Genero Digital No Ensino de Lingua Portuguesa

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UNISALESIANO Centro Universitário Católico Salesiano Auxilium Curso de Letras Adriana Yoshiko Shiiya Eliane Cristina Betti Delmanto Valéria Consentino Flausino GÊNERO DIGITAL NO ESTUDO DA LÍNGUA PORTUGUESA LINS – SP 2010

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Genero Digital No Ensino de Lingua Portuguesa

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Page 1: Genero Digital No Ensino de Lingua Portuguesa

UNISALESIANO

Centro Universitário Católico Salesiano Auxilium

Curso de Letras

Adriana Yoshiko Shiiya

Eliane Cristina Betti Delmanto

Valéria Consentino Flausino

GÊNERO DIGITAL

NO ESTUDO DA LÍNGUA PORTUGUESA

LINS – SP

2010

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Adriana Yoshiko Shiiya

Eliane Cristina Betti Delmanto

Valéria Consentino Flausino

GÊNERO DIGITAL

NO ESTUDO DA LÍNGUA PORTUGUESA

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Banca Examinadora do Centro Universitário Católico Salesiano Auxilium, curso de Letras, sob a orientação da Prof.ª Lídia Helena Gomes de Oliveira.

LINS – SP

2010

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Adriana Yoshiko Shiiya

Eliane Cristina Betti Delmanto

Valéria Consentino Flausino

GÊNERO DIGITAL

NO ESTUDO DA LÍNGUA PORTUGUESA

Monografia apresentada ao Centro Universitário Católico Salesiano Auxilium,

para obtenção do título de Licenciado em __________________________.

Aprovada em: _____/_____/ _____

Banca Examinadora:

Prof.ª Orientadora: ________________________________________________

Titulação: _______________________________________________________

_______________________________________________________________

Assinatura:_________________________________

1º Prof.(a): ______________________________________________________

Titulação: _______________________________________________________

_______________________________________________________________

Assinatura: ________________________________

2º Prof.(a): ______________________________________________________

Titulação: _______________________________________________________

_______________________________________________________________

Assinatura: ________________________________

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À minha família e aos meus amigos, em

especial, aos meus pais, à minha irmã e ao meu

noivo que me deram força, estímulo e me

impulsionaram a buscar vida nova a cada dia, além

de terem aceitado privarem-se de minha companhia

em horas de estudos, concedendo-me a

oportunidade de me realizar e crescer ainda mais

Adriana Yoshiko Shiiya

Ao meu querido irmão, meus pais, sogros,

marido, professores, às minhas colegas de sala que

se tornaram grandes amigas e a todos aqueles que

me apoiaram e incentivaram para a realização deste

tão almejado sonho e, principalmente, às minhas

amadas filhas Giovanna e Giulia, que se

sacrificaram, tendo que compreender a minha

ausência por tantas e tantas vezes

Eliane Cristina Betti Delmanto

Page 5: Genero Digital No Ensino de Lingua Portuguesa

A Deus dirijo minha maior gratidão. Mais do

que me criar, deu propósito à minha vida. Vem dEle

tudo o que sou, o que tenho e o que espero.

Aos meus pais, Roberto e Tereza, que mais

do que me proporcionar uma boa infância, formaram

os fundamentos do meu caráter, por serem a minha

referência de tantas maneiras e estarem sempre

presentes na minha vida de uma forma

indispensável.

Ao meu esposo, Onivaldo, companheiro

incondicional, a quem amo, por me fazer sentir tão

querida, e também por todo apoio e compreensão de

sua parte.

Aos meus familiares, amigos, e

especialmente, aos meus filhos, Roberta, Diego e

Robson, tão amados, dos quais me ausentei quando

estive em busca de realizar meu sonho.

À Olivia, minha amiga e irmã, pelo incentivo e

orações que vieram, principalmente, quando mais

delas precisei e foram essenciais para mim

Valéria Consentino Flausino

Page 6: Genero Digital No Ensino de Lingua Portuguesa

AGRADECIMENTOS

A DEUS pela oportunidade e pelo privilégio que nos foram concedidos

em compartilhar tamanha experiência e ao frequentar este curso, cuja

relevância de temas incorporam-se, em profundidade, a nossas vidas.

Às nossas famílias pela paciência em tolerar a nossa ausência.

À nossa Orientadora, Prof.ª Lídia Helena Gomes de Oliveira, pelo

incentivo, simpatia e presteza no auxílio às atividades e discussões sobre o

andamento e normatização desta Monografia de Conclusão de Curso.

A todos os professores, principalmente às professoras Ed e Silvani, pelo

carinho, dedicação e entusiasmo demonstrado ao longo do curso e por

contribuírem para a construção de nossos novos conhecimentos e

aprendizagem durante essa árdua caminhada de nossas vidas.

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EPÍGRAFE

Bom mesmo é ir à luta com determinação,

abraçar a vida e viver com paixão, perder com

classe e vencer com ousadia, porque o mundo

pertence a quem se atreve e a vida é muito curta

para ser insignificante.

(Charles Chaplin)

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RESUMO

Esse estudo aborda o Gênero Digital que está cada vez mais presente na vida de todos e tem sido indispensável na realização de diversas atividades sociais. A escrita digital tem desencadeado mudanças que refletem o seu impacto na identidade do sujeito, principalmente, nos jovens que estão em plena formação escolar. As novas tecnologias têm causado uma revolução, principalmente, na área linguística, propiciando assim, o surgimento de novos gêneros. Como todo processo de transformação passa por processos históricos globalizados, levam-se em consideração estudos específicos sobre gêneros textuais e gêneros digitais, com destaque para Crystal (2005), Caiado (2007), Marcuschi (2008) e Sousa (2007). Busca-se por meio desse trabalho analisar a escrita desses jovens no ambiente virtual, enfocando a escrita digital utilizada nos “scraps” do Orkut e nos “chats” do MSN; comparando-se assim, o tipo de escrita utilizado na área virtual e a escrita formal no ambiente escolar. A metodologia utilizada foi a pesquisa bibliográfica e a de campo, sendo realizada por meio de aplicação de questionários e estudo comparativo de casos. Palavras-chave: Gênero Digital. Gênero Textual. Escrita. Leitura.

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ABSTRACT

This study is about the Digital Genre that’s been increasingly present in everyone's life and has been indispensable for the achievement of several social activities. Digital writing has been unleashing changes that reflects its impact on the identity of the subject, especially, in young people who have been in full training school. New technologies have been causing a revolution, especially, in the linguistic area, thereby providing the emergence of new genres. As every procedure of transformation passes through historical process of globalization, it takes the specific studies on textual and digital genres into consideration, with prominence to Crystal (2005), Caiado (2007), Marcuschi (2008) and Sousa (2007). It tries by this research to analyze the writing of these young people in the virtual environment focusing the digital writing used on the "scraps" in Orkut and on the “chats” in MSN; thereby comparing the type of writing used in the virtual area and formal writing in the school environment. The methodology used was the bibliographical and field research that was done through the application of questionnaires and comparative study of cases.

Keywords: Digital Genre. Textual Genre. Writing. Reading.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO......................................................................................................11

CAPÍTULO 1 – GÊNERO TEXTUAL....................................................................13

1.1 DEFINIÇÃO DE GÊNERO E TIPO TEXTUAL ............................................13

1.2 AS NOVAS TECNOLOGIAS E OS NOVOS GÊNEROS TEXTUAIS ..........17

CAPÍTULO 2 – GÊNEROS DIGITAIS ..................................................................22

2.1 A REVOLUÇÃO DA LINGUAGEM..............................................................22

2.2 OS TIPOS DE GÊNEROS DIGITAIS..........................................................25

2.2.1 O e-mail ................................................................................................26

2.2.2 O chat ou sala de bate papo .................................................................27

2.2.3 Vídeo-conferência interativa .................................................................27

2.2.4 Listas de discussão...............................................................................28

2.2.5 Blogs (Weblogs)....................................................................................28

2.2.6 Redes Sociais ou Sites de Relacionamento .........................................28

2.3 OS SITES MAIS USADOS: ORKUT, TWITTER, FORMSPRING, FACEBOOK, MSN MESSENGER ........................................................................29

2.3.1 ORKUT .................................................................................................29

2.3.2 TWITTER..............................................................................................29

2.3.3 FORMSPRING......................................................................................30

2.3.4 FACEBOOK ..........................................................................................30

2.3.5 MSN MESSENGER ..............................................................................30

CAPÍTULO 3 – ESCRITA DIGITAL X ESCRITA FORMAL .................................32

3.1 A INFLUÊNCIA DA ESCRITA DIGITAL SOBRE A NORMA CULTA ..........32

3.2 ALGUMAS TÉCNICAS DA ESCRITA DIGITAL ..........................................38

CAPÍTULO 4 – PESQUISA DE CAMPO..............................................................43

4.1 ASPECTOS METODOLÓGICOS E DADOS ESPECÍFICOS .....................43

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4.2 ANÁLISE DOS PRINCIPAIS RESULTADOS OBTIDOS.................................43

4.2.1 A Notação Escrita nos Scraps (Orkut) e nos Chats (MSN) ..................43

4.2.2 A Notação Escrita no Ambiente Escolar ..............................................47

CONCLUSÃO.......................................................................................................50

REFERÊNCIAS ....................................................................................................51

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INTRODUÇÃO

Atualmente, vivemos na chamada sociedade da informação em um

tempo cuja comunicação é mediada por computador e as questões de

linguagem representam um papel fundamental na vida “pós-moderna”.

Essa nova era marcada pelo surgimento de novas formas midiáticas,

principalmente pela Internet, tem proporcionado grandes mudanças em todos

os aspectos diretamente ou indiretamente relacionados a elas, como

conceitualmente o tempo e o espaço, além de propiciar uma mudança no

suporte de leitura e escrita.

Os gêneros têm sofrido uma grande revolução e transformação devido

ao aparecimento da era digital. Com isso, surgem novos gêneros digitais,

provenientes de gêneros já existentes. Esse processo é designado, por

Bakhtin, de “transmutação”, fenômeno que explica a formação dos gêneros

complexos, os quais são originados dos gêneros primários que, ao se

transmutarem de uma esfera para outra, geram novos gêneros com um estilo

similar ao domínio discursivo que o absorveu. Segundo Fiorin (2008, p. 65):

Não só cada gênero está em incessante alteração; também está em contínua mudança seu repertório, pois, à medida que as esferas de atividade se desenvolvem e ficam mais complexas, gêneros desaparecem ou aparecem, gêneros diferenciam-se, gêneros ganham um novo sentido. Com o aparecimento da internet, novos gêneros surgem: o chat, o blog, o mail, etc.

Esses novos gêneros surgem mediante uma necessidade sócio-

comunicativa e atratividades exercidas pela mídia eletrônica.

Em relação à questão da linguagem utilizada no ambiente virtual,

observamos diversas modificações na forma escrita; a escrita digital é muito

diferente da escrita formal, devido à necessidade de comunicação no mais

curto espaço de tempo possível, em ambientes síncronos com vários

interlocutores; expressa também o caráter “falado” ao que compulsoriamente

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tem de ser escrito, além de proporcionar uma grande interação e criar vínculos

afetivos entre os usuários. Com isso, a escrita digital tem que ser breve e

concisa, ou seja, uma escrita abreviada que causa modificações no próprio ato

de ler e de escrever das crianças e dos jovens.

Com todas essas transformações mencionadas e pela crescente

presença dessa tecnologia no dia-a-dia dos adolescentes e da sociedade em

geral, é preciso refletir sobre as mudanças que a Internet trouxe em relação à

escrita.

Esse trabalho descreve mudanças da escrita na era digital e sua

influência em relação à escrita formal e reflete também sobre o impacto do

avanço tecnológico na identidade do sujeito.

O foco do trabalho são os novos gêneros digitais que se têm configurado

como novos desafios para a comunidade educacional no ensino da língua

portuguesa, apontando para a necessidade de mudança de antigos

paradigmas em relação ao ensino da escrita formal.

Como todo processo de transformação passa por processos históricos

globalizados, levam-se em conta estudos específicos sobre gêneros textuais e

gêneros digitais, com destaque para Caiado (2007), Crystal (2005), Marcuschi

(2008) e Sousa (2007).

Três objetivos mais amplos destacam-se como ponto de partida para a

produção desse trabalho: o primeiro, a discussão acerca da noção de gênero

textual discutida por diversos teóricos, inclusive no que se refere à

transmutação dos gêneros. O segundo objetivo, a discussão em relação à

mudança revolucionária da linguagem e a comunicação, através do ambiente

digital com seus diversos tipos de gêneros digitais. O terceiro objetivo refere-se

à influência da escrita digital em relação à escrita formal.

O último objetivo corresponde a um caráter mais específico, consiste em

realizar uma análise comparativa entre a escrita formal e a escrita digital com

os jovens nos seus diferentes ambientes, envolvendo a análise de scraps

escritos no site de relacionamento como o Orkut ou os chats realizados no

MSN e as anotações feitas em cadernos, avaliações escolares, produção de

texto, etc. A metodologia utilizada foi a pesquisa bibliográfica e a de campo

sendo realizada por meio de aplicação de questionários e estudo comparativo

de casos.

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13

1 GÊNERO TEXTUAL

1.1 DEFINIÇÃO DE GÊNERO E TIPO TEXTUAL

Segundo Aristóteles, os gêneros textuais se dividiam em três categorias.

Depois, passaram a designar-se categorias literárias bem definidas que foram

ampliando-se e subdividindo-se. Atualmente, a concepção de gênero textual

engloba toda e qualquer produção textual. Essa flexibilização do conceito de

gênero atingiu um grau tão elevado que ficou difícil caracterizar essa categoria

que chamamos de gênero textual. Portanto, o estudo e a reflexão sobre o

gênero textual não é só importante, mas fundamental por ele ser tão antigo

quanto à linguagem na qual está envolto.

Partimos da ideia de que a comunicação oral só é possível por algum

gênero textual. Para compreender a distinção entre gêneros e tipos textuais,

Marcuschi (2005, p. 22-23) aborda algumas definições dos seguintes autores:

Douglas Biber, John Swales, Jean-Michel Adam, Jean-Paul Bronckart:

a) Usamos a expressão tipo textual para designar uma espécie de sequência teoricamente definida pela natureza linguística de sua composição {aspectos lexicais, sintáticos, tempos verbais, relações lógicas}. Em geral, os tipos textuais abrangem cerca de meia dúzia de categorias conhecidas como: narração, argumentação, exposição, descrição, injunção. b) Usamos a expressão gênero textual como uma noção propositalmente vaga para referir os textos materializados que encontramos em nossa vida diária e que apresentam características sócio-comunicativas definidas por conteúdos, propriedades funcionais, estilo e composição característica. Seus tipos textuais são apenas meia dúzia, os gêneros são inúmeros. Alguns exemplos de gêneros textuais seriam: telefonema, sermão, carta comercial, carta pessoal, romance, bilhete, reportagem jornalística, aula expositiva, reunião de condomínio, notícia jornalística, horóscopo, receita culinária, bula de remédio, lista de compras, cardápio de restaurante, instruções de uso, outdoor, inquérito policial, resenha, edital de concurso, piada, conversação espontânea, conferência, carta eletrônica, bate-papo por computador, aulas virtuais e assim por diante.

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Antes de continuarmos a falar de gêneros textuais, seria importante

definir mais uma noção que é a expressão domínio discursivo. Para Marcuschi

(2005, p. 23-24):

Usamos a expressão domínio discursivo para designar uma esfera ou instância de produção discursiva ou de atividade humana. Esses domínios não são textos nem discursos, mas propiciam o surgimento de discursos bastante específicos. Do ponto de vista dos domínios, falamos em discurso jurídico, discurso jornalístico, discurso religioso etc., já que as atividades jurídica, jornalística ou religiosa não abrangem um gênero em particular, mas dão origem a vários deles[...].

Em relação às observações acima, não se deve confundir texto e

discurso, pois não são a mesma coisa. Pode-se dizer que texto é uma entidade

concreta realizada materialmente e corporificada em algum gênero textual.

Discurso é aquilo que um texto produz ao se manifestar em alguma instância

discursiva. Assim, o discurso se realiza nos textos. Em outros termos, os textos

realizam discursos em situações institucionais, históricas, sociais e ideológicas.

Para a noção de tipo textual: predomina a identificação de sequências

linguísticas típicas; de gênero textual: predominam os critérios de ação prática,

circulação sócio-histórica, funcionalidade, conteúdo temático, estilo e

composicionalidade; dos domínios discursivos são as grandes esferas da

atividade humana em que os textos circulam.

É importante ressaltar que os gêneros são entidades comunicativas e

não entidades formais, pois os gêneros são formas verbais estáveis realizadas

em textos situados em comunidades de práticas sociais e em domínios

discursivos específicos.

Marcuschi (2008, p. 16) em seu trabalho destaca algumas afirmações de

Bazerman:

Apesar de nosso interesse em identificar os gêneros e classificá-los, parece impossível estabelecer taxonomias e classificações duradouras, a menos que nos entreguemos a um formalismo reducionista. Pois, as nossas identificações de

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formas genéricas sempre terão curta duração. As classificações são sempre recortes do objeto e não agrupamentos naturais, por isso são sempre de base teórica. Os gêneros são o que as pessoas reconhecem como gêneros a cada momento do tempo, seja pela denominação, institucionalização ou regularização. Os gêneros são rotinas sociais de nosso dia-a-dia.

Os gêneros textuais não se caracterizam como formas estruturais

estáticas e definidas, pois são fenômenos sócio-históricos e culturalmente

sensíveis, então seria meramente impossível fazer uma lista fechada de todos

os gêneros. Alguns estudiosos alemães de linguística chegaram a nomear mais

de 4000 gêneros, por isso, qualquer teoria com uma classificação geral dos

gêneros não foi adiante.

Então, no estudo dos gêneros textuais devemos voltar nosso foco

principalmente para o funcionamento da língua e para as atividades culturais e

sociais. Assim, os gêneros não devem ser vistos como estruturas rígidas e

imutáveis, mas sim como formas culturais e de conhecimento, concretizadas na

linguagem, das ações sociais em um determinado contexto e em uma

determinada época, ou seja, o gênero textual é dinâmico e mutável no tempo.

Atualmente, existe uma grande quantidade de teorias de gêneros sendo

aquelas que procuram classificar os gêneros preferencialmente pela forma ou

estrutura perderam espaço para as que buscam observar os gêneros

justamente naquilo que lhe é mais peculiar, ou seja, seu lado dinâmico,

processual, social, interativo e cognitivo.

O estudo do gênero não deve ser feito para classificá-lo e catalogá-lo de

forma rígida, mas sim para realçar sua principal característica, a fluidez, que

possibilita de uma forma dinâmica e interativa, pois o gênero transmuta-se e

recria-se constantemente, acompanha as transformações da linguagem,

conforme o contexto histórico, social, científico, religioso e cultural.

Devemos considerar os gêneros textuais como uma parte constitutiva de

uma sociedade numa determinada época, visto que ao invés de ser uma forma

pré-concebida com uma estrutura rígida em que se inserem as manifestações

sociais, os gêneros surgem das manifestações sociais de uma determinada

época que, ao se reiterarem em determinado espaço de tempo, fazem surgir

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um novo gênero textual. Daí o porquê de se dizer que não se identifica um

gênero pela sua forma, mas sim pela sua repetida manifestação.

Vale a pena ressaltar o que Swales diz a respeito da expressão gênero,

segundo Marcuschi (2005, p. 29-30), “hoje, gênero é facilmente usado para

referir-se a uma categoria distintiva de discurso de qualquer tipo, falado ou

escrito, com ou sem aspirações literárias”. Os gêneros são os reflexos das

estruturas sociais decorrentes e típicas de cada cultura, sendo assim, a

variedade cultural traz consequências significativas para a variação de

gêneros.

Todos os textos se manifestam sempre num ou noutro gênero textual,

pois qualquer trabalho com texto deve ser feito baseado nos gêneros, sejam

eles orais ou escritos.

Os gêneros textuais distribuem-se tanto na oralidade quanto na escrita,

desde os mais formais aos mais informais, em torno de todos os tipos de

contextos e situações da vida cotidiana. Mas há alguns gêneros que só são

recebidos na forma oral apesar de sua origem ter originado da forma escrita,

como é o caso das notícias de televisão ou rádio. Ouvimos as notícias, mas

antes elas foram produzidas na forma escrita e são lidas (oralizadas) pelo

apresentador ou locutor.

Para Biber (1988), por meio dos objetivos dos falantes e no tópico

tratado que os gêneros são geralmente determinados, sendo assim uma

questão de uso e não de forma. Pode-se dizer que os gêneros textuais

baseiam-se em critérios externos (sócio-comunicativos e discursivos), e

enquanto os tipos textuais baseiam-se em critérios internos (linguísticos e

formais).

Em relação ao gênero textual é necessário que tanto a sua produção

quanto ao seu uso sejam adequados a cada situação. Para Marcuschi (2005, p.

34)

[...] é um caso de adequação tipológica, que diz respeito à relação que deveria haver, na produção de cada gênero textual, entre os seguintes aspectos: • natureza da informação ou do conteúdo veiculado; • nível de linguagem (formal, informal, dialetal, culta etc.)

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• tipo de situação em que o gênero se situa (pública, privada, corriqueira, solene etc.) • relação entre os participantes (conhecidos, desconhecidos, nível social, formação etc.) • natureza dos objetivos das atividades desenvolvidas.

É possível que essa relação obedeça a parâmetros rígidos devido às

rotinas sociais presentes em cada situação cultural e social, de modo que sua

desatenção poderia acarretar problemas. É importante que se leve em

consideração todos os aspectos citados acima para que seu uso seja

adequado a determinada situação.

1.2 AS NOVAS TECNOLOGIAS E OS NOVOS GÊNEROS TEXTUAIS

No Ocidente, os gêneros textuais estão sendo estudados há pelo menos

vinte e cinco séculos, portanto, não é um assunto novo, se considerarmos que

sua observação sistemática iniciou-se em Platão. Segundo Marcuschi (2008), o

estudo dos gêneros textuais encontrava-se concentrado na literatura desde os

tempos mais antigos. Ele surgiu com Platão e Aristóteles, tendo origem em

Platão a tradição poética e em Aristóteles a tradição retórica, agora ultrapassa

as fronteiras e vem para a linguística.

O estudo dos gêneros textuais tem sido feito continuamente, por meio de

análise à abundante diversidade das fontes e perspectivas dos temas sobre o

assunto. Devido ao interesse crescente de estudiosos de diversas áreas, o

estudo de gêneros textuais tem-se tornado cada vez mais interdisciplinar.

Na verdade, a interdisciplinaridade está hoje cada vez mais presente no

estudo dos gêneros textuais, em especial, na linguagem em funcionamento e

nas atividades culturais e sociais. Desde que não idealizamos os gêneros como

modelos e estruturas rígidas, mas como formas culturais e cognitivas de ação

social corporificadas na linguagem, os quais somos levados a ver os gêneros

como entidades dinâmicas cujos limites e demarcação se tornam fluidos. Para

Marcuschi (2008, p. 154):

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[...] é impossível não se comunicar verbalmente por algum gênero, assim como é impossível não se comunicar verbalmente por algum texto. Isso porque toda a manifestação verbal se dá sempre por meio de textos realizados em algum gênero.

Seguindo seu conhecimento pode-se afirmar que o gênero textual

centraliza-se no trato sociointerativo da produção linguística.

Consequentemente estamos submetidos a uma grande variedade de gêneros

textuais, de modo que sua identificação torna-se completamente difusa e

aberta, sendo eles inúmeros, tal como lembra muito bem Bakhtin (apud

MARCUSCHI, 2008), mas não infinitos.

Segundo Carolyn Miller (apud MARCUSCHI, 2008, p. 159):

Os gêneros são formas verbais de ação social estabilizadas e recorrentes em textos situados em comunidades de práticas em domínios discursivos específicos. Assim os gêneros se tornam propriedades inalienáveis dos textos empíricos e servem de guia para os interlocutores, dando inteligibilidade às ações retóricas. Resumidamente, poderia dizer que os gêneros são entidades: a) dinâmicas b) históricas c) sociais d) situadas e) comunicativas f) orientadas para fins específicos g) ligadas a determinadas comunidades h) ligadas a domínios discursivos i) recorrentes j) estabilizadas em formatos mais ou menos claros.

Compreendendo-se o dinamismo e a complexidade variável dos gêneros

textuais, como já foi mencionado antes, torna-se improvável sabermos se é

possível contá-los, pois como são sócio-históricos e variáveis, não há como

listá-los, por isso é muito difícil fazer uma classificação de gêneros. Pode-se

dizer que os gêneros textuais são a nossa forma de inserção, ação e controle

Page 20: Genero Digital No Ensino de Lingua Portuguesa

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social cotidiano, por isso há essa imensa pluralidade de gêneros. Tal como

frisava Bakhtin (apud MARCUSCHI, 2008, p. 190):

Os gêneros são apreendidos no curso de nossas vidas como membros de alguma comunidade. Nesse caso, os gêneros são padrões comunicativos socialmente utilizados, que funcionam como uma espécie de modelo comunicativo global que representa um conhecimento social localizado em situações concretas. Sociedades tipicamente orais desenvolvem certos gêneros que se perdem em outras tipicamente escritas e penetradas pelo alto desenvolvimento tecnológico.

Totalmente vinculados à vida cultural e social, os gêneros textuais são

fenômenos históricos que cooperam para ordenar e solidificar as atividades

comunicativas do dia-a-dia, incontornáveis em qualquer situação comunicativa.

As necessidades e atividades sócio-culturais estão emparelhadas, bem como

na relação com as novas tecnologias, o que é compreensível ao considerarmos

a existência de um grande número de gêneros textuais hoje em relação a

antigas sociedades antes do surgimento da comunicação escrita.

Segundo Marcuschi (2005), na atual ascensão da denominada cultura

eletrônica, com o telefone, o gravador, o rádio, a TV e, especialmente o

computador e o seu mais revolucionário surgimento, a internet, observamos

uma explosão de novos gêneros e novas formas de comunicação, tanto na

oralidade como na escrita.

Ainda segundo Marcuschi (2005), é notório o fato de que os gêneros

textuais interagem funcionalmente nas culturas em que se desenvolvem.

Caracterizam-se muito mais por suas funções comunicativas, cognitivas e

institucionais do que por suas propriedades particularmente linguísticas e

estruturais. Devem ser contemplados em seus usos e condicionamentos sócio-

programáticos caracterizados como práticas sócio-discursivas. São de difícil

definição formal e devido à existência de diversas formas, às vezes não

possuem denominações unívocas e, assim como surgem, podem desaparecer.

A utilização de novos gêneros pelo uso das tecnologias e suas

interferências nas atividades comunicativas diárias, tais como o rádio, a

televisão, o jornal, a revista, a internet, têm uma presença marcante. Assim,

Page 21: Genero Digital No Ensino de Lingua Portuguesa

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aparecem novas formas discursivas, tais como editoriais, artigos de fundo,

notícias, telefonemas, telegramas, tele mensagens, teleconferências,

videoconferências, reportagens ao vivo, cartas eletrônicas (e-mails), bate-

papos virtuais (chats), aulas virtuais (aulas chats) e assim por diante.

Em geral, os gêneros desenvolvem-se de maneira dinâmica e novos

gêneros surgem como desmembramento de outros, isto é, esses novos

gêneros não são inovações independentes, mas criados mediante outros

gêneros já existentes, de acordo com as necessidades ou as novas

tecnologias. Nem sempre temos algo completamente novo, mas derivado,

como, por exemplo, os chats surgindo como uma forma de conversação por

meios eletrônicos, ou os blogs surgindo dos diários de bordo. Esse estado de

coisas mostra o quanto os gêneros são dinâmicos e sua facilidade de

adaptação, principalmente na área linguística.

Marcuschi (2005, p. 20) em seu trabalho destaca a observação que já

notada por Bathkin que falava “na transmutação dos gêneros e na assimilação

de um gênero por outro gerando novos.” Como se pode notar, a tecnologia

propicia o aparecimento de diversas inovações, mas que na realidade não são

absolutamente novas. Como por exemplo, o caso do telefonema, que tem

semelhança com a conversação, mas que, pelo telefone, realiza-se com

características próprias. A diferença entre uma conversação face a face e um

telefonema possui estratégias peculiares. O e-mail (correio eletrônico) gera

mensagens eletrônicas semelhantes as que têm nas cartas (pessoais,

comerciais etc.) e nos bilhetes. Contudo, o e-mail tem identidade e linguagem

própria, diferente das cartas e dos bilhetes convencionais.

O principal aspecto desses e de outros gêneros emergentes é a nova

relação que surge com os usos da linguagem como tal. De certa forma,

propiciam a redefinição de alguns aspectos centrais na linguagem em uso,

como por exemplo, a relação entre a oralidade e a escrita, aproximando-as

cada vez mais.

Segundo Marcuschi (2005, p. 21):

Esses gêneros que emergiram no último século no contexto das mais diversas mídias criam formas comunicativas próprias

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21

com um certo hibridismo que desafia as relações entre oralidade e escrita e inviabiliza de forma definitiva a velha divisão dicotômica ainda presente em muitos manuais de ensino de língua. Esses gêneros também permitem observar a maior integração entre os vários tipos de semioses: signos verbais, sons, imagens e formas em movimento.

Dessa forma, os novos gêneros são semelhantes aos gêneros que já

existem, e esses já têm o seu determinado uso e funcionalidade, enquanto que

os novos dentro de um novo quadro comunicativo investem em seus novos

objetivos.

Para Marcuschi (2005), os gêneros textuais não devem ser

caracterizados, nem definidos por aspectos formais, sejam eles estruturais ou

linguísticos e sim, pelos aspectos sócio-comunicativos e funcionais, mas

também, não se deve desprezar a forma e as funções, pois em muitos casos

são elas que determinam o gênero. Contudo, haverá casos em que será o

próprio suporte ou o ambiente em que os textos aparecem que determinam o

gênero presente. Sendo assim, é necessário cautela em relação ao predomínio

de formas ou funções para a determinação e identificação de um gênero.

Atualmente é muito comum, encontrar os novos gêneros dentro de

novas tecnologias, particularmente na mídia eletrônica (digital). Diante disso, a

escola futuramente deverá se preocupar em ensinar como se produz um e-mail

e outros gêneros do discurso do mundo virtual.

Page 23: Genero Digital No Ensino de Lingua Portuguesa

22

2 GÊNEROS DIGITAIS

2.1 A REVOLUÇÃO DA LINGUAGEM

Na década de 1990, a Internet revolucionou o caráter linguístico. Embora

a Internet tenha surgido na década de 1960, para e-mails e bate-papos, as

pessoas só começaram a usá-la depois de 30 anos. Mas, em um tempo

relativamente curto, as pessoas adquiriram e dominaram essa nova tecnologia.

Nesse novo ambiente virtual, as pessoas se depararam com uma nova

forma linguística, cheia de gíria e jargão, onde podiam mudar a língua formal e

infringir regras convencionais de ortografia e pontuação. A velocidade com que

as inovações linguísticas surgiam e circulavam era impressionante.

Uma nova forma de comunicação humana surgiu com a Internet, a qual

alguns chamam de comunicação mediada por computador (CMC), outros de

comunicação eletrônica ou ainda de “netspeak”. A Internet não só revolucionou

e mudou o caráter linguístico, mas também todo o contexto social, educacional

e tecnológico.

Segundo Tom Erickson (apud MARCUSCHI, 2008, p. 198), o estudo dos

gêneros na comunicação virtual é muito interessante porque “a interação on-

line tem o potencial de acelerar enormemente a evolução dos gêneros”, o qual

visa à natureza do meio tecnológico e os modos como se desenvolve. O

ambiente virtual propicia “uma interação altamente participativa”, o que obrigará

a rever algumas noções já consagradas.

De modo geral, a comunicação mediada por computador abrange todas

as formas de comunicação e os gêneros que surgem nesse contexto. Um

conjunto específico de novos gêneros textuais desenvolvido no contexto da

mídia virtual tem sido analisado nas três últimas décadas do século XX. Daí

surge um novo tipo de comunicação conhecido como comunicação mediada

por computador (CMC) ou comunicação eletrônica, que desenvolve uma

espécie de “discurso eletrônico”.

Segundo Marcuschi (2008, p. 200), a importância de se estudar esses

gêneros textuais reside em pelo menos quatro aspectos:

Page 24: Genero Digital No Ensino de Lingua Portuguesa

23

1 – são gêneros em franco desenvolvimento e fase de fixação com uso cada vez mais generalizado; 2 – apresentam peculiaridades formais próprias, não obstante terem contrapartes em gêneros prévios; 3 – oferecem a possibilidade de se rever alguns conceitos tradicionais a respeito da textualidade; 4 – mudam sensivelmente nossa relação com a oralidade e a escrita, o que nos obriga a repensá-la.

Segundo Crystal (2005, p.77), a Internet, a maior rede de computadores

do mundo, fornece serviços que possibilitam que as pessoas entrem em

contato com outras através de três funções principais que podem ser

identificadas:

1. A world wide web (ou web) é a manifestação dessa rede mais amplamente encontrada – a reunião total de todos os computadores ligados à Internet que possuem documentos mutuamente acessíveis pelo uso de um protocolo-padrão (o protocolo de transferência de hipertexto, ou HTTP em inglês) [...].

2. Mensagem eletrônica (ou e-mail) é o uso de sistemas de computador para transferir mensagens entre usuários – agora empregado principalmente para se referir a mensagens enviadas entre caixas de correio particulares [...]. É de caráter extremamente diverso, abrange mensagens pessoais e institucionais de extensão e propósitos variados.

3. Grupos de bate-papo são discussões contínuas sobre um assunto específico, organizados em “salas” em determinados sites da Internet, em que os usuários de computador interessados no tópico podem participar [...].

Essas três funções e sua diversividade de modalidades facilitam e

dificultam o nosso meio de comunicação, pois tudo o que se conhecia da língua

falada e escrita não se realiza mais daquela forma, pois surgem novos

conceitos, novas oportunidades e principalmente a transmutação da escrita.

A introdução da escrita leva a uma cultura letrada nos diversos

ambientes em que a mesma atua. Tudo indica que hoje, a importante inserção

Page 25: Genero Digital No Ensino de Lingua Portuguesa

24

da escrita eletrônica tem conduzido a uma cultura eletrônica, cujo fenômeno é

designado como letramento digital e que deve ser levado a sério, pois veio para

ficar. Segundo Yates (apud MARCUSCHI, 2005, p. 15), com as novas

tecnologias digitais, ocorre-se uma espécie de “radicalização do uso da

escrita”. Com isso, “nossa sociedade parece tornar-se textualizada, isto é,

passa para o plano da escrita”.

Em relação à escrita da linguagem na Internet, Crystal (apud

MARCUSCHI, 2005, p. 19) ressalta três aspectos que devem ser verificados:

(1) do ponto de vista dos usos da linguagem, temos uma pontuação minimalista, uma ortografia um tanto bizarra, abundância de siglas, abreviaturas nada convencionais, estruturas frasais pouco ortodoxas e uma escrita semi-alfabética; (2) do ponto de vista da natureza enunciativa dessa linguagem, integram-se mais semioses do que usualmente, tendo em vista a natureza do meio com participação mais intensa e menos pessoal, surgindo a hiperpessoalidade; (3) do ponto de vista dos gêneros realizados, a Internet transmuta de maneira bastante complexa gêneros existentes, desenvolve alguns realmente novos e mescla vários outros.

A comunicação feita na Internet, isto é, a escrita utilizada em seu meio

aproxima-se muito da oralidade, principalmente no caso dos chats (bate-

papos), dos e-mails e dos blogs.

Portanto, vale a pena refletir sobre uma observação de Danet (1997,

p.7):

Num período de talvez 50 anos, nossa compreensão da natureza do letramento e da função social dos textos escritos terá mudado tão radicalmente que pouco de nós estarão vivos para testar ‘como as coisas eram’ no final do século XX. Por isso é vital produzir agora investigações sobre as atitudes as práticas de letramento na cultura impressa enquanto ainda é possível fazê-lo [...].

Isso leva-nos a pensar se o uso da escrita digital utilizada em seu meio

poderá alterar a própria forma de se escrever. Como ressalta Marcuschi

Page 26: Genero Digital No Ensino de Lingua Portuguesa

25

(2005), talvez sim, pois a linguagem oral sofre uma mudança constante devido

ao fato de a usarmos a todo o momento, com relação à escrita se passarmos a

usá-la também com tanta frequência poderá começar a sofrer mudanças mais

frequentes e velozes. Não é impossível de se pensar que talvez no futuro seja

possível existir várias formas de escrita, isto é, várias grafias dependendo do

contexto de uso dessas escritas.

A linguagem digital possui uma grande versatilidade linguística, com

características diversas, o qual é um tipo de linguagem que não é submetida a

correções ou revisões, isto é, não há regras. Como se pode ver na escrita dos

bate-papos (chat) ocorre muito o uso de abreviações, sendo uma grande parte

dela artificial e passageira, pois só serve para aquele determinado momento.

Mas, há ainda aquelas que se fixam e são utilizadas em seu meio.

Em relação às escritas das novas tecnologias digitais e a escrita formal,

Halliday (1996, p. 354) afirma que, “sob o impacto das novas formas de

tecnologias”, presenciamos uma nova situação que “está desconstruindo toda a

oposição entre a fala e a escrita”.

Ainda segundo Halliday (1996, p. 355) em relação aos processadores de

texto não demorará muito em que, “a distância entre a fala e a escrita terá sido

largamente eliminada”, pois o autor é o controlador de seu texto.

Com isso, a distância entre a fala e a escrita vai desaparecendo e com o

surgimento dessas novas gerações já digitalizadas, principalmente, em relação

ao letramento digital, possa acontecer o que Anderson (apud HALLIDAY, 1996,

p. 355) dizia: “Crianças que aprendem a escrever usando o processador de

palavras tendem a compor seu discurso escrito numa maneira que é mais

parecida coma fala do que com os tradicionais exercícios da escrita.”

2.2 OS TIPOS DE GÊNEROS DIGITAIS

Os gêneros da mídia virtual pelo uso da escrita eletrônica têm um papel

histórico, social e tecnológico, cujas formas textuais nessa escrita são variáveis

e versáteis, isto é, estão sempre em transmutação.

Page 27: Genero Digital No Ensino de Lingua Portuguesa

26

Há diversos gêneros emergentes nos ambientes virtuais, entre os mais

conhecidos e estudados podemos citar:

2.2.1 O e-mail – Funciona como um correio eletrônico e assemelha-se a

alguns gêneros bem conhecidos de todos: da carta, do bilhete do memorando,

da conversa informal, da carta comercial, do recado e, até mesmo do

telegrama, e dependendo do objetivo do mesmo, pode ser formal ou informal.

O e-mail é uma forma de comunicação escrita assíncrona entre os

interlocutores, mas possibilita uma rapidez enorme na troca de informações,

independente da distância em que os mesmos se encontram. Em geral, os

interlocutores são conhecidos ou amigos, nesse caso o anonimato é raro, pois

consiste em uma violação de normas do gênero. Com isso, essa característica

o diferencia dos bate-papos. De um modo geral, segundo Marcuschi (2005, p.

40), um e-mail é constituído das seguintes partes:

1) endereço do remetente: automaticamente preenchido 2) data e hora: preenchido automático 3) endereço do receptor: deve ser inserido (quando não for

uma resposta) 4) possibilidade de cópias a outros endereços: a ser

preenchido (visível ou não ao receptor) 5) assunto: precisa ser preenchido a cada vez ou se adota o

que veio no caso de uma resposta 6) corpo da mensagem com ou sem vocativo, texto e

assinatura 7) possibilidade de anexar documentos com indicação

automática ao receptor 8) inserção de carinhas, desenhos e até mesmo de voz.

Ainda em relação ao e-mail, Jonsson (apud MARCUSCHI, 2005, p. 41)

relata que:

[...] as mensagens eletrônicas podem partilhar as propriedades da carta tradicional, mas podem partilhar as propriedades do telefonema ou a comunicação face a face. Consequentemente, os e-mails transgridem os limites entre as noções tradicionais de comunicação oral e escrita.

Page 28: Genero Digital No Ensino de Lingua Portuguesa

27

2.2.2 O chat ou sala de bate papo – O chat difere do e-mail por ser

síncrono e permite um diálogo centrado basicamente na escrita, entre duas ou

mais pessoas. Caracteriza-se também pela fugacidade do texto que se

encontra em constante atualização, o que permite uma nova forma de

comunicação, através da escrita centralizada. Todos os participantes das salas

de bate-papo têm que criar um apelido (nickname) que será utilizado no

ambiente virtual.

O chat permite que uma pessoa converse com outras ao mesmo tempo,

proporcionando assim, uma enorme interatividade entre o uso do mesmo. O

fato de permitir o diálogo por meio da escrita, sem que os interlocutores

precisem necessariamente estar presentes, promove a criação de mecanismos

e estratégias que representam o diálogo face a face, com isso, pressupõe-se a

presença de marcas da oralidade nas conversas dos chats, a reprodução de

frases curtas, abreviações, entre outras características peculiares à modalidade

oral.

Por isso, a linguagem utilizada nas salas de bate-papo possui

características únicas: inúmeras abreviaturas criadas (tb, vc...) devido à

necessidade da rápida comunicação; a presença da “escrita fonética”, através

da qual se escreve do modo como se fala (kero, naun...) e por isso dá

prioridade aos fonemas das palavras e não à ortografia das mesmas; os

enunciados são curtos e a linguagem é completamente informal e ainda há a

presença do caráter homofônico (100sação, bonitaD+, etc).

Há diversos tipos de chats: chat aberto, reservado, agendado, privado,

aula-chat e entrevista com convidado. Em relação ao último item citado, o

funcionamento desse tipo de entrevista é semelhante ao do chat aberto, a

diferença é que o único que responde é o entrevistado. Todos os que acessam

podem enviar suas perguntas, ver as perguntas dos outros e as repostas do

entrevistado.

2.2.3 Vídeo-conferência interativa – É um tipo de gênero que se

assemelha ao bate-papo com convidados, mas tem um tema específico e

tempo certo de realização com parceiros definidos. As vídeos-conferência são

Page 29: Genero Digital No Ensino de Lingua Portuguesa

28

síncronas e têm como finalidade discussões relacionadas ao trabalho ou a fins

educacionais.

2.2.4 Listas de discussão – Esse gênero é muito comum na

comunidade acadêmica, entre grupos de estudantes universitários que criam

lista para debater sobre um determinado tema, em torno de interesses em

comum. São gêneros que utilizam uma comunicação assíncrona e operam via-

e-mails como forma de contato. Há sempre um moderador, espécie de

webmaster cuja função é gerenciar o envio de mensagens e a entrada de

novos membros. Ele é quem direciona as mensagens e faz a triagem, pois

pode acontecer de alguns participantes remeterem mensagens que não estão

dentro do assunto em questão.

2.2.5 Blogs (Weblogs) – A palavra Blog é a abreviatura do termo

WebLog. Segundo Sartori Filho (apud MARCUSCHI, 2005, p. 60), trata-se de

“um diário eletrônico que as pessoas criam na Internet”, onde as pessoas

escrevem sobre si, sua família, seus gostos, suas ideias, visões do mundo,

sentimentos e crenças, etc.

O blog é utilizado principalmente pelos adolescentes, cujo objetivo é

compartilhar um pouco de sua vida com os seus amigos e com o público em

geral. A linguagem geralmente é informal e segue uma ordem cronológica que

pode sempre ser atualizado. Os usuários dos blogs utilizam um tipo de

linguagem criada por eles que possui expressões típicas e características

próprias.

Os blogs são data-dados, consistem de fotos, músicas, links e seus

textos têm estrutura leve, pois geralmente são breves, descritivos e opinativos.

Apesar de ter um caráter assíncrono, é um ambiente muito interativo e

participativo, pois os leitores podem interagir com o “blogueiro” enviando

comentários ou críticas.

2.2.6 Redes Sociais ou Sites de Relacionamento: Atualmente, dentro

do imenso cenário digital, existem também as redes sociais ou sites de

relacionamento que a cada dia aumenta mais o número de usuários.

Page 30: Genero Digital No Ensino de Lingua Portuguesa

29

Uma Rede Social contém várias aplicações dentro dela, dá-se ênfase

aos recados, fotos e vídeos que podem ser compartilhados com amigos

autorizados ou não autorizados de acordo com suas configurações de perfil de

usuário. Os mais conhecidos são o Orkut, Facebook e o Twitter, mas existem

outros similares a eles. Um dos grandes problemas que ocorrem nesses sites

são os “FAKES”, isto é, são os usuários falsos que criam perfil e o utilizam para

poluir o ambiente virtual com propagandas ou, até mesmo, com vírus.

2.3 OS SITES MAIS USADOS: ORKUT, TWITTER, FORMSPRING,

FACEBOOK, MSN MESSENGER

2.3.1 ORKUT (Rede Social ou Site de Relacionamento)

É um dos maiores e mais utilizados sites de relacionamento do mundo,

cuja rede é formada por pessoas, grupos ou outras unidades. O orkut , que é

gratuito, é um sistema filiado ao Google e foi criado em 24 de janeiro de 2004,

cujo objetivo é de ajudar os seus membros a conhecer pessoas e manter

relacionamentos, além da troca de informações entre pessoas que possuem

algum interesse em comum, a formação de comunidades, a troca de e-mails,

etc.

A sua forma de comunicação é assíncrona e cada membro tem uma

página individual com o seu perfil, uma página de recados, depoimentos, álbum

de fotos, etc. Os recados no orkut são chamados de scraps e o tipo de

linguagem utilizada é a digital, uma forma, predominantemente, dialógica, por

isso, ela é totalmente informal.

2.3.2 TWITTER (Rede Social ou Site de Relacionamento)

Rede Social que permite aos usuários enviar e receber atualizações

pessoais de outros contatos em “Tweets” (textos de até 140 caracteres), por

meio de website, SMS ou softwares específicos. As atualizações são exibidas

Page 31: Genero Digital No Ensino de Lingua Portuguesa

30

no perfil do usuário em tempo real e também enviadas a outros usuários

seguidores que tenham assinado para recebê-las.

Foi criado em 2006 e alcançou seu auge nos dois últimos anos. Tornou-

se uma grande ferramenta para divulgação do meio artístico e comercial devido

à grande facilidade de comunicação, pois uma única postagem pode chegar a

um número indeterminado de seguidores sem custo algum, além de

estabelecer a possibilidade de um diálogo através das postagens entre os

usuários.

2.3.3 FORMSPRING (Rede Social ou Site de Relacionamento)

É um site voltado para postar perguntas dentro de um grupo de usuários

identificados ou não, para que os mesmos respondam-nas ou excluam-nas.

Todas as respostas são gravadas no perfil do usuário e ficam abertos para

qualquer um que entrar na rede social e quiser ler.

2.3.4 FACEBOOK (Site de Relacionamento)

O Facebook é uma comunidade social de relacionamento que liga

pessoas que vivem, estudam ou trabalham em torno do indivíduo e que

provavelmente ele não conhece. Permite publicar fotos, notícias, ver novidades

de seus amigos, publicar vídeos e mandar mensagens. Foi fundado por Mark

Zuckerberg em 2004, um ex-estudante de Harvard.

No início, a adesão ao Facebook era restrita apenas aos estudantes da

Universidade Harvard, depois ela expandiu-se até atingir o mundo inteiro. É

ainda o maior site de fotografias dos Estados Unidos, que é a sua principal

característica, com mais de 60 milhões de novas fotos publicadas por semana

ultrapassando todos os sites voltados à fotografia. E ainda permite aos seus

usuários criar vídeos.

2.3.5 MSN MESSENGER (Chat)

Page 32: Genero Digital No Ensino de Lingua Portuguesa

31

É o programa de mensagens instantâneas mais usado na Internet e foi

criado pela Microsoft Corporation em 1999. O seu principal serviço permite que

as pessoas conversem com outras através de mensagens instantâneas pela

Internet. O programa permite um usuário da Internet relacionar-se com outro(s)

que tenha(m) o mesmo programa em tempo real, e há uma lista de amigos

"virtuais" onde é possível verificar quando eles entram e saem da rede, isto é,

quando estão on-line ou off-line. Ele foi fundido com o Windows Messenger e

originou o Windows Live Messenger.

Esses sites são os mais conhecidos e usados dentro do ambiente virtual,

cada um tem uma característica própria, o que permite a seus usuários

conhecer pessoas do mundo inteiro e manter algum tipo de relacionamento

entre eles, por meio de mensagens, fotos, vídeos, anúncios e outros. Dentro

desse imenso ambiente virtual é possível fazer de tudo um pouco e um pouco

de tudo.

Page 33: Genero Digital No Ensino de Lingua Portuguesa

32

3 ESCRITA DIGITAL X ESCRITA FORMAL

3.1 A INFLUÊNCIA DA ESCRITA DIGITAL SOBRE A NORMA CULTA

A escrita tem um papel fundamental na Internet, ou seja, no mundo

virtual, pois a tecnologia digital depende totalmente da escrita. Com isso, é

inevitável não perceber que a escrita nos gêneros digitais possui características

específicas, a qual muitos a caracterizam como uma “fala por escrito”.

A comunicação mediada pelo computador difere-se totalmente da escrita

convencional, pois a escrita no meio digital não é necessariamente estática,

devido às diversas opções de técnicas disponíveis que permitem ao texto

mover-se pela tela, além de existirem possibilidades de interferir, mudar o texto

de várias maneiras que não estão disponíveis na escrita tradicional.

A escrita presente nos e-mails e nos bate-papos, chamada de

“netspeak”, sofre uma pressão para que seja realizada de forma rápida, por

isso ela carece daquela construção planejada e elaborada que ocorre na

escrita tradicional.

A maioria das pessoas manda mensagens sem nenhuma revisão e não

se importa com os erros ortográficos, com os erros de digitação, isto é, o uso

irregular da maiúscula, a falta de pontuação e outras anomalias.

Para Crystal (2005) tudo isso é irrelevante no ambiente virtual porque

não interfere no entendimento. Esse novo estilo de escrita faz com que as

pessoas sejam naturais e ousadas, além de se sentirem com mais liberdade

para escrever, pois assim mostram seu próprio estilo. Ainda segundo Crystal

(2005, p. 89):

Se recebo um e-mail de M no qual ele escreve errado uma palavra, não concluo por causa disso que “M não sabe escrever”. Simplesmente noto que M não é um bom digitador ou que estava com pressa. Sei disso porque faço a mesma coisa quando estou apressado.

Page 34: Genero Digital No Ensino de Lingua Portuguesa

33

Diante do que foi dito anteriormente, todas as pessoas em um ambiente

virtual pensam do mesmo modo e seguem a mesma postura, ninguém corrige,

nem analisa os erros de outras pessoas, pois o importante é o que a

mensagem traz em si e a sua essência.

Mas, ainda existem aqueles usuários que têm o mesmo cuidado de

revisar o que escreveram em suas mensagens do mesmo modo que teriam em

um ambiente fora da Internet.

Entende-se que o “netspeak”, em geral, não é uma linguagem falada que

foi escrita, mas uma linguagem escrita que foi levada em direção à fala. A

comunicação no meio virtual não é igual à fala ou à escrita, porém há algumas

propriedades presentes em ambas. Na verdade, o “netspeak” é visto como um

novo tipo de comunicação porque ele faz o que nenhum desses meios faz. É o

resultado de contato entre a fala e a escrita, isto é, é mais do que um híbrido de

fala e escrita.

O hibridismo está constantemente presente no ambiente virtual, pois a

escrita no mesmo ocorre sobre a influência da fala, isto é, a escrita é feita do

modo como as pessoas falam e não do modo como realmente seria correto nas

regras da língua culta. Dessa forma, podemos dizer que as novas tecnologias

eletrônicas afetam e mudam os hábitos de ler e escrever. Pela natureza da

relação e pelas condições de produção desse meio de comunicação, as

pessoas não utilizam uma escrita rebuscada e formal, que seria inadequada

nesse ambiente, mas um novo gênero discursivo, principalmente, nas salas de

bate-papo.

Os efeitos linguísticos desse novo meio de comunicação têm causado

uma revolução e também têm preocupado e horrorizado alguns observadores

que veem essa nova forma de escrita (netspeak) um sinal de deterioração dos

padrões. Muitos pensam que as crianças do futuro não terão capacidade de

escrever corretamente devido a tal influência.

Os autores, tais como Martins e Nogueira (apud MAGNABOSCO, 2009)

defendem que esse novo tipo de escrita pode ser prejudicial ao ensino da

Língua Portuguesa uma vez que o aprendizado da escrita estaria condicionado

à memória visual. Segundo ele, com o aparecimento de novas e diferentes

grafias, muitos jovens, que ainda estão em formação, ficarão constantemente

Page 35: Genero Digital No Ensino de Lingua Portuguesa

34

em dúvida do que realmente é correto ou errado, o que pode ainda ocasionar a

construção de vícios irreversíveis em relação à ortografia.

Segundo Caiado (2007 p. 37):

A norma ortográfica, atualmente, é considerada difícil, discriminatória, complicada do ponto de vista do cidadão, que para se comunicar “bem”, para pertencer à camada privilegiada da população, economicamente falando, deve escrever sem “erros ortográficos”, ou seja, deve escrever segundo a norma ortográfica vigente no país.

Essa norma, segundo Morais (apud CAIADO, 2007 p. 37), “contempla

aspectos regulares e irregulares”. Diante disso, pode-se dizer que esses erros

não são todos iguais, variam de pessoa para pessoa, pois cada um vem de

naturezas diferentes, tem um conhecimento diferente. Para escrever e falar

bem seguindo as normas é necessário que o aprendiz tenha certo nível de

escolaridade, além de ainda depender do lugar, do tipo de escola, do corpo

docente, de diversos fatores. Realmente não é fácil, pois é tudo cheio de

regras, e a maioria das pessoas realmente não tem prazer em aprendê-las,

aprendem porque é necessário e exigido para que se tornem pessoas cultas.

Por outro lado, o meio digital traz uma nova visão e compreensão sobre

a escrita, principalmente, dos adolescentes, pois há uma diversividade de

interação entre eles, além de, escrevem com liberdade, com espontaneidade,

sem seguir uma norma. Com isso, percebem que esta escrita pode ser aceita e

entendida porque gera compreensão no meio digital.

Para Caiado (2007, p. 39), essa situação dialógica virtual encontra-se

cada vez mais crescente, e, para alguns estudiosos da linguagem,

preocupante: a ortografia digital. “O que muda na alfabetização, no letramento

escolar, nos processos educacionais de internalização das formas de

comunicação nesta cultura digital?”

Observa-se que no blog, no e-mail e no chat os adolescentes usam o

letramento digital, cujas palavras são abreviadas, simplificadas, reduzidas, a

pontuação é irregular, não há acentuação gráfica e há o alongamento das

vogais e consoantes.

Page 36: Genero Digital No Ensino de Lingua Portuguesa

35

Alguns observadores acreditam que essa renúncia deliberada ao uso da

escrita formal da Língua Portuguesa ocorre porque o adolescente já é capaz de

redescrever seus conhecimentos ortográficos e muitas vezes se torna

intencional, no caso da escrita digital.

Em relação ao processo de Redescrição Representacional, segundo

Caiado (2007, p. 38):

Consiste na redescrição do conhecimento que a mente armazenou ao longo do desenvolvimento do indivíduo. Isto quer dizer que aqueles indivíduos que apresentam um comportamento eficiente em determinada área são capazes de redescrever esta área, utilizando a flexibilidade e a criatividade cognitivas para tal fim. Assim, a transgressão de informação é possível, pois o conhecimento sobre determinada área já se encontra estabilizado na mente humana.

Com isso, é possível dizer que a escrita digital configura uma

transgressão intencional da norma ortográfica da Língua Portuguesa.

Os usuários da escrita digital produzem notações inadequadas porque já

possuem discernimento das regularidades e irregularidades da língua, ou seja,

do que está certo ou errado. Desse modo, eles conseguem brincar, jogar com

as normas e regras ortográficas, porque são capazes de ir além, eles mudam,

criam, flexibilizam o conhecimento ortográfico devido a sua criatividade

cognitiva proporcionada pela redescrição representacional.

Por outro lado, há adolescentes que se encontram em um nível de

conhecimento inferior em relação à norma ortográfica da Língua Portuguesa e

com isso, poderiam ser influenciados pela escrita digital. Esses adolescentes

apesar de transgredirem a norma ortográfica propositalmente no ambiente

virtual, teriam mais dificuldade para adequar sua escrita no ambiente escolar.

Pode-se afirmar que o meio digital traz muitas mudanças, novos

conceitos, entendimentos sobre a escrita, especialmente em relação aos

adolescentes. Esses jovens de hoje estão sempre à procura de coisas novas,

diferentes, são ávidos por interação, e dentro do mundo virtual conseguem tudo

isso e muito mais. Eles se comunicam através da escrita digital, com isso,

desfazem-se da crença e das regras impostas pelas instituições de ensino, de

Page 37: Genero Digital No Ensino de Lingua Portuguesa

36

que apenas a escrita formal, isto é, a escrita correta das palavras pode gerar

sentido e comunicação.

O estilo da escrita digital, ou seja, o “netspeak” tem gerado muitas

discussões de que esse tipo de linguagem pode influenciar decisivamente a

escrita dos alunos no ambiente escolar. Apesar de que alguns internautas,

principalmente os adolescentes, têm o conhecimento de que essa forma de

escrita os fazem sentir-se integrados dentro desse grupo, de uma “tribo”, e para

poder interagir nesse ambiente é necessário utilizar outra forma de linguagem,

isto é, de escrita. Segundo Bernardes e Vieira (2005, p. 56-57), o recorte de

uma conversa entre dois adolescentes ilustra essa afirmação:

“25. <[lilijf]> vc freqüenta esse canal há muito tempo? 26. <[Rolls_]> é eu nunca tinha visto seu Nick 27. <[Rolls_]> a tem mais de um ano 28. <[lilijf]>ah, ta!!!!!!!!!!!!!![...] 29. <[Rolls-curioso]> aki eu escrevo tudo errado aki na net percebeu????? 30. <[lilijf]> mas naun e pra ser assim? 31. <[Rolls_-_]> a todo mundo escreve HERRADO 32. <[lilijf]> hehehe 33. <[Rolls_-_]> num é só mim 34. <[Rolls_-_]> hah 35. <[Rolls_-_]> aa 36. <[lilijf]> hahahahahaha 37. <[Rolls_-_]> poxa 38. <[lilijf]> pq vc acha que essa escrita ficou assim? 39. <[lilijf]> aki ni chat 40. <[Rolls_-_]> é ki vai mais rápido 41. <[lilijf]> e, tb acho 42. <[lilijf]> mas to me acostumando ainda 43. <[Rolls_-_]> a copiando todo mundo 44. <[lilijf]> eh 45. <[Rolls_-_]> saca 46. <[Rolls_-_]> pó vou tentar parar 47. <[lilijf]> parar o q? 48. <[Rolls_-_]> outro dia já ia botando Rolls na minha prova 49. <[Rolls_-_]> é mole 50. <[lilijf]> hahaha 51. <[lilijf]> ce acostuma ne? 52. <[Rolls_-_]> di escrever errado 53. <[Rolls_-_]> é já acostumei 54. <[lilijf]> já escreveu outras coisas como aki na net na hora de escrever no papel/ 55. <[Rolls_-_]> não ate aki não 56. <[Rolls_-_]> mas sempre quase 57. <[lilijf]> entendi”

Page 38: Genero Digital No Ensino de Lingua Portuguesa

37

Como se pode notar os adolescentes usam variedades distintas, quando

escrevem na escola ou na internet, isto é, conseguem discernir os tipos de

escritas e aplicá-las em seus diferentes ambientes. Segundo Pereira e Moura

(apud SOUSA, 2007), ao analisarem e interpretarem o tipo de escrita utilizada

em salas de bate-papo, constataram que os internautas, por conhecerem a

escrita formal, consideram inadequada usá-la no ambiente virtual, devido à

forma de interação que a mesma exige e, utilizam, então, uma “escrita teclada”,

que veicula os sentidos específicos de uma interação informal, dinâmica e

realizada em um novo suporte.

Se um jovem usa a Internet para enviar mensagens ou para se

comunicar com os amigos, então, ele possui certo conhecimento ou domínio

desse modo de escrever e lidar com programas e computador. Se ele domina,

também, outras maneiras de operar, com papel, caneta, softwares e tinta,

demonstra uma ampliação de seu letramento. Dessa forma, ele saberá

empregar corretamente cada tipo de comunicação em dada situação, seja ela

de máquina ou de seu próprio punho.

O problema pode surgir quando o jovem domina apenas um deles. Um

jovem que frequenta o ambiente virtual provavelmente domina a escrita digital.

Se ele consegue alterar o seu modo de escrever quando se transfere para

outro ambiente, ainda está tudo bem. O problema é quando ele emprega um

único modo para todos os ambientes, como não seria capaz de adequar os

diferentes usos de escritas em seus ambientes.

Muitos temem pela “decadência” da Língua Portuguesa no seu estilo

formal, mas para Sousa (2007, p. 201) esse temor é inoportuno, “pois os meios

eletrônicos não estão atingindo a estrutura da língua no que diz respeito aos

seus aspectos nucleares, a fonologia e a sintaxe.”

Segundo Marcuschi (2005), ao analisar a linguagem no ambiente virtual

é preciso dar maior importância ao papel que as condições externas (sociais,

culturais, históricas e tecnológicas) exercem sobre o uso da linguagem, ao

invés das condições internas (formais ou estruturais) observadas na superfície

textual.

No ambiente escolar, devemos nos lembrar que os estudantes

geralmente escrevem apenas para uma pessoa, o professor, enquanto que na

Page 39: Genero Digital No Ensino de Lingua Portuguesa

38

Internet seu nível de relação é bastante extenso. Utilizando-se da reflexão feita

por Defillippo e Cunha (apud SOUSA, 2007, p. 201) de que nickname escreve

mais que realname:

Pode-se afirmar que na Internet o internauta tem a presença de um outro real, de um outro que dialoga visceralmente com seu interlocutor e que exerce um papel ativo no processo de comunicação verbal. Já na escola esse outro é “minimizado” na figura do professor que irá avaliar a produção textual do aluno.

A notação ortográfica na esfera digital constitui segundo Marcuschi

(apud CAIADO, 2007, p. 41) “uma nova forma de relacionarmos com a escrita,

mesclando elementos característicos da fala com elementos característicos da

escrita, fazendo emergir toda a criatividade e interatividade dos sujeitos”.

Na mesma obra organizada por Freitas e Costa, Defillipo e Cunha (apud

RIBEIRO, 2007, p. 239) aponta a criatividade e o prazer como características

da ação de leitura/escrita de adolescentes:

Depois de meses de observação e interação com internautas adolescentes, percebemos que, nesse novo ambiente, uma nova prática de leitura e escrita surgia, impregnada de criatividade e prazer. Parecia-nos que estávamos entrando em contato com o espaço em que o mundo das letras não era só conhecido e apreciado por esses adolescentes, mas era também transformado e compreendido.

3.2 ALGUMAS TÉCNICAS DA ESCRITA DIGITAL

A linguagem digital não é só outro tipo de escrita, mas também uma

prática social, onde os jovens conhecem e conseguem manter relações sociais

entre eles. Observam-se muitas variedades e mudanças na escrita digital,

abreviaturas, troca de letras, interjeições, onomatopéias, pontuação irregular,

uso dos “emoticons” para poderem se expressar e diante disso os aspectos

Page 40: Genero Digital No Ensino de Lingua Portuguesa

39

normativos ortográficos da Língua Portuguesa são deixados para segundo

plano.

Segundo Crystal (2005, p. 91), o fato de que os mais jovens usam

formas abreviadas para se comunicarem através de:

[...] técnicas de rébus (b4 “before” [antes], CUl8er “see you later” [te vejo mais tarde]), abreviações (afaik “as far as I know” [até onde sei], imho “in my humble opinion” [na minha humilde opinião]) ou indicações fonéticas (thx “thanks” [obrigado]) [...].

não é completamente novo ou fundamental, pois a maioria das pessoas tem

usado abreviações há gerações, por exemplo, ttfn (“ta-ta for now”; por ora,

adeus), asap (“as soon as possible”; assim que puder), fyi (“for your

information”; para sua informação).

Entretanto, esse tipo de escrita “perde a graça”, se for usada fora da

tecnologia, seja no computador ou no celular, pois perde todo o estilo, sua

essência e sua identificação de grupo.

Em contrapartida, há o problema de alguns jovens começarem a usar

esses tipos de abreviações em outros lugares onde não convêm e sem

propósito algum, como por exemplo, no ambiente escolar, mais precisamente

em redações escolares, por isso deve ser vigiado e os responsáveis, neste

caso os professores, trabalharem mais em relação a isso, para que essa nova

geração possa discernir quando é viável ou não esses tipos de abreviações.

Segundo Crystal (2005), as variações da escrita digital devido ao seu

sistema extremamente reduzido, possuem três características principais que

valem a pena ressaltar:

O uso das maiúsculas tem uma grande variação. Ou se usa ao acaso o

tipo maiúsculo ou não se usa nada. Mas, o tipo minúsculo é o mais usado em

frases inteiras e em todos os lugares, mesmo em início de frase e em nomes

próprios. Devido ao uso indiscriminado de minúsculas, indica que qualquer uso

do tipo maiúsculo demonstra alguma forma de expressão. Por exemplo, muitas

vezes quando as mensagens são escritas totalmente com letras maiúsculas

são consideradas como “gritos”, palavras em maiúsculas expressam uma

Page 41: Genero Digital No Ensino de Lingua Portuguesa

40

ênfase extra (também podem ser usados asteriscos e espaçamento), por

exemplo:

Esse é um assunto MUITO importante.

Esse é um assunto *muito* importante.

Esse é um assunto m u i t o importante.

A pontuação, geralmente, é usada o mínimo possível e na maioria das

vezes nem é usada, principalmente nos e-mails e bate-papos. Há ainda

usuários que são meticulosos em relação ao uso da pontuação tradicional,

depende muito da personalidade de cada um, há aqueles que só a usam para

evitar ambiguidade e outros que devido à velocidade da digitação

simplesmente não a usam.

A prática da ortografia é diferente da forma convencional. Como já foram

mencionados antes, os erros de ortografia encontrados em um e-mail não

significam que a pessoa que os cometeu tenha um nível de escolaridade baixa,

mas apenas uma consequência da imprecisão ao digitar.

As abreviaturas são um dos estilos mais usados na escrita digital, pois

assim, é possível se comunicar (escrever) de uma forma mais rápida, como a

situação exige. Segundo Caiado (2007, p. 40): “As palavras e expressões

notadas nesse gênero são abreviadas ou reduzidas até o ponto de se

converterem em uma, duas ou três letras: ñ (não), aki (aqui), ki (que), hj (hoje),

Tb (também), fds (fim de semana).”

Dentro do ambiente virtual esse tipo de escrita não é considerado

errado, pois é uma forma de identificação e interação, além de ser adequada e

eficiente em seu meio.

Há várias estratégias de redução de palavras e, também, de expressões.

Com base em Santos (apud CAIADO, 2007, p. 40), listamos as seguintes

estratégias:

• Sons das letras iniciais das palavras associados a símbolos matemáticos: D+;

• Escrita consonântica: bjs, tb, td, mt; • Expressões reduzidas a três letras: fds; • A letra K substituindo o dígrafo QU: akeli, aki, eskeceram,

daki; • Subtração das vogais mediais: qm, qnd, tbm.

Page 42: Genero Digital No Ensino de Lingua Portuguesa

41

Mais algumas abreviações (em inglês) usadas nas conversas do

Netspeak, segundo Crystal:

Quadro 1: Abreviações usadas nas conversas do netspeak.

afk away from keyboard Ausente do teclado

asap as soon as possible Assim que for possível

a/ s/ l age/ sex/ location Idade/ sexo/ localização

bbl be back later Volto mais tarde

b4 Before antes

cm call me Me ligue

cyl8r see you later Até mais tarde

cya see you Até mais

dur? do you remeber? Você se lembra?

f? friends? Amigos?

Gr8 Great Ótimo/ legal

idk I don’t know Não sei/ não conheço

jam just a minute Só um minuto

j4f just for fun Só por diversão

np no problem Sem problemas

ruok? are you OK? Você está bem?

t + think positive Pense positivo

tx Thanks obrigado

wb welcome back Benvindo de volta

2g4u to good for you Muito bom para você

4e Forever Para sempre

Fonte: (CRYSTAL, 2006, p. 91-91)

Como se pode notar eles criam as suas próprias regras, pois é um

ambiente onde se pode inovar e criar. A cada dia aparecem mais novidades na

escrita digital.

Page 43: Genero Digital No Ensino de Lingua Portuguesa

42

Sendo assim, não parece que os jovens estão “escrevendo de forma

inadequada”, mas sim utilizando um processo de refinamento na escrita, o qual

usa o menor número de caracteres possível para economizar tempo na escrita

real. Eles escrevem de forma inadequada porque têm um propósito e intenção

em fazê-lo, devido às condições em seu meio. Portanto, a escrita digital é uma

nova forma de comunicação, na qual o internauta entra em uma realidade

diferente e pode assim criar, inovar e adquirir muitos conhecimentos.

Page 44: Genero Digital No Ensino de Lingua Portuguesa

43

4 PESQUISA DE CAMPO

4.1 ASPECTOS METODOLÓGICOS E DADOS ESPECÍFICOS

A metodologia utilizada para essa pesquisa foi o Estudo Comparativo de

Casos. Optamos por uma metodologia em pesquisa de estudo de caso,

primeiro porque acreditamos no aspecto processual e dinâmico dessa

metodologia e, também, por acreditarmos que seria a forma mais eficaz de

investigar se a maneira como os adolescentes escrevem no meio digital estaria

presente em textos de diversos gêneros, mais formais, como os escritos na e

para a escola: avaliações, cadernos de atividades, exercícios. A nossa intenção

foi a de conhecer a escrita digital dos sujeitos em estudo e aprofundar a análise

dessa escrita digital através dos “Scraps” no Orkut e dos “chats” no MSN.

Participaram desse estudo oito adolescentes, sete meninas e um

menino, aos quais denominaremos de A1, A2, A3, A4 e B1, B2, B3, B4 , sendo

que os primeiros tinham 12 anos e cursavam o 7º ano (6ª série) do Ensino

Fundamental II, e os últimos tinham entre 17 e 18 anos e cursavam o 3º ano do

Ensino Médio. É importante levarmos em consideração que todos estudam em

um colégio privado desde criança e convivem com uma família de nível de

instrução relativamente bom.

O nosso corpus foi constituído de uma entrevista com cada sujeito, de

scraps ou chats postados, por meio de e-mails e atividades realizadas no

ambiente escolar como provas, exercícios e atividades realizadas no caderno

em sala de aula.

4.2 ANÁLISE DOS PRINCIPAIS RESULTADOS OBTIDOS

4.2.1 A Notação Escrita nos Scraps (Orkut) e nos Chats (MSN)

1) Percebemos, através da análise, que não existe um padrão a ser

seguido ou uma “norma ortográfica” no ambiente digital, a escrita é subjetiva,

Page 45: Genero Digital No Ensino de Lingua Portuguesa

44

isto é, cada sujeito possui uma certa particularidade em relação a sua própria

maneira de escrever. O que foi observado em algumas palavras encontradas

nos scraps e nos chats analisados:

a) não = A1(nao); A4 (ñ ); B1 (nu, num, naum).

b) beijo(s)/ beijão = A2 (bjão); A4 (bjao, bjãoo, bjo); B1 (bjs, bjos); B3

(bjuss); B4 (bjos).

c) o que = A1 (oque); A2 (oke); A4 (oq).

d) de = A4 (d); B1 (di).

e) porque = A2 (porke, pq)

f) que = A4 (q, ke).

2) Utliza-se muito a redução de palavras, até o ponto de se converterem

em uma, duas ou três letras:

A1: q (que); mto (muito); vdd (verdade); pq (por que).

A2: to (estou); pq (por que); mto (muito); amñ (amanhã).

A4: ñ (não); q (que); amñ (amanhã); c (com); mto (muito); agr (agora); td

(tudo); fla (fala).

B1: geo (geografia); cel (celular); pra (para); pq (por que).

B2: pq (por que).

B3: q (que); pra (para); cel (celular).

B4: hje (hoje).

3) No meio digital, há muita occorrência da subtração das vogais mediais

ou da supressão das vogais das palavras, surgindo assim a escrita

consonântica:

A1: td (tudo); vc (você); tbm (também).

A2: tbm (também); vc (você).

A3: vc (você).

A4: qm (quem); tbm (também); vc (você).

B1: tbm (também); vc(você).

B2: vc (você).

B3: vc (você).

B4: vc (você).

Page 46: Genero Digital No Ensino de Lingua Portuguesa

45

4) Outra característica da escrita digital é a substituição do dígrafo QU

pela letra K devido à economia da escrita:

A2: oke (o que); porke (porque).

A4: kero (quero); ke (que).

B1: k (que).

5) Ausência de acentos, til e cedilhas:

A1: situacao; amanha, mae, manha.

A2: to, voce, preguica.

A3: tambem, entao, ja.

A4: atletico, seleçao, ate, tecnico, ca.

B1: negocios, ja, amanha, quimica, ta, facil.

B2: sarcastica, video.

B3: horarios, ate, amanha.

B4: abençoe, historia.

6) Em relação ao ditongos nasal –ÃO, muitas vezes é substituído por

AUM, sendo assim, o conceito de economia de caracteres na escrita digital se

desfaz nesse item, pois é muito mais longo escrever AUM do que –ÃO, mas

também foram encontrados o uso de UM, U ou simplesmente AO:

A1: nao.

B1: naum, num, nu (não).

7) Encontra-se muito no espaço digital, o uso de onomatopéias para que

seja possível demostrar as emoções, os sentimentos, o estado de espírito

naquele determinado momento. Cada sujeito ou grupo de amigos expressa a

sua risada de um modo particular:

A1: uahauhauha; ahuahauhauhauah (risada).

A2: ahuahauhauahaa (risada).

A3: uheiuiaehuiaheuiahuieh (grito de alegria).

A4: u.huuuu (grito de alegria)

B1: kkkkkkkkk (risada intensa).

B2: aushauhsuahus (risada); sokasoaksokaoskao.

B3: hahshas (risada).

Page 47: Genero Digital No Ensino de Lingua Portuguesa

46

B4: hehehe (risada).

8) Foi encontrado em grande quantidade, o uso do alongamento de

vogais e consoantes em determinadas palavras. Segundo Santos (2003) essa

caracterísitica utilizada pelos interlocutores “é a sensação de como

determinada palavra deve ser lida e que intenção ela carrega”, ou seja, houve a

pretensão de chamar a atenção do outro intelocutor por algum motivo ou

apenas para dar ênfase:

A1: ooiee; aaah.

A2: aaaata; corajosaaaa; siim; deussss.

A3: oooooooooi; teeu; tudo booooooom; ook.

A4: viajaaaaaaaar; sonoooo; priminhooooos; brigadaaa; ook.

B1: fedoooooooo; isaaaaaa; oiiiiiiiii; bommmmmm; eitaaaaaa, ficoooooo.

B2: aaaaaaaaaah; ameii; videeeo; oiiiiiiiie; melhoooooor; olhaaaa;

docinhoooos.

B3: oieee; bjusss.

B4: parabéééééns; amooo.

9) Nota-se que alguns trocam a letra E pela letra I e tamém o O pelo U:

A1: amu (amo).

B1: di (de); ti (te).

B3: bjus (beijos).

10) Houve ocorrências de junção de palavras:

A1: oque; atarde.

B1: jaja; daoraaaaa.

11) Em relação aos verbos, principalmente na forma infinitiva, há a

supressão do –r no final:

A2: só de pensa; brigada por me humilha e me faze...;

A4: so falta ganha agr; a gente combina de sai; tenho q estuda.

B1: vo te passa; é só fala um pouco;se eu num desce fala...

B3: ta meio comprido pra espeta q nem ele.

Page 48: Genero Digital No Ensino de Lingua Portuguesa

47

12) Através dos símbolos matemáticos e caracteres, eles expressam

sentimentos e emoções:

A1: ; ] piscada; ;] sorriso; o_o esperando ou em atenção; :S (dúvida).

A2: : / ou =/ tédio ou tristeza; =) alegria.

A3: (; piscada.

A4: =/ insatisfação ou tédio; =] alegria.

B2: =)) alegria; =0 sarcasmo ou surpresa; *-* alegria ou satisfação.

B4: =) sorriso; *-* alegria.

4.2.2 A Notação Escrita no Ambiente Escolar

A pesquisa feita sobre as notações no ambiente escolar foi de uma

entrevista com cada adolescente, e uma análise em algumas de suas

avaliações de disciplinas diferentes (história, geografia, filosofia e língua

portuguesa), e também no caderno de língua portuguesa.

Foi feita uma análise percentual dos “erros ortográficos” rastreados nas

produções realizada de cada sujeito no ambiente escolar. Nossa primeira

análise percentual levou em consideração as seguintes variáveis: a quantidade

total de palavras analisadas de cada sujeito e a quantidade de erros

ortográficos encontrados.

Antes de levantarmos qualquer conceito sobre o assunto, são

apresentadas a seguir algumas informações adquiridas através da entrevista

com cada adolescente:

1 – Identificação

2 – Idade

3 – Ano

4 – Tem o hábito de ler

5 – Número de livros lidos por ano

6 - Tempo que fica na Internet por dia

7 – Utiliza a escrita digital no ambiente escolar

8 – Tem que se policiar para não utilizar a escrita digital no ambiente

escolar

Page 49: Genero Digital No Ensino de Lingua Portuguesa

48

Quadro 2: Informações dos adolescentes sobre seus hábitos de leitura e

escrita.

1 2 3 4 5 6 7 8

A1 12 7º ano EF Sim 7 5-6 h Nunca Não

A2 12 7º ano EF Sim 5 2-3 h Nunca Não

A3 12 7º ano EF Sim 4 6-7 h Nunca Não

A4 12 7º ano EF Sim 5 2-3 h Nunca Não

B1 18 3º ano EM Não 1 2 h Raramente Sim

B2 18 3º ano EM Sim 4 4 h Nunca Não

B3 17 3º ano EM Sim 5 3 h Raramente Não

B4 17 3º ano EM Sim 3 2-3 h Nunca Não

Fonte: Dados obtidos por meio de aplicação de questionário e entrevista.

Em relação ao número de palavras analisadas e o número de

percentagem de “erros ortográficos” encontrados de cada aluno, têm-se o

seguinte levantamento:

Quadro 3: Palavras analisadas e o número de percentagem de

incorreções.

Nº de palavras analisadas

Percentagem de erros ortográficos

A1 1835 0%

A2 1307 0,15%

A3 1403 0%

A4 2725 0%

B1 2116 0%

B2 2992 0,2%

B3 2824 0,14%

B4 2569 0,5%

Fonte: Dados obtidos por meio de palavras analisadas.

Page 50: Genero Digital No Ensino de Lingua Portuguesa

49

Observações:

A2 – 2 erros: min (minuto), p (para).

B2 – 6 erros: p (para) 3 vezes, pag (página), Hist (História), doc

(documento).

B3 – 4 erros: tbm (também), org (organização), trab (trabalho), + (mais).

B4 – 13 erros: p (para) 3 vezes, vs (versus) 2 vezes, ñ (não) 2 vezes, +

(mais) 2 vezes, ex (exemplo), pag (página), fev (fevereiro), cap (capítulo).

Diante de todo esse levantamento de dados, constatamos que os

sujeitos envolvidos nessa pesquisa nunca ou quase nunca utilizam a escrita

digital no ambiente escolar, apenas quatro dos oito sujeitos utilizaram-na,

sendo um nível percentual muito baixo: 0,15%, 0,2%, 0,14% e 0,5%.

É importante ressaltar que foram escontrados outros tipos de erros

ortográficos e erros de acentuação, mas que nesse caso são irrelevantes em

nossa pesquisa.

Os dados mostram que esses adolescentes sabem adequar os dois

tipos de linguagem em seu determinado espaço e que não possuem nenhuma

dificuldade em relação a cada tipo de escrita.

Page 51: Genero Digital No Ensino de Lingua Portuguesa

50

CONCLUSÃO

Como se pode verificar, a escrita formal não é muito utilizada pelos

adolescentes no ambiente virtual, mas sim a escrita digital criada por eles

mesmos, onde não há normas a serem seguidas, nem uma regra ortográfica

digital.

Os adolecentes “escrevem errado de propósito”, intencionalmente, nos

chats e nos scraps, porque já possuem certo grau de conhecimento das

regularidades e irregularidades das regras ortográficas da Língua Portuguesa.

Sendo assim, eles entendem-se, comunicam-se e, principalmente, interagem-

-se por meio da escrita digital no ambiente virtual, assim desfaz-se o mito

imposto de que outras maneiras de escrever não gerem sentido e

comunicação.

Diante da pesquisa realizada, constatamos que os adolescentes

envolvidos na pesquisa sabem discernir a diferença da escrita formal e da

escrita digital, bem como, usá-las no lugar e no tempo adequado a cada

momento.

Essas constatações nos levam a acreditar que a escrita digital e a

tecnologia não irão prejudicar a norma ortográfica da Língua Portuguesa,

desde que a escrita formal seja bem ensinada e utilizada no ambiente escolar.

Por isso, é relevante ressaltarmos que o papel de cada instituição escolar é

essencial para a boa formação de cada sujeito.

A escrita digital é uma evolução na linguagem e na comunicação do ser

humano e ela está aí para ser utilizada e explorada por todos, só é preciso ter o

cuidado de utilizá-la no ambiente adequado e na hora certa.

Page 52: Genero Digital No Ensino de Lingua Portuguesa

51

REFERÊNCIAS

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