LEITE, Ana Mafalda - Oralidades

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Empréstimos da Oralidade na Produção e CríticaLiterárias Africanas

As literaturas africanas de língua portuguesa têm tido o seumaior desenvolvimento editorial e criat ivo, e ainda crít ico, nosúltimos vinte anos, após o acesso às independências políticas dos',cinco países africanos. Esta situação permitiu a criação de disciplinas curriculares que libertaram da antiga designação de"literatura ultramarina" cinco novas literaturas.

Mas a área de estudos literários africqnos, anglófonos efrancófonos, já existia com forte desenvolvimento havia pelo me

nos mais de duas décadas, em situação pós-colonial.Este facto está int imamente relacionado com os rumos das

.primeiras análises e estudos que tiveram lugar nas literaturas africanas de língua portuguesa. As teses e monografias recorreram,sempre, nas bibliografias secundárias a algum material crítico jáexistente e proveniente, na maioria dos casos, daquelas áreas. Noentanto, porque as literaturas nacionais dos cinco países africanos de língua oficial portuguesa, tiveram o seu percurso próprio,. um pouco distanciado do que acqnteceu no resto de África,exigiram e exigem diferente reflexão.

Tal facto não exclui o recurso, obrigatório tarnl?ém para o

estudioso desta área, às bibliografias e produção teórica que sevai fazendo no âmbito das outras literaturas africanas. A realização deste trabalho de pesquisa sobre a noção de "oralidade"l en-

IUsamos o concei to de Oralidade com uma dimensão ampla , abrangendo osentido de Oratura e Tradições orais ou ainda de Literatura OraL Isto.apesar de consideránnos pertinentes as observações de W, J Ong em relação às designações d~ oratura e literatura oral, que não são as mais adequadas e têm sido muitas vezes discutidas e postas em causa. Este. autorpropõe o uso de "verbal art forros" - formas de arte verbal - como altero

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Ana Mafalda Leite

quadra-se, assim, neste contexto de necessidade de apuramento eadequação à nossa àrea de alguns conceitos operatórios, comoeste em questão, em termos teóricos e analíticos.

Na sequência do movimento da Negritude e da necessidadede afirmação cultural da herança africana, os africanos e africanistas enveredaram pelos complexos e inúmeros caminhos datradição oral africana, quer ao nível da recolha e estudo dos textos e sua fixação e classificação, q'uer ainda na sua premeditadaincorporação nos universos da escrita literária.

Por outro lado a preocupação em legitimar um espaço próprio e diferencial das literaturas africanas em relação às literaturas europeias, marcadas inconscientemente com o signo colonial,levou a pressupostos teóricos e críticos que ainda hoje revelamalgumas fragilidades ou inadequações. O uso da "oral i dade"como instrumento de detecção de africanidade textual é um de

les. Na base deste estudo tentaremos situar a questão, procurando adequar de forma mais correcta a uti lidade do instrumentocrítico, não menosprezando a sua inegável aplicação ao universoliterário africano, mas legitimando~o em termos menos ideológi-cos.

A tendência para situar no âmbito da oralídade e'das tradi-ções orais africanas o discurso crít ico e a produção textual surgeainda de certo modo como forma de reacção a uma visão das literaturas africanas como satélites, derivados das li teraturas das"metrópoles". É um discurso que, de certo modo, se torna reactivo pela atitude inversa. De um cânone marcado pelo signo dacolonialidade, passa-se à assunção de outro, indígena, que tentacentripetamente encontrar, no âmbitó da cultura africana, os modelos próprios e autênticos.

A intertextualidade e afinidade dos textos literários africanoscom as literaturas europeias e a complexa rede de relações quecom elas estabelecem é um faclo incontornável. Contudo, umavez que estas literaturas, além deste enquadramento, são escritasna maioria dos casos na língua do colonizador, semelhante"calagem" levou por vezes a análises tendenciosamente paterna-

nativa às designações anteriores, Walter J Ong. Orality & Literacy, LO!1"

don, Roulledge, 1997, p. ]4,

Oralidades &: Escritas

l istas e a encarar a produção literária africana como uma espéciede produto neo-colonial.

Se, antes das independências, as obras e os autores s,ão enquadrados dentro do sistema literário da metrópok, posterior

mente, muitas das leituras tendem a situá~las intertextualmentedevedoras de obras e movimentos literários europeus, tendo emconta o espaço matriz de colonização, o que, naturalmente é ne~cessário fazer, mas não unicamente. A autonomização dos processos literários africanos, de língua portuguesa por exemplo,partilha diversas heranças intertextuais além da literatura portu~guesa (literatura latino e hispano-americana, literaturas africanasem outras línguas e os intertextos da tradição oral) que sãoigualmente importantes para a caracterização dos aspectos especificamente regionais e nacionais diferenciadores.

As designações abrangentes, ainda hoje usadas, do tipo,

"literaturas africanas de língua portuguesa"2, "literaturas lusófonas'\ "literaturas anglófonas e francófonas", são 'em si portadorasde urna significaçãQ ideológica obtusa, que permite a indefiriiçãon~cional, e leva a uma generalização do partic~lar em favor detraços apenas comuns pelo uso de um mesmo instrumento linguístico, e processos temáticos de contestação similares duranteo período colonial.

Escrita como continuidade da oralidade

Recuando um pouco no tempo, e tentando fazer parte dopercurso que levou africanos, africanistas, teóricos e escritores aconsiderar fundamental a oralidade, como um critério de análisedas literaturas africanas, começaremos por referir a intervenção

2 A este respeito Alfredo Margarida pôs à discussão o uso inadequado dadesignação clássica de "Literaturas africanas de expressão portuguesa"alertando para o lastro neo-colonialista patente na nomeação: "Não setrata de escrever em lfngua portuguesa, mas de se manter f iel à expressão

portuguesa, o que seria contraditório Com a substancia nacional daescrita"( ... ) Cin Estudos sobre Literaturas das Nações Africanas de

Língua Portuguesa, Lisboa , A Regra do Jogo, 1980, p; 8-,9.)

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" Ana Mafalda Leite

do senegalês Leopold Sédar Senghor. O poeta é um dos primeiros africanos a exprimir a jdeia de "continuidade" entre as tradições orais e a literatura africana, não s6 praticando na sua escri tapoética os recursos reclamados, mas também doutrinando sobreo assunto em vários textos ensaístic6~.

Na entrada do seu livro de poemas Éthiopiques afirma: "Envérité, naus sommes des lamantins, qui, selon lemythe africain,vont boire à Ia source ( .. ,)" (1964: 153). E mais adiante afirmaainda: "Les poe.tes negres, ceux de l'Anthologie3, comme ceux deJa traditian orale, sont, avant tout, des "auditifs", des chantres."

Esta ideia de herança oral, radicada nos "Mestres" africanos,os "griots", vai levar a criar uma noção de "continuidade" entre atrndiçfío oral e a Iiteratura. Criadores e críticos inferem essa relação como uma procura dos traços reveladores da passagem daoralidade para a escrita. E, entre outros, um dos instrumentos da

procura radicou e radica nos temas, e nas especificidades dos géneros orais. existentes na sociedade pré-colonial e ainda actualmente nas áreas rurais, menos alteradas pejas inevitáveis mudanças pós-coloniais.

Oralidade: entre ofacto e o mito

Tentar dilucidar a forma como é representada nos váriosdIscursos teóricos e crít icos a oralidade não é, de forma alguma,

questionar a sua inegável prevalência em África.

Semelhante pesquisa parece-nos de toda a utilidade, uma vezque na área de trabalho, a que nos dedicamos, o conceito é muitas vezes necessário, enquanto instrumento operatório de análisecrítica.

A questão não tem a ver com negação da importância daoralidade em África e nas literaturas africanas, mas antes com omodo como foram construídas e são entendidas as categoriasintelectuais de oralidade e, na sua esteira, de escrita e de literatura..

J Léopold Sédur Senghol'. Anthologie de Ia Nouvel lc Poésie Negra et Mal-,;achc, Paris, P.U.F., 1948.

Oralldades & Ellcritas

o discurso crít ico sobre esta matéria, que se estende de áreascorno a antropologia, linguística e teoria literária, edificou-se em simultâneo com a contribuição dos africanos e dos ocidentais.

Um dos pressupostos geralmente aceites e tidos como basede discussão da proeminência da: oralidade africana é a inexis

tência da escrita antes do contacto com os europeus.Tal ideia não leva em conta obviamente a aturada pesquisaque Albért Gérard realizou no seu brilhante estudo At!ican Lan-

guages Literatures onde nos revel<ã' importância dà~ )esde o século treze na região actuaImente corresponQ.ente à .Eti6pia, assim como outras áreas de África, em que a escríta em /

caracteres árabes te;ve relevo fundamental4 - isto para não referir j'

também os estudos anteriores de Cheik Anta Diop, em NationsNegres et Cultures, onde se defende que a civilização e escrita .egípcias foram um produto e um contributo para a cultura afric.a.::...-~na. i-'-'" ~-..,_-, -._..-., -.--_._~.__-'~ .

- cr reconhecimento e ideia aceite de que a literatura africana

moderna nasce a partir da introdução da escrita em África pelosei,Jropeus levou a urna curiosa dicotomia no discurso crítico: aescrita é europeia, a oralidade é africana. E aquilo que é um fenómeno acidental passa a ser encarado como um fenómeno essencial. Ou seja, a "natureza" cultura~~.A ...Qral;.~ão o~

~_~.~_ ..~~~. vÍ.e.r'lm.pyrt~rp~t est~~~~: .. e._~~rn~c.o ... ))

4 Com efeito a mais antiga presença da escrita em África es tá associada aouso dos caracteres árabes . Esta tradição começou com a introdução do15lão no continente tanto na parte. ocidental como oriental no período quecorresponde à Idade Média europeia. Exemplos desta manifestação

encont ram-se na lit eratura em swahHi. somál i e hausa. Este período afro-árabe da l ite ratura não tem todavia conexões est reit as com a matr iz indí

gena, tanto nos temas como na rea lização formal. As suas relações es treitam-se com o Islão e a literatura árabe em especial "We need to recall iothi5 connection that lhe oldest written t radition in Afriea i5 that associa t

ed with lhe Arab ic language. This tradition goes back to the introduction .of Islam in both East and West Africa in the period that corres'ponds tothe European Middle Ages . Bound up with the central posit ion af the Korao in the religian, i t has dete rmined a spec if line of development in Afei

ean literalure to which the term "Afro-Arab" has been attached( ... )"Abiola Irele, "The African Imagination". in Researeh in AfTiean Literatu-res, Spring 1990, p. 58.

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5]' Janh, Muntu, Paris , Seuil, 1962. Nesla obra Jahn procura provar a existência de uma certa unidade li t erár ia africana, gerada prec isamente peloesti 10, sendo o ritmo o seu elemenlo unificador. A influência negritudianudesta posição é signi ncativa.

6 Cf. "Senghor, num campo menos dúbio de interpretação do que a poesia,encontrava uma f6rmula para explicar o que poderia haver de dicotómico,de frontalmente oposto, entre os valores ocidentais europeus e os que per~

tenceriartl à África negra: 'a emoção é negra como a razilo é helena'( ... )" Alfredo Margarido, "Negritude e Humanismo" in Estudos sobre

Literaturas das Nações Africanas de Língua Portuguesa, Lisboa, A Regrado Jogo, 1980, p. 159. .

7 "Who could stake a claim lo serious cri tical, evaluative r ights on the basi sof Senghor 's famous slogan: Emotion is Negro as Reason is Greel<? Evento "native" critics eager to assert "natural" territorial rights to a virginf ie ld, some of Senghor' s Negritudinist excesses could not but be a. ,great,embarrassment. Criti cism- i s, a fter aU, an eminentJy rarional activity,whereas "emotion", "feeling", "inttÍition", "rhythm", and some of theother "keywords" of Negritude are characteristically relegated to themargin of critica! enterprise .". Biodun Jeyifo, "The Nature of Things:Arrested Decolonization and Critical Theory", in Researeh in Afriean Li -teratures, Spring 1990, p. 39.

spontanément rythme dês que l'homme est ému, rendu à Iui mê~me à son authenticité. Oui Ia paroIe se fait poeme. ( ... ) (1964:156).6 .

A predominância da oralidade em África é resultante de

condições materiais e históricas e não uma resultante da"natureza" africana; mas muitas vezes este facto é confusamente

analisado7, e muitos crí ticos 1?ar~emdo princípio de que há algode ontologicametlte oral em Africa, e que a escrita é um acontecimento disjuntivo e alienígeno para os africanos.

Ronorat Aguéssy em Visões e Percepções Tradicionais,afinna.a este respeito: "Em primeiro lugar, lembramos que umadas características das culturas africanas tradicionais, a sua característica fundamental, é a oralidade. Enquanto, no quadro daescrita, as fontes de valores são os "autores" e as suas obras, oque cria reflexos culturais que levam os pensadores a negar quaI~

quer réstea de pensamento onde não encontrem obras escritas,devemos hoje reconhecer que a oralidade ,pode produzir obrasculturais muito r icas. ( .... ) quando falamo_~e oral idade comog.racterística dQ ~mpo cultural a:tri.~?:noÇpensamosnuma aOm1':nante e não numa exc1rrsíViOãoe:»(1977.;'

. A questão trata-Se de assinalar a particularidade, sem perd~

de vista outros aspectos, e ~ r como descrever o acidental, o )

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Um dos pioneiros estudiosos das literaturas africanas, JanheinzJahn, distingue: "La literatura neoafrÍcana recíbe, pues, Ia herencia de una doble tradicÍón: Ia literatura africana tradicional y Iaoccidental. Una obra que no presente ning~n carácter europeo,

es dicir , que ni siquiera esté escrita, no pertenece a Ia li teraturaneoafricana, sino a la tradicional; [a frontera entre ambas es fácil

de trazar: es Ia línea ~_s..e.para.li .teratura oral de li teratura es~riw." (1971: 24).,X-oralidade é também uma ati tude perante a....realidade e não"'", busência de uma habilidade, e a frontek~_illt~separa a Iiteratura da oralidade não é assim tão nítida. Fin-

"-negrtTí"e1TllJi'ã1 .oe ry a 1rma:~ ... a mam paIO 11 1SdiSCUS-~I :. (, sion has been the denial of a cléar-cut differentation between oral

. ~J.( , and writ ten l iterature. Throughout the book I have rejected the~\í (,i. : ,} .• / suggestion that there is something peculiar to 'oral poetry' which.\ \, I"!' radically distinguishes it from written poetry in nature, composit-

l i}: . ', .' ion, style, social context, or function." (1977: 272).~r\'! O termo prúpôsto de literatura neo-africana recdbre um cor-~ ('" pus específico de textos produzidos peJos africanos em língua..<:;

: (/.. \; <~ ieuropeias, e distinguem-se por uma unidade fundamental de refe-.•• i \ .' ," rência e de visão do mundo. Esta visão era presumivelmente de-~,:.' . \' ' tectável através do conhecimento do pensamento africano tradi-:.. < \ • I /' donal, difundido pelas obras de Placide Tempels, MareeI Griaule

f • I. e Alexis Kagamé, entre outras. A postura jahniana deriva dos'\ \.' / iI'~ pressupostos essenciaJistas do movimento da Negritude, nomea-

l~ :- damente no que respeita ao uso do conceito de "nommd' como. um princípio operativo de neo-africanismo.5

, : i· A implicação idealista destes pressupostos faz jus ao discur-

O, I; , so negritudian~ (co~preensível no seu enquadramento histórico), I' acerca da poesia afrIcana, por exemplo, em q~e se defende tam

bém esta essencial idade do oral. A poesia é encarada como per~feitamente compatível com a categoria de "oral", que conota espontaneidade, afinidade simpática com o ser e a espiritualidade.Vejamos algumas da observações de L.S.Senghor a este respeito:"Le Negre singulierement, qui est d'un monde ou Ia parole se fait

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( ,~{ ':':'~); ~/,>.,~c,.,-<-(, onUd"'''&E~~,~-je;,L~~~~'

G"f~~tual,sem °considerar como ~~;~'dO à ord~m .i~ .Para compree~der a forma como e~tes trabalh~s ~o~am re~w o)

ci.as.)Aguessy ~ crítico e equilibrado .na s ua ~sserção quànd? ~os cebI~os, deve consIderar-se a . pologra con:o._a dis~phn~ q,u cLiue a oralIdade nas culturas afncanas e uma "caractenstlca dommou o estudo das culturas afncanas. o elos e concepçoes

dominante", ~as, não ~ única e exclusiv~. No enta,n~o este tip~ de ~nt:opológicas mo!daram a aprê~Iaçao os. eu:opeus ~m re~ação H~ K" U fo.J;observação nuo e mUIto frequente no dIscurso cnt1co dos afnca- a VIda e cultura af~. As teonas evolUclomstas, cu]as orIgens ~ vnistas. .,,) /1 . podem ser procuradas desde a antiguidade grega, passando por

" /" ..(.( (,.t ..., -/ ,, ·" :,J ._. /" ,. ;; . :. .. . ' : .~-,./......,J C.Vl ..6·6;e-c ~M"1("·i'.:. . :,/, Pascal e especialmente pela filosofia do século XVIII, deram ori-

A \ j ,!-, 't .JJ.._ LJ ~ c::.'v 1./ //'ré{ -/".(....6-."'iA-.<-""\./1 ! ,:' ',>: i ." ' .' ;' :.' :, .' g~m às premissas . d~ .estudQs como La Mentalité Primitive .dett u v GV\ L "'"r'" •• : .;:~.:. « : Lévy~BruhJ ou PnmUlve Culture de Tylor . A Europa exempI1fi-

I Oralidade: entre nostalgr.ae utop~a.... i·;!:;:.::·i··,,~:;.,:. ?:!ti.·:; cava o .estado adulto da civilizaçã?, enquanto as cultu. ras n~o-. .., ,; .;'....:' . .::j, ': -europelas eram encaradas como slmbolos d.e um estádIO de m~

~ Há du~s atitudes extrex;nadas para com a oralidade. qid~j: ;:.'): .:,:~i;;;i::~:>· fância, .através do q.u~Ia Europajá tjn~a passad~.l?~carada sobre~. uma deI as e reveJadora das ?Iferent~s formas ~o~o se apr.eendy ~.." .. :, '.' .;'):; . este pnsma, a tradlEQ oral era cQns!d~ada prImItIva. e os ~1-

/1 •..'\I rel~ção entre ~s textos or~l~ e esc~lt?~. A.pnmeIra consId~rw,a~ ,~.!,:.}:" : <;.J\;~: ,Jfcloris tas europeus estuc@ra~ o seu pam!!1ÓD~O.0!~1conside-,/1 ('. ,) socIedades oraIS (e as tradlçoes) pnlTlltlvas, a segunda consIde.r~-: :l::;: .:"" :';:",\"' 1 rando-o como formas sobrevlventeL9~n:LS~..stádi.o.J.OlCJa1. .

~. --:- -as exemplares. Por outras palavras, em certos momentos· da i~::: '..; i\:";'~. cJ-1.9-- As teorias evolucionistas contribuiram muito para ~ dicoto~

',',(/"~:r.;r{~7' história ~ociaJe inteJ~ctual do Ocidente~ e depe,nd~ndo dos p()~t :;:::::;) ' .: <::;"Y ~J ~)JC\ mia entre oral e,escr~to. -!"- literau:,ra or,aJ,era e~çarada cQm~ um~-\ ,íp).(Ú'fA, tos d.e vista do estudl~SO: o mesmo fenomeno ~ vI~tOcO~O.·~VI-:: :' ,: '". '. . . : ,. :; UY_'''j-, manifestação pnmária, sImpJe~Q Slljelta a trabalho refleXIVO,e1., (t-i1 d~nc!a, tant? de supenor~dade, como de ~ecad.en~la, da clvlllza-i: ::. ... ,: '. O' (f.l um produto de urna comuniCfa.?e, enquanto a literatura escrita r~-

~.v '1.,({: ~ çao europel~ ~: co~com~antemen~e, da mfeno~l~a,de ou bem-i,... ':,; ". . velava o oposto, final conclUSIVOde um rOc sso de. desenvolvl-c. .. ' 1\1 ~estar das clvl1Jzaçoes nao-europelas. A rever$lblhdade destes! ;:. ' :" Q., 'ír>lmento: complexa, e resultante do tra a o de um só autor E~ta

z:, \ julgamentos é um exemplo notável do resultado das intenções doi '. ,f\<t visão não se modificou muito com a antropologia uncional . Ruth,.. ,J . • . . , investigador e das conclusões que daí podem ser tiradas. O im-: .' YJ' Finnegan (1970:38) .afirma que muitos estudos antropológIcos~' "~r-o portante para a nossa reflexão é estar consciente de que 'esses: .....:': .. ri: defenderam que as inst ituições e produções cria tivas dos africa-

,/ I'", ,/ I ,J f pontos ~evista ~rabaJham m~ítas vezes, latentement,e, na nossa' , . :.. IJ~ nos eram puramente funcionais, normativas e com intuito de ('F"V.-0(

.::'. : _ ? percepçao das literaturas afncanas, e porventura dlstorcem as· ,: t;vJ manter a ordem social.JO / /,,;:::.:.0,\ ,;-" I" .J., nossas interrogações e as conclusões a que chegamos.. .. O'-~<'«W'"'l Se as teorias evolucionistas e funcional is tas acab~Q~. iJ_ /

:O", A"" \', Como se sabe, a preocupação com a literatura oral afncana j ser ultrapassadas nas suas teses , a antropologia ocidental, "na se.' . . ' r Ç/,.A~~

.. ,':' 1- iniciou-se ~os finais do. sé~ulo pas~a,do, enquadrada pe)~ activi- v' (oUl.7vIh.Vl Çz~ O\.M..k () cfú.. frvrr<--, rX...9-Il, ilt-l,": Lv J .~ ) (/ ;<;_,./,1 I d~de, colom~l e p~la cUrJ~sl~ade ~xotlca que as exploraçoes eco- ( v) <{ { ( -1. ~ .' (:~ .~

. nomlcas e clentlfJcas de Afnca VIeram despertar, quer na Europa .." 9 Um interessante artigo de Graham Huggan "Anlhropologlsts and other ~~~

I; . quer nos Estados Unidos. No decorrer do século actuaJ, as co- frauds" (in Comparative Literature, Spring 1994) analisa o papel de três ~:). (!. Jecções e recolhas cresceram em progressão geométrica, nornea- , obras literárias 9ue c:itica~ e ~arodizam a o p~pel do. a ntropólogo para ~"

-.\)}I damente a partir da década de sessenta.a . ·v .f 2'3. . com os povos nao oClçientuls.Suo elas ~ Devotr d~ VlO'en~e de Ya~bo_.1:..jJ Q . ;/-"_ Ouologuem, Os Passos PerdIdos de AleJo CarpentIer e Flytng Fax zn a

~ .({"l - , '. Freedom Tree de ~lbe~t Wendt. . . .~., .\!1(1----------- . , fi L/~tQ" / 10 "It~ central theoretl~aI mtere~t was, at root~the functlOnal mtegratlOn and,0 IJ}" REste fenómeno decorre, em parte, do acesso às independências da maioria fV~ malntenan.ce of soclety: and Items of oral ~Iteratu.rewere regar~e~ as rele-

.'t!\.\ dos países afr icanos na década de sessenta e do desejo crescente de co- F~ .(/ vant o~Jym so f?r as ~heycould befitted mt~ thlS. framework' Fmnegan.

'~e nhec~mento e revaJorizaçãó d o seu pa~~i;~~:.Ooral. '. O .... :c' ') Oral Llterature m Afnca, Oxford, Oxford Umverslty Press. 1977, p, 38. J /fu.Á/uo-.\ ---, (. I .. { .; \ f;;:.,.-~ (U)~ J\~.L{/) eís!" \ ( (. f~~./ r 19 \j ef ~ d.R. _

~ ,) l") ,.....~': . :!..<'~~'i .:", ,::,..::~., .d/·":: , ,.I \ ;G'f; fCêA;upI:.l~ rCó~ -") , fé/Y (..h-v o ~J eu~:I'--ti() 1. (. ," I ''. . " '••', j <.l f}.O l: " i.': " I i/' ..I}'" O~uf;r ,n(cJJuu~1J? 'ato J17U-L5U.'icJZ C p~e.--~ (.{/(;j1- . ~ r'\. ) ~.'. . ..... .'; "." /"l.- v. N~~ ~ ~ r.:u.,u n.:n 4~ ." 'f .~' "1'~1 . ' ;o .'l 4"" . ~~ ... _ t

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Ana Mafaldll Leite

quência dos importantes trabalhos de Claude· Lévi-Strauss, decerto modo encaminhou-se para uma visão ue procura I1KPes

/""qiiiS~pológica a inspiração para u ,~võ'fiümanrsmo.errida critica a obra de Lévi"Strauss em e a rammato-

~'undo o autor, os povos não europeus são estudados"comme l 'index d'une bonne nature enfouie, d 'un sol recouvert,d'un degrée zéro par rapport auquel on pourrait dessiner Iastructure, le devenir et surtout Iadégradation de notre société etde notre culture" (1967: 168). cDerrída faz o percurs~"logocentricidade" na história europeia desde o desencanto deRousseau com a civ.ilização moderna, P~.Q.._12º.LJi~rl,Saussure~ culminando na análise da obra de Lévi-Strauss, mostrando essa procura de ajustamento da voz com a ideia de natúJreza, pureza e bondad~"'----------~

No campo da teona literária, encontramos ainda hoje naEuropa uma mais subtil, mas igualmente perturbadora, atitude naforma de encarar a literatura oral. Como forma dejustificar as vi·

sões preconceituosas acerca das tradições orais, consideradasanteriormente menores, agora o ponto de vista tende por vezes aprojectar-se para o extremo oposto. Esta postura enebntramo-la,visivelmente assumida, por exemplo, numa obra fundamental eimportante de Paul Zumthor, Introduction à ia Poésie Oraie,

publicada em 1983:"A chaquejour qui passe, plusieurs langues au monde dispa

raissent: reniées, étoufées, mortes aveC le dernier vieil1ard, voixvierges d'écri ture,p)Jie mémoire sans défense, fenêtres jadisgrandes ouvertes sur le réel . L'un des symptômes du mal fut sansdoute, des l'origine, ce que naus nommons lit térature: et Ia l it térature a pris consistance, prospéré, est devenue ce qu'el le est I'une des plus vastes dimensions de l'homme - en .récusant Ia

voix. (...) II ne s'agit pas de faire un tri dans Ia compacíté de Iadurée, ni de reconstituer, fGt-ceau titre d'un patrimoine, des modes de vie et de pensée traditioneIle, chalereux, mais étouffants.11s'agit d'écarter tln faux univer~alisme qui.est enferrnement - derenoncer (puisqu'il est question de poésie) à privilégier l'écriture.

11 'Cf. artigo de James Comas "The Presence o f Theory/ Theor iz ing lhe Fresent", in Research In Afrícan Literatures. Spring 1990.

20

Oralldades & Escritas

C'est en ce sens qu'il"est urgent de dépasser l'ethnocentr:isme, qui inspire avec les naivetés .nationales, une conception périmée de l'evolution. (. ..) Peut-être Iagrande et malheureuse Afri·que, c10chardiséepar notre impérialismepolitico-industrie1,se trou·· .ve+elle plus que d' autres continents pres du but: parce que

moins gravement touchée par I'écriture, plus tiede'encore du feupremier dont forger l'instrument nouveau." (1983: 282-84).

; \Visão neo-romântica de Zumthor, apesar do excelentecontnDuto que a suãõ15ra é para a reVáIõrização do estudo dapoesia oral, mistifica e mitologiza de novo'a oralidade, nomeadamente na sua bipolaridade com a escrita, e no confronto Europa-África. Semelhante demanda da redenção e revalorização do oral,apesar do profundo conhecimento do autor, recupera modelos deoutra época.- Jean Claude Blachêre, na obra L e M ode le N eg re ,

assinala um similar tipo de esperança que se manifesta na escritade Cendrars e T. Tzara.12

Por outro lado, a ideia de que a oralidade é a resultante d.!um colectivo permitiu ~lfusão de um outror~conc~lto: o deque as' t radições orais sã íveis a todos, são UnIversalmentemais Igualitárias, pelo cesso a voz, õpãsso que a: e scrita e atecnologia'1fê1âassocia a, requerem uma preparação especial e;naturalmente, são mais"Sêl~~v~. Estepressuposto não toma emlinha de conta, apenas para dar um exemplo, o secretismo e elitismo envolvidos na aprendizagem e recitação de certos génerosda oratura em que o~o o'u "grioÇ é um especialista, escolhido ou por linhagem, ou por profissão, e só ele detém oco"

12 "D'emblée, les écrivains primilivistes (ApolJinaire, Cendrars: et Tzara)abol is sent pou r eux -mêmes Ia di stance qu 'il s ont posée ent re Ie negre e t

l'oecidenta[; i11'abolissent pOlir mieux marquer qu' il s se senlent en eon ' fonni lé de pensée avee l 'a rt ist e e ll e poete noi r. La "p rimivi ti sa tion" dunegre; l'insislance mise à inventorier ses différences esl , en somme, fonct ion du dés ir de l 'intel leetue l blanc de se désol idariser de son univers eultureI en s ' a ff innant sernblab le au pr irni ti f. A cet égard, l e qua li fi ca ti f de"pr imiti f' apparai t vidé de tou t son contenu évolut ionn iste; l es art is tesd 'avant-garde communiquent de plain-pied avee Ia pIus vieil le humanité,paree qu' ils ref usent le s sieeles de civilisation (prétendus leIs) qui lesséparenl.". Jean Claude Blachere, Le MOd ele Neg re. Dnkar, NouvelIesEditlons Afrieaines. 1981. p. 183.

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...

Ana Mafalda Leite

nhecimento dos textos mais longos e especiais, como a epopeia,as genealogias ou a crónica histórica.1J

Se as posturas teóricas dos ocidentais se extremam entre um~ de nostalgia e a utopia, as posturas dos africanos tendem a

ser também7Por vezes, excessivas no seu julgamento em relaçãoà literat.!:}.!J;\.g,raL --- -- ._-~._~-_ . ._.__ ._-, ------

acaso mais relevante é a atitude do escritor queniano NgugiWa Thiong'o que, na sua obra Decolonising lhe Mind: The

Politics of Language i/1 Ajrican Literature, reivindica para as literaturas africanas o uso exclusivo das línguas africanas, segundoele, mais capazes de apreender a cultura africana, isto é, implici-

tamente, também as tradições oraisJ4: ~

"Language as culture is the col1ective memory bank of a \; '.people's experience in history. Culture is almost indistinguishabJe "".. )from the language that makes possible its genesis, growth, bank- --ing, articulation and indeed its transmission fram one generationto the next (...) Janguage carries cuJture, a'ndculture carríes, particulary through orature and literature, the entire body of values

by which we come to perceive ourselves and QUI' place in theworld (n.) Language is thus inseparable from ours'elves as a community of human beings with a specific form and character, a

specifjc history, a specific reJationship to the worId..." (1981: l~)Se por um lado a questão Jinguístíca é um dos problemas

ideologicamente cruciais da fixação do discurso colonial eanticolonial no âmbito das literaturas africanas, por outro é reve-

l:t Em certos textos mais esotéricos, como os textos iniciálicos, é guardada ar azão do conhecimento, mais do que a razão de conhecer, emendida apr imeira como abrangendo a v ia para aceder à verdade ira percepção domundo e da essência das coisas. O conteúdo revelável é guardado para oiniciado e o acesso ao sent ido essenc ia l sub jaz na repe ti ção ordeoada dus

palavras, via necessár ia para chegar à revelação. Cf. Pascal Buba elF. Couloubuly, "Les textes iniliatiques"in Nolre Librairie. (Lilléralure

Malienlle - au carre/our de J'oral el da [ 'écrü), 0.° 75- 76, Juillel-Octobre1984, p. 59. .

14 Se com as t radições e formas orai s se busca também o essenc ia l ( logos ) dafundação ou refundação do grupo ou da comunidade percebe-se aqui,perturbadora, uma estranha afinidade com u visão (conservadora) do romantismo que explica, nOutro pluno, concepções como aquela que esteveoa géoese na Alemanha da Escola Histórica (Volksgeist). .

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=ta# •'1'1

Oralidades & Escritas

ladora, ainda, das preocupações relacionadas com a ídeia de umaestética, uma visão do mundo, africanas, de que as tradiçõesorais fazem naturalmente parte.

De uma forma geral, a posição dos escritores africanos fraocófonos admÍte a legitimidade e reivindica o uso de línguas africanas e europeias. E a maioria dos escritores anglófonos admitetambém similar legitimidade. No entanto, nos últimos anos estetem sido um tema debat ido, a part ir da publicação da obra do importante escritor queniano que só considera legí timo o uso daslínguas africanas. Esta posiçã~aJistal5 recente mostra,uma vez mais, que o equilíbr io teórico necessár io para o enquadramento da oralidade se enconfrâ envolvido por uma complexa

rede ideológica, resultante ainda dos resquíCIõs-coloniai~ --or razões históricas, o perfillingulshco õe cãIDrpãís africano faz hoje coexist ir pelo menos uma língua europeia , que funciona na maioria dos casos como língua ofic ial , e um número variável de línguas africanas. A língua oficial tem contribuído, namaioria dos casos, para" a realização de uma coesão nacional

nestes países pluriétnicos. No que respeita à literatura, ela tem-sedesenvolvido, enquadrada dentro desta diversidade linguística.\f"ainda um princípio nostálgico, idealista e essencialista, pensar emtermos estáticos na recuperação de uma mundividêncía pré-colonial, não levando em linha de conta as transformações sofridas nestas sociedades com o colonialismo, as indel2endências e amodernização. -_._---.-.~..." .....~-'" ..".-_.._..

nSlSIr numa visão monolítica e indiferenciada de uma esté-

tic~_W:.icana·é umé(Jorm~ém di<_I\eg~~tero&~Pilj~~~:: '_~ __

~~e)d~ad~ do univ~r~o c~~~ur~L ..~i.~~no.E talvez ainda .aaiiífestaçãOuem.m,vlS'llinreo-panafncana, que encara o contI-nente como indifereneiada totaTIdãae,Jíeste f inal do século,_._-~....~.

15 A perspectiva de Ngugi Wa Thioog'o é semelhante à de Edward Sapir eBenjamin L. Whorf em an tropologia no pr incíp io deste século , que defendiam que a língua que se fala delermina a nos sa v isão do ml lndo. Éconhecida pe la "Sapi r-Whorf Hyphotes is". A l íngua tem impor tânc ia ,mas não é fundamental . A cu ltu ra de que a l íngua é expressão mais visível é que é fundamental . Cf. Onésiri lo Almeida, "Filosofia Portuguesa Alguns Equívocos" , in Cultura - História e Filo sofia, voi IV, Lisboa,INIC, 1985.

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\'\":~'S:~

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Ana Mafalda Leite

quando as diferentes nações africanas constroem há .várins déc;;das o seu per~o lit~:_~ próprio e_~~fe~~~--

Oralidade, Literatura: Conto Oll Romance?

Os pressupostos teóricos mais OU menos extremados, idealistas e mitificados acerca da oralid;ide..e.das-tr-adições orais africanas levaram naturalmente a assefções._º.e.~:Últuadas,ou poucoclaras, no âmbito do estudo e da anáÍise crítica das literaturas

african~~co na sequência da<fdeia~rit~...?--ºf..9.)dLa

(0emre "natural"'nos africanos, a dança e a mÚSICasão talentos

mals ou menos inatos. Um africano nasceria supostamente jácom, o espírito da dança e por isso seria naturalmente vocaeionado para o jazz, o canto, etc. r~'---::---'----"'-'-'-

\__.._. .. --'fambém noâmbitõãã-H'têratur(.~ conto foi e continua aser, muitas vezes, encarado como a "f~ITi1ãj';-ãdeq.ü'ã(fã;"-õ-insrni-:-·--

mento narrativo por excelência "africano". Um exemplo destapostura crítica encontrá:-se-nãS--pãfáviã( de Adrian Roscoe aoafirmar que O romance não tem tradição em África e que nãoconsti tui um elemento significativo na tradição afticara: "Theafrican child (. ..) is faced in school with a writ ten literary fonnimposed on him (...) He may acquire a taste for the novel; but his\ife, bis society' s history ,;. .i\1a word, his culture - pre-disposeh'irn naturally to the story." (1971:76).

Ora, talvez mais do que qualquer outro gênero, o conto oralé universal e comum a todas as culturas e continentes.16 O facto

16 Lourenço do Rosár io fez , em Portuga l, a p rimeira tese de doutoramentodedicada 11 Oral idade afr icana, e afinna a respe ito do conto oral : "No quediz respeito à exi stênc ia múl tipla , não carece de demons tração o fac to dese ver if icar que o mesmo mot ivo temático pode ser abordado em pontostão diversos do mundo, alguns dos quais sem que nunca tenham tidocon tacloS d irec tos ou mesmo indi rectos . Por exemplo, um camponês deuma aldeia S ioux i solada nas reservas indígenas do ter ri tó rio americanoserá capaz de narrar eom os mesmos motivos ou semelhantes que umcamponês de uma qualquer aldeia isolada da Áf rica ou Ásia, falando daorigem da morte, da chuva, ou das aventuras de um herói que ~eva a

24

Oralidades & Escritas

de uma parte das sociedades africanas continuar a ser fundamentalmente camponesa e agrícola; e manter as tradições orais como ')forma de preservação da sua bagagem cultural , não Sigll lf!caque •

o conto, a forma mais popular de transmissão de conhecimento e ~de cul~~~ja necessarf~mê~fe"ã"'f~rm~~nãturãIll-ou"'"'ê'SS'elrcia:I"":s

,..,.---êie i"ecOnheclmentoda afncamdade Ilterana. ~-~._----'~\--:&-tadicotomia, considerada antagónica - conto/romance

enquadra-se obviamente em outras dictomias mais vastas, implícitas, do gênero: África! OcideA·tg.r~ir-i.toLn\.zã.Q,...n.atureza/cultura, oralidade/ escrita, literatura. O facto de o "romance" ser en-

• -.....-.-_------carado como estranho a Afrlca, e uma forma levada pelos euro-peus para o continente africano, n~o signif~, que entretanto não ganhe raízes nesse novo espaço. Outtas formas literárias, tomemos o caso do haiku, apesm-dãrua origem oriental,

ou do soneto cuja origem é italiana, ou ainda do salmo cuja ori- Iem é semita, encontram-se difundidas e anexadas e readaptadasum pouco por todas as literaturas dos diferentes continentes.

Tal visão é, apesar disso, proposta por Mohamadou Kane,professor e ensaísta senegalês, autor de várias importantes obras

sobre o conto e romance africanos: "L'avenir dti conte écrit dansa littérature africaine modetne semble mieux assuré. II n'y s'a'git,tout compte fait, que de l'ouverture d'un geme traditionnel 'à Ia"modernité". De lã vient Ia faveur que le public africain lui témoigne. Les autres genres sont tous d'importation. Le roman estnouveau, iJ ne progresse que lentement. l! rompt brutalementavec Ia tradition de l'oralité." (1981:234).

Mais recentemente ainda, Mbwil Ngal na sua obra Giamba-

rista Viko ou le vial du discours afrieain, escreve sobre intelectual africano que deseja amalgamar a estória oral com o ro- 'mance, considerando o género corno "discurso ocidental":"Accoucher d'un roman! C'est en effet tenir un discours occiden

tal. C'est évoluer dans I'espace visuel. Faire évoluer un récit dans

Ia dimensiQn spatio-temporelle. ( ... ) Le pouvoir du mot tres

amoindri perd de cette efficacité que lul connaí't l 'univers ~que de I'oralité. ( ..~cune rigidité pareil1~._~celle du roman! .J

melho r a través da sua intel igênc ia e argúc ia , sob re um adversário maispoderoso.", in A Narrativa Africana, Lisboa, Icalp. 1989, p. 62,

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Ana Mafalda Lcítc

Véritable cercle infernal, l 'espace romanesque! Je rêve d'un 1'0-

man sur le modêle du conte." (1984: 12-13).

Oralidade, Literatura:

continuidade ou transformação?A visão essencialista da oralidade tem perturbado a impor

tante tarefa neste domínio dos estudos comparativos. fundmnental para a nossa área, entre formas orais e escritas.

Alioune Tine, em "Pour une théorie de Ialittérature africaineécrite" afirma' que: "La littérature africaine se définit comme unelittérature située entre l'oralité et I'écríture. Cette idée a permis Iaréalisation d'un vaste consensus qui va des critiques africanistesaux écrivains" (1985:99) e, mais adiante ainda, afirma que aquiloque constitui o traço específico da literatura africana é a noçãode "oralité feinte" (1985: 102), "oralidade fingida".

Julgamos que a asserção de A.Tine só é parcialmente verda-

deira, uma vez que exclui a possibil idade da escrita de uma narrativa, romance ou conto que prescinda da recorrência aosmodelos da oralidade. Ou seja. o argumento pode caricatura!mente ser lido do seguinte modo: a narrativa, segundo este pres

~sto, será ocidental até ao momento em que não faça uso damstrumentação oral africana; apenas aquele material lhe dará acreditação necessária da africanidade, Parece-nos que o fundamento desfeIipo de-afici,ü'so"se-ãssemelha ao que encontramosacerca do género. O facto de não haver tràâlçaâoõ-iêm!ince em

África, q~rerà dlier que ele será· sempre uma forma alheia e fi..!ontrovl(rsa? Será qüe'Yiigíll"o nãO deveri"ide:r escrito"peiü-faéto ;r

de os seúsmodelos sere~ ~os? Será que a ausência dos tra=-j .ços da oralídade retira a a ncaníaãde a uma obra?l' I_'-""~''"''~'-~emelhant@o neo-romântica dos afritraffi"stas,de que aoriginalidade ou a "essenaahâa(re''ôus-'narrâIiVãSãfricanas deve

'0 . • ~. _ _ ~~ ••..•.•••• , • • • • •_, • • • • --_··,.."""'---·- • ~· • •

17 Ainda que reconheçamos que, historicamente. o romance foi , na origem,uma construção romana ({oqui romallÍce) a que o império da romanizaçãodeu particularidades nos diferentes ·'ramanças".

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I

I

III

! ,

Oralidades & Escritas

ser determinada pela forma como fazem eco, ou filtram, as tradições orais, parece-nos desajustada dos diferen~~ercursos decada umã.Clas literaturas nacionais, do diverso e heter0.Kéneocontinente africano, e ainda eivada de preconceitos ideológicos,com o seu exagero nas definições delimitativas. I :--;:k-

Já mais moderada e aceitável é a opinião de A. Irele 9..uando

consider a oralidade um aradigma central, mas não único:"Despite t e undoubted impact of print culture on Africanexperience and its role in the determination of new cultural mo"des, the tradition of orality remains predominant, serving as acentral paradigm for varíous kinds of expression on the continent( .. .) ln this primary sense, orality functions as lhe matrix of anAfrican mode of discourse, and where literature is concerned, the

griot is its embodiment i~ e~ery sense ?f the w~rd. C?rall.iter~ture /i

thus represents the baslc mtertex of the Afncan lmagmatlOn," j'1990: 56). -------.Ainda assim, haverá limitações a colocar na proposta de

lrele. Isto, porque nem todas as literaturas africanas recorrempredominantemente a este intertexto de base, e as literaturas afri

canas de língua portuguesa consti tuem, apesar de a ele recorrerem também, uma exemplar e singular excepção neste domín\Q..como teremos ocasião de verif icar mais adiantei: :âda literatura '

nacional africana tem as suas características próprias e desenvol·ve-se segundo moldes estéticos e linguísticos, cuja distintivídade 'resulta não só das diferenças culturais étnicas de base, mas tam- I

I bém das gi.fur.e.oJ;.a~JiMllJ~,ti9.9.,7f1JI~uraisue .a.,colonização ,lhes :acrescentou/E praticamente insustentável gua!quer generalizaçãoquecóIla'ü,Za él elabQrârões teóricas que não levem em líi1fiãC!econta as especificidades J:egionais".e,naçion,aisafdcanas.

Nesta medida, parece-nos que o julgamento de"Chidi Amutanos merece toda a atenção quando nos afirma que o reconhecimento de África exige mais do que autodefinição e afirmaçãoretórica:

"The abiding significance of traditionalist aesthetics howeverresides in its contribution to the necessary task of imparting moreknowledge about African artistic traditions, ethno-philosophiesand extarit .aesthetic value systems to an indifferent world whiJeimbuing the ignorant and miseducated African with greater con-

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Ana Mafalda Leite

fidence to understand both himself and the posit ion of his mortally injured faCein the world. But the crucial task of compellingthe world, especially the West, to recognize Africa through itspratica] achievements demands more than self-definition and

rhetorical reaffirmation." (1989: 50, sublinhado nosso).Também a opinião de Isidore Okpewho, o ensaísta nigeriano

que publicou trabalhos fundamentais e de consulta indispensável naárea da oralidade africanalB, nos merece atenção, pelo seu rigor crítico, e equilibrada visão das relações entre a oralidade e a literatura:

"While there are numerous elements of the oral traditionavailable for use by om modem writers, we should perhaps recognize that l iteracy is here to-stay and has a discrete characterof i ts own; the best justification forthe tradition is not a wholesale transfer into literate art but a judicious selectiveness which

will prove its adaptability to ch;mging circunstances. WJ~applaud the recourse to lraditiorf,..J..r.eallyda nal see the ~n .

C!l'!!3!~riters carryin~ as [email protected].~!!.1Y.-(i"98-S-:""2-3";-subli-nhat:hnrom>j

Outra das questões ainda relacionada com a oraJidade e a

escrita literária situa-se no modo como é encarada a relação entreun;a prática e a outra. Ou, seja, de q~ma é Que_~ liter~~!~

/-~"'<lff[C-ar:.~?~_~_~!.~.l~.tegram o mtertexto oral? _.J,,~_·_---"'Dm aos primeiros moa.os-aê"eqüa:cíônãr""êslã" relação foi/ através da ideia de "continuidade", exposta como vimos, por

1:,/ exemplo, através da ideia do "género" africano versus "género"<".\ ocidental; ou seja é "natural" que um escritor africano use o

conto, porque este é o género que permite estabelecer a continuidade com as tradições orais. Ou através da exploração dosritmos e dos temas, usando a língua como elemento potencial decaptação estiJística e vendo nesse trabalho uma espécie de"natural" mimetização ou reprodução da oraJidade. Várias teses

sobre a obra de Senghor exemplificam este tipo de trabalho.19

1$ Isidore Okpewho, The Epic in A /rica - Towards a Poetics o/ Oral Per

jormallce, New York, Columbia University Press, 1979; Myth in A/rica,Cambridge. Cambrigde UniversilY Press.1983.

19 Cf. Louis-Vincent Thomas, "De I'oralité à l'écrilure: le cas négro-afticain" in Négritude: Iradiliol/s et dévellopemenr", Éditions Complexe,Brllxe!les, 1978.

28·

Oralidades & Escritas

·-Uma segunda e mais produtiva maneira d:;ncarar ~r~ação~~;~tual, passa pela ideia de transformação. sta pressupõe o~ vários instrumentos possíveis, um<infra-estmtural, a língua, enquanto primeiro nível de manipulação, e os géneros en

quanto nível super-estruturaJ. A.Tine fala-nos em oral~

gida" e Abiola Irele em "re-interpretação"20 e em~'1ranspõSiçao ,~ .Termos que se prestam melhor ao pro"CeS"sõ-õe-recrfãçãen'jife·ã··· '"'literatura pressupõe. Com efeito, uma das mais importantes proptleaâdes da lit~~o texto literário é <4iccionalidadSJlefi-

nida como um~nto de regras prawáticas que reguJalD..ê.l~lações entre o mundo insti tuído pelo texto e o mundo empírico~

O texto li terário constrói um mundo fict ício através do qual mo- ~deliza o mundo empírico, representando-o e instituíndo uma@9C:~~~,~_~:~"ati:~~~:) ?""

Oralidade e Literaturas Africanasde Língua Portuguesa

As literaturas africanas de língua oficial portuguesa sãoconstituídas por três l iteraturas continentais e duas insulares.Tendo em conta as especificidades das literaturas insulares, limitar-me-ei às restantes três, neste enquadramento específico dointertexto da tradição oral. E mais concretamegte a referência vaientrosar-se especialmente com as literaturas ~gola~~~~2~!!l:?

í-bican1L.emparte devido ao facto de o corpus textual ser o mais"'s.ígrift1cativoa este respeito.

10"1 'he process involved in thi s mouvement be twecn two t radí tions can belermed One of "re-imerpretafion" in lhe anthrapological sense af lhe

word. It is well i lluslraled by lhe so·ca lled folk opers in Nigeria and therelatcd fon tl s of "cancer t part ies" in Ghana and Togo . 1n these works wewitl1ess an effarl to adapt the canventions af lhe oral narrative andtr aditional drama, both popular and ritual, to lhe exigencies of a new

cultural invironment dominated by western influences. 1nali these cases,oral ity remains as the de lennining medium; even where lf le re i s a wri lt entext, lhe voice as realising agency remains absolutely dominant.", Abiola1 re le . "The African Imagina lion" , in Research in A/ricall Literatures,Spring 1990. p. 58.

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Ana Mafalda Leite

Um importante estudo de Salvato Trigo "As Líteraturas africanas de expressão portuguesa - um fenómeno do urbanismo"2isitua a particularidade destas literaturas em relação às suas eongéneres francófonas e anglófonas. Neste trabalho salienta-se a

~em urbana dos textos das modernas literaturas africanas .:!0(língua por!.ugu~~§~~U:~J"ªll,'-:Q isol'l1'!le:..f!.!Q.-ª~~E~.!d~_~ OãiTImconslaerã que o ~E!.t .!~,qlle.: 'tem interesse literário, enquantoreduto de valores culturais e civilízacionais comuns, apesar dasdiferenças e tnol inguís ti cas ; a í se desenvolveu um prol,etar iadoque fecundou a~ementes anticoloniaj§, e em simultâneo uma formaparticular de veicular a língua portuguesa:

"( . . ,) cadinho do português que servia naturalmente de língua de comunicação e que , usado por falantes de diferentes regiõesetnolinguísticas, seria naturalmente sujeito a influências segmentais

e supras~gmenta is diversas que lhe moldaram a face caracter ís ti

ca da ala mucéquicé) ponto de. .E,ar tidaJ2.ª-!_ª-.2_ discurso verbal dasliteraturas a li' n e expressão portug~esa. ( ... ), como instituiçãocultural e socioeconómica, fonte de inspiração para os textospoéticos ou narrativos denunciadores do regime colonial de que

o ~era uma exemplar vítima, enquantoCl.J.!Kar de e~~.9 _ _2P(·~o.esterro para gentes despaganizadas em proceSSãoê distaniação dramática das suas origens civilizacionais." (1990: 56)

A maioria dos<&crit~ das literaturas africanas de língua

portuguesa são <§"imil~d9.s, uma I?,~~~e_.~~.nifiE.~~i.~~~:._~sceng~ncia ,.~l:l .I9.2~j_<k2,uase tõaos de origem urbana, sem contacto directo com o campo, e não dominam, salvo raras 'excepções, aslínguas afr icanas . Esse fac to não é comum nos outros países africanos, onde a ligação com °" te rreir" se mantém desde a infânciae os escr itores geralmente são, pelo menos, bil ingues .

Aliás, este(f.m.ómeno linguístico e d~~.'!§,§.jJ.!lÍle.ç!9.';)esultante

em grande parte dê·ufiY'-erldureêÜíi.enf6' e de uma[p'ortugalizã)

~>l doutrinária da polít ic~ .c?l?.r:!.ial ,vem contrariar'o qLi 'e~ãCõi1-~-'''-''''' , . . .• . .•

-.. ," .'

21 CI. Ensaios de Literatura Comparada Afro-Luso-Brasileira, Lisboa, Vega,1990 (p, 53-60),

22 A cons ta tação de tal fac to não tem qualquer intui to rác ico, serve apenaspara precisar e compreender melhor alguns aspectos especít lcos das trad ições cul turai s dos escritores das l it eraturas afr icanas de l íngua po rtuguesa.

30

Oralidades &: Escritas

teceu no final do século passado na literatura angolànae no prin

cípio deste na literatura moçambicana.2dlnto ~mbundu, em=::::>CAi1~.~!J:~E:,?-_?_~.?_!!~~.:_~~_.Mo~~jJjque, .ora.!!.uI!:1.~~_,g~.~,,:;,ntraram maIs ou menos mClplentemente na li teratura e no Jornal1smo"ãle"a"prÓxirnàdinueiite"ã 'Clêcãd-a-âelfinfã deste século.

Por outro lado, quan,do na década de sessenta a maioria dos

países africanos obtém as independências, inicia-se nas entãocolónias da Guiné, Angola e MoçambiqueCiLguerra colon.i~L eum processo de Gnvolvimento e crescimento urbanos que nãoteve lugar na maioria dos õutros-pã'Ises:-13stêS-dôi's - 'fenómenoscontribuiram e afectaram, ainda mais, a já existente fronteira entre o mundo rural e a cidade, ou se quisermos, entre uma

~:modernização" forçada e um enfraquecimento das ligações com-o. .muD.do..J[~dicional rural .} Se juntarmos a estas contigênclas históricas as g~crrãs"C1vl: tqúe tiveram lugar no J?ó.s-iI]sI~Een~~ncia,verifica-se que a elação das cl~~_eJ:.~L9..çm!"g"."~.~dolânico e dointerior, onde as tra lções orais mais vivamente se"mantêm, foisendo cada vez mais perturb.a.d.ª~e_alterad.a ..:,:~

Por estas e outras razões, que têm a ver com a histórÍa

própria e específica de cada uma destas sociedades e suas literaturas, a ~ção com as tr!!dições orais e com a orali~e é, àpartida, uma 'relação"efu'és§'@1@~:!!i'[g.:.resü1Iãi1(e;"na maioria

dos c~e uma experiência vivida, mas filtrada, apreen-

(Ciíclã;" es tudada. Mesmo a oral idade "mucéquica" , suburbana, paratrsarcJ'termo--Ue Salvato Trigo, é já parcialmente aculturada e

híbrida,! distante e diferente daquela que encontraríamos nocampo. Todas estas condicionantes nos levam necessariamente a

23 Cordeiro da Malta, escri tor e fil6Iogo angolano do final do século passadofoi o pr imeir o autor angolano a conferir ao kimbundu a dignidade literária, ombreando-o na poesia a par com o por tuguês, num processo de"para le li smo l ingu is ti co" . Em Moçambique, no p rinc ipio deSle século,publicava-se O Brado Afri cano em língua ronga e portuguesa, assimcomo jornais em língua inglesa e portuguesa.Cf. Mário Ant6nio, A Sociedade Angolana do fim do Século XIX e umseu Escritor, Luanda , Edi tor ia l Nós , 1961; Mário António, "Um João deDeus ango lano" , in Reler África, Coimbra, Insti luto de Antropologia,1990. Cf. I1ídio Rocha, Catálogo dos Per iódicos e Princ ipai s Seriados deMoçambique da Introdução da Tipografia à Independência (1854-1975),Lisboa, Ed. 70, 1985.

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Ana Mafalda Leite

,,::.9.Ç;ar.at:..~i~:'~',~,~~ "oralidade'Ya~ literatur~s africanas dec"' língua portuguesa oe uma fõfiTianecessanamente dlferente.""" '-"",;Não será pois por acaso, que o fenómeno literário da obra

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~~no o'delação da 1íngua~I9.rn~nto privi1e$.~.9...~~(/ ~~~:;atmlaça~~~:~:~:g~~,~,~,~!E?~"~!E~,~_t2"2.~"L~~!~~.~~~..?!~!.~,":Jas. I "_,

AI:irim~ira tese de doutoramento feita na área das literaturasafricanas de língua portuguesa foi precisamente sobre a obra deLuandino Vieira e da autoria de Salvato Trigo, que tem sido umdos principais teorizadores desta área de estudos e a ele se devem alguns dos principais textos de apoio pata a reflexão e ensino des,JaS-matéxi5.\.$.2:'."" .__

o estudo da obra de Luandino constatamos que, um pri

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24 Salvalo Trigo, Luandino Vieira O Iogoteta, POrto, Brasflia Editora, 198 I.

25 Ana Mafalda Leite, A Poética de José Craveir inha, Lisboa, Vega, 1991;Gilberto Matusse, A Const rução da Imagem da Moçambicanidade em Jo-sé Craveirinha , Mia Couto e Ungulan i Ba ka Khosa , Universidade Novade Lisboa, J 993, Laura Padilha, Entre Voz e Le tra - O lugar da Ancestra-/ idade naf icção angolana do século XX. Niteróí, Editora da UniversidadeFederal Fluminensc, 1995.

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Oralldades & Escritas

A Língua como instrumento ao serviçoda Oralidade .

Nas literaturas africanas de língua portuguesa, tendo emconta a especificidade de colonização que favoreceu a indigeni

zação do colono e a aculturação do colonizad026, em graus maisou menos extremados e substancialmente diferentes das outrascoloniza,s:ões.(ã"I'eTaçao·câii1"'a-sfàdiçõe"s'oiàis" e'c"6"ri1 a 'ôratÚra; .

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mostra que a "africanização", perversamente, se institui e processa no interior do instrumynto comunicativo processotransformativo e n~. A tematização linguística anha especial relevo na líteratura angolana, em especillrã partir dasobras de Luandino Vieira e Uanhenga Xitu.

A,eõünciação do legado "oral" faz-se através do enunciado,que cuilm,Jn-e-c-oliCeooã,núma'geologia estratificaciitqueatinge a

sintaxe, os ritmos híbridos das "oralidades". E neste trabalho da"língua" como texto (na acepção kristeviana) que se desvelam asrãdlçoes" traldas, e reformuladas, e~recUperaOLill!. traçQ)Lge.<

!."iiõ'tógJcosde variadas "formas" ou "géneros" orais africanos, e,>ootros g§Ij.~!~Sprovenientes da literatura escri ta.\ · , ."" ~'. .."...-~-" ..._. "'(lÊs te livr"õ'~b ""AJÜIgáiliem-e" na" Vidà 'é" 'a recriação, commuita liberdade pessoal, de certas formas do discurso popular.Quero dizer: no todo, no ri tmo, porque eu pretendia que no todoo ritmo e as alterações que aqui estão com certas palavras, comc~tos ,@:ntos da frase~~Q~n~E~§~2I!.,~E!!?~~SS9..~ ..9..~~Jl.~.~n~uagem popu~~~.ão in~?~~~~~!\t:ç~~m~!:',~Il,~~,a,?"~~,~:~.?:~E~9)mesmo ê!el!~·iAII'iéÜr qU'etenha utl!Jzado esse proce'sso com pa-

lavras que nao são do domínio popular, ou com construções quetambém não são do domínio popular." (Vieira,1980:58)

26 Cf. Mário Ant6nio, Luanda Ilha Crioula, Lisboa , Agência Geral do Ultramar, 1969, e Carlos Pacheco, José da Silva Maia Ferreira _ O Homeme a sua Época, Luanda, UEA, 1990.

27 Confere-se aqui ao conceito de língua e fala a acepção de "langue"l"parale" saussurianas,

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Ana Maralda Leite

.,~D~ar:aL~.~~~~'.' ..~,~ "oralidade'Ya~ literatur~s africanas deC' hngua portuguesa Cleuma fõffha necessariamente dIferente.-...._",,". .-Não será poís por acaso, que o fenômeno literário da obradeQ:uandil)o Vi~im.surgiu no contexto angolano, ou, mais recentemente, na literatura pós-colonial, o de Mia Couto no contexto

~~no o'delação da línguaJ..nstIlI.w~nto privíle.~~-9.";i-~~./contarnmaçao, 'estlçagem e entrosamento das culturas, oraIs e~ tas. r--- ~.~-~.~'"."~-'_. ,,.,_~._.~,._~.'".-,_~-,.>.= .

Al:irim~ira tese de doutoramento feita na área das literaturasafricanas de língua portuguesa foi precisamente sobre a obra deLuandino Vieira e da autoria de Salvato Trigo, que tem sido umdos principais teorizadores desta área de estudos e a ele se devem alguns dos principais textos de apoio para a reflexão e ensino desjaS-matéJjSl$.2'~...._._

o estudo da obra de Luandino constatamos que, um prim!ll-__ ~tEi.::tIe-inteFte-X{t1aIiZ'ação .d~,ªUd,a..®.::.~R@.~~.~,pe

(''êessariamen e j3ê1ã~llngrrlr:-'()''Tfát)'ã1I1'õ'queambém nós viémos a'-de"SffiVõ1Vêr,alguns anos mais tarde, sobre a obra poética de JoséCraveirinha, de certo modo executa um percurso semelhante.Este tipo de orientação veio a ser repensado teorícamente, numaoutra tese, "A Construção da Imagem de Moçambícanidade", daautoria de Gilberto Matusse.25 O livro de Laura Padilha, "EntreVoz e Letra - O lugar da Ancestralidade na Ficção Angolana doséculo XX", resultado da sua tese de doutoramento, retoma deigual modo, alguns destes percursos e aprofunda-os, em especialao desenvolver aspectos relacionados com o género.

24 Salvalo Trigo, Luandino Vieira O Logoteta, POrto, Brasflia EdiLora,198I.

25 Ana Mafa lda Leite, A Poética de José Craveir in!Ja, Lisboa, Vega, 1991;Gilberto Matusse, A Const rução da Imagem da Moçambicanidade em Jo.sé Craveir in!Ja, Mia Couro e Ungulani Ba ka Khosa, Universidade Novade Lisboa, 1993, Laura Padilha, Entre Voz e Let ra - O lugar da Ances/m.l idade naf icção angolana do século XX, Niter6i, Editora da UniversidadeFederal Fluminense, 1995,

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Oralldades & Escritas

A Língua como instrumento ao serviçoda Oralidade .

Nas literaturas africanas de língua portuguesa, tendo em

conta a especificidade de colonização que favoreceu a indigeni

zação do colono e a aculturação do colonizad026, em graus maisou menos extremados e substancialmente diferentes das outrascoloniza9ões.(ãl'eTaçac) com'"a-s'fádições' orãis'e'co'rii a "orai:"ú'iá:-U

-º,Oll1.e~~st~E:se exactamente pejas iferentes a à~""1.....com que os escnt~r~~._~lÇ,ªD.9"S."s.e::::ãss.efilíoi~~J:.~_"~mgmt'~~1J'\..'-A-.Hpilhagerh"ou "roubo" da língua portuguesa perõcl5tôruz1i1lómostra que a "africanização", perversamente, se institui e processa no interior do instrumynto comunicativo processotransformativo e n~. A tematização linguística anha especial relevo na Hteratura angolana, em especllirã partir dasobras de Luandino Vieíra e Uanhenga Xitu.

A~núnciação do legado "oral" faz-se através do enunciado,que cuITrnJn-e-com;eiITfã,núma"geologiaestratificadãqueatinge a

sintaxe, os ritmos híbridos das "oraJidades", E neste trabalho da"língua" como texto (na acepção kristeviana) que se desvelam asrãdlçoes" traldas, e reformuladas, eC$irecuperaOLo.§.traçQ,}.geF

J.·1iãt6;g·icosde variadas "formas" ou "géneros" orais africanos, e,~tros g§I}~EOSrovenientes da literatura escrita.\· '. '.. " '.'"-~ ..'"-""r'Êste Jiv-rÔ'71ó·Ai1.ügdin'eiife liCl Vida rã. recriaçãó, commuita liberdade pessoal, de certas formas do discurso popular.Quero dizer: no todo, no ritmo, porque eu pretendia que no todoo ritmo e as alterações que aqui estão com certas palavras, comc~tos ....@entos da frase~~E.!::mqE~§~~~,~.E.!:9~~SS9.~.gg~)L~

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lavras que nao são do dorninio popular, ou com construções quetambém não são do domínio popular." (Vieira, 1980:5B)

26 Cf. Mário Ant6nio, Luanda Ilha Crioula, Lisboa , Agência Geral do Ultramar, 1969, e CarIos Pacheco, José da Sil va Maia Fer re ira _ O Homeme a sua Época, Luanda, UEA, 1990.

27 Confere-se aqui ao conceito de língua e fala a acepção de "langue"l"parole" saussurianas.

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'.Ana Maflllda Leite

Mas naturalmente que o caso de~L'y'§l.!lginpVieira é apenasexemplar e paradigmático de uma das "falas" possíveis, e decerto modo também demonstrat ivo, . .pela força do seu registo epela sua atitude jnaugural,:?ílde qUéJ1sliteraturas africanas de lín-

,rgn1i"1Jtrrtugiiêsa' encontraram manei~pJ'óprias(rêdialogar com!I as "tradições", intertextualizando-as, obtusamente, no corpo lin- \.

) guístico. r-"- '. _ _ -''''- - --.-.._"~--'-_ __--:._.__ _ ._ ~ _- '"--"--BstJ1" tradução" das "oralida~ realizada naGnÇlJ~~ língua,

trabalhada,' enósInvõrüntariamente, comQ..f .<2rpo.E.fl9n~compósito de fragmentos de ritmos e formas,\iráregulãra sintaxe e ;'a discursividade literáriade modo inovador e surpreendente~

Através da literatura angolana, e de um dos seus maisproeminentes autores, as literaturas africanas de Hngua portu

guesa trouxeramrhíõdernidade às literaturas africanas, fazendo, coe?5~~~n~eà6waãâe:~~=!í~I~~;1';·'b-ifõvõ-corn..9...~~.~9'es~~~.:;2!?~<:.:~!!~~~~:'i i~!.l:~.~?!~~?.~a.~.í~!~,:,mms ou meno~lmparavel1 que os textos hteranos nos oelxam frulr; Isto mesmo ereconhecido por arfícõs"-e-teõrttt),f-ãfricanos de outras áreas,como é o caso de Abiola Irele ao afirmar: ' ,\

"( ... ) when we eonsider the work af some Portuguese-bornwriters sueh as Castro Soromenho and Luandino Vieira, whoexpress an engagement with Africa not simply in terms' of external allusion to forms of life but as a real, formal identificationwith local modes of expression,' that is, not merely as thematicreference but also as touehstone of formo

This observation leads to a consideration of modem Iiteratu-1re written in European languages by indigenous africans. Thestriking feature that gives ínterest to this literature is a noticeablepreoccupation not only with the African experience as the central \subject af their works, but aIs°with the problem of a proper andadequate reflection of that experience, which involves, informal

terms, LI reworking of lheir means of expressiol1 for that pur- (pose." (1990: 60, sublinhado nosso) ---

28 Cf. Mário de Andrade, "Uma Nova Linguagem no Imaginário Angolano"e Manuel Ferreira, "Lullandu / Sociedade Ponuguesa de Escri to res - umcaso de agressão ideológica", Luandino - José Luandino Vieira e a StlCl

obra (Esllldos, Testemunhos Entrevistas), Lisboa, Ed. 70, 1980.

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Oralidades & Escritas

Mas, se o caso luandinino é prova de que ~ língua é-º--pri

meiro instrumento de "textuali~, a forma p~d~al1ãõ-oé, felizmente, denominador comum para t os outros. Dife~

rentes modos de apro riação da língua imulam e ~tam 1 e~rentes registos de xtualrzaçao das "orali s.

O facto de usarmos no a a p ra "oral idade" visa

exactamente demonstrar que, por um lado, as tradições orais sãodiferentes de país para país, embora com um registo linguístico-cultural bantu comum, e dentro de cada país, de etnia para etnía,apesar de ser possível encontrar elementos unificadores na caracterização dos géneros e dos mitos, por exemplo. E o pluralserve-nos neste caso, também, para significar o processo transformativo que a urbe ~~.Q!L!.1_a.~..m.Q.Lç.Q~"§JY.L~Qçl.ç.I.anjjo-as e recriando-as. E usam~~.1Q.~i~9.~,.,p~ra acrescentar outroselementos, pi-õven1ellfes--ae-"outrasoralidades; de que a língüamatriz é portadora na sua orfg;em'cultüiãr . ..... ..

O plural de "oralidades';'permiie~iiôs, além do que acini.a foireferido, distinguir o odo de relacionamento do cr' res co.m·a textual i dade oral e c m as mg as. Ou seja, haverá talvez que

distinguir três tipOSâe-aprõpnãÇão: o primeiro, o mais frequente,tanto na literatura angolana como na moçambicana, a tendênciapara seguir uma norma mais ou menos padronizada (como ocaso de Pepetela ou Luís Bernardo Honwana) ou então"oralizar" a língua portuguesa, seguindo registos bastante diversificados entre si (por exemplo, o caso de Boaventura Cardoso, Manuel Rui ou de UnguJani Ba Ka Khosa).

O segun,do1ltende ibridizá-la" através da recriação sin-áctica ~-Ie;luca e de recom mações Jinguísticas, 'j5fõVê"ffit;ntes,por vezes, mas nem sempre, de mais dõque uma Iíngua(os casosde Luandino Vieira ou de Mia Cou1õT'-"-~---'-

O terceiro, menos frequente, e utilizado apenas por escrito ..

res bílíngues, cujo contacto com a ruralidade é mais Íntimo e pró~jmo, institui uma relação de diálogo, criando uma espécie de\:interseccionismo" linguístico, em que prolongamentos de frases,o1:Jlrr:trtesde frases, se continuam em diferentes línguas, alternando ou imprimindo ritmos diversificados, assim como fazendo írromper, recuperadas, diferentes cosmovisões. Esta terceira e últi

ma situação, quase ~~a intera~_~:

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Ana Mafalda Leite

tre as duas línguas conhecidas, uma africana, e a outra a línguaportuguesa, que tentam como "traduzir-se" mutuamente~~como éo caso de Uanhenga Xitu e, dlfetêfi[emênle:ê1é~Fêrííãndo Fonseca Santos).

Interessa-nos a partir desta constntação do modo original detextualização dac::Qr.iiJidãâe"nas líteraturas africanas de língua

portuguesa, analisar, nas páginas que se seguem, em diferentesEscritas alguns aspectos da sua tematização, nomeadamente di

ferentes motivos, e registos réfl"êXívos,que das Oralídades se re

escreveram (e inscreveram) n"ã"ficçãoe poesia angolanas e moçambicanas. VOZES, TEMPOS, SONHO

- poesia de Arlindo Barbeitos

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RADICAÇÃO, REESCRITA, RECOMPOSIÇÃO

- poesia de Ruy Duarte de Carvalho

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Para o Vasco epara o Patraquim

Convoca-Jios46 na actividade poética de Ruy Duarte um

certo grau de experimentalismo, de errância técnico-compositiva,de improvisação de novas formas e, ao mesmo tempo, inseridanesta aparente e muito rigorosa divagação, a permanência obsessiva de algumas procuras temáticas, a insistência em retomar de

livros anteriores partes de versos, frases, palavras, como que embusca de sentido. Ou como se parte do que foi sendo escrito

permanecesse obscuro, teimasse em regressar à luz da página

como citação, memória esquecida, que apenas a reinscrição activasse,

Reparamos que em todos os seus livros existe uma reflexão

poetizada dos trajectos em que se demarca a escrita. Esta contí .

nua anotação em abismo mostra que o próprio processo criativo

se interroga ao mesmo tempo que se produz, que a poesia nasce

também de uma distanciamento de si própria, como que autoge

rando-se na pesquisa da sua existência, levando a que, em simultâneo, o sujeito nela implicado sofra idêntico processo.

O percurso textual parece criar, assim, as suas formas es

pecíficas de desenvolvimento do ser criador, ao investir o sujeito

criado, que se (d)enuncia, na actividade de construção poética.

Deste modo, a consciência que se entrelê no fazer do poema étambém uma demanda de existência do ser poeta, tal como o

verso demanda a forma dos seus sentidos. Indo um pouco ,maislonge, observa-se que a noção de sujeito e de poema, em processo de gestação e de reformulação, se articula com a noção de es

paço, mais precisamente, "noção geográfica", título de poema e

verso que aparece com frequência nos textos do autor angolano.

'!6 Esta secção resulta da adaptação do art igo "Modcrnídade na poesia ango

lana: a obra de Ruy Duar te de Carvalho", in Santa Barbara PortugueseStudies, vol I , 1994,

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l\..naMafalda Leite

Radicação

É então no movimento, diria "transumânCÍa"da reflexão/procura poética, do questionamento/renascimento do sujeito, da fixação/desfixação gráfica, geo-gráfica e re-identlficativfl, que se pode apreender a modernidade, o carácter multímodo da poesia deRuy Duarte de Carvalho.

No primeiro livro, Chão de Oferta (1972), os aspectos referidos demarcam-se tenuemente. Inaugural, a obra apresenta-secomo um hino em louvor da terra, mais precisamente "O sul",

t ítulo do poema de abertura. Processa-se uma fusão entre ser-terra-escrever, onde harmonicumente a escrita circunscreve,grava o sujeito ofertado ao chão. Acto de envolvência totalizante, a l ír ica não questiona, mas abraça, enovela; o sujeito nãose desdobra, mas entranha-se, nasce, na telúrica feminina; a geografia dá-se a conhecer como presença - Novembrina Solene.

Lemos no poema Gravação do rosto: "Na superfície brancado desertol na atmosfera ocre das distâncias/ no verde breve da

chuva de Novembro/ Deixei gravado o meu rosto,! minha meio!minha vontade e meu esperma:/ prendi aos montes os gestos de

entrega (...) Aqui me deixei, aqui me fiz / desfiz, refiz amores"(p.47/50). Semelhante homologia entre ser e terra torna-secircular, repetível ao infinito: "Venho de um sul! medido claramente ( ... ) de um tempo circular/ liberto de estações.! De umanação de corpos transumantes/ confundidos/ na cor da crostaacúleal de um negro chão elaborado em brasa" (CO, p. 44).

Com o verso "Aqui me fiz" percebe-se um primeiro acto degestação do sujeito, provocado a part ir do chão do sul. Está representada a cena inicial, a geometria do espaço de ohde emergea entidade outra, que não o autor, o poeta. Logo, a poesia entraem consonância com o acto de nascimento do sujeito com a

terra: "Escolhe a colina! de cálido silêncio/ Repouso borbulhante/da obra em gestação" (CO, p. 45).

Chão de Oferta é, de facto, um livro onde tudo se inicia.Iniciação e nascimento do poeta como sujeito e como obra, masentre a obra, o s.ujeitoe o chão, não há rupturas, antes afinidadesuterinas, placentárias rítmicas, copuladas justaposições, pois

134

Oralldades & Escritas

quem está nascendo (sujeito, obra, espaço) vive a inocente alegria de ser 'evidência, pura origem lactente: "E faz-se gorda aterra! e lhe estremece a carne-madre farta! contente e abundante,!saciada! bem parida e já refeita,! acarinhada./ Sobram quindas demel pelos outeiros/ e o peito escorre, generoso e alto./Dorme aterra em verde luzi imensurável mesa de um anual banquete/ quefesteja! a imanência fêmea e mãe/ da natureza" (CO, p. 69).

Se no primeiro livro o sentido se oferece na sua imanência,A Decisão da Idade (1976), segundo volume do autor, propõeum processo de distanciação e de pesquisa, em que as formas, oespaço/cultura e o sujeito começam a redefinir-se. Lemos aí:"renovo a nitidez das referências/ A vaga geografia das ausênciasimpondo uma paisagem! reassumida renovada de ardor e nitidezamável.! Adquiro assim um depurado entendimento do que é a

posse.! Tenho também que o meu crescer se faz de cinza acumulada pelos regressos" (DI, p. 29).

E neste enquadramento de posse, reconquista pela distância,que se esboça uma nova proposta poética. Texto em que a encenação dramática se conjuga à dimensão épica, ao procurar o su

jeito dar consistência a uma herança cultural africana, englobantena noção de continente: "Habito um corpo móvel de paisagens/protegidas por clareiras de fartura! Habito o movimento e a mi

nha pátria/ é todo o continente de que não sei ofim" (DI, p. 63).Poema operátíco, "ptlra cinco vozes e coros", introduz na

poesia de Ruy Duarte o clima e as condições do espectáculo. Asreferências córicas, as vozes solo, o uso da canção e das falas depersonagens-símbolo como a mulher, o feiticeiro, o herói e o rei,emblematizam novas vertentes coreográficas na escrita. Elementos fundamentais para a representação de um tempo festivo a quea então recente independência angolana remete. Nota-se umalargamento temático e compositivo, concentrando-se a poéticana exploração de elementos musicais, cênicos, espectaculares e

dramáticos que melhor se adequam aos sentidos culturais/oraisem que o genotexto da geografia africana se ritma. Verificamostambém que os elementos - sujeito-obra-espaço - de novo se irmanam para se completar, complementar.

A noção de sujeito, que se outra dinamicamente para entrarem consonância com o novo espaço de posse e a diversa poética

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Ana Mafalda Leite

experimentada, dá lugar à noção de personagem: "Um homemchega e assume a personagem. Ilustra-se de faces, decompõe a fé,possui-se de um vigor insuspeitado, desvenda as claridades do seupeito, produz formosas coisas com os seus dedos põe-se a reordenaros horizontes, atinge mortalmente as formas com o olhar , progridenas tarefas de conquis ta e chama a si as referências do lugar C.,,) Umhomem vem fundir geografias, polarizar as forças da manhã deserta,vem fecundar as latitudes nuas (...) um homem que alterouconjugações de estrelas, é uma noção de espaço conquistado e emespaço se transmuta renovado" (DI, p. 49/51).

Como se o mundo não tivesse leste (1977), volume de contos,

faz a passagem à ficção anunciada por muitos dos 'elementos jáutilízados no livro anterior. Após um alargamento temático, oescritor regressa de novo à topografia circunscrita das terras deChão de Oferta, agora investindo~se de diferentes procedimentosformais. Movimento/deslocação que não é cont raditório e que organiza a pluralidade pela singularidade umbilical de onde a noção desuje ito provém. Os contos desempenham um duplo papel na ac tividade do múor:,p.or:,!Jm1<)dode nava, insistentem~nte, 3, aproximação.es té tica dá temática que lhe

étão cara - as caracte rís ti cas e a modus

vivendi dos pastores do sul; por outro um investimento pessoal, en quanto sujei to, na compreensão da sua relação cam essa te rra. Lemos no início: "Sinto-me envolvido por um cl ima de entendimentodo qual não tentarei dar tes temunho, tão insensato me parece querê-10 ( . .. ) Cheguei há pouco da onganda do Tchimutengue onde, aconvite do José , partic ipei nas últ imas cerimónias da fes ta de puberdade da sua fIlha mais nova ( ... ) Devo-lhe a minha definitiva voca

ção a uma geografia e a umpovo" (CSM, p. 9).A vocação geográf ica, ao delimitar-se, complementa a identi

tár ia ou vice-versa , experimentando-se na ficção, nava forma paraescrever °mesmo camo outro, a trama que leva a essa tão especialconjugação entre ser-terra-escrita. Estórias para circunscrever a

His tória, a his tória pessoal, o elo entre suje ito act ivado, recriado, n.oespaço em pennanente conquista. Consciente de mais uma novaopção experimental criat iva, o narrador afirma: "Desde os primeiroscontactos com o material que haVeria de conduzir-me ao. arrojodestas linhas eu sentira dever-me, em termos de sati sfação pessoa l,um circunstanciado entendimento dos casos como se disso dependesse a organização da minha vida futura" (p. 10).

136

Oralidades & Escritas

Um dos contos, As águas do Capembáua, composto de umenredo mais ou menas policial, incorpora três níveis que gradualmente se vão. esc la recendo. . Partindo. de um acontec imento

inicial, uma morte, procura-se a solução de várias fontes explica

tivas que provocarão a integração final na contexto religioso efeiticista da área. Deparamos, no deco.rrer do conto, com a se

guinte observação do narradar: "Surge-me aqui a primeira dificuldade ao arriscar-me como cantador de histórias que, na reali

dade, não soú ( ... ) (CSM, p. 20). Este processo de negativizaçãoacentua o cunho experimental, cujo resultada ultrapassa, no entanto, o mero amadorismo, pois a obra testemunha grande qualidade estética e demonstra que a ficção é um dos domínios possiveis na actividade de Ruy Duarte de Carvalho.

Como nos foi esclarecido pela frase citada, que funciona reflexivamente como processo de questionamenta da escrita, o enveredar pelo dOTIÚnionarrativo constitui, de certo modo, umafase de reinvestimento da própria noção de su jeito, enquadrado

geo-culturalmente, insti tuindo-se assim o domínio ficcional comolugar, não diria confessional, más testemunhal, de um tempo/es

paço sentido como herança, percurso potencial e fragmentariamente bíografemático, que institui uma vez mais a radicação do

sujei to como noção identi tá ria e enunciação existencial , unida definit ivamente às terras d.o sul angolano.

A narrativa torna-se assim lugar temporário de novo baptismo (do suje ito-abra-espaço) susci tado pelo desejo de adequação.entre linguagem e cultura. Também em termos profissionais RuyDuarte foi progressivamente deslocando a sua activídade no sentido de a aprofundar: inicialmente regente agrícola, dedica-semais tarde ao cinema e à antropolagia, campos o.nde tem desenvolvido trabalho importante, e que, paralelamente, entram emconsonância com as experiências cr iativas do autor.

Recomposição

Em Exercícios de Crueldade (1978) deparamos com uma

fase de reflexão e pausa que ante,cedem navas rumos que a escrita irá tomar. Continua a processo de invenção da noção do

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Ana Mafalda Leite

sujeito, questionamento que a obra, agora de temática predominantemente amorosa, estimula: "Mergulho na hereditariedadecomo se fosse em mim mesmo.! Governo os genes com toda asegurança (...) Decomponho a carne em adições de umaexaustiva cirurgia.! Numa folha de papel, de preferência embranco, projecto/ o animal a que me voto.! O seu contorno

caligráfico.! Do corpo transito ao gene. Defino-lhe o carácter.!Depois retorno ao corpo" (EC, p. 23).Semelhante "vocação animal" sugere, de imediato um dos

t ítulos da poesia de Herberto Hélder, poeta que marca intertextualmente de forma muito nít ida a escrita do autor angolano. Arelação evoca ainda a procura de uma linguagem onde a metáfora surrealizante atende à minuciosa efabulação amorosa. A pardeste mergulho do sujeito numa zona, diríamos, anterior ao ser,sanguínea, fetal, de determinação genética/gráfica do propósitode uma poesia, por excelência, lírica, cuja intenção é conscientemente referida nos versos primeiramente citados, observa-se a!atência de outra área poética que aspira ganhar lugar, forma epalavra: "Havia um texto para encerrar um livro e havia um Ji

vro/ para encerrar um tempo. E eu precisava de um lugar nanoite.lde tempo simultâneo sobreposto ao meu. de uma matriz deareia! aonde o verso se ajustasse ao vento para esculpir notlanco/ das falésias um texto de silêncios que excedesse os livros"

(EC, p. 59).O livro aqui referido pode ser lido, enigmaticamente como a

'grande obra', a palavra ou. sopro que é reveJadora/divina, a palavra que falta para decifrar o mundo; esse livro/verbo é a anulação da ideia de representação, o lugar de coincidência entre osujeito e O universo, a adequação do som com o pensamento dosom, o 'acesso ao conhecimento de si, da poesia e da geografia.Mas, porque o criador é humano, a coincidência apenas pode serachada pela diversidade. E um outro livro, um ano depois, em1979, Sinais misteriosos ... já se vê . .. , vem prolongar essa procuraideal de "um texto de silêncios". É quando surge a fotografia,tentat iva, afinal , de fazer coincidir a palavra com o silêncio, aimagem com o seu referente.

Ainda em Exercícios de Crueldade lia~se:"Toda a moral encerra uma palavra.! proponho fotografar'! O adjectivo corrom-

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Oralidades & Escritas

pe." (EC, p. 36). Em Sinais Misteriosos temos uma citação explicitando: "Depois fundou o modelo: os poetas futuros commáquinas de filmar nas mãos". Se por um lado a fotografia parece ajustar-se melhor enquanto processo criativo, verificamosque a introdução da imagem, que oscila entre fotografia e desenho, em montagem permanente, permite acentuar o distancia

mento do sujeito em relação ao objecto poético.A câmara escura interpõe-se entre o criador/operador e oobjecto criado/spectrum (palavra que conserva através da raizuma relação com o espectáculo", Barthes, 1980:23), dando-secomo que uma travessia simbólica da vida para a morte, do realpara o espectro, para a imagem "embalsamada", corpo inerte,sobre o qual o trabalho do operador recai, na separação necessária e objectal que lhe permite a atitude Júdica, o carácter conceptual da criatividade e a emoção formal. A raiz de espectáculo quea iconografia comporta permite processualmente ao poeta aproximar-se, pelo desdobramento compositivo, da sua intencional idade recriativa do mundo da tradição oral mumuíla, centro daspreocupações de Sinais Misteriosos. Ou seja, a disseminação dos

meios, o experimentalismo que o leva a actuar em simultâneocom a fotografia, o desenho e a palavra, são a dimensão pluralnecessária para centrar, enquadrar, a realização oral e o investimento técnico no âmbito de uma obra poética moderna.

Assim, o gestus cultural, histórico, da oratura dos povos dosul de Angola, é captado, encenado através dos ícones. O quenos separa enquanto spectator/leitor das imagens/poemas é também a distância histórico-cultural; esse intervalo é preenchidopelas marcas de uma "ressurreição fugitiva" que nós partilhamospelos dados compositivos: as vestes, os adornos, a pose. A pose

institui-se como paragem, momento de medi(t)ação entre o olharpreso à imagem e o olhar atento à palavra, Este processo de

actualização permite-nos analisar a relação inteligente que o poeta estabelece com o universo cultural mumuOa; a escrita nãopermite a reposição integral deste diferente mundo.

Por isso mesmo não se pretende repôr, o que sem dúvida seriauma atitude idealista, mas compôr, acrescentar, recompô,., investir-se o sujeito na rede parcelar dos elementos que aglutina, decompõee organíza como operador e conhecedor dos materiais que utiliza.

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Ana MafaIda Leite

Este tipo de trabalho citacional pressupõe uma segunda

mão, div idida entre a câmara, a caligrafia e o traço, que fitualiza

na literatura moderna o legado tradicional, retrabalhando-o e

moldando-o num novo corpus poético. Os textos anteriores são

fragmentados, inte rpretados, investidos de novos sentidos , reno

vada a sua força significante e rítmica num texto moderno queleva o lehor à descoberta dos "sinais misteriosos".

A investigação, quase laboratorial, desenha o percurso de

uma dispersão compositiva que é, afinal, o modo de apreensão

do espaço cultural e geográfico em que o autor se nasceu como

sujeito poético e como obra. Espécie de const rução heteronímica

pelas formas, em que a identidade se joga pela coexistência da

pluralidade dos vários regis tos técnico-composi tivos que procu

ram, tàmbém, a reposição da noção geográfica na assunção do

sujeito que se escreve nas diversas falas cultura is .

Reescrita

Ondula Savana Branca. (1982) persiste no percurso de

aproximação entre a palavra poética e o legado oral africano.

São três tipos de desdobramentos a que o autor recorre, a ver

são, a derivação e a reconversão. Lemos; "Cada conquis ta ! provém de outra conquista! e a posse da ciência é discern ir/ como se

entrança nelas o saber .! É casa já também! o pátio que precede a

cQnstruçãol transformação! transformação" (OSB, p. 42). As

sistimos de novo à busca de entrosamento entre o sujeito e o es

paço te lúrieo-culturaI , representado peja ora tura . O aeto poético

entremeia-se entre a traição produtiva à tradução e a recrinção de

um texto, onde a tradição se inter textualiza na dimensão autoral,

de uma obra, que quase prefere esquecer o seu sujeito individun lpara assumir as vozes anónimas (localizadas na sua origem),

fragmentadas nos registos ora is , cultuai s, que conjura .

O sujeito que reescreve os textos, interiormente tecidos na

sua própria poesia, ondula numa entidade pluralizada, máscara

embutida no próprio rosto, espaço preenchido pela transforma

ção do verbo em palavra. Desdobramento consentido para, de

140

Oralidades & Escritas

forma quase pass iva, o sujei to se ac tivar como receptor/produtor

de um legado que é também sua pertença: "Savana verde bem

fresca! savana verde verdadeiramente aberta ! à fome dos reba

nhos/ exposta aos rebanhos famintos/ savana verde/ não se apos

sou a terra ainda! do meu corpo/ e eu posso abrir os prados da

palavra / Deslumbramento,surpresa!/ Já existia o que se aprende

agora! e o que acontece acon tecia .i~../Mas como havia de sabê

-10 então/ quando a torrente me arrastava ainda! e eu via a minha

fa,ce renovar-se?" (OSB, p. 41).

Hábito da terra (1988) retoma, mais uma vez, as referências

ao sul e faz uso ainda de provérb ios, citações, recombinando, re

construindo; desdob\'amentos de processos fonnâis anteriores. O

uso do potencial gráfico da página, do espaço branco, onde os

textos disseminados dialogam e os itálicos criam linhas de dife

rentes leituras possíveis.

Reescrita que impregna o seu sujeito /to constante renasci

mento das falas/jormas em que se outra, e se renasce como su

jeito; demanda, revelação fragmentária, travessia dos lugares,

geo-grafias dos processos compositivos empregues na sua rein

venção cénica. Os nomes não chegam para definir o que se ama,

para se dizer quem é, onde se está, donde se provém. O livro

está sempre por escrever, até que um dia seja o silêncio: "tran

quilas são as paisagens onde a idade não conta".

Mas, o que viémos anotando acerca do percurso de escrita

de Ruy Duarte de Carvalho, encontra-se, afinal, bem explícito na

Arte Poética deste livro. Distanciando-se, aproximando-se, do

zoom no grande plano, o sujeito sabe que o ~·chã,.ode oferta" é aterra onde todos os seus sinais se gravam, se apagam, se torh-àm

a inscrever. Citamos, para concluir, aqui refeito , o seu teXto: ",

"Um texto é como um esforço de existir. Assim na vida,

quer dizer, no texto, Que se constrói/ Um texto ou um percurso?

Assim um gesto, quer dizer um texto. Há um lugar que invade

outro lugar e esse lugar estará presente noutro. Não há lugar

achado sem lugar perdido. Partir de uma palavra. Partir numa

palavra. Confirmações possíveis. f idelidade a quê? Texto, lugarde encontro. Casam-se além, asfalas de um lugar. no encontroda memória com a matriz.

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anil Mafaldll Leite

Não poderia traduzir palavras. Optei assim por traduzir a

forma e descobrir palavras que acrescentadas de outras são

palavras novas. Palavras de um guerreiro ou as de um rei? Quecoisas haverá que só o ouro as diga? Hão-de voltar a mim estes

discursos. Ainda mal saí da minha infância e só há pouco decifrei

o meu nome. Um dia só não basta para aprender a combinar as

/ vestes da forma. A labareda e a margem não dizem mais do queo encontro." (HT, p. 9/20).

-.

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Barthes, Roland,Roland Barthes por Roland Barthes, Lisboa, Ed.70,1976.

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142

CONCLUSÃO

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Tendo em conta a importância da oralidade, como um para·

digma diferenciador importante, se não fundamental, para o

estudo das literatu l'as afr icanas, este livro de ensaios procurousituar teoricamente, na sua pr imeira parte, os pressupostos ideo

lógicos que se prendem com a sua utilização e concepção em

vários discursos críticos, r eveladores de formulações por vezes

idea li stas e por vezes uni formizantes. Procurou também equacio

nar o enquadramento das literaturas africanas de língua portu

guesa no seu específico relacionamento com as oralidades, evi

denciando algumas das particularidades que neste domínio se

apresentam ao estudioso das matérias.

Há que levar em conta os factores contextuais - históricos,

sociológicos, antropológicos - de formação e desenvolv imento

das literaturas africanas de língua portuguesa, e ainda a sua parti

cular vertente de adequação em cada uma das literaturas nacio

nais. A língua portuguesa apresenta- se, neste quadro de d iferen

tes rea lizações , como um dos primeiros e lementos propiciadoresde ser usado como meio revelador e transformador das diversas

oralidades.

Num segundo momento destes ensaios procurou-se estabelecer os elos dessas oral idades com as escritas nas literatu ras afri

canas de língua portuguesa - ou a forma de fazer a ponte entre a

escrita dos livros e a escrita da alma47 - mostrando, em especial,

formas de tl'atamento da língua e sua manipu lação a fim de serem

receptáculo das oral idades, bem como diferentes modos de l'ef!e

xão temática sobl'e o assunto inscritas em obras de ficção e de

poesia angolanas e moçambicunus.

Através de textos de Mia Couto, de Fernando FonsecaSantos, de Ungulani Ba Ka Khosa e de Manuel Rui pudémos

percorrer uma p<lrte do universo de transfiguração dos modos de

47 "Ovindele visolleha ololldClkcrv'amikmlda elU It/visoltehela v'olukolo" -

pl'Ovérbio umbundu que significa "Os brancos escrevem nos livros, a

gente vai escrevendo ! lU alma" (Cr. F, F. Santos, Os Caminhos da Terra,

Lh>boa. Quelzal, 1997, p. 376).

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""Ana Mafalda . Leite

escrita da língua portuguesa, bem como o seu ,dialogismo comoutros universos Iinguístico-culturais. Com as obras destes autores revelou-se a insistente reflexão tematizada sobre o mundo

dos mais velhos e dos mais novos, da conjugação necessária en

tre oralidades e a escrita, bem como da necessidade de equilíbrio

entre a herança de tradições antigas com a mudança que os no

vos tempos trouxeram.

Pela memória oral da poética de Noémia de Sousa e de JoséCraveirinha constatou-se a original manei,ra de assumir legados

provenientes da tradição oral moçambicana que se entrosaram à

escrita de uma poesia ideologicamente necessária nos seus con

téudos epocais. Por outro lado, a mais recente poesia de ArEndo

Barbeitos e de Ruy Duarte de Carvalho, tão diferentes nos percursos escolhidos, manifestam essa similar, embora distinta, de

manda de ajustamentos recompositivos entre o legado oral e aescrita.

Outras abordagens são possíveis e, nomeadamente, a do

tratamento dos géneros, que será objecto de trabalho noutromomento. Diferentes obras, outros autores e literaturas merecem

identicamente especial atenção neste domínio. Este ensaio terá,no entanto, permitido repôr em outros termos alguns conceitos

operatórios e esclarecer preconceitos, porventura ainda eivados

de certo nativismo e neo-romantismo, que se encontram no discurso crítico e teórico.

Sistematizar bibliografia fundamental para o estudo destas

questões que entrelaçam o mundo das oralidades com o das es

cri tas foi outro dos aspectos que se procurou evidenciar, assimcomo dar a conhecer alguns dos trabalhos universitários mais si

gnificativos que nesta área se têm realizado, procurando encon

trar percursos analíticos exploratórios dos relacionamentos entre

as obras escritas e outras heranças e tradições não escritas.

Neste caminho pessoal, a que os meus diferentes trabalhos

vão remetendo, traçado também a partir do camin~o de muitosoutros investigadores, começado a partir de remotos longes,

verificou-se que a escrita se procurou fundamentar e esclarecernas oralidades, numa estreita e unida atracção, que nos levou ao

uso desse"&" aditivo, inseparável e comunicante que se encon

trou para o título deste ensaio.

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BIBLIOGRAFIA

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Page 29: LEITE, Ana Mafalda - Oralidades

7/28/2019 LEITE, Ana Mafalda - Oralidades

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Ana MaÍalda Leite Oralidacles & Escritas

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