na manutenção da estabilidade das

hemácias, o melhoramento da qualidade da carne e da cicatrização e tem um papel decisivo na

resistência a infecções virais. Macrófagos e neutrófilos têm atividade fagocítica diminuída em

animais com deficiência de vitamina E. Vários estudos relacionam a vitamina E ao Se, e esta

associação se mostrou benéfica. Trabalhos mostram que o uso concomitante destes compostos

diminuiu a incidência de retenção de membranas fetais em vacas leiteiras, assim como a ocorrência

de mastite. O sinergismo existente deve-se ao fato de ambos atuarem contra os peróxidos no

organismo animal. A vitamina E age prevenindo-os e o Se destruindo-os.

O Se atua como cofator e parte integrante da enzima GPx, que é um dos sistemas

responsáveis contra a oxidação. A vitamina E está na primeira linha de defesa contra a oxidação

lipídica. O Se, como parte da GPx, está na 2ª linha de defesa antioxidante e os aminoácidos

87

sulfurados aparecem na 3ª linha de defesa como precursores da GPx. Consequentemente, enzimas

como superóxido dismutase e catalase e outros sistemas de defesa contra a oxidação podem

moderar a necessidade por vitamina E. A vitamina C também atua como antioxidante por regenerar

a forma reduzida do α-tocoferol: no processo de inibição da oxidação de ácidos graxos, o tocoferol

é oxidado a radical livre de tocoferol e o ácido ascórbico pode doar um elétron a este radical para

regenerar a forma antioxidante (reduzida) do tocoferol.

Deficiência de vitamina E

A deficiência de vitamina E mostra uma grande variedade de sinais clínicos nas diferentes

espécies. O grau de severidade da deficiência depende da ingestão de ácidos graxos poli-insaturados

e da disponibilidade de Se, antioxidantes e aminoácidos sulfurados. A distrofia muscular

nutricional é uma síndrome comum em todas as espécies quando há deficiência de vitamina E,

sendo também chamada de degeneração de Zenker, no qual ocorrem lesões nos músculos

esqueléticos e cardíacos e substituição do tecido muscular por conectivo, originando estrias

esbranquiçadas nas fibras musculares. A condição responde a tratamento com vitamina E / Se. Em

ruminantes, o transtorno é conhecido como doença do músculo branco, ocorrendo em animais

jovens primariamente por deficiência de Se, mas influenciado pelo status de vitamina E. Esta

doença pode se apresentar em animais neonatos ou na idade de 3 a 4 semanas em cordeiros ou de

1 a 4 meses em terneiros. Caracteriza-se por fraqueza e deterioração muscular, dificuldade de ficar

em pé e de amamentar (os músculos da língua podem ser afetados). A morte pode ocorrer por dano

severo no miocárdio. Fatores estressantes como transporte ou movimentação, ou mudanças bruscas

na alimentação podem precipitar a doença. Embora a doença seja mais descrita em animais jovens,

também pode afetar adultos com deficiência de vitamina E / Se, ocasionando miopatia

degenerativa, aborto, natimortos e síndrome de vaca caída.

A relação entre a vitamina E com a reprodução adquiriu interesse devido aos primeiros

relatos de que a deficiência desta vitamina afetava esta função em ratos machos e fêmeas.

Entretanto, em outras espécies não têm sido encontradas evidências desta relação, salvo em casos

de diminuição da toxicidade do gossipol em touros. O gossipol é uma substância encontrada na

farinha de algodão (sementes), que tem efeitos tóxicos sobre a reprodução (azoospermia).

Suplementação de vitamina E foi efetiva na prevenção de retenção de placenta em vacas. A

deficiência de vitamina E também causa aumento da sensibilidade dos eritrócitos a peróxidos e o

aparecimento de membranas celulares anormais. Por este motivo, o teste de hemólise in vitro é

considerado um indicador de deficiência de vitamina E. Necrose hepática e síndrome mastite-

88

metrite-agalactia têm sido relatadas em suínos por deficiência de vitamina E / Se. Em frangos a

deficiência de vitamina E pode resultar em diátese exudativa, um edema subcutâneo severo causado

por aumento da permeabilidade capilar, encefalomalácia (doença do frango louco), que resulta de

hemorragia e edema do cerebelo, muito influenciada pela quantidade de ácido linoleico na dieta, e

distrofia muscular.

Toxicidade

A vitamina E, comparada às vitaminas A e D, é relativamente não tóxica. Porém, uma

hipervitaminose E pode ter efeitos deletérios. Em várias espécies animais são indicados níveis

máximos toleráveis de 1.000 a 2.000 UI/kg na dieta. Em aves, os efeitos tóxicos de um excesso de

vitamina E estão relacionados com taxa de crescimento reduzida, anemia, reticulocitose, aumento

do tempo de protrombina e reduzida concentração de Ca e P nos ossos.

Oxidação e antioxidantes

A oxidação é parte fundamental da vida aeróbica e do metabolismo celular, produzindo

radicais livres de forma natural. Pode-se dizer que é o preço que o organismo paga por manter a

energia necessária à vida. No organismo, estão envolvidos na produção de energia, fagocitose,

regulação do crescimento celular, sinalização intercelular, imunidade e defesa celular e síntese de

substâncias biológicas. Isto significa que os radicais livres têm um aspecto positivo, além de ser

um subproduto da obtenção de energia, pois são substâncias que atacam células estranhas ao

organismo, como bactérias e vírus.

Os radicais livres têm um elétron desemparelhado nos átomos de oxigênio, sendo

denominados de ERO (espécies reativas de oxigênio, ou em inglês ROS). Entretanto, quando em

excesso, as ERO podem causar efeitos prejudiciais, como a peroxidação dos lipídeos de membrana

e agressão às proteínas dos tecidos e das membranas, às enzimas, carboidratos e ao DNA. A

produção de ERO está elevada nas lesões teciduais causadas por traumas, infecções, parasitas,

radiações, hipóxia, toxinas e exercícios extremos. O estresse oxidativo é um termo que designa o

aumento indesejado das ERO, encontrando-se relacionado com diversas patologias, como artrite,

choque hemorrágico, doenças cardíacas, sepse, mastite, enterites, pneumonia e doenças

respiratórias. A mitocôndria é a principal fonte geradora de radicais livres, por meio da cadeia

transportadora de elétrons, durante a produção de ATP a partir da oxidação de substratos

energéticos e da redução do O2 em água (Figura 7).

89

Figura 7. Redução do O2 em água durante a cadeia de transporte de elétrons

As principais ERO são radicais, como hidroxila (HO∙), íon superóxido (O2∙-), peroxila

(ROO∙) e alcoxila (RO∙), e não radicais (sem elétrons desemparelhados), como oxigênio singlet

(1O2) e peróxido de hidrogênio (H2O2). O radical hidroxila (HO∙) é o mais deletério ao organismo

por possuir curta meia-vida, o que dificulta o sequestro in vivo. É formado no organismo

principalmente por dois mecanismos (Figura 8): reação do peróxido de hidrogênio (H2O2) com

metais de transição e homólise da água por exposição à radiação ionizante. Causa danos a DNA,

RNA, proteínas, lipídeos e membranas celulares. Nos aminoácidos e proteínas, o radical pode reagir

na cadeia lateral, onde ataca preferencialmente cisteína, histidina, triptofano, metionina e

fenilalanina, gerando danos com consequente perda de atividade enzimática, dificuldades no

transporte ativo através das membranas celulares, citólise e morte celular. A forma mais deletéria

do oxigênio ao organismo é o oxigênio singlet (1O2), forma excitada de oxigênio molecular que não

possui elétrons desemparelhados em sua última camada. Podem atuar de forma benéfica, na defesa

contra infecção, quando a bactéria estimula os neutrófilos a produzirem ERO com a finalidade de

destruir o micro-organismo. O peróxido de hidrogênio (H2O2) é gerado in vivo pela dismutação do

ânion-radical superóxido (O2∙-) por enzimas oxidases ou pela β-oxidação de ácidos graxos. O

peróxido de hidrogênio é pouco reativo frente às moléculas orgânicas na ausência de metais de

transição. No entanto, exerce papel importante no estresse oxidativo por ser capaz de transpor

facilmente as membranas celulares e gerar radical hidroxila.

No organismo, os metais de transição mais importantes para a ocorrência dessa reação são

Cu1+ e Fe2+. O peróxido de hidrogênio é utilizado pelos fagócitos do organismo para combater vírus,

bactérias e outros corpos estranhos, muito embora apresentem também efeitos deletérios às

moléculas biológicas. O radical superóxido (O2∙-), ao contrário da maioria dos radicais livres, é

inativo, e sua reação principal é a dismutação, na qual é produzida uma molécula de peróxido de

hidrogênio e uma molécula de oxigênio. Apesar dos efeitos danosos no organismo, o radical O2∙-

possui importância vital para as células de defesa, protegendo contra infecções causadas por vírus,

bactérias e fungos, sendo produzido in vivo pelos fagócitos ou linfócitos e fibroblastos, durante um

processo inflamatório.

90

Figura 8. Formação das espécies reativas de oxigênio (ERO) e ação dos antioxidantes

SOD: superóxido dismutase, Cat: catalase, GSH: glutation reduzido, GSSH: glutation oxidado

Os sistemas biológicos estão continuamente em risco de sofrer injúrias em nível celular em

função dos efeitos tóxicos dos ERO. Dessa forma, desenvolveram-se sistemas de defesa

antioxidantes, que permitem a proteção contra os efeitos deletérios dos radicais livres. Esses

antioxidantes são produzidos pelo organismo ou absorvidos na dieta, sendo definidos como

qualquer substância que regenera o substrato ou previne significativamente a sua oxidação. São

conhecidos três sistemas enzimáticos antioxidantes (Figura 8): (i) enzimas superóxido dismutase

(SOD), que catalisam a dismutação do radical ânion superóxido O2∙-, convertendo-o em O2 e H2O2.

Existem duas formas de SOD no organismo: uma que contém Cu2+ e Zn2+ como centros redox e

ocorre no citosol e outra que contém Mn2+ como centro redox; (ii) enzima catalase que atua na

dismutação do H2O2 em O2 e H2O, com participação da coenzima NAPH; (iii) sistema do glutation

(GSH), que atua em conjunto com duas enzimas, a glutation peroxidase (GPx) e a glutation redutase

(GR). A primeira enzima é uma Se-enzima, denotando a importância desse mineral e sua atuação

91

como antioxidante no organismo. O sistema glutation catalisa a dismutação do H2O2 em O2 e H2O,

operando em ciclos entre a sua forma oxidada e reduzida.

Outros compostos antioxidantes são os carotenoides, o ácido ascórbico, o α-tocoferol, a

ubiquinona, ácido úrico, a bilirrubina e os flavonoides. Os carotenoides agem in vivo como

desativadores do O2 singlet ou como sequestradores dos radicais peroxila, reduzindo a oxidação do

DNA e lipídeos, que está associada a doenças degenerativas. Dentre eles, o β- caroteno é a mais

importante fonte de vitamina A, e formam um tipo incomum de agentes redutores biológicos. O

ácido ascórbico é agente redutor e pode poupar a oxidação de vários antioxidantes, entre eles a

vitamina E. O α-tocoferol é o principal antioxidante lipossolúvel nas membranas celulares, sendo

responsável pela remoção dos radicais livres na membrana eritrocitária e tendo importante papel

em inibir a propagação da lipoperoxidação, atuando assim na prevenção da hemólise, por manter a

estabilidade das membranas. A ubiquinona possui grande poder oxidante através do sequestro dos

radicais livres e na desativação do radical ânion superóxido.

Outra importante função é a regeneração do tocoferol na membrana mitocondrial, onde exerce

a mesma função regenerativa que o ácido ascórbico. O ácido úrico é a principal forma de excreção

de nitrogênio das aves e dos répteis; nos mamíferos é um produto secundário de excreção, derivado

das bases purínicas. Encontra-se, na maioria dos tecidos, na forma de ânion urato, que é um

antioxidante efetivo nos sistemas biológicos, capaz de proteger o DNA e lipídeos de ERO, mediante

a reação com os radicais peroxila (ROO∙). Além disso, é capaz de recuperar estruturas já atacadas

que se tornaram radicais livres, e é responsável por estabilizar o ascorbato. Tanto a biliverdina

quanto a bilirrubina, produtos do catabolismo do grupo heme, possuem propriedades antioxidantes.

A atividade antioxidante da bilirrubina ocorre principalmente quando se encontra ligada à albumina

plasmática. Os flavonoides são substâncias polifenólicas, pigmentos naturais amplamente

distribuídos em plantas, frutas, verduras e em diversas bebidas. Já foram identificados mais de

5.000 flavonoides diferentes. Possuem um ou mais núcleos aromáticos, contendo substituintes

hidroxilados e/ou derivados funcionais, como ésteres, glicosídeos e outros. Os flavonoides têm

apresentado importância farmacológica em função da descoberta de seus efeitos antitumorais, anti-

inflamatórios, antioxidantes, antivirais e antimicrobianos.

Além do oxigênio, o nitrogênio também participa da estrutura dos radicais livres, em especial o

óxido nítrico (NO2). Entre suas principais funções, destacam-se a regulação da pressão arterial e a

sinalização intercelular. Seu efeito tóxico, como radical livre, pode levar a lesão tecidual em

processos inflamatórios crônicos. O NO2 é sintetizado a partir da arginina por ação da enzima óxido

nítrico sintetase, presente no endotélio e nos macrófagos. O NO2 promove vasodilatação com

92

redução da resistência periférica, inibe a agregação plaquetária e desempenha um papel importante

na síndrome de lesão por isquemia-reperfusão.

93

Vitamina K

Em 1929, Henrik Dam notou que aves alimentadas com dietas em que foram utilizados

solventes apolares para remover esteróis, em um estudo para determinar a capacidade de sintetizar

colesterol, desenvolviam hemorragias musculares e subcutâneas. Estes estudos foram estendidos

por MacFarland, que observou que defeitos de coagulação em aves alimentadas com dietas

baseadas em extrato lipídico de peixe ou farinha de carne não podiam ser revertidos com o uso das

vitaminas conhecidas até então, e a doença hemorrágica em frangos foi associada com um novo

fator, designado de vitamina K, a vitamina da coagulação, tornando-se assim a última vitamina

lipossolúvel a ser descoberta. Mais tarde, em 1935, Almquist e Stokstad demonstraram que a

doença hemorrágica em frangos podia ser revertida com extrato de alfafa. Em 1940, se tornou claro

que substâncias sintetizadas por bactérias também possuíam atividade de vitamina K. Informações

também se tornaram disponíveis a respeito de um composto em trevo e gramíneas estragadas que

pareciam ser causa de desordens hemorrágicas em bovinos e serviam como antagonista da vitamina

K. Mais tarde, este composto foi identificado como dicumarol. Foi apenas em 1974 que foi

esclarecido o papel metabólico da vitamina K, quando se descobriu que γ-carboxiglutamato estava

presente em todas as proteínas dependentes de vitamina K.

A vitamina K existe em diversas formas (Figura 9), por exemplo, nas plantas como

filoquinona (vitamina K1) e nas bactérias da flora intestinal como menaquinona (vitamina K2). Para

a terapia, está disponível um derivado sintético, a menadiona (vitamina K3).

Figura 9. Estruturas químicas das formas de vitamina K

94

Grande parte da vitamina K é sintetizada por bactérias intestinais, e várias espécies animais

conseguem incorporar esta vitamina mediante coprofagia. Os micro-organismos ruminais

sintetizam grandes quantidades de vitamina K, de forma que os ruminantes não necessitam de

fontes externas. Dietas de frangos e suínos são regularmente suplementadas com menadiona, mas

a necessidade de suplementação na dieta para outras espécies é controversa. Os frangos não

conseguem suficientes quantidades de menaquinona a partir da síntese microbiana intestinal.

Aproximadamente metade do estoque de vitamina K – principalmente filoquinona e menaquinona

– do organismo está no fígado. A menadiona, por ser mais hidrossolúvel, tem distribuição mais

abrangente em todos os tecidos, sendo rapidamente excretada.

Existem compostos antagonistas da vitamina K, como os derivados cumarínicos (Figura 10),

originados a partir de fungos contaminantes de trevo. Micotoxinas e sulfonamidas também são

antagonistas da vitamina K. O dicumarol é utilizado farmacologicamente como anticoagulante para

prevenir a formação de coágulos intravasculares. A warfarina é usada como potente rodenticida. A

vitamina K é encontrada em vegetais escuros e frescos, principalmente na alfafa, couve-flor,

repolho verde, alface, brócolis e espinafre. Também se encontra na gema do ovo, no tomate e no

fígado. Os requerimentos de vitamina K estão na ordem de 0,5-1,0 ppm (base seca), sendo que os

ruminantes não requerem consumir esta vitamina, que é produzida em quantidade suficiente pelos

micro-organismos ruminais.

Figura 10. Estruturas de antagonistas da vitamina K

Funções da vitamina K

O principal papel da vitamina K é a modificação pós-traducional de vários fatores de

coagulação sanguínea, em que essa vitamina serve como coenzima na carboxilação de certos

resíduos de ácido glutâmico presentes nessas proteínas. A vitamina K é necessária para a síntese

hepática de protrombina (Fator II) e dos fatores de coagulação sanguínea VII (pró-convertina), IX

95

(Fator Christmas) e X (Fator Stuart-Prower) (Figura 11). Essas proteínas são sintetizadas como

moléculas precursoras inativas.

Figura 11. Mecanismo da coagulação

Fatores dependentes de vitamina K são: IX (Christmas), X (Stuart-Prower),

VII (pró-convertina), II (protrombina)

A formação dos fatores de coagulação requer carboxilação de resíduos de ácido glutâmico,

que é dependente de vitamina K, para formar γ-carboxiglutamato (Gla), capaz da subsequente

ativação. A protrombina, por exemplo, possui 10 resíduos de Gla. Carboxilases microssomais

específicas são responsáveis pela formação de Gla. A reação requer O2, CO2 e vitamina K (como

cofator). Apenas a forma reduzida da vitamina K serve como cofator (forma hidroquinona),

portanto é necessário um sistema de redução para a regeneração da vitamina (forma quinona), via

vitamina K-epóxido (Figura 12).

Muitos antagonistas da vitamina K funcionam como inibidores das enzimas redutases

importantes para a regeneração da vitamina K. A formação de Gla é sensível à inibição por

dicumarol, anticoagulante de ocorrência natural nas células de trevo em deterioração, e por

warfarina, análogo sintético da vitamina K. A warfarina inibe a formação da protrombina ativa,

sendo usado como um potente rodenticida e uma droga anticoagulante para tratar pacientes em

risco por coagulação excessiva. Os resíduos da Gla da protrombina são quelantes de íons Ca,

carregados positivamente, devido à presença de dois grupos carboxilato adjacentes, negativamente

carregados. O complexo prototrombina-Ca é capaz de ligar-se a fosfolipídeos essenciais para a

coagulação sanguínea, na superfície das plaquetas. A ligação às plaquetas aumenta a taxa de

96

conversão proteolítica de protrombina em trombina. A protrombina é uma enzima proteolítica que

quebra ligações peptídicas no fibrinogênio para convertê-lo em fibrina, a proteína fibrosa insolúvel

que mantém unidos os coágulos sanguíneos. O Gla está também presente em outras proteínas, por

exemplo, na osteocalcina, envolvida na remodelação dos ossos.

Figura 12. Reação de carboxilação do ácido glutâmico (Glu) para a

formação de γ-carboxiglutamato (Gla), que é dependente da

vitamina K

(1) oxidação, (2) carboxilação, (3, 4) reciclagem da forma oxidada da

vitamina K a sua forma reduzida (hidroquinona)

Deficiência de vitamina K

A deficiência de vitamina K é incomum, pois quantidades adequadas são produzidas pelas

bactérias intestinais ou obtidas pela dieta na forma K2 (menaquinona). O principal sinal de

deficiência de vitamina K é falha na coagulação, que pode estar evidenciada por baixo nível de

protrombina, aumento no tempo de coagulação (tempo de protrombina acima de 40 s) e

hemorragias subcutâneas e internas, por vezes fatais. A deficiência pode ser resultado de

insuficiente vitamina K na dieta, falta de síntese microbiana no intestino, problemas de absorção

intestinal ou incapacidade hepática de usar a vitamina K disponível. Se a população bacteriana

97

diminui, por exemplo, pelo uso de antibióticos, a quantidade de vitamina formada endogenamente

diminui e pode levar a hipoprotrombinemia em indivíduos subnutridos. Certas cefalosporinas de

segunda geração podem causar hipoprotrombinemia. Em função disso, seu uso geralmente é

associado à suplementação de vitamina K. A deficiência de vitamina K costuma estar associada a

síndromes de má absorção ou ao uso de anticoagulantes farmacológicos. Recém-nascidos possuem

intestinos estéreis e, inicialmente, não possuem as bactérias que sintetizam a vitamina K. Em

ruminantes alimentados com trevo contaminado com fungos pode haver alto consumo de dicumarol

causando intoxicação hemorrágica devido ao antagonismo da vitamina K. Outra causa de

deficiência de vitamina K induzida é pelo consumo acidental de warfarina, cumarina sintética usada

como rodenticida. Filoquinona, assim como menadiona, devem ser usadas parenteralmente para

tratar animais que ingeriram warfarina e outros anticoagulantes. Alguns cavalos chamados

“sangradores”, que sofrem hemorragias após o exercício, geralmente respondem a tratamento de

suplementação de vitamina K. Profilaticamente, a administração intramuscular de vitamina K pode

ser indicada contra doenças hemorrágicas, mas não como tratamento farmacológico em condições

hemorrágicas.

Toxicidade

Poucos perigos são atribuídos à ingestão de vitamina K por longo tempo e em doses de 10-

100 ppm na dieta sob a forma de filoquinona. As formas naturais de vitamina K, filoquinona e

menaquinona, não são tóxicas em doses elevadas. Porém, a forma sintética da vitamina K, a

menadiona, em doses de 100 ppb na dieta pode agir como pró-oxidante, e sua alta concentração na

dieta pode produzir hemólise. Doses de menadiona de 2-8 mg/kg de peso corporal podem ser letais

em cavalos, provocando sinais de cólico, hematúria, azotemia e falha renal aguda. A administração

prolongada de vitamina K pode produzir anemia hemolítica e icterícia em filhotes, devido a efeitos

tóxicos na membrana dos eritrócitos.

98

Tiamina (Vitamina B1)

A tiamina ou vitamina B1 foi a primeira vitamina a ser descoberta. Eijkman, em 1890,

descobriu que frangos alimentados com arroz branco e afetados de beribéri (polineurite), doença

descrita desde tempos ancestrais em humanos, principalmente asiáticos, se recuperavam quando

alimentados com arroz integral. O pesquisador atribuiu o fato a uma toxina do arroz branco que

seria contrarrestada ao consumir o arroz integral, mas seu sucessor, Grijns, postulou que o beribéri

era causado pela falta de um importante componente do alimento. Funk obteve em 1911 um

componente da casca do arroz com característica de amina e então foi cunhado o termo “vitamina”

ou “amina vital”, muito embora depois se descobrisse que muitas vitaminas não são aminas. A

estrutura da tiamina consiste de uma molécula de pirimidina mais uma molécula de tiazol ligados

por uma ponte metileno, que na sua forma ativa está ligada a um grupo pirofosfato (Figura 13).

Figura 13. Estrutura da tiamina na sua forma de vitamina (tiamina pirofosfato)

Existem compostos sintéticos que são antagonistas da tiamina por possuir similar

composição e atuam por inibição competitiva, interferindo em diferentes pontos do metabolismo.

Assim, a piritiamina bloqueia a esterificação da tiamina com o ácido fosfórico, impedindo a ação

da coenzima co-carboxilase (que contém tiamina); a oxitiamina também inibe a ação da co-

carboxilase e o amprólio (usado como coccidiostático), inibe a absorção intestinal e a fosforilação

de tiamina. As plantas também podem conter antagonistas da tiamina estáveis ao calor, como os

polifenóis, que se encontram em algumas samambaias, no pasto festuca e no chá. Os polifenóis

servem como agentes antioxidantes, mas, no caso do antagonismo à tiamina, oxidam o anel tiazol

para produzir um dissulfeto não absorvível. Algumas samambaias também contêm tiaminase,

enzima que quebra a estrutura da tiamina na ponte metileno em tiazol e pirimidina, inativando-a. A

tiaminase também tem sido identificada em certos peixes, e animais que os consomem podem sofrer

transtorno neurológico conhecido como paralisia de Chastek.

99

A tiamina é uma das vitaminas com menor capacidade de armazenamento e por isso uma

deficiência pode manifestar sinais clínicos em pouco tempo. Em condições de alimentação

costumeira (cereais, hortaliças tuberosas) os animais monogástricos dificilmente terão deficiência

desta vitamina, a menos que os alimentos contenham antagonistas da tiamina (tiaminase, por

exemplo, na samambaia) ou sofram inativação por calor. A tiamina é encontrada principalmente

em cereais e milho, levedura de cerveja, vegetais, frutas, batata, fígado animal, gema de ovo e leite.

Os animais ruminantes e equinos adultos podem obter a vitamina B1 através das bactérias do rúmen

ou do ceco, respectivamente, enquanto coelhos e ratos dependem da coprofagia como fonte desta

vitamina. Nos ruminantes praticamente não se consideram requerimentos de tiamina devido a sua

síntese pelas bactérias ruminais, porém deve-se levar em consideração a possibilidade de

deficiência em ruminantes jovens que ainda não tem um rúmen funcional. Requerimentos em

animais monogástricos rondam 1,0 a 3,0 ppm (matéria seca), sendo os felinos os que possuem

maiores requerimentos. Tendo a tiamina importante participação no metabolismo dos glicídeos, o

aumento deste nutriente na dieta aumenta os requerimentos da vitamina. Gestação, lactação e idade

aumentam os requerimentos de tiamina.

Funções da tiamina

O pirofosfato de tiamina (TPP) ou coenzima co-carboxilase é a forma biologicamente ativa

da vitamina B1, formada pela transferência do grupo pirofosfato do ATP para a tiamina. A TTP

funciona como coenzima na descarboxilação-oxidação do piruvato, com sua conversão em acetil-

CoA possibilitando sua entrada no ciclo de Krebs. Neste mesmo ciclo, a TPP atua na

descarboxilação do α-cetoglutarato formando succinil-CoA. Estas duas reações são essenciais para

a produção de energia, sendo de vital importância no tecido nervoso. Na deficiência de tiamina, a

atividade dessas duas reações de descarboxilação/oxidação esta diminuída, resultando na

diminuição de produção de ATP e, consequentemente, em prejuízo na função celular.

O TPP também atua como coenzima na formação ou degradação de α-cetóis pela

transcetolase, na via das pentoses-fosfato. A vitamina B1 é importante na síntese de ácidos graxos

e colesterol e participa diretamente na excitação dos nervos periféricos. A falha na síntese desses

lipídeos para a estrutura das membranas das células nervosas parece ser a causa das mudanças

degenerativas que se observam na deficiência de tiamina. Esta vitamina funciona também na

manutenção do apetite e do tônus muscular. A vitamina B1 também é recomendada para a

manutenção, o crescimento e a reprodução dos animais. A TTP parece ter importante papel na

transmissão do impulso nervoso: a coenzima se localiza nas membranas periféricas dos neurônios,

100

sendo requerida na biossíntese de acetilcolina e nas reações de translocação de íons na estimulação

nervosa. Também tem sido postulada a ação da tiamina na síntese de insulina.

Deficiência de tiamina

O clássico sinal da deficiência de tiamina (beribéri em humanos e polineurite em aves) é

atingido no estágio final de deficiência, provavelmente devido ao acúmulo de intermediários do

catabolismo de glicídeos no tecido nervoso, explicado pela dependência da glicose para a obtenção

de energia nesses tecidos. O conhecimento da ação bioquímica da TTP não explica, entretanto, de

forma clara outros sinais decorrentes da sua deficiência: perda do apetite, constipação, enjoo,

depressão, irritabilidade e fadiga. Deficiência de moderada a severa causa confusão mental, ataxia

(andar cambaleante e disfunção motora) e oftalmoplegia (perda da coordenação ocular).

Deficiência severa causa beribéri em humanos e polineurite em aves (as mais sensíveis são os

frangos e pombos), doenças caracterizadas por acúmulo de fluidos (edema) no sistema

neuromuscular, dor, atrofia e debilidade muscular, paralisia e morte. Também pode ocorrer falha

cardíaca congestiva. Em humanos, a deficiência de tiamina é observada em desnutrição avançada,

em alimentação exclusiva a base de arroz polido e em alcoolismo crônico.

A tiamina é instável no calor e em meios alcalinos, podendo haver a sua destruição em várias

etapas do processamento dos alimentos e a conservação. Também pode ser destruída por tiaminases

presentes na carne de alguns peixes e no processo de fermentação por algumas bactérias. A

deficiência de tiamina foi observada em raposas alimentadas com peixes crus e gatos alimentados

tanto com peixe cru como em comida de gato enlatada. Rações enlatadas preservadas com

metabissulfito de Na também causaram deficiência de tiamina em felinos. A chamada síndrome da

mortalidade precoce é uma doença não infecciosa que afeta a truta do lago e outros salmonídeos

associada à deficiência de tiamina. Em herbívoros a deficiência de tiamina pode ocorrer a partir da

ingestão de Marsilea drummondii ou a samambaia Pteridium aquilinum. A característica mais

predominante da deficiência é a poliencefalomalácia com sinais de andar em círculos, convulsões,

cegueira e postura da cabeça em opistótono. Têm sido estabelecidas quatro condições para

diagnosticar a ocorrência de poliencefalomalácia: (1) dieta com alto conteúdo energético; (2)

aumento de piruvato e lactato sanguíneos (4-5 vezes o normal) e diminuição de atividade

transcetolase eritrocitária; (3) resposta positiva a tratamento com tiamina; e (4) lesões cerebrais de

necrose cortical bilateral à necropsia. A suplementação com grandes quantidades de melaço pode

causar o que se conhece como toxicidade ao melaço, na qual ocorrem sinais clínicos similares à

poliencefalomalácia.

101

Toxicidade

Grande ingestão ou administração parenteral de tiamina não produz efeitos tóxicos, uma vez

que a vitamina é rapidamente excretada pelo rim. Entretanto, repetidas e grandes doses parenterais

podem causar reação anafilática, com sinais como convulsões, paralisia, arritmia cardíaca e

respiratória e depressão.

102

Riboflavina (vitamina B2)

A riboflavina foi uma das primeiras vitaminas B identificadas. Em 1932, Warburg e Christain

isolaram uma enzima oxidativa de leveduras que continha uma fração proteica e outra não proteica,

sendo a primeira identificação de um grupo prostético (ativador) de uma enzima. Assim, a

riboflavina foi encontrada em uma coenzima antes de ser descoberta na sua forma livre. Em 1933,

Kuhn isolou um pigmento amarelo da clara do ovo que tinha propriedades oxidativas e funcionava

como fator de crescimento em ratos. Ele deu o nome de flavina (ovoflavina por ser do ovo). Mais

tarde se descobriu que continha ribose e foi dado o nome de riboflavina. A riboflavina consiste em

um núcleo de dimetilisoaloxazina ligado à ribose através de um grupo álcool (Figura 14).

Figura 14. Estrutura da riboflavina

As duas formas biologicamente ativas da vitamina B2 são a flavina mononucleotídeo (FMN,

Figura 15) e a flavina adenina dinucleotídeo (FAD, Figura 16). FMN e FAD são capazes de aceitar

reversivelmente dois átomos de hidrogênio, formando FMNH2 ou FADH2. FMN e FAD são

fortemente ligados, algumas vezes covalentemente, a flavoenzimas que catalisam a oxidação ou a

redução de um substrato. Nos alimentos ingeridos, FMN e FAD são hidrolisados na parte superior

do intestino para libertar a riboflavina. A riboflavina é absorvida por processos ativos e transportada

pelo sangue para os tecidos alvos em associação com a albumina. Uma vez na célula, a riboflavina

é convertida em FMN utilizando um ATP em reação catalisada pela enzima flavoquinase. Depois

o FMN se combina com uma 2ª molécula de ATP para formar FAD em reação catalisada pela

enzima FAD pirofosforilase. A urina é a principal via de excreção da riboflavina e do FMN, embora

FAD possa ser excretado na bile. A forma livre da riboflavina constitui menos de 5% das flavinas

no organismo, enquanto de 70 a 90% está na forma de FAD. Os requerimentos de riboflavina não

são considerados em ruminantes por causa da sua síntese microbiana ruminal e nos monogástricos

103

são da ordem de 2,0 a 4,0 ppm (matéria seca). Fontes de riboflavina se encontram nas plantas

verdes, em leveduras, fungos e algumas bactérias.

Figura 15. Estrutura da flavina mononucleotídeo (forma oxidada:

FMN; forma reduzida: FMNH2)

Figura 16. Estrutura da flavina dinucleotídeo

na forma oxidada (FAD)

Funções da riboflavina

As formas ativas da riboflavina, principalmente o FAD, participam como ativadores de mais

de 100 enzimas que catalisam reações de oxidação-redução. FMN e FAD atuam como grupos

prostéticos (não proteicos) de muitas flavoenzimas. A sua participação no metabolismo é

fundamental na oxidação de substratos e geração de energia (ATP), sofrendo alternativas de

oxidação e redução. Algumas flavoenzimas contêm metais (Fe, Mo, Cu, Zn) que participam de

104

reações de transferência de elétrons. As 40 flavoenzimas conhecidas têm sido classificadas nos

seguintes três grupos: (1) NADH2 desidrogenases que tem como substrato NAD reduzida e como

aceptor de elétrons enzimas do sistema citocromo, na cadeia de transporte de elétrons, sendo

fundamental na geração de ATP. (2) Oxidases que aceitam elétrons de substratos reduzidos e os

transferem ao oxigênio, para depois reduzir o O2 a H2O2. (3) Desidrogenases que aceitam elétrons

de substratos reduzidos e os transferem para o sistema citocromo. A riboflavina participa como

fator essencial no metabolismo dos aminoácidos, sendo parte das oxidases que oxidam α-

aminoácidos e os convertem em seu correspondente α-cetoácido, liberando amônia. Uma FMN-

oxidase é necessária para a conversão de piridoxina fosforilada (vitamina B6) em uma coenzima

funcional. Isto significa que uma deficiência de riboflavina pode também causar deficiência de

vitamina B6. A riboflavina tem papel importante na absorção intestinal de Fe. Riboflavina é

necessária no metabolismo dos ácidos graxos, tanto para a oxidação (FAD acil-CoA-desidrogenase)

como para a síntese a partir de acetato (FMN flavoproteína). Parece que a riboflavina é necessária

para a regeneração de glutation reduzido nas hemácias, fazendo que a deficiência torne as

membranas das hemácias mais vulneráveis ao estresse oxidativo.

Deficiência de riboflavina

Tanto humanos como animais não podem sintetizar riboflavina nos tecidos, devendo,

portanto, ingerir na alimentação ou adquirir por síntese microbiana intestinal. Neste sentido, os

ruminantes são muito mais eficientes que os monogástricos, não tendo requerimentos nutricionais,

pois os micro-organismos do rúmen sintetizam quantidades adequadas de riboflavina. Os lactentes

em geral não sofrem de deficiência, pois o leite constitui uma boa fonte de riboflavina. Em todas

as espécies, a deficiência se manifesta por uma taxa de crescimento diminuída, inflamação da

mucosa oral, perda de pelo e produção excessiva de lágrimas e saliva. Outros sinais incluem

anorexia, diarreia, dermatite, queilose (fissuras nos cantos da boca) e glossite (a língua parece lisa

e púrpura). As dietas típicas fornecidas a suínos e frangos, principalmente a base de grãos, as tornam

marginais na deficiência de riboflavina. Porcos jovens em crescimento são mais vulneráveis e

apresentam anorexia, baixo crescimento, pelo áspero, alopecia e manqueira. Em ocasiões também

acompanham neutrofilia e diminuição da resposta imune. Nas porcas, a deficiência de riboflavina

se manifesta por falhas reprodutivas. Em frangos aparece uma típica condição denominada

paralisia de dedos tortos, em casos de severa deficiência, em que o animal caminha sobre os jarretes

com os dedos curvados para dentro. Também em frangos de corte a deficiência de riboflavina causa

atraso no crescimento, diarreia e alta mortalidade nas primeiras semanas de vida. Em galinhas de

105

postura diminui a eclodibilidade e a produção de ovos. Nesta espécie, a dosagem de riboflavina na

ovoalbumina é um excelente indicador do status de riboflavina (deve estar entre 2-3 ppm). O

método bioquímico mais adequando para detectar deficiência de riboflavina é medir a atividade da

FAD-enzima glutation redutase nas hemácias.

Toxicidade

A riboflavina é uma vitamina que tem muito pouca toxicidade. Quantidades de riboflavina

na dieta de até 100 vezes os requerimentos diários em ratos podem ser toleradas sem problema.

Quando doses elevadas são fornecidas por via oral, apenas uma pequena fração se absorve e a

maioria é excretada pelas fezes. Isto ocorre porque o sistema de absorção de riboflavina via

intestinal é rapidamente saturado, além de que a capacidade para armazenar a vitamina nos tecidos

é limitada. A administração parenteral de riboflavina pode atingir toxicidade com doses de 600

mg/kg de peso em ratos. Nesses casos ocorre anúria e acúmulo de cristais nos túbulos renais.

106

Niacina (vitamina B3)

Depois do descobrimento da tiamina e da riboflavina, a niacina foi a 3ª vitamina do complexo

B identificada. Os primeiros indícios de a niacina ser um nutriente essencial vieram do estudo da

doença conhecida como pelagra em humanos e língua preta em cães. Esta doença foi descrita no

norte da Espanha por Gaspar Casal, médico da corte de Felipe V, em 1735, onde a população a

conhecia como mal de la rosa, e Casal a relacionou com pobreza e má alimentação. Estudos

posteriores a identificaram em outras latitudes e começaram a relacioná-la com deficiência de

proteína. O termo pelagra significa pele áspera, e se manifesta com dermatite, diarreia, demência

e morte. No século 20 foi identificado o aminoácido triptofano como o limitante nas condições de

pelagra e língua preta. Em 1937, Elvehjem isolou a nicotinamida do fígado como o fator que podia

curar língua preta em cães. Em 1945, Krehl descobriu que o triptofano era tão ativo quanto a niacina

no tratamento da pelagra. Depois, Heidelberg deu a prova definitiva de que o triptofano é convertido

em ácido nicotínico (vitamina B3).

Figura 17. Estrutura da niacina

(ácido nicotínico)

A niacina ou ácido nicotínico (Figura 17) é um derivado substituto da piridina. As formas

biologicamente ativas da coenzima são nicotinamida-adenina-dinucleotídeo (NAD, Figura 18) e

seu derivado fosforilado nicotinamida-adenina-dinucleotídeo-fosfato (NADP). A nicotinamida é

rapidamente desaminada no organismo e, dessa forma, é nutricionalmente equivalente ao ácido

nicotínico. A niacina é encontrada em cereais, grãos, no leite e na carne, especialmente no fígado.

A rigor, a niacina não é uma vitamina (composto essencial que precisa ser incorporado na dieta),

pois ela pode ser sintetizada no organismo a partir do triptofano (Trp). Porém, a conversão de Trp

em niacina é relativamente ineficiente e só acontece depois que os requerimentos de Trp estão

cobertos. Por outro lado, a biossíntese de niacina necessita de tiamina, riboflavina, e piridoxina.

107

Assim em termos práticos, tanto a niacina quanto o Trp são essenciais e precisam estar na dieta. Os

requerimentos de niacina variam amplamente dependendo da disponibilidade de Trp e da

capacidade de converter Trp em niacina. Nos ruminantes não se consideram requerimentos, pois

obtém a niacina através da síntese microbiana ruminal, salvo nos ruminantes jovens e em vacas

leiteiras de alta produção, que requerem consumo de fontes de niacina e Trp (6 g de

niacina/vaca/dia). Os cavalos também não têm requerimentos, pois sintetizam a niacina nas

bactérias do trato digestivo inferior e possuem boa capacidade de síntese de niacina a partir do Trp.

Nas demais espécies, os requerimentos de niacina variam entre 20 a 40 ppm na dieta (MS).

Figura 18. Estruturas de NAD+ e NADH

Funções da niacina

A principal função da niacina é na formação das coenzimas NAD e NADP, as quais atuam

em reações de oxidação-redução, comprometidas no fornecimento de energia dentro do

metabolismo animal. Nessas reações, a coenzima sofre redução do anel piridina, pela incorporação

de um íon hidreto (átomo de hidrogênio + um par de elétrons). As formas reduzidas do NAD e do

NADP são NADH e NADPH, respectivamente (Figura 18). Elas participam ao menos de 200

reações no metabolismo de glicídeos, ácidos graxos e aminoácidos, de fundamental importância,

principalmente nos tecidos cutâneo, gastrointestinal e nervoso. NAD é uma coenzima aceptora de

108

elétrons nas reações de oxidação dos nutrientes, e depois serve como doadora de elétrons na cadeia

de transporte de elétrons na mitocôndria, onde se realiza a síntese de ATP. Isto significa que NAD

é um composto intermediário entre os processos de oxidação, no catabolismo dos nutrientes, e os

processos de transferência de elétrons até o O2, na produção de ATP. Muitas enzimas que

participam de processos de óxido-redução são específicas em utilizar a coenzima NADP, como no

caso da via das pentoses-fosfato e na síntese dos ácidos graxos. Tanto NAD como NADP estão

envolvidas na síntese e degradação de aminoácidos. Poli(ADP-ribose) são moléculas niacina-

dependentes que participam da modificação pós-traducional de proteínas nucleares. As proteínas

poli ADP-ribosiladas parecem funcionar na reparação e na replicação de DNA e na diferenciação

celular. A deficiência severa de niacina pode aumentar a suscetibilidade ao dano oxidativo sobre o

DNA, devido a pouca disponibilidade de NAD.

Deficiência da niacina

A deficiência de niacina se caracteriza por transtornos na pele e no trato gastrointestinal, com

sinais como perda de apetite, crescimento retardado, fraqueza, dermatite, desordens digestivas e

diarreia. Uso de dietas a base de milho podem ser indutoras de deficiência devido ao baixo conteúdo

de Trp e niacina nesse cereal. A deficiência de niacina causa pelagra em humanos, uma doença

envolvendo a pele, o trato gastrointestinal e o sistema nervoso central. Os sinais da evolução da

pelagra compreendem dermatite, diarreia, demência e, se não tratada, morte. A doença chamada de

língua preta é consequência de deficiência de niacina em aves e cães, e consiste numa inflamação

da língua e da cavidade bucal, que leva a crescimento retardado por diminuição do consumo de

alimento. Nos cães, um sinal característico é babar uma saliva grossa e viscosa, devido a glossite e

gengivite. Deficiência não corrigida pode levar a desidratação severa, emaciação e morte. Devido

à coceira cutânea, podem desenvolver dermatite traumática.

No gato não ocorre síntese de niacina a partir de Trp, sendo dependentes da inclusão desta

vitamina na dieta. Na deficiência, apresentam sinais clínicos similares aos apresentados pelo cão.

Em humanos, a quantidade de NAD nas hemácias é considerada um bom indicador do status de

niacina. A suplementação de niacina em bovinos pode ser benéfica, principalmente em animais

estressados (transporte de gado), durante o período pós-parto e em vacas com cetose subclínica.

109

Toxicidade

Podem ocorrer efeitos tóxicos de niacina em níveis muito além dos seus requerimentos (10

a 20 vezes). A nicotinamida é 2 a 3 vezes mais tóxica que o ácido nicotínico. Administração de

elevadas doses de ácido nicotínico em humanos podem causar vasodilatação, coceira, sensação de

calor, náusea, vômito e lesões cutâneas. Em cães, doses de 2 g de ácido nicotínico por dia produzem

sinais de fezes sanguinolentas, convulsões e morte.

110

Piridoxina (vitamina B6)

A vitamina B6 é um termo coletivo para piridoxina (piridoxol), piridoxal e piridoxamina

(Figura 19), todos derivados da piridina e com atividade bioquímica equivalente. Eles diferem

apenas na natureza do grupo funcional ligado ao anel. A piridoxina ocorre principalmente nas

plantas, enquanto o piridoxal e a piridoxamina são encontrados em alimentos de origem animal. A

maioria das dietas para animais contém quantidades adequadas de vitamina B6, mas em algumas

condições, deficiências podem ocorrer, principalmente em aves e suínos. György foi o primeiro

pesquisador em reconhecer a vitamina B6 como uma vitamina específica, quando demonstrou que

uma doença similar à pelagra em ratos, conhecida como acrodinia, podia ser prevenida por esta

vitamina, mas não por tiamina, riboflavina ou niacina e propôs o nome de piridoxina a este

composto. A forma coenzimática da vitamina B6 é o piridoxal-fosfato (PLP). Os ruminantes e os

equinos obtêm vitamina B6 a partir de síntese microbiana ruminal ou intestinal, respectivamente, e

os requerimentos em monogástricos são da ordem de 2 a 4 ppm na dieta (MS).

Figura 19. Estrutura das três formas mais importantes da vitamina B6

Funções da piridoxina

Todos os três compostos podem servir como precursores da coenzima biologicamente ativa,

o PLP, o qual funciona como uma coenzima para um grande número de enzimas (em torno de 60),

particularmente aquelas que catalisam reações envolvendo aminoácidos, como coenzima de

reações de transaminação, descarboxilação e racemização de aminoácidos. A maioria das enzimas

dependentes de vitamina B6 são as transaminases, as quais usam α-cetoglutarato como o composto

aceptor de grupos amina. As aminotransferases são específicas para pares específicos de

aminoácidos e cetoácidos (nas reações chamadas de “pingue-pongue”). Elas representam uma

111

importante ligação entre o metabolismo de aminoácidos, glicídeos e ácidos graxos, bem como no

ciclo de Krebs. Também PLP participa em reações de descarboxilação não oxidativa convertendo

aminoácidos em suas aminas correspondentes (por exemplo, histamina, serotonina, taurina, γ-

aminobutírico, etanolamina), as quais atuam em eventos fisiológicos relacionados ao metabolismo

hormonal e como componentes de fosfolipídeos e sais biliares. Adicionalmente, a vitamina B6

participa nas seguintes funções: síntese de niacina (a partir de Trp), formação de ácido δ-

aminolevulínico (primeiro passo da síntese de porfirina), conversão de ácido linoleico em

araquidônico, síntese de adrenalina e noradrenalina, incorporação de Fe no grupo heme, transporte

de aminoácidos e formação de anticorpos.

Deficiência da piridoxina

Em função da importante atividade da piridoxina no metabolismo de aminoácidos e

proteínas, uma deficiência vai acarretar uma diminuição na retenção de nitrogênio e pobre

utilização das proteínas da dieta com excessiva excreção de nitrogênio. É possível observar retardo

no crescimento, dermatite, convulsões, anemia e alopecia. A deficiência de vitamina B6 é raramente

vista em animais, pois a maioria das dietas possuem adequadas quantidades da vitamina. Os

ruminantes e os equinos praticamente não sofrem de deficiência. Porém, gado estressado, por

exemplo, por transporte de longa distância, pode sofrer diminuição de vitamina B6. No caso dos

equinos, apesar de não sofrerem deficiência em condições normais, é recomendável fornecer uma

suplementação de vitamina B6 em situações de treinamento ou atividade intensa.

Em geral, a deficiência de vitamina B6 está caracterizada por baixa resposta imune humoral

e celular. Em suínos, caninos e felinos afetados por deficiência severa de vitamina B6 é possível

encontrar sinais como baixo apetite e crescimento, anemia microcítica hipocrômica, esteatose

hepática, pelo áspero, dermatite e edema subcutâneo. Situações avançadas podem causar

degeneração de nervos periféricos, manifestada por desordens do movimento, ataxia e, no fim,

convulsões. Nas aves, é típica a postura de asas estendidas e cabeça apoiada no chão. Em deficiência

severa, os frangos se tornam excitáveis com movimentos sem sentido e terminando em convulsões

violentas e morte, o que faz necessária a diferenciação com encefalomalácia. Anemia e depressão

de imunoglobulinas M e G também são um sinal frequente em aves com deficiência de vitamina

B6. A dosagem da forma fosforilada da vitamina B6 (PLP) no plasma pode ser uma boa ferramenta

diagnóstica para determinar o status desta vitamina no organismo.

112

Toxicidade

Como as demais vitaminas do complexo B, a vitamina B6 exibe uma toxicidade muito baixa.

Entretanto, doses excessivas de vitamina B6 podem causar sinais clínicos relacionados com o

sistema nervoso periférico, tais como alterações na marcha, incoordenação motora, convulsões,

paralisia e morte. Piridoxal é duas vezes mais tóxica que piridoxina ou piridoxamina.

113

Ácido pantotênico

O ácido pantotênico foi descoberto em 1933 por Roger Williams. Em 1937, Snell observou

que era um fator essencial para o crescimento de leveduras e de bactérias ácido-lácticas e ácido-

propiônicas. Mais tarde, Elvehjen, Jukes e outros demonstraram que o ácido pantotênico era

essencial para os animais e, em 1940, Williams isolou e determinou a estrutura e deu o nome ao

ácido pantotênico, inspirado na palavra grega pantos, que significa “encontrado em toda parte”.

Lipmann e Kaplan, em 1947, descobriram no fígado que a forma ativa do ácido pantotênico é a

coenzima A. Os ovos, o fígado e as leveduras são as mais importantes fontes de ácido pantotênico,

embora a vitamina seja amplamente distribuída em todos os alimentos. Não se reconhecem

deficiências de ácido pantotênico em ruminantes devido a sua síntese no rúmen. Em monogástricos

são mais frequentes as deficiências em suínos e aves. Os requerimentos nestas espécies são da

ordem de 10 a 12 ppm na dieta (MS). O ácido pantotênico é uma amida composta de ácido pantoico

unido a β-alanina (Figura 20).

Figura 20. Estrutura do ácido pantotênico

Ele pode ser encontrado na forma livre ou unido, principalmente como coenzima A ou como

transportadora de grupos acila (ACP). Para ser absorvido no intestino, deve estar na forma livre.

Em todos os tecidos, o ácido pantotênico pode ser convertido em coenzima A ou em outros

compostos em que a vitamina é grupo funcional. A maioria do ácido pantotênico no sangue é

encontrada nas hemácias como coenzima A, mas no plasma existe na sua forma livre.

Funções do ácido pantotênico

O ácido pantotênico é um componente da coenzima A (Figura 21), que contém, além do

ácido pantotênico, uma molécula de ADP em um extremo e outra de β-mercaptoetilamina no outro

114

extremo. Esta última possui um grupo tiol (SH) que constitui o sítio ativo da vitamina, atuando na

transferência de grupos acila. O grupo tiol da coenzima A (CoA) transporta compostos acila como

ésteres do tiol ativados. Exemplos de enzimas que têm as coenzimas do ácido pantotênico como

cofator (com sua respectiva forma ativa) incluem: piruvato desidrogenase (CoA), α-cetoglutarato

desidrogenase (CoA), ácido graxo oxidase (CoA), ácido graxo sintetase (ACP), propionil-CoA

carboxilase (CoA) e acetil-CoA sintetase (fosfopanteteína). Essas coenzimas participam em mais

de 100 vias metabólicas, envolvendo o catabolismo de glicídeos, proteínas e lipídeos, e a síntese de

lipídeos, neurotransmissores, hormônios esteroidais, porfirinas e hemoglobina. A função mais

importante da CoA é atuar no transporte de ácidos carboxílicos, que têm o potencial de se transferir

a outros grupos e estando na forma ligada à CoA se tornam “ativos”. A forma mais comum é a que

liga o ácido acético para formar acetil-CoA, composto comum de rotas catabólicas e anabólicas,

tendo atividade fundamental no ciclo de Krebs. A proteína transportadora de grupos acila (ACP)

substitui a CoA durante o processo de síntese de ácidos graxos. O ácido pantotênico também

estimula a formação de anticorpos através da incorporação de aminoácidos às imunoglobulinas.

Figura 21. Estrutura da coenzima A

Deficiência do ácido pantotênico

A deficiência de ácido pantotênico produz, em geral, os seguintes sinais: retardo no

crescimento e na eficiência de conversão de alimento, lesões na pele, transtornos do sistema

nervoso, desordens gastrointestinais, inibição da formação de anticorpos e diminuição da função

adrenal. Em suínos é característico ocorrer desordens do sistema locomotor. Em condições severas,

observa-se “passo militar ou de ganso”. Com o avanço do problema podem cair ou sentar na

“posição de cachorro”. O problema ocorre por desmielinização dos nervos braquial e ciático. Nas

115

porcas ocorre falha na fertilidade. Nas aves, a deficiência de ácido pantotênico se reflete em baixa

produção e eclodibilidade de ovos, além de dermatite, problemas de locomoção, anomalias na

plumagem e inflamação das pálpebras, fazendo com que os olhos fiquem grudados. Em cães se

observa apetite errático, perda de peso, baixa resposta imune e diminuição de colesterol e de

lipídeos no sangue.

Toxicidade

Como a maioria das vitaminas do complexo B, o ácido pantotênico não apresenta toxicidade

conhecida em doses relativamente elevadas. Em ratos se observa dano hepático com doses de 100

vezes o requerimento nutricional.

116

Biotina

O nome biotina foi dado por Kögl e Tönnis em 1936 a um fator de crescimento isolado da

gema de ovo necessário para leveduras. Por muitos anos acreditou-se que a biotina não era um

composto essencial devido a sua ampla distribuição nos alimentos e a sua síntese pela microflora

intestinal. Entretanto, o achado de lesões de pele e perda de pelo em animais e pessoas que

consumiam grandes quantidades de ovo cru levou à identificação de um composto antagonista da

biotina (avidina) e à revisão da essencialidade desta vitamina. A avidina é uma proteína termolábil,

secretada pelo oviduto das aves, que se encontra na clara do ovo. A biotina é uma molécula orgânica

nitrogenada com um núcleo de enxofre e grupo funcional carboxílico (Figura 22). Pode existir em

forma livre (biotina) ou ligada a proteínas (biocitina) através do grupo carboxila a um aminoácido,

geralmente lisina. Está presente em muitos alimentos e deve ser absorvida na forma livre no

intestino, para o qual conta com uma enzima de origem pancreática e intestinal chamada

biotinidase, que rompe a ligação presente na biocitina. Ruminantes e equinos não possuem

requerimentos de biotina devido à síntese desta vitamina pelas bactérias do trato intestinal. Nas

demais espécies os requerimentos rondam 0,1-0,2 ppm na dieta (MS). Perus têm maiores

requerimentos do que frangos.

Figura 22. Estrutura da biotina

Funções da biotina

A biotina é uma coenzima nas reações de carboxilação, nas quais ela serve como carregador

do dióxido de carbono ativado. A biotina liga-se covalentemente ao grupo ε-amino de resíduos de

lisina nas enzimas dependentes de biotina. A biotina constitui um grupo prostético de várias

enzimas que participam em reações de carboxilação. As mais importantes dessas enzimas são a

117

piruvato carboxilase (que catalisa a conversão do piruvato em oxalacetato, participando de forma

essencial na via de gliconeogênese), a acetil-CoA carboxilase (que catalisa a conversão do acetil-

CoA em malonil-CoA, participando na biossíntese de ácidos graxos), e a propionil-CoA carboxilase

(produzindo metil-malonil-CoA, essencial no aproveitamento de propionato para a gliconeogênese

nos ruminantes e de ácidos graxos de número ímpar de carbonos em todas as espécies animais). No

metabolismo dos glicídeos, a biotina participa como coenzima nas seguintes reações: carboxilação

de piruvato a oxalacetato, conversão de malato a piruvato, interconversão de succinato a propionato

e conversão de oxalosuccinato a α-cetoglutarato. No metabolismo nitrogenado, a biotina participa

em reações de síntese proteica, desaminação de aminoácidos, síntese de purina e metabolismo dos

ácidos nucleicos. No metabolismo dos ácidos graxos participa da primeira reação de síntese como

coenzima da acetil-CoA carboxilase que converte acetil-CoA em malonil-CoA. A biotina é

requerida na síntese de ácidos graxos insaturados de cadeia longa. Na deficiência de biotina está

comprometida a síntese de ácido araquidônico e, portanto, de prostaglandinas.

Deficiência de biotina

Apesar de a biotina ser essencial para o funcionamento normal de adrenal, tireoide, trato

reprodutivo e sistema nervoso, o sinal clínico mais característico da sua deficiência é a dermatite.

Os casos de deficiência são raros porque a vitamina está amplamente distribuída nos alimentos e

uma grande proporção das necessidades de biotina é suprida por bactérias intestinais. Em vacas

leiteiras, casos de deficiência são relatados esporadicamente, onde se observam lesões nos cascos

devido à falha na síntese de proteína da camada granular na sola do casco. Em suínos foram

relatados casos de deficiência de biotina por uso de sulfatalidina ou clara de ovo cru. No primeiro

caso por depressão da microflora intestinal e no segundo por efeito antagônico da avidina sobre a

biotina. Também pode ocorrer deficiência na presença de streptavidina, proteína proveniente da

actinobactéria Streptomyces avidinii, que liga a biotina com muita avidez, inviabilizando sua

utilização. A bactéria está presente no solo, em alimentos mofados e em excrementos. Os sinais

clínicos de deficiência de biotina em suínos se caracterizam por alopecia, dermatite, úlceras

cutâneas, inflamação da mucosa oral e lesões dos cascos (rachaduras), além de crescimento

retardado e prejuízo na conversão alimentar. Em aves, os sinais de deficiência são crescimento

reduzido e ineficiente conversão, além de dermatite, problemas de plumagem (penas quebradas),

deformações em pernas e bicos e inflamação das pálpebras. Os sinais em aves são similares à

deficiência de ácido pantotênico, mas na deficiência de biotina primeiro aparecem as lesões nas

pernas e depois em bico e olhos, enquanto na deficiência de ácido pantotênico aparecem antes os

118

problemas nos olhos e só em casos severos se observam problemas nas pernas. A deficiência de

biotina em aves pode causar perose, sinal típico da deficiência severa de Mn. Em cães, a deficiência

de biotina se manifesta por pelo sem brilho e quebradiço, dermatite e prurido. Em gatos se observa

diarreia sanguinolenta, anorexia e emaciação, além de dermatite, alopecia e hipersalivação.

Toxicidade

A biotina aparentemente não é tóxica, mesmo em grandes doses. Em suínos e aves, espécies

em que se acostuma suplementar esta vitamina, são indicados níveis de tolerância de até 10 vezes

os requerimentos. A suplementação desta vitamina deve ser realizada de forma muito criteriosa,

devido a ser uma das vitaminas mais caras.

119

Folacina (ácido fólico)

O ácido fólico ou folacina começou seu protagonismo como molécula essencial no

metabolismo quando foi descoberto, em 1931 por Willis, que um fator presente em leveduras

funcionava para tratar anemia macrocítica tropical em mulheres na Índia. Day e colaboradores em

1935 também descreveram um fator presente em leveduras e extratos hepáticos que prevenia

anemia em macacos e que designaram como vitamina M. Similar achado em frangos foi relatado

em 1939 por Hogan e Parrot, que identificaram um fator hepático chamado Bc. Finalmente, em

1940, Snell descreveu um fator de crescimento obtido de folhas de espinafre, sendo designado como

ácido fólico, do latim folium (folhas). Ele identificou o ácido fólico como sendo a mesma vitamina

M e o fator Bc. A deficiência de ácido fólico é mais relatada em mulheres grávidas como fator de

prevenção de anemia megaloblástica, doenças cardiovasculares e defeitos da medula espinhal em

fetos, como espinha bífida e anencefalia. Em animais, as necessidades de folacina são preenchidas

pelos alimentos e pela síntese bacteriana intestinal. A folacina está amplamente distribuída nos

alimentos, especialmente nas carnes. Aves e suínos podem requerer suplementação de folacina em

determinadas condições, como em alimentos contendo sulfas ou grãos contaminados com fungos.

As células cancerosas, devido a seu rápido crescimento, têm maiores necessidades de folacina, fato

que motivou o uso de drogas inibidoras da síntese de folacina em terapia oncológica química

(metotrexate e 5-fluorouracila).

A estrutura da folacina tem 3 partes diferenciadas (Figura 23): um núcleo de pteridina, uma

molécula de ácido p-aminobenzoico (PABA) e uma molécula de glutamato. Nos alimentos naturais,

podem existir de um a nove resíduos de glutamato em sua estrutura. Na forma sintética, existe

apenas um resíduo. Depois de ser absorvido no intestino, o ácido fólico é reduzido a sua forma

ativa, o tetra-hidrofolato (THF ou H4folato) nos lisossomos, pela enzima H2folato-redutase. Na

circulação, a vitamina encontra-se como N5-metil-H4folato. Dentro das células, o H4folato aparece

na forma poliglutâmica, a qual é biologicamente mais potente, sendo, dessa forma, armazenado no

fígado. Os inibidores da ação de folacina, usados como drogas anticancerígenas, atuam bloqueando

a conversão do ácido fólico a H4folato ou bloqueando a transferência de unidades de carbono do

H4folato às moléculas aceptoras. Os requerimentos de folacina são desconhecidos para ruminantes

e equinos devido à síntese microbiana intestina. Nas demais espécies são da ordem de 0,2 a 1,3

ppm na dieta (MS), sendo maior em porcas gestantes. Em todas as espécies as necessidades de

folacina aumentam na lactação e na gestação.

120

Figura 23. Estrutura do ácido fólico

Funções do ácido fólico

A forma ativa do ácido fólico é o ácido 5, 6, 7, 8-tetra-hidrofolato (Figura 24), o qual está

envolvido com a transferência de unidades de carbono em várias reações de síntese de lipídeos,

proteínas, ácidos nucleicos, hormônios e neurotransmissores.

Figura 24. Estrutura do tetra-hidrofolato

(THF ou H4folato)

As unidades de C podem ser grupos metila, metilene e formila. Uma importante reação é a

transferência de unidades simples de C da serina ao THF para formar 5-metilTHF. Este composto

fornece os grupos metila para a homocisteína, passo necessário para a síntese de metionina. Outras

transferências de grupos metila são essenciais na síntese de purinas e pirimidinas, na formação de

ácidos nucleicos, ressaltando a importância da folacina na reprodução e multiplicação celular, efeito

121

que é mais notório em tecidos de rápido crescimento. O THF também participa na interconversão

de serina e glicina, na degradação de histidina e na síntese de grupos metila para compostos como

metionina, colina e timina. A atividade desta vitamina é necessária na hematopoiese, na

manutenção do sistema imune e na função exócrina do pâncreas. A vitamina B12 está estreitamente

ligada à ação da folacina, pois regula a proporção de grupos metila a serem transferidos pelo THF

e também é necessária para o transporte de metil-THF através das membranas.

Deficiência de ácido fólico

Uma dieta sem folato pode causar uma deficiência em poucas semanas. O principal resultado

da deficiência de ácido fólico é a anemia megaloblástica (macrocítica) e leucopenia, causadas pela

diminuição na síntese de purinas e pirimidinas, que leva a uma incapacidade das células sanguíneas

precursoras em produzir DNA e, portanto, se dividir.

Os tecidos mais afetados na deficiência de ácido fólico são aqueles de rápida taxa de

crescimento ou regeneração, como epitélio gastrointestinal, epiderme e medula óssea. Nos

ruminantes, as bactérias ruminais preenchem as necessidades de folacina. Porém, animais jovens

podem sofrer deficiências, as quais se manifestam por leucopenia, com predisposição a sofrer

infecções que podem causar diarreia, pneumonia e morte. Em porcas gestantes com deficiência de

folacina ocorre mortalidade embrionária ou diminuição da leitegada. As aves são talvez a espécie

que sofre mais com dietas deficientes de folacina. Nesses casos ocorre uma severa anemia

megaloblástica, baixo crescimento e eficiência alimentar, além de problemas na plumagem, a qual

sofre descoloração, baixa produção de ovos e eclodibilidade e até perose. Em humanos, a

deficiência de folacina é a deficiência vitamínica mais comum, estando muito associada a condições

de pobreza e má nutrição.

Toxicidade

A folacina é considerada uma vitamina não tóxica.

122

Cianocobalamina (vitamina B12)

A vitamina B12 foi a última vitamina a ser descoberta em 1948 por Rickes e colaboradores,

e possui algumas características que a fazem única entre as demais vitaminas: é a mais potente das

vitaminas com baixas quantidades requeridas, é sintetizada somente por micro-organismos, de

forma que não se encontra nos vegetais, e tem na sua estrutura um núcleo de cobalto (Co). Os

animais obtêm a vitamina pré-formada, a partir de sua flora bacteriana natural ou pela ingestão de

alimentos derivados de outros animais. A cianocobalamina está presente em quantidades

apreciáveis no fígado, no leite, em ovos, camarões frescos, carne de porco e de galinha. A história

da cianocobalamina se remonta a início do século 19, quando Combe descreveu uma anemia fatal

em humanos, que foi chamada de anemia perniciosa. Vários pesquisadores procuravam um fator

hepático que fosse efetivo no tratamento da anemia perniciosa, que inicialmente foi confundido

com o ferro. Em 1929, Castle postulou que a anemia perniciosa era devida a uma interação entre

um fator extrínseco (na dieta) e um fator intrínseco (no suco gástrico). Após a descoberta da

vitamina B12 por Rickes, foi elucidada a sua complicada estrutura em 1956 e em 1961 foi relatada

a forma coenzimática da vitamina (coenzima B12) por Lenhert e Hodgkin. Esta última pesquisadora

recebeu o prêmio Nobel pela elucidação da estrutura da vitamina B12 mediante cristalografia de

raios X.

Figura 25. Estruturas da vitamina B12 e da coenzima B12

123

A estrutura da vitamina B12 lembra a da porfirina, com 4 núcleos pirrólicos unidos entre si

com átomos de N em cada núcleo coordenados a um átomo de Co (Figura 25). A estrutura básica

tetrapirrólica aqui recebe o nome de núcleo de corrina, acoplada em baixo com um nucleotídeo e

em cima com um cianeto (CN), o que lhe dá o nome de cianocobalamina. A forma ativa da vitamina

B12 é a coenzima B12, que pode estar em duas formas: a cobamamida ou adenosilcobalamina, na

qual o CN é substituído pela 5’-desoxiadenosina e a metilcobalamina, na qual o CN é substituído

por um grupo metila.

A vitamina B12 precisa de compostos que se unem a ela para poder ser absorvida no intestino.

Inicialmente, no estômago, por efeito do baixo pH e as peptidases, a B12 é liberada e posteriormente

ligada a um fator não intrínseco, secretado pela saliva, conhecido como cobalofilina. Dessa forma

ingressa no intestino, onde o meio alcalino e as proteases pancreáticas liberam a B12 da cobalofilina

para se unir a um fator intrínseco. Insuficiência pancreática pode causar baixa absorção e

deficiência de B12. O fator intrínseco é uma glicoproteína secretada pelas células parietais do

estômago e a ligação da vitamina B12 a este fator é indispensável para a sua absorção no íleo. Depois

de absorvida, a vitamina B12 é transportada pelo sistema portal por outras proteínas conhecidas

como transcobalaminas, das quais foram identificados os tipos I, II e III. De forma sucinta, para a

correta absorção de vitamina B12 são necessários os seguintes requisitos: adequada quantidade de

vitamina B12 na dieta, normal função gástrica para liberar a vitamina B12 das proteínas da dieta,

normal produção de cobalofilina na saliva, normal produção de fator intrínseco no estômago,

normal função pancreática para liberar a vitamina B12 do fator intrínseco e normal função absortiva

do íleo (receptores). Nos ruminantes, a produção de vitamina B12 é garantida pelas bactérias

ruminais, desde que tenham fonte de Co. Apenas 3% do Co da dieta é convertido em vitamina B12

no rúmen, e do total desta vitamina produzida, apenas 1 a 3% é absorvida no íleo, mas é quantidade

suficiente para as necessidades do animal. O principal órgão de armazenamento da vitamina B12 é

o fígado, onde também é realizada a transformação para as formas ativas coenzimáticas.

Os requerimentos da vitamina B12 são muito baixos (da ordem de ppb na dieta), o que a faz

a mais potente vitamina. Em geral, os requerimentos em animais monogástricos rondam os 9 a 26

ppb na dieta (MS), sendo maiores em cão e gato e menores nas aves. Nos ruminantes, é essencial a

disponibilidade de Co no alimento. Concentrações de Co no solo menores de 2 ppm são

consideradas deficitárias para ruminantes. Devem-se considerar situações de alta pluviosidade e

rápido crescimento das plantas como fatores que podem diluir a quantidade de Co nas plantas e

chegar a ser deficitário para os animais. Sabe-se também que o Co é necessário para as bactérias

fixadoras de N nas raízes das leguminosas.

124

Funções da vitamina B12

A vitamina B12 atua, na sua forma coenzimática, no metabolismo de aminoácidos, proteínas,

ácidos nucleicos, ácidos graxos e glicídeos. Nos animais, a coenzima B12 é necessária para a

atividade de três enzimas: metilmalonil-CoA mutase e leucina mutase (na forma de

adenosilcobalamina) e metionina sintetase (na forma de metilcobalamina). Nos animais

ruminantes, a reação da metilmalonil-CoA mutase é indispensável para a conversão do propionato

(proveniente da fermentação de glicídeos no rúmen) até succinil-CoA, como fonte de glicose (rota

de gliconeogênese, Figura 26).

Figura 26. Via de utilização do propionato para dar succinil-CoA

A reação 4 corresponde à metilmalonil-CoA mutase, enzima que

requer a coenzima B12

Animais ruminantes com deficiência de Co e, portanto, de vitamina B12, sofrem de

hipoglicemia e desencadeiam sinais de anorexia, enfraquecimento e baixo desempenho. Nesses

casos, a aplicação parenteral de vitamina B12 melhora o apetite em poucas horas e o fornecimento

de Co via oral leva a melhora em 7 a 10 dias. Esta reação também cobra importância na degradação

de alguns aminoácidos e na utilização de ácidos graxos com número ímpar de átomos de carbono.

Na deficiência de vitamina B12, ácidos graxos anormais acumulam-se e são incorporados nas

125

membranas celulares, incluindo as do sistema nervoso. Isso pode contribuir para algumas

manifestações neurológicas da deficiência da vitamina B12. Os efeitos da deficiência de cobalamina

são mais pronunciados em células que se dividem rapidamente, tais como o tecido eritropoiético

da medula óssea e as células da mucosa intestinal. Esses tecidos necessitam das formas N5-N10-

metileno e N10-formil do tetra-hidrofolato (THF) para a síntese de nucleotídeos, necessários para a

replicação do DNA. Na deficiência da vitamina B12, a forma N5-metil-THF não é usada

eficientemente. Uma vez que a forma metilada não pode ser convertida diretamente em outras

formas de THF, a forma N5-metil acumula, enquanto os níveis das demais formas diminuem.

Assim, pode ocorrer uma deficiência de formas de THF necessárias para a síntese de purinas e de

timina, resultando em sinais de anemia megaloblástica (anemia perniciosa), sinal característico em

humanos, mas não em animais. O derivado metil da coenzima B12 é requerido na conversão de

homocisteína em metionina. Outra função importante da vitamina B12 é na manutenção dos grupos

sulfidrilo (-SH) do glutation na forma reduzida.

Deficiência da vitamina B12

Nos animais, diferentes dos humanos, não são encontrados os sinais mais importantes da

deficiência de vitamina B12 como são anemia megaloblástica (anemia perniciosa) e lesões

neurológicas, muito embora possa ser observada uma anemia moderada em suínos e ruminantes.

Os sinais neurológicos na deficiência de B12 ocorrem por deficiência de derivados de H4folato,

necessários para a síntese de purinas e dTMP (e, portanto, DNA). A deterioração neurológica deve-

se à desmielinização progressiva do tecido nervoso. Na deficiência de B12 ocorre interferência com

a formação da mielina devido ao acúmulo de metil-malonil, o qual é inibidor competitivo do

malonil-CoA, interferindo, portanto, na síntese de esfingomielina. Em humanos, a deficiência de

vitamina B12 está relacionada à deficiência de fator intrínseco ou a dietas estritamente vegetarianas.

Nos ruminantes, a deficiência de Co é determinante em casos de deficiência de vitamina B12,

situação conhecida como marasmo enzoótico, caracterizado por anorexia, pelo áspero,

engrossamento da pele, anemia, emaciação e, eventualmente, morte, caso não haja tratamento ou

mudança de alimentação. A deficiência de Co tem sido associada a fotossensibilização em

cordeiros, situação caracterizada por cabeça inchada, que responde a tratamento parenteral com

vitamina B12. Em ocasiões, a deficiência de Co pode levar a cetose e fígado gorduroso por causa da

extrema deficiência de energia, uma vez que está bloqueada a via gliconeogênica a partir de

propionato ruminal. Em suínos, a deficiência de vitamina B12 leva a anorexia, perda dramática do

crescimento e anemia tipicamente microcítica embora moderada. Também pode aparecer pelo

126

áspero, vômito e diarreia, bem como sinais neurológicos, como excitabilidade, incoordenação e

vocalização. Em fêmeas, a deficiência se manifesta por reprodução alterada, principalmente falhas

no estro, aborto, diminuição de leitegadas e mortalidade neonatal. Em aves, a deficiência de B12

reduz crescimento e consumo de alimento e piora a conversão alimentar. Também pode haver sinais

nervosos e plumagem defeituosa. Perose pode ocorrer de forma secundária devido à falta de colina

ou metionina como fontes de grupos metila. Outros sinais encontrados incluem anemia, erosão de

moela e infiltração de gordura no coração, fígado e rins. Em poedeiras, a eclodibilidade se vê

seriamente reduzida. Em cães e gatos, a deficiência de B12 se manifesta principalmente por anemia

não regenerativa, baixo crescimento, emaciação, letargia, reprodução comprometida e, em gatos,

também se observa alta excreção de ácido metilmalónico. Em cavalos não se relata deficiência de

vitamina B12 devido a sua síntese pelas bactérias intestinais e sua posterior absorção.

Toxicidade

A suplementação de vitamina B12 não representa risco, mesmo em quantidades elevadas. Em

ruminantes, a necessidade é de Co mais do que vitamina B12, devido ao processo de síntese desta

vitamina pelas bactérias do rúmen. Nesses animais pode existir necessidade de suplementação com

Co, o qual não pode exceder 5 ppm na dieta. A toxicose de Co produz policitemia moderada,

respiração dificultosa e excessiva defecação, micção e salivação.

127

Colina

Embora a colina não preencha as condições totais de uma vitamina (nutriente essencial

requerido em pequenas quantidades que deve ser obtido na dieta) tem sido classificada como

vitamina do complexo B. Pode ser sintetizada pelo fígado e é requerida em grandes quantidades,

uma vez que faz parte da estrutura da maior parte dos fosfolipídeos (> 50%) das membranas animais

e do neurotransmissor acetilcolina. Não é requerida como coenzima. A colina foi isolada por

Streker, em 1849, na bile de porcos a partir da lecitina (fosfatidil-colina). Mais tarde, em 1867, foi

estabelecida a sua estrutura química por Bayer e em 1929 foi determinado o seu papel essencial na

formação da acetilcolina. Na década de 1920 foi observado o potencial da colina na prevenção de

lipidose hepática em cães, com privação de insulina, atribuindo desde então sua característica como

“fator lipotrópico”. A colina é uma amônia ligada a 3 grupos metila que lhe conferem sua

capacidade como doadora de grupos metila, além de estar unida a um grupo hidroxietila. A

acetilcolina é um ácido acético com ligação éster de colina e a lecitina é um fosfoglicerídeo com

uma colina ligada no C3 (Figura 27).

Figura 27. Estruturas da colina, acetilcolina e lecitina

(fosfatidilcolina). R1 e R2 representam ácidos graxos

Embora a colina possa ser sintetizada nos tecidos animais, principalmente no fígado, pode

não haver quantidades suficientes às necessidades do organismo quando seus precursores e/ou

mediadores (metionina, vitamina B12 e folacina) estão deficitários. A colina é sintetizada como

128

lecitina nos tecidos pela metilação sequencial da fosfatidil-etanolamina, com participação de uma

N-metiltransferase e com S-adenosilmetionina como doador de grupos metila. A colina pode ser

obtida na dieta a partir do consumo de fosfolipídeos que a contenham. Os requerimentos são bem

maiores do que a maioria das vitaminas, estando em torno de 2.000 ppm na dieta. A colina está

presente em todos os tecidos como componente dos fosfolipídeos de membrana e sua liberação nas

células ocorre por ação da fosfolipase C, que quebra a lecitina para render diacilglicerol e

fosfocolina. Apenas uma pequena quantidade da colina é acetilada com acetil-CoA para produzir

acetilcolina, por ação da enzima colina-acetiltransferase, presente em terminações nervosas

colinérgicas. A acetilcolina deve ser hidrolizada de novo, após o estímulo nervoso, mediante a

enzima acetilcolinesterase.

Funções da colina

A colina participa das seguintes funções: (1) na forma de lecitina faz parte da estrutura das

membranas celulares e das lipoproteínas de muito baixa densidade (VLDL), que transportam

triglicerídeos no sangue, além de ser fator essencial no amadurecimento da cartilagem óssea; (2) é

um “fator lipotrópico” evitando a esteatose hepática mediante a promoção do transporte de ácidos

graxos na forma de lecitina ou a utilização dos ácidos graxos no próprio fígado; (3) é precursora da

acetilcolina, neurotransmissor do sistema nervoso parassimpático; e (4) é fonte de grupos metila

participando da síntese de metionina e creatina. O envolvimento das vitaminas folacina e B12, bem

como da metionina, no metabolismo dos grupos metila, faz com que estas substâncias possam

substituir parcialmente as necessidades de colina. Esta última função (doador de grupos metila)

constitui o principal fator que determina a patologia em casos de deficiência de colina. Para ser

fonte de grupos metila, a colina é convertida em betaína (composto produzido por oxidação da

colina).

Deficiência de colina

Os principais sinais de deficiência de colina incluem baixo crescimento, lipidose hepática,

perose em aves, hemorragia no rim e nas articulações e hipertensão. A severidade dos sinais clínicos

está influenciada por outros nutrientes como metionina, vitamina B12, folacina e gordura. Os

ruminantes obtêm grande parte das necessidades de colina a partir da sua síntese pelas bactérias

ruminais, mas em ocasiões de alta exigência metabólica (altas taxas de crescimento em gado de

corte, alta produção em vacas leiteiras) a quantidade de colina pode não ser suficiente, sendo

129

recomendado suplementar com até 750 ppm de colina na dieta. Em vacas leiteiras de alta produção

é comum a suplementação de colina como preventivo de lipidose hepática, embora tenha pouco ou

nenhum efeito sobre a produção ou sobre o percentual de gordura no leite. Em suínos, a deficiência

de colina produz leitões de conformação alterada (pernas curtas e barrigudos), incoordenação de

movimentos, lipidose hepática, oclusão renal e, em recém-nascidos, uma condição de pernas

estendidas que pode ser prevenida com suplementação de colina nas fêmeas gestantes. Esta última

condição aumenta quando é reduzida a quantidade de alimento fornecido às porcas gestantes (de

3,2 a 1,5 kg/dia), o que resulta em menor consumo de colina e metionina. A deficiência de colina

também se manifesta nas porcas por baixa taxa de concepção e diminuição da leitegada. Em aves

jovens (frangos e perus), a deficiência de colina causa retardo no crescimento e perose,

provavelmente em função do papel da colina no processo de maturação da cartilagem óssea. Em

galinhas poedeiras, a suplementação de colina previne a esteatose hepática. Em cavalos não se

conhecem evidências de deficiência de colina.

Toxicidade

Intoxicação experimental com colina pode resultar em sinais clínicos como salivação,

tremores, puxadas musculares, cianose, convulsões e paralise respiratória. Fornecimento de colina

em quantidades que dobrem os requerimentos diários (2.000 ppm) não tem maiores efeitos em

suínos, porém pode causar efeitos em frangos, tais como menor crescimento e piora na eficiência

alimentar.

130

Ácido ascórbico (vitamina C)

A história da vitamina C se confunde com a história do escorbuto, uma doença em humanos

caracterizada por sinais clínicos de gengivite hemorrágica e perda de dentes, sendo potencialmente

fatal por causa de múltiplas hemorragias. O escorbuto foi descrito desde tempos ancestrais, sendo

relatadas epidemias quando havia carência de frutas frescas, principalmente de frutas cítricas. Em

1747, James Lind, médico da Marinha Britânica relacionou o escorbuto, que acometia os

marinheiros em viagens prolongadas, com a deficiência de frutas frescas e estabeleceu a rotina de

fornecer limões aos soldados. Em 1907, Holst e Frolich descobriram que o porquinho-da-índia

(cobaia) podia sofrer de escorbuto, proporcionando assim um animal experimental para o estudo

da deficiência de vitamina C. Em 1928, Szent-Györgyi isolou um fator antiescorbuto em várias

frutas, denominando-o ácido hexurônico, um derivado da glicose. Inicialmente, devido aos altos

requerimentos comparado com outras vitaminas, o ácido ascórbico não foi considerado como

vitamina, mas em 1933, o ácido hexurônico foi sintetizado por Richstein e estabelecida sua

atividade como fator antiescorbuto, designado-o como vitamina C.

A vitamina C é um composto hidrossolúvel e termolábil, que pode ser sintetizado pelas

plantas e pelos tecidos da maioria das espécies animais, com exceção de primatas, cobaia, peixes,

morcegos frutívoros, insetos e algumas aves. Essas espécies têm deficiência da enzima

gulonolactona oxidase, que converte L-gulonolactona em 2-ceto-gulonato, composto que se

transforma por isomerização espontânea em ácido L-ascórbico. A forma ativa da vitamina C é o

ácido ascórbico (Figura 28) que pode estar na forma reduzida ou oxidada (ácido dehidroascórbico).

Figura 28. Estrutura do ácido ascórbico (formas oxidada e reduzida)

A forma oxidada pode sofrer outra oxidação, se convertendo na forma inativa, denominada

ácido dicetogulônico, evento que pode ser acelerado pela luz e calor. Este fato faz da vitamina C a

131

mais instável das vitaminas. Os animais domésticos não têm requerimentos nutricionais de vitamina

C, pois podem sintetizar as quantidades necessárias, existindo requerimentos apenas naquelas

espécies com deficiência da enzima gulonolactona oxidase.

Funções da vitamina C

Apesar de a vitamina C não ter forma coenzimática conhecida, ela participa em diversas

reações. Um papel muito bem documentado é seu envolvimento na síntese de colágeno, proteína

fibrosa componente da pele e do tecido conectivo. A vitamina C participa das reações de

hidroxilação da lisina e da prolina, para produzir hidroxi-lisina e hidroxi-prolina, as quais são

necessárias na síntese do colágeno, sendo essencial tanto para a manutenção normal do tecido

conectivo, como para recompor tecidos danificados. Dessa forma, a vitamina C participa na

cicatrização de feridas e fraturas e no controle de sangramentos gengivais. O requerimento da

vitamina C nesses processos tem a ver com um efeito protetor da hidroxilase, através da oxido-

redução de núcleos de Fe e grupos tiol presentes na enzima. A vitamina C mantém o estado ferroso

(Fe2+) do Fe ligado à enzima, e mantém os grupos tiol no seu estado reduzido (-SH).

Adicionalmente, a vitamina C facilita a absorção do Fe da dieta no intestino.

O ácido ascórbico tem a capacidade de ceder e receber elétrons, o que lhe confere um papel

essencial como antioxidante, estabilizando as células mediante a proteção dos lipídeos das

membranas, evitando sua peroxidação pelos radicais livres. Assim, o ácido ascórbico torna-se

essencial na resposta imune do organismo. Os principais mecanismos contra o dano dos radicais

livres envolvem, além da vitamina C, o β-caroteno (vitamina A) e a vitamina E, como as principais

vitaminas antioxidantes, além das metaloenzimas glutation peroxidase (Se), catalase (Fe) e

superóxido dismutase (Cu, Zn, Mn). A vitamina C também tem efeito estimulador da atividade

fagocítica dos leucócitos, da função do sistema retículo-endotelial, da formação de anticorpos e da

produção de interferon, contribuindo assim na defesa contra as infecções. Por outra parte, a

vitamina C reduz a quantidade de glicocorticoides circulantes, os quais têm efeito supressor sobre

a função dos neutrófilos, e tem efeito poupador da vitamina E mediante a regeneração da forma

reduzida do α-tocoferol.

Deficiência de vitamina C

Em termos práticos, os animais domésticos não sofrem de deficiência de vitamina C, uma

vez que a sintetizam a partir da glicose no fígado e no rim. Entretanto, em situações de dietas

132

desbalanceadas, transtornos metabólicos, ou em deficiência de vitaminas A e/ou E, pode haver

sinais de deficiência de vitamina C, que incluem escorbuto, principalmente em ruminantes jovens

sob condições estressantes (frio, umidade, baixo consumo de colostro). Nestes animais, a síntese

de vitamina C começa a funcionar a partir das 2 a 3 semanas de vida, tendo os níveis adultos até os

3 meses de idade. Os ruminantes são a espécie que mais poderia sofrer de deficiência de vitamina

C, em comparação com os monogástricos, porque não tem acesso a fonte exógena, uma vez que o

ácido ascórbico da dieta é destruído pela flora ruminal. Em suínos recém-desmamados, sob

condições ambientais adversas, pode ocorrer deficiência de vitamina C, principalmente se existe

um balanço energético negativo. Nesses casos, podem se observar sinais como fraqueza, dor óssea

e hemorragias cutânea e muscular. Situação similar pode ser observada em pintinhos recém-

nascidos, principalmente se há condições de manejo estressantes, tais como frio ou calor excessivo,

subnutrição, vacinações e presença de doenças como a coccidiose. Nessas condições, a

suplementação de vitamina C (150 ppm na dieta) melhora o desempenho dos frangos. Em galinhas

poedeiras, recebendo 100 ppm de vitamina C pode haver melhoria na vida de postura, na qualidade

da casca e na produção de ovos. Suplementos de 200 ppm de vitamina C em frangos sob condições

de estresse por calor podem melhorar as respostas de ganho de peso e conversão alimentar.

O porquinho-da-índia, espécie que não pode sintetizar vitamina C, pode manifestar a

deficiência em anorexia, perda de peso, anemia e hemorragias dispersas. A típica deficiência de

vitamina C resulta em humanos no escorbuto, uma doença caracterizada por gengivas doloridas e

esponjosas, dentes frouxos, fragilidade dos vasos sanguíneos, edemas nas articulações e anemia. A

maioria dos sinais pode ser explicada por uma deficiência na síntese do colágeno, resultando em

tecido conectivo defeituoso.

Toxicidade

Em geral, altas doses de vitamina C são bem toleradas, tendo se relatado efeitos tóxicos em

megadoses, que incluem acidose, problemas gastrointestinais e glicosúria. Como a vitamina C

melhora a absorção intestinal de Fe, pode ocorrer acúmulo de Fe (hemocromatose), que afeta a

função hepática.

133

Carnitina

Para a maioria das espécies animais, a carnitina não é considerada uma vitamina, uma vez

que pode ser sintetizada pelo próprio organismo. Porém, em circunstâncias em que a síntese está

diminuída devido à falta dos seus aminoácidos precursores (metionina e lisina) pode haver

situações deficitárias. A carnitina é essencial em alguns insetos, como o bicho-da-farinha (Tenebrio

molitor) e a mosca das frutas (Drosophila melanogaster), nas quais constitui uma verdadeira

vitamina. A carnitina foi isolada de extratos de carne e identificada em 1905. Fraenkel estudou os

requerimentos nutricionais do bicho-da-farinha, o qual é utilizado em alimentação animal, e propôs

o reconhecimento de uma vitamina do complexo B, a qual foi identificada como carnitina em 1932.

A carnitina é uma amina quaternária (β-hidroxi-γ-trimetilaminobutirato), similar à colina, bastante

solúvel em água, que pode estar na forma livre (Figura 29) ou como éster.

Figura 29. Estrutura da carnitina

(β-hidroxi-γ-trimetilaminobutirato)

A carnitina é sintetizada no fígado e no rim a partir de dois aminoácidos precursores,

metionina e lisina, tendo ainda como cofatores o ácido ascórbico, a nicotinamida, a piridoxina e o

Fe. É armazenada no tecido muscular e excretada pelo rim, o qual reabsorve quase 90% do total

excretado, tendo, portanto, um alto grau de conservação. Não existem requerimentos nutricionais

da carnitina nos animais, uma vez que quantidades adequadas são sintetizadas pelo organismo em

situação normal.

Funções da carnitina

A carnitina participa do transporte dos ácidos graxos de cadeia longa desde o citoplasma até

o interior da mitocôndria, onde sofrem β-oxidação. Os ácidos graxos esterificados com a coenzima

A (grupos acil-CoA) não podem atravessar a membrana da mitocôndria e devem ser transferidos à

134

carnitina, no citoplasma, por ação da enzima carnitina-acil transferase I, transformando-os em

grupos acil-carnitina, que entram na matriz mitocondrial, onde são retransferidos à coenzima A

mediante a enzima carnitina-acil transferase II. Dessa forma, os ácidos graxos (como grupos acil-

CoA) são oxidados dentro da mitocôndria para a geração de ATP. Portanto, o papel da carnitina é

considerado essencial para a utilização desses substratos energéticos. A carnitina também serve de

agente protetor das células contra o efeito tóxico de um possível acúmulo de compostos acil-CoA,

captando os grupos acila como ésteres de carnitina, os quais são depois transportados ao fígado

para serem catabolizados ou ao rim para serem excretados. Também são atribuídas funções à

carnitina em processos como lipólise, cetogênese e detoxificação de amônio.

Deficiência de carnitina

O principal evento que ocorre na deficiência de carnitina é a falha na oxidação dos ácidos

graxos, o que ocasiona um desvio desses compostos para a síntese de triglicerídeos, particularmente

no fígado, podendo levar a uma esteatose hepática. Além do balanço negativo de energia que a falta

de utilização de ácidos graxos pode ocasionar, quantidades acumuladas de grupos acil-CoA afetam

o ciclo de Krebs, a gliconeogênese e o ciclo da ureia, incrementado o déficit de energia e levando

a sinais clínicos que incluem encefalopatia e icterícia. Em ruminantes e outros animais, o uso de

carnitina é recomendado em casos de intoxicação por amônia por estimular a síntese de ureia e

consequentemente a incorporação de amônia. Estudos na patogenia da cetose das vacas e da

toxemia da gestação de ovelhas e cabras, têm levado à hipótese de uma desrepressão que sofreria a

enzima carnitina-acil transferase I, o que permitiria a entrada descontrolada de ácidos graxos ao

interior da mitocôndria e a geração excessiva de corpos cetônicos. Em outras espécies, como suínos,

a suplementação de carnitina produziu melhora no ganho de peso e diminuição de gordura na

carcaça. Em certas famílias de cães com cardiomiopatia dilatada têm sido encontrados baixos

valores de carnitina no miocárdio.

Toxicidade

Em animais não existem estudos que mostrem a tolerância máxima de carnitina. Apenas em

humanos foi relatada diarreia em casos de suplementação bem acima das quantidades consumidas

na dieta normal. O isômero D-carnitina interfere com a função normal do isômero L-carnitina, que

é o composto natural.

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