Do Cinema ao Segredo · Como parte integrante do estudo central teórico, serão aprofundadas...

30
Gonçalo Alves Viana Do Cinema ao Segredo Orientador: Professor Doutor Manuel José Carvalho Almeida Damásio Vogal: Professor Dr. Gonçalo Laidley Melo Galvão Teles Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias Coordenação Pedagógica do Departamento de Cinema e Artes dos Media Lisboa 2019

Transcript of Do Cinema ao Segredo · Como parte integrante do estudo central teórico, serão aprofundadas...

Page 1: Do Cinema ao Segredo · Como parte integrante do estudo central teórico, serão aprofundadas diferentes representações do segredo em diversas histórias. Como é trabalhado este

Gonçalo Alves Viana

Do Cinema ao Segredo

Orientador: Professor Doutor Manuel José Carvalho Almeida Damásio

Vogal: Professor Dr. Gonçalo Laidley Melo Galvão Teles

Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias

Coordenação Pedagógica do Departamento de Cinema e Artes dos Media

Lisboa

2019

Page 2: Do Cinema ao Segredo · Como parte integrante do estudo central teórico, serão aprofundadas diferentes representações do segredo em diversas histórias. Como é trabalhado este

2

Nome: Gonçalo Alves Viana

Título da Tese: Do Cinema ao Segredo

Relatório Técnico defendido em provas públicas na Universidade Lusófona de Humanidades e

Tecnologias no dia 07/ 05/ 2019, perante o júri, nomeado pelo Despacho de Nomeação n.º:

105/2019, para obtenção do grau de mestre em Estudos Cinematográficos perante o júri com a

seguinte composição:

Presidente: Professor Doutor Paulo Renato da Silva Gil Viveiros (ULHT);

Arguente: Professor Doutor Nelson Agostinho Marques Araújo (ESAP);

Orientador: Professor Doutor Manuel José Carvalho Almeida Damásio (ULHT);

Vogal: Professor Dr. Gonçalo Laidley Melo Galvão Teles (ULHT).

Escola de Comunicação, Arquitetura, Artes e Tecnologias da Informação

Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias

Lisboa, 2019

Page 3: Do Cinema ao Segredo · Como parte integrante do estudo central teórico, serão aprofundadas diferentes representações do segredo em diversas histórias. Como é trabalhado este

3

AGRADECIMENTOS

Gostaria de agradecer ao meu vogal Professor Dr. Gonçalo Galvão Teles pelo apoio durante toda

a fase de escrita e produção da curta-metragem, bem como em ter acreditado no projecto ao longo

do seu desenvolvimento.

Agradeço também a toda a excelente equipa que me ajudou na pré-produção, na pós-produção e

durante as filmagens. Todos os elementos ajudaram-me no seu tempo livre sem receberem nada

em troca, dando uma esperança à colaboração e à dedicação pela arte.

Agradeço a todos os apoios que obtive para a realização do filme, desde do Hospital IPO, ao Meu

Super, à Farmácia Varela em Moscavide, à produtora Untold – Stories of places e a todos aqueles

que contribuiram para a campanha crowdfounding da plataforma PPL.

Agradeço à minha família, amigos e, em especial, à Giulia Di Battista pelo apoio em fases mais

complicadas do processo.

Page 4: Do Cinema ao Segredo · Como parte integrante do estudo central teórico, serão aprofundadas diferentes representações do segredo em diversas histórias. Como é trabalhado este

4

RESUMO

Todas as narrativas cinematográficas propôem-se a desvendar algo novo, a contar uma história que

nunca foi contada, ou a retratá-la de uma forma diferente. No fundo, todas elas consistem numa

passagem de informação do ecrã para o espectador.

Algumas dessas histórias englobam ainda uma busca, uma procura no seu interior, um mistério que

não é desvendado à partida. Estas narrativas trazem-nos segredos. E como é contada uma história

com um segredo? Deve este ser desvendado imediatamente? Ou pode tornar-se parte formal do

próprio conto?

Como parte integrante do estudo central teórico, serão aprofundadas diferentes representações do

segredo em diversas histórias. Como é trabalhado este aspecto fulcral de cada filme, em que nível

é colocado o espectador e quando ou a que ritmo decide o realizador desvendar a informação oculta.

Tratando-se de um estudo algo específico, são poucas as fontes onde podesse basear esta tese e a

metodologia aplicada. Renira Gambarato, estudiosa brasileira, douturada em Design de

Informação, lançou em 2010 um artigo sobre a metodologia para análise de filme, tendo em conta

os objectos. Adaptando o segredo a um “objecto” do filme, esta foi a metodologia usada.

Compreende-se que o segredo é uma parte integrante do filme que pode ser representada de várias

formas e originar diferentes interpretações na audiência. Enquanto o segredo revelado proporciona

a espectativa de confronto entre personagens; a suspeita do segredo constrói uma tensão até à sua

descoberta; e um segredo surpreendente origina um choque dramático e uma mudança drástica na

compreensão da história.

São estas pequenas variáveis que proponho analisar e, consequentemente, aplicar numa curta-

metragem produzida e aliada a esta tese teórica, intitulada Qualquer um pinta.

PALAVRAS CHAVE

- Segredo

- Representação

- Objecto cinematográfico

- Confiança

- Mentira

Page 5: Do Cinema ao Segredo · Como parte integrante do estudo central teórico, serão aprofundadas diferentes representações do segredo em diversas histórias. Como é trabalhado este

2

ÍNDICE GERAL

Introdução........................................................................................................................................3

Motivação pessoal............................................................................................................................4

Questões de Investigação.................................................................................................................6

Metodologias....................................................................................................................................6

Estado da arte .................................................................................................................................11

Relatório.........................................................................................................................................16

Contributo.......................................................................................................................................21

Pistas Futuras..................................................................................................................................25

Bibliografia.....................................................................................................................................26

Filmografia.....................................................................................................................................27

Page 6: Do Cinema ao Segredo · Como parte integrante do estudo central teórico, serão aprofundadas diferentes representações do segredo em diversas histórias. Como é trabalhado este

3

INTRODUÇÃO

Desde das primeiras experiências dos irmãos Lumiere no final do século XIX que a realidade

adquiriu um “parceiro” com o qual partilhava muitas semelhanças, o Cinema. Mais que a literatura,

a fotografia ou mesmo o teatro, o cinema cria uma realidade paralela que transporta a sua audiência

de tal modo que o espectador deixa a sua cadeira e vive a história da personagem durante um

respectivo período. Os primeiros espectadores confundiam-se com a imagem projectada de um

comboio a vir na sua direção dentro de uma “janela gigante”. Mas hoje, é intuitivo perceber-se que

aquela história não é real nem está a acontecer no presente. O cinema mente aos seus espectadores,

não mostra tudo, esconde-nos um segredo, conta-nos só o que a câmara e a montagem decidem

mostrar. Mas esse segredo é público, qualquer espectador percebe hoje que o dinossauro gigante é

feito em computador e que as bicicletas não voam, muito menos com um alien dentro do cesto.

Existe uma grande equipa a trabalhar atrás da câmara que em nenhum momento (salvo raras

excepções propositadas) é revelada, mas é conhecida. Todo o filme ficcional acarreta este segredo

e não é necessário um truque genial para o esconder.

Mas é quando a própria história engloba um segredo que a creatividade é estimulada. A audiência

pode abdicar do seu papel exclusivamente passivo e tornar-se parte da história, interagindo com o

ambiente e a tensão das personagens, quer seja detentora do segredo ou não. O filme, como conceito

narrativo, não se resume apenas a uma constatação das imagens e sons projectados, mas abrange

também o próprio intelecto do espectador. Toda a percepção, especulação e previsão do desenlace

da narrativa é imaginada na mente de cada membro da audiência. O filme ganha, assim, uma

dimensão que transcende o próprio objecto. E esta consequência depende fortemente da maneira

como é contada a história, como o realizador decide guiar o espectador, como é expresso o segredo.

É precisamente neste panorama que eu pretendo inserir o estudo da minha tese. Avaliando as

diversas formas de representacão do segredo, será possível adaptar cada uma delas em função da

intenção pretendida e da reação do espectador. Ainda que considere claramente que o cinema, como

outro tipo de arte, não se insere no campo das ciências exactas, do efeito-consequência e, por tanto,

Page 7: Do Cinema ao Segredo · Como parte integrante do estudo central teórico, serão aprofundadas diferentes representações do segredo em diversas histórias. Como é trabalhado este

4

a utilização de uma determinada técnica representativa do segredo não implica forçosamente uma

reacção especulada previamente. Pretendo apenas focar o estudo deste objecto cinematográfico e

concluir quais as reacções que podem resultar de algumas formas diferentes de representar o

segredo. Em último âmbito, a tese servirá para um conhecimento e um olhar mais aprofundado

sobre o tema.

MOTIVAÇÃO PESSOAL

Tal como um contador de histórias, um cineasta cria e inventa. Deve possuir uma imaginação fluída

que suporte todo esse novo mundo existente apenas na sua mente. E esse mundo interno deve ser

tão real para si quanto o externo que partilha com outros. Mesmo quando questionado, deve haver

uma rápida e coerente resposta que não coloque em causa a integridade dessa sua criação.

A mentira e o segredo são muito semelhantes. E todos nós (acredito eu) temos mentiras e segredos.

E só nós sabemos como é lidar com eles. A frustração, a angústia, o receio de ser posto em causa

e o dilema de ser confrontado, em milésimos de segundo, com uma situação de hipotética revelação

do segredo ou continuação da defesa dessa realidade interior. Ou ainda a angústia da situação em

que é pretendido desvendar-se o segredo, mas existem fortes razões que não o permitem.

A minha intenção passa por analisar como são tratadas essas situações em diferentes filmes, cada

um dos seus intervenientes e a própria audiência. Como é transposto para o cinema o conjunto de

emoções e sentimentos que invadem um indíviduo enquanto esconde um segredo, bem como o

indivíduo que sente algo a ser-lhe ocultado. E ainda a moral e as consequências dessa decisão, que

nos levam a esconder factos tão facilmente, por vezes, e de maneira tão sofrida, noutras tantas.

Além disso, como manobra terapéutica, exploro estes fortes sentimentos que advém de todas as

difíceis situações de segredo que já passei, ainda que adopte claramente uma posição impessoal.

Espero poder também contribuir para outros que sintam de alguma forma empatia e compaixão

pelos intervenientes da história e, de forma humilde e sincera, gostaria que este olhar servisse de

introspeção e auto-avaliação das próprias decisões futuras em episódios de mentiras e segredos.

Page 8: Do Cinema ao Segredo · Como parte integrante do estudo central teórico, serão aprofundadas diferentes representações do segredo em diversas histórias. Como é trabalhado este

5

Através deste foco mais profundo e conciso, posteriormente sintetizarei as diferentes técnicas

utilizadas e colocarei paralelamente ao meu filme. Desta maneira, não só consigo adquirir um maior

leque de ideias, como posso adaptar uma das técnicas que faça mais sentido para mim e para a

história

A decisão do formato de produção de uma curta-metragem foi tomada de uma maneira muito

natural. Sempre tive uma paixão pelo cinema e sonhei um dia estar sentado numa grande sala,

rodeado de pessoas influentes da arte a visualizar um filme da minha autoria. Mas quando

finalmente comecei a fazer cinema, percebi algo um pouco diferente.

A fase de planeamento e pré-produção, apesar de muito trabalhosa, é ainda mais entusiasmante, já

que engloba a fase de construção do filme, onde tudo é possível e imaginável. O filme perfeito é

planeado e as ideias são todas consideradas. Mais tarde, no final do projecto, quando é visto o

resultado pela primeira vez, é gratificante materializar todo o esforço e dedicação, todos os meses

de preparação numa determinada duração de imagens em movimento.

Contudo percebi que a fase mais apaixonante desta relação com o cinema é a fase das próprias

rodagens. A ansiedade e o nervosismo aglomerado da pré-produção antecipa o extâse das

filmagens. Mas assim que o set está montado e a “película a rodar”, uma estranha sensação de

conforto e simultâneamente adrenalina invade qualquer receio. A pura diversão toma conta da

concentração e os takes são às dezenas. E com a oportunidade proporcionada pela Universidade,

optei por sentir esta satisfação uma vez mais e produzir uma curta-metragem que podesse conter

um segredo na sua narrativa, de forma a aplicar uma determinada maneira de representar o segredo

no cinema.

Page 9: Do Cinema ao Segredo · Como parte integrante do estudo central teórico, serão aprofundadas diferentes representações do segredo em diversas histórias. Como é trabalhado este

6

QUESTÕES DE INVESTIGAÇÃO

Como um realizador, no seu papel criativo, conta um segredo dentro de um segredo?

Como vai ele/a, usando as suas ferramentas técnicas e conceptuais, contar uma história à sua

audiência, que inclua informação muito importante, mas que nem todas as personagens a

conheçam? Por vezes, informação que nem a própria audiência adquiriu?

Será explícito e directo na abordagem, ou poderá ser mais subtil na maneira como se refere ao

segredo?

Onde é colocada a sua audiência? É omnipresente conhecedora de tudo, ou é colocada a par das

personagens que procuram desvendar o segredo?

METODOLOGIAS

Tal como já referi anteriormente, a metodologia que me proponho a abordar é “O papel dos objectos

no cinema”, desenvolvida por Ranira Gambarato (. Porém, antes de explicar o motivo da minha

escolha, começo por justificar a razão de não ter optado pelas outras metodologias.

Análise de Conteudo

Método quantitativo para análise de material qualitativo.

À partida, tratando-se de uma análise rigorosa, científica e seguindo diversas regras, a Análise de

Conteúdo não será a mais adequada para aplicação sobre uma obra de arte. Apesar de podermos

atingir resultados interessantes através desta metodologia, enquanto estudante de arte, existem

Page 10: Do Cinema ao Segredo · Como parte integrante do estudo central teórico, serão aprofundadas diferentes representações do segredo em diversas histórias. Como é trabalhado este

7

muitos outros aspectos importantes que são ignorados, como a subjectividade de cada um e os

contributos sensoriais e emocionais da obra a ser analisada.

Mais especificamente, para o meu caso, o estudo do segredo no cinema não deve ser analisado

quantitativamente, já que em casos como Oldboy (Park Chan-wook, 2003) o segredo é uma parte

fundamental da narrativa mas é apenas expressa uma única vez, no final do filme.

Análise de Discurso

O discurso é caracterizado pelo conjunto de afirmações que estruturam a maneira como se pensa

sobre algo e como se actua em função desse pensamento.

Esta metodologia também poderia ser uma hipótese a aplicar no meu caso, já que possibilita uma

análise do segredo de uma forma eclética, recorrendo a intertextualidade. Conseguiria obter várias

perspectivas, não só dos intervenientes numa determinada situação de segredo, mas de várias outras

situações em diferentes contextos.

Porém, o problema reside mesmo nesses textos, nessas fontes. Mesmo quando o segredo é o centro

do diálogo, este nem sempre o refere, ou seja, o texto no qual está latente um segredo, não discursa

sobre o segredo enquanto conceito. Teria muitas situações de discursos onde há um segredo, mas

teria pouca matéria para o trabalhar.

Análise Crítica do Discurso

A crítica como momento de investigação, como análise das contradições nos discursos, é orientada

para a resolução de problemas sociais concretos.

Também poderia adoptar esta abordagem da crítica ao discurso se fosse interessante analisar o

discurso moral, religioso, ético, político, cultural e social de agentes-chave no discurso do segredo.

Seria uma metodologia adequada se o meu objectivo passasse por desmontar esses discursos, por

vezes falaciosos, da temática da mentira, do oculto, da confidência.

Page 11: Do Cinema ao Segredo · Como parte integrante do estudo central teórico, serão aprofundadas diferentes representações do segredo em diversas histórias. Como é trabalhado este

8

Mas ainda assim, não é essa a abordagem que tenho interesse em tomar. Pretendo focar a luta

interna, o conflicto entre dois intervenientes, a situação do segredo em si e como esse é trabalhado

no cinema, não o discurso sobre este.

Análise Etnográfica e de Audiências

Esta metodologia estuda a aplicação da cultura popular na satisfação de necessidades de cada

indivíduo. Propõe-se a investigar um determinado tópico no seio de uma, relativamente, pequena

amostra de indivíduos, através da observação, participação, entrevistas, sondagens, etc.

Esta metodologia seria a minha escolha alternativa, já que me interessa também a análise do

segredo associada a diferentes grupos sociais, sejam eles diferenciadados por gerações, geografia,

classes sociais, grau de proximidade, etc. Como é perceptível nos exemplos que me propus a

estudar, o segredo é tratado de diferentes maneiras quando circula em meios de alta classe, como

Stoker (Park Chan-wook, 2013) e Eyes Wide Shut (Stanley Kubrick, 1999), e noutros meios mais

populares, como Just le fin du monde (Xavier Dolan, 2016) e I, Tonya (Craig Gillespie, 2017). Tal

como seria interessante, também estudar as reacções e opiniões de diferentes grupos de audiências

quando confrontados com o visionamento de uma situação de segredo, numa posição próxima da

sua situação social ou completamente distante.

Ainda assim, este caminho continua a não ser o mais motivante. Eu tenciono explorar a arte do

esconder e a sua representação, o seu núcleo central, como é transmitida essa ideia. Que metáforas,

que elipses, que técnicas e práticas estão associadas ao segredo, dentro de um filme.

Metodologia escolhida: Análise dos objectos no cinema

Eisenstein refere muitas vezes como os objectos no cinema ajudam a influenciar a percepção da

audiência de acordo com os propósitos do realizador (Eisenstein, 1991, p.22). Alain Fleischer

coloca o objecto numa posição fulcral para a progressão da narrativa, é o objecto que vai despoletar

a demanda do personagem (Fleischer, 2004, p.87-103).

Page 12: Do Cinema ao Segredo · Como parte integrante do estudo central teórico, serão aprofundadas diferentes representações do segredo em diversas histórias. Como é trabalhado este

9

Gambarato vem introduzir, pela primeira vez, um método de análise do papel dos objectos no

cinema através de parâmetros quantitativos e qualitativos (Gambarato, 2010, p.107). A autora

procura destacar a relevância de diferentes objectos e como os realizadores a expressam, como

comunicam determinada ideia usando o respectivo objecto. Enumera então alguns critérios que

devem ser aplicados. Os critérios de relevância, expressividade e funcionalidade.

Desta forma, os objectos podem adquirir diferentes facetas. Conseguem transparecer o estado de

mente de uma personagem, seja por métodos explicítios ou implícitos. Representam uma ideia e

ainda “traduzem-na” para uma linguagem universal (Gambarato, 2010, p.106).

No meu caso, o meu “objecto” de estudo não se insere completamente no campo dos objectos

estudados por Gambarato. Ainda que se possa denominar de “objecto”, eu focar-me-ei num objecto

conceptual, abstracto, mas que, apesar de não se integrar totalmente nos objectos de Gambarato,

insere-se em algumas categorias desta metodologia. Mais concretamente, será uma adaptação da

Análise de objectos no cinema, de objectos físicos do quotidiano, para um objecto conceptual, o

segredo.

Desde dos pioneiros aos contemporâneos, vários realizadores usaram objectos como forma de

representação de uma ideia. Um relógio representando a passagem do tempo, a porta como

travessia para o outro lado, o espelho como um olhar introspectivo, etc.

Tal como na poesia, o cinema, como obra de arte, não retrata os seus temas de maneira directa, ou

seja, as ideias e intenções do realizador são passadas subtil e implicitamente. Tal poderá surgir da

quantidade de dados que o cinema partilha com o seu espectador. Enquanto a música transmite

ideias e emoções apenas através de som e texto, a fotografia através de imagem, e a literatura

apenas texto. Um leitor ou um ouvinte de música possui uma maior “liberdade imaginária” que um

espectador de cinema, envolvido em texto, imagem e som.

Por opção estética e artística, mas também pela vontade em criar narrativas interessantes e

apelativas, alguns cineastas começaram a recorrer a metáforas, comparações, ligações entre

diferentes campos semânticos para articular as suas história. Mas essas ligações nem sempre

procuram ser óbvias e racionais.

Page 13: Do Cinema ao Segredo · Como parte integrante do estudo central teórico, serão aprofundadas diferentes representações do segredo em diversas histórias. Como é trabalhado este

10

Um dos grandes cineastas que usa intensivamente os objectos, significados e símbolos, metáforas

e analogias, é o americano David Lynch. Os seus filmes conseguem transparecer diferentes ideias

e emoções usando objectos banais em contextos e significados alterados.

O segredo como “objecto” do cinema já pode possuir uma utilização. Não se trata necessariamente

de um objecto que significa algo. O segredo já é um significado. É a maneira como cada realizador

representa esse significado que nos traz ideias e emoções diferentes.

Analisarei as características chave que definem a presença de um segredo num filme. Estudarei a

posição da audiência em relação ao conhecimento do segredo e à aproximação da personagem

principal. Como é introduzido o segredo na narrativa, qual a sua importância e o seu impacto. As

técnicas de montagem e de som associadas. As pistas apresentadas e a sua credibilidade. E o

resultado da revelação do segredo para todas as personagens.

O segredo pode constituir uma parte da narrativa, sendo apenas mais um objecto trabalhado pelo

autor, trazendo mistério e dinâmica ao filme, suspense e alguma interação da audiência. Pode ser

um objecto desnecessário ao filme, no qual a narrativa poderia ser contada sem esse recurso. Neste

caso, podemos observar o segredo de um ponto de vista mais superficial e relacionado com o

entretenimento. Possui geralmente uma representação clássica onde a audiência é detentora de toda

a informação, ao contrário das personagens (método muito utilizado em novelas e séries

televisivas)

Mas também se encontram narrativas onde o segredo está incluído na sua essência, onde a história

trata o próprio segredo como parte integrante. É geralmente nestes casos que a criatividade de cada

realizador é trabalhada, bem como a interação com a audiência. Aqui, o “objecto” do segredo ganha

uma dimensão cinematográfica tal, que todos os outros objectos do filme remetem para este. O

segredo vira o filme e o filme é o próprio objecto trabalhado em si.

De uma forma igualmente válida, também pode ser considerada uma narrativa em que não será

necessário o recurso ao segredo, em que o realizador decide contar a sua história como uma simples

narrativa linear, como se um narrador apresentasse cada acontecimento de uma forma sequencial e

clara. Mas a inclusão do segredo abre as portas a uma diferente abordagem, para um filme diferente

que origina uma experiência da audiência igualmente diferente.

Page 14: Do Cinema ao Segredo · Como parte integrante do estudo central teórico, serão aprofundadas diferentes representações do segredo em diversas histórias. Como é trabalhado este

11

ESTADO DA ARTE

O cinema usa com frequência o factor “tensão” na audiência. Nomeadamente nos filmes de terror,

o que não é mostrado, o fora-de-campo, é presumido. Esta característica cria uma tensão no

espectador que aguarda a qualquer momento o impacto de uma aparição.

Um segredo confidenciado funciona de forma semelhante. No momento em que a audiência

conhece o segredo, surgem várias situações de tensão das quais se pode esperar um confronto a

qualquer momento. Mas tal como no terror, essas situações são trabalhadas de maneiras diferentes

em cada filme. E, dependendo da história e do realizador, o espectador pode também tomar várias

posições. Em filmes como Just la fin du monde, a audiência conhece o segredo a partir do início e

permanece constantemente aguardando a sua revelação. Noutros filmes como Stoker, a audiência

vai conhecendo a verdade simultâneamente com a personagem principal.

No cinema clássico americano, em cumplicidade com a literatura e o teatro, a audiência era

detentora de toda a informação, o espectador geralmente passava por todas as cenas importantes

para perceber claramente a narrativa. Desta forma, os segredos seriam sempre expostos à audiência,

restando-lhe apenas aguardar o confronto.

No cinema contemporâneo, algumas partes da narrativa começaram a ser deliberadamente confusas

ou mesmo ocultas à audiência. Alguns realizadores optam por dar uso a diversas técnicas

cinematográficas para realçar o segredo no meio da narrativa, como a música ou a montagem. Este

é o facto que permite o papel mais interactivo da audiência. Não só assiste, como também pensa,

deduz, raciocina e tira conclusões que, posteriormente, pode verificar a sua veracidade.

Após uma pesquisa acerca de artigos publicados relevantes ao estudo do segredo e da sua

representação, os resultados foram escassos. Existem várias obras relativas às diferentes

representações de géneros, de raças, de profissões, mas não foi encontrado nenhum estudo em que

o segredo fosse o principal foco. Apenas uma obra referente, de alguma forma, à relação entre o

segredo e a narrativa: The Genesis of Secrecy on the interpretation of narrative, Frank Kermode

(1979). Ainda que seja um pouco ambígua e distante do meu foco mais condicionado.

Page 15: Do Cinema ao Segredo · Como parte integrante do estudo central teórico, serão aprofundadas diferentes representações do segredo em diversas histórias. Como é trabalhado este

12

É, pois, um estudo muito específico de um objecto maioritariamente usado como ferramenta para

alcançar um resultado. Seria como um carpinteiro estudar exactamente o que é uma espátula e não

o resultado que obteve ao utilizá-la. Mas podem ser tiradas algumas conclusões se o carpinteiro

estudar diferentes peças de madeira que foram trabalhadas com diferentes espátulas.

Desta forma, como estudo do estado da arte, proponho-me a analisar 5 filmes, de diferentes

realizadores e épocas, que tratam o segredo/mentira/rumor popular também de diferentes maneiras.

Alguns destes filmes foram escolhas minhas de visualizações prévias e que considerei bastante

relevantes para o meu propósito. Outros filmes foram sugestões de pessoas que conheciam a minha

intenção e proposeram correctamente os títulos. Optei por filmes de diferentes décadas para uma

análise mais rica do ponto de vista das inovações técnicas e da imersão narrativa. Pela mesma

razão, também decidi optar por realizadores de diferentes nacionalidades e culturas, de modo a

estudar a transversalidade da representação do segredo, as semelhanças e diferenças entre eles,

comparadas com os seus contextos sociais. Para me auxiliar nessa análise e reflexão, baseio-me na

já referida metodologia de análise cinematográfica: O papel dos objectos no cinema, de Renira

Gambarato (2010).

1 - Começemos por um clássico de um dos maiores mestres do cinema mundial, Eyes wide shut

(Stanley Kubrick, 1999). Podemos considerar este um filme com alguns aspectos clássicos e

revolucionários do ponto de vista do trabalho do realizador no segredo. Temos situações em que o

segredo é-nos revelado enquanto é narrado e outras onde a suposição do espectador faz parte da

interpretação diferente de cada um.

O casamento e traição começam por ser introduzidos no início de forma misteriosa e através de um

jogo de metáforas. Uma das personagens que esconde um segredo olha-se ao espelho, como se o

seu reflexo a julgasse. Por momentos, sente-se um confronto entre a personagem e o seu reflexo,

sobre a revelação ou continuação de ocultação do segredo.. Quando o segredo é revelado, o tom

do filme fica claramente mais sério e surge uma música tensa de fundo, enquanto a cara do receptor

do segredo é focada na sua expressão de surpresa e confusão. Neste momento, a audiência empatiza

com o receptor e toda aquela informação é novidade.

Page 16: Do Cinema ao Segredo · Como parte integrante do estudo central teórico, serão aprofundadas diferentes representações do segredo em diversas histórias. Como é trabalhado este

13

Mais tarde, quando é contado outro segredo ao personagem principal, mas por outra personagem,

a audiência, tal como a personagem principal, é conhecedora de alguns pontos e apenas necessita

conectá-los. Mas nem tudo parece ser verdade, e o realizador opta por esse discurso

propositadamente dúbio para uma verdade menos clara.

No final, quando uma das personagem descobre a máscara da personagem principal, a audiência

pode antecipar o confronto. Mas Kubrick opta por nem incluir essa confissão no filme, mostrando

que isso não importa.

2 – Outro filme que explora igualmente duas facetas diferentes da inovação do segredo no cinema

é Stoker (Park Chan-wook, 2013). O realizador coloca-nos na pele de uma jovem personagem que

pouco desconfia o que está para acontecer. A audiência segue cada passo a seu lado, sentindo o

suspense e mistério com a progressão da narrativa. Esta confusão e desconfiança vai aumentando

consoante o descobrimeto de novas pistas. Mas mesmo a veracidade destas é posta em causa através

de uma edição brusca e não linear que baralha o espectador.

Mais uma vez, é focada a expressão facial do mentiroso quando questionado, sugerindo algo de

estranho para a audiência, fazendo-a duvidar da personagem.

Alguns elementos externos como a personagem da tia e as cartas descobertas dão origem a outras

pistas confusas acerca da verdade escondida.

Tudo culmina num momento de elucidação e confissão total, recorrendo a um flashback, para que

a personagem principal, juntamente com a audiência, compreenda todo o segredo.

3 – Num estilo mais independente e vanguardista, Vinterberg trabalha também o segredo e o seu

poder no cinema, com o filme The Celebration (Thomas Vinterberg, 1998). Como um dos filmes

pertencentes ao famoso grupo de cineastas dinamarqueses Dogma 95, gira em torno das

performances e diálogos, trabalhando pouco os aspectos mais técnicos.

De início, mesmo seguindo a personagem principal, não são dadas pistas sobre a revelação do

segredo, a audiência é surpreendida tal como todas as outras personagem. Alguns detalhes subtis,

Page 17: Do Cinema ao Segredo · Como parte integrante do estudo central teórico, serão aprofundadas diferentes representações do segredo em diversas histórias. Como é trabalhado este

14

como a personagem pensativa ou o facto de olhar com desdém sobre a personagem do pai, podem

antecipar algum confronto.

Quando é revelado o segredo, nenhuma personagem acredita, o que também causa alguma

confusão ao espectador. Mas a personagem principal volta a revelar outro segredo e as reações

começam a indicar alguma credibilidade. Mesmo quando confrontado por todos os outros

personagens, o filho, personagem principal, continua a defender a sua verdade. Á medida que mais

verdades vão sendo reveladas e a credibilidade do filho aumenta, o caos vai sendo instaurado e a

audiência, tal como o resto dos convidados, abandona toda a empatia pela personagem do pai.

No final, o pai admite tudo e o filho permanece pensativo, como se estivesse arrependido de ter

revelado o segredo.

Para os dois últimos filmes, decidi escolher um cinema mais recente.

4 – Um dos grandes destaques desta década como jovem realizador, Xavier Dolan, fez um filme

sobre um segredo que nunca chegou a ser revelado, Just la fin du monde (Xavier Dolan, 2016).

O filme inicia-se com a personagem principal a anunciar o segredo à audiência e a revelar que

deseja anunciá-lo aos restantes personagens.

Em todos os momentos em que é colocada a questão acerca da razão da visita, música não-diegética

é introduzida, camâra lenta, pormenores da expressão da personagem principal são focados. O

realizador leva-nos ao íntimo da personagem, ao seu espaço introspectivo que só o espectador e a

própria personagem conhecem, quando parece existir, por momentos, uma consideração sobre a

revelação do segredo. O tempo passa a ter um peso ofegante sobre o filme.

Existem algumas elipses que levam a audiência a questionar o que terá sido falado. Tudo isto serve

para a construção do climax do filme, quando surgem várias questões e confusões que deixam

alguns assuntos em aberto.

No final, o segredo nunca foi revelado directamente, mas algumas pistas deixadas conceptualmente

dão a entender uma cumplicidade entre o segredo, as personagem que o conhecem e a audiência.

Page 18: Do Cinema ao Segredo · Como parte integrante do estudo central teórico, serão aprofundadas diferentes representações do segredo em diversas histórias. Como é trabalhado este

15

5 – Por fim, escolhi um filme que nos traz uma história real mas com diferentes versões: a versão

da heroina Tonya, a versão do seu marido Jeff e a versão dos Media. O filme é I, Tonya (Craig

Gillespie, 2017). De todos os filmes analisados, este é o que se assemelha mais ao meu projecto

por duas razões. Primeiro, a audiência é colocada numa posição em que não consegue concluir

nada com certeza. E segundo, existe uma mistura homogénea entre segredo, mentira e rumor

popular.

O segredo começa por ser apresentado sob a forma de notícia nacional, com uma linguagem

documental a orientar entrevistas entre os intervenientes da história. Cada um conta a sua versão,

iniciando a confusão que se estabelece durante todo o filme.

A audiência é omnipresente, ou seja, está sempre no acontecimento. Contudo, não pode tirar

conclusões finais, pois os próprios dados fornecidos no filme são confusos. Como exemplo, uma

das personagens a meio do filme diz: “Esta próxima parte não é verdade”. Isto indica ao espectador

que, na versão daquela personagem, aquele facto não aconteceu. Mas isso é apenas na versão

daquele personagem em específico. Ou pode também signifcar que acontece, mas a personagem

prefere pensar que não.

Numa das cenas do filme, um criminoso agride uma patinadora e foge. Mas, mais tarde, a nossa

personagem principal acusa o marido de o ter feito e este reage mal. Ou seja, nas imagens vemos

A acontecer, mas, posteriormente, as personagem discutem sobre se foi A mesmo o que aconteceu,

ou se foi B.

Ao longo de todo o filme são partilhadas confissões de acontecimentos passados que nem sempre

correspondem de forma coerente em todas as versões de cada personagem. A própria audiência da

historia verídica nunca soube ao certo o que se passara. E o espectador do filme, à sua semelhança,

também carece de factos suficientes e credíveis que possam aferir exactamente o que se passou.

Mas o filme não se propõe a esclarecer ninguém. Envolvendo todos esses diferentes rumores sobre

a história verdadeira, o filme retrata a luta das personagens dentro da sua própria vida privada,

popular e social. Sem menosprezar a verdade do que aconteceu, I, Tonya segue a história da

protagonista independentemente.

O filme é terminado com a frase: “Todos têm a sua própria verdade e a vida faz o que lhe apetece”

Page 19: Do Cinema ao Segredo · Como parte integrante do estudo central teórico, serão aprofundadas diferentes representações do segredo em diversas histórias. Como é trabalhado este

16

RELATÓRIO

Ainda que a parte teórica do cinema, à semelhança de todas as outras formas de arte, seja bastante

importante para o desenvolvimento do próprio formato, são os trabalhos práticos que o

exemplificam. A teoria constitui a base onde a prática assenta. Desta forma, desde do início do

mestrado, e como já foi referido na motivação pessoal, sempre foi minha intenção produzir uma

curta-metragem como resultado final.

Sendo meu o conceito e a intenção e querendo praticar a minha aptidão para realizar, foi-me

incutida, naturalmente, a tarefa de pensar a história e escrever o guião. Além disso, por razões

organizacionais, acabei por assumir também o papel de Produtor Executivo. Sendo um trabalho

individual no seio do mestrado, tive de reunir uma equipa de produção constituída por amigos e

voluntários da universidade que ofereceram o seu tempo livre para me auxiliar na produção, mas

sendo eu o coordenador geral das tarefas.

Explorando o campo da dôr e do sofrimento que envolve uma mentira, cheguei à sua forma mais

profunda, a privação da verdade e/ou revelação de uma realidade diferente da que é conhecida.

Esta conclusão aproximou-me também de uma outra parte integrante da nossa sociedade, o rumor

popular, o mexerico, “diz-se”, que muitas vezes envereda por esta vertente de revelar uma realidade

um pouco diferente daquela que foi recebida previamente. E pareceu-me interessante associar esta

nova perspectiva também à minha narrativa. Deste modo, aglomerando estes aspectos num só,

alcancei o meu objecto de estudo final, o segredo. Este esclarecimento conclusivo ajudou-me a

contextualizar o mote da história e a desenvolver a narrativa num sentido.

Novamente, tomando como base a minha motivação, tive a intenção de explorar uma história onde

a mentira fosse parte integrante da narrativa. Mas não procurava uma mentira simples, tencionava

encontrar uma situação em que poderia ser legítimo, independentemente do ponto de vista, mentir.

Procurava um episódio em que não fosse tão claro para o espectador condenar a mentira como algo

moral e eticamente errado. Não queria abordar o típico conflicto entre amantes nem entre relações

paternais. Então, decidi optar por uma ligação familiar igualmente forte onde a mentira podesse

provocar pesadas consequências nos seus intervenientes: a relação entre irmãos. Optei por dois

irmãos masculinos pois é um ponto de vista que, obviamente, domino melhor e também pareceu-

Page 20: Do Cinema ao Segredo · Como parte integrante do estudo central teórico, serão aprofundadas diferentes representações do segredo em diversas histórias. Como é trabalhado este

17

me adequado ao âmbito da história, ter dois indivíduos do mesmo sexo para contrastar entre

semelhanças e diferenças. E o assunto da mentira teria de ser algo muito importante para os dois

irmãos, algo que levaria um irmão a mentir ao outro mas por motivos de sacrifício, por esconder

uma situação em prole de protecção. Uma mentira legítima.

Rapidamente surgiu a figura maternal como fonte de elevada importância para os dois irmãos e

ainda como provocadora de igual sofrimento. Algo relacionado com a morte da mãe poderia

despoletar uma mentira muito forte entre os irmãos. E, assim, a narrativa foi sendo construída em

volta desta premissa inicial. A história moldou-se numa mentira que o irmão mais velho contou ao

mais novo para protegê-lo de sentimentos de culpa.

Sinopse Inicial: A história envolve-se em torno de 3 personagens: dois irmãos, Vítor (honesto),

Filipe (mentiroso) e a sua mãe Margarida. Vítor volta a casa para encontrar a sua mãe muito doente

enquanto Filipe trata dela. A mãe começa a alucinar e não quer viver mais. Numa manhã, Vítor

descobre a mãe morta. Filipe parece esconder algo que Vítor não sabe. Mesmo depois de este

insistir, Filipe parece mentir na sua resposta. Vítor acusa Filipe de ter morto a mãe pela ganância

da sua miserável herança, os irmãos discutem, ambos deixam a cidade e a sua relação para trás por

uma briga sobre verdade e mentira.

Com o contributo fundamental do meu orientador, vogal e algumas pessoas próximas, a história

foi crescendo, adquirindo alguns detalhes que naturalmente funcionavam para alimentar a premissa

inicial. Alguns pormenores foram adicionando mistério em volta da condição da mãe e acentuando

a culpa do irmão mentiroso. Além disso, surgiu a história secundária do casal que abordava a ideia

da exploração do rumor popular. Trata-se de uma história paralela que inicia e finaliza o filme, mas

que vai sendo referenciada pelo meio em tom de rumor. Tom esse que é usado no final do filme

quando o casal se refere à história principal.

Enquanto a história dos irmãos continuava a ganhar coesão, senti necessidade de desenvolver a

doença da mãe e o seu historial. Procurei doenças que podessem acrescentar mais drama à narrativa

com períodos de delírio. Optei por uma doença oncológica, um tumor cerebral, que justificaria os

momentos de lucidez e outros de paranóia e, além disso, é uma patologia que pode provocar morte

repentina, trazendo alguma credibilidade à hipótese de morte natural.

Page 21: Do Cinema ao Segredo · Como parte integrante do estudo central teórico, serão aprofundadas diferentes representações do segredo em diversas histórias. Como é trabalhado este

18

Para acentuar esta dualidade entre as personagens dos irmãos e as diferentes emoções relacionadas

com quem emite e quem recebe a mentira, pensei em dividir o filme em duas partes, com cada uma

delas focando cada irmão. Este aspecto é fundamental para o filme, mas também para a forma como

abordo o segredo. A ideia principal é guiar o público entre as sensações de cada personagem, de

cada lado da mentira, mas sem focar o próprio assunto da mentira. Ou seja, a minha própria

expressão do segredo no cinema pretende centrar as fortes emoções de cada interveniente, deixando

o conteúdo da mentira para segundo plano. Esta opção estética da narrativa está fortemente

relacionada com o objecto de estudo da tese.

Desta forma, inicialmente seguimos o irmão mais novo e a sua descoberta da situação em que se

encontra a familía, com alguns detalhes escondidos da cumplicidade entre o irmão mais velho e a

mãe doente. No centro do filme está o momento da inesperada morte da mãe. Na segunda metade,

o filme foca-se no irmão mais velho que sofre duplamente com a perda da mãe e acusação de ser

o responsável pelo que se sucedeu.

Noutros detalhes estéticos, a própria côr e música que envolve cada irmão é diferente. O irmão

mais novo é envolvido em tons mais quentes e nostálgicos, enquanto o irmão mais velho carrega

tons mais pesados e frios. Mais um detalhe cinematográfico que ajuda a acentuar as duas diferentes

partes do filme e relaciona-se com as emoções sentidas por cada personagem.

A opção de planos maioritariamente fechados na cara dos personagens é simultâneamente

propositada, mas também forçada. Como grande referência estética, o filme James White (Josh

Mond, 2015) capta muito bem a componente psicológica interna do personagem principal ao

evidenciar as suas expressões faciais em grande plano e com uma câmara ao ombro muito orgânica

e viva, seguindo cada situação muito próxima do personagem. É perceptível para o espectador não

só o que é facilmente lido nas expressões externas, mas também é fortemente subentendido as

próprias emoções que o personagem tenta esconder internamente. E este formato robusto adaptava-

se perfeitamente à minha intenção narrativa. Outra consequência relevante desta opção é o facto

de usar planos muito fechados na casa, acentuando a claustrofobia e a sensação de não haver opções

optimistas para o futuro da família. Por outro lado, tendo um espaço bastante reduzido para filmar

e curto tempo para a direcção de arte trabalhar, estes planos fechados eram a melhor opção para

evitar mostrar a totalidade do espaço.

Page 22: Do Cinema ao Segredo · Como parte integrante do estudo central teórico, serão aprofundadas diferentes representações do segredo em diversas histórias. Como é trabalhado este

19

Ainda outro pormenor técnico que evidencia as duas diferentes histórias são os movimentos de

câmara. Na história principal temos um estilo orgânico com câmara ao ombro, e na história paralela

do casal, temos uma câmara mais estável no tripé ou na dolly.

Tratando-se de uma história muito real e concreta, com personagens de traços muito humanos,

procurei também um cinema nesse sentido. Pensei então em reunir uma pequena mas versátil

equipa que conseguisse dirigir, procurando focar-me mais na performance dos actores e deixar para

segundo plano pormenores técnicos. Com a adição de alguns elementos de produção a equipa

cresceu e chegámos a contar com vários assistentes que não tinha considerado inicialmente. Mas,

por destino, ou pela clássica fatalidade do cinema, poucos dias antes das rodagens, vários elementos

da equipa viram-se forçados a abandonar o projecto, voltando a contar com uma pequena produção,

tal como tinha planeado de início.

A pré-produção do filme foi um pouco atribulada. Inicialmente, contactei duas pessoas que me

afirmaram estar aplicadas em apoiar, mas que acabaram por nunca demonstrá-lo. Contactei então

alunos da universidade, dos quais voluntariaram-se nove. Alguns mantiveram-se, outros desistiram

a meio. Com cerca de mês e meio de antecedência das rodagens, contava com uma equipa bem

composta e a maioria dos locais garantidos. E este estado manteve-se até uma semana antes das

rodagens. Em primeiro lugar, o assistente de realização teve de abandonar o país. Depois foram

alguns assistentes de som, imagem e produção. E, por último, o maior obstáculo da pré-produção

surgiu quando a dona da casa onde estavam já todos os detalhes confirmados, contactou a produção

para avisar que já não podiamos filmar no local. Felizmente, a excelente equipa de produção

conseguiu rapidamente encontrar uma nova casa, muito menor e sem aparência de casa. Este facto

não só obrigou a equipa de arte a reconsiderar tudo, como obrigou-me a repensar todos os planos,

movimentos de câmara, de actores, de décors, etc. Tudo isto quatro dias antes do início das

rodagens.

Ainda que esteja muito orgulhoso e grato pela minha equipa, pelo seu esforço e dedicação e

reconhecendo o excelente trabalho que realizaram dentro das condições apresentadas, sinto que o

filme possa ter perdido algo com esta forçada alteração de última hora. Alguns planos e ideias de

movimento alteraram-se improvisadamente e talvez tenha afectado o produto final.

Page 23: Do Cinema ao Segredo · Como parte integrante do estudo central teórico, serão aprofundadas diferentes representações do segredo em diversas histórias. Como é trabalhado este

20

Sem ser inesperado (ou não fosse este o ramo do cinema), ainda surgiram vários obtáculos durante

as rodagens. Entre eles, uma quase expulsão do IPO onde tinhamos algumas cenas para filmar,

faltaram alguns props importantes em algumas cenas e algum som teve de ser recuperado em pós-

produção. Contudo, a adrenalina, a emoção e o êxtase de estar em rodagens tornaram todos estes

problemas em algo insignificante perante toda a magia de fazer cinema. Como é frequente, também

houve alguns pontos do guião que foram ligeiramente alterados nas rodagens. Alguns menos

intrusivos como pequenas mudanças de falas propostas pelos actores. Outros mais

comprometedores que me fizeram repensar a história e o seu seguimento. E, como também é muito

frequente, o tempo voltou a ser inimigo da quantidade de planos filmados por cena.

Foi também na demorada pós-produção que o filme foi-se moldando de uma maneira mais afastada

daquela pensada no guião. Ainda assim, inicialmente, a premissa seria montar o filme completo,

com todas as cenas filmadas tal como previsto no guião. E, posteriormente, consoante o

desenvolvimento natural da montagem, haveria uma segunda versão mais curta que se focaria na

narrativa do filme, sem forçosamente ligar-se à premissa considerada pela narrativa do guião.

Page 24: Do Cinema ao Segredo · Como parte integrante do estudo central teórico, serão aprofundadas diferentes representações do segredo em diversas histórias. Como é trabalhado este

21

CONTRIBUTO

Tendo em conta o formato optado para a tese, os resultados prendem-se com a versão final do

filme. Apesar do estudo aprofundado do segredo em diversas obras e do olhar crítico focado nas

suas representações, o contributo desta tese gira maioritariamente em torno da curta-metragem e

da consequente influência que o estudo teve no seu planeamento narrativo. Como tal, esta última

parte do relatório técnico, apoiar-se-á nas conclusões retiradas da montagem final do filme.

Inicialmente focarei-me nas minhas próprias conclusões relacionadas com o planeamento do filme

e com a sua eventual produção e montagem. E posteriormente, como referência de visualizações

de alguns espectadores, construirei uma reflexão geral da pequena amostra de comentários sobre o

filme e a envolvência da audiência com o segredo.

Este segundo ponto será essencial nas conclusões da tese, pois a própria representação do segredo

está fortemente ligada à experiência da audiência e ao nível de conhecimento que é apresentado no

filme. Alguns pontos mais claros, outros mais ocultos, proporcionam ao espectador diferentes

campos de conhecimento da informação disponível no filme. Tal é observável na própria análise

ao Estudo da arte, onde diferentes filmes me proporcionaram diferentes percepções acerca da

informação assimilada. E, certamente, para outro espectador, essas percepções teriam uma

diferente interpretação. Mas devemos admitir que a decisão da representação do segredo por parte

do realizador, envolve-nos num mesmo mistério, numa busca semelhante pela conclusão, pela

descoberta dos detalhes ocultos.

Dessa forma, a conclusão deverá ser suficientemente geral para abranger a maioria da audiência. E

assim, conseguirei obter uma conclusão mais fiel sobre o resultado que espero nas reacções do

espectador, sendo este mais, ou menos, aproximado do especulado.

Seguirei então com a minha visão pessoal do filme. Como resultado final da montagem, surgiram

então as duas versões ligeiramente diferentes. A primeira versão tem aproximadamente 19 minutos.

A versão longa contém quase todas as cenas do guião e transmite uma ideia mais fiel à premissa

inicial, com pormenores que ajudam a perceber a omissão de algo a Vitor, ajudam a traçar um perfil

mais nítido de Filipe e, tendo em consideração o trabalho desta tese, adiciona alguns elementos que

Page 25: Do Cinema ao Segredo · Como parte integrante do estudo central teórico, serão aprofundadas diferentes representações do segredo em diversas histórias. Como é trabalhado este

22

contribuem para a prentendida especulação do espectador em relação ao segredo que não se revela

no filme.

A versão mais curta, com 15 minutos, funciona melhor como filme, mas a ausência de alguns

elementos pensados no guião, transforma um pouco a minha intenção de expressão do segredo e a

questão da mentira legítima. Ou seja, existem menos pistas e dicas para o espectador tirar as suas

conclusões. Contudo, o segredo continua a ser expresso de uma determinada maneira que suporta

a premissa inicial em seguir as emoções dos irmãos sem revelar o que realmente aconteceu. Coloca-

se o espectador no lugar de observador das atitudes e comportamentos de cada irmão, tirando as

suas próprias conclusões, mas sem saber o que aconteceu na verdade. Assim, o próprio espectador,

ao falar sobre a história, poderá assumir o papel de comentador sem certezas, tal como o casal da

história paralela, interpretando a sua versão, “pintando” tal como os personagens, tal como todos

nós quando partilhamos uma realidade que pode não ser a verdadeira.

Para além deste jogo de certezas e suposições, referindo uma outra parte da minha motivação

pessoal com este projecto, ambiciono colocar a audiência no papel emocional dos personagens,

desconhecendo o segredo, mas, ainda assim, sentindo o que as personagens sentem. Pretendo

colocar o espectador no papel de procura pela verdade e, no momento a seguir, de ocultação da

mesma. Passando momentaneamente pelas fortes tensões emocionais de quem está enquadrado

numa situação de mentiras e segredos.

Como segunda parte desta conclusão, focarei os comentários de espectadores que pouco ou nada

conheciam a história do filme e a sua relação com o segredo oculto.

Com uma amostra de 11 pessoas que assistiram à versão mais curta de 15 minutos, registaram-se

alguns pontos em comum, outros distantes entre si e ainda algumas outras questões levantadas que

não esperaria. Mas facilmente foi notável que a montagem da versão mais curta deixou de parte

alguns detalhes que sugeriam uma linha narrativa mais fiél à ideia inicial. Ainda que esse não tenha

sido obstáculo suficiente para despistar o filme dos seus contornos base.

Passando à descrição dos resultados, todos concordaram que o Filipe (irmão mais velho) matou

realmente a sua mãe. Divergiram sim nas suas intenções. Alguns afirmaram que o Filipe exagerou

na quantidade de calmantes que deu à mãe e matou-a negligentemente. Outros apoiam-se no

argumento que Filipe quis matar a mãe propositadamente para vender a casa e os terrenos. E já que

Page 26: Do Cinema ao Segredo · Como parte integrante do estudo central teórico, serão aprofundadas diferentes representações do segredo em diversas histórias. Como é trabalhado este

23

estava farto da situação, pensou que seria benéfico para todos este desenlace. Mas mesmo tendo

como referência este último caso, é observável uma empatia pelo personagem do irmão mais velho

que levou o espectador a duvidar das suas intenções puramente egoístas e gananciosas.

No caso do irmão mais novo, o Vítor, existe um consenso maior acerca da sua personagem, pois é

a ele que lhe é ocultado o segredo. Alguns espectadores adiantaram que não seria justo o seu

comportamento e atitude perante o Filipe, já que é uma pessoa ausente e que parece apenas

preocupar-se quando volta a casa durante um curto período.

Por fim, outro aspecto relacionado com o primeiro discutido, é a história paralela do casal. Alguns

entenderam a ligação com o primeiro plano, outros não. Mas tendo em conta as referências a esta

história espalhadas ao longo do filme, a cena no quarto do hospital é suficiente para ligar os pontos.

A maioria dos espectadores percebeu então o propósito da colocação desta última cena, construindo

uma metáfora em volta do rumor popular, do boato. Apesar desta conclusão ter sido entendida e a

conexão paralela entre ambas as histórias, a maioria dos espectadores não interpretou a última fala

como sendo também um rumor ao qual não se deve acreditar. Houve uma confiança maior por esta

última descrição, fazendo o espectador acreditar que o Filipe efectivamente “...vendeu a casa e os

terrenos e fugiu com o dinheiro todo para o estrangerio.” Esta observação pode prender-se ao facto

de ser a última fala, de ser a conclusão auditiva do filme e de visualizar em simultâneo o Filipe a

sair da cidade com uma mala circular, que poderia estar cheia de dinheiro.

É, portanto, óbvio que as conclusões esperadas a partir do guião inicial tenham sido um pouco

diversificadas e menos próximas das especuladas.

Algumas cenas iniciais cortadas como a conversa dos perfumes no bar ou a chegada ao prédio

ajudavam a perceber melhor a intenção do Filipe em arranjar esquemas financeiros lucrativos e a

esconder algo do irmão, acentuando assim a desconfiança entre os irmãos.

Outro elemento retirado foi o frasco a ser escondido e a ser recolhido mais tarde, o que enfraquece

a acusação do irmão mais velho, ainda que este tenha sido um dos pontos que continuou presente

no filme.

E por fim, uma das cenas cruciais que foi cortada e que provavelmente originaria uma diferente

conclusão, mais próxima da esperada na fase da construção da narrativa, é a cena de diálogo entre

o Filipe e o seu amigo António. Aqui, sente-se fortemente a tristeza e talvez algum arrependimento

Page 27: Do Cinema ao Segredo · Como parte integrante do estudo central teórico, serão aprofundadas diferentes representações do segredo em diversas histórias. Como é trabalhado este

24

do Filipe quando menciona o seu irmão. Além disso, a sua convicção em sair da cidade prende-se

com o facto de estar farto e desta situção que ocorreu, não para simplesmente fugir do que fez. Este

pormenor pode auxiliar o espectador a concluir que a última frase do casal trata-se apenas de mais

um rumor e não do verdadeiro destino e intenção do Filipe.

Alguns destes cortes na fase de montagem relacionam-se com a performance dos actores, outros

com a minha própria direcção e outros condicionados pela redução do tempo total da curta-

metragem. No entanto, o filme continua com o seu forte carácter de narrativa inclusiva de um

segredo. Apesar de auxiliar, algumas cenas cortadas poderiam afunilar mais as conclusões dos

espectadores. Mas deixando estas cenas de fora, pode surgir um maior espaço para a compreensão

das intenções e do desenvolvimento de cada personagem. Como se a sua caracterização tivesse

ganho mais liberdade para poder ser interpretada.

Existem ainda algumas cenas que, por razões de tempo e escolha, não possuem muitos planos para

escolha na montagem. Sendo também editor, visualizei o filme já montado antes de sequer começar

as filmagens e, o que por um lado pode ter ajudado a ganhar mais tempo, por outro limitou e

condicionou a montagem final do filme.

Recolhendo a minha conclusão e aquelas partilhadas pelo público, posso adiantar que o meu

objectivo com a curta foi parcialmente cumprido. Por um lado consegui criar uma narrativa que

envolvesse um segredo, representá-lo de uma maneira que as personagens demonstrassem, a

audiência sentisse, mas o segredo não se revelaria e, no final, houvesse conclusões diferentes que

se prenderiam ao facto do segredo não ter sido revelado. Apesar de não terem sido mostradas

certezas, a totalidade dos espectadores considerou o Filipe como único responsável pela morte da

mãe o que demonstra que o segredo foi percebido através da performance do actor. Adianto

“parcialmente”, já que a ideia de conclusão inicialmente era diferente, envolvendo também mais

pistas que “pintavam” o filme de outra forma.

Page 28: Do Cinema ao Segredo · Como parte integrante do estudo central teórico, serão aprofundadas diferentes representações do segredo em diversas histórias. Como é trabalhado este

25

PISTAS FUTURAS

Com este estudo aprofundado de várias técnicas de conceptualização do segredo nas narrativas

cinematográficas, é adquirido um leque variado, mas claro, do que já foi feito e do que ainda pode

ser explorado.

O segredo na narrativa cinematográfica pode ganhar dimensões diferentes daquelas da realidade.

O trabalho da mentira pode tornar-se introspectivo e terapéutico. Ao contrário do que se pode

presumir, uma mentira revela mais verdades sobre o seu locutor do que um facto. Mas uma mentira

não é mais do que uma imaginação, uma criação, uma inovação. E essa é uma das necessidades

mais essenciais à vida do Homem: a criação.

Desta feita, o próprio segredo faz parte da vida, tal como do cinema. Ao aproximarmos cada vez

mais realidade e ficção, conheceremos melhor o mundo à nossa volta e isso permite-nos perceber

a vida, os seus intervenientes e todas as emoções consequentes desta procura.

Page 29: Do Cinema ao Segredo · Como parte integrante do estudo central teórico, serão aprofundadas diferentes representações do segredo em diversas histórias. Como é trabalhado este

26

BIBLIOGRAFIA

Eisenstein, Serguei (1991) Vol. II: Towards a Theory of Montage. Londres, British Film Institute,

Inglaterra

Fleischer, Alain (2004) Une dramaturgie des objets. Paris, Éditions Léo Scheer, França

Gambarato, Renira (2010) Methodology for film analysis: The role of objects in films. Montreal,

Canada

Page 30: Do Cinema ao Segredo · Como parte integrante do estudo central teórico, serão aprofundadas diferentes representações do segredo em diversas histórias. Como é trabalhado este

27

FILMOGRAFIA

CHAN-WOOK, P. (2003) Oldeuboi, Coreia do Sul, 120min, Show East

CHAN-WOOK, P. (2013) Stoker, EUA, 99min, Fox Searchlight Pictures

DOLAN, X. (2016) Just la fin du monde, Canadá, 97min, Entertainment One

GILLESPIE, C. (2017) I, Tonya, EUA, 117min, Neon/30 West

KUBRICK, S. (1999) Eyes wide shut, EUA, 159min, Warner Bros

MOND, J. (2015) James White, EUA, 85min, The Film Arcade

VINTERBERG, T. (1998) The Celebration (Festen), Dinamarca, 105min, Nimbus Film