Jesus Apócrifo

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  • 8/7/2019 Jesus Apcrifo

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    Jesus Apcrifo? Jesus

    Por:Rev. Augustus Nicodemus Lopes

    Na semana da Pscoa do ano de 2002, a revista poca publicou, mais uma vez, umareportagem acerca de Jesus, intitulada "Jesus na boca do povo" (poca, 1. De Abril2002, pp. 77-83). O artigo, assinado por Antnio Gonalves Filho, questiona o retratode Jesus que nos oferecido nos evangelhos cannicos (Mateus, Marcos, Lucas e Joo)e afirma que est crescendo o retrato de um outro Jesus, pintado nos evangelhosapcrifos, escritos pelo povo simples, onde so narrados detalhes e fatos da vida deJesus quando criana, adolescente e jovem. Muitos livros tm sido publicados acercadestes evangelhos, e naturalmente os evanglicos tm ficado confusos.

    Os evangelhos apcrifos so imitaes grosseiras dos evangelhos, escritos por volta dossculos II a IV, que contm lendas e histrias incrveis sobre Jesus, e que procuramimitar os evangelhos autnticos que temos em nossa Bblia. Temos notcia de cerca decinqenta destes evangelhos, alguns preservados em pedaos, outros em sua inteireza, ede outros s sabemos o nome. Os que foram preservados e podem ser lidos hoje sopoucos, e entre eles se encontram O Proto-evangelho de Tiago; Evangelho de Pseudo-Mateus; Evangelho da Natividade de Maria; Histria de Jos, o Carpinteiro; Evangelhode Tom; Evangelho de Nicodemus; Evangelho de Felipe; e Evangelho dos Egpcios.

    Desde cedo a Igreja Crist rejeitou estas obras, pois no preenchiam o critrio decanonicidade: no foram escritas pelos apstolos ou por algum ligado a eles,contradiziam a doutrina crist, tinham exemplos e recomendaes morais e ticas poucorecomendveis, e seus autores falsamente atriburam a autoria aos apstolos, como por exemplo, o Evangelho de Tom. Alm do mais, suas histrias fantsticas acerca deCristo claramente revelavam seu carter especulativo e supersticioso, ao contrrio dasobriedade e da seriedade dos evangelhos bblicos.

    Mas a provocao da revista poca no coisa nova, e nem se limita aqui ao Brasil.Durante a Pscoa de 1996, trs das principais revistas norte-americanas publicarammatrias de capa sobre os mais recentes desdobramentos da ltima e mais nova fase daspesquisas acadmicas sobre o "verdadeiro" Jesus, empreendimento levado a efeitoespecialmente por estudiosos de linha liberal. Nessa poca, Jesus tambm andou sendocapa de revista aqui no Brasil, em artigos que seguiam a mesma linha, em termos gerais.

    Num certo sentido, o empreendimento no original. Num livro publicado em 1906,que marcou poca nos meios acadmicos do estudo dos Evangelhos, Albert Schweitzer descreveu e analisou o que ele batizou de "a busca do Jesus histrico". Nesse livro (TheQuest for the Historical Jesus), Schweitzer analisa os esforos de reconstruir a vida deJesus feitos pelos pesquisadores crticos a comear do sculo XVII.

    Os estudiosos crticos justificam a sua busca do "Jesus histrico" afirmando que a IgrejaCrist, pelos seus dogmas e decretos acerca da divindade de Jesus, obscureceu a suafigura humana, e tornou impossvel, durante muito tempo, uma reconstruo histrica

    da sua vida. Essa impossibilidade, argumentam eles, tornou-se ainda mais severa aps aReforma, quando a exegese dos Evangelhos e do Novo Testamento em geral passou a

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    ser controlada pelas confisses de f e pela teologia. Argumentam que, para que sepossa fazer uma reconstruo do Jesus histrico , portanto, necessrio deixar para trsos dogmas e a teologia, e tentar entender e reconstruir o Jesus da histria.

    Por dois sculos, estudiosos de dois continentes tentaram reconstruir o Jesus da histria

    partindo do princpio que o relato dos evangelhos bblicos errado, porm, sem muitosresultados positivos. O Jesus reconstrudo pelos liberais parecia mais o fruto daobstinao dos mesmos do que de uma sria pesquisa cientfica. O trabalho de R.Bultmann e K. Barth ps um fim honroso "busca" agonizante e declarou-a umaempreitada intil. A falta de consenso entre os estudiosos, a natureza altamenteespeculativa dos seus mtodos e a impossibilidade de provar as hipteses levantadaspara explicar o surgimento do relato dos evangelhos, acabaram por encerrar a busca.

    Mas, a idia no morreu. Estamos testemunhando em nossos dias mais uma tentativapor parte dos que no acreditam na historicidade dos evangelhos, de achar a "verdade"por detrs desses relatos. O artigo da revista poca apenas mais um artigoespeculativo neste sentido, que procura valorizar caricaturas de Jesus, to grosseiras,que nunca foram aceitas pelos cristos em todas as pocas como sendo autnticosrelatos da sua vida.

    Uma falha imperdovel de reportagens como a da poca compreensvel por teremsido escritas por jornalistas, e no por peritos em crtica histrica do Novo Testamento que no consultaram a opinio de pesquisadores bblicos de convicesconservadoras. A maioria dos citados, como Leonardo Boff (catlico liberal), GezaVermes (judeu), Fernando Altemeyer (ex-padre catlico) e frei Betto (catlico) norepresentam o pensamento mais amplo da comunidade acadmica internacional, tantocatlica como protestante. So reportagens unilaterais e preconceituosas, num certosentido.

    Algumas crticas podem ser feitas ao projeto da busca do Jesus histrico atravs dosevangelhos apcrifos. Em primeiro lugar, o pressuposto controlador da busca adesconfiana de que a Igreja Crist, propositadamente, escondeu a verdade sobre Jesus,ao rejeitar os evangelhos apcrifos. Tal desconfiana, porm, continua sem ter fundamento firme. Se algum quiser ver por si s porque estes evangelhos apcrifosforam rejeitados, s l-los e compar-los com os evangelhos bblicos. Em segundolugar, vemos a natureza altamente especulativa das hipteses e idias levantadas. Emterceiro lugar, no h consenso entre os atuais defensores do "novo Jesus". Exatamente

    por causa do alto nvel de especulao, o Jesus reconstrudo por eles continua sendomenos que convincente. No apresentam nenhum Jesus que seja realmente plausvel eque explique o surgimento da Igreja Crist.

    A busca do "verdadeiro Jesus" empreendida pelos especuladores e apreciadores dosapcrifos continuar. Mas, no precisamos ser profetas para predizer que no o acharo.Ele j est diante dos nossos olhos, nas pginas dos Evangelhos bblicos, mas os seuspreconceitos e a incredulidade impedem-nos de v-lo.