Cap tulo 6 Modelando a Vari^anciaCap tulo 6 Modelando a Vari^ancia 6.1 Introdu˘c~ao Nos modelos...

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Cap´ ıtulo 6 Modelando a Variˆ ancia 6.1 Introdu¸c˜ ao Nos modelos vistos at´ e aqui a variˆ ancia dos erros foi assumida constante ao longo do tempo, i.e. V ar( t )= E( 2 t )= σ 2 . Muitas s´ eries temporais no entanto exibem per´ ıodos de grande volatilidade seguidos de per´ ıodos de relativa tranquilidade. Nestes casos, a suposi¸ ao de variˆancia constante (homocedasticidade) pode n˜ao ser apropriada. Na verdade, embora a variˆ ancia incondicional dos erros ainda possa ser assumida constante, sua variˆancia condicional pode estar mudando ao longo do tempo. Al´ em disso, em muitas situa¸ c˜oespr´ aticas tem-se interesse em prever a var- iˆancia condicional da s´ erie al´ em da s´ erie propriamente dita. Por exemplo, no mercado de a¸ oes o interesse ´ e n˜ ao apenas prever a taxa de retorno mas tamb´ em a sua variˆancia ao longo de um certo per´ ıodo. Esta variˆ ancia condicional ´ e tam- em chamada de volatilidade. Algumas referˆ encias para este cap´ ıtulo s˜ao Taylor (1986), Franses (1998), e Tsay (2002). Exemplo 6.1 : Nas Figuras 6.1 e 6.2 os gr´aficos apresentam indices de pre¸ cos di´arios de fechamento de algumas bolsas de valores europ´ eias: DAX (Frankfurt), SME (Su´ ı¸ ca), CAC (Paris) e FTSE (Londres). Exemplo 6.2 : Na Figura 6.3 os gr´aficos apresentam as taxas de cˆambio di´ arias do D´ olar Australiano, Libra Esterlina, Dolar Canadense, Florim Holandes, Franco Frances, Marco Alem˜ ao, Iene Japones e Franco Sui¸ co, em rela¸ ao ao Dolar Amer- icano, enquanto nos gr´ aficos da Figura 6.4 est˜ao os logaritmos das taxas de vari- plot(EuStockMarkets, xlab=”, main=”) Figura 6.1: Indices de pre¸ cos di´arios de fechamento de bolsas de valores europ´ eias: DAX (Frankfurt), SME (Su´ ı¸ ca), CAC (Paris) e FTSE (Londres). 78

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Capıtulo 6

Modelando a Variancia

6.1 Introducao

Nos modelos vistos ate aqui a variancia dos erros foi assumida constante ao longo

do tempo, i.e. V ar(εt) = E(ε2t ) = σ2ε . Muitas series temporais no entanto exibem

perıodos de grande volatilidade seguidos de perıodos de relativa tranquilidade.

Nestes casos, a suposicao de variancia constante (homocedasticidade) pode nao

ser apropriada. Na verdade, embora a variancia incondicional dos erros ainda

possa ser assumida constante, sua variancia condicional pode estar mudando ao

longo do tempo.

Alem disso, em muitas situacoes praticas tem-se interesse em prever a var-

iancia condicional da serie alem da serie propriamente dita. Por exemplo, no

mercado de acoes o interesse e nao apenas prever a taxa de retorno mas tambem

a sua variancia ao longo de um certo perıodo. Esta variancia condicional e tam-

bem chamada de volatilidade. Algumas referencias para este capıtulo sao Taylor

(1986), Franses (1998), e Tsay (2002).

Exemplo 6.1 : Nas Figuras 6.1 e 6.2 os graficos apresentam indices de precos

diarios de fechamento de algumas bolsas de valores europeias: DAX (Frankfurt),

SME (Suıca), CAC (Paris) e FTSE (Londres).

Exemplo 6.2 : Na Figura 6.3 os graficos apresentam as taxas de cambio diarias

do Dolar Australiano, Libra Esterlina, Dolar Canadense, Florim Holandes, Franco

Frances, Marco Alemao, Iene Japones e Franco Suico, em relacao ao Dolar Amer-

icano, enquanto nos graficos da Figura 6.4 estao os logaritmos das taxas de vari-

plot(EuStockMarkets, xlab=”, main=”)

Figura 6.1: Indices de precos diarios de fechamento de bolsas de valores europeias:DAX (Frankfurt), SME (Suıca), CAC (Paris) e FTSE (Londres).

78

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6.1. INTRODUCAO 79

plot(EuStockMarkets, xlab=”, main=”, ylab=”, plot.type=’single’)

Figura 6.2: Indices de precos diarios de fechamento de bolsas de valores europeias:DAX (Frankfurt), SME (Suıca), CAC (Paris) e FTSE (Londres).

acao (retornos diarios). O perıodo amostral vai de 31 de dezembro de 1979 a

31 de dezembro de 1998. Uma caracterıstica comum nestes retornos e que em-

bora as medias parecam ser aproximadamente constantes as variancias mudam

ao longo do tempo. Na Figura 6.5 estao os histogramas com uma curva normal

superposta para os mesmos dados (retornos). Pode-se notar que muitos valores

aparecem nas caudas das distribuicoes. Finalmente, nas Figuras 6.6 e 6.7 temos

as autocorrelacoes amostrais dos retornos e dos retornos ao quadrado. Note como

existe bastante aucorrelacao entre os retornos ao quadrado. Todas estas carac-

terısticas sao em geral verificadas em series reais de retornos e devem ser levadas

em conta pelo modelo.

1.0

1.4

1.8

Dol

ar A

us

0.4

0.6

0.8

Libr

a

1.2

1.4

Dol

ar C

an

1.5

2.5

3.5

Flo

rim

1980 1985 1990 1995

45

67

89

Fra

nco

1.5

2.0

2.5

3.0

3.5

Mar

co

100

200

Iene

1.5

2.0

2.5

Fra

nco

Sui

1980 1985 1990 1995

Figura 6.3: Taxas de cambio diarias em relacao ao Dolar Americano do DolarAustraliano, Libra Esterlina, Dolar Canadense, Florim Holandes, Franco Frances,Marco Alemao, Iene Japones e Franco Suico, entre 31 de dezembro de 1979 e 31de dezembro de 1998.

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80 CAPITULO 6. MODELANDO A VARIANCIA

−0.

050.

050.

10

Dol

ar A

us

−0.

040.

000.

04

Libr

a

−0.

020

−0.

005

0.01

0

Dol

ar C

an

−0.

04−

0.01

0.02

Flo

rim

1980 1985 1990 1995

−0.

040.

000.

04

Fra

nco

−0.

040.

00

Mar

co

−0.

040.

00

Iene

−0.

040.

00

Fra

nco

Sui

1980 1985 1990 1995

Figura 6.4: Retornos diarios em relacao ao Dolar Americano do Dolar Aus-traliano, Libra Esterlina, Dolar Canadense, Florim Holandes, Franco Frances,Marco Alemao, Iene Japones e Franco Suico, entre 31 de dezembro de 1979 e 31de dezembro de 1998.

A ideia aqui e tentar modelar simultaneamente a media e a variancia de uma

serie temporal. Para fixar ideias, suponha que um modelo AR(1), Xt = αXt−1+εtfoi estimado e deseja-se fazer previsoes 1 passo a frente,

xt(1) = E(Xt+1|xt) = αxt.

A variancia condicional de Xt+1 e dada por

V ar(Xt+1|xt) = V ar(εt+1|xt) = E(ε2t+1|xt).

Ate agora assumimos que E(ε2t+1|xt) = σ2ε , mas suponha que a variancia condi-

cional nao seja constante, i.e. E(ε2t+1|xt) = σ2t+1. Uma possıvel causa disto e que

os dados se distribuem com caudas muito longas. Para facilitar a notacao vamos

denotar por It = {xt, xt−1, . . . , εt, εt−1, . . . }, ou seja σ2t = V ar(εt|It−1).

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6.2. MODELOS ARCH 81

Dolar Aus

−0.05 0.05 0.10

040

80

Libra

−0.04 0.00 0.04

020

4060

Dolar Can

−0.02 0.00

050

150

Florim

−0.04 −0.01 0.02

020

60

Franco

−0.04 0.00 0.04

020

4060

Marco

−0.04 0.00

020

4060

Iene

−0.06 −0.02 0.02

020

4060

Franco Sui

−0.04 0.00

020

40

Figura 6.5: Histogramas dos retornos diarios do Exemplo 6.2.

6.2 Modelos ARCH

Existem varias formas de especificar como a variancia condicional (volatilidade)

varia com o tempo. Uma estrategia utilizada para modelar σ2t , proposta em Engle

(1982), consiste em assumir que ela depende dos quadrados dos erros passados,

εt−1, εt−2, . . . atraves de uma autoregressao. No caso mais simples, faz-se

εt = vt

√c+ αε2t−1 (6.1)

onde {vt} e uma serie puramente aleatoria com media zero e variancia igual a 1

e vt e εt sao independentes. Segue que a esperanca e a variancia condicionais sao

dadas por,

E(εt|It−1) = E(vt)√c+ αε2t−1 = 0

E(ε2t |It−1) = σ2t = c+ αε2t−1 (6.2)

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82 CAPITULO 6. MODELANDO A VARIANCIA

0 5 15 25 35

−0.

040.

02

Dolar Aus

0 5 15 25 35

−0.

020.

04

Libra

0 5 15 25 35

−0.

040.

02

Dolar Can

0 5 15 25 35

−0.

040.

000.

04

Florim

0 5 15 25 35

−0.

040.

02

Franco

0 5 15 25 35

−0.

040.

02

Marco

0 5 15 25 35

−0.

020.

04

Iene

0 5 15 25 35

−0.

040.

000.

04

Franco Sui

Figura 6.6: Correlogramas dos retornos no Exemplo 6.2.

Neste caso dizemos que a variancia segue um processo autoregressivo condicional-

mente heterocedastico de ordem 1, ARCH(1). Note que e necessario impor as

restricoes c > 0 e α ≥ 0 para que σ2t seja sempre positiva. Quando α = 0

a variancia condicional e constante e εt e um processo condicionalmente homo-

cedastico. Alem disso queremos garantir a estacionariedade da autoregressao de

modo que a restricao imposta e 0 < α < 1. Note tambem que (6.2) nao inclui

um termo de erro e portanto nao e um processo estocastico.

A esperanca e variancia incondicionais podem ser obtidas como,

E(εt) = E[E(εt|It−1)] = 0

V ar(εt) = E(ε2t ) = E[E(ε2t |It−1)]

= E[c+ αε2t−1] = c+ αE(ε2t−1).

Se o processo e estacionario entao E(ε2t ) = E(ε2t−1) = V ar(εt) e portanto

V ar(εt) =c

1− α.

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6.2. MODELOS ARCH 83

0 5 15 25 35

−0.

020.

04

Dolar Aus^2

0 5 15 25 35

0.00

0.10

Libra^2

0 5 15 25 35

0.00

0.10

0.20

Dolar Can^2

0 5 15 25 35

0.00

0.10

Florim^2

0 5 15 25 35

−0.

020.

04

Franco^2

0 5 15 25 35

0.00

0.10

Marco^2

0 5 15 25 35

0.00

0.10

0.20

Iene^2

0 5 15 25 35

0.00

0.10

Franco Sui^2

Figura 6.7: Correlogramas dos retornos ao quadrado no Exemplo 6.2.

Alem disso,

Cov(εt, εt+k) = E(εtεt+k) = E[E(εtεt+k)|εt+k−1, . . . , εt−1]

= E[εtE(vt+k

√c+ αε2t+k−1)] = 0, para k > 0.

Ou seja, ao postular o modelo ARCH(1) estamos assumindo que os {εt} sao nao

correlacionados.

Exemplo 6.3 : Para ilustracao a Figura 6.8 apresenta dois processos ARCH de

ordem 1 simulados a partir de uma sequencia {vt} de 200 numeros aleatorios i.i.d.

gerados de uma distribuicao N(0, 1). A sequencia {εt} foi construida usando a

equacao (6.1) com c = 1 e α = 0, 8. Note como a sequencia {εt} continua

tendo media zero mas parece ter tido um aumento de volatilidade em alguns

perıodos. Em um modelo AR(1), a forma como esta estrutura nos erros afeta

a serie original depende do valor do parametro autoregressivo e duas possıveis

situacoes sao mostradas nos graficos inferiores da figura. Na Figura 6.9 temos

o histograma dos valores {εt} gerados, com uma curva normal superimposta,

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84 CAPITULO 6. MODELANDO A VARIANCIA

alem do grafico de probabilidades normais (QQ-plot normal). Note como ha um

excesso de valores nas caudas ocorrendo com uma frequencia maior do que seria

esperado na distribuicao normal.

processo aleatório

0 50 100 150 200

−5

05

10

ε(t) = v(t) 1 + 0.8ε(t − 1)2

0 50 100 150 200

−5

05

10

x(t) = 0.5x(t − 1) + ε(t)

0 50 100 150 200

−5

05

10

x(t) = 0.9x(t − 1) + ε(t)

0 50 100 150 200

−5

05

10

Figura 6.8: Processos autoregressivos com erros ARCH(1) simulados.

Basicamente a equacao (6.2) nos diz que erros grandes (ou pequenos) em valor

absoluto tendem a ser seguidos por erros grandes (ou pequenos) em valor absoluto.

Portanto o modelo e adequado para descrever series aonde a volatilidade ocorre

em grupos. Alem disso, na equacao (6.2) somando ε2t e subtraindo σ2t de ambos

os lados obtemos que

ε2t = c+ αε2t−1 + νt

com νt = ε2t − σ2t = σ2

t (v2t − 1). Ou seja, o modelo ARCH(1) pode ser reescrito

como um AR(1) estacionario para ε2t com erros nao normais (v2t ∼ χ21 se vt ∼

N(0, 1)) que tem media zero e variancia nao constante. Portanto, a funcao de

autocorrelacao do processo {ε2t} e dada por ρ(k) = αk e o correlograma amostral

deve apresentar um decaimento exponencial para zero.

Se o processo ARCH(1) for estacionario nao e difıcil calcular o seu coeficiente

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6.2. MODELOS ARCH 85

dens

idad

es

−10 −5 0 5

0.00

0.10

0.20

−3 −2 −1 0 1 2 3

−10

05

Q−Q plot Normal

quantis teoricos

quan

tis a

mos

trai

s

Figura 6.9: Caracteristicas de um processo ARCH(1) simulado.

de curtose que e dado por

κ =E(ε4t )

[V ar(εt)]2.

Denotando por E(v4t ) = λ o quarto momento do erro segue que o quarto momento

condicional e dado por

E(ε4t |It−1) = E(v4t σ4t |It−1) = λE(σ4

t |It−1) = λ(c+ αε2t−1)2.

(se assumirmos que vt ∼ N(0, 1) entao λ = 3). Portanto, o quarto momento

incondicional fica,

E(ε4t ) = E[E(ε4t |It−1)] = λE(c2 + α2ε4t−1 + 2cαε2t−1).

Se o processo e estacionario de quarta ordem entao podemos escrever E(ε4t ) =

E(ε4t−1) = µ4 e portanto,

µ4 = λ

(c2 + α2µ4 + 2cα

c

1− α

)= λc2

(1 + α

1− α

)+ λα2µ4

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86 CAPITULO 6. MODELANDO A VARIANCIA

e finalmente,

µ4 =λc2(1 + α)

(1− α)(1− λα2).

O coeficiente de curtose entao fica,

κ =λc2(1 + α)

(1− α)(1− λα2)

(1− α)2

c2= λ

1− α2

1− λα2, para λα2 < 1

que e sempre maior do que λ. Ou seja, qualquer que seja a distribuicao de vto coeficiente de curtose sera maior do que a curtose de vt (desde que α > 0 e

λ > 1). Em particular, processos ARCH(1) tem caudas mais pesadas do que a

distribuicao normal e sao portanto adequados para modelar series temporais com

esta caracterıstica. Series de retornos, como as do Exemplo 6.2, frequentemente

apresentam caudas mais pesados do que a normal devido ao excesso de curtose.

Previsoes da Volatilidade

Suponha que uma serie temporal Xt segue um processo ARCH(1), i.e. Xt =

vt√ht, vt ∼ N(0, 1). As previsoes da volatilidade, k passos a frente, no tempo

t = n sao obtidas como,

hn(k) = E(hn+k|In) = c+ αE(X2n+k−1|In).

Para k = 1 segue que E(X2n+k−1|In) = X2

n+k−1 e para k > 1 temos que

E(X2n+k−1|In) = E(hn+k−1v

2n+k−1|In)

= E(hn+k−1|In)E(v2n+k−1|In)= E(hn+k−1|In) = hn(k − 1)

pois hn+k−j e vn+k−j sao independentes. As previsoes entao ficam,

hn(k) =

{c+ αX2

n, k = 1

c+ αhn(k − 1), k = 2, 3, . . .

O Modelo ARCH(p)

Estas ideias podem ser generalizadas para processos mais gerais ARCH(p) em

que a variancia condicional depende dos quadrados de p erros passados, i.e.

εt = vt

√c+ α1ε2t−1 + · · ·+ αpε2t−p (6.3)

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6.2. MODELOS ARCH 87

e entao a variancia condicional e modelada como,

σ2t = E(ε2t |It−1) = c+ α1ε

2t−1 + · · ·+ αpε

2t−p.

Neste caso, para garantir que σ2t seja sempre positiva e necessario impor a

seguintes restricoes c > 0 e α1 ≥ 0, . . . , αp ≥ 0 e para garantir estacionariedade

e necessario tambem que as raızes de 1− α1B − · · · − αpBp = 0 estejam fora do

cırculo unitario. Juntando estas restricoes equivale a impor a restricao c > 0 e∑pi=1 αi < 1.

Analogamente podemos reescrever o modelo ARCH(p) como um modelo

AR(p) para ε2t definindo os erros νt como anteriormente, i.e.

ε2t = c+ α1ε2t−1 + · · ·+ αpε

2t−p + νt.

com νt = σ2t (v

2t − 1).

Identificacao

A caracterıstica chave dos modelos ARCH e que a variancia condicional dos er-

ros εt se comporta como um processo autoregressivo. Portanto deve-se esperar

que os resıduos de um modelo ARMA ajustado a uma serie temporal observada

tambem sigam este padrao caracterıstico. Em particular, se o modelo ajustado

for adequado entao a FAC e a FACP dos resıduos devem indicar um processo pu-

ramente aleatorio, no entanto se a FAC dos quadrados dos resıduos, ε2t , tiver um

decaimento caracterıstico de uma autoregressao isto e uma indicacao de que um

modelo ARCH pode ser apropriado. A ordem p do modelo pode ser identificada

atraves da FACP dos quadrados dos resıduos.

Previsoes da Volatilidade

Suponha que uma serie temporal Xt segue um processo ARCH (p). As previsoes

da volatilidade, k passos a frente, no tempo t = n sao obtidas como,

hn(k) = E(hn+k|In) = c+

p∑i=j

αjE(X2n+k−j|In).

Para k ≤ j segue que E(X2n+k−j|In) = X2

n+k−j e para k > j temos que

E(X2n+k−j|In) = E(hn+k−jv

2n+k−j|In)

= E(hn+k−j|In)E(v2n+k−j|In)= E(hn+k−j|In) = hn(k − j)

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88 CAPITULO 6. MODELANDO A VARIANCIA

ja que hn+k−j e vn+k−j sao independentes.

6.3 Modelos GARCH

Uma generalizacao natural dos modelos ARCH consiste em assumir que a var-

iancia condicional se comporta como um processo ARMA, i.e. depende tambem

de seus valores passados. Fazendo εt = vt√ht onde

ht = c+

p∑i=1

αiε2t−i +

q∑j=1

βjht−j

segue que a esperanca condicional de εt e zero e a variancia condicional e

σ2t = ht. Este modelo e chamado ARCH generalizado, ou GARCH, de ordem

(p, q). Aqui as restricoes de positividade e estacionariedade impostas sobre os

parametros sao dadas por c > 0, αi ≥ 0, i = 1, . . . , p, βj ≥ 0, j = 1, . . . , q e∑pi=1 αi +

∑qj=1 βj < 1.

Embora a primeira vista pareca um modelo mais complexo, sua vantagem

sobre os modelos ARCH e basicamente a parcimonia. Assim como um modelo

ARMA pode ser mais parcimonioso no sentido de apresentar menos parametros a

serem estimados do que modelos AR ou MA, um modelo GARCH pode ser usado

para descrever a volatilidade com menos parametros do que modelos ARCH.

Em termos de identificacao dos valores de p e q as ferramentas basicas sao

mais uma vez a FAC e a FACP dos quadrados dos resıduos. Assim, se o modelo

ajustado for adequado a FAC e a FACP dos resıduos devem indicar um processo

puramente aleatorio, no entanto quando estas funcoes sao aplicadas aos quadrados

dos resıduos elas devem indicar um processo ARMA(p, q). A identificacao pode

nao ser muito facil em algumas aplicacoes embora na maioria dos casos um modelo

GARCH(1,1) seja suficiente. Na pratica recomenda-se tambem tentar outros

modelos de ordem baixa como GARCH(1,2) e GARCH(2,1).

As previsoes da volatilidade em modelos GARCH sao obtidas de forma similar

a de um modelo ARMA. Por exemplo, apos estimar os parametros de um modelo

GARCH(1,1) e assumindo-se que ε0 = h0 = 0 pode-se construir as sequencias

ε1, . . . , εt e h1, . . . , ht e a previsao 1 passo a frente da volatilidade fica

σ2t (1) = c+ αε2t + βht.

6.3.1 Estimacao

Para uma serie x1, . . . , xn observada e um modelo GARCH(p, q), denotando-se o

vetor de parametros por θ=(c, α1, . . . , αp, β1, . . . , βq) e destacando-se a densidade

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6.3. MODELOS GARCH 89

conjunta das p primeiras realizacoes segue que

p(x1, . . . , xn|θ) = p(x1, . . . , xp|θ)n∏

t=p+1

p(xt|xt−1, . . . , xt−p,θ).

Assumindo normalidade segue que

Xt|xt−1, . . . , xt−p ∼ N(0, ht)

e portanto

p(x1, . . . , xn|θ) = p(x1, . . . , xp|θ)n∏

t=p+1

(2πht)−1/2 exp

(− x2

t

2ht

).

Em geral o numero de observacoes sera grande o suficiente para que o termo

p(x1, . . . , xp|θ) possa ser desprezado. Por exemplo, para um modelo ARCH(1) a

funcao log-verossimilhanca fica

−0.5n∑

t=2

[log(2π) + log(c+ αx2

t−1) + x2t/(c+ αx2

t−1)].

Note que algum algoritmo de otimizacao nao linear devera ser utilizado e nada

garante sua convergencia para um otimo global. No R pode-se usar a funcao

garch do pacote tseries para fazer a estimacao por maxima verossimilhanca.

6.3.2 Adequacao

Se um modelo ARCH ou GARCH foi ajustado a uma serie Xt nao correlacionada

entao os resıduos padronizados sao dados por

Xt =Xt√ht

e formam uma sequencia i.i.d. com distribuicao normal padrao. Assim, a ade-

quacao do modelo pode ser verificada aplicando os testes usuais de normalidade a

estes residuos padronizados e os testes de aleatoriedade (Box-Pierce e Ljung-Box)

aos quadrados dos resıduos.

Exemplo 6.4 : Na parte superior da Figura 6.10 estao os precos diarios no

fechamento de um indice de mercado da Alemanha (DAX), entre 1991 e 1998.

O interesse e em analisar os chamados retornos dados por log(xt/xt−1) e estes

estao no grafico inferior da Figura 6.10. Existe evidencia na literatura que mod-

elos GARCH(1,1) conseguem captar bem os movimentos caracterısticos dos re-

Page 13: Cap tulo 6 Modelando a Vari^anciaCap tulo 6 Modelando a Vari^ancia 6.1 Introdu˘c~ao Nos modelos vistos at e aqui a variancia dos erros foi assumida constante ao longo do tempo, i.e.

90 CAPITULO 6. MODELANDO A VARIANCIA

tornos. Foi usada a funcao garch no pacote tseries do R para ajustar um modelo

GARCH(1,1).

DA

X

1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998

2000

5000

reto

rnos

1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998

−0.

100.

00

Figura 6.10: Precos diarios no fechamento de um indice de mercado da Alemanha(DAX), entre 1991 e 1998 e respectivos retornos.

Estimate Std. Error t value Pr(>|t|)a0 0.00 0.00 6.14 0.00a1 0.07 0.01 6.07 0.00b1 0.89 0.02 53.82 0.00

Tabela 6.1

Assim, o modelo ajustado obtido foi

Yt = vt√ht, vt ∼ N(0, 1)

ht = 0.00005 + 0.068Y 2t−1 + 0.889ht−1

sendo todos os coeficientes significativos. O teste de Ljung-Box aplicado nos

quadrados dos residuos indicou aleatoriedade (p-valor = 0,71), no entanto o teste

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6.3. MODELOS GARCH 91

de normalidade de Jarque-Bera aplicado aos residuos rejeitou a hipotese nula (p-

valor<0,001). Assim a hipotese de normalidade condicional parece estar sendo

violada.

Na Figura 6.11 estao os histogramas, graficos de probabilidades normais dos

retornos e resıduos do modelo GARCH(1,1) estimado, alem dos correlogramas

dos quadrados dos retornos e resıduos.

DAX

−0.10 −0.05 0.00 0.05

010

30

Residuos

−10 −5 0 5

0.0

0.2

−3 −2 −1 0 1 2 3

−0.

100.

000.

10

DAX

−3 −2 −1 0 1 2 3

−5

05

Residuos

residuos

Time

1992 1994 1996 1998

−10

05

0 5 10 15 20 25 30

0.0

0.4

0.8

Residuos^2

Figura 6.11: Histogramas e probabilidades normais dos retornos do indice de mercadoda Alemanha (DAX) e resıduos do modelos GARCH(1,1) e correlogramas dos seusquadrados.

Um fato estilizado presente em series temporais financeiras e que o mercado

tem baixa volatilidade quando esta em alta e alta volatilidade quando esta em

baixa. Tal assimetria nao e levada em conta pelos modelos GARCH e para con-

tornar esta limitacao outros modelos foram propostos na literatura. Por exemplo,

no modelo EGARCH (ou GARCH exponencial) modela-se o logaritmo da volatil-

idade como,

log(σ2t ) = c+ α

∣∣∣∣ εt−1

σt−1

∣∣∣∣+ γεt−1

σt−1

+ βσ2t−1.

Em termos de estimacao uma vantagem deste modelo e que os parametros c, α e

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92 CAPITULO 6. MODELANDO A VARIANCIA

β sao irrestritos ja que estamos modelando o logaritmo da volatilidade. A unica

restricao e γ < 0 pois assim a volatilidade aumenta quando εt−1 < 0.

6.4 Volatilidade Estocastica

As formulas para modelar σ2t vistas ate agora foram todas determinısticas, i.e.

sem uma componente de erro aleatorio. No entanto, pode ser mais razoavel

assumir que a variancia condicional varia estocasticamente ao longo do tempo ao

inves de deterministicamente, especialmente se existem mudancas abruptas na

volatilidade (e.g. como resultado de greves, guerras, etc.).

Assim, uma alternativa aos modelos (G)ARCH consiste em assumir que σ2t

segue um processo estocastico. Geralmente modela-se o logaritmo de σ2t . Em sua

forma mais simples um modelo de volatilidade estocastica (VE) e dado por

Xt = vt exp(ht/2), vt ∼ N(0, 1)

ht = c+ αht−1 + ηt, ηt ∼ N(0, σ2η)

com |α| < 1 e ht = log(σ2t ). Note que nao ha necessidade de restricoes de

positividade nos parametros pois estamos modelando o logaritmo da volatilidade.

O modelo pode ser estendido para uma estrutura AR(p) em ht, ou seja

Xt = vt exp(ht/2), vt ∼ N(0, 1)

ht = c+

p∑i=1

αiht−i + ηt, ηt ∼ N(0, σ2η)

Estimar modelos de volatilidade estocastica e mais difıcil porque a funcao de

verossimilhanca e dificil de ser avaliada.

Propriedades

1. E(Xt) = E(vt eht/2) = E(eht/2)E(vt) = 0, ja que ht e vt sao independentes.

2. V ar(Xt) = E(X2t ) = E(eht v2t ) = E(eht)E(v2t ) = E(eht). Mas, como

estamos assumindo que ht e estacionaria segue que,

E(ht) = µ = c/(1− α) e V ar(ht) = σ2 = σ2η/(1− α2)

e a distribuicao incondicional do log-volatilidade e ht ∼ N(µ, σ2). Portanto,

eht segue uma distribuicao log-normal com parmetros µ e σ2 cuja media e

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6.4. VOLATILIDADE ESTOCASTICA 93

variancia sao dados por

E(eht) = eµ+σ2/2 = V ar(Xt)

V ar(eht) = (eσ2 − 1)e2µ+σ2

3. E(X4t ) = E(v4t e2ht) = E(v4t )E(e2ht). Se εt ∼ N(0, 1) entao E(v4t ) = 3 e

E(X4t ) = 3E(e2ht). Mas

E(e2ht) = V ar(eht) + E2(eht) = (eσ2 − 1)e2µ+σ2

+ (eµ+σ2/2)2

= e2µ+σ2

(1 + eσ2 − 1) = e2µ+2σ2

.

Portanto, a curtose e dada por

κ =3 e2µ+2σ2

e2µ+σ2 = 3eσ2

que e sempre maior do que 3 pois eσ2> 1. Um resultado mais geral e que

κ = E(v4t )eσ2

ou seja a curtose induzida por este modelo e sempre maior

do que a curtose de vt.

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94 CAPITULO 6. MODELANDO A VARIANCIA

Exercıcios

1. Um modelo ARIMA foi identificado e estimado para uma serie temporal ob-

servada mas ha indicacao de que a variancia condicional deve ser modelada

por um processo GARCH(1,1). Explique como se chegou a esta conclusao.

2. Refaca o exemplo da Figura 6.8 e estime um modelo AR(1) para a serie

Xt. Verifique se existe estrutura autoregressiva nos quadrados dos resıduos

e identifique um modelo ARCH para os erros.

3. Obtenha as previsoes 1, 2 e 3 passos a frente para um modelo GARCH(1,2).

4. Descreva duas vantagens de modelos EGARCH sobre modelos GARCH.