A Queda de Artur - J. R. R. Tolkien

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    Versos 61-94 do Canto I da ltima verso do texto de

    A Queda de Artur.

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    OBRAS DE J. R. R. TOLKIEN

    The Hobbit [O Hobbit]Leaf by Niggle [rvore e folha (Sobre Contos de Fadas e Folha, de Migalha)]

    On Fairy Tales [Sobre Histrias de Fadas]

    Farmer Gil of Ham [Mestre Gil de Ham]The Homecoming of BeorhtnothThe Lord of the Rings [O Senhor dos Anis]

    The Adventures of Tom Bombadil [As Aventuras de Tom Bombadil]The Road Goes Ever On [com Donald Swann]

    Smith of Wootton Major

    OBRAS PUBLICADAS POSTUMAMENTE

    Sir Gawain and the Green Knight, Pearl and Sir Orfeo*The Father Christmas Letter [Cartas do Papai Noel]

    The Silmarillion* [O Silmarillion]Pictures by J. R. R. Tolkien*

    Unfinished Tales* [Contos Inacabados]The Letters of J. R. R. Tolkien*

    Finn and HengestMr. Bliss [Sr. Bliss]

    The Monsters and the Critics & Other Essays*Roverandom [Roverandom]

    The Children of Hrin* [Os Filhos de Hrin]The Legend of Sigurd and Gudrn* [A Lenda de Sigurd e Gudrn]

    The Fall of Arthur* [A Queda de Arthur]

    A HISTRIA DA TERRA-MDIA POR CHRISTOPHER TOLKIEN

    I The Book of Lost Tales, Part One

    II The Book of Lost Tales, Part TwoIII The Lays of BeleriandIV The Shaping of Middle-earth

    V The Lost Road and Other WritingsVI The Return of Shadow

    VII The Treason of IsengardVIII The War of RingIX Sauron Defeated

    X Morgoths Ring

    XI The War of the Jewels

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    XII The Peoples of Middle-earth

    *Editados por Christopher Tolkien

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    NDICE

    Prefcio

    A Queda de Artur

    Notas sobre o texto de A Queda de Artur

    O poema na tradio arturiana

    O poema no escrito e sua relao com O Silmarillion

    A evoluo do poem a

    Apndice:

    Poesia em ingls antigo

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    Nota do tradutor

    O leitor desavisado de lngua portuguesa que leia o poema A Queda de Artur, deJ. R. R. Tolkien, ter de imediato uma sensao de estranhamento. Podero existirvrios motivos para isso:

    O tema a campanha do Rei Artur contra os romanos, da qual chamado de

    volta pela notcia de que seu sobrinho (ou filho) Mordred est cometendo umatraio mltipla pode no ser fcil de compreender para quem no estejafam iliarizado com a chamada Matria da Bretanha. Fala-se aqui do reino de

    Artur, situado na ilha da Gr-Bretanha, j que a atual Bretanha (propriamentedita) fica do outro lado do Canal da Mancha, em terras de Frana. Os cavaleiros

    da Tvola Redonda, e desta a maioria dos leitores j ter ouvido falar, tmnomes que tampouco soam cotidianos: Gawain, Gareth, Gaheris, Bedivere,

    Lancelot, Bors e outros.

    O vocabulrio usado nesta traduo, que decorre do modo peculiar de

    versificao (explicado abaixo) e tambm do arcasmo do tema, pode apresentaralguns obstculos. J nos primeiros versos, deparamos com palavras como

    riscas, butim, alccer... Nada, porm, que no seja solvel recorrendo-se a um(bom) dicionrio. Pode servir de consolao o fato de que os leitores de lnguainglesa tropearo em problemas anlogos: fanes, embayed, forwandered.

    Em relao a esse problema, vale citar as palavras de Christopher Tolkien que na presente obra editor do texto paterno em sua prpria traduo do

    islands de The Saga of King Heidrek the Wise [ A Saga do Rei Heidrek, o Sbio]:

    Na presente edio (arriscando-me ao epteto de bizarro) busqueiuma traduo da poesia verso a verso, limitado pela imitao das

    mtricas e dos esquemas aliterantes dos originais. [...] inevitavelmente, asexigncias conjuntas da aliterao e da preciso implicaram convocar ao

    servio algumas palavras que, podem alguns pensar, j deveriam terpermisso para morrerem em paz, mesmo em se tratando da traduo depoesia heroica.

    Mais outro fator de estranheza ser a prpria forma do poema. Ele foi

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    composto em versos aliterantes, comuns na tradio germnica anglo-sax,

    alem, nrdica mas extremamente incomuns em lnguas romnicas, como, por

    exemplo, o portugus. No entanto, esse modo de versificao apresenta umparalelismo com os versos rimados aos quais estamos mais afeitos. Uns e outrosso como so porque eram originalmente (na Idade Mdia) declamados, no

    escritos, pelos menestris ou bardos, que usavam recursos fonticos para ligar osversos entre si e proporcionar um sentido de continuidade aos ouvintes.Simplificando: na poesia em rimas so geralmente sons voclicosque se repetem

    entre um e outro fim de verso, enquanto na aliterao so as consoantes que serepetem dentrode um mesmo verso. Essas consoantes so as que iniciam as

    slabas tnicas de trs palavras, canonicamente duas no primeiro hemistquio(meio verso) e uma no segundo. Podem aliterar entre si formas surdas e sonorasda mesma articulao (p. ex., fcom v, ou scom z), e em portugus convenciona-

    se que tambm aliteram rcom rr, lcom lh, ncom nh. Ademais, qualquer vogalalitera com qualquer outra (e com h, nas lnguas germnicas). Estes versos

    podem servir de exemplo dos dois modos:

    A rima m arca bem o fim do verso

    Pra que no fique o leitor disperso.

    Aliteram as tnicas repetindo os sons

    Mas umas s outras fazem eco as vogais.

    Nesta verso de A Queda de Artur, os nomes de pessoas e lugares forammantidos com a grafia e o acento tnico do texto original em ingls moderno.

    Pessoas: Gunever(e), Lncelot, Mrdred, Gwain. A exceo Artr, nomecomum em portugus e bem conhecido pelas referncias ao Rei Artur,

    portanto aliterando em t. Lugares: Cmelot, Bnwick, lmain, ngel, Rmeril. Aexceo Floresta das Trevas, nome que foi traduzido por dois motivos:

    1. O significado do nome fica mais explcito quando vertido.

    2. Floresta das Trevas[em ingls Mirkwood] designa no poema a grandeselva germnica, ainda existente em tempos medievais, mas tambmo nome da mata que existia na Terra-mdia, o continente imaginado por

    Tolkien em sua mitologia (nas Terras Ermas, entre os rios Anduin eCorrente). Mirkwoodfoi traduzido por Floresta das Trevasem O Senhor

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    dos Anise O Hobbit. Mirk uma palavra arcaica para escurido,

    treva. Mantm -se dessa forma a coerncia interna na obra do autor.

    Estej a, pois, alertado o carssimo leitor. Seu equivalente anglfono poder

    tambm encontrar motivos para estranhamento ao ler The Fall of Arthur. Minha

    esperana que as ideias, e principalmente as emoes, sejam evocadas demodo semelhante em um e em outro.

    RONALD E. KYRMSE

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    PREFCIO

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    PREFCIO

    Todos sabem que uma fora importante na poesia de m eu pai era seu amorpermanente pelos antigos versos aliterantes setentrionais, que se estendiam do

    mundo da Terra-mdia (especialmente na longa mas inacabada Balada dosFilhos de Hrin) ao dilogo dram tico The Homecoming of Beorhtnoth [O

    Retorno de Beorhtnoth] (que surgiu do poema em ingls antigoa A Batalha de

    aldon) e aos seus poemas nrdicos antigos A Nova Balada dos Vlsungse Aova Balada de Gudrn (aos quais se referiu em uma carta de 1967 como coisa

    que fiz muitos anos atrs quando estava tentando aprender a arte de escreverpoesia aliterante). Em Sir Gawain and the Green Knight[Sir Gawain e o

    Cavaleiro Verde] demonstrou sua habilidade ao reproduzir o poema aliterante dosculo XIV na mesma m trica em ingls moderno. A essas obras, acrescenta-se

    agora seu poema inacabado e indito A Queda de Artur.

    Consegui descobrir uma nica referncia a esse poema feita por meu pai, que

    est em uma carta de 1955, onde ele disse: Escrevo poesia aliterante comprazer, apesar de ter publicado pouca coisa a lm dos fragmentos em O Senhor

    dos Anis, com exceo de The Homecoming of Beorhtnoth[...] Ainda esperoterminar um longo poema sobre A Queda de Arturna mesma medida ( TheLetters of J. R. R.Tolkien, no 165). Entre seus papis no h nenhuma indicao de

    quando foi iniciado ou quando foi abandonado; mas felizmente ele conservouuma carta que lhe foi escrita por R. W. Chambers em 9 de dezem bro de 1934.

    Chambers (professor de ingls no University College, Londres), que tinha dezoitoanos a mais do que ele, era um velho amigo e vigoroso apoiador de meu pai, e

    nessa carta relatou que havia lido Arturem uma viagem de trem paraCambridge, e na volta tirou vantagem de uma cabine vazia para declam-locomo ele merece. Falou do poema em tom altamente elogioso: de fato

    muito grandioso [...] realmente heroico, sem falar do seu valor em mostrar comoa mtrica do Beowulfpode ser usada no ingls moderno. E terminou a carta

    com: Voc realmente precisaterm in-lo.

    Mas isso meu pai no fez; e mais um dos seus longos poemas narrativos foi

    abandonado. Parece praticamente certo que havia parado de trabalhar na Balada

    dos Filhos de Hrin antes de deixar a Universidade de Leeds rumo a Oxford, em

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    1925, e registrou que comeara a Balada de Leithian(a lenda de Beren eLthien), no em versos aliterantes e sim em dsticos rimados, no vero daquele

    ano (The Lays of Beleriand[As Baladas de Beleriand], p. 3). Alm disso,enquanto estava em Leeds, comeou um poema aliterante sobre A Fuga dos

    oldoli de Valinor, e outro ainda mais curto que era claramente o comeo de

    uma Balada de Erendel( The Lays of Beleriand, II, Poems Early Abandoned).Sugeri em A Lenda de Sigurd e Gudrn(I) como mera conjetura, j que no

    h nenhuma evidncia para confirm-lo, que m eu pai tenha se voltado para ospoem as nrdicos como uma nova empreitada potica [e uma volta poesia

    aliterante] aps ter abandonado a Balada de Leithian [...] perto do final de 1931.Se foi assim, ele deve ter comeado a trabalhar em A Queda de Artur, ainda

    longe de estar terminada no final de 1934, depois que os poemas nrdicos foramconcludos.

    Ao buscar uma explicao para o fato de ele ter abandonado esses poem asambiciosos quando cada um deles j estava bem avanado, devemos examinar

    as circunstncias de sua vida aps ser eleito professor de anglo-saxo em Oxford,em 1925: as demandas de seu cargo e de sua bolsa de estudos, as preocupaes,ansiedades e despesas da famlia. Como aconteceu em grande parte de sua vida,

    ele nunca tinha tempo suficiente; e talvez, conforme tendo a crer, o sopro dainspirao constantemente interrompida acabasse por murchar; porm, emergia

    de novo quando aparecia uma brecha entre seus deveres e obrigaes e seusoutros interesses, mas agora com um mpeto narrativo alterado.

    Sem dvida houve, em cada caso, razes especficas, que agora no podem

    ser identificadas com nenhuma certeza; mas no caso de A Queda de Artursugeri(O POEMA NO ESCRITO) que foi levado a encalhar pelas grandes alteraes

    de mar por que passavam na poca os conceitos de meu pai, derivadas de seutrabalho em The Lost Road[A Estrada Perdida] e da publicao de O Hobbit: o

    surgimento de Nmenor, o m ito do Mundo Tornado Redondo e da Rota P lana, e aaproximao de O Senhor dos Anis.

    de supor tambm que a prpria natureza deste ltimo poema, primoroso,tornava-o particularmente vulnervel a interrupes ou perturbaes. A

    espantosa quantidade de m aterial de rascunho remanescente de A Queda de

    rturrevela as dificuldades inerentes a esse uso da forma mtrica que meu paiapreciava to profundamente e seu empenho rigoroso e perfeccionista em

    encontrar, numa narra tiva intrincada e sutil, uma expresso adequada dentro dos

    padres de ritmo e aliterao da form a potica do ingls antigo. Para mudar a

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    metfora, A Queda de Arturera uma obra de arte a ser construda devagar: no

    podia suportar o surgimento de novos horizontes imaginativos.

    Independentemente do que se possa pensar dessas especulaes, A Queda derturnecessariamente acarretou para o editor problemas de apresentao. Pode

    ser que alguns, ao se voltar para este livro, se contentassem com pouco mais que

    o texto do poema conforme aqui publicado, e talvez um breve relato das etapasde sua evoluo, tal como atestadas pelos abundantes manuscritos de rascunho.

    Por outro lado, talvez houvesse outros que, levados ao poema atrados por seuautor, mas com poucos conhecimentos da lenda arturiana, desejassem e

    esperassem encontrar alguma indicao da situao desta verso com relao tradio medieval da qual surgiu.

    Como eu disse, meu pai no deixou nenhuma indicao, nem mesmo das maisbreves, como fez para os poemas nrdicos publicados como A Lenda de Sigurde Gudrn, de suas ideias ou intenes subjacentes ao tratamento muito originalque deu Lenda de Lancelot e Guinevere. Mas neste caso claram ente no h

    razo para penetrar no labirinto numa tentativa editorial de escrever um relatoabrangente da lenda arturiana, o que provavelmente apareceria como ummuro de impedimento erigido como se fosse um preliminar necessrio leitura

    de A Queda de Artur.

    Portanto, dispensei toda Introduo propriamente dita, mas depois do texto

    do poema inclu diversos comentrios de natureza decididamente opcional. Asbreves notas que seguem o poem a restringem-se em grande m edida aexplicaes muito concisas de nomes e palavras, e a referncias aos

    comentrios.

    Para os que desejam essas exploraes, cada um desses comentrios diz

    respeito a um aspecto bem distinto de A Queda de Arture de seu interesseespecial. O primeiro, O poema na tradio arturiana, de inteno simples,

    evitando interpretaes especulativas e de alcance limitado, embora um tantoextenso, fala sobre a derivao do poema de m eu pai de determ inadas tradies

    narra tivas e de suas divergncias com relao a elas. Com esse obje tivo, baseei-me principalmente em duas obras em ingls, o poema medieval conhecido como

    Morte Arthure aliterante e os contos relevantes de Sir Thomas Malory, comalgumas referncias s suas fontes. Como no desejava fornecer um resumoseco, citei textualmente diversos trechos dessas obras, exemplificando aquelas

    tradies de maneira e modo profundamente diferentes desta Queda de Artur

    aliterante de outra poca.

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    Depois de m uito deliberar, achei melhor, por causar bem menos confuso,escrever esse relato como se a forma mais recente do poema (conforme

    publicado neste livro) fosse a nica coisa que pudssemos saber a seu respeito, eportanto a estranha evoluo dessa forma revelada pela anlise dos textos emrascunho tivesse sido perdida. No julguei necessrio entrar nas origens sombrias

    da lenda arturiana e nos primeiros sculos de sua histria, e aqui direi apenas que essencial compreenso de A Queda de Arturreconhecer que as razes da

    lenda so derivadas do sculo V, aps o final definitivo do domnio romano naGr-Bretanha com a retirada das legies em 410, e das lembranas de batalhas

    travadas pelos britnicos na resistncia contra as ruinosas incurses e agressesdos invasores brbaros, os anglos e os saxes, estendendo-se desde as regiesorientais de sua terra. Deve-se ter em mente que em todo este livro a palavra

    britnico(s) refere-se especfica e exclusivam ente aos habitantes celtas e seu

    idioma.Seguindo-se a O poema na tradio arturiana h uma discusso sobre O

    poem a no escrito e sua relao com O Silmarillion, acerca dos diversos

    escritos que do algum indcio das ideias de meu pai sobre a continuao dopoem a; e depois um artigo sobre A evoluo do poema, essencialmente uma

    tentativa de mostrar da maneira mais clara possvel, apesar da histria textualextremamente complexa, as principais mudanas estruturais a que me referi, ao

    lado de vrios exem plos de seu modo de composio.

    Nota.Em todo este livro, as referncias ao texto do poema so dadas na formade nmero do canto (algarismos romanos) + nmero do verso, p. ex. II.7.

    aOu anglo-saxo. (N. do T.)

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    A QUEDA DE ARTUR

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    I

    Como Artur e Gawain foram guerra e cavalgaram rumo ao leste.

    Artur partiu ao oriental combate

    e trava batalha em terras selvagens,

    nas vagas navega, atravessa at os saxes,

    do reino de Roma a derrota quer evitar.

    Pra voltar atrs do tempo a mara esperana o carrega, os hereges derrotar

    que com naus inmeras nunca mais assediem

    as praias compridas, as priscas guas

    nem tenham butim da Bretanha, sua ilha.

    Como a terra que tnue se torna no outono

    e o sol que descendo se assenta no poentesob neblina sombria, obriga-se o homem

    a fadiga e andana, que abundante corre

    o sangue sob o sol, abrasada a alma,

    aps glria prolongada, para um golpe final

    de amor-prprio e provas, para em prtica pr

    a vontade constante combatendo a sina.

    A sina tecida maliciosa o impele,

    e Mordred com seu mal a mente endurece,

    diz que sbia a ao e a pacincia loucura.

    Abatamos seus tem plos, suas torres deixemos

    rompidas, em p, os portos queimados,

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    e em meio marcha armada, as ilhas

    do reino de Roma encerradas em fumaa

    do fogo que vinga! Muito vale tua mo,

    eis tua fortuna conquistar e vencer!

    E a Bretanha ditosa, o teu am plo reino,eu a levo ilesa, t que logo retornes.

    Fiel tu me achas. Que ouse adversrio

    deflagrar aqui guerra ou pegar as muralhas

    da terra verde entre as vagas, vivo estando Artur,

    se no leste o lobo em lgubre selva,

    assediado, rendido, vai dar sua vida.

    Assim mesmo diz Mordred, e muito o louvam,

    nem engano nem engodo Gawain suspeita

    neste ousado conselho; anseia por guerra,

    pois no cio seu olho inda v o mal

    que a Tvola Redonda outrora rompeu.

    Partiu, pois, Artur oriental guerra,

    e batalhas despertaram em terras selvagens.

    Castelos e templos de gentios reis

    sua potncia ataca , com vitria marchando

    das fozes do Reno por reinos infindos.

    Sente falta de Lancelot; Lionel e Ector,

    Bors e Blamore ao combate no vm;

    mas senhores de renome permanecem com ele:

    Bediver e Baldwin, Brian da Irlanda,

    Marrac e Meneduc dos montes e torres;

    Errac e Iwain de Urien da linhagemque rei foi em Reged; poderoso Cedivor

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    da soberana o parente, o rpido Cador.

    Gawain grande, cuja glria aumenta

    quando os tempos se toldam, justssimo e audaz,

    entre valentes cavaleiros desde logo provado,

    socorro e alccer na queda do mundo.Qual investida derradeira de cidade cercada

    engaja-os Gawain. Como gaia trombeta

    voa sua voz avante de Artur;

    como lmpada que reluz sua lmina empunha

    bem mais que os primeiros, como marca de raio.

    Adversrios frente, as flamas os seguem,

    avante, ao levante cavalgam vidos,

    todos fogem j deles como da face de Deus,

    nas plagas sem povo no espia um s olho,

    nem h ouvidos ouvindo nas infindas colinas,

    s feras e aves que andam nos fundos

    das terras solitrias. Atingem por fim

    a riba cerrada da Floresta das Trevas:

    solido atrs, paredes frente;

    em desabitados outeiros altssima est

    vasta, invicta, sob um vu a floresta.Trevosos, severos so os vales profundos,

    do medo as imensas ramadas das rvores

    em renques correntes sobre os rios curvadas

    que correm nos declives dos cmoros de gelo.

    Clam am os corvos nas encostas de rocha,

    fazem eco as guias que no ar volteiam ;os lobos ululam circulando a mata.

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    Frio o vento, o inverno o sopra,

    percorrendo em furor a floresta infinda

    onde as folhas farfalham. Com fora vem a chuva,

    e o sol se dissolve em sbita tormenta.

    L longe o Leste se eleva em ira,

    e o pavor do trovo, provindo dos crceres

    dos montes que intimidam, se move acima.

    Detm-se em incerteza, nas alturas enxergam

    nveos ginetes em nuvens de vento

    com rigor cavalgando, gris, monstruosos,

    capacetes de sombra, desgraadas formas.

    A trombeta os abala. As belas bandeiras

    dos mastros desmontam. No mais o ao,

    nem ouro, prata alva, aba de escudo

    refletindo centelha que na treva se perde,

    pois inimigos fantasmticos com desumanas vozes

    se am ontoam na treva. Alteia a voz Gawain

    e brada qual trombeta. Brilha seu grito

    que rola nas rochas onde ruge o vento

    e o trovo revolto: Vam os, guerra,

    hostes em ordem, que o dio proclamam!Nem sombras nocivas nem adversrio tememos

    dos montes do medo que demnios assombram!

    Escutai, outeiros, nas trevas a mata,

    tronos estranhos de antigos deuses,

    domnios imensos, tremendo escutai!

    Do ocidente vem batalha que no tem e o vento,enrgico anelo que a nvoa no detm;

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    capito das tropas, nas trevas a luz,

    ao levante cavalga Artur! Vibram ecos.

    Ecoam as encostas na calma do vento

    rebatendo Artur.

    A tarde chegacom a lua rolando lenta nas nvoas

    revoltas de vento no vasto cu,

    onde restos de borrasca enredam os astros.

    Fogos refulgem, frgeis lnguas douro,

    sob geladas colinas. No dilculo imenso

    cintilam qual fantasmas, da terra se erguendo

    como obras de elfos na erva do outono

    ocultados dos mortais em outeiros secretos,

    as tendas de Artur.

    O tempo passa.

    Vem o dia medonho, toldada manh

    luzindo sem sol nos cerros obscuros;

    no alto os uivos do ar perecem .

    Prevalece o silncio. Dos vales profundos

    boiam as brumas desdobrando-se acima;

    fumos sem forma afundam, midos,

    os morros sob o firmamento, imanes lugares

    num mar sem limite imergem e somem.

    rvores erguem-se, contrados seus braos,

    como erva sob a gua onde a onda no alcana,

    ameaam no nevoeiro os homens errantes.

    Insensveis os coraes do exrcito acampado

    na beirada da horrvel Floresta das Trevas.

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    Pressentem a selva nas incertas brumas;

    apagaram as fogueiras. Agarra-os o pavor,

    miram e medem esse mundo de sombras

    inslito, desconhecido, e silenciam .

    Afastada e dbil, quando a tarde cai,

    distinguem trompa que treme nos morros,

    solitria, como atnitas rejeitadas vozes

    no meio do mar. Mais e mais se aproxima.

    J escutam cascos, reclama um cavalo,

    sinal das sentinelas. A agonia encontrou-os.

    Com asas urgem do oeste as novas

    que a guerra chegada Gr-Bretanha.

    Eis! Cradoc os alcana, buscando o rei

    por trilhas fatais seu roteiro seguindo,

    das fozes do Reno por reinos infindoscavalgou com rigor. Nem as grandes sombras,

    nada, nem nvoa, seu denodo deteve.

    Magro e faminto, desmonta do cavalo

    contando a Artur notcias ruins:

    Dem ais te demoras rem oto da tua terra!

    Empenhas-te em prlios com povos braviosno leste desolado, e lderes agora,

    suas naus unidas, danosas, velozes,

    agruparam em portos e praias secretas.

    Navegam nas vagas trevosos drages;

    nas costas sem socorro os escudos rebrilham

    e conduzem bandeiras ao dobro de trompas.Selvagens os ventos dos rivais na Bretanha!

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    York rodeada, trada Lincoln;

    em Kent, cr tu, a costa arde.

    Montado enfrentei obstculos, muitos,

    nas tormentas do mar consumi minhas foras,

    da perfdia te falo. No te fies em Mordred!Recebe adversrios, falseia confiana,

    celebra aliana com ilustres de Lochlan,

    com Almain e Angel anda tramando,

    arranca-te o reino, a coroa quer tomar

    com mos do mal. Marcha ao oeste!

    *

    Por um tempo Artur, incontido de ira,

    ca lou em silncio. A veloz fortuna

    se volve perversa. Em vinte batalhas

    combateu, conquistou, rebateu inimigos.

    Sua mo fez humildes os comandos pagos.

    Do alto do nimo foi ngreme a queda,

    predizendo no corao o desastre de sua casa,

    o mundo costumeiro desmonta-se e acaba,

    voltou-se contrria do tempo a mar.

    Depressa ento pede que opine Gawain,

    sbio em conselho. Acerbas suas palavras;

    contou-lhe todas as notcias ruins.

    Falhando-me Lancelot, isolado estou,

    e fazem-me falta as fortes espadas

    Da fam lia de Ban. bom, me parece ,

    que requisites auxlio, pra que sirvam de novo

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    ao potentado de outrora. A quem trai-nos assim

    nos oporem os poderosos, com coragem voltando

    a oprimir Mordred com imenso vigor.

    O grave Gawain agora responde:

    A mim agrada mais que a famlia de Ban

    habite em Benwick, a baixa traio

    no mais confirmando temendo o pior:

    os am igos demonstram ser inimigos.

    Se Lancelot resoluto, fidelssimo de intuito,que prove que se arrepende, deponha a soberba,

    e venha sem convite quando convm ao rei!

    Mais aprovo com poucos, que probos sejam,

    enfrentar batalha, do que com hesitantes espadas

    e escudos riscados de cbulas vassalos

    em polar-nos as fileiras. No h l bastante?Se juntares tropas em todo o Mundo,

    mortais ou imortais, da florestal beira

    Ilha de Avalon, hostes sem conta,

    nunca e nenhures senhores mais bravos,

    melhores cavaleiros de melhor renome,

    homens de mais honra sob o amplo cuvo reunir-se de novo at o final juzo.

    Aqui franca e fina a flor do tempo,

    que os livres a relem brem ao longo dos anos

    qual vero dourado no feroz inverno.

    E Gawain te guia. Que nos guarde Deus

    auspiciosos parceiros, coraes unidos,pois percorre nossos corpos aquele mesmo sangue,

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    Artur, tu e Gawain! Mais ttricos males

    j fugiram longnquos que j untos enfrentamos.

    Na prontido acredita! Se perdura o dio

    e conselhos incertos aprecia em segredo,

    raivosos como o vento vamos rumo ao oestenavegando o gro-mar com vingana repentina!

    *

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    II

    Como o navio frsio trouxe notcias, e Mordred reuniu seu exrcito e chegou aCamelot em busca da rainha.

    Voam ares atros sobre guas profundas,

    do sul sopram a solta espuma,

    um mar clamante, imenso, revolto,

    morros espumantes, monstros de trovo.

    O palor da lua no lgubre mundo

    entre nuvens transtornadas rumo ao norte flutua.

    De Frana vem, voa, um navio veloz,

    com figura de drago ligada proa,

    encapado em preto, pulsa no mar,

    fera selvagem pelas vagas caada

    entre ces sequiosos. Os cornes do vento

    falam de seu desfecho. Confusas as vozes

    pedindo aos deuses acudi-los ali,

    as madeiras despedaam-se, perdida est a nau

    nos morros do mar. Ilumina a lua

    arregalados olhares nos lvidos rostos

    dos que miram a morte. Submete-os o destino.

    A mente de Mordred caminha, ao despertar,

    por causas obscuras, secretas, profundas.

    Alto, no oeste, olha pela janela:

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    vai nascendo incerto o embaado dia,

    num luzir cinzento disfarado nas nuvens.

    Nas muralhas de rocha vai correndo o vento;

    o mar murmura, remi e reflui.

    No ouve nem olha: seu ntimo retornaao infindo cativeiro aflito de desej o,

    elegante Guinever, com garbo dourado,

    formosa e temvel qual mgica fada

    que caminha no mundo pra tormento dos homens

    e no lana lgrimas. Avassalar ele pode

    torres e tronos, no abater essa ideia.

    Feliz na saleta, em leito de prata

    em macios travesseiros de seda ela dorme,

    os tranados soltos, em sussurros respira

    e vaga envolta no perfume dos sonhos,

    no se arrepende, sem pena, no a pica dor nenhuma,

    na cmoda corte de Camelot rainha,

    desamparada soberana. A aragem sopra fria.

    Ele dorme em leito estril. Fantasmas negros

    de desej o insaciado e inslita fria

    assaltaram -lhe a vontade na matina enfadonha.

    Ele escala escada que corre ngrem e

    aos muros de ameias bem formadas de pedra.

    Sobre o mundo que lam enta e desanimado desperta

    ele inclina-se em escrnio, sem gota de lgrima.

    Cantam os galos. Soam gritos no porto.

    Os servos o exigem, passando em silncio,

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    no cmodo e na alcova buscando depressa.

    O vido Ivor, fiel escudeiro,

    o encontra na escada, quieto porta:

    Por que passeias a ss? Vem descendo, senhor!

    H notcias pra ti! O tempo que restaPara espera no presta. Aporta um navio!

    Mostra-se Mordred, e tremendo contemplam

    seu rosto moreno escorrendo de gua;

    cabeleira que o ar leva, palavras speras:

    Meu castelo de fidalgo inundais com ral

    porque vem um navio que foge da tormenta?

    Ivor reata: Tuas ordens obedece,

    vindo de Frana, o frsio capito,

    nas asas do ar, honra sua palavra,

    desafia os fados. Os fados venceram .

    Repousa rompida na praia sua nau;

    no limite da morte ele demora-se ainda.

    Os demais esto mortos. No comeo do dia

    esse rubro pirata dos dourados anis

    fez entrega ao patro na trilha do inferno;

    no deseja rem isso nem confessor tam pouco,as notcias derradeiras deu a seu senhor:

    O mesquinho Cradoc escapa rumo ao rei,

    ri tua rede e rpido foge

    rumo ao este, a Almain, em hora certa,

    leva notcia da Bretanha. Faltou-te conselho;

    a Artur tudo est relatado,teus atos, teus alvos. Sua ira atroz,

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    j se volta e vem, convoca a tropa,

    das raias de Roma como borrasca retorna.

    Nove mil e m ais do mar se aproximam;

    seus navios navegam nas vagas do norte,

    em Whitesand as guas se enchem de barcos,martelos de carpinteiros, gritar de marujos,

    arneses tinindo, ginetes s pressas,

    clam or e tumulto. Muito cuidado!

    Decorando as muralhas penduraram escudos,

    brases de sangue predizendo guerra.

    Se arm am com as ondas e a ira do vento;

    h equipes de ces rebocando as naus

    com cordas e cabos. caa no leste!

    Radbod, o Rubro, pirata destemido,

    fiel ao dio, de nimo pago,

    morreu, foi seu rumo. A aurora escura.

    Ao mar o rem etem, sem temer por seu esprito

    que anda pelas guas, uma alma sem lar.

    O vento selvagem voa pelo oeste.

    Estandartes desfraldados, maldito corvo negro

    o braso que exibem. Sopram as trompas,

    rangem couraas, os rinchos dos cavalos

    nos gelados vales das colinas ressoam.

    Mordred j marcha; muitos mensageiros

    ao norte e ao leste as novas j levam

    ao longe por Logres. Cavaleiros e chefes

    convida a virem, convoca depressa

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    em memria do juramento, a Mordred fiis,

    certos na hipocrisia, adversrios de Artur,

    fortes na perfdia, fceis de comprar,

    sectrios da fortuna, flibusteiros

    de Erin, de Alban, do este de Sassoin,de Almain e Angel e das ilhas da nvoa;

    os corvos da costa e dos crus pntanos.

    Ele acode a Camelot, buscando a rainha.

    De seus ps os passos s pressas ela escuta

    que escalam a escada machucando os degraus.

    Ele alcanou seus aposentos. Abrasados os olhos,

    porta se posta, espia soturno.

    Ela ali em silncio, calada e imvel,

    parada no peitoril. Raia bao o dia

    nas tranas que ela traz com contraste douro.Como ondas do oceano so seus olhos cinzentos;

    gelados, translcidos, seu olhar desafiam,

    impem-se sem pena. plida a face,

    seu corao falseia, como se amansasse ces

    que seguem seu passeio e com siso andam

    enquanto um lobo violento a seu lado caminha.

    Disse ento Mordred, de humor sorridente:

    Dam a da Bretanha! Faz tem po que vives

    em dias de abandono, solitria, sem am o,

    soberana sem rei, sem barulho na corte

    de cavaleiros valentes. Falei, no ters

    nunca mais no mundo tormento de cio

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    nem momento sem amor. Nem menos que rainha,

    confundidos teus dias, vais perder tua glria,

    nem que a sorte oscile se o certo escolheres.

    Um rei, querendo-te, sua coroa compartilha

    e te manda amor, amante fiel.

    A grave Guinever no guarda a resposta:

    A coroa te arrogas, soberano te dizes

    um emprstimo apenas do que te ps aqui,

    que vive e governa, nem que a volta tarde.

    Agradeo que me consideres e dediques servio,

    pois tal cabe, creio, de um caro sobrinho

    rainha de Artur. Seus olhos trem em ,

    ele a pe ao p dele, empolga-se e a toma.

    Ele grrulo e grave Guinever estremece:

    Empenhado no norte, nunca maisArtur vai voltar a esta terra, sua ilha,

    nem Lancelot do Lago que relembra o amor

    para teus galanteios! O tem po j m uda;

    regredindo o ocidente, com poder vem um vento

    do leste que se nobilita. Desfalece o mundo.

    A preamar j aumenta oprimindo as guas.Refalsado ou sincero, o audacioso quem pode

    navegar os escolhos, arrancar da runa

    o poder e a grandeza. Minha ideia essa.

    Prisioneira ou monarca, permaneces a meu lado,

    querendo ou no querendo, capturada ou esposa.

    Eu tomo esta fortuna antes que as torres desmoroneme tombem os tronos; vou fartar primeiro a sede.

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    Com coroa dourada serei rei depois.

    No frio m ago a rainha inda medita,

    prudente, mas teme; espantada finge estar,

    vai falando cautelosa, seu silncio rompendo:

    Tu demonstras am or, o que muito me admira,

    e topo contigo, que cortejas e insistes;

    preciso pensar na sbita proposta!

    Peo a ti, d-me tempo e um tanto de flego

    se a resposta me pedes! Se est perto Artur,em perigo estarei. Mostrars uma prova

    que em penhas combate e disputas o reino

    em meio ao tumulto? Prometo aceitar-te

    depressa se o cumprires. Com despeito ele ri:

    Ests presa, no podes ter prova de poder

    enquanto eu for conde ou quando for rei.s noiva ou prisioneira? Faze o anncio depressa!

    Hoje, inda hoje, teu juzo espero,

    nada mais eu permito. Caminha e se vai.

    Depressa precipita seus ps que ecoam

    no piso de pedra com passos largos.

    A noite vem inerte. Um nu crescente

    revela-se, vivo, das trevosas nuvens,

    farrapos de borrasca, e em arena de estrelas

    nada em bonana. Frenticos cavalgam

    combatentes montados com estrpito de cascos,

    ponteadas de ao prateadas lanas.

    A lguas dali num valo profundo

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    luzes claras de Cam elot enfraquecem e apagam;

    as terras distantes espreitando, e as matas

    e estradas de trevas. Sua trilha de medo.

    Revelou-se o lobo patrulhando no bosque,

    e a caa oculta escapa da tocaia,

    de medo tomada do inimigo fugiu,

    caada e acossada, insigne outrora,

    recompensa do combate de noblimos cervos

    com fora de feras. Enfim escapa

    Guinevere com graa em gro manto cinzento,

    ocultada em trevas, fugitiva da corte.

    So poucos os probos que apoiam sua pressa,

    homens que a acudiram em outros dias,

    quando trilhou de Leodegrance at Logres,

    noiva rumo ao noivo, adornada de ouro,

    na jactncia matutina de Artur, o possante.

    Ao ermo pas, a ocas torres

    onde Leodegrance solene, h longos anos,

    na Tvola Redonda festins celebrava,

    ela corre casa, no cru refgio,

    ocultando-se hesitante. No triste corao

    relem bra a Lancelot, que de longe oua

    da dor e andana da contendora do lobo.

    Se casse o rei, e rissem os corvos,

    ele viria socorr-la, rgia dama,

    em resgate com garbo? Da desgraa talvez

    nascesse o prazer, a doura de Guinevere,

    e no Mordred somente, arrumasse a sorte

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    pra voltar em seu intuito do tempo a m ar.

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    III

    De Sir Lancelot, que habitava em Benwick.

    No sul, passando do sono fria,

    monta tormenta, caminha para o norte

    sobre amplas guas, com alto trovo

    e cheia de chuva agita-se e avana.

    Os morros e montes de espumantes toposrem exem -se em tumulto nos mares revoltos.

    Nas praias de Benwick ribombam as ondas,

    trituram gigantescos, crepitantes rochedos

    com ira de ogros. O ar sal,

    com espuma e respingos dispersos em vapor.

    Lancelot ali, sobre lguas de mar,

    em vista revolta de elevada janela,

    contem pla e pondera, meditando a ss.

    A treva se estende. Angustiado ele est.

    Traiu seu amo, aliado paixo,

    rej eita a paixo, rechaa-o ainda o amo;

    refugam-lhe a f, ao que a f traiu,

    por milhas de mar do am or separado.

    Sir Lancelot do Lago, Lorde de Benwick,

    outrora de Artur o mais distinto cavaleiro,

    com forma de rei entre filhos de reis

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    tido por intrpido, combatendo com armas,

    a todos suplantando, de ardente corao;

    entre lordes de beleza revelada como flor

    fam oso e renomado, o mais formoso de rosto,

    com vigor e graa, agudo como ao.Branca tez tem ele; pretssimos cabelos,

    Escuros e faiscantes; escuros os olhos.

    Grande Gawain, grande como o sol douro,

    mas o cenho faz sombra ao cinza dos olhos;

    sua vida severa. Visto por todos

    como igual, quase, no o queima a inveja,

    justo e elogia protegidos e rivais,

    mas premia com amor somente o seu amo;

    no louva ilustre mulher nem homem

    tanto quanto a Artur. Todos os dias

    observando desconfia, duvida da Rainha

    que em sombra cinzenta vai desperdiar sua glria.

    S com Lancelot mesmo ela se deleita em amor,

    em sua grande glria tem gozo e prazer.

    amada, a ningum mais, seu amor ele d;

    no louva ilustre mulher nem homem,s Guinever lhe cara: s a glria acata

    de ilustre cavaleiro que ao lado da senhora

    conserva no corao. srio seu intento;

    foi constante muito tempo a Artur, seu senhor,

    na Tvola Redonda, altiva e real,

    prncipe de brios, cumprindo o deverpra am a e Rainha. Mas ai! prata fria

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    ou o ouro com que ela, de vido corao,

    adorna seus dedos, considera mais belo;

    muito mais formoso o que aos montes guarda

    escondido nas trevas. Adora-o, pois,

    com amor sem amarras a inclemente senhora,formosa e mgica, temvel fada

    que caminha no mundo pra tormento dos homens.

    O destino a instiga. Ela o tem por belo,

    tomando-o nas mos como mero ouro e prata.

    Prateada e douro, matutino sol,

    fascina sua risada, e seu sbito pranto

    molhado de lgrimas, sutilssimo veneno,

    arde como ao. Altas juras romperam eles.

    Com humor am argo Mordred observa-os

    entre inveja e dio vil, f e tormento.

    Assim o mal surge, e a sombra obscura

    como nuvem negra inunda a corte

    e, lenta, dilui a luz do dia.

    Em hora de azo foi Agravain

    chamado morte, o da mo dura

    tombou junto porta bem o queria Gawain.Irmos afirmados mexem as espadas

    e a Tvola Redonda foi toda partida

    por lm inas geladas na luta pela Rainha.

    Com dura justia tomam a Rainha,

    a formosa e mgica mandam fogueira,

    morte inclemente. Mas a morte esperou.Ali chega Lancelot, relmpago veloz,

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    trovo que cavalga, fogo indmito,

    em assdio sbito, assalta sem pena,

    derruba e arrasa carssimos amigos,

    como moitas que a tormenta inclemente arranca.

    Gaheris e Gareth, de Gawain os irmos,pelo fogo desfeitos como o fado quis.

    Do fogo a salvou, levou-a para longe;

    e tomados pelo medo no se animaram a segui-los;

    pois a gente de Ban em combate protegeu-o.

    Sua raiva rareia, o irado esmorece,

    seu humor mngua. Dem ora a afligir-se,

    arrependido do dano da Redonda Tvola.

    Engole o orgulho, renegando a audcia

    que mata os am igos e mina a confiana.

    Saudoso da simpatia de Artur, seu senhor,quer outra honra na nsia do corao,

    restaurar a soberana, am parado pelo rei,

    reassent-la em seu estado. Estranho ela o v,

    no mais o mesmo, por mal sbito.

    O combate ela suporta se pode ter o que quer,

    se a vida e o afeto satisfeita mantiverpra usar como deseja enquanto subsiste o mundo;

    do exlio a ss ressente-se ela deveras,

    e de perder a grandeza da existncia pelo amor.

    Despedem-se com pena. Com brasas na voz

    ela injuria sua ferida explorando-lhe a vontade.

    Seu pesar a atraioa, a am bio se frustra;o sol reluzente de sbito sombra

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    agitada na treva. Estranha pareceu a ele,

    no mais a mesma. Junto ao mar ele para

    como pedra esculpida, desespero cinzento.

    A despedida foi dor. O perdo ela encontra

    com arrimo do rei, amparada pelos homens,pra que pior no haj a, mpia guerra,

    contenda de cristos, nem festim de corvos.

    corte de Cam elot a acolhe por rainha

    grande, com glria. A graa de Artur

    ele procura e no alcana. Recusam sua espada.

    Nessas mos nunca mais com firm eza fiel

    depe sua espada, repousa a cabea

    do lorde Lancelot, longe do am or,

    pedindo perdo, a vaidade humilhada.

    Sem nada de ternura, banido da terra,

    da Tvola Redonda, sociedade real,

    e da cadeira altiva em que outrora se assentava

    afastou-se triste. Todo o mar salgado,

    cinzento, atravessou.

    O pesar Artur conheceu

    no seio do corao; pareceu-lhe a casa

    minguada em alegria, estragado o contentamento,

    perdendo o mais distinto capito na carncia.

    No sai a ss para sua terra

    alm do mar Lancelot. Os lordes de sua gente

    so muitos, comandam. Nos seus mastros tremulam

    os em blemas de Blam ore e de Bors, o forte,

    de Lionel, Lavain, do galante Ector,

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    o mais novo de Ban. Tomam nau para Benwick

    e abandonam a Bretanha. Em batalha nunca mais

    conduzem bandeiras acudindo a Artur,

    mas nas torres de Ban, impvidas, altssimas,

    delongam-se alertas, relutam em guerrear,velando Lancelot, seu lorde, com amor

    em seus dias de treva, angustiado a fundo.

    Traiu o amo, aliado paixo,

    rej eita a paixo, rechaa-o ainda o amo,

    por milhas de mar do am or separado.

    Brotada no ocidente, a notcia se espalha

    de Artur aprestando-se contra a terra sua prpria,

    que equipa sua esquadra pra vingana poderosa,

    organizando-a apressado, que a sbita fria

    da extensa tempestade deteve e impediu.Sobre o Lorde de Logres e a liga de traio

    que ataca seu trono medita sombrio:

    paladinos constantes nesses dias so escassos

    que alcem bem alto a honra da coroa,

    mandando no ocidente, nas fronteiras do mar,

    amparando as muralhas contra a derrota do mundo;muita falta lhes fazem as fortes espadas

    do povo de Ban, seus em blemas brilhantes;

    a luta de seu lorde, se Lancelot tivessem,

    seria farta de fogo qual flama ardente.

    Em parte espera, em parte despreza,

    ser cham ado ele mesmo por comando veloz,

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    devolvendo o firme servio ao rei,

    valendo Lancelot ao lorde Artur.

    Com desgosto regressa a Guinever seu pensamento:

    h tristeza na Bretanha, intento de guerra;

    renovasse-se firme o afeto da senhora,

    em perigo estaria a querida de Lancelot.

    Com sanha desprezou-o, sem contrio nenhuma,

    sem pena, com soberba e desprezo, e no entanto

    querida e carssima. Se o perigo a am eaa,

    veloz e alegre, logo que o cham e,

    contra o mar e a tormenta, ao clamor de trombeta,

    singraria as torrentes, tomaria a espada

    na terra triste, na batalha final

    a mando da amada, mesmo contra o rei.

    Mas nada do monarca, nenhum chamamentonem pedido da dama. S andana do vento

    sobre amplas guas, midas, bravias.

    A glria de Gawain, cavalgando dourado

    como o sol descendo e abrasando o mundo,

    traa cam inho vermelho na margem do oceano,

    na dianteira de Artur, e em treva cai o leste.Guinever se esconde no escuro cinzento,

    exam ina e se demora, e o mundo titubeia;

    aspereza que aparece quando a alegria se vai,

    perigo farej a ela conjeturando tenebrosa,

    a esperana se rompe, querendo ela porm

    moldar a seu tino o destino dos homens.E Lancelot ali, sobre lguas de mar,

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    contem pla e pondera meditando a ss

    com dvida atroz. A tarde cai.

    No toca trompa nem tropa convoca;

    hesita e no sai. Sopra o vento,

    tremem as torres batidas pela tormenta.

    A aurora se arrasta. Morrendo nas praias

    a espuma rebrilha, espectro dbil;

    a mar virando, a borrasca minguando.

    A luz se livra da longa sombrae anda na gua, ondas desperta,

    como vidro de reflexos verdes e prata.

    Em sono de sombra, debruado janela,

    delonga-se Lancelot em longo sonho;

    tem a fronte curvada elevada janela.

    Seus olhos se abrem alba do dia:inda voa o vento no vasto cu,

    saltando s alturas, mas na terra embaixo

    a paz est posta. Poas refletem

    o sol que ressalta qual crculo de prata;

    regado, aguado, fulgura o mundo;

    canta ave com ave na alba feliz.

    A toma nimo, seu nus pesado

    fica leve com alvio. Eleva-se solitrio

    e o hlito da alba lhe arde no rosto;

    sente o sopro de cano olvidada

    alcanando-lhe o corao qual ctara ou harpa.

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    Ali Lancelot, leve e brando,

    recebe o sol, a ss cantando;

    levanta-o a vida que refulge nas trevas,

    exaltada pela dor no domo dos cus.O tempo mutante, alteram-se as mars,

    nos outeiros matutinos que trilha a esperana

    pra despert-lo da fadiga existindo ainda o mundo.

    No reconhece o minuto que nunca m ais

    retorna em tempo e traz tempestade

    que impele ao combate coa trombeta do vento.

    Voltou atrs da fortuna a mar,

    sua rpida corrente o carrega consigo.

    Tem o fim sua frente e definha seu dia,

    no correr da mar no voltar jamais

    a tratar com criaturas existindo ainda o mundo.

    *

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    IV

    Como Artur retornou de manh e pela mo de Sir Gawain conquistou apassagem do mar.

    Os lobos ululam l na floresta;

    nos ares as rvores uivam e tremem,

    e folhas que revoam selvagens, perdidas,

    acumulam-se mortas nos imensos recncavos.

    de treva a estrada por atrozes vales,

    entre morros que montam entre muitas nvoas

    aos resguardos de Gales, graves no oeste,

    castanhos e toscos. s montanhas negras

    vo velozes cavaleiros, e nas vrzeas sem casas

    no resta rastro. Torrentes de gua

    despencam das penhas, espumam na treva;

    ouvem-nas eles, indo ao reino oculto.

    Cai o escuro. Os cascos batendo

    desfalecem no silncio da lgubre terra.

    *

    A aurora rala. Nos rostos escuros

    das montanhas vetustas voltadas para o leste

    a luz se alastra. Brilhante est a terra.

    O sol se acende. Sobe a alba

    qual prata que banha o brilho da gua

    num cu vazio, azul e infindo.

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    Pelos ram os irrompem raios de luz,

    ressaltam e oscilam na cinzenta floresta;

    gotas pingando dos galhos e folhas

    como farpas de vidro que fulgem e reluzem.

    No se move um animal: mudos os pssaros.Cautelosos como lobos trilhando a mata

    cavalgam nos vales os que vm de Mordred,

    com malta de fam intos, imensos ces

    que acompanham a pista com brbaros latidos.

    Caam eles a rainha com dio frio

    t que falhe sua f nas vrzeas sem casas,

    demoram-se famintos nos morros terrveis

    nos resguardos de Gales. A guerra os segue,

    tristeza na Bretanha. Alteram -se os ventos,

    Mordred imvel.

    Transmitem-lhe a mensagem

    nas penhas das praias, nas plagas do sul,

    escarpas faiscantes. Na curta erva

    montou suas tendas, qual cidade aj untada

    com becos e praas, bulha de vozes,

    envolta nos vales, elevando-se nos morros

    superiores a Romeril, que a torrente de gua

    cavou em vala e vai dar no mar.

    Do este, de Angel e das ilhas de nvoa

    arrolam sua marinha os reis de Almain,

    reunindo sob o penhasco naus entalhadas

    e turvos estandartes volitando ao vento.

    A brisa espuma nas pintas das ondas,

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    quebrando na praia, de prata e verde,

    as vagas revoltas nas fragas de greda.

    Num morro gramado Mordred se posta:

    volta a vista avante, ao sul,

    pra que nunca nenhuma nau de Arturvenha co vento. Avia sentinelas

    margem do mar nos limites do sul,

    cuidando do estreito dia e noite

    dos outeiros todos. Ento mandou

    erguer fogueiras que queimem e ardam,

    alertando-o do retorno de Artur, convocando

    e juntando sua tropa em proveitoso local.

    Assim guarda, aguarda e escuta o vento.

    Ivor o sada com vido cham ado,

    postado j unto tenda, pensativo e ereto;

    notcias importunas do ocidente ele traz.

    Senhor!, o anncio, a Senhora est perdida!

    Sua pista se perde nas pedras lisas;

    os ces de caa derrocados nas colinas.

    terra secre tssima, aos guardados vales,

    para l onde Leodegrance h longos anoshabitou assediado, encantado senhor,

    chegou l, est livre. Mas seus aliados so poucos.

    No mais deves temer a mgica m ulher!

    O destino a destrua! No retorne jamais,

    pra tormento de Mordred no caminhe neste cho!

    Elimina-a da mente! Argumenta com homens,deslembra a mulher impelindo a guerra!

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    Tua hora esta. Mas os olhos titubeiam ,

    calada a lngua. Lento voltando-se,

    com trovo na fronte o fero Mordred

    o encara com clera. Cala-te!, exclama.

    O momento do mestre s o mestre escolhe.Nada conheces. Danado em malogro,

    do vo servio voltas casa

    discursando grosseiro, trazendo a Mordred

    advertncias de tolo? Retira-te daqui

    prum destino maldito. O demo te leve!

    Passeia a ss e sem sossego.

    No seu peito desperta, sob preta sombra,

    um fogo abafado cujo fumo o sufoca;

    errante, ponderando, num labirinto caminha

    entre pavor e fria. Numa volta sua mente,caada pelo anseio, desata-se dele,

    o desejo a incita a srio tormento.

    Mas cr que Guinever recado enviou

    por reservado estafeta levando-o sobre o mar

    ao lorde Lancelot, e lembra-lhe o amor,

    suplicando socorro em seu fracasso.Se o povo de Ban ao combate acorrer

    e em fusco fundo a flor de lrio

    outra vez for vista com altivez marchando

    pra Artur ajudar, entende que o impede

    de atingir seu objeto. Deste jeito medita.

    O bravo Lancelot, lorde de Benwick,mais ele abomina, temendo-o tambm,

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    e recorda bem claro o discurso proftico

    que, se os lordes de Benwick exibindo o lrio

    em combate aberto ele aborda e desafia,

    a derrota o arrasa. Irado e sagaz,

    a dvida e a audcia no seu turvo raciocnioporfiam em vo. O vento se abate.

    No cu sem sombra, luzente e dourado,

    o sol ao anoitecer reacende o vero

    e se pe como brasa. Rebrilha o mar

    sob estrelas trnsfugas na estrada do cu.

    Passa dia aps dia. Com ardor am anhece

    e h brisa soprando pura na manh,

    calma e aguda. Um grito o desperta.

    Uma vela, uma vela sobre as vagas reluz!

    Vigias agitam-se, queixosas vozes

    levadas do vento voam entre eles,

    e os guardas das fogueiras que agarram tochas

    esperam despertos. Ele para em silncio.

    Ele volta a vista avante, ao sul,

    vendo velas que vm pelo mar.

    Assim, de manhzinha, aproxima-se Artur,

    retornando afinal, monarca de perdido reino.

    No seu pendo radia, bordada em prata,

    alva rainha que ala nos braos

    um recm-nascido de santa donzela,

    transluzido de sol. Acende-se o mar.

    A muitos se mostra, e Mordred o reconhece,

    o estandarte de Artur. Afastando os olhos,

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    o em blema de Benwick busca afoito,

    prata sobre preto. Pois no o enxerga.

    A linda flor-de-lis desfalece em seu campo

    e tomba na treva. O destino aproxima-se.

    Sobe o sol, assomam as velas.No meio do mar debilmente soando

    escutam cornes. Erguendo-se vem

    a plena pressa, prximo de Artur,

    um forte navio que fulge na manh,

    alto e alvo, de ouro seu casco;

    na vela se v um levante sol,

    na bandeira bordada flutua brisa

    um grifo fogoso que fulgura dourado.

    chegado Gawain, que guarda seu rei

    e com alento valente lder da vanguarda:

    so cascos faiscantes, de quilhas centena

    e velas que revoam e paveses que balanam .

    Atrs descortinam a tropa a caminho:

    h lanchas de calado, e levam barcaas,

    gals e galeras aparelhadas pra guerra,

    ao sol passando seiscentas velas,

    viso bela e bruta. Drapejam bandeiras;

    dez mil armam entos montam ali

    pendendo dos costados, bandeiras de prncipes

    e senhores do Norte e dos nove reinos

    da bendita Bretanha. Mas a estirpe de Ban

    no est l, nem Lancelot, o dos lrios, tampouco.

    Ento Mordred mui alto sem humor se ri.

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    Ouvem-se suas ordens. Acres as trompas.

    Queimam fogueiras, ergueram-se estandartes,

    as costas ecoam, nos escudos batem lanas.

    A guerra acorda, o desgosto na Bretanha.

    Artur retorna terra sua prpria,com poder e majestade altivo vem

    a Romeril onde chorando, correndo lento

    um crrego alcana a costa do mar.

    O sol nas espadas e pontas, de prata feitas,

    das lanas reluz, que se elevam

    plantadas como trigo. Volitando acima,

    grasnam os corvos com agudas vozes.

    So mil no mar espumante faiscando

    os rpidos remos. Rgulos saxes

    bradam bravos na proa das naus;

    brandem espadas, brilham machados,

    com vozes severas invocam seus deuses.

    Com rostos irados as carrancas de drago

    eles empurram , impelem pra que partam logo,

    soltos de sbito, balanando ao ataque.

    Atingem os costados. Estouram os madeiram es.

    Ranger de ganches, machados que estrugem;

    fascam, abrem-se elmos e lanas;

    os ferreiros guerreiros marretam bigornas

    com estrpito de martelos, mortfera forja

    de ira e runa. Erguem mos rubras.

    Apertam Prydwen, bela e altiva

    capitnia de Artur, prateada nau.

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    Ento Gawain toca a grande trompa.

    Sua enorme nau, desenhada de ouro,

    se mete em seu meio bramindo qual trovo,

    voa com o vento. Perseveram atrs

    lgios de Lothian, lordes e capites.

    Arrasam os remos. Madeirame desfeito,

    cordame fendido. Com intenso golpe

    os mastros desmontam como imensas rvores,

    despencam abaixo na bulha do combate.

    Agora Gawain Galuth desembainha,

    lmina ilustre habilssimos artesos

    anteriores a Roma suas runas gravaram,

    a tmpera mortal, fortssimo o ao

    vem como fogo, flama nas mos.

    O rei dos godos que na carranca se segura,

    ele atinge-o mortfero, afastando-o pro mar;

    nos lordes de Lochlan lana raios,

    os altos elmos e mpios estandartes

    desfaz com fria. forte sua voz

    gritando Artur. Tremem os ares

    co barulho da rplica, vociferando milhares.

    Como trigo na tempestade, talos que caem

    ao longo da colheita, ou eleva-se a nvoa

    ao sol que nascendo acende sua fria,

    seus inimigos que o medo domina fogem todos.

    Tombando da borda dos barcos perecem

    caindo nas ondas, suas almas perdendo.

    Os barcos derribados so brasa e fumaa;

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    uns subindo na praia, quebrados e rotos.

    A rubra mar as rochas tinge.

    Trincados, em cacos, escudos na gua

    flutuam em destroos. De todos restam poucos,

    escapando ao combate em quebranto, sangrentos.

    Destarte Artur retorna a seu reino

    abrindo coa espada o passo do mar,

    com Gawain na vanguarda. Sua glria reluz

    qual astro no pice, spera, clara,

    montando s alturas sobre todos os homens

    ao encontro da queda. Aquieta-se o destino.

    A mar est virando. Madeirames partidos,

    defuntos que afundam , fracos destroos,

    dejetos que jazem enchendo as praias;

    pedras em pranto despontam nas guas.

    *

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    V

    Do pr do sol em Romeril.

    Destarte fica Artur montado na baixam ar.

    Contem pla sua terra e triste anseia

    por rever outra vez a verde grama,

    andando vontade quanto dure o mundo;

    pra que sinta o sal, o seu aromacom perfume de vinho, vento de trevo

    que germina junto ao mar em gramado de sol,

    escutar da cristandade os badalos agudos

    de sinos que oscilam aprazveis na brisa,

    um prncipe de paz que impera e reina

    ao p da porta aberta do Paraso.

    Contempla a terra altiva e clara.

    Ali passeia a traio, soam trombetas

    com altivo poder. Traidores, prncipes,

    na costa agrupam seus escudos sem pudor

    enganando seu senhor. Renegam a Cristo,

    virando sua esperana ao poderio pago.

    Muitos marcham , rumando para o sul;

    do leste cavaleiros malvolos acorrem

    como feras de fogo que inflamam e arrunam;

    alvas torres viram tochas, o trigo repisado,

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    o cho queixando-se, murchando a gram a.

    H tristeza na Bretanha e extingue-se o mundo;

    os sinos silenciam , ressoam espadas,

    o inferno est vizinho, o cu se afasta.

    Paga imposto e tributo terrvel,

    desperdiando o sangue que aprecia mais,

    ceifadas as vidas que prefere a todas;

    l morrem amigos, murcha a flor

    da rgia cavalaria, cuja dolorida paga

    foi treva, destino dos mortais, e olvido,

    pra abalar as muralhas e trilhar a conquista,

    ter outra vez a verde erva

    sob os ps, os passos que buscam o lar.

    Nunca teve Artur fatal perigo

    que, temido ou domado, seu pensam ento desviasse

    ou obstasse sua trilha. J o tolhe a pena

    e o apreo pela ptria e seu povo leal,

    pelos pequenos logrados e os instigados h muito,

    pelos fracos que duvidam; aflige-se pelos maus.

    Exausto, com pesar, saciado de guerra,

    pois coroa real e direito traz,

    passa em paz e aplica o perdo,

    curando as feridas, liderando a todos,

    pra ditosa Bretanha reconquistar a alegria.

    O fado sua frente oferta-lhe a morte

    antes de obter o intento, conquistar o mundo.

    [Os dezesseis versos seguintes foram escritos mais apressadam ente em um

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    bilhete separado.]

    Agora chama Gawain. Grave sua fala,

    na mgoa demonstra pensamentos severos.

    Sdito do meu sangue, sincero e nobre,

    torre que me protege, verdadeiro conselho,

    a trilha adiante c onduz ao perigo.

    Tomamos o mar. Os muros inda restam,

    desafiam nossa fora eivados de ameaas.

    Condiz decidirmos um ataque implacvel

    e pedgio mortal do traidor cobrarmos

    pra vencer a passagem sem recusar o preo,

    no pavor da aventura, avante com dano,

    sem considerar a esperana? Roga meu corao

    que melhor tomar alento, batalhar s depois.

    Anda, as armas a outro porto levem os,

    fio-me no vento e na fraca mar

    que nos alce ao oeste.

    Aqui termina A Queda de Arturem sua forma mais recente.

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    I

    How Arthur and Gawain went to war and rode into the East.

    Arthur eastward in arms purposed

    his war to wage on the wild marches,

    over seas sailing to Saxon lands,

    from the Roman realm ruin defending.

    Thus the tides of time to turn backwardand the heathen to humble, his hope urged him,

    that with harry ing ships they should hunt no more

    on the shining shores and shallow waters

    of South Britain, booty seeking.

    As when the earth dwindles in autumn day s

    and soon to its setting the sun is waningunder mournful mist, then a man will lust

    for work and wandering, while yet warm floweth

    blood sun-kindled, so burned his soul

    after long glory for a last assay

    of pride and prowess, to the proof setting

    will unyielding in war with fate.

    So fate fell-woven forward drave him,

    and with malice Mordred his mind hardened,

    say ing that war was wisdom and waiting folly.

    Let their fanes be felled and their fast places

    bare and broken, burned their havens,

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    and isles immune from march of arm s

    or Roman reign now reek to heaven

    in fires of vengeance! Fell thy hand is,

    fortune follows thee fare and conquer!

    And Britain the blessed, thy broad kingdom,I will hold unharm ed till thy home-coming.

    Faithful hast thou found me. But what foe dareth

    war here to wake or the walls assail

    of this island-realm while Arthur liveth,

    if the Eastern wolf in his own forest

    at last em bay ed must for life battle?

    So Mordred spake, and men praised him,

    Gawain guessed not guile or treason

    in this bold counsel; he was for battle eager,

    in idle ease the evil seeing

    that had rent asunder the Round Table.

    Thus Arthur in arms eastward journeyed,

    and war awoke in the wild regions.

    Halls and temples of the heathen kings

    his might assailed marching in conquest

    from the mouths of the Rhine oer many kingdoms.

    Lancelot he missed; Lionel and Ector,

    Bors and Blamore to battle came not;

    yet mighty lords remained by him:

    Bediver and Baldwin, Brian of Ireland,

    Marrac and Meneduc from their mountain-towers;

    Errac, and Iwain of Uriens linethat was king in Reged; Cedivor the strong

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    and the queens kinsman Cador the hasty.

    Greatest was Gawain, whose glory waxed

    as times darkened, true and dauntless,

    am ong knights peerless ever anew proven,

    defence and fortress of a falling world.As in last sortie from leaguered city

    so Gawain led them . As a glad trumpet

    his voice was ringing in the van of Arthur;

    as a burning brand his blade wielded

    before the foremost flashed as lightning.

    Foes before them, flames behind them,

    ever east and onward eager rode they,

    and folk fled them as the face of God,

    till earth was empty, and no ey es saw them,

    and no ears heard them in the endless hills,

    save bird and beast baleful haunting

    the lonely lands. Thus at last came they

    to Mirkwoods margin under mountain-shadows:

    waste was behind them, walls before them ;

    on the houseless hills ever higher mounting

    vast, unvanquished, lay the veiled forest.Dark and dreary were the deep valley s,

    where limbs gigantic of lowering trees

    in endless aisles were arched oer rivers

    flowing down afar from fells of ice.

    Among ruinous rocks ravens croaking

    eagles answered in the air wheeling;wolves were howling on the woods border.

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    Cold blew the wind, keen and wintry,

    in rising wrath from the rolling forest

    am ong roaring leaves. Rain came darkly,

    and the sun was swallowed in sudden tempest.

    The endless East in anger woke,

    and black thunder born in dungeons

    under mountains of menace moved above them .

    Halting doubtful there on high saw they

    wan horsemen wild in windy clouds

    grey and monstrous grimly riding

    shadow-helmed to war, shapes disastrous.

    Fierce grew the blast. Their fair banners

    from their staves were stripped. Steel no longer,

    gold nor silver nor gleaming shield

    light reflected lost in darkness,

    while phantom foes with fell voices

    in the gloom gathered. Gawain loudly

    cried as a clarion. Clear went his voice

    in the rocks ringing above roaring wind

    and rolling thunder: Ride, forth to war,

    ye hosts of ruin, hate proclaiming!Foes we fear not, nor fell shadows

    of the dark mountains demon-haunted!

    Hear now ye hills and hoar forest,

    ye awful thrones of olden gods

    huge and hopeless, hear and tremble!

    From the West comes war that no wind daunteth,might and purpose that no mist stay eth;

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    lord of legions, light in darkness,

    east rides Arthur! Echoes were wakened.

    The wind was stilled. The walls of rock

    Arthuranswered.

    There evening cam ewith misty moon moving slowly

    through the wind-wreckage in the wide heavens,

    where strands of storm among the stars wandered.

    Fires were flickering, frail tongues of gold

    under hoary hills. In the huge twilight

    gleamed ghostly -pale, on the ground rising

    like elvish growths in autumn grass

    in some hollow of the hills hid from mortals,

    the tents of Arthur.

    Time wore onward.

    Day came darkly, dusky twilight

    over gloomy heights glimm ering sunless;

    in the weeping air the wind perished.

    Dead silence fell. Out of deep valley s

    fogs unfurling floated upward;

    dim vapours drowned, dank and form less,

    the hills under heaven, the hollow places

    in a fathomless sea foundered sunken.

    Trees looming forth with twisted arms,

    like weeds under water where no wave moveth,

    out of mist menaced man forwandered.

    Cold touched the hearts of the host encam ped

    on Mirkwoods margin at the mountain-roots.

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    They felt the forest though the fogs veiled it;

    their fires fainted. Fear clutched their souls,

    waiting watchful in a world of shadow

    for woe they knew not, no word speaking.

    Far and faintly ere the fall of eve

    they heard a horn in the hills trembling,

    forlorn and lonely, like lost voices

    out of night at sea. Nearer it sounded.

    Now hoofs they heard, a horse neighing,

    watchmen calling. Woe had found them.

    From the West came word, winged and urgent,

    of war assailing the walls of Britain.

    Lo! Cradoc was come the king seeking

    down perilous way s their path trailing

    from the mouths of the Rhine oer many kingdomsgrimly riding. Neither grey shadows

    nor mist stay ed him mighty -hearted.

    Haggard and hungry by his horse standing

    to Arthur told he evil tidings:

    Too long my lord from your land ye tarry !

    While war ye wage on the wild peoplesin the homeless East, a hundred chiefs

    their seahorses swift and deadly

    have harnessed in havens of the hidden islands.

    Dragon-prowed they drive over dark billows;

    on shores unguarded shields are gleaming

    and black banners borne am id trumpets.Wild blow the winds of war in Britain!

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    York is leaguered, y ielded Lincoln;

    unto Kent kindled the coast blazeth.

    Hither have I hardly hunted riding

    on the sea pursued to your side hastened,

    treason to tell you. Trust not Mordred!He is false to faith, your foes harbours,

    with lords of Lochlan league he maketh,

    out of Almain and Angel allies hireth,

    coveting the kingdom, to the crown reaching

    hands unholy. Haste now westward!

    *

    A while then Arthur white with anger

    there sat in silence. Thus sudden fortune

    had turned and betray ed him. In twenty battles

    he had fought and conquered; his foes were scattered,

    neath his hand were humbled heathen chieftains.

    Now from hopes summ it headlong falling

    his heart foreboded that his house was doomed,

    the ancient world to its end falling,

    and the tides of time turned against him.

    Swift then sent he to summ on Gawain

    bold in counsel. Bitter words he spake;

    the evil tidings all he told him.

    Now for Lancelot I long sorely,

    and we miss now most the mighty swords

    of Bans kindred. Best meseemeth

    swift word to send, service craving

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    to their lord of old. To this leagued treason

    we must power oppose, proud returning

    with matchless might Mordred to humble.

    Gawain answered grave and slowly :

    Best meseem eth that Bans kindred

    abide in Benwick and this black treason

    favour nor further yet I fear the worse:

    thou wilt find thy friends as foes meet thee .

    If Lancelot hath loyal purposelet him prove repentance, his pride forgoing,

    uncalled coming when his king needeth!

    But fainer with fewer faithfulhearted

    would I dare danger, than with doubtful swords

    and tarnished shields of truant lieges

    our muster swell. Why more need we?Though thou legions levy through the lands of Earth,

    fay or mortal, from the Forests margin

    to the Isle of Avalon, armies countless,

    never and nowhere knights more puissant,

    nobler chivalry of renown fairer,

    mightier manhood under moon or sunshall be gathered again till graves open.

    Here free unfaded is the flower of time

    that men shall rem ember through the mist of years

    as a golden summer in the grey winter.

    And Gawain hast thou. May God keep us

    in hope allied, heart united,as the kindred blood in our bodies courseth,

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    Arthur and Gawain! Evil greater

    hath fled aforetime that we faced together.

    Now in haste is hope! While hate lingers,

    and uncertain counsel secret ponders,

    as wroth as wind let us ride westward,and sail over sea with sudden vengeance!

    *

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    II

    How the Frisian ship brought news, and Mordred gathered his host and went toCam elot seeking the queen.

    Dark wind came driving over deep water,

    from the South sweeping surf upon the beaches,

    a roaring sea rolling endless

    huge hoarcrested hills of thunder.

    The world darkened. Wan rode the moon

    through stormy clouds stream ing northward.

    From France came flying a fleet vessel

    dark and dragon-prowed, dreadly carven,

    sable-shrouded, on the sea leaping,

    by the waves hunted as a wild creature

    am ong hungry hounds. The horns of the wind

    were its mort blowing. Men were calling,

    to their gods cry ing with grim voices,

    as it rode to wreck with riven timbers

    in the mouths of the sea. The moon glittered

    in the glaring ey es upon their grey faces

    death outstaring. Doom oercame them.

    Mordred was waking. His mind wandered

    in dark counsels deep and secret.

    From a window looked he in western tower:

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    drear and doubtful day was breaking,

    grey light glimm ered behind gates of cloud.

    About the walls of stone wind was flowing;

    sea sighed below, surging, grinding.

    He heard nor heeded: his heart returnedto its long thraldom lust-tormented,

    to Guinever the golden with gleaming limbs,

    as fair and fell as fay -woman

    in the world walking for the woe of men

    no tear shedding. Towers might he conquer,

    and thrones oerthrow yet the thought quench not.

    In her blissful bower on bed of silver

    softly slept she on silken pillows

    with long hair loosened, lightly breathing,

    in fragrant dreams fearless wandering,

    of pity and repentance no pain feeling,

    in the courts of Cam elot queen and peerless,

    queen unguarded. Cold blew the wind.

    His bed was barren; there black phantoms

    of desire unsated and savage fury

    in his brain had brooded till bleak morning.

    A stair he mounted steeply winding

    to walls em battled well-wrought of stone.

    Oer the weeping world waking coldly

    he leant and laughed, lean and tearless.

    Cocks were crowing. Clamour rose at gate.

    Servants sought him soft-foot running

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    through hall and bower hunting swiftly.

    His eager squire Ivor hailed him

    by the dungeon-stair at the door standing:

    Lord! Come below! Why alone walk ye?

    Tidings await you! Time is spared ustoo short for shrift. A ship is landed!

    Mordred came then; and men trembled

    at his dark visage drenched with water;

    wind-tossed his hair, and his words grated:

    Do ye ransack with rabble this roy al castle,

    Because a ship from storm to shore flieth?

    Ivor him answered: On your errand hasting

    the Frisian captain from France cometh

    on wings of wind, his word keeping,

    fate defy ing. Fate hath conquered.

    His ship is broken on the shore lying;

    at the door of death he doomed lingers.

    All else are dead. At early day

    the red rover the rings of gold

    repay ed to his patron, ere he passed to hell;

    shrift he sought not, nor shaven priest,his latest words to his lord speaking:

    Cradoc the accursd to the king fly ing

    through thy net slipping news untimely

    east to Almain ere the hour was ripe

    hath brought from Britain. Bare is thy counsel;

    in Arthurs ears all is rum ouredof thy deeds and purpose. Dark his anger.

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    He hastens home, and his host summ ons,

    from the Roman marches riding as tempest.

    Nine thousand knights draw near the sea;

    on northern waves his navy lies,

    Whitesand with boats, wherries and bargesshipwrightshammers, shouting seamen,

    ringing armour, riders hasting,

    is loud and thronging. Look ye to it!

    Shining on bulwarks shields are hanging

    blazoned in blood-red foreboding war.

    On the waves they wait and the winds fury ;

    lean hounds at leash longships are tugging

    on heaving hawsers. Haste now eastward!

    Radbod the Red, rover fearless,

    heathen-hearted to hate faithful,

    died as his doom was. Dark was the morning.

    To sea they cast him, of his soul recked not

    that walks in the waters, wandering homeless.

    Wild rode the wind through the West country.

    Banners were blowing, black was the raven

    they bore as blazon. Blaring of trumpets,

    neighing of horses, gnashing of armour,

    in the hoar hollows of the hills echoed.

    Mordred was marching; messengers speeding

    northward and eastward the news bearing

    through the land of Logres. Lords and chieftains

    to his side he summ oned swift to hasten

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    their tryst keeping, true to Mordred,

    faithful in falsehood, foes of Arthur,

    lovers of treason, lightly purchased

    followers of fortune, and freebooters

    of Erin and Alban and East-Sassoin,of Almain and Angel and the isles of mist;

    the crows of the coast and the cold marshes.

    He came to Cam elot, the queen seeking.

    Fiercely heard she his fee t hasten

    with striding steps the stair climbing.

    To her bower came he. With burning ey es

    by the door he stood darkly gazing.

    She sat silent no sign giving

    at the wide window. Wan gleamed the day

    in her bright tresses bleakly golden.Grey her ey es were as a glittering sea;

    glass-clear and chill they his glance challenged

    proud and pitiless. But pale her cheek

    for heart misgave her, as one that hounds tameth

    to follow her feet and fawn at hand,

    when wolf unawares walks am ong them .

    Then spake Mordred with his mouth smiling:

    Hail! Lady of Britain! It is long sitting

    alone lordless in loveless day s,

    a kingless queen in courts that echo

    to no noise of knighthood. Yet never shalt thou

    on earth hereafter thine hours barren

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    and life find loveless. Nor less than queen

    with dimmed glory thy day s revile

    though chances change if thou choose aright.

    A king courts thee his crown to share,

    his love offering and loyal service.

    Gravely Guinever again answered:

    Thou callest thee king, and of crown speakest

    in his lieu twas lent thee by thy liege-master,

    who liveth yet and reigneth, though long absent.

    For thy love I thank thee and loyal service,

    though due I deem it from dear nephew

    to Arthurs queen. Then her ey es wavered,

    and he set her beside him, seized her fiercely.

    Grim words he spake Guinever trembled:

    Now never again from northern warsshall Arthur enter this island realm,

    nor Lancelot du Lake love rem em bering

    to thy tryst return! Time is changing;

    the West waning, a wind rising

    in the waxing East. The world falters.

    New tides are running in the narrow waters.False or faithful, only fearless man

    shall ride the rapids from ruin snatching

    power and glory. I purpose so.

    Thou at my side shall lie, slave or lady,

    as thou wilt or wilt not, wife or captive.

    This treasure take I, ere towers crumble,and thrones are oerturned, thirst first will I slake.

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    I will be king after and crowned with gold.

    Then the queen took counsel i n her cold bosom

    between fear and prudence; feigning wonder,

    softly after silence she dissembling spake:

    My lord, unlooked-for were thy love-speeches,

    and this eager suit thou urgest now;

    new thoughts arise needing counsel!

    Delay allow me and a little respite

    ere thou ask my answer! Should Arthur come,my plight were perilous. Could thou proof show me

    that thou wilt ride over ruin, wresting kingship

    from troublous times, troth were plighted

    with briefer counsel. Bitterly laughed he:

    What proof of power shall prisoner seek,

    captive of captor? Be I king or earl,twixt bride and bond brief be the choosing!

    Needs must tonight that I know thy mind;

    longer I grant not. Then his leave took he.

    Fierce and hasty his feet echoed

    with striding steps on the stone pavement.

    Night came slowly. The naked moon

    slipped sudden forth from swathing clouds

    torn by tempest, in a tarn of stars

    swam serenely. Riding swiftly

    hosemen hastened. Hooves were beating,

    steel-pointed spears stung with silver.

    Long leagues behind in a low valley

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    the lights of Cam elot lessened and faded;

    before lay forest and the far m arches,

    dark roads and dim. Dread pursued them.

    Wolf had wakened in the woods stalking,

    and the hind hardly from hiding driven

    her foe had fled, fear-bewildered,

    cowed and hunted, once queen of herds

    for whom harts maj estic in horned combat

    had fought fiercely. So fled she now,

    Guinevere the fair in grey mantled,

    cloaked in darkness, from the courts stealing.

    Few faithful men her flight aided,

    folk that followed her in form er day s,

    when from Leodegrance to Logres rode

    bride to bridegroom brave and golden

    in mighty Arthurs morning glory.

    Now to lonely towers, land deserted,

    where Leodegrance once long ago

    at the Round Table regal feasted,

    she hastened home to harbour cold,

    hiding uncertain. In her heart darkly

    she thought of Lancelot, should he learn afar

    of her woe and wandering by wolf hunted.

    If the king were conquered, and the crows feasted,

    would he come at her call, queen and lady

    riding to rescue? Then from ruin haply

    were gladness wrested. Guinevere the fair,

    not Mordred only, should master chance

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    and the tides of time turn to her purpose.

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    III

    Of Sir Lancelot, who abode in Benwick.

    In the South from sleep to swift fury

    a storm was stirred, striding northward

    over leagues of water loud with thunder

    and roaring rain it rushed onward.

    Their hoary heads hills and mountainstossed in tumult on the towering seas.

    On Benwicks beaches breakers pounding

    ground gigantic grumbling boulders

    with ogre anger. The air was salt

    with spume and spindrift splashed to vapour.

    There Lancelot over leagues of sea

    in heaving welter from a high window

    looked and wondered alone musing.

    Dark slowly fell. Deep his anguish.

    He his lord betrayed to love y ielding,

    and love forsaking lord regained not;

    faith was refused him who had faith broken,

    by leagues of sea from love sundered.

    Sir Lancelot, Lord of Benwick

    of old was the noblest knight of Arthur,

    am ong sons of kings kingly seeming,

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    deem ed most daring, in deeds of arms

    all surpassing, eagerhearted;

    am ong folk whose beauty as a flower blossomed

    in face the fairest, formed in manhood

    strong and gracious, steel well-tempered.White his hue was; his hair raven,

    dark and splendid; dark his ey es were.

    Gold was Gawain, gold as sunlight,

    but grey his eyes were gleaming keenly;

    his mood sterner. By men holden

    almost equal envy he knew not,

    peer and peerless praising justly,

    but to his lord alone his love giving;

    no man nor woman in his mind holding

    dearer than Arthur. Daily watchful

    the Queen he doubted, ere the cold shadow

    on her great glory grey had fallen.

    To Lancelot her love gave she,

    in his great glory gladness finding.

    To his lady only was his love given;

    no man nor woman in his mind held hethan Guinever de