I COLÓQUIO CULTURA E EDUCAÇÃO NA AMÉRICA PORTUGUESA€¦ · a influÊncia da colonizaÇÃo...

20
I COLÓQUIO CULTURA E EDUCAÇÃO NA AMÉRICA PORTUGUESA Belo Horizonte Faculdade de Educação Universidade Federal de Minas Gerais 24 a 27 de abril de 2012

Transcript of I COLÓQUIO CULTURA E EDUCAÇÃO NA AMÉRICA PORTUGUESA€¦ · a influÊncia da colonizaÇÃo...

Page 1: I COLÓQUIO CULTURA E EDUCAÇÃO NA AMÉRICA PORTUGUESA€¦ · a influÊncia da colonizaÇÃo portuguesa para a relaÇÃo pÚblico-privado na educaÇÃo no contexto do rio grande

I COLÓQUIO CULTURA E EDUCAÇÃO NA AMÉRICA

PORTUGUESA

Belo Horizonte Faculdade de Educação

Universidade Federal de Minas Gerais

24 a 27 de abril de 2012

Page 2: I COLÓQUIO CULTURA E EDUCAÇÃO NA AMÉRICA PORTUGUESA€¦ · a influÊncia da colonizaÇÃo portuguesa para a relaÇÃo pÚblico-privado na educaÇÃo no contexto do rio grande

2

“Vivamus et metus.”

PROGRAMAÇÃO

Todas as atividades terão lugar no Auditório Prof. Neidson Rodrigues (2o. andar)

1

24 de abril – 18:00h Conferência de Abertura Prof. Dr. Guilherme Pereira das Neves – UFF Coordenação: Prof. Dr. Antônio Cesar de Almeida Santos – UFPR 25 de abril

Manhã – 8:30h Mesa Redonda Circulação de livros e práticas de leitura

• Prof. Dr. Álvaro Antunes – UFOP (Debatedor) • Profa. Dra. Márcia Abreu – UNICAMP (Conferencista convidada) • Prof. Dr. Cláudio DeNipoti – UEPG (Conferencista convidado) • Prof. Dr. Eduardo Neumann – UFRGS (Conferencista convidado)

Tarde 14:00h - Sessão de Comunicações 15:45h – Intervalo 16:15h – Sessão de Comunicações

26 de abril Manhã – 8:30h Mesa Redonda Práticas Culturais e Educativas

• Prof. Dr. José Newton Coelho Meneses – UFMG (Debatedor) • Profa. Dra. Maria Aparecida de Menezes Borrego – Museu

Paulista/USP ((Conferencista convidada) • Profa. Dra. Adriana Maria Paulo da Silva – UFPE (Conferencista

convidada) • Profa. Dra. Ana Cristina Pereira Lage – UNI-BH (Conferencista

convidada) Tarde 14:00h - Sessão de Comunicações 15:45h – Intervalo 16:15h – Sessão de Comunicações 18:00h – Lançamento de livros

2

19:00h – Pensar Educação, Pensar o Brasil – Conferência do Prof. Dr. Carlos Roberto Jamil Cury Local: Auditório Prof. Luiz Pompeu (Faculdade de Educação UFMG)

27 de abril

Manhã – 8:30h Mesa Redonda Administração, instrução, educação

• Prof. Dr. Luiz Carlos Villalta – UFMG (Debatedor) • Profa. Dra. Laura de Mello e Souza – USP (Conferencista

convidada) • Profa. Dra. Ana Rita Bernardo Leitão – Universidade de

Lisboa (Conferencista convidada) • Prof. Dr. José Maria de Paiva – UNIMEP (Conferencista

convidado)

Tarde 14:00h - Sessão de Comunicações 15:45h – Intervalo 16:15h – Sessão de Comunicações 18:30h - Conferência de Encerramento Prof. Dr. António Gomes Ferreira – Universidade de Coimbra

Coordenação: Profa. Dra. Thais Nivia de Lima e Fonseca

Page 3: I COLÓQUIO CULTURA E EDUCAÇÃO NA AMÉRICA PORTUGUESA€¦ · a influÊncia da colonizaÇÃo portuguesa para a relaÇÃo pÚblico-privado na educaÇÃo no contexto do rio grande

3

SESSÕES DE COMUNICAÇÕES

DATA HORÁRIO SESSÃO

25/04 14:00H CULTURA E DISCURSOS EDUCACIONAIS 1. A IDEIA DE ATRASO E O PAPEL DA EDUCAÇÃO NA MODERNIZAÇÃO PORTUGUESA DA SEGUNDA METADE DO

SÉCULO XVIII - EDUARDO TEIXEIRA DE C. JUNIOR (UFPR)

2. CULTURA ESCOLAR NO SÉCULO XIX: A INFÂNCIA DO HOMEM E A INFÂNCIA DA PEDAGOGIA - SÉRGIO PEREIRA DA

SILVA (UFGO) E ADEMILSON DE SOUSA SOARES (UFMG)

3. ALGUMAS REFLEXÕES SOBRE AS PUNIÇÕES NO IMPÉRIO PORTUGUÊS ENQUANTO POSSIBILIDADES

EDUCACIONAIS - GILMAR ALVES MONTAGNOLI (UEM-PR)

4. A INFLUÊNCIA DA COLONIZAÇÃO PORTUGUESA PARA A RELAÇÃO PÚBLICO-PRIVADO NA EDUCAÇÃO NO

CONTEXTO DO RIO GRANDE DO SUL - DANIELA DE OLIVEIRA PIRES (UFRS)

25/04 16:15H CULTURA ESCRITA E PRÁTICAS EDUCATIVAS

1. INSTRUIR E PERSUADIR: POESIA E PROJETO ILUSTRADO LUSO-BRASILEIRO - CLAUDETE DAFLON (UFF)

2. A ESCRITA MAGISTRAL: FORMAS DE APRENDIZADO DA ESCRITA DECORATIVA NO SÉCULO XVIII - MÁRCIA ALMADA

(UFMG)

3. A TRADUÇÃO COMO PRÁTICA CULTURAL: O TEATRÓLOGO CLÁUDIO MANUEL DA COSTA, MEDIADOR DE PIETRO

METASTASIO - NILZE PAGANINI E LUIZ PAGANINI (PUC MINAS)

4. ENTRE LIVROS E ESCRITOS; DANTAS PEREIRA E O ILUMINISMO PORTUGUÊS -RAMON GUILLERMO MENDES

(UEPG)

26/04 14:00H O ESTADO E AS REFORMAS DA EDUCAÇÃO

1. AS AULAS RÉGIAS E OS SALÁRIOS DOS PROFESSORES NO PERÍODO DE REORGANIZAÇÃO DOS ESTUDOS (MINAS

GERAIS, 1795-1800) - CLEIDE CRISTINA OLIVEIRA, SUELLEN CÁSSIA MARGOTI, CHRISTIANNI CARDOSO MORAIS

(UFSJ)

2. ENTRE CARNES VERDES E ÁGUAS ARDENTES: ARRECADAÇÃO DO SUBSÍDIO LITERÁRIO E INVESTIMENTO EM

EDUCAÇÃO NA CAPITANIA DE MINAS GERAIS (1772-1777) - MICHELLY DA SILVA OLIVEIRA, PATRICIANE XAVIER

MOREIRA DOS SANTOS, CHRISTIANNI CARDOSO MORAIS (UFSJ)

3. SILENCIAMENTO: A HISTORIOGRAFIA SOBRE A EDUCAÇAO FEMININA NA COLÔNIA E A CRIAÇÃO DAS AULAS

PÚBLICAS PARA O SEXO FEMININO NO PERÍODO MARIANO - FERNANDA C. COSTA FRAZÃO, CHRISTIANNI

CARDOSO MORAIS (UFSJ)

4. A BOA CONDUTA DOS PROFESSORES RÉGIOS - TEREZA FACHADA LEVY CARDOSO (CEFET-RJ)

Page 4: I COLÓQUIO CULTURA E EDUCAÇÃO NA AMÉRICA PORTUGUESA€¦ · a influÊncia da colonizaÇÃo portuguesa para a relaÇÃo pÚblico-privado na educaÇÃo no contexto do rio grande

4

26/04 16:15H INSTITUIÇÕES RELIGIOSAS E PRÁTICAS EDUCATIVAS I

1. PROJETOS E PRÁTICAS EDUCATIVAS DE FR. JOSÉ MARIANO DA CONCEIÇÃO VELOSO - ERMELINDA

MOUTINHO PATACA (USP)

2. O COLÉGIO DA BAHIA: DE COLÉGIO A UMA QUASE UNIVERSIDADE NA AMÉRICA PORTUGUESA - FERNANDA C.

DA E. DOS SANTOS (UFSC)

3. CATEQUESE E ALFABETIZAÇÃO: DUAS FACES DA MESMA MOEDA - MARIA APARECIDA DE ARAÚJO BARRETO

RIBAS (UEM-PR)

4. PEDAGOGIA JESUÍTICA E ALTERIDADE: A DEMONIZAÇÃO DA ALMA INDÍGENA - FABIO EDUARDO CRESSONI

(UNESP)

27/04 14:00H PRÁTICAS EDUCATIVAS E SOCIABILIDADES

1. PRÁTICAS EDUCATIVAS PRESENTES NOS ESPAÇOS DE SOCIABILIDADE: VILA BELA DA SANTÍSSIMA

TRINDADE E VILA REAL DO BOM JESUS DO CUIABÁ (1748-1822) - NILEIDE SOUZA DOURADO (UFMT)

2. CULTURA ESCRITA E INSERÇÃO SOCIAL FEMININA NA CAPITANIA DE MINAS GERAIS (1750-1822) - SILVIA

MARIA A. R. VARTULI (UFMG)

3. RECRIANDO LAÇOS: ARRANJOS COLETIVOS E PROCESSOS FORMATIVOS ENTRE A POPULAÇÃO NEGRA DE

PERNAMBUCO NO SÉCULO XIX - ITACIR MARQUES DA LUZ (UFMG)

4. LENDO, ESCREVENDO E BORDANDO: PRÁTICAS EDUCATIVAS DOS ÓRFÃOS DE FAMÍLIAS ABASTADAS DA

COMARCA DO RIO DAS VELHAS (1750 – 1800) - TALÍTHA MARIA B. GORGULHO (UFMG)

27/04 16:15H INSTITUIÇÕES RELIGIOSAS E PRÁTICAS EDUCATIVAS II

1. FONTE DA EDUCAÇÃO JESUÍTICA: CATECISMO BILÍNGUE DO PADRE MAMIANI - ANE LUÍSE SILVA M.

SANTOS (FJAV-SERGIPE)

2. UM PADRE-PROFESSOR NO SERTÃO - EDUCAÇÃO E CONQUISTA DOS ÍNDIOS DO RIO DOCE NA

CAPITANIA DE MINAS GERAIS (1758-1801) - BRUNO DUARTE GUIMARÃES SILVA (UFMG)

3. A EDUCAÇÃO RETRATADA NAS CARTAS DO PADRE MANOEL DA NÓBREGA (1517-1570) - FERDNANDO

MARCUS ORNELLAS E CÉZAR DE ALENCAR A. DE TOLEDO (UEM-PR)

4. A PRESENÇA DA COMPANHIA DE JESUS NO GUAIRÁ NO SÉCULO XVII - MARLI DELMÔNICO DE ARAÚJO

FUTATA (UEM-PR)

Page 5: I COLÓQUIO CULTURA E EDUCAÇÃO NA AMÉRICA PORTUGUESA€¦ · a influÊncia da colonizaÇÃo portuguesa para a relaÇÃo pÚblico-privado na educaÇÃo no contexto do rio grande

5

A IDEIA DE ATRASO E O PAPEL DA EDUCAÇÃO NA MODERNIZAÇÃO PORTUGUESA DA SEGUNDA METADE DO SÉCULO XVIII

Eduardo Teixeira de Carvalho Junior

Doutorando em História (UFPR) e professor do Unicuritiba [email protected]

Tradicionalmente, a historiografia nos apresenta o Iluminismo como um tema paradigmático para o campo da história das idéias. Construído a partir de um cânone, o Iluminismo se impôs e venceu o modelo da sociedade do Antigo Regime. Este paradigma norteou a direção de investigações sobre Portugal e o Brasil setecentistas, que, por suas naturezas históricas particulares, apresentam uma série de problemas em suas abordagens. Conforme apontaram alguns historiadores, Portugal não estava totalmente isolado e atrasado em relação à Europa, como queriam fazer pensar os críticos mais radicais da cultura portuguesa no século XVIII, como Luiz António Verney. Aliás, segundo Sebastião José da Silva Dias, “Verney deixou-se cegar pelas ‘luzes’ do século; exagerou os males da cultura nacional”. De fato, como apontou Antonio Manuel Hespanha, diante das mudanças que se apresentavam na Europa, “a questão era saber se o particular modo de ser da nação portuguesa (no que tinha ele de bem e mau) estava enraizado na própria natureza das coisas ou se era apenas a epidérmica consequência de costumes sociais ou políticos reformáveis.” Na historiografia portuguesa dos séculos XIX e XX, autores como Oliveira Martins, Antero de Quental e Antonio Sérgio também reforçaram a idéia de decadência, defendendo que a cultura portuguesa setecentista fora marcada pelo atraso e pela escuridão, o que levou a pensar que o Iluminismo não existiu em Portugal. Entretanto, se a sociedade lusa não viveu a mesma experiência do Iluminismo francês ou inglês, teve uma trajetória histórica específica, como bem aponta Franco Venturi. O contato de alguns portugueses com outras nações e com as idéias modernas divulgadas nestes ambientes intelectuais considerados mais avançados levaram a que eles elaborassem diagnósticos da crise e do atraso intelectual dos portugueses, e a necessidade de mudanças para fazer prosperar o reino. Portugal já havia sido um grande Império mas, por uma série de razões, estava vivendo uma época de decadência. Assim, recuperar o passado glorioso era apontado como argumento para superar o atraso de Portugal em relação às outras nações europeias. Um diagnóstico comum dava conta de que a estreita relação entre os domínios político e religioso em Portugal teria representado um obstáculo para a sua modernização, refletindo na situação decadente da Agricultura, das manufaturas e do comércio. Para os críticos da sociedade setecentista portuguesa, como Ribeiro Sanches e D. Luiz da Cunha, as nações da Europa centro-ocidental já haviam superado a estrutura arcaica das sociedades medievais, e um novo dinamismo anunciava estados cujas riquezas eram cada vez mais medidas pelo comércio entre eles. De outra parte, comparando Portugal com outros ambientes intelectuais, Verney exaltava o cosmopolitismo intelectual dos franceses, ingleses, holandeses e italianos, atribuindo o

atraso cultural português a um excesso de orgulho dos portugueses, fruto do preconceito e desprezo dos ibéricos em relação à cultura estrangeira. A partir destas considerações, foram analisados alguns textos de D. Luiz da Cunha, de Antonio Nunes Ribeiro Sanches e de Luiz Antonio Verney e, problematizando os discursos destes pensadores, discute-se até que ponto a idéia de atraso corresponde à realidade da cultura setecentista portuguesa. Assim, procurou-se compreender como a idéia de atraso foi fundamental para os argumentos desses intelectuais e, a partir disso, como essa mesma idéia foi utilizada para justificar as reformas do ensino português. Além de buscar compreender o papel da educação nas propostas de modernização do reino português, traço fundamental da especificidade de um ‘Iluminismo luso’, apontamos para as futuras consequências dessas mudanças na constituição do estado nacional brasileiro. Palavras-chave: Iluminismo e Educação; Portugal século XVIII; América portuguesa.

RESUMOS

Page 6: I COLÓQUIO CULTURA E EDUCAÇÃO NA AMÉRICA PORTUGUESA€¦ · a influÊncia da colonizaÇÃo portuguesa para a relaÇÃo pÚblico-privado na educaÇÃo no contexto do rio grande

6

CULTURA ESCOLAR NO SÉCULO XIX: A INFÂNCIA DO HOMEM E A INFÂNCIA DA PEDAGOGIA.

Sérgio Pereira da Silva

Pós-doutor em Educação, Professor do curso de pós-graduação em Educação (UFG)

[email protected]

Ademilson de Sousa Soares Professor-doutor da Faculdade de Educação da UFMG

[email protected]

O texto busca analisar a possível relação entre a ideia de infância do homem e a ideia de infância da pedagogia procurando responder como os pilares de uma sedimentada cultura pedagógica, que surge durante um século em crise, perdurou até os nossos dias, inclusive no caso da escola brasileira. Tomando a leitura dos textos “As palavras e as coisas”, “A microfísica do poder” e “A ordem do discurso”, de Michel Foucault, como referência para a análise proposta, problematizamos, na primeira parte do texto, a expressão infância do homem e enfatizamos a demanda por uma pedagogia que ajude o homem a nascer, viver, crescer, aprender e se desenvolver, inclusive como “objeto” das ciências humanas. Mas como pensar cientificamente o homem e a educação do homem? As “ciências duras”, tributárias da revolução científica do século XVII, negam qualquer historicismo, sociologismo, psicologismo e antropologismo, fazendo crescer a tensão entre os saberes sobre o homem e as ciências dedutivas e empíricas. As “ciências humanas”, por sua vez, reivindicando que o homem seja o seu objeto próprio de investigação, negam que a filosofia possa oferecer qualquer fundamento e faz crescer as tensões entre os chamados saberes objetivos e a reflexão filosófica. Na segunda parte do texto, exploramos as tensões que fizeram o pensamento do século XIX caracterizar-se como um compasso de espera pensante e viver uma profunda crise de representação em que a infância do homem se confunde com a infância da pedagogia. Essa crise e esse compasso de espera deixam inseguros o homem e a pedagogia que surgem, mas não impedem, no entanto, que diferentes sujeitos busquem consolidar os fundamentos de uma cultura escolar duradoura. Nessa perspectiva, as práticas educativas e os hábitos culturais serão cada vez mais “orientados cientificamente” a partir de um ideário de racionalidade que conduziria o homem para a maioridade. Para a análise dos pilares da cultura pedagógica que surge, questões como “o controle social do discurso”, “o poder oculto no discurso” a “vontade de verdade” e “intelectuais da pedagogia, poder e saber”, dentre outras, também perpassam nossa argumentação e buscam sustentá-la. Na terceira parte do texto, discutimos a realidade da educação pública no Brasil durante o século XIX como herdeira do período colonial brasileiro que teve fim apenas em 1822. Para manter os brasileiros sob severo controle, o império exerceu vigilância acurada sobre as práticas culturais e educativas de leitura e de escrita. No Antigo Regime português há uma curiosa semelhança entre dominação política e império da língua. A chegada da Corte Portuguesa em 1808 anunciou novos ares que se materializaram no processo de independência controlada. Foram dados os primeiros e tímidos passos para a constituição de uma suposta nação livre e para a constituição de uma tímida, mas tradicionalmente arrojada, cultura escolar no Brasil. Finalmente, concluímos que a nossa escola e também a nossa escrita, a nossa ciência e a nossa indústria devem muito ao século XIX como um tempo efervescente e pouco contemporâneo de si mesmo. Tempo que oscila entre apostar no futuro e se apegar ao passado. Por isso, a infância do homem em crise com todas as formas de representação terá que ser

educada por uma nova escola, também ela orientada por uma nova ciência pedagógica que vive plenamente a sua infância, mas que dá os seus primeiros e arrojados passos no sentido de constituir uma sólida e tradicional cultura escolar que perdura até os nossos dias, moldando corpos e mentes, atitudes e pensamentos. Palavras-chave: Cultura pedagógica; Século XIX; Infância do homem e da pedagogia

ALGUMAS REFLEXÕES SOBRE AS PUNIÇÕES NO IMPÉRIO PORTUGUÊS ENQUANTO POSSIBILIDADES EDUCACIONAIS

Gilmar Alves Montagnoli

Mestrando em Educação (UEM) [email protected]

Célio Juvenal Costa

Professor do Departamento de Fundamentos da Educação e do Programa de Pós-graduação em Educação (UEM)

O objetivo do trabalho é refletir sobre os modos de punir e os dispositivos simbólicos que os envolviam à época do Império Português. Trata-se do contexto das Ordenações Portuguesas, compilações de normas que pretendiam dar conta de todos os aspectos legais da vida dos súditos em todo o Império. Com enfoque ao Livro V (que trata das punições) das Ordenações Filipinas (1603), chamar-se-á a atenção para os mecanismos de punição/educação, com o objetivo de compreender o projeto de sociedade vigente. A fim de atingir os objetivos referidos, convém abordar algumas práticas do modo de conceber o poder no período em questão, que também se afirmava por meio de dispositivos simbólicos e rituais, além da punição, é claro. Conforme afirma Lara (1999), “Punir, controlar os comportamentos e instituir uma ordem social, castigar as violações a essa ordem e afirmar o poder do soberano constituíam elementos inerentes ao poder real”. Para ser eficaz, ressalta a autora, “a punição devia ser afirmativa e exemplar: como exercício de poder, ela devia explicitar a norma, fazer-se inexorável e suscitar o temor” (LARA, 1999, p. 21). Tal concepção de poder pode também ser percebida nas relações entre senhores e escravos no interior das fazendas e casas senhoriais, o que é evidenciado na advertência de Jorge Benci, um jesuíta italiano que, no final do século XVII, recomendava aos senhores “açoites moderados” (BENCI, 1977). No artigo intitulado “Escravidão e educação nos escritos de Antônio Vieira e Jorge Benci”, Menezes (2006) oferece elementos importantes para refletir sobre as propostas pedagógicas contidas nos sermões dos autores. O autor observa que, embora tivessem posições distintas, ambos os jesuítas não questionaram a escravidão, ao contrário, procuraram preservá-la. O fato é que Vieira tenta educar os escravos para a aceitação e Benci busca ensinar aos senhores como governar os escravos. Em virtude dos objetivos deste trabalho, merecerão destaque as considerações de Benci, por melhor expressar a concepção de poder sobre a qual ser pretende refletir. Para o pregador, dar ao escravo sustento, trabalho e castigo é, além de direito, uma obrigação devida por um senhor cristão aos seus escravos. Sobre as obrigações do senhor para com o escravo, estabelece Benci (1977): o sustento; o vestido, o cuidado em suas enfermidades; a doutrina cristã e, finalmente, o castigo, ponto que merece um olhar um pouco mais atento nesta discussão em virtude da função disciplinadora que possuía no contexto. Na tentativa de ensinar aos senhores a forma como governar os escravos, Benci expressa a concepção de poder característica do contexto em questão e, como tal, presente na legislação. Nas

Page 7: I COLÓQUIO CULTURA E EDUCAÇÃO NA AMÉRICA PORTUGUESA€¦ · a influÊncia da colonizaÇÃo portuguesa para a relaÇÃo pÚblico-privado na educaÇÃo no contexto do rio grande

7

Ordenações Filipinas, nota-se que o castigo físico devia ser exemplar, exibido a todos os presentes, infundindo temor, obediência e sujeição. Enfim, o objetivo é, a partir do ordenamento jurídico português promulgado em 1603 durante o reinado de Felipe II (1598 a 1621), refletir sobre a função pedagógica desempenhada pelas penas, uma vez que, por meio de sua aplicação, os súditos internalizavam os valores eleitos socialmente. Palavras-chave: Educação; Ordenações Filipinas; Punição. A INFLUÊNCIA DA COLONIZAÇÃO PORTUGUESA PARA A RELAÇÃO PÚBLICO-PRIVADO NA EDUCAÇÃO NO CONTEXTO DO RIO GRANDE DO SUL (1889-2000)

Daniela de Oliveira Pires

Doutoranda em Educação (UFRGS) [email protected]

O presente estudo pretende analisar a influência da colonização portuguesa no Brasil, como um fator importante, para o aprofundamento da relação público-privado na promoção da educação, tomando por base, o contexto do Estado do Rio Grande do Sul, a partir do séc. XIX. Neste sentido, consideramos que atualmente, um dos assuntos mais contraditórios no campo educacional, talvez seja a aproximação entre o público e o privado no fomento da educação pública. Tal debate atravessa toda a nossa história educacional. História esta que para ser mais bem compreendida, com o aprofundamento de aspectos relacionados à formação da própria sociedade portuguesa, pois muito dos costumes e valores de Portugal, acabaram por influenciar a nossa formação enquanto país, enquanto nação. Assim é imperioso analisarmos os aspectos relacionados ao período do Brasil – Colônia, bem como do Brasil- Império. Dentre os aspectos da sociedade portuguesa e, que foram incorporados pelo Estado brasileiro, podemos destacar valores como a meritocracia, a solidariedade mútua e, que passam a ser vinculados, nos dias de hoje, com a promoção das políticas públicas, em especial o direito à educação. À meritocracia e o privilégio pessoal, eram característicos da organização do Estado português e, que na atualidade, são valores incorporados no âmbito educacional, especificamente com relação ao processo de avaliação, que leva em consideração, dentre outros requisitos, o mérito pessoal, denota uma espécie de influência. Para os portugueses, o mérito pessoal e os privilégios concedidos, em razão da responsabilidade individual eram o determinante para forjar a organização da vida portuguesa. Na visão de Sergio Buarque de Holanda, as principais consequências da colonização portuguesa e espanhola para o Brasil- Colônia, que se estenderam por trezentos anos, foi à imposição de uma cultura diversa, com valores culturais, sociais, econômicos e políticos diferentes dos hábitos e dos padrões sociais dos povos colonizados, fazendo com que nos forjássemos com uma sociedade, ainda hoje, vistos segundo o autor, como “desterrados em nossa terra”. O autor identifica estruturas geradas pela empresa comercial, que estão relacionadas com o nosso presente, mas também com relação a vários períodos da nossa história, gerando com isso, uma espécie de continuidade em vários aspectos da nossa política, em especial, com relação ao tratamento que a educação passa a receber. O estudo encontra-se em fase inicial, de levantamento de dados. As fontes de pesquisa utilizadas serão bibliográficas, contemplando obras no campo da História da Educação. Assim, serão analisados os principais autores da historiografia brasileira que tratam do período relativo ao Brasil-Colônia, do Brasil-Império e do período Republicano, como forma de demonstrar a evolução da relação público-privado, em âmbito nacional. Aprofundaremos também o estudo do contexto do Estado do Rio

Grande do Sul, a partir da contribuição de autores que tratam da temática regionalista. Podemos concluir até este momento que a estrutura oficial de organização social a época da colonização portuguesa, pertencia à esfera privada, e não a esfera pública, pois no caso, o que se legítima como oficial, pertence à esfera de organização privada. Corroborando com tal argumento, destaca-se que uma das características marcantes da sociedade portuguesa é a questão relativa à falta de organização administrativa pública e o destaque para a questão dos privilégios pessoais, da meritocracia. Acrescido a isso, resta destacarmos que o Rio Grande do Sul, durante o período da colonização, possuía uma importância estratégica para a Coroa Portuguesa, pois se configurava como um território de permanente disputa com a Coroa Espanhola. Por isto, já no século XVII, houve a preocupação de assegurar a presença de portugueses nesta região, adotando várias iniciativas que, em longo prazo, resultaram na formação do atual Estado do Rio Grande do Sul, fortalecendo assim, a sua influência, em vários aspectos da sociedade rio-grandense, durante os séculos seguintes. Palavras-chave: Colonização; Educação; Público-Privado.

INSTRUIR E PERSUADIR: POESIA E PROJETO ILUSTRADO LUSO-BRASILEIRO

Claudete Daflon

Doutora em Letras e professora de Literatura Brasileira (UFF) [email protected]

A difusão, especialmente via a Arte Poética (1748), de Francisco José Freire (1719-1773), do princípio horaciano do deleite e da utilidade na poesia luso-brasileira refletiu-se numa produção caracterizada pela consolidação do papel político do poeta no final do século XVIII. Nesse contexto, era recorrente a prática da poesia encomiástica, como observa Ivan Teixeira em seu trabalho Mecenato pombalino e poesia neoclássica (1999), em que o poema era compreendido como extensão da ordem do Estado. Por essa perspectiva, a atividade literária representava uma forma de atuação pública dos intelectuais comprometidos com o projeto ilustrado português. Por outro lado, como assinala Jorge Antonio Ruedas de la Serna, em seu trabalho Arcádia: tradição e mudança, de 1995, a produção poética no Brasil recebeu influência importante da Arcádia Lusitana e, por conseguinte, das diretrizes propostas por Pedro Antônio Correia Garção (1724-1772), como a defesa do panegírico fundada na restauração do gosto clássico e no patriotismo. Isso equivale a dizer que a poesia encomiástica, no contexto luso-brasileiro setecentista, filiava-se à tradição clássica do verso ao mesmo tempo em que exercia uma função político-ideológica. Se, contudo, a pátria confunde-se com o soberano, a defesa do Estado passa pelo fortalecimento do monarca, daí o prestígio do discurso elogioso. Outra influência importante na Arcádia Lusitana e que teve implicações nos caminhos dados à poesia de louvor foi João de Barros (1496-1570), que se mostrava favorável ao elogio e à exposição pública do mérito na medida em que permitiriam instituir como exemplo os homens excelentes. Em outras palavras, havia um sentido educativo a ser observado. Desse modo, a opção pelo encômio, muitas vezes apontada pela crítica, a partir do século XIX, como mera bajulação, aparece associada a uma importante função ideológica assumida pela poesia. Na verdade, o poeta preocupava-se em diferenciar o elogio da “infame” adulação. Jean Starobinski, em As máscaras da civilização, de 1989, observa a situação delicada do poeta que depende da benevolência dos poderosos, mas que, ao louvar, precisa diferenciar-se do adulador e, para tanto, lança mão de artifícios, como a atitude humilde na apresentação dos versos, que despertem a confiança do destinatário. Nesse sentido, a sinceridade entra como chave importante dessa poesia

Page 8: I COLÓQUIO CULTURA E EDUCAÇÃO NA AMÉRICA PORTUGUESA€¦ · a influÊncia da colonizaÇÃo portuguesa para a relaÇÃo pÚblico-privado na educaÇÃo no contexto do rio grande

8

patriótica e comprometida com o Estado, que encontra no elogio a forma de erigir exemplos a serem seguidos e de difundir as bases do projeto político em que se acredita. De todo modo, seja como parte das relações de favor seja como instrumento de divulgação dos ideais defendidos pelo poeta, o louvor ganha dimensão pedagógica na medida em que serve à persuasão e à difusão das ideias defendidas. Portanto, o exercício da poesia encomiástica por escritores como Manuel Inácio da Silva Alvarenga (1749-1814) revela seu reconhecimento como ilustrado engajado em mudanças relacionadas, sobretudo, às reformas educacionais impetradas no período pombalino. Amante da poesia e da matemática, Alvarenga adere à Ilustração portuguesa e considera necessárias as transformações no ensino da Universidade de Coimbra durante o reinado de D. José I. Sua atuação ainda se estende à atividade de Professor Régio, nomeado em 1782, assim como à sua participação na Sociedade Literária do Rio de Janeiro, fundada em 1786. Tratava-se, no final das contas, de contribuir para o processo de modernização de Portugal, o que só seria viabilizado com o estímulo à difusão das ciências modernas. Se motivações práticas, associadas a interesses econômicos, levaram a medidas que possibilitassem o desenvolvimento do conhecimento científico, esbarrava-se, contudo, nas contradições inerentes à sociedade portuguesa. Diante disso, torna-se ainda mais interessante a atitude pedagógica, especialmente, quando o poeta encontra na poesia espaço para o elogio das ciências e dos homens públicos comprometidos com o progresso. Por esse viés, merecem destaque poemas como À mocidade portuguesa, A D. José I, Às Artes, Os vícios e O Desertor assim como a ode e o soneto de título No dia da inauguração da estátua equestre. A leitura crítica dos versos demonstra a filiação às preceptivas em voga assim como sua atuação construída na convergência entre o ofício de escritor, a condição de intelectual ilustrado e professor. Palavras-chave: Ilustração, Poesia, Silvia Alvarenga, Educação, Século XVIII.

A ESCRITA MAGISTRAL: FORMAS DE APRENDIZADO DA ESCRITA DECORATIVA

NO SÉCULO XVIII

Márcia Almada Professora Doutora do

Curso de Conservação-Restauração de bens culturais móveis (UFMG) [email protected]

A escrita é um instrumento cognitivo, comunicativo e expressivo; portanto, possui determinados conjuntos de normas que devem ser seguidas para o cumprimento das suas funções. Tomando como exemplo os documentos públicos produzidos no mundo ocidental durante a Era Moderna, percebemos uma ordem construtiva pré-estabelecida: cartas de mercês, diplomas, estatutos confrariais, entre outros, deveriam ser executados segundo regras que atingiam tanto o texto quanto a ordem estética. Segundo Francisco Gimeno Blay, a visualidade é um discurso e possui regras que indicam, a um olhar, o seu destinatário, uso ou finalidade. Assim, determinados tipos de letras, suportes e desenho da página eram utilizados de acordo com a função, o emissor ou o destinatário do documento. No entender de Fernando Bouza Alvarez, desde o surgimento da tipografia, o registro manuscrito ganhou em solenidade em relação ao impresso - beleza e qualidade exterior faziam parte dessa construção simbólica. O trabalho de ornamentação de documentos estava plenamente vivo durante o século XVIII e os investimentos nesta atividade eram uma prática distendida socialmente. Segundo Armando Petrucci, interessa saber quem estava capacitado a produzir os documentos, porque eram

necessários e a extensão do domínio da escrita na sociedade; estes fatores estão associados ao significado da forma gráfica. Variados grupos sociais, da elite às camadas populares, fizeram uso da escrita, em suas formas gráficas rebuscadas ou mais simplificadas. Assim, pode-se entender que a difusão social da escrita está além da capacidade de escrever e usar os sinais do alfabeto e que as padronizações gráficas exercem função cultural e simbólica. As dinâmicas aplicações das regras assinalam que os usos que se faziam da escrita estavam além do âmbito exclusivo dos grupos de letrados e o aprendizado das normas e das técnicas podia ser feito em graus variados e não descartava o autodidatismo. O profissional da escrita deveria dominar as normas, que eram apreendidas na prática ou através de manuais. Dos manuais da arte de escrever podem ser extraídos os padrões difundidos em cada época. A partir dos textos, prólogos, frontispícios e mostras caligráficas desse material impresso, é possível perceber quais eram os conceitos e as discussões que giravam em torno do uso da caligrafia. Serão apresentados os dois principais métodos de ensino, cujas discordâncias motivaram um intenso debate entre os seus defensores. De certa forma, a discussão refletia a preocupação com a inserção da caligrafia no grupo das artes liberais e, consequentemente, com o status social dos profissionais envolvidos com a arte gráfica da palavra. Apesar da defesa da aprendizagem metódica e com regras definidas, apresentaremos exemplos que afirmam que a realidade não descartou a possibilidade do ensino sem a intervenção direta de mestres e mesmo do autodidatismo, prática que é percebida nas vozes dos autores, bem como nos próprios documentos. Serão apresentados e analisados nessa comunicação os manuais de caligrafia impressos em Portugal no século XVIII, suas relações com as publicações europeias e as formas como foram usados por mestres privados e escrivães autodidatas na América Portuguesa. Palavras-chave: Caligrafia, ensino, século XVIII A TRADUÇÃO COMO PRÁTICA CULTURAL: O TEATRÓLOGO CLÁUDIO MANUEL

DA COSTA, MEDIADOR DE PIETRO METASTASIO Nilze Paganini

Doutora em Letras (PUC Minas) [email protected]

Luiz Paganini

Doutor em Estudos Literários (UFMG) [email protected]

No século XVIII, os habitantes letrados da Capitania das Minas Gerais estavam atentos às mudanças que ocorriam em outras partes do mundo, tanto no que se refere à economia, quanto no âmbito da política e da cultura. Tais letrados exerciam atividades literárias que podiam se combinar, em circunstâncias especiais, a execuções musicais, teatrais e/ou representações religiosas. Desse modo, nas práticas culturais do Setecentos mineiro, mesclavam-se frequentemente manifestações de cunho religioso a atividades profanas ou a celebrações em homenagem aos poderosos. Os estudos sobre a história da Inconfidência Mineira nos revelam que os intelectuais que viviam na Capitania das Minas Gerais criaram condições de intercâmbio cultural através da leitura de textos em suas próprias residências. Nessas reuniões, à semelhança de saraus, liam versos e trocavam ideias, muitas vezes extremamente revolucionárias, conseguindo burlar as rígidas normas censórias

Page 9: I COLÓQUIO CULTURA E EDUCAÇÃO NA AMÉRICA PORTUGUESA€¦ · a influÊncia da colonizaÇÃo portuguesa para a relaÇÃo pÚblico-privado na educaÇÃo no contexto do rio grande

9

impostas pelas autoridades portuguesas à publicação de impressos. Assim, o governo português nunca conseguiu evitar que a circulação de ideias ocorresse na Capitania, tanto internamente, como de fora para dentro e vice-versa. A leitura coletiva, em voz alta, diferentemente da individual e silenciosa, pode ter sido um meio eficiente de divulgação de textos interditos ou que levariam mais tempo para chegar aos leitores, caso necessitassem esperar as cópias manuscritas. Sem contar o fato de que essa teria sido uma forma de divulgação de ideias entre os analfabetos e os pouco letrados. Vivendo em Vila Rica nesse período histórico, o poeta Cláudio Manuel da Costa foi um importante mediador cultural, estabelecendo interlocução com a tradição literária e filosófica ocidental. Mais conhecido por sua obra lírica, o poeta inconfidente também produziu o significativo poema épico Vila Rica, no qual, além dos versos, empreendeu uma escrita de caráter historiográfico, através do Fundamento histórico, pretendendo narrar o passado da Capitania das Minas Gerais. Cláudio Manuel da Costa exerceu cargos públicos e alcançou notoriedade, como prova a circulação de seus textos impressos e manuscritos, encontrados em diferentes bibliotecas. Outras atividades exercidas por ele foram a tradução e a produção de textos para a Casa da Ópera de Vila Rica, realizando um trabalho conjunto com outros agentes culturais, como compositores, músicos, atores e produtores, tendo em vista a montagem dessas peças. Até hoje, pouco se pesquisou sobre as experiências de Cláudio Manuel da Costa como teatrólogo. Este texto visa abordar esta sua faceta intelectual a partir da Comédia do mais heróico segredo – Artaxerxe, adaptação da ópera Artaserse, do então conhecidíssimo autor italiano Pietro Metastasio. Enquanto o melodrama Artaserse, de Metastasio, possui personagens da realeza e transcorre em um palácio, Cláudio Manuel da Costa transformou a obra, misturando reis, príncipes e guerreiros a personagens bufos. Ao escrever a A Comédia do mais heróico segredo – Artaxerxe, Cláudio Manuel da Costa tinha mente que ela se destinava ao público da Casa da Ópera de Vila Rica e que, portanto, deveria conter elementos que agradassem àquele tipo de audiência. O trabalho de escrita que ele fez não pode ser chamado de uma simples transposição textual do sistema linguístico italiano para o sistema linguístico português, mas como um diálogo entre autores e obras, apropriação cultural e adequação literária a uma realidade local. Há todo um processo de recriação textual. ENTRE LIVROS E ESCRITOS: DANTAS PEREIRA E O ILUMINISMO PORTUGUÊS

Ramon Guillermo Mendes

Bacharel em História e graduando em Letras (UEPG) [email protected]

A presente proposta de trabalho visa se inserir em um contexto historiográfico em plena expansão (História cultural/Intelectual) com o intuito de promover um debate sobre a questão dos sujeitos dentro da historia e partir de uma analise micro para se compreender como Carlo Ginzburg não como se desenvolvem as idéias predominantes de maneira estrutural dentro das instituições em uma sociedade ou o grande fetiche do senso comum como um punhado de representações coletivas arbitrárias, mas sim como os processos de configuração e significação se verificam entre os personagens singulares do jogo cotidiano da cultura. Assim o projeto busca pensar a História dentro de conceitos epistemológicos e metodológicos operacionalizando e repensando suas aplicações e limites dentro da Historiografia bem como compreender de maneira mais efetiva os processos de leitura

e produção escrita se desenvolvem dentro de uma sociedade urbana que vive um período de readaptação e mudança drástica como a Portugal Pombalina. O Iluminismo português ou Pombalino tencionou dentro de sua lógica uma concepção bem delimitada de temas como universidade, política e ciência, as reformas iniciadas por Marquês de Pombal tinham o objetivo de tornar o ensino superior em Portugal uma prática cientifica voltada essencialmente pata as matemáticas e as engenharias, principalmente a naval. Nesse contexto de reforma pedagógica é que surgiu em decreto de cinco de agosto de mil setecentos e setenta e nova a Academia Real da Marinha que consistia em uma instituição de ensino superior de caráter politécnico que em mil setecentos e oitenta e três ganharia uma repartição especial, ou seja, uma polaridade primordialmente voltada ao ensino de futuros oficiais e cientistas, assim a Companhia dos Guardas Marinhas é fundada. A academia tinha um vinculo pedagógico estreito com as instituições que estavam sendo fundadas ou reformadas na Inglaterra e na França e por essa aproximação formava pensadores que dialogavam com o humanismo o empirismo e com os ideais políticos do liberalismo. José Maria Dantas Pereira um dos muitos professores e alunos formados pela academia é o objeto de estudo do presente texto. Um Militar, cientista e político que participou ativamente dos ciclos e espaços intelectuais da Portugal no final do século XVIII e início do XIX, seja com suas publicações na Real academia de Ciências de Lisboa, ou pela sua responsabilidade ao montar e organizar a biblioteca da Companhia das Guardas Marinhas. A conotação sintomática dos escritos de Dantas Pereira serve de porta de entrada para uma leitura e descrição dos discursos que normatizavam e perpassavam as concepções filosóficas e políticas que eram construídas através da leitura e redescrição das obras de pensadores como Condorcet, Condillac e Carnot pelos intelectuais portugueses. A presente proposta de trabalho visa discutir com campos diversos da História como, a história do livro e da palavra impressa de Robert Darnton bem como as concepções de história intelectual de Dominick Lacapra. A análise partirá do catálogo dos Guardas Marinhas organizado por Dantas Pereira datado de mil oitocentos e doze, e seguirá pela análise do seu texto publicado nas memórias da Real Academia de Ciências de Lisboa intitulado Memória sobre um Projeto de Pasigrafia, publicado em mil e oitocentos. Palavras-chave: Dantas Pereira, Paisigrafia, Iluminismo Português

Page 10: I COLÓQUIO CULTURA E EDUCAÇÃO NA AMÉRICA PORTUGUESA€¦ · a influÊncia da colonizaÇÃo portuguesa para a relaÇÃo pÚblico-privado na educaÇÃo no contexto do rio grande

10

AS AULAS RÉGIAS E OS SALÁRIOS DOS PROFESSORES NO PERÍODO DE REORGANIZAÇÃO DOS ESTUDOS (MINAS GERAIS, 1795-1800)

Christianni Cardoso Morais

Profª do Departamento de Educação da UFSJ [email protected]

Cleide Cristina Oliveira

Graduanda em Pedagogia (UFSJ) [email protected]

Suellen Cássia Margoti

Graduanda em Pedagogia (UFSJ) [email protected]

Nosso trabalho tem como objetivo mapear a distribuição das aulas régias na Capitania de Minas Gerais e identificar os salários pagos aos mestres nos últimos anos do século XVIII, período de reorganização dos Estudos Menores. Todavia, para que se compreenda este movimento, faz-se necessário retornar ao ano de 1759, que marcou o início da Reforma dos Estudos Menores empreendida por D. José I. Esta reforma suprimiu as escolas jesuíticas dos domínios portugueses, criou as aulas régias de Latim, Grego e Retórica, assim como a Diretoria Geral de Estudos – órgão responsável por fiscalizar a educação. Tal reforma se alicerçava em uma política regalista, que pretendia fortalecer e fazer progredir a economia e as ciências no Reino Lusitano. A partir de 1771, a Real Mesa Censória ficou responsável por administrar os Estudos Menores: as aulas de ler/escrever/contar e de Gramática Latina, Retórica, Grego e Filosofia (Ciências da Natureza). Em 1772 iniciou-se uma segunda fase da Reforma dos Estudos, sob orientação do Marquês de Pombal, muito mais centralizadora, que constituiu uma das primeiras iniciativas de estruturação de um sistema de ensino no Ocidente. Foi criado um imposto denominado subsídio literário, que se destinava a custear as reformas no campo da instrução, inclusive o pagamento dos salários dos mestres. Em 1777, com o falecimento de D. José I, sua filha D. Maria I assumiu o poder. No período mariano, houve, na Metrópole, um aumento das aulas de Primeiras Letras em mosteiros e os salários dos professores decaíram consideravelmente. Todavia, a política mariana era hesitante, quando comparada com as ações centralizadoras do período pombalino e o sistema escolar parecia fora de controle. Sendo acometida de um estado de insanidade mental, D. Maria I fora afastada do poder. Durante a regência de seu filho D. João, iniciada em 1792, as determinações marianas sofreram uma inflexão, especialmente a partir de 1794, com a criação da Junta da Diretoria Geral dos Estudos e Escolas do Reino – que ficou encarregada de administrar o sistema educativo português, sendo seus deputados nomeados em 1799. Houve uma retomada das orientações centralizadoras pombalinas. No final do XVIII, se encontrava em curso uma reorganização das aulas, a qual se inscrevia em um quadro de crise econômica geral, vivido tanto na Metrópole quanto no Ultramar. Tal crise levou a um processo de estatização e centralização administrativas dos estudos e à perda de poder das Câmaras Municipais. Neste contexto mais amplo é que devem ser analisados os temas que discutimos neste trabalho: a disseminação das aulas régias e os salários dos professores da Capitania de Minas Gerais. Para tanto, tomamos como fontes de pesquisa documentos oficiais, produzidos em escala regional, sob as ordens do Estado Lusitano (entre 1795 e 1800). A partir da documentação, foi possível identificar que as aulas de Primeiras Letras e de Gramática Latina foram as que predominaram durante o período analisado e que nem sempre as

cadeiras oficialmente autorizadas e distribuídas foram preenchidas. Mesmo entre as aulas que possuíam professores, houve um abandono progressivo, especialmente nas localidades mais afastadas do poder central da capitania. Identificamos os valores dos salários dos professores, que eram diferenciados conforme a especialidade ensinada: Filosofia (460$000 réis), Retórica (440$000), Gramática Latina (400$000) e Primeiras Letras (150$000). Havia casos em que os professores não recebiam os ordenados integralmente e, ainda, muitos em que o pagamento dos ordenados dos professores não estava sendo realizado há anos, de forma alguma. Os professores de Primeiras Letras eram os que recebiam ordenados inferiores com mais frequência. Assim, o Reino de Portugal, mesmo cobrando o subsídio literário de seus súditos, vinha acumulando dívidas com os mestres régios, que continuavam a exercer suas especialidades sem receber pelos serviços prestados. Palavras-chave: aulas régias; reorganização dos estudos; salários de professores.

ENTRE CARNES VERDES E ÁGUAS ARDENTES: ARRECADAÇÃO DO SUBSÍDIO LITERÁRIO E INVESTIMENTO EM EDUCAÇÃO NA CAPITANIA DE MINAS GERAIS

(1772-1777)

Christianni Cardoso Morais Profª do Departamento de Educação da UFSJ

[email protected]

Michelly da Silva Oliveira Graduanda em Pedagogia (UFSJ) [email protected]

Patriciane Xavier Moreira dos Santos

Graduanda em Pedagogia (UFSJ) [email protected]

O objetivo de nosso trabalho é mapear a arrecadação do imposto denominado subsídio literário e os investimentos realizados com o mesmo na Capitania de Minas Gerais, entre os anos de 1772 e 1777. Para tanto, realizamos um levantamento sistemático em fontes primárias produzidas por ordem da coroa portuguesa, em escala regional, as quais se encontram atualmente alocadas no Arquivo Público Mineiro. O subsídio literário foi um imposto criado em 1772 e se inscreve na Reforma dos Estudos Menores. Tal reforma fora iniciada em 1759, quando D. José I proibiu as aulas dos jesuítas em todo o Reino Lusitano e regulamentou novos métodos de ensino, criando as aulas régias de Latim, Grego e Retórica. Com a expulsão dos jesuítas, estabeleceu-se uma nova organização pedagógica que se inseria em um projeto político-econômico amplo e centralizador. A Reforma dos Estudos sofreu, em sua primeira fase (1759 a 1772), sérias dificuldades de concretização, especialmente sob o ponto de vista econômico. Os mestres eram pagos pelas Câmaras Municipais. Porém, seus salários variavam muito de uma localidade para outra e demoravam a se efetivar. Para garantir seu sustento, os professores tinham autorização para cobrar emolumentos dos pais dos alunos, mas tal alternativa não surtiu o efeito desejado. Com a publicação da Carta de Lei de 6 de novembro de 1772, iniciou-se uma segunda fase da Reforma dos Estudos, que se estendeu até 1777, ano que marca o fim do período josefino. Mantendo a política de intervir em todos os setores da sociedade, em 1772 o Estado Regalista, sob a orientação pombalina, trazia para si a tarefa de examinar e contratar

Page 11: I COLÓQUIO CULTURA E EDUCAÇÃO NA AMÉRICA PORTUGUESA€¦ · a influÊncia da colonizaÇÃo portuguesa para a relaÇÃo pÚblico-privado na educaÇÃo no contexto do rio grande

11

os mestres, gerir e financiar as aulas régias, sendo a Real Mesa Censória o órgão responsável pelo sistema escolar. A distribuição dos professores era feita de acordo com sua especialização por disciplinas, sendo oferecidas as aulas de Primeiras Letras (para ensinar Doutrina Cristã, ler, escrever e as quatro operações básicas da Matemática) e um segundo nível, em que havia as aulas de Humanidades (Grego, Latim, Retórica) e Filosofia (Ciências da Natureza, ou seja, Química, Física, Botânica). Como dissemos, o subsídio literário, objeto central deste estudo, foi criado em 1772 e se destinava a custear as reformas no campo da educação. Com sua cobrança, o Estado pretendia auferir rendas para o pagamento dos salários dos mestres. Tal imposto incidia sobre a carne verde (carne fresca), vinho, todos os tipos de água ardente e o vinagre. Sua cobrança deveria ser realizada pelas Câmaras Municipais, que enviavam, de três em três meses, as anotações feitas em cadernos de receita e os valores coletados para seus Ouvidores. Estes tinham o dever de enviar tudo à Junta da Real Fazenda de suas capitanias e estas remetiam as contas para a Junta da Real Fazenda do Rio de Janeiro que, anualmente, computava os haveres e deveres ao Rei de Portugal. O que não era gasto com os salários dos mestres da colônia era enviado a Lisboa. Assistia-se, dessa maneira, um movimento centralizador, de forte estatização do sistema de ensino lusitano. Ao mapear a arrecadação do imposto nas terras mineiras, percebemos que era bastante difícil para as câmaras manter os pagamentos dos súditos em dia. Havia muitos obstáculos, dentre eles a falta de funcionários, as dificuldades oferecidas pelas estradas, as grandes distâncias do território mineiro e até mesmo a sonegação do imposto por parte dos produtores. Tudo isso gerava grande oscilação no pagamento do tributo, inclusive dentro de uma mesma comarca. Foi possível perceber que, quanto mais próximo do poder central e quanto mais urbanizada a localidade, mais efetivas eram as contribuições, mas nem todas as populações que contribuíam com o imposto possuíam aulas régias. Por fim, considerando as receitas e despesas do tributo, constatamos que grande parte do valor arrecadado era enviado a Portugal e pouco se gastava com os ordenados dos professores na Capitania de Minas. Palavras-chave: aulas régias; subsídio literário; período josefino.

SILENCIAMENTO: A HISTORIOGRAFIA SOBRE A EDUCAÇAO FEMININA NA COLÔNIA E A CRIAÇÃO DAS AULAS PÚBLICAS PARA O SEXO FEMININO NO

PERÍODO MARIANO

Christianni Cardoso Morais Profª do Departamento de Educação da UFSJ

[email protected]

Fernanda C. Costa Frazão Mestre em Educação (UFSJ)

[email protected] O objetivo de nosso trabalho é analisar a produção historiográfica acerca da história da educação feminina no Brasil referente ao período colonial. Tomamos como fontes de pesquisa os resumos e trabalhos completos publicados nas edições I a VI do Congresso Brasileiro de História da Educação (realizadas em 2000, 2002, 2004, 2006, 2008 e 2011) e do I ao VI Congresso de Pesquisa e Ensino em História da Educação em Minas Gerais (ocorridos nos anos de 2001, 2003, 2005, 2007, 2009 e 2011). Ademais, os artigos de 27 números da Revista Brasileira de História da Educação, publicados entre 2001 e 2011. A partir destas publicações, realizamos um balanço

sobre a configuração da história da educação das mulheres no Brasil Colônia. A discussão que se apresenta diante do quadro de trabalhos que tomam o tema e a referência temporal em tela nos sugere duas questões norteadoras: a primeira relativa às fontes disponíveis para a pesquisa histórica do período colonial e, em segundo lugar, sobre as condições sociais e educacionais vividas pelas mulheres. Para a primeira questão, há que se ressaltar a escassez de fontes que dizem respeito diretamente às mulheres e as especificidades da documentação disponível para a pesquisa sobre o período colonial (como a dificuldade de leitura de documentos do período, tanto pela grafia quanto pela linguagem utilizada). Destacamos a proibição de tipografias na América Portuguesa até a vida da Família Real para o Rio de Janeiro, o que marca uma restrição à imprensa como fonte para o período anterior. O primeiro periódico impresso legalmente em nosso território foi A Gazeta do Rio de Janeiro (em 1808) uma publicação autorizada pelo Estado. No que diz respeito à segunda questão que norteia nosso estudo, destacamos que a institucionalização da educação das mulheres teve objetivos e um ritmo específico, bastante diferente da educação oferecida ao sexo masculino. No período em que se discutia sobre o funcionamento do ensino na colônia e se tentava implantar as aulas régias, a educação para as mulheres não era algo reconhecido como necessário. Assim, tomamos como caso exemplar a legalização do ensino feminino elaborada no reinado de D. Maria I (1777-1792), porém não efetivada e pouco estudada pelos historiadores da educação brasileiros. De maneira geral, a educação das mulheres era realizada prioritariamente no ambiente doméstico, restringindo-se ao aprendizado das habilidades básicas de leitura e escrita, Doutrina Cristã, prendas domésticas (trabalhos de agulha) e, em alguns casos, música. O ensino das operações básicas da Matemática era negado às mulheres e o da escrita visto com receio e temor. Com isso, podemos dizer do agravamento da escassez de fontes para a história da educação feminina, pois essas iniciativas de cunho privado quase não nos legaram registros. Assim, a partir das restrições educacionais das mulheres e consequente limitação de fontes sobre suas experiências educativas no período colonial, consideramos que o sexo feminino viveu em uma zona de silêncio. Tal situação, conferida pela negação do acesso das mulheres ao ensino público, naturalizada para o período, deve ser pensada em termos históricos. O fato de uma mulher ter ocupado o trono do Império Lusitano por algum tempo não significou uma mudança nos costumes à época. Mesmo tendo sido admitida a criação legal do ensino público feminino, constatamos a anulação desta iniciativa, o que revela uma forma de silenciamento histórico de qualquer ação do Estado em favor da educação das mulheres. No caso das mulheres que lidavam com uma situação de desigualdade naturalizada por sexo, é interessante notar a tentativa de equilíbrio da situação acionada no reinado de D. Maria I. Assim, este aspecto ganha ênfase no processo histórico na medida em que demarca rupturas na estrutura social ao trazer elementos novos e antes desconsiderados legalmente. O levantamento dos estudos sobre a história da educação feminina para o período colonial aponta para a existência de poucos trabalhos, mas é importante ressaltar que foram as pequenas incursões e práticas das mulheres que, em conjunto com as transformações mais gerais da sociedade, permitiram a elas novos rumos na história da educação no Brasil e nos âmbitos mais gerais e cotidianos das vivências. Palavras-chave: História da educação das mulheres; período colonial; produção discursiva.

Page 12: I COLÓQUIO CULTURA E EDUCAÇÃO NA AMÉRICA PORTUGUESA€¦ · a influÊncia da colonizaÇÃo portuguesa para a relaÇÃo pÚblico-privado na educaÇÃo no contexto do rio grande

12

A BOA CONDUTA DOS PROFESSORES RÉGIOS

Tereza Fachada Levy Cardoso Pós-doutorado pela Universidade de Lisboa

Professora da pós-graduação em Ensino de Ciências e Matemática e em Ciência, Tecnologia e Educação do CEFET-RJ

[email protected]

Este trabalho faz parte de uma ampla pesquisa sobre a história da profissão docente nos séculos XVIII e XIX no mundo luso-brasileiro, com ênfase nos professores régios. Um de seus objetos é investigar se é possível traçar um perfil profissional, tanto dos professores que atuavam em Portugal como os da América portuguesa. Em investigação anterior já se levantaram imagens produzidas tanto por docentes quanto por instâncias administrativas sobre o que era ser professor. Na presente pesquisa, elegeu-se um outro aspecto relevante, relacionado ao ofício: seu comportamento social. A Reforma dos Estudos, pelo Alvará de 28 de junho de 1759 criou em todo o reino português o sistema das Aulas Régias, com cadeiras avulsas de humanidades, que inicialmente foram Gramática Latina, Grego, Hebraico e Retórica, mas depois incorporaram disciplinas como Filosofia Racional e Moral, Matemática, Língua francesa, entre outras. Os professores régios eram aqueles selecionados e pagos pela Coroa Portuguesa. Pertenciam a um grupo de funcionários criado pelo Estado com a Reforma dos Estudos, realizada durante o reinado de D.José I (1750-1777) em Portugal, em geral conhecida na historiografia como as Reformas Pombalinas da Educação, por terem sido implementadas pelo poderoso ministro Sebastião de Carvalho e Melo, o marquês de Pombal. De acordo com Nóvoa (1987, p. 30), “a definição de uma profissão tem a ver com o reconhecimento e prestígio concedidos pela sociedade, a qual, por deter o poder de classificar e categorizar o mundo, concede a um certo grupo profissional o controlo (e o monopólio) de um determinado domínio de trabalho, confiando-lhe um mandato para definir as regras a que deverá estar sujeito o exercício da sua atividade.” O mesmo autor (p.49) observa que há um “conjunto dos interesses que se relacionam com o exercício de uma atividade institucionalizada (...) atividade que exige a posse de um corpo de saberes e de saber-fazer e a adesão a condutas e a comportamentos, notadamente de ordem ética, definidos coletivamente e reconhecidos socialmente”. A lei determinava que os docentes só deveriam ser contratados após se submeterem a um concurso. Mas ao requerer sua inscrição no exame, o candidato deveria apresentar necessariamente atestados sobre a sua boa conduta fornecidos pelo pároco e pela polícia, além de outros atestados, opcionais, todos recomendando o candidato para o cargo pretendido, fosse por suas virtudes morais, ou então pela experiência profissional que já possuía. Mas o que era uma conduta virtuosa? Quais os comportamentos passíveis de punição? Que tipo de queixas ou elogios eram feitas sobre os professores? Que tipos de reclamações os próprios professores encaminhavam? Qual o valor do exemplo, especialmente nessa nova categoria profissional, de professor público, que se formava? A boa conduta no exercício do magistério tinha um caráter pedagógico, deveria ser um bom exemplo de moralidade e do que era ser um súdito fiel e temente à religião. Mas isso trazia alguma novidade? E será que a diretriz governamental sobre o assunto era aceita e praticada da mesma forma no Reino e na América Portuguesa? Para o exame dessas questões foi preciso pesquisar, além da legislação e dos atestados fornecidos pelos candidatos ao cargo, também outras fontes: processos, requerimentos e pareceres encontrados em diferentes instâncias administrativas como, por exemplo, a Diretoria Geral dos Estudos, a Real Mesa Censória ou a Secretaria de

Estado dos Negócios da Marinha e Domínios Ultramarinos, no período de 1759 a 1822, quando da independência do Brasil. Palavras-chave: Aulas Régias; História da Educação; História da profissão docente PROJETOS E PRÁTICAS EDUCATIVAS DE FR. JOSÉ MARIANO DA CONCEIÇÃO

VELOSO

Ermelinda Moutinho Pataca Doutora em História e Ensino de Ciências da Terra (Unicamp)

Professora da Faculdade de Educação (USP) [email protected]

Frei José Mariano da Conceição Veloso (1742-1811) é bastante conhecido por seus estudos botânicos, especialmente na elaboração da Flora Fluminensis e na direção da Tipografia do Arco do Cego em Lisboa (1799-1801). Além destas, o frade franciscano exerceu diversas funções a serviço do Estado, já tratadas na bibliografia, e que revelam múltiplas habilidades do personagem e do importante papel político que exerceu junto à corte de Lisboa. Mas a faceta de Fr. Veloso como educador não foi suficientemente abordada e pode trazer contribuições para a história da educação no Brasil, em associação a história das ciências e das artes. Neste trabalho nos propomos a investigar as práticas educativas de Frei Veloso desenvolvidas ao longo de sua formação, assim como das múltiplas funções exercidas no Brasil e em Portugal, avaliando a criação de um instrumental teórico e prático de ensino, em que aliou suas funções à formação de quadros na História Natural, nas artes tipográficas, no desenho, na gravura. Iniciamos nossa análise pela compreensão de sua formação nos conventos franciscanos do Rio de Janeiro e São Paulo, na configuração inicial de seus referenciais teóricos, práticos e teológicos. Sobre a formação e atuação dos franciscanos como educadores e missionários, a documentação é escassa, mas estudos recentes analisam a atuação dos franciscanos na educação durante o período colonial, que podem auxiliar a elucidar as seguintes questões controversas na historiografia: como e onde fr. Veloso construiu conhecimentos em história natural? Ele seria um autodidata, ou os franciscanos já tinham introduzido as ciências naturais em sua formação? Num segundo momento, analisaremos como Fr. Veloso associou suas atividades a projetos e práticas educacionais. Quando esteve na capitania de São Paulo (1770-1782), Fr. Veloso exerceu funções complementares no ensino, na evangelização, na reurbanização da aldeia de São Miguel e na preparação de herbários e coleções de plantas vivas, remetidos para Lisboa. Durante a Expedição Botânica (1782-1790) manteve a alternância entre as atividades missionárias, educativas e de história natural. A formação e atuação de Fr. Veloso como franciscano auxiliaram nas práticas de história natural. Os conhecimentos indígenas sobre o território e a botânica eram essenciais na descrição e sistematização das espécies, como ressaltado nas instruções para o conjunto das viagens, e que Fr. Veloso como missionário beneficiou-se de seu conhecimento local e de sua proximidade com os povos indígenas pela evangelização. O estudo sobre as práticas desenvolvidas ao longo das viagens auxilia na compreensão sobre a formação do corpo técnico, assim como da convergência entre saberes como: preparação de coleções, sistematização de informações, desenho e mapeamento. Diferentemente de outras viagens do período, todos os componentes da Expedição Botânica se formaram e preparam para o exercício das viagens na América

Page 13: I COLÓQUIO CULTURA E EDUCAÇÃO NA AMÉRICA PORTUGUESA€¦ · a influÊncia da colonizaÇÃo portuguesa para a relaÇÃo pÚblico-privado na educaÇÃo no contexto do rio grande

13

Portuguesa. Surgem as questões: como e onde se deu a formação de profissionais tão habilitados para práticas complexas? Quais as influências e atuações de Fr. Veloso na preparação dos naturalistas, desenhadores e militares envolvidos na expedição? Sobre a formação e atuação dos desenhadores da expedição botânica, já encontramos um corpo documental expressivo, que são associados à bibliografia sobre a engenharia militar em Portugal e no Brasil, para elucidar as convergências entre arte e ciência para o desenvolvimento do desenho científico na Expedição Botânica. Por fim, analisaremos a atuação de Fr. Veloso em Lisboa (1790-1808). O mestre franciscano instruiu alguns naturalistas nas práticas de viagem, desenvolvidas na Expedição Botânica, através de correspondências e da publicação de manuais de história natural. Além disso, os interesses com a edição e a tradução se ampliam, gerando a necessidade de pesquisas nas artes tipográficas. As relações entre arte e ciência que desenvolveu durante suas viagens, foram essenciais na edição e tradução de manuais sobre gravura, pintura, desenho e história natural na Tipografia do Arco do Cego. Fr. Veloso orientou a formação dos artistas na oficina tipográfica, especialmente quanto às relações entre a história natural, o desenho e gravura, como expresso no Aviário Brasílico (1800). Nos prefácios das edições da tipografia encontramos as concepções de Fr. Veloso sobre temáticas diversas, como agricultura, natureza, artes e ciências, todos relacionados aos projetos políticos e econômicos para o Brasil, que nos auxiliam na compreensão de como pretendia difundir o conhecimento para a população brasileira, tão necessário para o desenvolvimento colonial.

O COLÉGIO DA BAHIA: DE COLÉGIO A UMA QUASE UNIVERSIDADE NA AMÉRICA PORTUGUESA

Fernanda Santos

Doutoranda em História (UFSC) [email protected]

É inegável que, a se pensar na existência de um projeto, ou projetos de educação no Brasil, durante o período colonial, deve-se considerar a análise das questões da presença dos Jesuítas na América Portuguesa. O Colégio da Bahia funcionou, entre os séculos XVI e XVIII, como uma parte do projeto global da Companhia de Jesus e foi um dos seus centros nevrálgicos. A aposta que os Jesuítas fizeram na educação, na Época Moderna, seria o grande meio para incutir uma nova consciência e formar um novo homem que fosse fundamente de uma nova civilização. O Colégio da Bahia, apesar de nunca ter sido elevado à condição de Universidade, na prática funcionou como tal, pois possuía quatro faculdades superiores e concedia graus académicos. Incitava-se também a que os alunos completassem os seus estudos académicos em Portugal, atendendo-se à orientação do Colégio Ultramarino. No século XVIII, nele foi fundada a Faculdade de Matemática, demonstrando que os Jesuítas, no Brasil, acompanhavam o desenvolvimento científico da época. O domínio de conhecimentos transmitidos no Colégio da Bahia em muito ultrapassava os limites da esfera espiritual e religiosa, e uma das figuras cimeiras e de topo formadas no Colégio foi o padre Antônio Vieira. Os conteúdos formativos do Colégio, a sua organização, o ensino, a metodologia colocaram-no no mais alto nível pedagógico e cultural, com o perfil de exigência de uma Universidade. Esta pesquisa pretendeu, assim, problematizar e expor os motivos que levaram a considerar o Colégio da Bahia como um caso pioneiro, particular e inovador na História da Educação do Brasil, quer pela dimensão, quer pela qualidade do seu ensino.

O Colégio da Bahia funcionou com parâmetros universitários semelhantes à Universidade de Coimbra. Há um histórico de tentativas para tornar o Colégio da Bahia uma Universidade, no intuito óbvio de se constituírem universidades no Brasil. Pretende-se abordar em que circunstâncias houve petições para elevar o Colégio a esta condição, e as razões pelas quais, sucessivamente, lhe foi negada essa possibilidade. O primeiro Curso de Filosofia no Brasil teve início em 1572. O Colégio da Bahia atribuiu o grau de Mestre em Artes aos estudantes, externos e internos. A segunda metade do século XVII constitui um período de análise de suma importância. Expulsos os invasores holandeses, as tentativas para se criar uma Universidade no Brasil são diversas. Em 1639 ampliou-se o uso das insígnias, porque tanto os Mestres de Teologia Especulativa e Moral, como os Examinadores, usavam a borla branca desta Faculdade à moda das Universidades portuguesas. As cerimônias de atribuição de grau representam, assim, um dos aspectos tradicionais das Universidades portuguesas mantidos nos colégios do Brasil. Portugal recusou-se, até 1689, a conceder todos os graus e privilégios universitários aos alunos dos colégios jesuítas. Este laço de dependência não era neutro nem indiferente, servindo, num primeiro momento, aos próprios Jesuítas que, desde 1555, detinham o controlo da Universidade de Coimbra, e constituindo-se, depois, em um dos mais úteis instrumentos de difusão do pombalismo e do espírito nacionalista. Na prática, o Colégio não obteve o título formal de Universidade, mas este estava implícito, isto é, o Colégio admitia indiscriminadamente os alunos de todas as classes ou raças que procurassem ali estudar e os seus graus acadêmicos eram dados em cerimônia pública, funcionando com parâmetros similares aos das Universidades de Coimbra e Évora. Ainda que este reconhecimento seja implícito é, evidentemente, insuficiente para dar ao Colégio da Bahia o título de Universidade, o Colégio ostenta a qualificação de Escolas Gerais ou Estudos Gerais, antiga fórmula da Universidade Portuguesa, quer em Lisboa, quer depois da sua transferência para Coimbra em 1537, qualificação essa que não se usava nos colégios portugueses. O uso desta designação por parte do Reitor do Colégio mostrava que o Colégio era, para os inacianos, uma universidade. No Brasil, esta qualificação de Estudos Gerais aplicou-se ao Colégio da Bahia e aos do Rio de Janeiro e Olinda, todos eles de fundação régia, e ainda a outros, e valeu como uma compensação ao título de Universidade. Palavras-chaves: colégio, Jesuítas, Universidade.

PEDAGOGIA JESUÍTICA E ALTERIDADE: A DEMONIZAÇÃO DA ALMA

INDÍGENA

Fábio Eduardo Cressoni Doutorando em História (UNESP)

[email protected]

O objetivo de nosso trabalho é analisar as dificuldades encontradas pelos missionários da Companhia de Jesus em relação à catequese dos índios Tupinambá, por ocasião da presença dos caraíbas nas aldeias. Identificados como principais opositores ao projeto catequético de conversão, fundado no entendimento de mundo cristão sustentado pela concepção cosmológica do orbis christianus quinhentista, os guias espirituais desse grupo indígena foram considerados os representantes e, portanto, operadores da vontade demoníaca agora presente na América portuguesa. Pretende-se, pois, discutir os motivos que levaram os inacianos a realizarem uma leitura que resultasse nessa alteridade, capaz de conceber os caraíbas como principais

Page 14: I COLÓQUIO CULTURA E EDUCAÇÃO NA AMÉRICA PORTUGUESA€¦ · a influÊncia da colonizaÇÃo portuguesa para a relaÇÃo pÚblico-privado na educaÇÃo no contexto do rio grande

14

adversários do processo de cristianização da sociedade brasileira que começava a se formar no século XVI. O problema aqui levantado trata da alteridade constituída pelo colonizador, neste caso os padres que cá desembarcaram. A visão de mundo jesuítica englobava em seu projeto missionário a salvação das almas indígenas existentes na América. No entanto, o ajustamento cultural proposto pelos religiosos deixaria de acontecer plenamente. A experiência social portuguesa obviamente era diversa da indígena encontrada na América. Os primeiros acreditavam em Deus e se organizavam de maneira diversa, em relação aos indígenas, marcando suas vivências por experiências ligadas a idéias próprias desse modelo, como ordem e hierarquia. A própria configuração da sociedade dada pelo Estado, ao fazer-se representar como um corpo social expõe essa condição. Sentir-se português deveria ser sentir-se, em seu modo de ser, cristão (leia-se sempre, neste caso, católico), acompanhando o restante desse modelo de organização social. O ponto comum entre todos, nesse sentido, referendando pelo modelo era o cristianismo. Os segundos veneravam Tupã. Seu modelo de organização social era diferente. A sociedade, tomando por experiência outra cultura, constituía-se, em sua concretude, por meio de outra realidade. Os contatos visavam trocas com significados simbólicos que demandavam dimensões diversas das práticas reinícolas expandidas em conjunto com o Império português. Dentre todas as diferenças que orientavam as sociedades portuguesa e tupinambá, um ponto de convergência pode ser identificado em meio a esse processo. O modo de vida desses dois grupos sociais no século XVI deveria ser socialmente definido por um elemento em comum: a religiosidade. Não se quer, aqui, transmitir a idéia de troca como algo estabelecido por intermédio de contatos tido como harmoniosos. A intencionalidade de ambos os grupos, estabelecidos em suas respectivas culturas para melhor (sobre) viver, conforme seus interesses requerem uma leitura que contemple, com efeito, os conflitos desempenhados em meio a esse processo. Consideremos ainda a seguinte questão: pensar a sociedade luso-brasileira quinhentista como local de inserção de dois blocos culturais “monolíticos” (o católico português e o religioso tupinambá), separados indistintamente, seria um erro. Nessa permanente experiência de contatos e trocas culturais, as práticas e representações simbólicas de ambos os grupos se alterariam de maneira significativa. Portugueses e indígenas recriariam suas atitudes em meio à nova experiência social. Todavia, sendo portadores de um modo específico de ser, tentariam fazer prevalecer à cultura da qual era detentores. Objetiva-se, portanto, entender como se deu esse encontro entre esses dois grupos, a partir do estudo dos contatos estabelecidos entre jesuítas e caraíbas, lembrando sempre que essa mediação cultural fora estabelecida por um ponto de convergência: os sistemas religiosos de ambos os grupos. Daí, aquilo que chamamos de demonização da alma indígena. Ao cruzar o Atlântico, os portugueses que desembarcariam na América trariam consigo também seus antigos demônios, representados pela experiência anterior, do antigo continente em que viviam. Em outras terras, a convicção européia consistiria em debater-se novamente frente a frente com o Diabo. Lê-se, nesse sentido, o novo (neste caso, o índio), a partir da antiga experiência (a européia), conduzindo a tradução do outro a uma leitura direcionada para si mesmo. Tem-se por intenção observar esse contato a partir de uma perspectiva que possa contemplar não somente a visão jesuítica, mas também a experiência tupinambá, distorcendo-a da leitura demoníaca exercida pelos religiosos. Primeiro, espera-se explicar os anseios jesuíticos, isto é, os motivos que fizeram com que os padres da Companhia desenhassem os caraíbas dessa maneira. Em seguida, quer-se, a partir

das mesmas fontes de afirmação demoníaca, encontrar resquícios do modo de ser do principal grupo indígena que ocupou o litoral no momento inicial da expansão do Império português em direção a América. PALAVRAS-CHAVE: América portuguesa; Companhia de Jesus; Catequese.

CATEQUESE E ALFABETIZAÇÃO: DUAS FACES DA MESMA MOEDA

Maria Aparecida de Araújo Barreto Ribas Pós-doutorado em Educação (UEM)

[email protected]

Em 1630 os neerlandeses empreenderam a tomada de Pernambuco e na sequencia de várias outras capitanias nas partes da América Portuguesa. De modo que a presença dos neerlandeses perdurou por 24 anos nas capitanias do norte (1630-1354). Neste contexto de dominação neerlandesa uma outra presença foi registrada no período: a Igreja Reformada ou Calvinista. Tal presença esteve estreitamente relacionada às disputas coloniais pelo território português ou hispano-português na América. O catolicismo romano era, até então, a religião oficial e a única permitida nos domínios da Coroa espanhola (era a época da União Ibérica); sua estrutura contava já com cerca de um século de atividades na colônia hispano-portuguesa, através de suas ordens religiosas, suas práticas eclesiásticas e seus métodos de catequese indígena. A tomada de Pernambuco e, na sequência, de outros territórios do norte pelos neerlandeses fez da religião reformada a nova ortodoxia das partes conquistadas; ou seja, o calvinismo instalou-se como religião oficial do Brasil holandês. Este trabalho propõe a discussão sobre a evangelização reformada ou calvinista entre os indígenas do Brasil holandês que tinha como parte central desse projeto a alfabetização dos mesmos. Porque para os reformados ou calvinista evangelizar e alfabetizar eram faces de uma mesma moeda. Uma pratica não se desvinculava da outra no entendimento dos reformados. A aparente possibilidade que qualquer pessoa tem de ascender ao mundo da leitura, desde que lhe sejam proporcionados os meios adequados, faz com que o ato de ler passe desapercebido enquanto prática cultural carregada de intencionalidade. A prática educativa sempre esteve plenamente convencida de que “o ensino da leitura é um meio de transformar os valores e os hábitos dos grupos sociais que são o seu alvo”. É neste sentido que esta discussão se insere. Isto é, o empenho por parte da Igreja Reformada durante a presença neerlandesa nas capitanias do norte, de alfabetizar os indígenas tinha como objetivo especifico a sua doutrinação. De modo que, dentre as características específicas da missionação calvinista, uma era essencial: a alfabetização. Para a Igreja Cristã Reformada, não havia como desvincular uma prática da outra: evangelização e alfabetização deveriam caminhar juntas, pois eram as duas faces de uma mesma moeda. Tal alfabetização tinha um propósito claramente definido: “a fim de ensinarem as crianças e os adultos a ler e escrever e instruí-los nos elementos da religião cristã”.1 A instrução religiosa, portanto, passava pela leitura. Considerando que parte do projeto da missionação calvinista envolvia a elaboração de um catecismo para uso dos catecúmenos, obviamente era preciso capacitá-los para a sua leitura, ou seja, alfabetizá-los; na verdade, a proposta pedagógica dos calvinistas, como testemunham

Page 15: I COLÓQUIO CULTURA E EDUCAÇÃO NA AMÉRICA PORTUGUESA€¦ · a influÊncia da colonizaÇÃo portuguesa para a relaÇÃo pÚblico-privado na educaÇÃo no contexto do rio grande

15

os documentos, objetivava mais que a alfabetização (o saber ler), mas o letramento, quer dizer, o saber ler e escrever. Em suas narrativas, os cronistas neerlandeses registraram impressões sobre a catequese e a alfabetização nas aldeias. Todos eles foram unânimes quanto ao sentido e a importância dessa obra para a conversão dos brasilianos: tratava-se de alfabetizar a fim de inculcar-lhes a fé reformada. Gaspar Barléu discorreu sobre a importância da alfabetização para uma efetiva compreensão dos preceitos da fé reformada por parte dos indígenas; nesse sentido, registrou a existência de muitas escolas nas aldeias, com o fito de preparar a seara. A alfabetização dos “aborígenes”, portanto, não era um fim, mas um meio. O “letramento” era encarado pelos reformados calvinistas como uma forma eficaz de extirpar os maus costumes indígenas e imprimir em suas consciências, de forma indelével, a pura fé reformada por sobre as idolatrias e paganálias tanto das religiões indígenas quanto da católica. Lembremos que a extirpação de maus costumes ou heresias através da educação não era uma prática voltada apenas para a colônia e seus habitantes naturais; era uma política pedagógica já implantada na Metrópole, neste momento, pelas próprias comunidades e a Igreja. Tanto aqui quanto além-mar, era preciso educar para bem catequizar.

PRÁTICAS EDUCATIVAS PRESENTES NOS ESPAÇOS DE SOCIABILIDADE: VILA BELA DA SANTÍSSIMA TRINDADE E VILA REAL DO BOM JESUS DO CUIABÁ

(1748-1822)

Nileide Souza Dourado Doutoranda em Educação (UFMT)

[email protected] A presente comunicação integra parte da discussão da tese que estou elaborando “Constituição e apropriação de saberes e fazeres em região de fronteira: Mato Grosso (1748-1822) ”, na área da educação, desenvolvida junto ao GEM (Grupo de Pesquisa em História da Educação e Memória) e ao Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE), do Instituto de Educação, da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT). O presente estudo tem como propósito conhecer o processo educativo no cenário colonial mato-grossense – segunda metade do século XVIII – tendo como uma das premissas - as práticas socioculturais e escolares, manifestos nos saberes e fazeres cotidianos de homens e mulheres, fundamentais para caracterizar a capitania de Mato Grosso e o seu lugar no mundo civilizado e colonial brasileiro. A pesquisa procura especialmente evidenciar os diversos mecanismos não sistemáticos ou formais utilizados para se educar e instruir a população, seja na perspectiva das estratégias de ordem autoritária propostas pelo colonizador, ao introduzir os colonizados no processo civilizatório, tão almejado pelas elites lusitanas e seus descendentes, como pelas táticas de resistências/improvisações, utilizadas pelos colonizados nos espaços de sociabilidade estabelecidos na Vila de Cuiabá e Vila Bela, no campo do trabalho - aprendizado de ofícios mecânicos - nas artes, construção, nas guerras, execução dos serviços domésticos, nas atividades religiosas, civis, comerciais e festivas, enfim, nos lugares de constituição e circularidade de cultura - da população lusitana, indígena, africana, mameluca e aquela advinda dos descendentes mestiços radicados em Mato Grosso. Essas práticas de ensino-aprendizado foram inspiradas na dimensão educativa e cultural, resultante do movimento constituído pelo trilhar cotidiano e do relacionamento circular de influências mútuas, especialmente no que diz respeito às

práticas, adaptações ao meio e assimilação de costumes, formas inovadoras de vida, conquistas, fracassos, fazeres e saberes cotidianos de homens comuns e anônimos, sujeitos que fazem a história. A priori, esses espaços são compreendidos pela pesquisa, como lugares de exercício de funções pedagógicas e de aprendizagem, para além da sala de aula, mas inserida nos diversificados espaços sociais e culturais. Desse modo, a investigação se insere no campo da história da educação e da cultura e a opção do estudo nos conceitos e categorias elaborados por Sérgio Buarque de Holanda (1994), Michael de Certeau (1994), Norbert Elias (1994), Roger Chartier (1990), Carlos Ginzburg (1987) e Pierre Bourdieu (2001). Sustenta-se, também o estudo nas abordagens propostas por pesquisadores portugueses e latino-americanos tais como: António Nóvoa, Justino Magalhães, Luciano Mendes de Faria Filho, Thais Nívia de Lima Fonseca, Cynthia Greive Veiga, Aníbal Quijano, Luiza Rios Ricci Volpato, Elizabeth Madureira Siqueira, Leny Caselli Anzai, Carlos Alberto Rosa, Otávio Canavarros e Gilberto Luiz Alves, entre outros, com aportes teóricos e categorias de análises que versam sobre práticas educativas “culturais e escolares”, escolarização, colonialidade, etnias, violência, barbárie, figuração, configuração humana e ações “civilizadoras” na América Portuguesa e no extremo Oeste. Já a empiria selecionada, que ainda está sendo compulsada, é de grande relevância e tem ofertado pistas e sinais indicadores sobre práticas de sociabilidade cultural nesta parte do território brasileiro, para além da educação formal. Todavia, outros documentos serão cotejados com aqueles já relacionados, sempre na perspectiva de ampliar, contestar, reforçar e explicar discursos e práticas oficiais e extra-oficiais, manifestos pela elite lusitana ou da nativa e apropriada pelo homem comum através da dinâmica e desenvolvimento humano nessa espacialidade e temporalidade. Assim, privilegiei um conjunto de fontes relativas a Mato Grosso, registros documentais manuscritos, impressos e bibliográficos, disponíveis no APMT; NDIHR/UFMT; BN do Rio Janeiro, no IHGB e IHGMT, entre outras instituições, dentre os quais se destacam os relatos de cronistas,as instruções régias, correspondências administrativas, narrativas e cronologias, a exemplo dos Anais do Senado da Câmara de Cuiabá e dos de Vila Bela, além de mapas dos habitantes, alguns deles inéditos, visto pertencer a coleções eclesiásticas. Portanto, nossa investigação objetiva, ao final da pesquisa,fazer fulgurar as diversas manifestações educativas presentes na sociedade colonial Mato – Grossense e expressas através de discursos e práticas cotidianas. Palavras-chave: História da Educação. Práticas Educativas. Mato Grosso Colonial.

CULTURA ESCRITA E INSERÇÃO SOCIAL FEMININA NA CAPITANIA DE MINAS GERAIS (1750-1822).

Silvia Maria Amâncio Rachi Vartuli

Doutoranda em História da Educação (UFMG) [email protected]

Este artigo é fruto da pesquisa de doutorado que vem sendo desenvolvida na Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais. A investigação apresenta como objeto de estudo a inserção social feminina em Minas Gerais nos séculos XVIII e início do XIX a partir do contato com os elementos da cultura escrita. Possui como objetivos: compreender como os grupos femininos, ao estabelecerem relações com a cultura escrita, construíram estratégias de negociação com as instâncias representativas de poder e evidenciar a atuação destes sujeitos na sociedade colonial.

Page 16: I COLÓQUIO CULTURA E EDUCAÇÃO NA AMÉRICA PORTUGUESA€¦ · a influÊncia da colonizaÇÃo portuguesa para a relaÇÃo pÚblico-privado na educaÇÃo no contexto do rio grande

16

Muito embora seja clara a existência de um discurso educativo “oficial” que objetivava a preparação da mulher para as funções de mãe e esposa, percebemos, por meio dos estudos realizados e da análise documental, que algumas mulheres exerceram atividades que em muito extrapolaram as diretrizes desses mesmos discursos. Ao travarem contato com a cultura escrita, essas mulheres ampliaram seus círculos de convívio e atuação, como a presença decisiva na administração da indústria doméstica e redefiniram os caminhos da vida nas Minas Gerais e da própria estrutura desta sociedade. A metodologia empregada buscou apreender a circulação, interpenetração e utilização de saberes no período colonial a partir da compreensão de que as práticas educativas são processos históricos dotados de particularidades e que extrapolaram os espaços responsáveis pela “educação institucional”. Para tanto, o entendimento dos papéis desempenhados pelas mulheres, dos espaços por elas freqüentados, de suas práticas cotidianas ou eventuais e das trocas culturais ocorridas neste contexto tornou-se indispensável. Nesta intenção, aprofundamos nossa compreensão acerca dos conceitos de letramento e de práticas educativas. Esses procedimentos metodológicos auxiliaram-nos a perceber de maneira mais atenta e detalhada as diferentes formas de relação com a instrução e com a cultura escrita como caminho para a interpretação e o posicionamento diante da realidade social. Consideramos, para tanto, as teorizações desenvolvidas pela História Social para a abordagem da trama social como cenário de conflitos, contradições e de elaboração de estratégias. As mulheres ao tecerem suas relações e agirem no cotidiano assumiram o lugar de sujeitos formuladores da vida social. Eram portadoras de singularidades, subjetividades e imprimiram modificações no mundo do trabalho, da política, da afetividade. Da mesma maneira, os estudos desenvolvidos no interior da História Cultural indicam caminhos para que possamos compreender as representações e as práticas engendradas por diferentes sujeitos, num dado momento histórico, como fatores configuradores do porvir social. Dentro deste quadro teórico, a investigação das vidas das mulheres que estabeleceram contato com a cultura escrita inspirou-se, também, na ideia de que os casos mais raros não podem ser encarados como algo fora da história. As exceções podem nos servir como exercício de redução da escala de análise. Ao focarmos as vidas das mulheres consideradas exceções não diminuímos ou limitamos nossa capacidade investigativa, mas aprofundamos nosso olhar, perseguimos as trajetórias de suas vidas, trabalhamos com os indícios documentais de maneira verticalizada e alteramos, assim, o conteúdo do que é observável e observado. Recuperamos o que parecia sem importância, desbotado ou frágil na imensidão da estrutura de todo um sistema. Coerentes a essa lógica, utilizamos como fontes de pesquisa os inventários e testamentos que compõem o acervo do Arquivo da Casa Borba Gato em Sabará, Minas Gerais. Somada à análise dos testamentos, realizamos a leitura dos requerimentos de tutela de mulheres viúvas que solicitaram provisões para administrar bens e pessoas. Esses documentos compõem o acervo do Arquivo Histórico Ultramarino e encontram-se digitalizados. Por meio desta última documentação, tomamos conhecimento do número significativo de mulheres que demonstravam interesse em gerir os negócios, cuidar dos filhos e educá-los. A partir das análises desenvolvidas, percebemos a realização de diferentes tarefas pelas mulheres como se “alfabetizadas fossem”, pois declaravam ser capazes não apenas de cuidar, educar e ensinar os filhos, mas reger e administrar bens e legítimas. Mesmo quando os homens assumiram papéis de mediadores da relação entre as mulheres e a cultura escrita, essas foram capazes de interpretar, demandar e definir aspectos importantes da vida social.

Palavras-chave: Cultura escrita; educação feminina; práticas educativas na colônia.

RECRIANDO LAÇOS: ARRANJOS COLETIVOS E PROCESSOS FORMATIVOS ENTRE A POPULAÇÃO NEGRA DE PERNAMBUCO NO SÉCULO XIX

Itacir Marques da Luz

Doutorando em Educação (UFMG) [email protected]

O estudo propõe uma reflexão sobre a dinâmica cotidiana da população de origem africana existente no Brasil no século XI, e no seu interior, a análise das diferentes formas de organização coletiva desses sujeitos, considerando tal atividade associativa não apenas como recurso de sobrevivência ao sistema escravista, mas também como expressão da experiência africana de vida coletiva preservada e reinventada no movimento da Diáspora. A partir desse entendimento, destaca-se o caráter formativo ou educativo presente nos processos de constituição e atuação dessas organizações. Para visualizar tal fenômeno, tomamos o particular contexto da Província de Pernambuco, tendo em vista seu papel significativo no trafico atlântico de escravos da África ao Novo Mundo e onde a grande presença dessa população implicou no surgimento de diversas entidades negras e na circulação de valores e saberes diversos por dentro delas. Com base num arcabouço teórico que inclui estudos sobre História da África, aspectos da História da população negra no Brasil, análises sobre o mundo do trabalho oitocentista, e também sobre o surgimento das práticas escolares no país, vimos realizando um levantamento documental a partir de diferentes entradas baseadas nas tipificações do fenômeno analisado, a exemplo dos Compromissos e Livros de Registros das irmandades religiosas. Além destes registros produzidos diretamente pelos próprios sujeitos pesquisados, importam a análise de ofícios e relatórios emitidos por órgãos oficiais e eclesiásticos da Província relativos a esse tipo de organização, bem como a legislação e jornais da época, considerando a contribuição desses dois elementos no exercício de compreensão da realidade vigente. Esses documentos vem sendo consultados no Arquivo Público Estadual e no Arquivo da Assembléia Legislativa de Pernambuco; também recorremos ao Instituto Arqueológico, Histórico e Geográfico de Pernambuco e IPHAN. Além desses acervos, deveremos consultar a documentação existente na Cúria Metropolitana de Recife e Olinda, no sentido de verificar dentre os registros e processos eclesiásticos mais vestígios desse universo afro-diaspórico traduzidos nas entidades religiosas e outras instâncias. Embora o estudo esteja na sua fase inicial, restringindo-se até o momento à apenas algumas irmandades, algumas não formalmente declaradas negras, vem sendo possível identificar alguns elementos relevantes no conjunto de aspectos que as constituem. Dentre os mais visíveis estão a ênfase nos ofícios por sua importância como ferramenta social e por na sua capacidade agregadora, ao lado do pertencimento étnico-racial dos integrantes das entidades. De forma mais sutil, observa-se também outros laços internos, a exemplo do aspecto geracional e conjugal, da mesma forma que a condição cativa e a territorialidade. A partir destas breves observações, acreditamos que na pertinência em relação ao estudo mais aprofundado quando a essa prática associacionista comum entre a população negra nesse período, na medida em que elas talvez pudessem representar certas “vivências africanas” para seus membros, ao mesmo tempo em que, sem dúvida, também ajudava na configuração de estatutos sociopolíticos diferenciados para melhor levar a vida na sociedade escravista. Talvez isso nos ajude a avançar na compreensão sobre as diferentes formas de afirmação e resistência promovidas pelos negros e negras, dentro

Page 17: I COLÓQUIO CULTURA E EDUCAÇÃO NA AMÉRICA PORTUGUESA€¦ · a influÊncia da colonizaÇÃo portuguesa para a relaÇÃo pÚblico-privado na educaÇÃo no contexto do rio grande

17

das quais o exercício associativo e o processo formativo que o constituía representaram crucial. Palavras-chave: Associacionismo, Formação Cultural, Diáspora Negra.

LENDO, ESCREVENDO E BORDANDO: PRÁTICAS EDUCATIVAS DOS ÓRFÃOS DE FAMÍLIAS ABASTADAS DA COMARCA DO RIO DAS VELHAS (1750 – 1800).

Talítha Maria Brandão Gorgulho

Mestre em Educação/ Fae-UFMG [email protected]

A presente comunicação é parte da minha dissertação de Mestrado em Educação defendida em dezembro de 2011 na Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais, sob a orientação da Professora Thais Nívia de Lima e Fonseca e intitulada “Aos órfãos que ficaram”: estratégias e práticas educativas dos órfãos de famílias abastadas da comarca do rio das velhas (1750-1800).” Para esta pesquisa, foi realizado um levantamento de todos os Inventários presentes no arquivo do Museu do Ouro/Casa Borba Gato – IBRAM de Sabará-MG, que tivessem datas de abertura entre 1750 e 1800 e pertencessem ao Cartório do Segundo Ofício, totalizando 488 documentos que formam o banco de dados dessa pesquisa. Feito isso, selecionei, através de critérios baseados na história econômica e demográfica, além de critérios criados especificamente para estas análises, os documentos que pertenciam aos sujeitos classificados como “os mais abastados”, a fim de alcançar os inventários que iriam ser utilizados para este estudo, cheguei ao número de 100 documentos considerados como os pertencente aos “mais abastados” e com os quais trabalhei mais detidamente. Após este processo, escolhidos os documentos que iriam me ajudar a colocar o foco nos sujeitos pretendidos, lancei mão de alguns testamentos, em geral os que estavam trasladados nos próprios inventários, para conseguir o confronto de fontes, com a finalidade de me aproximar das estratégias e práticas educativas dos órfãos, objetivo principal estudo realizado para a elaboração da minha dissertação. No texto que ora apresento, baseado nas análises expostas no segundo capítulo da dita dissertação, trago uma discussão acerca do conceito de práticas educativas. Procurei, neste momento da pesquisa, entender o que era percebido por educação na América Portuguesa no Antigo Regime. Para isso, analisei como o tema era tratado pela legislação do período e como, segundo os inventários e alguns testamentos, foi reinterpretado e adaptado às relações cotidianas que levavam às práticas educativas dos órfãos das famílias abastadas da Comarca do Rio das Velhas, sujeitos principais das minhas análises. Por meio dos inventários post morten, observei indícios que podiam ser relacionados à educação presentes nos bens arrolados, nos traslados dos testamentos, nos autos de contas e tive a possibilidade de perceber diferentes práticas educativas dos órfãos pertencentes a um grupo ainda pouco evidenciado pela historiografia da Educação. Seguindo as indicações das fontes, elaborei uma lista com essas práticas educativas encontradas a partir da qual foi possível observar várias práticas educativas dos órfãos das famílias mais abastadas deste período na Comarca do Rio das Velhas. A observação das várias práticas educativas me permitiu analisar as diferenças e proximidades entre elas, para os diferentes tipos de órfãos, fossem eles legítimos ou ilegítimos / naturais, homens ou mulheres trazidas neste texto. Acredito que a importância de tal estudo está na colaboração que o mesmo dá a discussão acerca conceito de práticas educativas. Conceito este que está ainda em desenvolvimento, principalmente nas pesquisas que vêm sendo elaboradas sobre a

educação nas Minas setecentististas, em especial pelo Grupo de Pesquisa Cultura e Educação na América portuguesa, do qual faço parte. Palavras-chave: práticas educativas, órfãos e abastados. FONTE DA EDUCAÇÃO JESUÍTICA: CATECISMO BILÍNGUE DO PADRE MAMIANI

Ane Luíse Silva Mecenas Santos

Mestre em História pela FJAV-Sergipe [email protected]

No alvorecer do século XVII a ação jesuítica intensificou-se no litoral da colônia lusitana do Novo Mundo. Paulatinamente, as aldeias indígenas foram transformadas em missões, nas quais a cultura e saberes locais foram sucumbindo diante da imposição da tradição cristã europeia. A ação catequética jesuítica nas terras situadas ao norte da capitania da Bahia resultou na produção de textos a respeito da língua e dos costumes dos povos que viviam às margens norte do Rio Real. Com isso, foram produzidos o Catecismo e a Gramática da Língua Kiriri, pelo inaciano Luiz Mamiani. Trata-se de escritos de fundamental importância para a compreensão da mentalidade dos jesuítas no período colonial e de suas ações na constituição de uma nova cristandade. Partindo da relevância de tais registros para a História da Educação no período colonial, este trabalho tem o propósito de apontar alguns sinais da catequese e do método utilizado por Mamiani. O catecismo foi encomendado pela Ordem, e só foi concluído vinte e cinco anos depois, elaborado graças, de acordo com o autor, aos seus doze anos de observação do comportamento. A mentalidade jesuítica emerge nas linhas da gramática e do catecismo, vislumbrando ao mesmo tempo a doutrina cristã e as normativas da língua kiriri. A pesquisa desenvolveu-se a partir da análise desses dois textos, que podem ser vistos como exemplares da ação catequética jesuítica nas capitanias do norte da colônia. Elementos como o medo passam a ser então o elo necessário para promover a aproximação do índio com os jesuítas. Os padres defendiam a ideia de que deviam preparar a alma dos nativos para que esses pudessem receber a fé cristã. A preparação era feita incutindo a necessidade do índio consentir a catequese como forma de manter sua segurança. A dialética conquistador-conquistado eclode nas entrelinhas dos textos. Além disso, a escrita de Mamiani também reflete a influência da retórica barroca, com imagens dissimuladas, cenários que mesclavam o vivido entre dois mundos distintos. Para Mamiani a língua é embaraçada nas frases, havendo divergências entre os próprios jesuítas quanto a sua escrita. Na escrita dos jesuítas da aldeia sergipana do Geru, a Europa cristã defronta-se com a América portuguesa indígena. Dois mundos aparentemente distantes se entrecruzam nas prédicas dos inacianos. A conquista da América lusitana não se fez somente com armas de fogo, mas também por meio das palavras e do ensino. Palavras-chave: catequese, educação jesuítica, Sergipe.

Page 18: I COLÓQUIO CULTURA E EDUCAÇÃO NA AMÉRICA PORTUGUESA€¦ · a influÊncia da colonizaÇÃo portuguesa para a relaÇÃo pÚblico-privado na educaÇÃo no contexto do rio grande

18

UM PADRE-PROFESSOR NO SERTÃO: EDUCAÇÃO E CONQUISTA DOS ÍNDIOS DO RIO DOCE NA CAPITANIA DE MINAS GERAIS (1758-1801)

Bruno Duarte Guimarães Silva

Graduado em Jornalismo (PUC Minas) Graduando em História (UFMG)

[email protected] Pesquisas documentais realizadas no Arquivo Público de Estado de Minas Gerais revelaram indícios da atuação, durante a segunda metade do século XVIII, de João Pedro de Almeida como Padre e Professor Régio nas localidades indígenas do Cuiaté e do Peçanha, região na época chamada de Sertão do Rio Doce. O trabalho em desenvolvimento tem como objetivo estabelecer relações entre os discursos de legitimação da atuação de Padres-Professores em aldeias indígenas, focando no caso singular de João Pedro de Almeida, o processo de conquista dos territórios ainda não controlados pelos colonizadores e os propósitos da educação civilizadora destinada aos índios aldeados. Pretende-se também apontar alguns aspectos da dinâmica da alteridade dos sujeitos produtores desses discursos. A presença de um padre e professor na região dos sertões é representativa do processo de expansão do território colonial na Capitania de Minas Gerais naquele período. A diminuição da produtividade mineradora no circuito das minas e a expectativa de descoberta de novas jazidas minerais no sertão leste da capitania incentivaram expedições a essas regiões ainda não efetivamente colonizadas. Entretanto, essas áreas há muito tinham sido habitadas pelos povos indígenas que fugiam do litoral da América Portuguesa e encontravam, nos sertões, territórios ainda não densamente povoados pelos colonos. A própria administração colonial considerava a existência de grupos indígenas nesses sertões um fator de controle a favor das ordens régias que proibiam, com o objetivo de se controlar o contrabando do ouro, o estabelecimento de colonos naquelas áreas. Entretanto, quando a necessidade da expansão da fronteira colonial se impôs, ocorreu uma mudança no papel que a administração destinava às populações indígenas. Se antes, eram vistas como necessárias e estratégicas para o controle da povoação, agora seriam consideradas obstáculos para o desenvolvimento econômico da Capitania. Foram organizadas expedições militares com o objetivo de reduzir os índios nas aldeias, regidas pela Lei do Diretório Pombalino de 1758 que já ordenava o estabelecimento de escolas separadas por sexo e o trabalho de mestres nessas localidades. No Diretório Pombalino está registrada a intenção de cristianizar e civilizar os índios como fins primeiros das ordens régias ali expressas. Tem-se aí a retratação do tema da civilidade e da ação civilizadora tão em voga na Europa do século XVIII, a disseminação de valores e normas de comportamento que integrassem os cidadãos em uma sociedade. Os índios cujos costumes são tidos como “abomináveis” e “pagãos”, depois de reduzidos nas aldeias dirigidas pelo Diretório Pombalino seriam educados para se acomodarem aos costumes da “civilidade”. Entretanto, cabe enfatizar que tal ação civilizadora não pretendia ser um processo de construção de padrões comportamentais, mas a imposição das normas e costumes europeus, tidos como “civilizados”. O trabalho considera as reformas educacionais pombalinas como mais um instrumento de caráter civilizador do Estado Português. A partir da regulamentação do subsídio literário em 1772, o número de cadeiras de aulas régias aumentou em toda a Capitania e foi também na década de 70 que João Pedro de Almeida se apresentou à administração colonial como mestre da aldeia do Cuiaté, requerendo o assentamento como Professor Régio de Primeiras Letras da localidade. O padre assumiu a cadeira em 1781, foi transferido em 1788 para a aldeia do Peçanha e morreu em 1801. Período contemporâneo

às notícias de ataque dos índios às povoações de colonos e expedições militares de redução e combate dos “gentios” que resistiam ao aldeamento. É dessa, não simples, coincidência temporal do trabalho do padre-professor com a expansão da fronteira colonial mineira que o trabalho elabora a relação entre a educação civilizadora e a conquista desses territórios. Os documentos pesquisados são do tipo administrativo, como folhas e recibos de pagamento, assentamentos e requerimentos, de onde é possível extrair informações sobre o tempo de serviço, valor do ordenado e relações do Padre com outros sujeitos da administração colonial. Há também correspondências e relatórios das autoridades abordando a expansão da fronteira e as ações educativas promovidas pelos governos coloniais nessas regiões, que nos indicam o quanto o Estado Português estava interessado na conquista desse território e revelam aspectos da alteridade em relação aos povos indígenas. Através dos discursos de legitimação dessas ações é possível identificarmos a dinâmica da descoberta, da compreensão e da comunicação do “eu” colonial para com o “outro” indígena. Palavras-chave: Educação – Índios – Conquista

A EDUCAÇÃO RETRATADA NAS CARTAS DO PADRE MANOEL DA NÓBREGA

(1517-1570)

Cézar de Alencar Arnaut de Toledo Doutor em Educação (USP)

Professor da Universidade Estadual de Maringá [email protected]

Ferdnando Marcus Ornellas

Graduando em História (UEM) [email protected]

Este trabalho discute a visão do Padre Manoel da Nóbrega (1517-1570) a respeito da educação. Esse religioso foi o primeiro superior dos Jesuítas no Brasil. Eles vieram em 1549, na esquadra do Governador Geral Tomé de Sousa. A catequese do gentio se tornou fundamental no trabalho missionário jesuítico, pois, fazia parte do projeto colonizador português e trazia o ideal de civilidade, europeia. Além disso, reforçava o objetivo de propagar a fé cristã. A Companhia de Jesus, fundada por Inácio de Loyola (1491-1556), foi uma das alternativas para solucionar a crise vivida pela Igreja, que enfrentava o cisma iniciado por Martinho Lutero (1483-1546) em 1517. Essa Ordem religiosa nasceu e floresceu na Idade Moderna, conformando-se à sua época e cumprindo papel de destaque no cenário religioso, político e educacional do início da Modernidade. Em Portugal, os jesuítas prestaram valorosos serviços aos monarcas, tendo sido confessores de reis e de príncipes. Às monarquias de Portugal e Espanha foi concedido o direito do Padroado, que era o privilégio real de administrar os bens da Igreja, nomear clérigos e manter financeiramente as ordens religiosas. Com isso, juntamente com a estima pelos serviços prestados por esses religiosos, a Companhia de Jesus foi se consolidando como instituição, e as viagens missionárias eram custeadas pela Coroa. Na realização do trabalho missionário, era necessário que os jesuítas contabilizassem os resultados alcançados e a comunicação epistolar se tornou o meio por excelência de documentação e comunicação entre eles e seus superiores na Europa. Havia uma regra específica na escrita de cartas, não se limitando apenas às autoridades, mas, ao público também. Para este último, eram escritos apenas os

Page 19: I COLÓQUIO CULTURA E EDUCAÇÃO NA AMÉRICA PORTUGUESA€¦ · a influÊncia da colonizaÇÃo portuguesa para a relaÇÃo pÚblico-privado na educaÇÃo no contexto do rio grande

19

sucessos das missões, ou seja, os relatos edificantes. As cartas jesuíticas fizeram parte das primeiras manifestações literárias do Brasil, contendo não só o resultado da catequese, mas também a descrição da terra e da cultura. As cartas jesuíticas foram o principal instrumento para a realização deste trabalho de pesquisa. Para a consulta, foi usada a obra editada pelo Padre Serafim Leite (1890-1969), a Monumenta Brasiliae. Serafim Leite pertencia à Companhia de Jesus e se empenhou em coletar diversas cartas jesuíticas que abordam o Brasil Colonial. Trata-se de um trabalho de caráter bibliográfico e documental que demonstra por meio da análise dos escritos do Padre Manoel da Nóbrega, seu parecer sobre a terra, o gentio e quais foram os métodos utilizados para a realização do trabalho missionário, contendo uma visão tipicamente jesuítica de sociedade, subordinada à religião, como elemento civilizador. Essas cartas também deram forma à própria imagem sobre o Brasil que se formava na época. A contribuição dos jesuítas para a educação escolar foi sendo moldada a partir das necessidades que, aos poucos, surgiam. Com a construção de colégios, a educação jesuítica se tornou um marco da pedagogia moderna, de caráter elitista, norteada pelas regras da Ratio Studiorum, o principal documento que expõe a organização dos estudos nas escolas dos jesuítas, promulgado em 1599. A educação escolar jesuítica fez parte da constituição da cultura no Brasil colonial e é uma de suas principais referências. Palavras-Chave: Jesuítas, História da Educação, Educação Brasileira.

A PRESENÇA DA COMPANHIA DE JESUS NO GUAIRÁ NO SÉCULO XVII.

Marli Delmônico de Araújo Futata Mestre em Educação

Professora da Faculdade de Educação da UEM [email protected]

Trata-se de um estudo em fase inicial acerca da história do Paraná Colonial, especificamente acerca da ocupação do território, à época denominado Província del Guairá e a presença e atuação dos jesuítas. A Companhia de Jesus, ordem religiosa fundada em 1534 por Inácio de Loiola, era no século XVI uma organização presente em várias partes do mundo. Desempenhou um importante papel educacional no Brasil-Colônia, tanto com a catequese dos povos nativos quanto com a instrução dos filhos dos colonos. Os jesuítas atuaram como evangelizadores e educadores, todavia faziam parte de um grande projeto colonizador português. A ocupação da região sul do Brasil teve início no século XVII com a fundação de reduções, constituídas de aldeamentos indígenas organizados e administrados por jesuítas espanhóis. No Paraná essas reduções ou missões, como também eram denominadas, foram destruídas ainda na primeira metade do século XVII por bandeirantes portugueses. A Companhia de Jesus, bem como o Brasil Colônia, é tema pouco estudado pelos pesquisadores da área de História da Educação e por isso o presente estudo objetiva contribuir com a ampliação de tais pesquisas. É uma investigação de cunho bibliográfico e utiliza como fontes os escritos dos autores que versaram sobre a temática ou o período delimitado para a presente pesquisa, ou seja, o século XVII. PALAVRAS-CHAVE: Jesuítas. Paraná colonial. Século XVII.

Page 20: I COLÓQUIO CULTURA E EDUCAÇÃO NA AMÉRICA PORTUGUESA€¦ · a influÊncia da colonizaÇÃo portuguesa para a relaÇÃo pÚblico-privado na educaÇÃo no contexto do rio grande

I COLÓQUIO CULTURA E EDUCAÇÃO NA AMÉRICA PORTUGUESA

Realização: Grupo de Pesquisa Cultura e Educação na América Portuguesa – GCEAP Apoio: