Charla policial

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coletânea de textos, produzidos pelo Ten Carlos Jonatas Spalding, resgatados junto à família do autor, precocemente falecido, em 1961 e, publicados em organização do Cel José Hilário Retamozo, integrando o grupo de livros produzidos para as festas dos 150 anos da Brigada Militar do Estado do Rio Grande do Sul (Br).

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CARLOS JONATASS PAL DING

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COUCÃO

150anosBRIGADA MIUTAR

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Capa: concepção - Vanderlei Martins Pinheiro

arte-final Soelma

FICHA CATALOGRAFICA

Spalding, C JonetesCharla policial. Porra Alegre, Presença, 1987.

83 p.

1. Literatura Brasileira - Crônicas I. Tttuto.

CDU 869.0(81)

oElaborada pela Bibliotecária Maria Goretti de Souza Silveira - CRBI10-487)

Revisão: Aldira Correa Hetamozo

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PREFÃCIO

"MEU PREZADO COLEGA

Saúde e pronto restabelecimento junto à Exma. Fam (lia paraalegria de todos nós, te desejo.

Li, com muito contentamento, os mandamentos do Brigadia-no, publicados no jornal "a CI DADE", de Santa Maria.

E. realmente, uma orientação para a nossa gente que muitome agradou, e que pode servir para todo homem em qualquer ad-versidade.

Meus parabéns e continua, que a cruza Spalding-Borges For-te deu para o Rio Grande a confirmação da raça forte de que estásservindo de sinuelo.

Um forte abraço do amigo

VascoMello Leíría".

Com esse bilhete o veterano advogado e criminalísta "CapitãoCaraquatá", como foi diplomado pelo Movimento TradicionalistaGaúcho o poeta Vasco Mello Leiria, saudava o surgimento, na irn-prensa de Santa Maria, no jornal "a CI DADE", da obra fIOS DezMandamentos para o Brigadiano" do jovem Tenente Carlos Jona-tas Spalding, falecido em outubro de 1961.

Aquele trabalho foi, posteriormente, publicado em pequenoformato, por mais de uma vez, e circulou pelos quartéis brigadia-nos, largamente. "Cal oca" manteve colaboração assídua em jornaisdo interior do Rio Grande do Sul e viu publicações suas em revis-

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tas e jornais especializados em assuntos de natureza policial de vá-rias regiões do mundo. Com seus familiares ficaram alguns recortesque, reunidos com saudade e carinho, me foram, certo dia, confia-dos pelo seu irmão Luiz Fernando Borges Fortes Spalding para queos divulgasse. Isso ocorreu em 1982 ... A sorte, os bons ventos dasorte madrinha que me abençoa a vida colocou-me, de repente,quase ao término de meu tempo de serviço, na condição de Coor-denador da Comissão Literária encarregada das publicações come-morativas dos 150 anos da Brigada Militar. Não poderia ter ocorri-do melhor circunstância para dar plena divulgação aos trabalhos dosaudoso brigadiano Carlos Jonatas Spalding, precocemente ceifadode nosso convrvlo, Oficial de elite que honrou sobremodo as filei-ras da Sesquicentenária Brigada Militar deixou como registro deseu encantamento pela Coroporação e seu entranhado amor à so-ciedade sul-riograndense a obra "SERViÇOS DE POLICIA MILI-TAR (Edição Sulina), o já referido "MANDAMENTOS PARA OBRIGADIANO" (Edição da Imprensa Oficial (1967) e uma infi-nidade de outros trabalhos publicados, esparsamente, pela impren-sado interior ...

Esta CHAR LA POLICIAL que ora entregamos ao públicoreúne uma parte dessestrabalhos e traz à baila muitos assuntos auehoje ainda são preocupação dos Policiais Militares, numa prova ir-refutável de sua atualidade. E uma coleção de temas de leituraagradável que se insere entre aqueles que, sendo publicados, esta-rão servindo de gaudio pelas comemorações do século e meio deexistência da Brigada Militar.

JOSE HILARIO RETAMOZOMaj PM - Coordenador da Comissão Literária

BG n9 82/1987

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SEU MELHOR AMIGO

o Policial-Militar é o melhor amigo que um cidadão corretopode ter. Em alguns casos 9u em alguns lugares, pode ele mostrar-se pouco .amãvel, mas em geral é justo dizer que ele representa umdos sustentáculos da vida civilizada. A sua dedicação é todos osdias posta à prova, com resultados lisongeiros para a sua nobreCorporação.

Muitos indesejáveis têm sido presos, com risco de vida do po-licial-militar, para que o bem estar dos cidadãos não seja jamaismolestado. Muitas vidas e propriedades têm sido salvas graças àintervenção pronta e eficaz do policial-militar.

Todos os tipos de ocorrências anormais, que se verificam nasruas, encontram sempre o policial-militar vigilante no sentido demanter ou restabelecer a ordem; proteger os que estão em perigo;socorrer os acidentados.

Alguns excessos de autoridade de policiais-militares que aindanão se identificaram com a nobre missão que o povo Ihes confiou,não deve servir de pretexto para cobrir de críticas uma classe quedá todo o seu esforço, e emprega todo seu carinho, para protegera população das cidades em todas as horas do dia e da noite, comuma dedicação que deveria ser suficiente para fazer esquecer todasas críticas por mais justas que fossem.

E, como se isso não bastasse, lembremo-nos que a sua existên-cia é a garantia da nossa.

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BRIGADIANOS EXCEPCIONAIS

Cito Thomas Walsh: "Roubo à mão armada, violação de trân-sito, incêndio criminoso, homicídio, até cachorros loucos - tudoisso faz parte da rotina de um policial". Policial de giro, ou de ser-viço no Destacamento, acrescento eu. E tudo tem que ser resolvidocom eficiência e presteza. E o é, quando estão de serviço, policiaiscomo os brigadianos José Silveira e Hélio Nogueira. Tudo então éresolvido com a maior facilidade. Até mesmo bebê adiantado. (A-final não há nada de extraordinário a este RESPE ITO. Talvez gê-meos dessem mais trabalho. Mas s6 um ... )

Foi o caso do primogênito do casal Roque Domingos.Zero hora e trinta minutos do dia 30 de abril.Sentindo a precipitação do parto, o casal dirigiu-se ao Posto

Policial N92, da Brigada Militar, em Vila do Sarandi. Ali, os solda-dos de serviço solicitaram por telefone uma ambulância para que aSra. Roque Domingos fosse assistida. O médico socorrista prome-teu vir logo com a ambulância. E o logo foi se alongando. E o nenêfoi se adiantando. E os brigadianos foram preparando um cantinhono Posto Policial. Era iminente o parto. Não havia parteira, nãohavia mulher alguma que aquela hora da madrugada pudesse auxi-liar. Havia os briqadianos ...

Assistiram-na com eficiência e presteza. O nenê adiantadonasceu no Posto Policial sem complicações, graças ao espírito deiniciativa e princípios de polícia social de que estão embuídos os

- BRIGADIANOSQuando o médico chegou na ambulância, a parturiente já se

encontrava em seu lar, com seu nascituro, e com seu marido. Exul-tavam alegria. . . -

Pol feia não é s6 pega ladrão!

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"PEDRa E PAULO"

Quando em 1956, a Brigada Militar lançou em Porto Alegre,as duplas "Pedro e Paulo", ela sabia que a introdução daquele no-vo sistema de policiamento ostensivo-preventivo, estava fadadoao mais pleno êxito. Sabia que dentro em pouco, não apenas oportoalegrense, mas todo o riograndense, exultaria de contenta-mento. Sentir-se-ia protegido de maneira sábia e carinhosa pelosencarregados da sua segurança, que agora apresentavam um altoíndice de aprimoramento.

Sabia, igualmente, a Brigada Militar, que com o invitável su-cesso dos "PP", ela passaria a ser solicitada por todas as entidadespromotoras de festejos e reuniões, e por todos os rnunicfpios pro-gressistas, para proporcionar-lhes uma assistência policial-militarigual a que vinha dando a certos locais da Capital - a eficiente as-sistência dos "PP".

Após anos de lutas constantes em prol da população, o suces-so dos "PP" é inconteste. E como a Brigada Militar prévia, ela pas-sou a ser solicitada. Muito solicitada. Os estudantes queriam "PP"em seus bailes e festas. O povo solicitava-os para o trânsito. A so-ciedade, deles necessitava em todas as suas atividades grandiosas.

E assim foi que Montenegro, Vacaria, Caxias e agora SantaMaria, pleitearam junto aos poderes públicos um serviço de poli-ciamento eficiente e disciplinado, carinhoso e moderno - um ser-viço de policiamento "PP".

Os dois primeiros munidpios já foram contemplados. Há ne-cessidade de o serem os demais, pois também querem que seus ha-bitantes sintam-se sob o manto protetor dos "PP" e também para

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que se imponham aos olhos dos visitantes, como padrões em ma-téria de policiamento, por possuírem os soldados padrões "PP",

Urge, pois, um aprimoramento em toda a Brigada Militar,uma reestruturação em sua organização, para que ela possa atenderaos que lhe solicitam o referido policiamento.

~ necessário, ao nosso entender, que as unidades não especia-lizadas, que não é o caso do RPR Mont. CB, CIM, RBG e outras,sejam transformadas em batalhões de pol (cia "Pedro e Paulo".Mais ou menos como no Estado de Guanabara, onde a então Polf-cia Militar do Distrito Federal, é toda "Cosme e Damião".

A Brigada Militar vem vindo por este caminho. A criação dosNúcleos de Preparação Policial, em Porto Alegre e no interior,além de outras, dão-nos prova disso, no que diz respeito à BrigadaMilitar. Uma recente visita do governador do Estado, eng. LeonelBrizola, ao quartel dos "PP", proporcionou a abertura de um cré-dito especial de 4 milhões de cruzeiros para compra de viaturas aeles destinadas, afora outros créditos à disposição da Brigada Mi-litar, que indiretamente beneficiará também o Batalhão de Polícia,é a prova no que diz respeito ao Poder Público.

Santa Maria, tenho certeza, será contemplada com "PP". Elamerece por "n" razões, e porque é Santa Maria.

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COLEGIAIS E TRANSITO

(Panamá) - Coisas verdadeiramente notáveis presencia-se naavenida principal de Panamá City. As vezes fica-se surpreso. As ve-zes fica-se encantado.

Desta feita fiquei encantado.Transcorria a "Semana de Prevenção de Acidentes de Trânsi-

to", Diversas ruas estavam engalanadas com faixas e cartazes. Aler-tavam motoristas e transeuntes com os resultados da imprudência.Quase os mesmos dfsticos usados no Brasil: "Perca um minuto navida ... "

Meu encantamento todavia não foi com as faixas e seus con-selhos. Foi com um negrinho de seus 16 anos. Com um apito naboca e luvas brancas nas mãos dirigia o trânsito num importantecruzamento. Desembaraçava-se bem o safado. Mas vá lá! t: umafalta de responsabilidade ... se bem que o garoto entendia do as-sunto Não era um membro da Guarda Nacional ... Não estavafardado Estava à paisana ...

Ainda atônito, continuei minha caminhada. Olhava as vitrinascom um olho. Pelo rabo do outro, controlava o pretenso guarda detrânsito.

Noutro cruzamento a mesma coisa. Um caso original.Chamei um integrante da Guarda Nacional que perambulava

pela artéria: Desejava uma informação sobre a presença dos "chi-cos" no trânsito.

E aqui vai o "porquê", como gentilmente me foi explicado.(Qual falta de responsabilidade! Qual nada. Algo muito bem pla-nejado! )

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Dada a impossibilidade da Guarda Nacional cumprir sozinhao programa pré-estabelecido de intensificação do policiamentoeducativo de trânsito nas artérias de maior movimento, a GN con-ta com o aux (lio espontâneo dos colegiais.

As diversas entidades congregadoras dos estudantes, assim co-mo os clubes juvenis e escoteiros, são instruidos durante certo pe-ríodo, pelos oficiais e sargentos da GN, sobre como policiar pre-ventivamente o trânsito. Aptos para tal fim, e no decorrer da Se-mana de Prevenção, os estudantes correm às ruas a fim de dirigir eorientar o tráfego. Fazem com que pedestres e motoristas obede-çam os sinais regulatórios, criando, dessa maneira, o hábito salutarde não desrespeitá-Ios para segurança geral da população.

Lembrei-me, então, de notfcias que acabara de receber dePorto Alegre. Na "terrinha" fora iniciada uma campanha de edu-cação juvenil no trânsito. Constituia-se de palestras efetuadas pelosDelegados de Pol (cia-Militar da Brigada gaúcha à diversas tu rmasdo Colégio Santo Antônio. Interessantíssimo seria a continuaçãodessa campanha em outras escolas e a posterior utilização em auxí-lio da Polícia durante a nossa Semana de Prevenção. Supervisiona-dos, é claro, como aqui no Panamá, pelos próprios policiais. (Aliás,era isso que fazia o GN que perambulava pela avenida e que foi pormim interpelado).

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PISTOLAS CRUZADAS

(Canal Zone) - Relativamente há bem pouco tempo algunspoliciais-militares brasileiros começaram a usar um distintivo for-mado por duas pistolas cruzadas. Os primeiros que me recordoter visto usando, foram os integrantes da hoje chamada 6ª Cia.de Pol ícia do Exército. As pistolinhas eram, e até hoje são, parteintegrante do distintivo regional daquela Companhia.

Lembro-me que muitas interrogações surgiram com a divulga-ção do suposto novo distintivo nos meios policiais-militares.

Fiz, como tantos, dive'rsas suposições. Não passaram de supo-sicões ...

. Aqui, quando passamos a usar nos uniformes, como os. poli-ciais-militares de tio Sam, as pistolinhas, minha curiosidade fez-meprocurar respostas às interrogações outrora surgidas, e não respon-didas.

Informações pessoais, livros e folhetos fizeram-me retrocederao ano 1920.

Naquele ano houve uma reorganização no Corpo de Políciaiviilitar do Exército Norte-americano. Para integrar este Corpo fo-ram selecionados 5.ooU infantes. O então Comandante Geral daUnidade de Intenteria de onde estes homens saíram, sugeriu que,como eles não serviam mais como infantes, se Ihes ceveria distin-guir o distintitivo. Foi então que criaram, em caráter definitivo epermanente, a Polícia Militar, e lhe deram um novo distintivo,completamente diferente do usado pelos infantes (fuzis cruzados),e das demais armas e serviços.

Entre as muitas sugestões para o novo emblema dos policiais-

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militares, decidiu-se a aprovação do das pistolas cruzadas, umaidéia do Capitão George M. Chandler, do Estado Maior. Serviu demodelo, uma pistola de coleção de armas do Comandante JerorneClarck, reformado do Exército Americano, e hoje residente emPurcellville, na Virqrnla. Pistola esta, muito ligada à história da Po-trela Militar. Segundo nos consta foi uma das primeiras armas por-tadas pelos primeiros integrantes dos Corpos de Pol (cia Militar.

a distintivo foi tornado público em 1922. (Ele era muitomais velho do que eu podia imaginar). Hoje na quase totalidadedos países do Continente Americano, os policiais-militares usam aspistolas cruzadas como seu srrnbolo. E entre eles figuram os doBrasil.

Não só os da 6~ Companhia. Também os de algumas PPMMestaduais, sendo que uma delas é a nossaBrigada Militar.

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SERVICO DE POLICIA MILITAR

Acabamos de escrever um pequeno livro intitulado "Serviçosde Polfcia Militar". Abordamos neste trabalho os serviços mais co-mumentes prestados pela Brigada Militar no policiamento preven-tivo e repressivo do nosso Estado.

Estes serviços são do conhecimento geral, e normalmente sãoexecutados com eficiência. O ideal, porém, seria que sempre fos-sem executados com eficiência. Este livro vem a ser nossa contri-buição para a conquista do ideal.

Para tal, procuramos apresentar aos leitores as mais modernastécnicas e planejamento sobre como executá-Ios. E assim fizemos,por estarmos imbuídos do pensamento de que o planejamento dasações policiais tem como resultante a eficiência.

As técnicas e o planejamento apresentados. em "Serviços dePolícia Militar", são frutos, em parte, de nossa participação e ob-servação de ações policiais no Brasil e no estrangeiro e, principal-mente, da experiência policial de outros países que os registraramcomo normas de ações a serem sempre seguidas.

Não temos dúvidas, por esta última razão, de que a leitura e oseguimento daquilo que apresentamos neste trabalho trará conse-qüências benéficas às Polfeias Militares e proporcionará maior se-gurança a seus homens fardados de cáqui quando em serviços poli-ciais.

"Serviços de Polícia Militar" foi editado pela Livraria SulinaEditora, de Porto Alegre, que o incluiu dentro da série "ColetâniaPolicial Militar", e já o colocou à disposição dos interessados atra-vés de sua rede de representantes.

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"879 DISTHITu POLICIAL"

A Técnoprint Gráfica S.A., do Rio de Janeiro, editora indis-cutivelmente já vitoriosa na produção de livros de bolso, vem delançar mais uma brilhante série dentro de suas famosas "Ediçõesde Ouro:" "879 UIS I RITO POLICIAL", com livros escritos pelonorte-americano Ed Mc Bain.

Como todos os livros da Técnoprint, os desta série também sedestacam aos nossos olhos pela sua rnaqnffica apresentação artfstica e gráfica. Suas capas envernizadas são bem desenhadas e impres-sas com esmero. A paginação é agradável e a revisão boa.

Já saíram do prelo três exemplares: "O coração tatuado", "Osalário do crime" e "60 minutos para viver".

Ed Mc Bain teve o cuidado de não criar um único detetive pa-ra suas histórias. Seus personagens são vários. São os policiais lota-dos no "879 Distrito Policial de New York". Policiais fardados e àpaisana, como os investigadores Kling, Arthur Brown, Meyer, Ste-ve Carella e Cotton Hawes, e que trabalham sempre em comumacordo com o pessoal do departamento de polfcia técnica, comoSam Grossrnarln, o laboratorista, nas lutas contra os crimes e oscriminosos.

O grande mérito de Ed Mc Bain é não atacar, como cornu-mente o fazem grandes escritores policiais, - "o espírito rotineiroda pai reta, a aplicação da mesma técnica a todos os casos com odefeito de não se cuidar da especialidade da hipótese e do homem-criminoso de que trata". Os livros da série "879 Distrito Policial"não apresentam um detetive particular dotado de grande inteligên-cia, pernóstico. fanfarrão e conquistador. que parece ter por ideal

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desmoralizar as organizações policiais, tornando-as mesmo rídfcu-Ias ante os olhos do leitor. .

Neles, muito ao contrário, são narrados por Ed Mc Bain overdadeiro e árduo trabalho da polfcia desde o interior de um dis-trito policial, assim como os mais modernos processos de investi-gação criminal usados nos Estados Unidos, o que Ihes dá um sabortodo especial de originalidade e veracidade.

Por estas razões é que julgamos que estes livros devem ser li-dos por todos, e principalmente pelos policiais, porque além do jádito, no nosso entender de especializado em pai feia, cada livro deEd Mc Bain é uma verdadeira aula de polfcia onde, inclusive, sãoapresentados cópias de formulários e fichas utilizados pela polrciapara fins de arquivamento e elucidação de crimes.

Leia, pois, Ed Mc Bain e sinta-se como um dos integrantes do"879 Distrito Policial".

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F.I.F.S.P.

JONATASC. SPALDING(Membro da F.I.F.S.P.)

A "Fédération International des Fonctionaires Supérieurs dePol (ce" foi criado no dia 22 de abril de 1950, com as grandes fina-lidades de congregar e promover a confraternização entre os fun-cionários de Polrcia dos quadros superiores, de todo o mundo, fa-cilitando-lhes o intercâmbio cultural, o estudo e ligação com osgrandes órgãos intemacionais de polícia, no que tange ao aprimo-ramento da ação social dos serviços policiais e a defesa sobre o pla-no internacional dos interesses morais dos funcionários de pol (da.

Com apenas dois anos de existência a Organização das NaçõesUnidas (ONU) a considerou como entidade honorária dos Estatu-tos Consultivos do seu Conselho Econômico e Social, o mesmoacontecendo, dois anos mais tarde com a UNESCO, por delibera-ção de sua Assembléia Geral de 1954.

Os princípios que norteiam a F.1. F.S.P. são os de fazer preva-lecer a prevenção sobre a repressão, e de mostrar aos cidadãos quea polfcia é, antes de tudo, um órgão social de proteção. Por esta ra-zão a Federação organiza, anualmente, Congressos Internacionaisde Pol feia, e participa, freqüentemente, em diferentes conferênciasinternacionais relativas a criminologia: prevenção da criminal idade,direito penal, defesa social, etc.

Após pormenorizados estudos, a F.I.F.S.P. chegou ao parecerde que seria muito mais eficaz a aplicação dos meios e a difusãodos princípios citados junto a infância, de forma tal que ela nãose sinta por isso, como um conjunto de menores delinqüentes ousocialmente inadaptados. Assim, a realização de Congressos Inter-

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nacionais pela Proteção da Infância, conferências sobre problemaseducacionais, e o manual da "Ação da Polícia na Proteção de Saú-de Mental das Crianças" já são realidades.

No campo da chamada "Defesa Social", no deconer das reu-niões internacionais, tem sido apresentados numerosos trabalhos,destacando-se um, apresentado no 11ICongresso Internacional deCriminologia, elaborado pelo Comissário Principal da "Surété"Francêsa, Paul Villetorte, que é o Secretário Geral da F.I.F.S.P .•versando sobre "A Polícia diante da Reincidência". e que teve re-percusão em todo o mundo.

Evoluindo normalmente em seus fins iniciais. a F.I.F.S.P:que tem por presidente o Secretário de ~rança Pública do Prin-cipado de Mônaco, M. Delavenne, procura os meios de contato dapol ícia com a infância para, nestas ocasiões, PÔ" em prática a açãoprotetora da pol ícia em favor da infância visando sempre um mun-do melhor.

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PROFILAXIA CRIMINAL

o artigo 39do Estatuto da F.IF.S.P. ("Fédération Internatio-nale des Fonctionnaires Supérieurs de Police", com sede em Paris,(França) expressa os fins desta Associação. Entre outras finalida-des, ali se encontram estabelecidas as de proceder a todos os estu-dos que facilitem a ação preventiva e educativa da pol (ela, provo-car o aprimoramamento da organização e a eficácia dos serviços depolícia.

Para dar cumprimento a tais dispositivos a F.I. F.S.P. cria gru-pos internacionais de especialistas, que após estudarem e debate-rem os assuntos que Ihes são atribuídos, encaminham suas conclu-sões aos congressos internacionais fie polfcia.

Assim vão surgindo regulamentos, normas e sugestões às orga-nizações de pol (cia e aos poderes 'executivos e legislativos de todoo mundo.

Desta maneira vem, pois, a F.I. F.S.P. de constatar a transfor-mação profunda dos contatos sociais, e dos novos rumos da pro-filaxia criminal. Transformações estas que impõe à polícia umaadaptação e extensão de seus fins e métodos.

Por estas raZões é que ela acaba de sugerir a adaptação damissão preventiva da polfcia fi nova concepção da criminologia,concepção "existencial" (isto é, procurando apanhar o homem emsua realidade complexa) e dinâmica. Opina também a Federaçãopela chamada dos quadros da pol ícia para prevenir conflitos entreo delinqüente e a sociedade, e o seu emprego para participar daeducação dos cidadãos e assessorar os poderes executivo e legislati-vo em matéria de profilaxia criminal.

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A Federação considera ser necessário que, no cumprimentode sua missão, o policial se dedique mais particularmente aos jo-vens, usando em especial seu poder de persuassão em vez do decoação, estendendo sua ação aos pais, após uma avaliação prudentedas normas sócio-culturais do meio.

Reafirma ela a necessidade de uma colaboração estreita entrea pol ícia e todos os serviços médicos, sociais, educativos ou cultu-rais encarregados de assistir a juventude.

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X MANDAMENTOS DO BRIGADIANO

O desejo dos policiais de bem servir ao povo, dando-lhe o má-ximo de assistência e tudo fazendo para tirar de seu convrvlo aspessoas nocivas que lhe perturbam a tranqüilidade, é uma realida-de.

E incontestável que nos dias correntes as organizações poli-ciais tem este desejo por ideal. E ele conseqüência dos trabalhos derelações públicas que executam, fazendo com que o povo passe aver no policial o seu protetor leal e dedicado e não aquele que lhevai tolher a liberdade. O povo está, pois, aprendendo que deve con-fiar no policial, solicitá-Io como conselheiro e tutor nos momentosde dificuldades e insegurança.

. Mas apenas o povo aprender, não é suficiente. E preciso queele proceda como tal.

Torna-se, então, necessário que paralelamente com as promo-ções pró-polrcia, as corporações policiais codifiquem normas sobreo procedimento que devem ter seus componentes, como agentesde autoridade que são para com o público no exercfcio de suas no-bres e delicadas atribuições de pol fcla preventiva.

O emprego destas normas, destes mandamentos, em todos oscontatos com o povo, completam as promoções. Deixa latente queo policial está, em verdade, à disposição do povo, o que vem que-brar a muralha de gelo existente entre o povo e polfcia. O temorque ele tem de se acercar do policial cai por terra. O polfcia deixade ser o "bicho-papão", para ser o "anjo da guarda".

Esta tão desejada harmonia povo-pol feia é tanto mais acen-tuada, quanto mais leal e objetivo for o binômio promoção-manda-mentos.

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Assim, aqui vão 10 mandamentos para o brigadiano e que se-rão comentados, individualmente, nas edições de A CIDADE sub-seqüentes a esta.

I - Fazer prevalecer a prevenção sobre a repressão.II - Empregar sempre o bom senso.

III - Estar permanentemente a serviço da sociedade.IV - Ser um servidor público no mais amplo sentido da pa-

lavra.V - Ser cortês e delicado até com os delinqüentes.

VI - Ser exemplo para jovens e adultos.VII - Aprimorar seus conhecimentos técnicos-profissionais.

VIII - Guardar zeloso o tesouro das tradições brigadianas.IX - Jamais macular a farda da Brigada Militar.X - Ser fiel a si mesmo, ao serviço, à Pátria e a Deus.

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X MANDAMENTOS DO BRIGADIANO

DE JONATAS C. SPALDING

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FAZER PREVALECER A PREVENÇ.Õ.OSOBRE A REPRESSÃO

A missão principal do brigadiano no policiamento deve ser 3

de prevenir delitos e contravenções.Muito embora a repressão também seja uma das suas atribui-

ções, ele deve ernpreqar toda sua autoridade e todos os seusconhecimentos para educar o povo obstando, assim, práticas decrimes e contravenções.

Ministrar conselhos, fornecer informações e vigiar constante-mente advertindo os faltosos em potencial, é algo de muito subli-me que o brigadiano pode fazer para que a sociedade viva tranqüi-lamente e com segurança.

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EMPREGAR SEMPRE O BOM SENSO

O êxito de uma intervenção policial dependerá quase que ex-clusivamente da forma com que o brigadiano abordará a ocorrên-cia.

E sabido que ninguém gosta de ser chamado à ordem. Tam-bém o é que normalmente após a prática de um delito ou contra-venção seu autor está num estado de exaltação máximo.

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Sendo assim, as atividades do brigadiano devem ser as maisacertadas possíveis. Como cada ocorrência é diferente de outra,não é possível estabelecer normas de ação para enfrentá-Ias. Mas écerto que em todas as melhores ações são as determinadas pelobom senso.

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.ESTAR PERMANENTEMENTE A SERViÇO DA SOCIEDADE

Dizem os regulamentos que, fardado, o brigadiano está per-manentemente de serviço.

Sendo assim, e considerando que a Brigada Militar é a granderesponsável pela manutenção da ordem e segurança pública no Es-tado, o brigadiano deve estar sempre alerta para mostrar à socieda- .de que sua Corporação jamais deixará de cumprir esta nobilitantemissão que lhe foi confiada.

Nas ruas, bailes, cinemas, etc., mesmo que pela "escala de ser-viço" esteja de folga, o brigadiano deve intervir sempre que a situa-ção assim o requerer.

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SER UM SERVIDOR PÚBLICONO MAIS AMPLO SENTIDO DA PALAVRA

Como um Servidor público, o brigadiano tem a seu cargo de-veres e obrigações de grande responsabilidade para com o públicoque o paga.

Servir a este povo não é nada mais nada menos do que obri-gação. Mas servir da melhor maneira possível deve ser prerrogativado brigadiano.

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Já está se tornando um hábito o "Pergunte a um brigadiano".E o prestCgio do brigadiano não pode ser desmerecido. E nunca oserá se a resposta for dada com cortesia, e ainda mais, se o inquiri-dor além da resposta receber uma "mãozinha" na solução do seuproblema.

-V-SER CORTES E DELICADO ATE COM OS DElINQUENTES

A cortesia e a delicadeza devem ser qualidades primordiais dobrigadiano.

Com atitudes e palavras corteses ele contará com o apoio dosque o cercam e estará contribuindo para aumentar o conceito desua Força.

O brigadiano deve tratar seus semelhantes como gostaria deser por eles tratado, mesmo que este seja um delinqüente.

No desempenho de missões repressivas o ser cortês e delicadoacalmará os ânimos exaltados, a que facilitará, sobremodo, a açãopolicial.

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SER EXEMPLO PARA JOVENS E ADULTOS

Os atos de juventude nada mais são do que os reflexos daeducação e exemplos que Ihes foram dados.

Se existe uma juventude transviada é porque a educação mi-nistrada aos jovens é deficiente, e os atos daqueles que os cercamou que por eles são responsáveis, são exemplos de como se deveproceder.

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Em vez de julgar os filhos devemos ensinar aos pais. E o briogadiano, como defensor da sociedade tem de conduzir-se de modoque suas ações não dêem margem a maledicência ou censuras, dan-do assim bons exemplos aos pais, que por sua vez os transmitirãoaos filhos.

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APRIMORAR SEUS CONHECIMENTOSTt=CNICOS-PROFISSIONAIS

O brigadiano deve ter uma larga soma de conhecimentos so-bre a profissão que abraçou. Isto lhe proporcionará maior certezade estar agindo acertadamente no desempenho de suas atribuicõespoliciais.

O ideal, no entanto, é que seus conhecimentos sejam sempree cada vez mais aprimorados. Para tal, a observação dos atos deseus colegas, e o estudo dos assuntos técnicos-profissionais, - queproporcionarão ao brigadiano estar a par das últimas novidades, -Ihes serão de grande valia.

GUARDAR ZELOSO O TESOURODAS TRADIÇOES BRIGADIANAS

Criada em 18 de novembro de 1837, a Brigada Militar encerratoda uma vida de lutas e glórias em prol da legalidade.

Embora muitas vezes ela tivesse que se apartar de sua superiordestinação: o policiamento, e abraçar a beligerância, o fêz em be-neffcio da sociedade, e dando mostras de sua capacidade de ação etrabalho em qualquer setor.

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o título "briosa" Brigada Militar custou-lhe muito sangue debravos e tem de ser cultuado e cada vez mais merecido.

Guardar as tradições brigadianas é ter sempre presentes exem-plos de coragem, luta, fé e amor à causa pública.

-IX-

JAMAIS MACULAR A FARDA DA BRIGADA MILITAR

o brigadiano sempre será prestigiado quando nas coisas daordem pública ele aparece ao povo como seu guardião.

Em promiscuidade com o povo, permutando idéias mais oumenos levianas, mostrando-lhe, inconscientemente suas naturaisfraquezas de homem e, talvez, as suas deficiências de inteligência,- no café ou no bar - e tardado, o brigadiano está se banalizando.E como conseqüência banalizando a farda da Brigada Militar queenverga, e reduzindo a força de sua autoridade.

Eis porque a farda da Brigada Militar jamais deve ser macula-da, e obriga quem a enverga ao rigor da compostu ra extrema.

-X-SER FIEL A SI MESMO, AO SERViÇO, A PATRIA E A DEUS

Ser conscientemente fiel a causa que abraçou é uma obriga-ção moral que o brigadiano deve ter para consigo mesmo.

No mundo conturbado em que vivemos os subornos, as tenta-ções e os caminhos que levam ao mal a todo momento surgem anteo brigadiano.

Quase que são precisos esforços extra-humanos para afastá-los.

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Estes esforços o brigadiano tem de fazer para ser fiel a si mes-mo, como homem bem formado, honesto e exemplo de virtude

que é à saciedade.Ser fiel a si mesmo é ser fiel ao serviço, que necessita do bri-

gadiano: ser fiel à Pátria, que necessita do serviço é ser fiêl a Deus,que quer paz entre os homens de boa vontade.

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POLl-CIA EM PfLULAS*

o Policial não deve se satisfazer com a teoria sobre a crimina-lidade. Deve conhecer a vida real do homem delinqüente. Como is-to é improvável, deve, pelo menos, por-se em contato com o crime~O criminoso no mundo da imaginação: - na literatura policial.

"Vá a pol icia; eles sabem o que têm a fazer. Estão habituadosa enfrentar problemas. São profissionais. No crime, as interferên-cias de amadores dão mau resultado"

Agatha Christie

"O crime é um rasgão que despedaça completamente a vida.Não é apenas a queda de uma malha. E deixa vestígios que nãoenganam, se uma pessoa tiver paciência para examinar todas asmalhas",

. Erle Stanley Gardner

"Se os assassinos nunca vissem maneira de escapar, depois deassassinarem, poucos crimes de morte viriam a ser cometidos".

"Não devemos esquecer que o próprio Bertillon reconheceque há uma probabilidade entre cem mil de acharem duas impres-sões digitais semelhantes", -

Georges Simenon

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"Os policiais são os teus amigos, e bons amigos".Bruno Bax

"Ninguém vem à polícia contar nada sobre ~m crim~ que.co-meteu. Às confissões expontâneas geralmente sao puras unaqma-ções exacerbadas pela bebida".

Willian F. Nollan

"A Lei existe para evitar crimes".Richard Deming

"Escusado será dizer-se que se tratando duma prova judicialé necessário preservá-Ia intata e como tal protegê-Ia de possfvel de-terioração ou destruição".

A. Varatojo

"Para os policiais os fatos é que contam, e não as hipótesesmais ou menos fantasistas".

Williann Irish

"Há malvados que aprenderam o crime na escola do diabo, eque escapariam ao próprio Deus ... "

Emile Zola

"A um menininho perdido: - Eu sei que seu pai se chamapapai. Mas corno é que sua mãe costuma chamá-Ia?" I

Avram Davidson

"0 impulso natural de todos os criminosos sem arma é oestrangulamento".

Anna Mary Wells

"Todo criminoso de classe procura apresentar à polícia umaalternativa de sua culpa. Pode dar à morte uma aparência de na-turalidade, fazê-Ia passar por acidente, ou empurrar as culpas parauma terceira pessoa".

Thomas Flanagan

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·"Os homens detestam cenas. Estão prontos a enfrentar, comas mãos vazias, um gatuno, mas preferem fugir como uns covardesa dizerem um adeus definitivo a uma mulher",

William Irisch

"A Lei deve agir para proteger o inocente e punir o culpado",Erle Stanley Gardner

"As mulheres-policiais não são escolhidas pela beleza do seurosto ou pela sinuosidade das suas curvas",

Thomas B. Dewey

"Um homem, que cometeu um crime, não terá mais que vintee cinco por cento de escrúpulos em cometer outro".

Raymond Chandler

"O crime é o inevitável sub-produto dos ódios e das rivalida-des nascidas de uma civilização que se baseia na concorrência".

Erle Stanley Gardner

"Muitos crimes foram descobertos graças às conversas, às teo-rias, ao raciocfnio",

Ellery Queen

"Os pensamentos não matam. Não bastam para isso .. ."Agatha Christie

liA melhor maneira de prender um criminoso é seguir os mes-mos processos que ele",

Dr. A. Varatojo

•• Frases recolhidas.

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MALOCA

Misto de céu e inferno, de felicidade e desespero, de casa esarjeta: MALOCA!

Basta chegarmos em qualquer baldio, beira de morro, ou mar-gem de imunda sanga, para encontrá-Ia.

Pálida, com leves maçãs avermelhadas no exterior, devido aposição que algumas tábuas ocupavam em painéis abandonados, éa maloca o amontoado velho e apodrecido, que tenta imitar a for-ma de um cubo.

Protege-a contra ingratas chuvas e raios solares de 29", enfer-rujada lâmina de zinco, palha Santa Fé e pedaços de latas deazeite.

Maloca! Pouco de céu e casa, porque abrigou rnrsera famfliaque veio do esquecido interior, "fazer fortuna" na metrópole ...

Muito de inferno e sarjeta, porque lixo e fezes ornamentamseu jardim de macegas; porque com o calor, o mau cheiro asfixiaum anjinho nu atacado por coqueluche; porque com as chuvas aúmidade de seu assoalho, terra socada, gripa as crianças que temseus narizes sempre correndo ...

E um pouco de felicidade, porque suas frestas são tapadas,ai í com o retrato de Getú lio Vargas; aqui com São Jorge matandoo dragão, e acolá com recortes de jornais: o time do Internacional011 garotas de biquine, o que é um orgulho; porque a lenha entre 4tijolos aquentará café "a Ia Di Primo Pobre", alimento "society"de todo dia ...

E um barbarismo de desespero, porque a água da sanga trou-xe o tifo; porque o choro dos 8 filhos é de fome; porque a Prefei-tura vai demolir a "número 3045"; e, porque é uma MALOCA!

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HONRA CRIOULA

Conto adaptado de um fato

O tal de Gomercindo era de fato um guasca de grande valorpela sua bravura no lombo de um bagual xucro. Grudava-se no se-rigote que nem carrapato em picanha de boi gordo.

Certo dia, Seu Lufz, proprietário da Fazenda Rosário, obse-quiou Gomercindo com um potrilho zaino. Animal com fama deindomável. Seu Luíz, no entanto, exigia como condição indispen-sável, que Gomercindo quebrasse o corincho do redomão em suapresença.

Nosso personagem não fez muito da oferta. Achou que o ve-lho Luíz queria fazer mofa. Até mesmo esqueceu que ganhara opotro.

Meses mais tarde Gomercindo resolveu visitar um de seus pri-mos que era peão da Fazenda Rosârio. Quando lã chegou, ao sau-dar o proprietário expondo a razão de sua presença, Seu Luíz, emtroca, e talvez para inticar, disse-Ihe com fingido assombro:

- "Buenas, fndio velho I Pensei que viesse enfrentar o zaino!Faz horas que o espera, ou será que lhe mete medo por acaso?"

- "Medo! - grunhiu o gaúcho, ao tempo em que um relâm-pago fugaz brilhou em suas pupilas verdes. Mostrava seu amor prõ-prio ferido.

- "Medo!" - repetiu - "Agora mesmo vou quebrar-lhe oqueixo, e em pelo! Saltarei nele do travessão da porteira do cur-

11"ra.E dez minutos mais tarde, Gomercindo esta pendurado na

trave do curral. Abriram a porteira e o zaino disparou como se lhetivessem atado couro cruna sola. Ao sair Gomercindo largou-5e do

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travessão e acomodou-se, que nem guri em beira de rancho, nolombo do colhudo. Esse, anima! de poderosa musculatura, pren-deu-se o corcovear e dar priscos de arrepiar. Gomercindo só lhecorria pelas paletas as chilenas de prata, no mais.

. .O zaino escarvejava. Bufava. Ia se boleando, quando o guasca

manoteou do mango de cabo de guajuvira e se botou a relhaços esocos na ganacha do chucro.

A mango, soco e espora, levou-o para bandas donde o velhoLu fz assistia tudo, se abrindo que nem cordeona em baile. Bemperto dele, levantou pela última vez o mango e grudou-lhe no meioda testa. O cavalo caiu como fulminado.

Gomercindo deu alguns passos para espichar as pernas. E, nosilêncio que marcou sua façanha só se escutou o ressonar de suasesporas nazarenas, donde corria ainda o sangue do bagual. Gomer-cindo dirigiu-se ao palanque onde deixara seu pingo atado. Montousem tocar no estrivo, e com um seco - "1nté mais ver!" - despe-diu-se dos presentes com uma saudação geral.

- "Ei! - gritou Luíz, -- "Nõa leva o zaino: E seu, tchê. Ga-nhou-o ... "

- "Obrigado Patrão - respondeu o gaúcho - Deixo ar. Pode-rá servir-lhe para puxar as pipas de água de volta do poço.

E inclinando-se sobre a cruz do cavalo, partiu batendo namarca rumo da porteira da estância ...

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MUNDANISMO

Hoje, dentre as trepadeiras que o contornam, num pátio emque frondosas árvores procuram escondê-Io, o vivo castelo de tem-pos idos parece chorar saudoso.

Ah! Bons tempos aqueles em que os acordes suaves e ine-briantes de variadas valsas espalhavam-se por todo seu interior. Atémesmo fugiam por suas janelas para entrelaçar mais e mais os ca-sais amorosos, na vastidão de seus arredores arborizados e floridos.

Quanta luz de luxuosos candelabros e magnfficos lustres seespalhava no amplo, rico salão de festas. Dava o mais belo coloridoque os olhos podem ver, ao desfile de decotados vestidos de gala,que cobriam angelicais jovens sorridentes ...

Era algo de maravilhoso o tempo que lá foi ... Até agora élembrada saudosa, a irritante voz de Madame. Ela fazia questão deentoar melodias I(ricas acompanhada pela orquestra de cordas. Co-mo essa anfitriã desagradava, então, a mocidade apaixonada peladança ...

Quanta alegria banhada em champanha. Quanta felicidade láteve seu gênese ao compasso do ritmo vienense que ecoava pelosolar ...

Mas, passou ... Agora o abandono e a escuridão moram emseus aposentos. Os ratos são os dançarinos no momento, ou empoltronas aristocráticas, ou em estufarnentos pintados a mão decadeiras seculares. Saracoteiam ao som enlouquecedor da sinfoniados pernilongos.

Suas cortinas de veludo, umas abrigam aranhas, que as unemà pintura emoldurada mais próxima com suas teias vigorosas. Ou-

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tras balançam no sentido do agitado vento que invade as janelaspelos vidros quebrados por pedras que a garotada atira.

E lá fora, enquanto as árvores são despidas de suas folhas quecaem ao chão, o zumbir do vento. parece choro e soluços deste casa-rão abandonado, relembrando os felizes dias em que r,,1adame otornava o mais alegre lugar mundano ...

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FUGA FRUSTRADA

Quando o telefone rompeu o profundo silêncio da noite, mi-nha mão procurou o despertador. E meu dedo mergulhou no restode uísque que sobrara no fundo do copo. Meio que despertei ...

Na escuridão ainda não compreendia bem a ausência do des-pertador. Era ele sempre que me acordava ...

Tirando o dedo do morno líquido do copo, levei-o à boca.Uísque! Seu gosto de palha apressou meu despertar. Bebi de umgole o que restava no copo.

Ainda não atinava com a origem do rufdo que me estouravaa cabeça ...

I

Aos poucos lembrei-me que não podia ter nenhum desperta-dor sobre a mesa de cabeceira, e sim um copo e uma garrafa vaziade "Queen Anne". Nesta noite .eu não dormia em casa... dormianum destes apartamentos que se alugam para uma noite, e queexistem aos borbotões nesta cidade.

Custando a abrir os olhos e bocejando constantemente, dirigi-me ao telefone. Sim, era ele que me acordava I Ia levantar o fonequando deixou de tocar. Que parvo havia sido! Inventara uma des-culpa qualquer a fim de passar a noite fora de casa,somente parareceber este telefonema ... traçar nossos planos de fuga ... E meutorpor não mo havia deixado. Lancei o copo ao solo. Partiu-se es-trondosamente em mil pedaços. Maldito u fsque! E o telefone vol-tou a chamar como um eco do espatifar-se do copo.

Corri ao telefone. Tropecei no tapete caindo de bruços sobreos cacos. Todo doído ainda consegui levantar o fone, levar o aus-cultador ao ouvido.

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- E ... você Luana?- Sim, anjo sou eu e cheinha de saudades tuas.- Como. . . ansiava este momento ... Luana ! Tenho tantas

coisas ... para te dizer ... e acho que não mais poderemos ...- Mas porque, anjo? Temos ainda bastante tempo para con-

versar, afinal lia noite é uma criança ... 11 Alô! Alô ... Alô!

o sangue corria de meu pulso tingindo de vermelho o fone eo fio ... Cortara-me nos cacos do copo. Já não tinha forças paraabrir os lábios, balbuciar qualquer palavra ... Esvafa-rne em san-gue. Era evidente minha morte ...

Encontrariam-me morto, banhado em sangue, e com o produ-to do desfalque em meus bolsos. Era o triste fim de um pretensobanqueiro honrado ...

E ela? Pronta para fugir comigo ... ficaria me esperando al-gum tempo, por certo. Que impressão a meu respeito guardaria pa-ra o resto da vida? ... "Cortou o pulso ... suicidou-se o covarde.Não foi bastante homem para enfrentar a realidade ... "

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NOITE MADRINHA ...

Quando a inspiração n~o vem e o pensamento é um caos, asletras vão tropeçando sem formar sentido. Ouasesempre queremse agrupar em palavras. Tolas palavras que por nada expressaremvão sendo riscadas.

Eis que agora elas parecem querer harmonizar-se, dar a luz aromânticas frases.

Mas não desejam sobreviver. E eu tenho de dar-Ihes vida. t:necessário que vivam! Com elas também eu viverei mais esta noite.

NOITE, MADRINHA DOS DESAFORTUNADOS!Isto é quase outra súplica!Elascomeçam a viver!Veio a luz, vieram estrelas, veio a música ...E meu pensamento foi perambulando, ganhando vida em ru-

mo qualquer.A música é quente, é suave ...NOITE, MADRINHA DOS DESAFORTUNADOSIIsto é quaseuma súplica!Veio o mar, a areia, a brisa ...E lua, e estrelas, e música levaram-me para uma noite a beira

mar.E ela estava lá. Reflexos dourados nos sedosos cabelosacas-

tanhados, tez clara, olhos penetrantes, lábios gostosos, pés descal-ços ... Encanto de mulher.

Envolvo-a em meus braços e bailamos.Só os olhos falam ... palavras de carinho, palavras de amor.E a areia salpica nossos pés, e a água morna e espumante os

molham, e nossos lábios se encontram.Doce ilusão! Feliz pensamento INOITE, MADRASTA DOS DESAFORTUNADOSI

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MULHER

- Não!A verdadeira mulher é aquela que tem o coração como centro

de todos os seus pensamentos e ações.E aquela que com a sua presença nos faz possuidor de uma

alegria infinita. Engendrar os mais sublimes ideais. E, até mesmo,querer conquistar o universo.

E aquela que tem, ainda que com o coração partido pela maiscruel desilusão, um sorriso nos lábios e braços abertos para maisuma vez receber o dono de seu amor.

E quem tendo seu orgulho para o resto do mundo, dobra-operante aquela voz que a chama - "Querida .. ."

E é aquela que sabe participar da felicidade de seu eterno na-morado, assim como acompanhá-Io nas amargas dores com beijos,carinhos e palavras de conforto.

Esta sim é a única a quem se pode chamar mulher. E quemmais merece, um dia, ouvir de lábios inocentes o doce nome "ma-mã". Pois soube dominar o orgulho, que é terreno. Mostrou cari-nho e renúncia, sublimes ...

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o MEDALHAO DA CORRENTE

Em minha mente, quase toda acabrunhada, um pensamentosó existia: fugir!

Aqueles apitos que mantinham a ligação dos policiais, aquelezumbir de projéteis que raspavam pelo meu corpo, me davam maisforças para continuar na fuga, para amaldiçoar cada vez mais a so-ciedade. Até o tempo parecia querer expulsar-me da face terrestre.Torrencialmente, e alagando tudo, a chuva caia. Cada relâmpago·que estourava, fazia com que eu me atirasse ao solo. Não poderiaser visto por meus perseguidores.

Totalmente embarrado, com as mãos sangrando e as roupasem frangalhos, embrenhava-me mais e mais na mata verde cobertapelo preto véu de uma noite tempestuosa.

Agora já não me jogava ao chão para não ser localizado. Ati-·ravam-me a ele. Era a ventania que queria desfolhar os ramos. E-ram os galhos secos que, no chão, me faziam tropeçar, em vez deestarem ardendo no fogão de alguma velha pobre. .

Sempre que tombava e sentia meus lábios encontrar a lama,praguejava contra os estampidos. Praguejava contra os que clama-vam justiça.

Minhas forças já eram diminutas. O cansaço tornava lerdos osmovimentos que fazia para tirar meu corpo de uma poça d'âgua.

Eis que grossa faísca clareou a mata. Eis que pequena chamailuminou um cano. Novamente no chão eu estava. Mas desta vezabraçado pela dor.

Mansamente minha mão foi se colocar no peito ferido. Doiamuito, mas ... segurei algo ... Não achava a feridal Segurei umacorrente com um medalhão!

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A imagem santa de minha mãe me veio a mente. Era um pre-sente que me dera dizendo; li ••• olha para ela!,. recorda-te demim ... "

Estava louco? Por que fugia? Não, minha mãe, não é teu fi-lho! Não é teu filho que se acovardou assim ... Mãe! Perdoa! Ma-tei um homem! E ele tinha também o direito de viver ... Tinhaum lar cheio de alegria. E agora ... agora terá seu corpo numataúde preto, no mármore frio da sepultura branca ...

Mãe! Não chores! Sou culpadol Sou um assassino ... e ele ...e ele ...

Mas, não era a lama que beijava agora. Era algo macio.Levantando o olhar eu vi mamãe. Com sua mão acariciava

meu rosto. Tentava, risonha, acordar-me, choroso ...

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CEMITERIO

As folhas do velho portão batiam-se. Excitava os nervos dequem por ali passasse. Muros amarelecidos pelo tempo. Partessem reboco. Algumas já sem tijolos. Pequenas trepadeiras a bailarno assustador ritmo do vento que reinava no lusco fusco deste diainvernoso.

Era, em verdade, horripilante postal de um cemitério aban-donado.

Seus túmulos pareciam nascer do capinzal, Um arbusto seco,no centro de um masoléu, permanecia na inércia. Dava idéia de gi-gantesca mão descarnada que se estendia ao céu implorando mise-ricórdia.

A um canto, grossa árvore caída sobre um bloco de mármore,impressionava. Suas inscrições e figuras metálicas, umas não maisexistiam: outras jazidas amassadas. A cruz que por certo o ornavaoutrora, por vezes aparecia entre os galhõs, coincidindo com o cla-rão dos relâmpagos.

Era tudo que se destacava após pequena capela. Impregnadapelo cheiro do sebo de vela, misteriosamente, nela era iluminadoseu santo.

O mais eram ervas daninhas e pontos brancos ...E o vento continuava a assobiar sua fúnebre canção. Movia

até o mínimo ramo. Parecia querer tudo afastar do sinistro cemité-rio, onde só a natureza afoita vivia ...

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CARITAS .•.

o povo começou a aglomerar-se nas calçaoas. a fim de con-templar um lamentável espetáculo de uma odiosa exploração capi-talista. Com efeito, um guri rnaqricela, de seus 11 anos de idade,empurrava penosamente um carrinho de mão. carregado até asbordas de mercadorias, com o fito de subir uma respeitável ladei-ra. A pobre criaturinha, desfeita em suor, punha seu pequeno om-bro contra o veículo e este se movia lentamente.

Da multidão de curiosos, elevou-se a voz de uma mulher, que,como C;P sabe, são muitos sensfveis aos "sofrimentos humanos", di-zendo:

- Não é vergonhoso que se explore assim um mísero garoto?A multidão concordou unanimemente num sussurro. Mas nin-

guém se moveu. De repente interveio um homem possante, e lançando um olhar circular aos demais, esclareceu a teoria da mulher:

- ~ indigno que deixemos este pequeno empurrar sozinho ocarro! Não estão vendo que ele não tem força para tal?

E dando exemplo, pôs-se a empurrar ao lado do menino. Estaatitude decidiu aos outros. Três ou quatro dos curiosos foram daruma "mãozinha" ao garoto. Isto foi o suficiente para que o carri-nho subisse rapidamente.

- Para onde vais? - perguntou um, já no topo da ladeira.O menino apontou uma direção que ia dar lá onde o diabo

perdeu as botas. Pronto! Novos protestos entre os presentes contraos patrões que tinham o cinismo de encarregar tão débil criaturade semelhante tarefa.

- Mas não pudeste dizer a teu patrão que não podias subir aladeira sozinho?

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- Claro que disse!! - contestou o jovem.- E que te respondeu este monstro?- Ele encolheu os ombros e me disse: "Anda, vai de uma vez,

que antes de chegares na esquina, encontrarás alguns idiotas que tedarão uma "mãozinha!" ...

, *Traduzido de um autor desconhecido.

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NEGRINHO

Mãos nos bolsos de uma bombacha remendada nos fundi lhos.Cabeça erguida. Lá ia assoviando uma toada, o piazito de cabelosloiros despenteados, por deserta rua.

Era um destes tipinhos comuns dos fins ~e linha dos bairrospopulares. Gazeava a aula para jogar bolita, caçar pardais ou fazertravessuras em alguma sanga.

Por certo procurava algum 7 para pintar. Foi ao olhar paraum terreno baldio, que sua mente despreocupada trabalhou. Juqui-nha assoviou mais alto. Deu, sem querer, um ritmo mais alegre àcanção. Apressou suas passadas em direção do terreno. - Que pe-reira maravilhosa! - por certo disse para si mesmo. Na verdade,dentre aqueles montões de lixo depositados no terreno, uma perei-ra coberta de frutos parecia imitar uma árvore de natal ... Carre-gadinha ... Uma maravilha ...

Quando ia pular para a árvore, ouviu um fraco latir chorososair dentre um punhado de papéis sujos e cascas de laranjas. Paroue aguçou os ouvidos. Correu para o local donde vinham os latidos.Revirou rapidamente o cisco. Seus olhos pequeninos e verdes depa-raram com um cachorrinho de uns poucos dias de vida. Encolhidoe arrepiado chorava sua orfandade.

No írrtimo de Juquinha fora vencida a idéia de comer peras.Nem mais pensou em frutas ... Seu coração voltou-se para o inde-feso animal.

- "Não chores, Negrinho, vou dar um jeito em tua vida! ... "Segurou o cusco junto ao peito. Esfregou-lhe a mão no corpo

e com assoprões limpou seu pelo.

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Juquinha tomara a direção de sua casa na subida da coxilha.Até chegar em seu casebre, eram palavras de carinho e pro-

messas de proteção que o pequenino dizia a sua prenda.Pé ante pé, Juquinha aguardava um descuido da sua mãe, na

cozinha. Afinal surrupia leite. Vira o buião e o leite cai dentro deuma lata enferrujada de sardinhas. Dispara para o fundo do quin-tal. "Negrinho" lambusava-se todo. Nunca teve tanto leite ao seudispor desde que nascera.

Para o resto do dia Juquinha privou-se de suas brincadeirascom a garotada da vizinhança. Esteve construindo uma casinha pa-ra seu achado.

Quando a noite caiu, "Negrinho" encontrava-se escondidfs-simo num velho pelego em seu primeiro lar.

Juquinha, em sua cama, virava de um lado para o outro. Nãoconseguia dormir. Seu pensamento estava voltado para o cachor-rinho: - Estaria ele passando bem? Não teria frio?"

E, com estas perguntas, suando, esperou que seu pai apagassea impertinente luz do candieiro e fosse se deitar.

Pronto!Agora era sua vez de agir. Com cuidado saltou a janela de seu

quarto. Queria mais uma vez ver "Negrinho". A tentação foi gran-de ...

Meia hora depois, o garoto dormia feliz e cheio de satisfação.Encolhidinho em sua cama, envolvia seu novo companheiro: o vira-latinha que lhe impregnara o coração de amor e carinho ...

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UMA BOLA ...

Na mesa do bar, bebendo um martini, procurava algo parauma crônica. Pensava na música e no álcool e na noite enluarada láfora. Pensava em tudo. Não pensava em nada ...

Entrou afobado um quarentão, que desviou minhas reflexões.Tropeçou no pé de uma cadeira. Caiu! O pessoal ao lado da minhamesa gargalhou gostosamente. E, quase que em coro, disseram:"Ele é uma bola!"

Mas ele levantou ... Olhou feio para todos. Puxou um revól-ver ...

Lembrei-me então do cronista Antônio Maria que numa deli-ciosa crônica aconselhava: "Não queira nunca, meu amigo, pormais que este prazer te fascine, ganhar a fama de engraçado, vil/o,talentoso ou inteligente. Tua vida vai ficar um inferno. Quando en-trares num bar, haverá sempre uma mesa, onde estarão sentados se-nhoras e senhores "bem". Então ouvirás uma voz gritar: - Chegouelel

Ele és tu. Aí, chamarão para ser da mesa, e tu irás, porquenão haverá outro jeito. Quando estiveres sentadinho, a moça vaidizer ao ouvido da outra:

- Ele é engraçadíssimo.E depois, virando-se para o teu lado, perguntará:- O que é que você tem feito?Nessa altura, irmão, não terás o direito de responder: "Nada.

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Não tenho feito nada". Tens que dar uma resposta bem inteligen-te, dessas que a mesa toda caia dura, morta de tanto rir. E o pior éque estarás morrendo de cansaço. Na realidade não és engraçado,nem talentoso, nem nada. Es vivo, até o dia em que a morte te vierapanhar. Então, outra moça da mesa vai dizer:

- Ele é uma bola ...E tu não és uma bola. E tu mereces o direito de solidão, de si-

lêncio, de mansa e contemplativa burrice. Ninguém te quer daressa paz. - Por quê?

E dolorosa, bom moço, cansativa e cruciante a fama do teutalento ...

Compra um revólver, companheiro. Põe-no à cintura. Entra,depois, no bar. Quando a mesa de "gente bem" te chamar, puxa oteu revólver e dize:

- Tá aqui prá voces!E nem será preciso atirar ... "

•• ••

Mas ele quis atirar, completo eu nesta crônica meio roubada.Puxou o gatilho. Um jato d'água saiu do cano da arma (de bor-racha) ...

A mesa toda caiu dura, morta de tanto rir ...Ele era mesmo uma bola ...

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CALrGULA:LUNATICO OU SENSATO?

Sempre .tive o Imperador Romano Cal fgula em conta delouco. Convenhamos, nomear Consul "Incitatus" é um gesto eqüi-no em todos os sentidos. Confesso, porém, que até então apenaslera friamente as narrativas dos livros de História Universal referen-tes a Calígula e seu cavalo "Incitatus". Nunca tinha tido a curiosi-dade de embrenhar-me a fundo na interpretação de seus atos.

Eis que lendo "Calendário do Crime", obra de Ellery Queen,fiquei deveras impressionado com as justificativas dadas às atitudesde Calfqula. inéditas. Pelo menos para mim.

Quando Cal (gula se tornou imperador nomeou seu consul, In-citatus. Sendo Incitatus um cavalo, compreende-se o rigor dos his-toriadores ao colocarem o neto de Tibério na categoria dos loucos.Esta classificação é discutível. Temos conhecimento de outras no-meações, e não apenas entre os romanos, muito menos atilados.

Atribuiu-se, também, a Calígula o assassínio de seu filho ado-tivo, Lucius. Era seu hábito, igualmente, mandar para a arena oscidadãos que não lhe agradavam e jogar, nas horas de ócio, com da-dos viciados. Que estes fatos são históricos, parece indubitável,mas justificarão eles as conclusões tiradas? Já comentamos o episó-dio do cavalo. No que se refere a Lucius, este era, segundo o testa-mento de Tibério, co-herdeiro de Cal (gula e um Imperador que fett:desaparecer do número dos vivos o seu co-herdeiro poderá ser con-siderado um indivíduo de temperamento nervoso ou cautelosomas, nunca louco. Atirar os inimigos para a arena junta o interesseparticular com o prazer do público e é um Indício de clarividência

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política. Finalmente, se é certo que não se justifica moralmente oemprego de dados viciados, não é menos verdade que essa práticareduz consideravelmente as probabilidades negativas para o joga-dor que os utiliza.

Resumindo, conclui Ellery Oueen - longe de ser um lunático,Cal ígula era um homem sensato".

Que Calícula fosse sensato, não creio. Que fosse louco, estouinclinado agora a não mais crer. Ficarei no meio termo: Acreditoque agora estou sendo mais justo à memória do Imperador.

Se Cal (gula nomeou consul seu cavalo Incitatus, os pau listaselegeram vereador seu rinoceronte "Cacareco".

Quem sabe se Calígula ao tomar aquela atitude não julgava láter suas razões para tal, como também as julgavam ter os paulistaspara elegerem "Cacareco"? (se bem que, por mais puras que Ihesparecessem tais razões, contaram com minha antipatia incondicio-nal). •

Descansa em paz Calígula. Para mim V. Excia. já não foi um-louco, uma personalidade psicopática.

Pode ser que mais tarde eu ainda venha a considerar V. Excia.um sensato. Mas por enquanto não.

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MOLEQUE IRO

E quase nada este projeto de cavalo. Pequenino por fora, omouro é gigante de coração.

Quando pela manhã o tiram da baia, sempre sai mancando deuma das patas. E o golpe que aplica para não ser trabalhado. Crian-ça fiteira que inventa doença para "matar" a aula.

Acabe com esta farsa, quando lhe começam a escovar o cor-po.

Vira, então, moleque. Orelhas para trás, boca aberta, dentesâ mostra, e pronto! Um descuido do tratador basta para que viran-do o pescoço, tente mordê-Io. Nunca soube de alguém vítima deseus dentes ameaçadores. E modalidade de brincadeira do IRO.Demonstra nisso, alegria e amizade ao que procura seu dorso ami-go.

Ei-lo troteando e galopeando na praça h (pica. Enquanto é dis-tendido, noto que sua pequenês desaparece. Começa a crescer ..._crescer... Avança para o primeiro obstáculo armado. Verdadeiromonstro colorido, que se torna infantil sob o magestoso salto doIRO. Outro mais adiante é o pi':óximo que ter-á de transpor. Emcadenciado galope, com franqueza de mestre, arrojo de "purosangue" (que ele não tem), e bem enquadrado, marca o salto. Le-vanta seus anteriores, encolhendo-os. Emprega o pescoço, baixan-do-o como em esforço vital. Um corpo no ar. Uma montueira depaus, que me representa tremer de medo. Novamente no chão. Re-toma sua andadura anterior. Segue saltando ...

- Chega por hoje, mourinho!

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Cavalo e cavaleiro confraternizam-se. Este acariciando-o, ecom tabletes de açúcar na mão oferece àquela que, sedento peloprêmio de sua maestria, os devora lambendo e babando a mão queo ouia.

Lá vai ele para o banho. Ainda percebo seu rítmico andar.Sempre sincronizado com a cola que levemente se agita. Cá e lá ...

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A ESTORIA DO ROGERIO

Estava em casa, sentado em minha poltrona favorita. Davagostosas baforadas em meu cachimbo holandês de porcelana, en-quanto lia Dostoievsky. "Recordações Ida Casados Mortos", para. ...ser mais preciso. Uma edição popular bastante condensada. Man-tem, no entanto, todo o vigor e horror das memórias de AlexandrePetrovitch Goriantchikof, publicada por Dostoievsky.

Absorvia-me com os "forçados" e suasdesv.enturas.Fui interrompido bruscamente. Meu garotinho pulou para

meu colo.- "Tá lendo, uma histólia papaiziu?- Estou, meu querido. Uma história triste ...- "Eu conto uma pá ti".- Então conta. Quero ver se é bonita.- "Ela uma vêz um cavalo blabo. Ia colendo na rua com o

sodado. Caiu dentlo do bulaco. Cavalo fez dodoi na péna i u soda-do botô meculio na péna do cavalo. Cavalo ficô boml Bacana!"

- Mas é uma estória muito linda, filhinho. Quem te ensinou?- "Rogélio sane, papaiziu!"E eu bem que sabia que a estorinha saira de sua cabecinha.

Não me consta que alguém lhe contasse algo similar.

* *

Hoje Dostoievsky sou eu. Não publico "Recordações da Casados Mortos". Publico recordações da casado pequeno vivo. Só nãodigo que Dostoievsky, hoje, é o meu Rogério, porque não creioque com apenas dois anos e dois mesesde idade (a de Roqériolesse

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escritor russo já soubesse fazer estória. E estória humana, com pé ecom cabeça.

Já sei! Acham que sou pai-coruja ... Mas também não fiz es-torinhas com dois anos de vida ...

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"PLATERO E EU"

Longe estou de querer fazer uma crítica literária. E aindamais em se tratando de uma obra de Juan Ramón Jimenez (Pl'~mio Nobel).

Mas lendo "Platero e eu" (volume II da Coleção Catavento daGlobo), sinto-me jovem, puro, alegre. Uma paz de espírito se apo-dera de mim. Percebo que vou aos poucos esquecendo tudo queme cerca. E meu pensamento parece flutuar nas paisagens inebriam-temente descritas por Jimenez. Cada passagem de "Platero e eu" é-bela e reconfortante. Vou-me identificando com os fatos e perso-nagens andaluzes, e passo a viver nessa sensível prosa poética ...

Eu era quem regressava com Platero quando caía a tarde deabril. "Tudo quanto era de ouro, no poente, se transformou desúbito em prata - uma alegoria limpa e luminosa, de açucenas decristal. Depois o vasto céu foi como uma safira translúcida, trans-mudada em esmeralda. Eu vinha triste ... " Platero, por certo,também. E eu, também ...

E realmente notável estar no cimo para ver a paisagem rubra:"Aí está o ocaso, todo em púrpura, ferido de seus próprios pu-nhais de luz, que o fazem sangrar. Ao explendor crepuscular, opinheiral verde se veste de vagos tons alaranjados. E a grama e asflorinhas, rubras e transparentes, embalsamam o sereno instantede uma essência úmida, penetrante e luminosa.

"Ficamos Plrtero e eu (e eu) extasiados ao crepúsculo verme-lho".

Continuo extasiado até agora. Mesmo com o fim de Platero.

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Mas neste momento em que o rememoro na "paisagem ru-bra" vou ficando rubro e este devaneio também. Ele pelo calor quelhe deram as maravilhosas visões de Jimenez da natureza, e que es-tão entre aspas. Eu, de cólera - já começo a sentir-me flutuando -porque nada mais posso dizer de "Platero e eu", senão:

- Leia-o ... Leia- ... Lei ... Lei ... Le ...

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MOSCA

A pior hora para fazer uma crônica é após o almoço, num diade calor.

Pego o lápis. Cheio de preguiça espicho a mão à uma folha depapel. Rabisco duas palavras. Quebro a ponta do diabo do lápls.:Mais preguiçoso ainda levanto da cadeira. No porta-casacos, tiro,do bolso de meu paletó, a caneta. Volto à mesa. Esfrego os olhos.

Zumbindo, faz uma volta alegre e 01 fmpica na minha cabeçauma mosca. Não faltava mais nada. Com todo este calor terei queespantar o inseto?

Acomodei-me sobre o papel. Lá vem a mosca. Risco o que àlapis havia escrito. Escrevo meia dúzia de frases a tinta.

- Até tu, caneta! Não tinhas outra hora para secar?- Saia daqui, inseto ingrato!Tudo me irrita. Quebro a ponta do lápis, seco a tinta da cane-

ta, a mosca Plaft! (Ainda te mato, raiol) Ela voou de minha testa.O suor corre em meu rosto. Olho o relógio. 14,10.- Só?A mosca pousa desta vez no meu braço. Como em passos de

samba, saltita entre os cabelinhos. Que coceira! Plaft! ... Cincodedos ficaram marcados nele. E nela? Nada ...

Calmamente faço a ponta no lápis. Inicio outra vez a crônica."Mosca". Sugestivo nome.

Ela de novo!Perco a "elegância". Tiro o lenço do bolso da calça. Passo pe-

la testa. Ficou encharcado. Ponho-me de pé. Aguardo este impo-nente inseto díptero. Ali vem ele cheio de alegria. Corro ao seu al-cance com o lenço na mão, para abatê-Ia.

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Perdi-o de vista.O Deus meu! Ah! pousou na minha orelha. Plaftl. .. A ponta

do lenço bate no meu ombro. Fico irritado. A mosca esquivando-se pousou sobre o papel onde escrevia suas aventu ras ... Pé antepé vou chegando à mesa. Sento-me na cadeira. Dou duas voltas aolenço no ar deixo-o cair sobre a mosca.

Matei-a. Pego novamente no lápis. A preguiça morreu comela.

Consegui escrever em paz ...

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PROCISSAO

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Por- trás dos vidros da ampla ~nela de um dos aristocráticospalacetes da Avenida Independência, a velhinha, embrenhada empensamentos sublimes, deixava sair de seus lábios tributos de lou-vor ao Senhor Rei do Universo. Quem sabe (JJêInto ela, com a maisforte fé de seu coração feminino, nIo pedia ao Pai Miser-icorólO-50 •••

Lágrimas saiam de seus olhos.. Era visível sua ansia em salta •..ajanela Como ela desejaria ser parte daquele milhar" de católicospor que ai f passava em acompanhamento -ã ProcissIo do Corpo deDeus ... Desde seu tempo de meninota, era a primeira vez que de-la não participava ... Suas pernas nJo mais se moviam ...

Comovedora cena. ConbJdo, sua .-asionomia nJo se mostravade todo sofredora. Ainda dispunha de forças nos dedos para rnexeI"as contas de seu rosário. De voz para conversar com Cristo ...

Por Ele esperava. Pediria bençãos para alguém. AI!JIém quemuito queria ver- com uma vida pura e cheia de saúde.

Mais um colégio cantando ••Hóstia Santa". Uma Associaçãode Moças ecoando o Padre Nosso. E"ISos coroinhas de vermelho.Antecipam o Santíssimo.

E o Corpo de Deus que se aproxima ...Sonindo a sexagenária senhora acompanhou a imagem com

05 olhos. Ergueu seus braços ao céu, corno numa prece desespera-da.

E aquele menininho bobo na calçada, vendo-a com as mãospara o ar apontou o dedinho inólCêldol" e fez alguns '"bang"."OOng", e deu Qosto-3ÕSgargalhadas. __ _

No entanto era por ele ~e a anciã orava . . _ Pelo seu únic'netinho. __

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A BRIGADA DE HOJE

OUTRORA MANOBRAS E COMBATESI HOJE "POLICIAQUEREMOS SER, NÃ PAZ E NA GUERRA! SO POLICIAlNADA MAIS!"

A Brigada Militar de hoje, deixou aquelas velhas lides milita-res que as situações de épocas remotas exigiam, para abraçar suasuperior destinação: POLICIAMENTO.

Se outrora um 29 RC vencia Honório Lemes num Combateda Conceição, hoje uma Companhia de Polícia permite que o po-vo, numa estação rodoviária ou ferroviária, num Aeroporto Salga-do Filho, embarque e desembarque livre de preocupações e veja amão amiga dum "Pedro ou Paulo" apontar: - ~ ali, meu Senhor!

Se outrora um Coronel Pilar dava vitórias à legalidade emCerrilhada ou Ipamoroti, hoje, um Regimento de Polícia RuralMontada vence moléstias, epizootias, e toda calamidade públicaque sem a vigilância do "aba larga" imperava na zona rural gaúcha.

Se outrora um 19 BC inebriava-se no sabor da vitória numKm 298, hoje, um Corpo de Bombeiros, dia e noite de olhos aber-tos, zela E PROTEGE o bem e a vida alheia do pavor do fogo.

Se outrora as situações exigiam a espada, hoje, a vida moder-na exige que a Brigada Militar se mantenha alerta para a existênciade ordem perfeita entre os homens de boa vontade.

E uma conseqüência do desenvolvimento do intelecto huma-no, que apreciamos. Armas em último caso. O povo reclama seusdireitos. A Brigada zela seuspertences enquanto isso.

Para tal, aí está ela, atendendo solicitações diversas para aju-dar a resguardar o direito do homem.

Se na foto da página anterior vemos uma cena de campanha,

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por volta de 1903, vemos metralhadoras aprestadas para as mar-chas bélicas, nas outras'vemos os brigadianos dos batalhões de ca-çadores, orgulhosos, resguardando navegações enquanto a classernarítirna reivindica o que de seu direito julgava.

Esta é a transformação radical que notamos na Brigada de.Ho]e, Nada de revoluções. Nada de lutas. Apenas policiais militaresresguardando direito, zelando patrimônios. f o século XX que evo-lui. E a Brigada Militar que abraça, com o aplauso do povo, a no-bre missão de POLrCJA. Polícia como o homem quer: defensora,ordeira, DE CONFIANÇA

• Refere-se às fotos publicadas na revista Briasd« Gaúcha.

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A PAZ CHEGOU NOS PAMPAS ...

365 DIAS DE POLICIAMENTO RURAL

Criado no dia 30 de setembro de 1956, o Regimento de Polí-cia Rural Montada completará em setembro próximo seu primeiroano de atividades. Completará 365 dias de Policiamento Rural nascoxilhas, canhadas e pampa gaúcho.

Neste curto espaço de tempo, os abas-largas já estão capacita-dos a nos transmitir um pouco dó triste panorama do interior pelosseus fe.itos maravilhosos e quase miraculosos.

Impregnadas de dor, devido ao estado em que encontraram apopulação rural, são as entrelinhas dos relatórios periodicamenteenviados ao comando do Regimento pelos policiais de abas-largas ..Foi lendo esses relatórios que ficamos contagiados da mesma dor.Conhecendo os alarmantes surtos de tracoma na infância rural, dobócio endêmico, subnutrição, analfabetismo, abigeato, desordens,mortes ... ficamos desejosos de escrever esta reportagem - paramostrar um trabalho anônimo que o povo glorificou ...

Indiscutivelmente para esta gente rural, os soldados desta uni-dade nova da Brigada Militar, do RPR Mont, tem sido mais do quedefensores, tem sido seus lídimos "heróis anônimos".

Numa homenagem justa, pois, a estes "heróis anônimos", epara mostrar ao leitor alguma coisa dos relevantes serviços presta-dos em prol da causa pública no hinterland, nestes quase 365 diasde polieiamento rural, pegamos um dos relatórios que chegarama sede do RPR, Montado do 39 Pelotão, sediado em São Gabriel ecomandado pelo 29 Ten. Oritz Morari Abiz, e mais alguns dosmuitos casos dignos de nota.

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039 PELOTAO DO 29 ESQUADRAO

o 29 Esquadrão do RPR Mont, com sede em Alegrete, desta-cou o seu 39 Pelotão para o rnunicfpio de São Gabriel, no dia 20de dezembro de 1956. Este Pelotão, passou a atender, com seusgrupos, os municfpios e distritos de São Gabriel, Dom Pedrito eLavras do Sul.

O 39 Pelotão é composto de 53 homens no total. São eles;1 - 29 tenente; 1 - 29 sargento; 7 - 39 sargentos; 2 - 39 sargen-tos motoristas mecânicos; 1 - 39 sargento enfermeiro-veterinário;12 - cabos de fileira; 28 - soldados de fileira; e 1 - soldado cla-rim.

SEUS PRIMEIROS TRABALHOS

Mal tinham os abas-largas do 39 Pelotão desencilhados os ca-valos para acantonar, um rosário de solicitações e queixas os colo-caram imediatamente em ação para a defesa do gaúcho. De suafamília. De seu patrimônio.

"Batendo na marca", sairam os abas-largas pelos diversos dis-tritos de São Gabriel. Diligências e mais diligências. Buscas e maisbuscas. O fruto da fatigosa missão surgiu - surpreendente.

Do dia 20 de dezembro de 1956, até o dia 28 de fevereiro de1957 (dois meses e 10 dias), registramos só em São Gabriel os da-dos que seguem:

- gados roubados: localizados e restitufdos aos seus proprie-tários: 88;

- eqüinos roubados: localizados e restitu (dos aos seus pro-prietários: 9; .

- patrulhas para policiar carreiras de cancha reta: 7;- armamento apreendido em reuniões e batidas: revólveres 8;

facas diversas: 61; facões de mato: 11 e munições: 20 balas;_. captura de foragido: 1;- socorros de urgência prestados: 24;- alguns medicamentos usados: Penicilina 400.000 unidades,

Dibiotil, Dechelim, Anecrozam forte - Polidase Labor-Agocholine, Lizine, Sulfa em pó, pomadas diversas, Linfo-

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cilim, água oxigenada, iodo, mercúrio-cromo;- condução de enfermos em jipes: 5;- busca de cadáver: 1 (em uma lagoa);- tropas apreendidas por falta de documentação !:-:ga!ou sus-

peita: 4;- levantamento de marcas e sinais dos animais C" 84 fazen-

das.

5 DESTACAM ENTOS

Os cinco primeiros destacamentos policiais rurais do 39 Pelo-tão foram instalados em: Catuçaba, Tiarajú, Azevedo Sodré, Sus-piro e lbaré, respectivamente a 6, 8 e 9 de janeiro deste ano, os 3primeiros; 7 e 10 de fevereiro deste ano, os dois últimos.

Praticamente são de menos de um mês os dados dos traba-lhos efetuados por estes destacamentos, que registramos em suasrespectivas zonas. Por serem assombrosos, e demonstrarem a lacu-na que preencheu o Regimento de Pol ícia Rural Montada, soma-mGS, os números dos 5 destacamentos e os trouxemos ao conheci-mento público:

- patrulhas para policiar carreiras de cancha reta: 9;- patrulhas noturnas e diurnas {ronda de campos e corredo-

res): 50;- elementos detidos: 7;- queixas recebidas: 45;- ocorrências atendidas (diversas): 8;- patru lhas em salões de bailes: 15;- armamento apreendido em reuniões e batidas: revólveres:

6; facões de mato: 8, facas diversas: 25;- levantamento de marcas e sinais dos animais de 45 fazen-

das;- patrulhas em festas públicas: 2;- escoltas para conduzir detidos: 2;- levantamento de local de crime: 1;- IPM instaurado: 1;- socorros de urgência prestados: 28;- empréstimos de pequenas importâncias de dinheiro para

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compra de medicamentos de urgência: diversos;- busca de réus foragidos da justiça: 4;- Tropas apreendidas por falta de documentação legal ou

suspeita: 3.Os dados que acima publicamos são indestrutíveis e puros. Ti-

rados de fontes oficiais, falam pelos abas-largas. Dizem da nobrezade seus serviços, do carinho e abnegação com que cumprem suasatribuições e ordens, do quanto já Ihes são gratos os homens dacampanha e o Rio Grande do Sul.

Mas vamos um pouco mais adiante. Vejamos alguns dos mui-tos CASOS DIGNOS DE NOTA:

CAES OVElHEIROS

Em Serro do Ouro, município de São Gabriel, o proprietárioda Estância Santa Helena vinha alarmando-se com o desapareci-mento periódico das ovelhas do seu rebanho.

Quando o número atingiu a 31 foi dado parte pelo interessa-do ao Delegado de Polícia. Em seguida os abas-largas começaram aagir.

Ao término de dois dias de trabalho, constataram os nossosmontadas a falta de 31 ovelhas. Percorrendo o campo da SantaHelena encontraram, no fundo da estância uma sanga. Em suasmargens lfrnpidas 10 ovelhas mortas foram localizadas. Examesminuciosos nos animais mostraram sinais de mordidas de cachorrosovelheiros. A esta altura desaparecera a suspeita de roubo.

O morador mais próximo de Santa Helena, possuía dois óti-mos cães ovelheiros soltos em seu campo. Ele mesmo já encontraraduas ovelhas suas mortas pelos seus cães.

Como não houvesse cachorros na Estância Santa Helena, fi-cou certo que por lá agiam os cães do vizinho.

De comum acordo os fazendeiros resolveram aceitar a suges-tão dos abas-largas: - prenderam por 30 dias os cães. Não maisapareceram ovelhas mortas. E, para solucionar definitivamente osuposto roubo de ovelhas, os cachorros foram sacrificados por seupróprio dono.

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"TEJA PRESO", CASTELHANOI

o jornalista Josué Guimarães, na reportagem "A sombra doaba-larga domina o chão dos parnpas", publicada na revista MAN-CHETE, contou este fato, que já se tornou singular, a fim deexemplificar os belos serviços dos montadas:

"0 soldado de aba-larga curtira quatro noites e quatro dias naespera. O abigeatário reiúno havia de vir na escuridão da noite ouno clarear da madrugada. E veio mesmo, nas trevas. Apeou asso-biando, o desalmado. Tirou da guaiaca o alicate e se aprontou paracortar o primeiro fio. Então, num de-repente, o Montada pulou damoita que já tinha a forma do corpo, apontou o mosquetão e deuvoz de "teja preso". Num relancim reconheceu Castelhano, velholadrão de gado de São Gabriel e redondezas. Daí o homem saltoucomo cobra em bote, puxou do fala-verdade e atirou no aba-larga.Um, dois tiros. E correu assustado para a égua que escarvava ochão, montando de golpe. Aí o Montada atirou no animal comorecurso, e o pobre se pranchou de comprido. Mas Castelhano ga-nhou o mato como um corisco e desapareceu. Na volta, arreliado,o soldado deu conta ao comandante do fracasso:

- E a í atirei na égua e ele ganhou o mato ...- Por que não atirou no Castelhano? - perguntou o coman-

dante para experimentar.- Porque a ordem vossa, meu comandante, é de não ma-

tar ...A história é verídica e se passou com um homem da Polícia

Rural Montada num dia qualquer, num corredor da campanha, en-tre as coxilhas do Rio Grande. Ela serve para dizer melhor do espf-rito dos homens que integram a nova unidade da Brigada Militar."

DURA LEX SED LEX

Quando entraram os abas-largas em ação no município deAlegrete, surgiu o primeiro "primoroso" caso: desvencilhar pode-rosa quadrilha de abigeâtários. O desenrolar da busca dos ladrõesde gados e ovelhas, estranho para os que vivem nos grandes cen-

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tros, fez os jornais abrirem manchetes para atrair leitores. O pampagaúcho passou a ser imaginado como um "far-west" em cinemas-cópia. Chegaram a chamar de "cow-boy" o aba-larga, contra o queprotestamos solenemente. Aos abas-largas, se quiserem, que cha-mem de guasca, Indio, - de gaúcho. Nosso folclore possue figurasde respeito e mais belas do que qualquer outro pago. Não apele-mos aos vizinhos no norte para adjetivar o arrojo dos soldados daQuerência, dos soldados da Brigada Militar.

Por serem gaúchos os abas-largas, sem receio, desmoronarame apontaram como maiores abigeatários de Alegrete, uma quadri-lha respeitada por ser composta de "homens tidos e havidos naopinião pública".

Depois do término do rigoroso Inquérito Policial Militar, noqual verdadeira procissão de depoentes desfilou ante os elementosdo RPP Mont, foi decretada a prisão preventiva dos indiciados.

633 ovelhas e 85 vacuns haviam sido roubados e foram apre-endidos. Cr$ 447.700,00 o valor do roubo. Otima fórmula (crimi-nosa) de enriquecer depressa. Formaram dois rebanhos roubadosde diversos proprietários. "A fórmula deu certo até o dia que a Po-Iícia Rural Montada (em boa hora) entrou em cena".

Apelaram. "Dura Lex Sed Lex". Presos. Vitória incontestedos abas-largas em prol da honestidade e paz na querência.

ANJOS- DA-G UAR DA

Muitos outros casos não menos importantes e inéditos na his-tória policial do Rio Grande do Sul, poderiam desfilar nesta repor-tagem-relatório". Não os relatamos. "Para o bom entendedor meiapalavra basta", e para o bom gaúcho, o riograndense puro do inte-rior, os abas-largas já se caracterizaram como homens de moral ele-vada, disciplinados de intenções nobres, quer na moral, quer nomodo de ação.

Hoje, o fardamento caqui dos abas-largas indica nas coxilhas ecanhadas a aproximação dos novos e primeiros serviçais e providen-ciais ANJOS-DA-GUAR DA. "Inspiram sempre confiança aos ho-mens do trabalho e da produção. Espantam desde logo os ladrõesde gados", epidemias e o desamparo.

E a lei que se aproxima. Não para restringir ou punir. Mas pa-ra orientar, prevenir, amparar ...

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A LITERATURA POLICIAL BRASILEIRA PERDEU UMVALOR E A POLICIA MONTADA UM OFICIAL

Em 20 de Março de 1961 apresentamos, neste GABINETE,um artigo escrito, especialmente, pelo TENENTE CARLOS JONA-THAS SPALDING sobre a POLfCIA MONTADA DO CANADA- O tenente Spalding pertencia à Brigada Gaúcha do Estado doRio Grande do Sul, corporação brasileira correspondente àquelaorganização policial canadense.

De u'!la freqüente troca de correspondência nasceu entre nósuma sincera amizade, de tal modo que a notfcia da sua morte, em14 de Outubro, nos impressionou vivamente. Com tão triste acon-tecimento, perdemos um valioso e inesquecível amigo.

O tenente Spalding era um apaixonado da literatura policial echegou a enviar-nos, em tempos, um. conto que ele considerava oseu "gatinhar" literário no trilho da ficção detectivesca.

Adaptamos o conto à Rádio e transmitimo-Io no QuintoPrograma, mas roubamos-lhe, então, o seu sabor caractedstico, pe-la dificuldade da interpretação de muitos vocábulos gaúchos.

Hoje, porém, na singela homenagem que desejamos prestar aoTENENTE CARLOS JONATAS SPALDING, tomamos a iniciativade o publicar "NA HORA DO CRIME", tal como nos foi remeti-do. Puro e real, violento e sincero no "Iinguajar sul-riograndense",como Spalding nos dizia na carta que nos foi remetida há precisa-mente um ano.

A.V.

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A CARTA

Porto Alegre, Out., 22, 1960.Meu estimado amigo Varatojo.

Com esta estou remetendo para a apreciação do grande ami-go, um continho meio policial. E. ele um dos meus primeiros traba-lhos dentro do tema ficção policial. Espero que você me envie suaapreciação sincera sobre seu conteúdo.

Em princípio este conto vai dedicado ao amigo, pois muitoembora você não imagine, quem me incutiu o gosto de escrever umconto policial foi o amigo. A leitura constante de seus interessan-tes trabalhos e as ricas seleções contidas em "ABC Policial", conta-giaram-me. Assim vai anexo a esta liA hora do crime ... ".

Por se tratar de um caso supostamente ocorrido no interiordo Rio Grande do Sul, e por ser escrito por um gaúcho, o contocontém vários vocábulos do linguajar sul-rio-grandense. Para facili-tar ao amigo, os termos gaúchos empregados estão em tipo redon-do. Sua "tradução" para a I(nqua portuguesa segue abaixo.

Carreira - O mesmo que corrida de cavalos, com a diferençade ser em cancha reta. Quando correm mais de dois cavalos a car-reira toma a designação de "penca".

Tordilho - Cor de animal cavalar ou muar em que predominae pelo branco, havendo diversas variedades tordioho-negro, tordi-lho-vinagre ...

Zaino - Pelo de animal cavalar mais escuro que vermelho.Boliche - Pequena casa de negócio na campanha, onde no

gera I se vende bebida.Quadra - Medida linear e de superfície. E. também a extensão

tomada por base para as carreiras de cancha reta, que vai do míni-

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mo de duas ao máximo de seis quadras. A quadra de carreira é de132 metros.

Canha - Cachaça, aguardente.Estrago - Vocabulário popular significando despesa.Mulher velha - Expressão popular carinhosa, significando a

esposa, companheira.Mate - Bebida resultante da infusão das folhas da Ilex. (Veja

adiante chimarrão).Palheiro - Cigarro feito com fumo picado de rama e envolto

em um pedaço de palha de milho seca.Cobres - Expressão popular significando dinheiro.Pampa - Nome que com freqüência os filhos dos outros Esta-

dos do Brasil dão às campinas do Rio Grande do Sul - camooaberto, planura.

Chimarrão - Mate sem açúcar tomado em cúia; mate amargo.E a bebida predileta dos gaúchos.

Sarro - Denominação popular dada à crosta que fica na bocaquando se bebe muito.

Adaga - Arma branca, mais larga e maior que o punhal.Cuia - Porongo, ou mais propriamente, cabeça de porongo,

onde se prepara o mate para ser tomado com a bomba.Bomba - Canudo de prata ou de qualquer outro metal, que

se introduz na cuia para se tomar mate. A bomba tem em uma dasextremidades um bojo crivado de furinhos, e na outra uma parteachatada por onde se suga o mate tomado em cuia.

Vivente - (Veja só, Varatojo) palavra portuguesa muito usualno Rio Grande do Sul, e ao que me consta, em desuso nos outrosEstados. Significando pessoa, indivfduo. .

Estrebuchar - Debater-se, agitar-se.Borracha - O que se dá ao v fcio da embriaguês, o que está

ernbriaqado..Bandas - Direção onde fica uma localidade em relação a ou-

tra.Chimarrear - Tomar chimarrão.Cancha - Campo.

Meu caro Varatojo, para "traduzir" estas palavras para vocêutilizei o "Vocabulário Gaúcho", de Roque Callage, e o "Voca-

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bulário Sul Riograndense", de Carlos Morais. Aqui no Rio Grandedo Sul nós possuímos mais de 2000 vocábulos, e o interessante éque eles são usados na linguajar corrente não só do interior comotambém da capital.

Quando em 1958 estive no Rio de Janeiro, São Paulo e Per-nambuco, às vezes em virtude de certas palavras que eu emprega-va não era compreendido. Então dava-me conta que estava empre-gando um regionalismo. O mesmo ocorre nos outros Estados daFederação, pois dado a extensão do Brasil, e a origem da popula-ção, vão surgindo vocábulos e mais vocábulos.

Bem, Varatojo, não lhe vou roubar mais tempo. Aqui tudocorre calmamente e o calor já começou a aparecer. Andamos entre23 a 30 graus centigrados.

Com minhas recomendações aos seus familiares, envio-lhe umabraço muito amigo.

SPALDING

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O CONTO

NA HORA DO CRIME ...

Por C. JONATAS SPALDING

Em verdade a carreira tinha sido um espetáculo maravilhoso.O tordilho do seu Gomercindo ganhara por um pescoço ao zainodo Epaminondas.

Seu Epaminondas pagara o valor da aposta e desaparecera.No boliche, seu Gomercindo festejava a vitória com os ami-

gos. Puderai Ganhar numa carreira de 2 quadras e meia 200 con-tos, já dava para festejar.

Parecia mesmo que Gomercindo sabia que esta seria sua últi-ma festa. Estalava a I(ngua a cada trago de canha, com um máximode imponência. Gargalhava gostosamente! Contava vantagens emais vantagens. E os amigos, que nestas ocasiões nunca faltam, oendeusavam. Era um Deus nos acuda de vivas ao seu Gomercindo evivas ao tordilho do seu Gomercindo.

A noite já ia alta e os amigos de bar diminuiam. Seu Gomer-cindo pagou o "estrago". Deu as boas noites aos que sobraram esaiu estrada fora em passo miúdo.

A alegria ficara no boliche. Ele, cheio de álcool, seguia cabis-baixo, pensando na mulher velha que o esperava em casa, todas asnc51tes,com um mate espumante.

Com as mãos nos bolsos da calça apalpava os cento e noventae tantos contos que restavam da brincadeira.

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E calmamente seguia a longa caminhada para casa. Caminha-da que seria a derradeira, porque assim seu Epaminondas decidira.Caminhada que não o levaria ao seu lar, pois seria interrompida nocaminho para que ele não mais caminhasse, não mais visse, nãomais falasse ...

*

Seu Epaminondas sabia que Gomercindo a esta altura estavade retorno a casa. Odiava-se por ter perdido a carreira e 200 con-tos. Odiava-se muito mais por saber que no boliche o seu dinheiropagara a farra de seu antagonista. Que lá ele era objeto de mofa.Que lá gozavam a derrota de seu cavalo. E ele se sentia humilhado,sedento de vingança.

Havia já três horas que estava na espreita. A figueira centená-ria da encruzilhada o abrigava, juntamente com seu ódio. Apertavana mão direita o punhal. Com a esquerda, em concha, levava aoslábios, constantemente um palheiro que não era fumado, e simmordido pela raiva que o envolvia.

*

E o Gomercindo continua seu trajeto. Nem sequer olha paraos lados ou para trás. Se ele imaginasse que sua vida estava por fin-dar, talvez procurasse dar, com os olhos ao menos, um adeus à na-tureza. Mas ele não sabe que a morte o espreita. Ignora que jamaisveria o Sol, que esta noite triste, sem Lua e estrelas, seria o cenáriodo seu assassinato.

E o Gomercindo caminha lentamente, apalpando os "cobres"abarrotando no fundo dos bolsos. Vai meio que "costurando" aestrada dura e seca, pois o álcool cada vez se manifesta mais.

Que triste fim, caminhar lentamente e cambaleante, quasesem saber que caminha para a morte que viria muito breve, sorra-teira ... E por não saber que vai de encontro à morte, não ter aoportunidade de dizer adeus à vida, às árvores, ao pampa, ao céunegro, a terra que o haveria de cobrir ...

Gomercindo ainda consegue pensar. Não na morte, mas nochimarrão que a mulher velha sabe tão bem preparar e que lhe tira-

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rá o "sarro" do álcool. Se soubesse que uma adaga ponteaguda efria o aguarda a pouco menos de uma quadra, não pensaria apenasem ter a cuia na mão. Pensaria e desejaria seguir outra estrada. quenão este corredor da morte ... Fugir para chegar a casa ... Parabeijar mais uma vez sua mulher, abraçar e dar mais uma vez abênção aos seus oito filhos, dar umas apalpadelas no "tordilho" in-venc (vel da região...

Seu Epaminondas tinha lido num jornal da capital que quan-do se crava um punhal bem no coração do vivente. ele cai de todoe só "estrebucha" por uns trinta segundos, sem poder reagir.

E seu punhal atravessaria o coração de Gomercindo. E ele nãoteria dificuldade nenhuma, pois Gomercindo devia cruzar pela fi-gueira bastante borracho para não reagir.

Era só cravar o punhal, tirar' o dinheiro dos bolsos, jogar aadaga no arroio e correr campo fora. Nin~ém descobriria o seucrime. Nem mesmo o seu cabo Izidoro Padilha do DestacamentoPolicial da Brigada Militar, pois o seu cabo sabia que ele era um ho-mem de bem ...

Enquanto pensava e pensava, o Gornercindo ia se chegando.Agora Epaminondas apertava mais ainda o punhal. pois já divisavao vulto cambaleante de sua v(tima.

"

E o Gomercindo está a uns 50 metros da morte e não sabe ...Será que Deus não lhe ilumina os miolos? De que adiantaria?

Gomercindo gargalharia de Deus, pois não creria que seria estrebu-chado nem na adaga de Epaminondas, nem da de ninguém, poisera muito macho.

Mas o fato seria consumado e ele, borracho como estava, nãoteria forças para se defender.

Como que um fantasma, um vulto surge na sua frente. Osolhos de Gomercindo, meio cerrados, meio abertos, vêem reluziralgo na sua frente ...

Sente pesada mão segurar-lhe o braç-oe ouve-que lhe -falam:

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- Eu ainda não lhe tinha cumprimentado pela carreira, seuGomercindo, e o faço agora. Como prêmio vou lhe acompanharaté sua casa ... o senhor parece que se passou no festejo ...

E o cabo Izidoro, com a fivela de seu cirrturão sempre reluzin-do, interrompeu a ronda que fazia por aquelas bandas, para entre-gar Gomercindo à sua mulher, e dar umas chimarreadas antes deretornar ao serviço que interrompera na encruzilhada da figuei-ra ...

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FORTE "SAN LORENZO":

ABRIGO DE NOBRES, PIRATAS E CRIMINOSOS

Homenageando a memória do saudoso escritor riograndenseTenente Carlos Jonatas Spalding, falecido a 14 de outubro p. fin-do, inserimos em nosso jornal de hoje, a bela crônica de sua lavra,intitulada "Ponte San Lorenzo", escrita alg.Jmas semanas antes doseu fatal desenlace, e que foi a última e a primeira de uma série decrônicas que estava a escrever sobre o Canal do Panamá, onde este-ve e fez um curso especial de Pol ícia Militar:

Quando no século XVI, com o seu descobrimento, a Américapassou a ser verdadeira "corrida ao ouro" para os europeus, o Rei..da Espanha houve por bem proteger suas possessões na AméricaCentral. Para tal, em 1597 Filipe 11 iniciou as obras de um forte noestratégico ponto situado à margem da desembocadura do rio Cha-gres no Oceano Atlântico, na hoje República do Panamá.

Pouco eficaz, no entanto, foi a instalação de tropas espanho-las neste forte batizado com o nome de San Lorenzo, frente à au-daciosa e aventureira pirataria da época.

Em 1668 Henry Morgan, pirata inglês, saqueava Porto Bello,nas cercanias, e três anos mais tarde conseguia tomar San Lorenzoonde seus elementos ficariam instalados para uma reorganizaçãocom o fim de destruir por fogo a cidade de "Panamá, le vieja".Depois de saqueada por Morgan, ficou esta região praticamenteabandonado até princfpios do século XV 111.

Em 1718 o Forte de San Lorenzo é restabeleci do para a Es-

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panha pelo Vice Rei de Nova Gramada, para ser, em 1740, demo-lido pela poderosa esquadra inglesa comandada pelo AlmiranteVernon.

Doze anos mais tarde foi o forte San Lorenzo reedificado emsua forma atual. Posteriormente foi utilizado como penitenciária,o que condizia perfeitamente com a época. Acredita-se que porvolta do ano de 1846, os presos deixaram esta casa que ficou noabandono até 1955.

Desde 55 é mantido e conservado pelas Unidades do ExércitoNorteamericano sediadas na região denominada Canal Zone por es-tar este forte localizado nas proximidades do Canal do Panamá.

Apesar de ser uma área insegura dado já se encontrarem diver-sas edificações em ruinas, o Forte San Lorenzo é um dos recantosmais pitorescos da região, atraindo grande número de turistas. Emsuas imediações existem logradouros para piqueniques e churras-queadas, pois já em dois anos consecutivos os gaúchos que vão aoCana! Zone freqüentar na Usarcarib School, o Curso de PolíciaMilitar, confraternizam com seus colegas de todos os damaispaíses da América, oferecendo-lhes churrasco bem riograndensecom seu típico aroma que por certo fez acordar espíritos adorme-cidos de nobres, piratas e criminosos que por ali teriam perdidoa vida.

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Ten Carlos Jonatas Borges Fortes Spalding

FOI UMA AFIRMAÇAO DE INTELlGENCIA E DEDICAÇÃO ASUA TERRA E SUA GENTE

O mundo lntelectualrioqrandense e a Brigada Militar particu-larmente, acabam de sofrer profundo abalo e perda irreparável como prematuro falecimento do tenente Carlos Jonatas Borges FortesSpalding, elemento de escol da mil Icia estadual e uma das promis-soras esperanças das letras do extremo meridional do Brasil.

Jonatas Spalding faleceu em Porto Alegre, vitimado por insi-diosa enfermidade contra a qual foram incapazes todos os recursosda medicina.

Os leitores de A CIDÔ.DE estavam habituados à leitura dosbelos trabalhos do intelectual extinto, eis que durante todo o pri-meiro ano de existência do jornal Jonatas Spalding esteve presenteem nossas colunas com preciosas colaboração, às vezes de admirá-vel sentido literário.

Jonatas Spalding, por seus estudos e por seus trabalhos, se fi-zera admirado nos grandes centros universais onde os modernos ehumanizados métodos de pai feia adquirem, à cada hora, mais am-plos caminhos ao seu aperfeiçoamento. E que o intelectual riogran-dense vivia preocupado em melhorar as práticas policiais em rela-ção à criatura humana, tendo escrito e publicado em A CIDADEos "X mandamentos do Brigadiano" que se constituiram em autên-ticas lições de austeridade, de equihbrio e de humanização nas re-lações entre policiais-militares e as populações.

Terminado o curso de humanidade no Colégio Nossa Senhoradas Dores, Jonathas Spalding ingressou no curso de oficial da Bri-gada Militar completando sua formatura em 28 de julho de 1956.

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Foi o orador de sua turma.Durante sua curta atuação no mundo das letras, Jonatas

Spalding deixou dois magnificos trabalhos especializados: "X Man-damentos do Brigadiano" e "Serviços de PoHcia Militar", que al-cançaram merecida repercussão não apenas entre os profissionaisdo policiamento como entre a população apreciadora de bons tra-balhos. Era membro da "Federation Internacional e des Fonction-naires Supérieurs de Police" e possuia o "Curso de Delegado de Po-Ircla Militar" pela "Militarv Police Officer Course", do Panamá.

O tenente Carlos Jonatas Borges Fortes Spalding, que integra-va a Casa Militar do governador Leonel Brizola, era casado com aexma. sra. d. Noris Salerno Spalding, tendo deixado dois filhos,Rogério e Magda.

Era filho do escritor e historiador riograndense Walter Spal-ding e de sua esposa a exma. sra. d. Aida Borges Fortes Spalding.

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•Cel LOURIVAL R. SOBRAL I

HOMENAGEM A UM BRIGADIANO

Falando em relações públicas, ocorreu-me falar sobre um ra-paz extraordinário que passou por aquele serviço e que pela sua ab-negação, capacidâde produtiva, amor à tropa e concentração aotrabalho, foi o brigadiano que mais produziu em menor espaço detempo. Vftima de súbita moléstia, faleceu aos 27 anos de idade,quando se revelava um dos mais brilhantes oficiais da B. M. Suasproduções oferecidas à Corporação, aparecem em destaque, naspublicações das revistas da França! Sua passagem pelo CFO (ondeingressou depois de servir por mais de um ano como soldado, pornão se conter na espera da abertura de matrícula) deixou uma tri-lha de exemplos a seguir. Na Sociedade Acadêmica e Grêmio Lite-rário, foi dos que mais realizou. A Exposição que a Brigada Militarfez no sanguão do Edifício Mallet, em 1959, teve na sua capacida-de e espírito organizador, um impulso decisivo na sua apresenta-ção. Estive, por mais de uma vez, na salinha do sub-solo do Q.G.em que ele, dois sargentos e um soldado, preparavam dfsticos ilus-trados com fotografias e quadros com farta demografia brigadiana.A esse extraordinário oficial que se chamou Carlos Jonatas BorgesFortes Spalding e que para nós era o "Caloca", rendemos o nossopreito de saudades, neste relato! - Pois falar na história da Briga-da, sem mencionar um dos expoentes máximos da nova geração,seria negar ~ valioso reflexo de virtudes que ele soube espargir e si-lenciar os inestimáveis serviços prestados por esses jovens da Bri-gada de hoje! Seria olvidar um jovem que madrugou nas qualidadesbrigadianas! Combalido, convalecendo de grave intervenção cirúr-gica, onde ficara sem um rim, apresentava-se ao seu chefe, dizendo-

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se apto para o serviço! E meses após, já no leito de morte, onde fuivisitá-I o, produzia para a Brigada! Para concretizar minhas afirma-ções, vou citar o livrete que mereceu correr dois mundos para sertranscrito na revista de maior tiragem da França! Foi a obra que oconsagrou: "OS DEZ MANDAMENTOS PARA O BRIGADIA-NO":

I - Fazer prevalecer a prevenção sobre a repressão.II - Empregar sempre o bom-senso.III - Estar permanentemente a serviço da sociedade.IV - Ser um servidor público no mais amplo sentido da pa-

lavra.V - Ser cortês e delicado até com os delinqüentes.VI - Ser exemplo para jovens e adultos.V II - Aprimorar seus conhecimentos técnico-profissionais.VIII - Guardar zeloso o tesouro das tradições brigadianas.IX - Jamais macular a farda da Brigada Militar.X - Ser fiel a si mesmo, ao serviço, à Pátria e a Deus .. . . Ser conscientemente fiel à causa que abraçou é uma obri-

gação moral que o brigadiano deve ter para consigo mesmo.No mundo conturbado em que vivemos, os subornos, as ten-

tações e os caminhos que levam ao mal a todo momento surgemante o brigadiano.

Quase que são precisos esforços extra-humanos para afastá-los.

Estes esforços o brigadiano tem de fazer para ser fiel a si mes-mo, como homem bem formado, honesto e exemplo de virtudesque é a sociedade.

Ser fiel a si mesmo é ser fiel ao serviço, que necessita do bri-gadiano; é ser fiel à Pátria, que necessita do serviço; é ser fiel aDeus, que quer paz entre os homens de boa vontade".

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OUTRAS OBRAS DA

r

COUÇÁO

150anosBRIGADA MIUTAR

u

ESBOÇO HISTORICO DA BRIGADA MILITAR DO RIO GRAN-DE DO SUL - Volume III - Aldo Ladeira 'Ubeiro

CAUSOS DO GAÚCHO FARDADO II - Gelson Vinadé - ValneiTavares- Ubirajara Anchieta - José Cassales

CHARLA POLICIAL - Crônicas - Carlos Joanathas Spalding

II ANTOLOGIA DE POETAS BRIGADIANOS -José Hilário .fie-tamozo

BRIGADA MILITAR DO RIO GRANDE DO SUL - Um monu-mento de tradições - A Ido Ladeira Ribeiro

SIM OU NÃO - Romance - Jehu Thlbaro Marques da Silveira

MARCA DE CASCO - Conto Infanto Juvenil - Aldira Correa Re-tamozo

O ABA- LARGA - Revista em Quadrinhos - Oritz Morari Abiz eAntonio Telvio Oliveira

SEIS COMBATES E UMA INVASÃO - Hélio Moro Mariante -Fernando O. M. O'Donnel - Antonio Augusto Fagundes -Coralio B. Cabeda - Orestes Carneiro da Fontoura - Audix-ford A 1meida Coronel - Apparlcio Silva Rillo (Coordenação:José Hilário Retsmozo).

SAR ILHOS MILlCIANOS - Hélio Moro Mariante

DE PRONTIDÃO - Causosbrigadianos - Hélio Moro Mariante

MEMORIAS DE 93 - Diário do Cel PILLAR - Hélio Moro Ma-riante

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MEMOR IAS DO PITOR ESCO - Crônicas - Antonio Silveira daSilva

NOTfCIAS HISTORICAS' ~Jo$é Luiz SilveiraO PATRULHEIRO URBANO -Cel NiloA HUMANIZAÇAO DA EFICIENCIA POLICIAL - Esmeralda

Fonseca Filho

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