FENÓMENO DA «DESADMINISTRATIVIZAÇÃO»

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    FENMENO DA DESADMINISTRATIVIZAO1

    Fenmeno da Desadministrativizaoo Formas de privatizao ou retorno para o Direito

    Privado

    Privatizao do Direito aplicvely Est relacionada com a opo crescente, por

    parte da Administrao Pblica, em aplicar o

    Direito Privado Administrativo, preterindo o

    Direito Administrativo, com as suas garantias e

    vinculaes;

    y O Direito Administrativo releva hoje mais aperspectiva e interesses particulares do que os

    pblicos.

    Privatizao da gesto/execuo de tarefas pblicasy Podemos distinguir dois subtipos de

    privatizao

    oPrivatizao funcional

    No h lugar transferncia deuma tarefa pblica para uma

    entidade privada, uma vez que esta

    ltima apenas auxilia a

    Administrao Pblica numa

    determinada tarefa, servindo-se,

    para isso, dos seus meios privados

    (de Direito Privado), ou seja, neste

    caso, no h exerccio privado de

    funes pblicas.

    1 Os apontamentos apresentados foram recolhidos em aulas prticas de Direito Administrativo I,

    ministradas pela Exma. Professora Doutora Juliana Coutinho, na Faculdade de Direito da Universidade

    do Porto (FDUP), no ano lectivo 2010/2011.

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    Por exemplo: para concretizao deuma ordem de demolio, acto

    administrativo a executar pela

    Cmara Municipal, esta contrata um

    ente privado.

    o Privatizao orgnica H lugar transferncia da

    responsabilidade de execuo de

    uma tarefa pblica para uma

    entidade privada, caso em que se

    verifica um exerccio privado de

    tarefas pblicas.

    y Privatizao atravs dacriao de entidades

    administrativas privadas;

    y Delegao de poderespblicos de autoridade a

    entidades verdadeiramente

    privadas (Administrao

    Pblica delegada ou

    concessionada), isentas de

    influncia pblica dominante

    (como sucede no contrato de

    concesso constante do

    Cdigo de Contratos

    Pblicos).

    Privatizao material de tarefasy Neste caso, h lugar a uma despublicizao da

    tarefa, tornando-se privada2.

    2Ver artigo 3. da Lei-Quadro das Privatizaes (Lei 11/90, de 5 de Abril), conjugada com o artigo 10.

    CPA e artigo 267. CRP.

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    Como se justifica a privatizao da Administrao Pblica?o Para explicar a concretizar deste fenmeno, so apresentados

    dois princpios fundamentais:

    Princpio da eficincia e da eficcia na prossecuo dointeresse pblico

    y Constitui um imperativo do Estado de Bem-Estar;y Existe a necessidade de optimizao dos meios

    em funo dos fins a prosseguir (artigo 81.,

    alnea c) e artigo 267., n.1 da CRP + artigo 10.

    CPA), facilitando a prossecuo do interesse

    pblico (concretizao constante do artigo 3. da

    Lei-Quadro da Privatizao).

    Princpio da participao dos administrados/particulares na actividade administrativa,

    inclusivamente a nvel sucessrio

    y Decorre dos artigos 2. e 267., n.5 CRP +artigos 7. e 8. CPA;

    y Pode revestir vrias formas, nomeadamente decooperao com a Administrao Pblica

    (privatizao funcional) ou de substituio da

    mesma (privatizao orgnica);

    o Os princpios explanados deviam ter uma aplicao rigorosa,constituindo um limite e fundamento privatizao, no

    se superando garantias e princpios essenciais do Direito

    Administrativo;

    o Fenmeno da Desadministrativizao A concretizao deste fenmeno desenrolou-se em

    duas realidades:

    y (1) Privatizao (j falada em momentoanterior);

    y (2) Entidades administrativas independenteso Integram a Administrao independente (

    Administrao autnoma do Estado);

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    o Constituem uma forma de compensar oscaminhos de privatizao da

    Administrao. O Estado deixou de operar

    como operador econmico, passando a

    actuar apenas como mero regulador, oque no corresponde realidade,

    precisamente pelo facto de terem sido

    criadas estas entidades;

    o Associadas a uma necessidade de garantirneutralidade e independncia;

    o Podemos individualizar duas categorias deentidades privadas administrativas:

    Entidades administrativasindependentes em sentido estrito

    y Organismos autnomos nopersonalizados (desprovidas

    de personalidade jurdica),

    que funcionam junto de uma

    determinada pessoa colectiva

    pblica, qual so imputados

    os seus actos e omisses de

    actos, carecendo, por isso, de

    personalidade judiciria

    (artigo 10., nmeros 3 e 4

    CPTA);

    y Estas entidades, de inspiraofrancesa, desempenham uma

    funo de garantia de

    Direitos, Liberdades e

    Garantias;

    y Exemplos:o Provedor de Justia;

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    o Comisso Nacional deProteco de Dados

    (CNPD);

    o Comisso de Acesso aosDados Administrativos(CADA)

    Autoridades reguladorasindependentes (watchdogs)

    y Pessoas colectivas pblicas,com funes de regulao em

    determinados sectores a

    Economia e cuja criao

    inspirada na figura norte-

    americana das Agncias

    Reguladoras Independentes;

    y Dispem de amplos poderesde regulao, que se

    traduzem na faculdade de

    elaborao de normas, na

    fiscalizao e controlo da sua

    aplicao, atravs da

    concesso de autorizaes e

    licenas e a aplicao de

    sanes em caso de

    incumprimento;

    y Exemplos:o ICP AutoridadeNacional de

    Comunicaes (ICP-

    ANACOM);

    o Entidade Reguladora deServios Energticos

    (ERSE);

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    o Autoridade daConcorrncia;

    o Comisso do Mercadode Valores Mobilirios

    (CMVM).

    o As entidades administrativasindependentes constituem um terceiro

    independente na relao interpartes,

    como um rbitro e so uma forma de

    descaracterizao da Administrao

    Pblicas, entendidas como entidades para-

    jurisdicionais.

    o Crticas s entidades administrativasindependentes (em especial, as

    autoridades reguladoras independentes)

    Esto livres do contrologovernamental e parlamentar, ainda

    que os seus membros sejam

    designados pelo Governo e pela AR

    (no um acto de execuo

    contnua). Algumas delas so

    sujeitas a um controlo a posteriori

    pelo Governo, o que contraria a

    ideia de iseno, imparcialidade e

    neutralidade face sua actividade ;

    Com isto, levanta-se uma ideia dedesconfiana face restante

    Administrao, considerando-se

    que esta no capaz de se abstrairdo Estado de Partido;

    So consideradas um enclave anti-democrtico, dada a fuga, por

    parte do Governo, s normas

    relativas s tarefas a que est

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    incumbido pela, evitando o controlo

    exercido por esta ltima;

    Os tribunais3 apenas controlam alegalidade da sua aco, mas no o

    mrito (convenincia das decises),responsabilidade que no

    assumida pelo Governo;

    Esta realidade revela a refraco daaco desenvolvida pelo Estado,

    hoje entendido como Estado

    Mnimo Regulador (ou

    Administrao Pblica de Infra-

    estruturas), em que se perdeu a

    proteco do interesse pblico, isto

    , o Estado privatizou a

    prossecuo do interesse pblico;

    Tendo-se colocado em causa alegitimidade democrtica e a

    constitucionalidade de tais

    entidades, acrescentou-se o artigo

    267., n.3 CRP. Contudo, com esta

    clusula geral, no se limitou a

    criao de entidades

    administrativas independentes.

    Alis, esta norma considerada, por

    alguns autores, uma norma

    constitucional inconstitucional,

    dada a abertura criao

    desenfreada de entidades.

    3Tribunais Administrativos e Fiscais e Tribunal de Contas (este ltimo, no controlo das Finanas

    Pblicas)