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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ
LIZANDRÉIA BALDESSAR RAMOS
A (IN) ADMISSIBILIDADE DAS PROVAS ILÍCITAS NO PROCE SSO PENAL : Quanto as Interceptações Telefônicas
Biguaçu 2008
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LIZANDRÉIA BALDESSAR RAMOS
A (IN) ADMISSIBILIDADE DAS PROVAS ILÍCITAS NO PROCE SSO PENAL : Quanto as Interceptações Telefônicas
Monografia apresentada à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI , como requisito parcial a obtenção do grau em Bacharel em Direito.
Orientadora: Profª. MSc. Eunice Anisete de SouzaTrajano.
Biguaçu 2008
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LIZANDRÉIA BALDESSAR RAMOS
A (IN) ADMISSIBILIDADE DAS PROVAS ILÍCITAS NO PROCESSO
PENAL: Quanto as Interceptações Telefônicas
Esta Monografia foi julgada adequada para a obtenção do título
de bacharel e aprovada pelo Curso de Direito, da Universidade do Vale do Itajaí,
Centro de Ciências Sociais e Jurídicas.
Área de Concentração: Direito Processual Penal
Biguaçu, 12 de novembro de 2008.
Profª. MSc. Eunice Anisete de Souza Trajano UNIVALI – Campus de Biguaçu
Orientadora
Prof. MSc. Celso Wiggers UNIVALI – Campus de Biguaçu
Membro
Profª. MSc. Maria Letícia Iconomos Baixo UNIVALI – Campus de Biguaçu
Membro
4
Dedico este trabalho aos meus pais, Lizandro
Corrêa Ramos (in memorian) e Albertina Baldessar
Ramos (in memorian), espelho de todo meu caráter
e fonte de minha inspiração.
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AGRADECIMENTOS
A Deus, por se fazer presente em todos os momentos
difíceis de minha existência.
A toda minha família, pelo incentivo dado em toda
minha trajetória acadêmica.
Aos colegas de classe, aos quais, algumas vezes
recorri para elucidar minhas dúvidas.
A minha professora e orientadora, Eunice Anisete de
Souza Trajano, pela imensa presteza que demonstrou
durante o período de elaboração desta monografia.
Por fim, a todos aqueles que contribuíram de alguma
forma, e que não me recordo neste momento.
6
“Direito não é uma simples idéia, é uma força viva. Por isso a justiça sustenta numa das mãos a balança com que pesa o direito, enquanto no outra segura a espada por meio da qual o defende. A espada sem a balança é a força bruta, a balança sem a espada, a impotência do direito. Uma completa a outra, e o verdadeiro estado de direito só pode existir quando a justiça sabe brandir a espada com a mesma habilidade com que manipula a balança”.
Rudolf von Ihering, in A Luta pelo Direito.
7
TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE
Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total
responsabilidade pelo aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a
Universidade do Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca
Examinadora e o Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.
Biguaçu, 12 novembro de 2008.
Lizandréia Baldessar Ramos
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RESUMO
Este trabalho apresenta um estudo sobre a questão da (in) admissibilidade das
provas ilícitas no processo penal: quanto às interceptações telefônicas. Assunto
bastante atual e controvertido. Salienta-se que a Constituição da República
Federativa do Brasil de 1988, expressa e é taxativa que “são inadmissíveis, no
processo, as provas obtidas por meios ilícitos”, esculpida no inciso LVI, do artigo 5º.
Entretanto, busca-se, demonstrar que os direitos constitucionalmente protegidos, em
especial, os direitos da personalidade, quais sejam: o direito a intimidade,
privacidade, a honra e a imagem, podem ser sopesados, e cederem quando
contrapostos ao interesse da coletividade, bem como, afastada a exclusão da
inadmissibilidade das provas ilícitas em casos graves e excepcionais, quando em
favor do acusado, conforme a teoria da proporcionalidade ou razoabilidade. E
quanto às interceptações telefônicas, quando estas preencherem os requisitos e
obedecerem às formalidades legais da lei 9.296/96, (Regulamenta o inciso XII, parte
final do art. 5º da Constituição Federal), poderão ser utilizadas como meio de prova.
Palavras Chave : Provas. Provas ilícitas e ilegítimas. Interceptação telefônica.
9
ABSTRACT
Ce document présente une étude sur la question de (dans) la recevabilité des
preuves illégales dans les procédures pénales: le piratage de téléphone. Sujet très
actuel et controversé. Il convient de noter que la Constitution de la République
fédérative du Brésil en 1988, et il est obligatoire que les exprimées "sont irrecevables
dans la procédure, les éléments de preuve obtenus par des moyens illégaux»,
sculptées dans la LVI point de l'article 5. Pendant ce temps, la recherche est de
démontrer que les droits protégés par la Constitution, en particulier les droits de la
personnalité, à savoir: le droit à l'intimité, l'intimité, l'honneur et l'image, peut être mis
en balance, et quand céder opposé à l'intérêt de la communauté, et et, loin de
l'exclusion des éléments de preuve irrecevable et illégal graves dans des cas
exceptionnels, lorsqu'il en faveur de l'accusé, comme la théorie de la proportionnalité
ou raisonnable. Et comme le piratage de téléphone quand ils répondent aux
exigences et à respecter les formalités légales de la loi 9.296/96, (no point XII de
l'art. 5 de la Constitution fédérale) mai être utilisés comme preuves.
Mots clés: preuve. Preuve illégale et illégitime. Intercept téléphone.
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ROL DE ABREVIATURAS OU SIGLAS
Abin Agência Brasileira de Inteligência
ACR Acórdão
Ampl. Ampliada
Art. Artigo
Atual. Atualizada
C/C Cumulado com
CP Código Penal (Dec.-lei 2.848, de 07.12.1940)
CPP Código de Processo Penal (Dec.-lei 3.689, de 03.10.1941)
CRFB/88 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
Dec. Decreto
DJ Diário da Justiça
DJU Diário da Justiça da União
DOU Diário Oficial da União
Ed. Edição
HC Habeas Corpus
Min. Ministro (a)
MPF Ministério Público Federal
MSc. Mestre
N. Número
P. Página
P. ex. Por exemplo
Rel. Relator
Rev. Revisto
RF Revista Forense
RT Revista dos Tribunais (periódicos)
11
STJ Superior Tribunal de Justiça
STF Supremo Tribunal Federal
T. Turma
UNIVALI Universidade do Vale do Itajaí
V. Volume
§ Parágrafo
12
ROL DE CATEGORIAS
Ação pública “Dá-se por meio de denúncia e é de iniciativa do Ministério Público. É incondicionada (independente), quando não depende de representação, nem de requisição; é condicionada (dependente) quando há necessidade por lei de requisição do Ministro da Justiça ou da representação do ofendido1”. Ação privada “Compete ao ofendido ou seu representante legal no juízo criminal2”. Denúncia “Ato de imputar a alguém a prática de uma infração penal. Forma como o promotor de justiça formaliza a acusação perante o juízo competente, dando início à ação3”. Estado “No sentido de Direito Público, Estado, segundo conceito dado por juristas, é o agrupamento de indivíduos, estabelecidos ou fixados em um território determinado e submetidos à autoridade de um poder soberano, que lhes dá autoridade orgânica4”.
Etimológico
“Origem de uma palavra, parte da gramática que trata da origem das palavras5”. Fumus boni juris “Fumo do bom direito. Expressão muito usada no mundo jurídico, a significar certa atitude que parece estar em consonância com as regras jurídicas6”. Habeas Corpus “É o instituto jurídico que tem a precípua finalidade de proteger a liberdade de locomoção ou o direito de andar com o corpo. E, assim, virá para garantir a pessoa contra qualquer violência ou coação na sua liberdade de ir e vir, mover-se, parar, entrar e sair, em que se funda o direito de locomoção que lhe é atribuído7.” 1 GUIMARÃES, Deocleciano Torrieri. Dicionário Técnico Jurídico . 6 ed. rev. e atual. São Paulo: Rideel, 2004, p. 36. 2 GUIMARÃES, Deocleciano Torrieri. Dicionário Técnico Jurídico . 6 ed. rev. e atual. São Paulo: Rideel, 2004, p. 36. 3 GUIMARÃES, Deocleciano Torrieri. Dicionário Técnico Jurídico . 6 ed. rev. e atual. São Paulo: Rideel, 2004, p. 239. 4 SILVA. De Plácido e. Vocabulário Jurídico. Atualizadores: FILHO, Nagib Slaibi; CARVALHO, Gláucia. 25 ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2006, p.553. 5 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário Básico da Língua Portuguesa . São Paulo: Folha de São Paulo, 1995, p. 280. 6 LUIZ, Antônio Filardi. Dicionário de expressões latinas . 2. ed. São Paulo: Atlas, 2002, p. 126/127. 7 SILVA. De Plácido e. Vocabulário Jurídico. Atualizadores: FILHO, Nagib Slaibi; CARVALHO, Gláucia. 25 ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2006, p.671.
13
Hipótese “[...] é aquele em que propriamente deve ser tido, entende-se a suposição tida como verdadeira a respeito de certo fato ou princípio, a fim de que dela se tirem conclusões, se expliquem certos fenômenos, ou se mostrem certos efeitos8”. Indício “[...] na técnica jurídica, em sentido equivalente a presunção, quer significar o fato ou a série de fatos, pelos quais se pode chegar ao conhecimento de outros, em que se funda o esclarecimento da verdade ou do que se deseja saber9”. In dubio pro reo “Na dúvida, em favor do réu. Quer dizer, se a prova não for absolutamente convincente, deve o réu ser absolvido10”. In dubio pro societate “Na dúvida, em favor da sociedade11”. Informática “Ciência que visa ao tratamento da informação através do uso de equipamentos e procedimentos da área de processamento de dados12”. Instrução processual “Na terminologia forense, é empregado para exprimir a soma de atos e diligências que, na forma das regras legais estabelecidas, devem ou podem ser praticados, no curso do processo, para que se esclareçam as questões ou os fatos, que constituem o objeto da demanda ou do litígio13”. Investigação criminal “[...] a investigação se mostra no aspecto de uma devassa, notadamente quando tem por escopo a elucidação de um crime e a descoberta do criminoso [...]14. Iure novit cúria “O juiz conhece o direito15” Juris et de jure “Locução Latina que se traduz: De direito e por direito, é aplicada, notadamente, para distinguir a presunção que, sendo inatacável ou indestrutível, é instituída ou estabelecida pela própria lei. As presunções juris et jure são tidas como absolutas16”.
8 SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico . 27. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 682. 9 SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico . 27. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 731. 10 LUIZ, Antônio Filardi. Dicionário de expressões latinas . 2. ed. São Paulo: Atlas, 2002, p. 145. 11 LUIZ, Antônio Filardi. Dicionário de expressões latinas . 2. ed. São Paulo: Atlas, 2002, p. 145. 12 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário Básico da Língua Portuguesa . São Paulo: Folha de São Paulo, 1995, p. 361. 13 SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico . 27. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 753. 14 SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico . 27. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 775. 15 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal . 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 262. 16 SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico . 27. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 806.
14
Juris Tantum “Exprimindo o que resulta ou é resultante do próprio Direito, serve para designar a presunção relativa ou condicionada, em que, embora estabelecida pelo Direito como verdadeiro, admite prova em contrário17”. Lato Sensu “Nesta razão, é comum a adoção da locução latina Lato Sensu (sentido largo), ao contrário de Strictu Sensu (sentido restrito), para indicar o amplo e extenso sentido em que se toma a regra jurídica ou em que se interpreta a disposição legal18”. Medida Cautelar “Em sentido amplo, entende-se, na terminologia processual, todo e qualquer ato forense ou processo intentado por uma pessoa, em justiça para prevenir, conservar, ou defender direitos19”. Periculum in mora “Perigo da demora [...] Trata-se de um dano potencial, uma situação de fato que pode sofrer um dano irreparável se não tomada uma providência imediata20”. Presunção “[...] é o vocábulo empregado na terminologia jurídica para exprimir a dedução, a conclusão ou conseqüência, que se tira de um fato conhecido, para se admitir como certa, verdadeira e provada a existência de um fato desconhecido ou duvidoso21”. Telemática “É a ciência que trata da transmissão e manipulação de dados, imagens, escritos e informações por meio do uso combinado da informática (do computador) com as várias formas de telecomunicação22”.
17 SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico . 27. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 807. 18 SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico . 27. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 818. 19 SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico . 27. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 904. 20 LUIZ, Antônio Filardi. Dicionário de expressões latinas . 2. ed. São Paulo: Atlas, 2002, p. 229. 21 SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico . 27. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 1090. 22 GOMES Luiz Flávio; CERVINI, Raúl. Interceptação telefônica : lei 9.296, de 24.07.96. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1997, p. 165.
15
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 01
1 A PROVA NO PROCESSO PENAL .................................................................. 03
1.1 CONCEITO ..................................................................................................... 03
1.2 OBJETO DA PROVA....................................................................................... 05
1.2.1 Fatos que independem de provas ............................................................ 06
1.2.1.1 Fatos axiomáticos ou intuitivos.................................................................. 06
1.2.1.2 Fatos notórios ou verdade sabida ............................................................. 07
1.2.1.3 Fatos presumidos ou presunção legal....................................................... 07
1.2.1.4 Fatos inúteis .............................................................................................. 08
1.2.2 Fatos que dependem de provas................. ............................................... 09
1.2.2.1 Fato admitido ou incontroverso ................................................................. 09
1.2.2.2 Direito ........................................................................................................ 10
1.3 FINALIDADE ................................................................................................... 10
1.4 CLASSSIFICAÇÃO DAS PROVAS ................................................................. 11
1.4.1Quanto ao objeto ou natureza.................. .................................................. 11
1.4.2 Quanto ao valor ou efeito .................... ...................................................... 12
1.4.3 Quanto ao sujeito ou fonte ................... ..................................................... 13
1.4.4 Quanto à forma............................... ............................................................ 13
1.5 PRINCÍPIOS GERAIS DAS PROVAS............................................................. 14
1.5.1 Princípio da auto-responsabilidade das provas ...................................... 15
1.5.2 Princípio da audiência contraditória ou princ ípio do contraditório....... 15
1.5.3 Princípio da aquisição ou comunhão da prova .. ..................................... 16
1.5.4 Princípio da oralidade....................... ......................................................... 17
1.5.5 Princípio da concentração.................... ..................................................... 17
1.5.6 Princípio da publicidade ..................... ....................................................... 18
1.5.7 Princípio do livre convencimento motivado .... ........................................ 18
1.6 ÔNUS DA PROVA: ACUSAÇÃO, DEFESA E JUIZ ........................................ 19
1.7 MOMENTOS DA ATIVIDADE PROBATÓRIA ................................................. 21
1.7.1 Proposição .................................................................................................. 21
1.7.2 Admissão .................................................................................................... 22
16
1.7.3 Produção ..................................................................................................... 22
1.7.4 Valoração .................................................................................................... 23
1.8 SISTEMA DA AVALIAÇÃO DAS PROVAS ..................................................... 23
1.8.1 Sistema da livre apreciação ou íntima convicç ão ................................... 24
1.8.2 Sistema da certeza moral do legislador, da ve rdade legal ou formal .... 25
1.8.3 Sistema da livre convicção, da verdade real o u do livre convencimento .
............................................................................................................................. 26
1.9 MEIOS DE PROVA ......................................................................................... 28
2 DAS PROVAS OBTIDAS POR MEIOS ILÍCITOS ............ ................................. 30
2.1 CONCIDERAÇÕS PRELIMINARES ............................................................... 30
2.2 PROVAS ILÍCITAS E ILEGÍTIMAS ................................................................. 32
2.3 CORRENTES ACERCA DA (IN) ADMISSIBILIDADE ..................................... 39
2..3.1 Pela inadmissibilidade das provas ilícitas o u corrente obstativa......... 39
2.3.2 Pela admissibilidade das provas ilícitas ou c orrente permissiva.......... 40
2.3.3 Corrente intermediária ....................... ........................................................ 40
2.4.PROVAS ILÍCITAS POR DERIVAÇÃO OU TEORIA DOS FRUTOS DA
ÁRVORE ENVENENADA...................................................................................... 41
2.5 TEORIA DA PROPORCIONALIDADE ............................................................ 45
2.6 ADMISSIBILIDADE DA PROVA ILÍCITA EM BENEFÍCIO DO ACUSADO ..... 49
2.7 ANÁLISE DO CONCEITO E RELATIVIDADE JURÍDICA DOS DIREITOS
INDIVIDUAIS DA INTIMIDADE E PRIVACIDADE FRENTE À LEI 9.296/96......... 51
3 A QUESTÃO (IN)ADMISSIBILIDADE DAS PROVAS ILÍCITAS NO PROCESSO
PENAL: QUANTO AS INTERCEPTAÇÕES TELEFÔNICAS ........ ...................... 55
3.1 PREVISÃO LEGAL DA INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA NA
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988.............. 55
3.2 INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA LATO SENSU........................................... 58
3.2.1 Interceptação telefônica stricto sensu ...... .............................................. 59
3.2 2 Escuta telefônica............................ ............................................................ 60
3.2.3 Interceptação e escuta ambiental ............. ................................................ 62
3.2 4 Gravação clandestina telefônica e ambiental .. ........................................ 63
3.3 NATUREZA JURÍDICA DAS INTERCEPTAÇÕES TELEFÔNICAS
AUTORIZADAS..................................................................................................... 64
17
3.4 DOCUMENTAÇÃO E VALOR PROBANTE .................................................... 65
3.5 QUEBRA DE SIGILO DE DADOS TELEFÔNICOS ........................................ 66
3.6 ANÁLISE DA LEI 9.296/96.............................................................................. 68
3.6.1 A (In) constitucionalidade do parágrafo único do art. 1º da lei 9.296/96 ...
.............................................................................................................................. 68
3.6 2 Casos da admissibilidade da interceptação .... ........................................ 70
3.6.3 Iniciativa do pedido de interceptação........ ............................................... 73
3.6.4 A inequívoca demonstração da necessidade de i nterceptação............. 74
3.6.5 Fundamentação, diligência e prazo............ .............................................. 75
3.6.6 Deferimento, procedimento policial e opção de acompanhamento pelo
Ministério Público ................................. .............................................................. 77
3.6.7 Sigilo das diligências, autos apartados, ampl a defesa e contraditório.....
.............................................................................................................................. 79
3.6.8 Incidente de inutilidade de gravações na inte rceptação ........................ 80
3.6.9 Crimes previstos no art. 10 da lei 9.296/96 .. ............................................ 81
3.7 A INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA NA ATUALIDADE.................................. 82
3.7.1 A interceptação telefônica e a Comissão Parla mentar de Inquérito (CPI)
.............................................................................................................................. 82
3.7.2 Projeto de lei do Senado n. 525 de 2007 ...... ............................................ 84
CONCLUSÃO ....................................................................................................... 85
REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS .............................................................. 89
ANEXO ................................................................................................................. 94
INTRODUÇÃO
A presente Monografia tem como objeto demonstrar a (in)
admissibilidade das provas ilícitas no processo penal: quanto às interceptações
telefônicas.
A escolha do tema deu-se em razão da grande controvérsia
que este assunto tem alcançado nos dias atuais, mormente com os meios de
comunicação escrita e falada, referindo-se aos “abusos” provocados pela má
interpretação da lei 9.296/96, (regulamenta o inciso XII, parte final do art. 5º da
Constituição Federal), frente aos princípios constitucionais.
Desta forma, o trabalho será estruturado em três momentos.
Para tanto, no Capítulo 1, tratar-se-á da atividade probatória
em geral, trazendo o conceito de prova, seu objeto, os fatos que dependem e os que
independem de provas, sua finalidade, classificação, os princípios gerais das provas,
o ônus, bem como, os momentos da atividade probatória com seu sistema de
avaliação, e por fim os meios de prova.
No Capítulo 2, tratar-se-á das provas obtidas por meios ilícitos,
trazendo as considerações preliminares, falar-se-á acerca das correntes da (in)
admissibilidade das provas ilícitas: obstativa, permissiva e a intermediária, ainda
verificar-se-á o entendimento sobre as provas ilícitas por derivação ou teoria dos
frutos da árvore envenenada, estudar-se-á a teoria da proporcionalidade e a
admissibilidade da prova ilícita em benefício do acusado, trazendo entendimentos
doutrinários e jurisprudências, incluindo o entendimento do Supremo Tribunal
Federal.
Destarte, no Capítulo 3, propõe-se analisar as interceptações
telefônicas em geral, tendo como foco a distinção entre as diversas modalidades,
quais sejam: interceptação, escuta, interceptação e escuta ambientais e gravação
clandestina. Por fim serão vistos os comentários e a aplicação da Lei 9.296 de 1996,
abrangendo a discussão quanto seus efeitos de inconstitucionalidade, e a possível
reestruturação da legislação.
2
Para a presente monografia foram levantadas as seguintes
hipóteses:
São admissíveis no processo penal as provas ilícitas por
derivação ou Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada?
A ilicitude das provas no processo penal pode ser interpretada
à luz do princípio da proporcionalidade e razoabilidade, diante do art. 5º inciso LVI
da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988?
São admissíveis as provas ilícitas quando estas forem para
absolver o acusado ou princípio da proporcionalidade pro reo?
Em quais hipóteses pode utilizar-se da interceptação telefônica
como meio de prova, uma vez que a lei infringe direitos e garantias constitucionais,
em especial os que concernem à intimidade e a vida privada?
O presente Relatório de Pesquisa se encerra com a Conclusão,
nas quais são apresentados pontos conclusivos destacados, seguidos da
estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões sobre a (in) admissibilidade
das provas ilícitas no processo penal: quanto às interceptações telefônicas.
Quanto à Metodologia empregada para o presente trabalho,
registra-se que foi o método dedutivo.
3
1 A PROVA NO PROCESSO PENAL
Neste primeiro capítulo, far-se-á um estudo sobre a teoria geral
das provas, trazendo o conceito de prova, seu objeto, os fatos que dependem e os
que independem de provas, bem como a finalidade, classificação, seus princípios e
o ônus.
Verificar-se-á também os momentos da atividade probatória, a
retrospectiva do sistema de apreciação das provas, e por fim os meios de prova.
1.1 CONCEITO DE PROVA
Embora este trabalho tenha como proposta a questão da (in)
admissibilidade das provas ilícitas no processo penal: quanto às interceptações
telefônicas, é necessário primeiramente esclarecer alguns pontos importantes
acerca da teoria geral da prova, cuja compreensão será essencial para o
entendimento do ponto central do estudo realizado.
O Processo Penal tem como escopo a apuração da verdade
real, também denominada verdade material, ou seja, busca-se com o processo a
reconstrução histórica do fato tido como criminoso23.
De origem latina, a palavra prova tem como significado objetivo
de reconhecer, demonstrar ou comprovar. Provar significa demonstrar no processo,
a existência ou inexistência de um fato, a falsidade ou veracidade de uma afirmação.
Prova é, portanto, o mecanismo pelo qual se tenta estabelecer a verdade de uma
alegação ou de um fato24.
23 GRINOVER, Ada Pellegrini; SCARANCE FERNANDES, Antonio; GOMES FILHO, Antonio Magalhães. As nulidades no processo penal . 9. ed. rev, atual e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, p.147. 24 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal . 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 260.
4
Adalberto José Q. T. de Camargo Aranha25, traz o conceito
etimológico e jurídico de prova:
Prova origina-se do latim probatio, podendo ser traduzida como experimentação, verificação, exame, confirmação, reconhecimento, confronto etc. [...] Como significado jurídico representa os atos e os meios usados pelas partes e reconhecidas pelo juiz como sendo a verdade dos fatos alegados.
Acerca do assunto, Fernando Tourinho Filho26 leciona que:
Provar é, antes de mais nada, estabelecer a existência da verdade; e as provas são os meios pelos quais se procura estabelece-la. É demonstrar a veracidade do que se afirma, do que se alega. Entendem-se, também, por prova, de ordinário, os elementos produzidos pelas partes ou pelo próprio Juiz visando estabelecer, dentro do processo, a existência de certos fatos.
Ao discorrer sobre o conceito de prova, Ronaldo Tanus
Madeira27 assevera que:
[...] a prova penal pode ser conceituada como o conjunto de fatos produzidos pelas partes, acusação e defesa, e, de ofício, pelo próprio juiz, em um procedimento processual, cuja finalidade é a de estabelecer uma verdade jurídica, através da descoberta da verdade real, e que possa, com segurança, levar o magistrado a prolatar uma decisão final justa.
Grinover, Scarance e Magalhães, esclarecem que a incerteza
quanto à veracidade das afirmações levantadas pelas partes no processo,
constituem as questões de fato que devem ser resolvidas pelo magistrado.
25 ARANHA, Adalberto José Q. T. de Camargo. Da prova no processo penal . 7. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva. 2006, p.5. 26 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal . 9. ed. rev e atual. São Paulo: Saraiva. 2007, p.513. 27 MADEIRA, Ronaldo Tanus. Da prova e do processo penal . Rio de Janeiro: Editora Lúmen Júris, 2003, p.1.
5
Entendendo-se por prova o instrumento pelo qual se forma a convicção do juiz a
respeito da ocorrência ou inocorrência de certos fatos28.
1.2 OBJETO DE PROVA
São objetos de prova, todos aqueles fatos, acontecimentos,
coisas e circunstâncias relevantes e úteis para formar a convicção do julgador
acerca do fato tido como criminoso e assim podendo dar solução a lide penal.
Nesse sentido ensina Fernando Capez29:
Objeto da prova é toda circunstância, fato ou alegação referente ao litígio sobre os quais pesa incerteza, e que precisam ser demonstrados perante o juiz para o deslinde da causa. São, portanto, fatos capazes de influir na decisão do processo, na responsabilidade penal e na fixação da pena ou medida de segurança, necessitando, por essa razão, de adequada comprovação em juízo.
Consoante dispõe Julio Fabbrini Mirabete30:
Objeto da prova é o que se deve demonstrar, ou seja, aquilo sobre o que o juiz deve adquirir o conhecimento necessário para resolver o litígio. Abrange, portanto, não só o fato criminoso e sua autoria, como todas as circunstâncias objetivas e subjetivas que possam influir na responsabilidade penal e na fixação da pena ou na imposição de medida de segurança. Refere-se pois, aos fatos relevantes para a decisão da causa devendo ser excluídos aqueles que não apresentam qualquer relação com o que é discutido e que, assim, nenhuma influência podem ter na solução do litígio.
28 GRINOVER, Ada Pellegrini; SCARANCE FERNANDES, Antonio; GOMES FILHO, Antonio Magalhães. As nulidades no processo penal . 9. ed. rev. atual e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, p.135/136 29 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal . 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 260. 30 MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo penal . 18. ed. rev. e atual. São Paulo: Atlas, 2006, p. 250.
6
Fernando da Costa Tourinho Filho31, afirma que objeto de
prova são “Somente os fatos que possam dar lugar a dúvida, isto é, que exijam uma
comprovação”.
Ainda, concernente ao objeto de prova, ensina Magalhães de
Noronha32 que, “nem tudo o que surge ou aparece no processo é, pois, objeto de
prova”. Entretanto serão visto a seguir os fatos que independem de prova.
1.2.1 Fatos que independem de provas
1.2.1.1 Fatos axiomáticos ou intuitivos
Entende-se por fatos axiomáticos ou intuitivos, aqueles que são
evidentes, representam o que é certo, indiscutível, induvidoso, de maneira, segura,
rápida, sem necessidade de maiores indagações33.
Neste mesmo sentido, afirma Julio Fabbrini Mirabete34
exemplificando que:
Não precisam ser provados, os fatos axiomáticos ou intuitivos, aqueles que são evidentes por si mesmo. A prova de que o acusado estava em determinado lugar em determinada hora, p. ex., exclui a necessidade de se comprovar que ele não estava no local do crime, ocorrido em outra cidade distante.
31 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal . 9. ed. rev e atual. São Paulo: Saraiva. 2007, p. 514. 32 NORONHA, E. Magalhães. Curso de direito processual penal . 25. ed. São Paulo: Saraiva, 1997. 33 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal . 9. ed. rev e atual. São Paulo: Saraiva. 2007, p. 217. 34 MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo penal . 18. ed. rev e atual. São Paulo: Atlas, 2006, p. 250.
7
1.2.1.2 Fatos notórios ou verdade sabida
Por fatos notórios entende-se como sendo aqueles fatos cujo
conhecimento faz parte da cultura média de uma sociedade.
Nesse sentido, leciona Fernando Capez35 “É o caso da verdade
sabida: por exemplo, não precisamos provar que no dia 07 de setembro comemora-
se a Independência, ou que a água molha e o fogo queima”.
Vale ressaltar a posição de Julio Fabbrini Mirabete36 que não
se deve confundir o conhecimento do juiz ou de um determinado número de pessoas
com a notoriedade dos fatos. Um fato pode ser conhecido pelo magistrado e não ser
notório, bem como os boatos corriqueiros de determinado grupo, os quais podem
advir de lendas ou originado de uma verdade distorcida, aumentada, ou até mesmo
corrompida.
1.2.1.3 Fatos presumidos ou presunções legais
Por fatos presumidos ou presunções legais entende-se como
sendo aqueles fatos decorrentes da própria lei.
Nesse sentido, leciona Fernando Capez37 que não dependem
de prova as presunções legais, “porque são conclusões decorrentes da própria lei,
ou ainda, o conhecimento que decorre da ordem normal das coisas, podendo ser
absolutas (juris et de jure)38 ou relativas (juris tantum)39”.
35 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal . 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 261. 36 MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo penal . 18. ed. rev e atual. São Paulo: Atlas, 2006, p. 251. 37 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal . 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 261. 38 Juris et de jure. De direito e por direito. LUIZ, Antônio Filardi. Dicionário de expressões latinas . 2. ed. São Paulo: Atlas, 2002, p. 160. 39 Juris tantum. De direito (até que se prove o contrário). LUIZ, Antônio Filardi. Dicionário de expressões latinas . 2. ed. São Paulo: Atlas, 2002, p. 161.
8
Por fim, distingue e exemplifica Julio Fabbrini Mirabete40:
A presunção absoluta (juris et de jure), que não admite prova em contrário, da presunção relativa (juris tantum), que pode ser afastada quando há prova que contradiz. Exemplos da primeira são presunção de imputabilidade de agente embriagado voluntária e culposamente (art. 28, II do CP41) e a inimputabilidade do menor de 18 anos (art. 2742); da segunda, a presunção de violência em determinados crimes contra os costumes (art. 22443).
1.2.1.4 Fatos inúteis
Por fatos inúteis entende-se como sendo aqueles fatos, que
verdadeiros ou não, serão indiferentes para a apuração da causa.
Nesse sentido, exemplifica Julio Fabbrini Mirabete44:
São irrelevantes, p.ex., as roupas vestidas pelo autor, suas convicções religiosas ou seu estado civil quando tais circunstâncias não são elementos do crime, não influenciam na fixação da pena ou não trazem qualquer subsídio à apuração da verdade buscada no processo.
Consoante dispõe Adalberto José Q. T. de Camargo Aranha45:
Equipara-se a prova inútil aquela que, por disposição de lei, não pode resultar em proveito, mesmo que eventualmente demonstrada.
40 MIRABETE, Julio Fabrini. Processo penal . 18. ed. rev e atual. São Paulo: Atlas, 2006, p. 251. 41 “Art. 28. Não excluem a imputabilidade penal: [...] II – a embriaguez, voluntária ou culposa, pelo álcool ou substância de efeitos análogos”. BRASIL. Decreto-Lei nº 2.848, de 07 de dezembro de 1940. Código Penal. Lex : Vade Mecum Acadêmico de Direito. 4 ed. São Paulo: Rideel, 2007. 42 “Art. 27. Os menores de dezoito anos são penalmente inimputáveis, ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação especial”. BRASIL. Decreto-Lei nº 2.848, de 07 de dezembro de 1940. Código Penal. Lex : Vade Mecum Acadêmico de Direito. 4 ed. São Paulo: Rideel, 2007. 43 “Art. 224. Deixar, sem justa causa, de prover a subsistência do cônjuge, ou de filho menor de dezoito anos ou inapto para o trabalho, ou de ascendente inválido ou menor de sessenta anos, não lhes proporcionando os recursos necessários ou faltando ao pagamento de pensão alimentícia judicialmente acordada, fixada ou majorada; deixar sem justa causa, de socorrer descendente ou ascendente, gravemente enfermo”. BRASIL. Decreto-Lei nº 2.848, de 07 de dezembro de 1940. Código Penal. Lex : Vade Mecum Acadêmico de Direito. 4 ed. São Paulo: Rideel, 2007. 44 MIRABETE, Julio Fabrini. Processo penal . 18. ed. rev e atual. São Paulo: Atlas, 2006, p. 250. 45 ARANHA, Adalberto José Q. T. de Camargo. Da prova no processo penal . 7. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva. 2006, p.28.
9
São os fatos que, alegados e até provados, colidem com uma presunção jure et de jure. A prova equipara-se a inútil porque dela não se pode tirar conseqüências jurídicas, já que resultante de uma presunção absoluta contra a qual não pode prevalecer.
1.2.2 Fatos que dependem de provas
1.2.2.1 Fato admitido ou incontroverso
Os fatos admitidos ou incontroversos (aceito pelas partes)
precisam ser provados, uma vez que no processo penal vigora o princípio da
verdade real, não podendo o juiz tomar como verdadeiros os fatos apenas porque as
partes o admitiram. Diferentemente do que ocorre no Processo Civil, em que vige a
norma do artigo 334, II e III do Código de Processo Civil46.
Assim entende Fernando Capez47:
O fato admitido ou aceito (também chamado fato incontroverso, porque admitido pelas partes). Neste caso, diferentemente do que ocorre no processo civil, existe a necessidade da produção probatória porque o juiz pode questionar o que lhe pareça duvidoso ou suspeito, não estando obrigado à aceitação pura e simples do alegado uniformemente pelas partes.
Nesse mesmo sentido, se manifesta Adalberto José Q. T. de
Camargo Aranha48:
Destarte, o princípio civil de que somente carecem de prova os fatos controversos ou controvertidos, não se provando os não contestados, reconhecidos ou admitidos pela outra parte, não tem aplicação no
46 Artigo 334 do Código de Processo Civil – “Não dependem de prova os fatos: [...] II – afirmados por uma parte e confessados pela parte contrária; III – admitidos, no processo, como incontroversos”. BRASIL. Lei n. 5.869, de 11 de janeiro de 1973. Institui o Código de Processo Civil. Lex : Vade Mecum Acadêmico de Direito. 4 ed. São Paulo: Rideel, 2007. 47 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal . 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 261/262. 48 ARANHA, Adalberto José Q. T. de Camargo. Da prova no processo penal . 7. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva. 2006, p.27.
10
âmbito penal. O interesse social que prevalece no campo penal exige a prova de todos os fatos.
1.2.2.2 Direito
O direito, em regra, não precisa ser provado, uma vez que se
presume estar o magistrado instruído sobre ele. Entretanto há exceções a tal regra,
devendo ser objeto de prova: a) as leis estaduais e municipais; b) os regulamentos e
portarias; c) os costumes; d) a legislação estrangeira.
Como bem salienta Fernando Capez49:
O direito em regra, não carece de prova, na medida em que o magistrado é obrigado a conhecê-lo, segundo o brocardo jurídico iure novit cúria, ou seja, o juiz conhece o direito. Porém, toda vez que o direito invocado for estadual, municipal, alienígena ou o consuetudinário, caberá à parte alegante a prova do mesmo.
1.3 FINALIDADE
A finalidade da prova destina-se fornecer ao julgador
elementos suficientes, para que possa conhecer a verdade acerca do fato delituoso
e, assim, aplicar o direito.
Neste sentido, dispõe Fernando da Costa Tourinho Filho50 que:
“O objetivo ou finalidade da prova é formar a convicção do juiz sobre os elementos
necessários para a decisão da causa [...] é tornar aquele fato conhecido do juiz,
convencendo-o da sua existência”.
49 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal . 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 262. 50 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal . 9. ed. rev e atual. São Paulo: Saraiva. 2007, p. 514.
11
Também se manifesta sobre o tema, Guilherme de Souza
Nucci, aduzindo que a finalidade da prova é convencer o magistrado a respeito da
veracidade do fato litigioso, buscando a verdade processual atingível ou possível,
pois, com base nela que o juiz proferirá a sua decisão51.
Ainda, no mesmo sentido arremata José Frederico Marques52
afirmando que “Com a prova, o que se busca é a configuração real do fato sobre as
questões a serem decididas no processo. Para a averiguação desses fatos, é da
prova que se serve o juiz, formando, ao depois, sua convicção”.
1.4 CLASSIFICAÇÃO DAS PROVAS
Muitas são as classificações das provas apresentadas pelos
processualistas penais, as mais encontradas nas obras acerca do tema são: a)
quanto ao objeto ou natureza: diretas e indiretas; b) quanto ao valor ou efeito: provas
plenas e não plenas ou indiciárias; c) quanto ao sujeito ou fonte: pessoais e reais; d)
quanto à forma: provas documentais, testemunhais e materiais.
1.4.1 Quanto ao objeto ou natureza
Fernando Capez53 quanto ao objeto ou natureza das provas
classifica estas como direta ou indireta, aduzindo que:
O objeto da prova nada mais é do que o fato cuja existência carece ser demonstrada. Assim, a prova pode ser: a) direta: quando, por si, demonstra um fato, ou seja, refere-se diretamente ao fato probanto; b) indireta: quando alcança o fato principal por meio de um raciocínio
51 NUTTI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado . 2. ed. rev, atual e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribuanis, 2003, p. 298. 52 MARQUES, José Frederico. Elementos de direito processual penal .v. 2. 2. ed. São Paulo: Millennium, 2000, p. 330. 53 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal . 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 271.
12
lógico-dedutivo, levando-se em consideração outros fatos de natureza secundária, porém relacionados com o primeiro, como por exemplo, no caso de um álibi.
Discorrendo acerca dessa classificação Adalberto José Q. T.
de Camargo Aranha54 assevera que:
Na prova direta a conclusão é imediata e objetiva, resultando
apenas da afirmação; na prova indireta exige-se um raciocínio, com formulação de hipóteses, exclusões e aceitações, para uma conclusão final. São provas indiretas as presunções e os indícios.
1.4.2 Quanto ao valor ou efeito
Quanto ao valor ou efeito as provas podem ser classificadas
como plena (perfeita ou completa) ou não plena (imperfeita, incompleta ou
indiciária).
Sobre o assunto, colhe-se da doutrina de Fernando Capez55:
Plena: trata-se de prova convincente ou necessária para a formação de um juízo de certeza no julgamento, por exemplo, a exigida para a condenação; quando a prova não se mostrar inverossímil, prevalecerá o princípio do in dúbio pro reo56; não plena ou indiciária: trata-se de prova que traz consigo um juízo de mera probabilidade, vigorando nas fases processuais em que não exige um juízo de certeza, como na sentença de pronúncia, em que vigora o princípio do in dúbio pro societate57. Exemplo: prova para o decreto de prisão preventiva. Na legislação, aparece como ‘indícios veementes’, fundadas razões, etc.
54 ARANHA, Adalberto José Q. T. de Camargo. Da prova no processo penal . 7. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva. 2006, p.24. 55 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal . 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 271. 56 Indubio pro reo. Na dúvida, em favor do réu. Quer dizer, se a prova não for absolutamente convincente, deve o réu ser absolvido. LUIZ, Antônio Filardi. Dicionário de expressões latinas . 2. ed. São Paulo: Atlas, 2002, p. 145. 57 In dúbio pro societate. Na dúvida, em favor da sociedade. LUIZ, Antônio Filardi. Dicionário de expressões latinas . 2. ed. São Paulo: Atlas, 2002, p. 145.
13
1.4.3 Quanto ao sujeito ou fonte
Quanto ao sujeito ou fonte as provas podem ser classificadas
como pessoais ou reais. A primeira é qualquer afirmação pessoal consciente, com a
finalidade de fazer fé dos fatos afirmados. E prova real é aquela que emerge do
próprio fato, como por exemplo, a mutilação de um membro, a exibição de uma
arma, uma fotografia58.
Ensina Adalberto José Q. T. de Camargo Aranha59, que o
“Sujeito da prova é a pessoa ou coisa de quem ou de onde promana a prova”.
As provas reais são aquelas consistentes numa coisa externa e
distinta das pessoas, (lugar, cadáver, arma, etc.); e, pessoais, são aquelas que
encontram origem na pessoa humana, consistindo em declarações do que sabem ou
conclusões formadas (interrogatório, depoimento, conclusões periciais)60.
1.4.4 Quanto à forma
Quanto à forma as provas podem ser classificadas como:
testemunhal, documental e material.
Acerca do assunto, Fernando Capez61 leciona que:
a) testemunhal: resultante de depoimento prestado por sujeito estranho ao processo sobre fatos de seu conhecimento pertinentes ao litígio; b) documental: produzida por meio de documentos; c) material: obtida por meio químico, físico ou biológico (ex.: exames, vistorias, corpo de delito etc.).
58 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal . 9. ed. rev e atual. São Paulo: Saraiva. 2007, p. 515. 59 ARANHA, Adalberto José Q. T. de Camargo. Da prova no processo penal . 7. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva. 2006, p.24. 60 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal . 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 271/272. 61 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal . 12. ed. ver. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 272.
14
Ainda, exemplificando, Adalberto José Q. T. de Camargo
Aranha62 esclarece que:
Quanto à forma da prova há possibilidade de três manifestações em juízo, quais sejam: testemunhal, documental e material. “testemunhal (testemunhas, ouvida da vítima, acareações); documental, também conhecida como literal ou instrumental (escritos públicos ou particulares, cartas, livros comerciais, fiscais etc.); e material (corpo de delito, exames, vistorias, instrumento do crime etc.).
Note-se, que a classificação das provas é mais por uma
questão didática, em virtude de que todas terão sempre o mesmo objeto, qual seja,
convencer o magistrado.
Das várias classificações existentes, as que mais interessam
ao presente trabalho, são aquelas que se dividem em provas ilegais, ilícitas,
ilegítimas e ilícitas por derivação, pois está mais bem relacionado com o tema.
Diante disso, serão conceituadas e exemplificadas essas espécies de forma
individualizada no capítulo 2.
Após a classificação das provas abordar-se-á seus princípios.
1.5 PRINCÍPIOS GERAIS DAS PROVAS
Antes de adentrar-se ao estudo dos princípios, é de bom alvitre
mencionar o conceito e a importância do que se pode entender por princípio.
Derivado do latim principium, quer dizer origem, começo,
preceito, regra, causa primária, indicando o começo ou origem de qualquer coisa63.
Diversos são os princípios norteadores da atividade probatória,
podendo-se destacar: o princípio da auto-responsabilidade das partes; o princípio
audiência contraditória ou princípio do contraditório; princípio da aquisição ou
62 ARANHA, Adalberto José Q. T. de Camargo. Da prova no processo penal . 7. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva. 2006, p.25. 63 SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico . 27. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 1094.
15
comunhão da prova; princípio da oralidade; princípio da concentração; princípio da
publicidade; princípio do livre convencimento motivado.
1.5.1 Princípio da auto-responsabilidade das provas
Segundo este principio, as partes assumem tudo o que
alegarem, ou seja, a prova é incumbida a quem alega, sendo conhecido também
como o ônus da prova.
Nesta mesma linha de raciocínio colhe-se da doutrina de Paulo
Lúcio Nogueira64 segundo o qual o “Princípio da auto-responsabilidade das partes,
está relacionado com o ônus da prova, cabendo a cada parte apresentar as provas
que lhe pareçam necessárias”.
Salienta Adalberto José Q. T. de Camargo Aranha que, por
este princípio, cada parte suporta as conseqüências de suas alegações e dos seus
atos, quais sejam: sua inatividade, negligência, erro ou atos intencionais, pois está
incumbida de demonstrar em juízo as alegações que lhe compete provar65.
1.5.2 Princípio da audiência contraditória ou princ ípio do contraditório
Entende-se por princípio da audiência contraditória ou princípio
do contraditório, o direito que assegura a ampla defesa das partes e, principalmente
do acusado.
Trata-se da garantia amparada na Constituição da República
Federativa do Brasil de 1988 que, no seu inciso LV, do art. 5º, assim dispõe:
64 NOGUEIRA, Paulo Lúcio. Curso completo de processo penal . 10. ed. São Paulo: Saraiva, 1996, p. 186. 65 ARANHA, Adalberto José Q. T. de Camargo. Da prova no processo penal . 7. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva. 2006, p. 33.
16
Art. 5º [...]
LV – Aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.
Assim, nesta senda Fernando Capez66 esclarece que “toda
prova admite a contraprova, não sendo admissível a produção de uma delas sem o
conhecimento da outra parte”.
Afirma Paulo Lúcio Nogueira que o princípio da audiência ou
princípio do contraditório domina todo o processo, eis que, não é tão somente na
audiência, mas em todo o processo criminal, assim, cabe à parte contrária
manifestar-se sobre toda prova que for produzida no processo67.
1.5.3 Princípio da aquisição ou comunhão da prova
Segundo este princípio, as provas que forem produzidas não
pertencerão somente à parte que a produziu, mas ao processo, para que possa
servir a ambas as partes e ao interesse da justiça68.
Ainda nesta linha, é a doutrina de Adalberto José Q. T. de
Camargo Aranha69, para o qual “não há prova pertencendo a uma das partes, mas
sim o ônus de produzi-la. Toda a prova produzida integra um campo unificado,
servindo a ambos os litigantes e ao interesse da justiça”.
66 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal . 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 276. 67 NOGUEIRA, Paulo Lúcio. Curso completo de processo penal . 10. ed. São Paulo: Saraiva, 1996, p. 187. 68 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal . 12. ed. ver. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 276. 69 ARANHA, Adalberto José Q. T. de Camargo. Da prova no processo penal . 7. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva. 2006, p.33
17
Consoante aduz Paulo Lúcio Nogueira70:
Princípio da comunhão da prova, pelo qual toda prova produzida na esfera penal teia interesse comum; portanto, mesmo que fosse testemunha arrolada pela acusação, não poderia ser dispensada sem concordância da defesa, ou vice-versa. Mas tal princípio não pode ser levado a tal extremo, pois permitiria um aumento do número máximo de testemunhas de cada parte.
1.5.4 Princípio da oralidade
Este princípio tem como escopo o predomínio da oralidade, o
qual se exprime através de atos como depoimentos, alegações, debates, entre
outros.
Assim leciona Fernando Capez71, “deve haver a predominância
da palavra falada (depoimentos, debates, alegações); os depoimentos são orais, não
podendo haver a substituição por outros meios, como as declarações particulares”.
1.5.5 Princípio da concentração
Ao abordar este princípio, Fernando Capez72 adverte que “o
princípio da concentração é conseqüência do princípio da oralidade, onde se busca
concentrar toda a produção da prova na audiência”.
Em contrapartida, Paulo Lúcio Nogueira73 afirma que o
princípio da concentração consiste: “na realização da instrução e do julgamento em
70 NOGUEIRA, Paulo Lúcio. Curso completo de processo penal . 10. ed. São Paulo: Saraiva, 1996, p. 187. 71 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal . 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 277. 72 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal . 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 277. 73 NOGUEIRA, Paulo Lúcio. Curso completo de processo penal . 10. ed. São Paulo: Saraiva, 1996, p. 187.
18
uma só audiência; inexiste no processo penal, em que são realizadas várias
audiências. Tal princípio já está implícito na oralidade”.
Destarte, o princípio da concentração tem como função
centralizar, convergir todos os meios de prova em audiência, uma vez que, obter-se-
á maior rapidez na produção e colheita das provas.
1.5.6 Princípio da publicidade
Os atos judiciais, quanto à produção e colheita de provas são
públicos, admitindo-se a exceção somente no segredo de justiça74.
Neste mesmo sentido colhe-se da doutrina de Fernando
Capez75 quando assenta que “Princípio da publicidade: os atos judiciais (e portanto a
produção de provas) são públicos, admitindo-se somente como exceção o segredo
de justiça”.
A prova, conforme visto é um ato judicial e consequentemente,
constitui-se em ato público.
1.5.7 Princípio do livre convencimento motivado
O princípio do livre convencimento motivado está amparado no
art. 155 do Código de Processo Penal76, dispondo:
O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na
74 ARANHA, Adalberto José Q. T. de Camargo. Da prova no processo penal . 7. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva. 2006, p. 34 75 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal . 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 277. 76 BRASIL. Decreto-Lei nº 2.848, de 07 de dezembro de 1940. Código Penal. Lex : Vade Mecum Acadêmico de Direito. 4 ed. São Paulo: Rideel, 2007.
19
investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas.
Parágrafo único. Somente quanto ao estado das pessoas serão observadas as restrições estabelecidas na lei civil.
Entende-se, portanto, por princípio do livre convencimento
motivado, quando as provas não são valoradas previamente pela legislação,
consequentemente, o julgador tem liberdade de apreciação, limitando-se apenas aos
fatos e circunstâncias constantes nos autos77.
Ainda, segundo este princípio exige-se decisão fundamentada
pelo julgador em face da relatividade das provas e do princípio da verdade real78.
1.6 ÔNUS DA PROVA: ACUSAÇÃO, DEFESA E MAGISTRADO
A palavra ônus tem origem latina (onus), significando fardo,
carga, peso, imposição etc. Entretanto ônus da prova (onus probanti) representa a
necessidade de provar para ser reconhecida judicialmente a pretensão
manifestada79.
Ônus da prova é, portanto o encargo que possui a parte de
provar aquilo que alegou em seu proveito e cuja demonstração é relevante para o
deslinde do processo.
Ensina Julio Fabbrini Mirabete80 que Ônus da prova (ônus
probanti) é a faculdade ou encargo que tem a parte de demonstrar no processo a
real ocorrência de um fato que alegou em seu interesse, o qual se apresenta como
relevante para o julgamento da pretensão deduzida pelo autor da ação penal.
77 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal . 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 277. 78 NOGUEIRA, Paulo Lúcio. Curso completo de processo penal . 10. ed. São Paulo: Saraiva, 1996, p. 187. 79 ARANHA, Adalberto José Q. T. de Camargo. Da prova no processo penal . 7. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva. 2006, p.7. 80 MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo penal . 18. ed. rev e atual. São Paulo: Atlas, 2006, p. 258.
20
Para Fernando da Costa Tourinho Filho81 “Cabe, pois, à parte
acusadora provar a existência do fato e demonstrar sua autoria. Também lhe cabe
demonstrar o elemento subjetivo que se traduz por dolo ou culpa”.
Lembra Fernando Capez82 que:
A prova é induvidosamente um ônus processual, na medida em que
as partes provam em seu benefício, visando dar ao juiz os meios próprios e idôneos para formar a sua convicção. Ônus da prova é, pois, o encargo que têm os litigantes de provar, pelos meios
admissíveis, a verdade dos fatos.
O Código de Processo Penal Brasileiro prevê em seu art. 156,
que “a prova da alegação incumbirá a quem a fizer [...]”. Entretanto, cabe à
acusação provar o fato, ao acusado incumbe provar a existência de causas
excludentes da culpabilidade ou antijuricidade, como também a caracterização de
situações que impliquem diminuição de pena ou concessão de benefícios penais83.
Além das partes, pode o juiz, quando julgar necessário, solicitar
provas para sua melhor convicção, conforme dispõe o art. 156, 2ª parte do CPP “[...]
sendo, porém, facultado ao juiz de ofício:
I – ordenar, mesmo antes de iniciada a ação penal, a produção
antecipada de provas consideradas urgentes e relevantes, observando a
necessidade, adequação e proporcionalidade da medida;
II – determinar, no curso da instrução, ou antes de proferir
sentença, a realização de diligências para dirimir dúvida sobre ponto relevante.”
Quanto às diligências requeridas pelo juiz, esclarece Julio
Fabbrini Mirabete84 que:
81 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal . 9. ed. rev e atual. São Paulo: Saraiva. 2007, p.524. 82 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal . 12. ed. ver. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 273. 83 MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo penal . 18. ed. rev e atual. São Paulo: Atlas, 2006, 258. 84 MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo penal . 18. ed. rev e atual. São Paulo: Atlas, 2006, p. 259.
21
A autorização legal para a iniciativa do juiz na produção de prova evidentemente não permite que determine investigação por mero capricho, que exponha terceiro a vexames ou humilhações ou que, vencendo os limites do admissível, venha a provocar diligência arbitrária, sem qualquer vínculo com os fatos e as demais provas dos autos.
Adverte Fernando Capez85 que:
Somente em casos excepcionais, quando a dúvida persistir no espírito do magistrado é que este poderá dirimi-la, determinando as diligências neste sentido. Essa pesquisa probatória a ser efetivada pelo juiz deve restringir-se a uma área de atuação por ele delimitada, com o fito que quebrar a quebra da imparcialidade.
1.7 MOMENTOS DA ATIVIDADE PROBATÓRIA
As atividades atinentes ao procedimento probatório
desdobram-se em quatro momentos: a) proposição ou indicação; b) admissão; c)
produção; d) valoração86.
1.7.1 Proposição
A proposição da prova consiste numa função exclusivamente
das partes, uma vez que, elas indicaram os meios pelos quais pretendem provar o
que foi alegado, e assim obter a prestação jurisdicional87.
Sobre o tema discorre Fernando Capez88:
Proposição: refere-se ao momento ou o instante do processo previsto para a produção da prova. Em regra, as provas devem ser
85 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal . 12. ed. ver. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 274. 86 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal . 9. ed. rev e atual. São Paulo: Saraiva. 2007, p.524. 87 ARANHA, Adalberto José Q. T. de Camargo. Da prova no processo penal . 7. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva. 2006, p.35. 88 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal . 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 274.
22
propostas com a peça acusatória, com a defesa prévia [...]. A única prova passível de ser requerida pelas partes ou determinada de ofício pelo juiz, em qualquer fase do processo, até mesmo em grau de recurso, diz respeito ao incidente de insanidade mental do acusado.
1.7.2 Admissão
Após o requerimento da prova ou da proposta, surge a fase da
admissão na qual o juiz deferirá ou não a sua produção.
No entendimento de Fernando Capez89 “Admissão: trata-se do
ato processual específico e personalíssimo do juiz, que, ao examinar as provas
propostas pelas partes e seu objeto, defere ou não a sua produção. Toda prova
requerida pelas partes deve ser deferida, salvo quando protelatória ou impertinente”.
Por fim, e na mesma linha de entendimento Adalberto José Q.
T. de Camargo Aranha90 afirma que, “A admissibilidade da prova é o ato processual
específico do juiz, que, por ele, examinando as provas propostas pelas partes e o
seu objeto, defere ou não a produção”.
1.7.3 Produção
Produção na linguagem forense, refere-se a promoção de
produção de prova ou de defesa, é o conjunto de atos processuais que devem trazer
a juízo os diferentes elementos de convicção oferecidos pelas partes91.
Neste sentido afirma Adalberto José Q. T. de Camargo
Aranha92 que, “Produção da prova vem a ser o conjunto de atos processuais que é
mister para trazer a juízo os diferentes elementos de convicção oferecido pelas
partes”.
89 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal . 12. ed. ver. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 274. 90 ARANHA, Adalberto José Q. T. de Camargo. Da prova no processo penal . 7. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva. 2006, p.38. 91 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal . 12. ed. ver. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 274. 92 ARANHA, Adalberto José Q. T. de Camargo. Da prova no processo penal . 7. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva. 2006, p.40.
23
1.7.4 Valoração
Consoante Fernando Capez93 “Valoração: nada mais é do que
o juízo valorativo exercido pelo magistrado em relação às provas produzidas,
emprestando-lhes a importância devida, de acordo com a sua convicção. Esse
coincide com o próprio desfecho do processo”.
1.8 SISTEMA DA AVALIAÇÃO DAS PROVAS
Após a fase de produção das provas, cabe ao magistrado
avaliá-las, analisado-as minuciosamente para embasar sua decisão.
Os sistemas de valoração das provas representam uma
evolução histórica no que tange as mudanças atinentes à liberdade do magistrado
na avaliação e valoração das provas produzidas no processo.
Nesse sentido Julio Fabbrini Mirabete94 faz a retrospectiva do
sistema de apreciação das provas:
Com a evolução da justiça penal sofreram profundas alterações os sistemas de apreciação das provas. Primitivamente, aplicava-se o sistema étnico ou pagão, em que a apreciação das provas era deixada ao sabor das impressões do juiz, que as aferia de acordo com sua própria experiência, num sistema empírico. Em seguida, vigorou o sistema religioso, em que se invocava o julgamento divino, através das ordálias, dos duelos judiciários e dos juízos de Deus. Nos tempos modernos, são três os sistemas instituídos pelas legislações: o da certeza moral do juiz; o da certeza moral do legislador; e o da livre convicção.
93 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal . 12. ed. ver. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 274. 94 MIRABETE, Julio Fabrini. Processo penal . 18. ed. rev e atual. São Paulo: Atlas, 2006, p. 259/260.
24
Em seguida, passar-se-á a verificação individual dos sistemas
de avaliação da prova, dos tempos modernos, quais sejam: a) Sistema da livre
apreciação ou íntima convicção, b) Sistema da certeza moral do legislador, da
verdade legal ou formal e c) Sistema da livre convicção, da verdade real ou do livre
convencimento.
1.8.1 Sistema da livre apreciação ou íntima convicç ão
Discorrendo acerca do Sistema da íntima convicção Julio
Fabbrini Mirabete95 leciona que:
Pelo sistema da certeza moral do juiz, ou da íntima convicção, a lei nada diz sobre o valor das provas e a decisão funda-se exclusivamente na certeza moral do juiz, que decide sobre sua admissibilidade, sua avaliação, seu carreamento para os autos. É o sistema que preside, de certo modo, os julgamentos efetuados pelo tribunal de Júri.
Neste mesmo sentido, colhe-se da doutrina de Fernando
Capez96:
A lei concede ao juiz ilimitada liberdade para decidir como quiser, não fixando qualquer regra de valoração das provas. Sua convicção íntima, formada não importa por quais critérios, é o que basta, não havendo critérios balizadores para o julgamento. Esse sistema vigora entre nós, como exceção, nas decisões proferidas pelo júri popular, nas quais o jurado profere seu voto, sem necessidade de fundamentação.
Ainda, assevera com propriedade Fernando da Costa Tourinho
Filho97 que:
95 MIRABETE, Julio Fabrini. Processo penal . 18. ed. rev e atual. São Paulo: Atlas, 2006, 260. 96 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal . 12. ed. ver. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 275/276. 97 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal . 9. ed. rev e atual. São Paulo: Saraiva. 2007, p. 526.
25
Segundo esse sistema, o julgador não está obrigado a exteriorizar as razões que o levam a proferir a decisão. O juiz atribui às provas o valor que quiser e bem entender, podendo, inclusive, decidir valendo-se de conhecimento particular a respeito do caso, mesmo não havendo prova nos autos. Ele decide de acordo com a sua convicção íntima, sem necessidade de fundamentar a decisão.
1.8.2 Sistema da certeza moral do legislador, da ve rdade legal ou formal
Entende-se por sistema da certeza moral do legislador, da
verdade legal ou formal, quando a lei estabelece o valor de cada meio de prova com
o fim de que o magistrado o considere como base para a formação de sua decisão,
ou seja, a lei impõe ao julgador a observância de certos preceitos, estabelecendo o
valor de cada prova.
Neste sentido aduz Julio Fabbrini Mirabete98 que “a lei impõe
ao juiz a observância de certos preceitos, estabelece o valor de cada prova, institui
uma hierarquia delas, de forma que não lhe deixa praticamente nenhuma liberdade
de apreciação”.
Salienta Fernando da Costa Tourinho Filho99 que:
Abolido o sistema da íntima convicção, surgiu o das provas legais, que suprimia ou restringia a faculdade de apreciação das provas. Trata-se de sistema diametralmente oposto ao da íntima convicção. Enquanto naquele o legislador demonstra sua desconfiança no juiz, neste (íntima convicção) há inteira e absoluta confiança. O juiz devia decidir segundo as provas existentes nos autos, e a lei exigia que tais ou quais fatos se provassem dessa ou daquela maneira, sendo que, às vezes, previa-se o valor dos meios probatórios se satisfeitas certas condições ou pressupostos.
98 MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo penal . 18. ed. rev e atual. São Paulo: Atlas, 2006, p. 260. 99 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal . 9. ed. rev e atual. São Paulo: Saraiva. 2007, p. 526.
26
Sobre o assunto, adverte Fernando Capez100 que:
A lei impõe ao juiz o rigoroso acatamento a regras preestabelecidas, as quais atribuem, de antemão, o valor de cada prova, não deixando para o julgador qualquer margem de discricionariedade para emprestar-lhe maior ou menor importância. Não existe convicção pessoal do magistrado na valoração do contexto probatório, mas obediência estrita ao sistema de pesos e valores imposto pela lei.
1.8.3 Sistema da livre convicção, da verdade real o u do livre convencimento
Entende-se por sistema da livre convicção, da verdade real ou
do livre convencimento, aquele frente o qual o magistrado forma sua convicção, sua
decisão pela livre apreciação das provas, e devendo motivar sua decisão indicando
sua fundamentação. Este é o adotado pela legislação brasileira atual.
Neste sentido, manifesta-se Julio Fabbrini Mirabete101:
O juiz forma a sua convicção pela livre apreciação da prova. Não fica adstrito a critérios valorativos e apriorísticos e é livre na sua escolha, aceitação e valoração. Foi este o adotado pelo Código de Processo Penal, em substituição ao sistema da certeza legal da legislação anterior [...]
Sobre o assunto acrescenta Fernando Capez102 advertindo
que:
O juiz tem liberdade para formar a sua convicção, não estando preso a qualquer critério legal de prefixação de valores probatórios. No entanto, essa liberdade não é absoluta, sendo necessária a devida fundamentação. O juiz, portanto, decide livremente de acordo com a sua consciência, devendo, contudo, explicitar motivadamente as
100 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal . 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 275. 101 MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo penal . 18. ed. rev e atual. São Paulo: Atlas, 2006, p. 260. 102 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal . 12. ed. ver. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 276.
27
razões de sua opção e obedecer a certos balizamentos legais, ainda que flexíveis.
Neste raciocínio, exemplificando Fernando da Costa Tourinho
Filho103 aduz que:
Admitem-se todos os meios de prova. O juiz pode desprezar a palavra de duas testemunhas e proferir sua decisão com base em depoimento de uma só. Inteira liberdade tem ele na valoração das provas. Não pode julgar de acordo com conhecimento que possa ter extra-autos. [...] Se o juiz tiver conhecimento da existência de algum elemento ou circunstância relevante para o esclarecimento da verdade, deve ordenar que se carreiem para os autos as provas que se fizerem necessárias.
Tal sistema de avaliação das provas está previsto no artigo 131 do
Código de Processo Civil104 e artigo 155 do Código de Processo Penal105.
1.9 MEIOS DE PROVA
Meios de prova são as vias pelas quais as partes apresentam
os fatos ocorridos e pela qual o juiz forma o seu convencimento, ou seja, pode servir
de prova tudo o que direta ou indiretamente, seja útil na apuração da verdade real.
103 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal . 9. ed. rev e atual. São Paulo: Saraiva. 2007, p. 527. 104 Artigo 131 do Código de Processo Civil – “O juiz apreciará livremente a prova, atendendo aos fatos e circunstancias constantes dos autos, ainda que não alegados pelas partes; mas deverá indicar, na sentença, os motivos que lhe formaram o convencimento”. BRASIL. Lei n. 5.869, de 11 de janeiro de 1973. Institui o Código de Processo Civil. Lex : Vade Mecum Acadêmico de Direito. 4 ed. São Paulo: Rideel, 2007. 105 Artigo 157 do Código de Processo Penal –“O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas. Parágrafo único. Somente quanto ao estado das pessoas serão observadas as restrições estabelecidas na lei civil.” BRASIL. Decreto-Lei nº 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em : http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del3689.htm. Acesso em: 03/10/2008.
28
Neste sentido ensina Fernando Capez106:
O meio de prova compreende tudo quanto possa servir, direta ou indiretamente, à demonstração da verdade que se busca no processo [...], vigora no direito processual penal o princípio da verdade real, de tal sorte que não há de se cogitar qualquer espécie de limitação à prova, sob pena de se frustrar o interesse estatal na justa aplicação da lei.
Esclarece Julio Fabbrini Mirabete107 que:
Meios de prova são as coisas ou ações utilizadas para pesquisar ou demonstrar a verdade: depoimentos, perícias, reconhecimentos etc. Como no processo penal brasileiro vige o princípio da verdade real, não há limitação dos meios de prova. A busca da verdade material ou real, que preside a atividade probatória do juiz, exige que os requisitos da prova no sentido objetivo se reduzem ao mínimo, de modo que as partes possam utilizar-se dos meios de prova com ampla liberdade. Visando o processo penal o interesse público ou social de repressão ao crime, qualquer limitação à prova prejudica a obtenção da verdade real e, portanto, ajusta aplicação da lei.
Neste mesmo sentido, afirma ainda Fernando da Costa
Tourinho Filho108 que meio de prova: “É tudo quanto possa servir, direta ou
indiretamente, à comprovação da verdade que se procura no processo: testemunha,
documento, perícia, informação da vítima, reconhecimento, tudo são meios de
prova”.
O Código de Processo Penal Brasileiro traz em seu bojo, de
maneira taxativa alguns tipos de provas, as quais são denominadas de provas
nominadas, p. ex: testemunhal, documental e pericial, mas lembrando que no
Processo Penal vigora o princípio da verdade real, há ainda a possibilidade de
utilizar-se das provas inominadas, quais sejam, aquelas provas que não estão
106 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal . 12. ed. ver. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 272. 107 MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo penal . 18. ed. rev e atual. São Paulo: Atlas, 2006, p. 252. 108 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal . 9. ed. São Paulo: Saraiva. 2007, p. 515.
29
elencadas de maneira taxativa, mas que colhidas de forma lícita, servem como meio
de prova, p. ex: fotografias e filmagens.
30
2 DAS PROVAS OBTIDAS POR MEIOS ILÍCITOS
Neste segundo capítulo, demostrar-se-á a (in) admissibilidade
das provas ilícitas no processo penal, para tanto, inicialmente será apresentado as
considerações preliminares, trazendo o conceito e diferenciação entre provas ilícitas
e ilegítimas, as correntes doutrinárias acerca da sua admissibilidade, ou não,
jurisprudências pátrias, bem como a teoria dos frutos da árvore envenenada, e da
proporcionalidade/razoabilidade e por fim a admissibilidade da prova ilícita em
benefício do acusado.
2.1 CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES
A questão da admissibilidade, ou não, das provas ilícitas no
processo, vem gerando controvérsias no meio jurídico desde antes da sua previsão
legal em nível constitucional, face à sua importância na atividade probatória onde as
partes visam influir na formação do convencimento do julgador.
No direito brasileiro, antes da Constituição da República
Federativa do Brasil de 1988, não havia dispositivo que proibisse taxativamente a
inadmissibilidade das provas colhidas ilicitamente, sendo assim, havia duas
correntes doutrinárias a respeito do tema, predominando a que defendia a
admissibilidade, especialmente no direito de família109.
Os adeptos da teoria da admissibilidade fundavam-se na busca
da verdade real, não importando o meio pelo qual a prova era obtida, devendo o juiz
aproveitar o seu conteúdo. Assim, no eventual conflito entre o direito à intimidade e o
direito à prova (produzida por todos os meios, inclusive os ilícitos), o primeiro deveria
ceder quando em confronto com a ordem pública110.
109 AVOLIO, Luiz Francisco Torquato. Provas ilícitas : Interceptações telefônicas, ambientais e gravações clandestinas. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2003, p. 73. 110 AVOLIO, Luiz Francisco Torquato. Provas ilícitas : Interceptações telefônicas, ambientais e gravações clandestinas. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2003, p. 73.
31
A doutrina minoritária que se posicionava pela
inadmissibilidade da prova ilícita, baseava-se no art. 332 do Código de Processo
Civil111.
Com o advento da Constituição da República Federativa do
Brasil de 1988 a situação parecia consolidada, em face da proibição expressa
inserida no art. 5º, LVI112, vedando a admissibilidade no processo, de provas obtidas
por meios ilícitos, uma vez que, normalmente são colhidas com infringência aos
direitos fundamentais dos cidadãos.
Entretanto, o tema da prova ilícita ganhou espaço notório entre
as preocupações fundamentais do direito processual moderno, em virtude do grande
desenvolvimento tecnológico. A vida privada, a intimidade, a honra da pessoa
humana tornou-se vulnerável. Isso impôs ao legislador cuidado para não autorizar
invasões desnecessárias ou desmedidas na vida dos cidadãos113.
Contudo, não é fácil atingir o ponto de equilíbrio. De um lado, é
necessário armar o Estado de poderes suficientes para enfrentar a criminalidade
crescente, violenta e desenfreada; do outro, garantir aos cidadãos sua tranqüilidade,
intimidade e imagem, para que não sofram excessos e abusos dos órgãos oficiais114.
Diante disso, para propiciar um melhor entendimento do real
alcance desta proibição constitucional, é de suma importância, diferenciar as
modalidades pelas quais determinada prova pode ser considerada ilícita. A distinção
entre uma e outra está no meio pelo qual são produzidas ou mesmo pela natureza
do bem jurídico lesionado na obtenção da prova.
111 Artigo 332 do Código de Processo Civil – “Todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, são hábeis para provar a verdade dos fatos, em que se funda a ação ou a defesa”. BRASIL. Lei n. 5.869, de 11 de janeiro de 1973. Institui o Código de Processo Civil. Lex : Vade Mecum Acadêmico de Direito. 4 ed. São Paulo: Rideel, 2007. 112 Artigo 5 º, inciso LVI da CRFB/88 “São inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos”. Brasil- Constituição da República Federativa do Bra sil , de 05 de outubro de 1988. Lex: Vade Mecum Acadêmico de Direito. 4 ed. São Paulo: Rideel, 2007, p. 45. 113 FERNANDES, Antonio Scarance. Processo penal constitucional . 3. ed. rev. ,atual e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2002, p. 83/84. 114 FERNANDES, Antonio Scarance. Processo penal constitucional . 3. ed. rev. ,atual e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2002, p. 84.
32
Com relação aos meios de prova admissíveis, esclarece
Edilson Mougenot Bonfim115:
O Código de Processo Penal não esclarece taxativamente, como outrora já ocorreu, os meios de prova admissíveis. Os meios de prova explicitamente regulados no Código são apenas aqueles cuja utilização é mais freqüente. Os únicos fatos acerca dos quais o meio de prova é prescrito pela lei são aqueles decorrentes do estado das pessoas, em relação aos quais o art. 155 do Código de Processo Penal116 dispõe que devem ser observadas as restrições à prova estabelecidas na lei civil. Dessarte, por exemplo, a menoridade do réu deverá ser provada por documento hábil (Súmula 74 do Superior Tribunal de Justiça)117.
Sobre o assunto, Fernando Capez118 adverte que:
Prova vedada ou proibida é, portanto, aquela produzida por meios ilícitos, ou seja, em contrariedade a uma norma legal específica. A prova vedada comporta duas espécies distintas: (a) prova ilegítima e (b) prova ilícita.
2.2 PROVAS ILÍCITAS E ILEGITIMAS
As provas ilícitas são colocadas como espécies das provas
vedadas, as quais compreendem as provas ilícitas propriamente ditas, sendo
aquelas que violam norma de direito material, e as ilegítimas, que são as obtidas
com infringência às normas de direito processual.
115 BONFIM, Edilson Mougenot. Curso de processo penal . 2. ed. rev, aum. E atual. São Paulo: Saraiva, 2007, p.296. 116 Art. 155 do Código de Processo Penal “O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da
prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas. Parágrafo único. Somente quanto ao estado das pessoas serão observadas as restrições estabelecidas na lei civil.”
117 Súmula 74 do Superior Tribunal de Justiça “Para efeitos penais, o reconhecimento da menoridade do réu requer prova por documento hábil”. 118 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal . 12. ed. ver. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 278.
33
Há uma confusão entre prova ilegítima e prova ilícita, mas não
devem ser confundidas, apesar de ambas não serem aceitas no direito processual
penal, pois a prova ilícita fere o direito material enquanto a prova ilegítima o direito
processual.
Adalberto José Q. T. de Camargo Aranha traz a origem
etimológica do termo ilícito119:
Tem sua origem etimológica do latim illicitus (il +licitus), tendo dois sentidos: um, restrito, significando o que é proibido ou vedado por lei, e outro, amplo e genérico, indicando o que é contrário a moral e aos bons costumes, reprovável pela opinião pública e proibido pelo direito.
Coincide assim, com o enunciado previsto pelo legislador
constituinte brasileiro, no art. 5º, inc. LVI: “São inadmissíveis, no processo, as provas
obtidas por meios ilícitos”.
A prova ilícita, em sentido estrito, compreende aquela prova
colhida infringindo normas ou princípios previstos pela Constituição Federal e pelas
leis, frequentemente para proteção das liberdades públicas e dos direitos da
personalidade e intimidade.
Considera-se, assim, prova ilícita aquela cuja obtenção viola
uma norma de direito material, ou seja, diz-se ilicitamente obtida a prova quando
afrontado um direito que determinado indivíduo tem tutelado independentemente do
processo. Ex.: as prova obtidas com violação do domicílio (art. 5º, XI, da
CRFB/88)120, das comunicações (art. 5º, XII, da CRFB/88)121; as conseguidas
119 ARANHA, Adalberto José Q. T. de Camargo. Da prova no processo penal . 7. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva. 2006, 53. 120 Art. 5º, XI, da CRFB/88 “a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem o consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial”. Brasil. Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Lex: Vade Mecum Acadêmico de Direito. 4 ed. São Paulo: Rideel, 2007. 121 Art. 5º, XII, da CRFB/88 “é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal”. Brasil. Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Lex: Vade Mecum Acadêmico de Direito. 4 ed. São Paulo: Rideel, 2007.
34
mediante tortura ou maus-tratos (art. 5º, III, da CRFB/88)122; as colhidas com
infrigência à intimidade (art. 5º, X da CRFB/88)123 etc124.
Nesse sentido, ensina Fernando Capez125:
Quando a prova for vedada, em virtude de ter sido produzida com afronta a normas de direito material, será chamada de ilícita. Desse modo, serão ilícitas todas as provas produzidas mediante a prática de crime ou contravenção, as que violem normas de direito civil, comercial ou administrativo, bem como aquelas que afrontem princípios constitucionais.
Grinover, Scarance e Magalhães126 asseguram que:
A questão da denominada ´prova ilícita` ubica-se, juridicamente, na
investigação a respeito da relação entre o ilícito e o inadmissível no procedimento probatório e, sob o ponto de vista da política legislativa, na encruzilhada entre a busca da verdade em defesa da sociedade e o respeito a direitos fundamentais que podem ver-se afetados por esta investigação. A prova ilícita (ou obtida por meios ilícitos) enquadra-se na categoria da prova vedada.
É importante salientar ainda, quanto ao estudo das provas
ilícitas, o artigo 11 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, o Pacto de
São José da Costa Rica127, que hoje integra o Sistema Constitucional Brasileiro,
dispondo:
122 Art. 5º, III da CRFB/88 “ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante”. Brasil. Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Lex: Vade Mecum Acadêmico de Direito. 4 ed. São Paulo: Rideel, 2007. 123 Art. 5º, X da CRFB/88 “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”. Brasil. Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Lex: Vade Mecum Acadêmico de Direito. 4 ed. São Paulo: Rideel, 2007. 124 GRINOVER, Ada Pellegrini; SCARANCE FERNANDES, Antonio; GOMES FILHO, Antonio Magalhães. As nulidades no processo penal . 9. ed. rev, atual e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, p. 150. 125 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal . 12. ed. ver. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 263. 126 GRINOVER, Ada Pellegrini; SCARANCE FERNANDES, Antonio; GOMES FILHO, Antonio Magalhães. As nulidades no processo penal . 9. ed. rev, atual e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, 148/149. 127 BRASIL. Convenção Americana Sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), 22 de novembro de 1969. Adotada no âmibito da Organização dos Estados Americanos, em São José da Costa Rica, em 22-11-1969, entrou em vigor internacional em 18-07-1978, na forma do segundo parágrafo de seu art. 74. O Governo brasileiro depositou a Carta de Adesão a essa Convenção em
35
“Art. 11 – Proteção da honra e da dignidade.
1. Toda pessoa tem respeito de sua honra e ao reconhecimento de sua dignidade.
2. Ninguém pode ser objeto de ingerências arbitrárias ou abusivas em sua vida privada, na de sua família, em seu domicílio ou em sua correspondência, nem de ofensas ilegais à sua honra ou reputação.
3. Toda pessoa tem direito à proteção da lei contra tais ingerências ou tais ofensas”.
A jurisprudência dominante aduz que a proibição da prova
ilícita somente gera nulidade do processo se a condenação ou se a acusação
basear-se exclusivamente na prova ilícita ou em provas colhidas a partir dela, qual
seja, a denominada prova ilícita por derivação que será tema do tópico 2.4.
Ainda sobre o assunto, Grinover, Scarance e Magalhães128,
esclarecem quanto à prática da colheita ilegal da prova, que “chegou-se a convicção
de que a prova obtida por meios ilícitos deve ser banida do processo, por mais
relevantes que sejam os fatos por ela apurados, uma vez que se subsume ela ao
conceito de inconstitucionalidade”.
Quanto à prova ilegítima, afirma-se que é aquela cuja colheita
estaria ferindo normas de direito processual. Nesse caso, há violação de norma
garantidora de interesse vinculado ao processo e sua finalidade129.
Exemplo clássico de prova ilegítima é o caso das pessoas que,
em função de ofício ou profissão, devam guardar sigilo, como os padres, os
advogados, psicólogos, etc. Sendo tomado o depoimento dessas pessoas com
relação a fatos que conhecem em função do seu ofício, a prova deverá ser
considerada nula130.
25-09-1992. Aprovada pelo Dec. Legislativo nº 27, de 25-09-1992 e promulgada pleo Dec. Nº 678, de 06-11-1992. 128 GRINOVER, Ada Pellegrini; SCARANCE FERNANDES, Antonio; GOMES FILHO, Antonio Magalhães. As nulidades no processo penal . 9. ed. rev, atual e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, p. 152. 129 AVOLIO, Luiz Francisco Torquato. Provas ilícitas : Interceptações telefônicas, ambientais e gravações clandestinas. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2003, p. 43. 130 AVOLIO, Luiz Francisco Torquato. Provas ilícitas : Interceptações telefônicas, ambientais e gravações clandestinas. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2003, p. 43.
36
Pode-se dizer que a prova ilegítima viola o devido processo
legal, visto do prisma formal e não substancial como a ilícita.
As sanções para as provas ilegítimas, encontram-se na própria
lei processual. Tudo se resolvendo dentro do processo, segundo os esquemas
processuais que determinam as formas e as modalidades de produção da prova,
com a sanção correlativa a cada transgressão, que pode ser uma sanção de
nulidade131.
Frisa-se, entretanto, que tanto as provas ilícitas como as
ilegítimas são espécies de provas consideradas ilegais. A distinção entre uma e
outra está no meio pelo qual são produzidas ou mesmo por sua própria natureza.
Quanto essa diferenciação, afirma Alexandre de Moraes132:
As provas ilícitas são aquelas obtidas com infringência ao direito material, as provas ilegítimas são as obtidas com desrespeito ao direito processual. Por sua vez, as provas ilegais seriam o gênero do qual as espécies são as provas ilícitas e as ilegítimas, pois configuram-se pela obtenção com violação de natureza material ou processual ao ordenamento jurídico.
Ainda, nessa mesma linha é a doutrina de Grinover, Scarance
e Magalhães133, segunda a qual:
A prova é ilegal toda vez que sua obtenção caracterize violação de normas legais ou de princípios gerais do ordenamento, de natureza processual ou material. Quando a proibição for colocado por uma lei processual, a prova será ilegítima (ou ilegitimamente produzida); quando, pelo contrário, a proibição for de natureza material, a prova será ilicitamente obtida.
131 AVOLIO, Luiz Francisco Torquato. Provas ilícitas : Interceptações telefônicas, ambientais e gravações clandestinas. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2003, P. 43 132 MORAES, Alexandre de, Direito Constitucional . 21. ed. São Paulo: Atlas. 2007, p. 99. 133 GRINOVER, Ada Pellegrini; SCARANCE FERNANDES, Antonio; GOMES FILHO, Antonio Magalhães. As nulidades no processo penal . 9. ed. rev, atual e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, p. 149.
37
Ainda, fora à distinção no plano da natureza da norma violada,
outra se faz quanto ao momento da transgressão: enquanto a prova ilegítima a
ilegalidade ocorre no momento de sua produção no processo, a prova ilícita
pressupõe uma violação no momento da colheita da prova, anterior ou
concomitantemente ao processo, mas sempre externamente a este134.
Assevera com toda propriedade Luiz Francisco Torquato
Avólio135, que é possível distinguir perfeitamente as provas ilícitas das ilegítimas.
Pois, a prova ilegítima é aquela cuja colheita estaria ferindo normas de direito
processual, e como sanção para seu descumprimento, encontra-se previsto na
própria lei processual, que pode ser uma sanção de nulidade; diversamente da
prova ilícita, ou ilicitamente obtida, cuja colheita afronta normas e princípios de
direito material, sobretudo de direito constitucional, pois sempre se prende à questão
das liberdades públicas, onde estão assegurados os direitos e garantias atinentes à
intimidade, à liberdade, à dignidade humana, como também de direito penal, civil,
administrativo. Para a violação dessas normas, é o direito material que estabelece
sanções próprias.
Quanto às sanções ao utilizar as provas ilícitas adverte Edílson
Mougenot Bonfim136
Caso já se encontrem nos autos, deve o julgador determinar seu desentranhamento, ou seja, sua retirada dos autos, de modo a evitar que essas provas, ainda que racionalmente desconsideradas pelo julgador, acabem por exercer influência na formação de seu convencimento. A sentença que se fundar em prova ilícita será nula.
Salienta ainda, Julio Fabbrini Mirabete137:
Já se tem decidido que, considerada ilícita, a prova deve ser desentranhado dos autos. Mas não se tem decretado a nulidade do
134 GRINOVER, Ada Pellegrini; Interceptações e gravações clandestinas . Novas tendências no direito processual . São Paulo: Forence, 1990, p. 61. 135 AVOLIO, Luiz Francisco Torquato. Provas ilícitas : Interceptações telefônicas, ambientais e gravações clandestinas. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2003, p. 43 136 BONFIM, Edilson Mougenot. Curso de processo penal . 2. ed. rev, aum. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 297. 137 MIRABETE, Julio Fabrini. Processo penal . 18. ed. rev e atual. São Paulo: Atlas, 2006, p. 257.
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processo em que há prova ilícita, se há nos autos outras provas que levaram a condenação.
Colhe-se entendimento do Supremo Tribunal Federal:
Habeas corpus. Constitucional. Penal e processual penal. Sentença condenatória fundada em provas ilícitas. Inocorrência da aplicação da teoria dos "frutos da árvore envenenada". Provas autônomas. Desnecessidade de desentranhamento da prova ilícita. 1. A prova tida como ilícita não contaminou os demais elementos do acervo probatório, que são autônomos, não havendo motivo para a anulação da sentença. 2. Desnecessário o desentranhamento dos autos da prova declarada ilícita, diante da ausência de qualquer resultado prático em tal providência.[...] Habeas corpus denegado e liminar cassada138.
Ainda, entende o Supremo Tribunal Federal:
“Habeas Corpus. 2. Notitia criminis originária de representação formulada por Deputado Federal com base em degravação de conversa telefônica. 3. Obtenção de provas por meio ilícito. Art. 5º, LVI, da Constituição Federal. Inadmissibilidade. 4. O só fato de a única prova ou referência aos indícios apontados na representação do MPF resultarem de gravação clandestina de conversa telefônica que teria sido concretizada por terceira pessoa, sem qualquer autorização judicial, na linha da jurisprudência do STF, não é elemento invocável a servir de base à propulsão de procedimento criminal legítimo contra um cidadão, que passa a ter a situação de investigado. 5. À vista dos fatos noticiados na representação, o Ministério Público Federal poderá proceder à apuração criminal, respeitados o devido processo legal, a ampla defesa e o contraditório. 6. Habeas corpus deferido para determinar o trancamento da investigação penal contra o paciente, baseada em elemento de prova ilícita”139.
138 STF - Primeira Turma HC 89032/ SP-São Paulo. Relator(a): Min. MENEZES DIREITO. DJ 23-11-2007. PP-00079. 139
STF – Segunda Turma. HC 80948 / ES – Espírito Santo. Relator(a): Min. Néri da Silveira. DJ 19-12-2001. PP-00004.
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Contudo, a proibição das provas ilícitas, não deve ser vista em
termos absolutos, tendo em vista que vigora, nos países filiados a esta vedação, a
teoria da proporcionalidade, tema que será visto no tópico 2.5.
Verificar-se-á a seguir, as principais correntes doutrinárias, no
tocante ao tratamento que a prova considerada ilícita recebe.
2.3 CORRENTES ACERCA DA (IN) ADMISSIBILIDADE
Existem três correntes doutrinárias acerca da questão da
admissibilidade, ou não, das provas obtidas por meios ilícitos, quais sejam: a) pela
inadmissibilidade das provas ilícitas ou corrente obstativa, b) pela admissibilidade
das provas ilícitas ou corrente permissiva, e c) corrente intermediária.
2.3.1 Pela inadmissibilidade das provas ilícitas ou corrente obstativa
Entende a corrente obstativa que não se admite no processo,
em nenhuma hipótese, a inserção de provas obtidas por meios ilícitos, pois prevê o
inc. LVI do art. 5º da CRFB/88 “São inadmissíveis, no processo, as provas obtidas
por meios ilícitos”.
Neste sentido, aduz Luiz Francisco Torquato Avólio140:
A finalidade do processo penal com a descoberta da verdade material, entende que a liberdade da apreciação dos meios de prova, por maior que seja não é total: o limite é aquele que garanta a exclusão dos meios de prova que atentem contra o poder público, ou se revelem subversivos da ordem pública, violentos e atentatórios à
personalidade humana ou à moral pública.
140 AVOLIO, Luiz Francisco Torquato. Provas ilícitas : Interceptações telefônicas, ambientais e gravações clandestinas. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2003, p. 76.
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2.3.2 Pela admissibilidade das provas ilícitas ou c orrente permissiva
Entende a corrente permissiva que fundamenta sua posição no
foco da busca da verdade real, ainda que baseado em meios ilícitos.
Neste sentido, afirma Luiz Francisco Torquato Avólio141:
[...] embora partindo de pressupostos diversos, as teorias
englobadas sob a rubrica da admissibilidade das provas ilícitas postulam a sua utilizabilidade no processo, reservando ao infrator as sanções cabíveis. Inutilizáveis, no processo, seriam somente, as
provas que a própria lei processual proscreve.
2.3.3 Corrente intermediária
Surgiu entre as teorias obstativa e permissiva, a intermediária,
segundo a qual não se vincula aos extremos, quanto a (in) admissibilidade da prova
ilícita.
Entende a corrente intermediária que não se deve proibir ou
aceitar as provas pelo fato de serem ilícitas. Devendo haver uma proporcionalidade
entre os bens jurídicos contrastantes, fazendo um balanceamento dos bens jurídicos
lesados.
Referindo-se a corrente intermediária aduz Antônio Scarance
Fernandes142:
Admite-se a produção de prova obtida em violação de norma constitucional em situações excepcionais quando, no caso, objetiva-
141 AVOLIO, Luiz Francisco Torquato. Provas ilícitas : Interceptações telefônicas, ambientais e gravações clandestinas. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2003, p.45. 142 FERNANDES, Antonio Scarance. Processo penal constitucional . 3. ed. rev. ,atual e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2002, p. 85.
41
se proteger valores mais relevantes do que aqueles infringidos na colheita da prova e também constitucionalmente protegidos.
Entretanto, a corrente intermediária admite a produção da
prova obtida por meios ilícitos, nas hipóteses em que o bem jurídico alcançado com
esta, ser de maior valor que o bem jurídico sacrificado pela ilicitude da obtenção143.
2.4 PROVAS ILÍCITAS POR DERIVAÇÃO OU TEORIA DOS FRUTOS DA ÁRVORE
ENVENENADA
Tratam-se aqui, de um dos mais polêmicos tópicos no estudo
das provas ilícitas, as chamadas “provas por derivação”.
Tais provas têm aparência lícita por sua natureza, contudo,
ganham caráter ilícito por chegarem ao processo através da influência e auxílio de
outra prova considerada ilícita.
Nos sistemas em que vigora a inadmissibilidade das provas
ilícitas, como é o caso do ordenamento nacional, surge um outro questionamento,
qual seja, se é possível admitir no processo provas obtidas de forma lícita, mas que
tiveram como origem informações decorrentes de uma prova ilícita.
Afirma Luiz Francisco Torquato Avólio144 que “O problema das
provas ilícitas por derivação, por uma imposição lógica, só se coloca nos sistemas
de inadmissibilidade processual das provas ilicitamente obtidas”.
A conhecida Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada,
originária do direito norte-americano, com tradução fruits of the poisonous tree,
proíbe a utilização no processo das provas ilícitas, bem como aquelas denominadas
provas ilícitas por derivação, que se conceituam como sendo provas aparentemente
143 GRECO FILHO, Vicente, Manual de processo penal . 3. ed. atual. São Paulo: Saraiva. 1995, p. 177/178. 144 AVOLIO, Luiz Francisco Torquato. Provas ilícitas : Interceptações telefônicas, ambientais e gravações clandestinas. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2003, p. 68.
42
lícitas, mas obtidas através de comportamento anterior ilícito, as quais devem ser
desprezadas, pois a contaminação pelo vício (veneno) da ilicitude do meio utilizado
para obtê-las contamina a todos os seus frutos145.
Fernando da Costa Tourinho Filho146 discorrendo sobre a
doutrina do fruto da árvore envenenada aduz:
A doutrina do ´fruit of the poisonous tree`, ou simplesmente ´fruit
doctrine`, ´fruto da árvore envenenada`, adotada nos Estados Unidos desde 1914 para os Tribunais Federais, e nos Estados, por imperativo constitucional, desde 1961, e que teve sua maior repercussão no caso Silverthorne Lumber Co. v. United States, 251 US 385 (1920), quando a Corte decidiu que o Estado não poderia intimar uma pessoa a entregar documentos cuja existência for
descoberta pela polícia por meio de uma prisão ilegal.
Conceitua e exemplifica Fernando Capez147 que:
As provas ilícitas por derivação são aquelas lícitas em si mesmas, mas produzidas a partir de um fato ilícito. Por exemplo: documento é apreendido em um domicílio, durante diligência de busca e apreensão sem prévia ordem judicial. A prova será considerada ilícita. Entretanto, a partir dessa prova ilícita, não utilizada no processo, chega-se a testemunhas e outros documentos
regularmente produzidos (provas lícitas em si mesmas).
Para exemplificar, imagine-se que, por meio de escuta
telefônica clandestina, descobre-se a chegada de grande quantidade de
entorpecentes em determinado dia e, no dia da chegada, a polícia faz a apreensão
com todas as suas formalidades legais. Segundo esta doutrina, a prova material do
145 BONFIM, Edilson Mougenot. Curso de processo penal . 2. ed. rev, aum. E atual. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 297/298. 146 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal . 9. ed. rev e atual. São Paulo: Saraiva. 2007, p. 523. 147 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal . 12. ed. ver. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 279/280.
43
delito é ilícita porque só se chegou a seu conhecimento através de uma escuta não
autorizada148.
Ainda, como exemplo clássico, comumente usa-se o da
confissão ou declarações colhidas mediante tortura física, em que o acusado indica
onde se encontra o produto do crime, a confissão, no caso, é comprometida. As
revelações extorquidas mediante violência ou grave ameaça são absolutamente
ausentes de manifestação de vontade do depoente ou interrogado149.
Parte da doutrina e jurisprudência não reconhece qualquer
efeito ou sanção à consideração no processo das provas derivadas de prova ilícita,
posicionando-se no sentido da admissibilidade de tais provas, pois não há proibição
de forma expressa na Constituição.
Embora que a Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada, ganhou
redação com a lei 11.690/2008 no Código de Processo Penal, dispondo em seus § §1º 2º,
do artigo 157:
“[...]
§ 1º São também inadmissíveis as provas derivadas das ilícitas,
salvo quando não evidenciado o nexo de causalidade entre umas e outras, ou quando as
derivadas puderem ser obtidas por uma fonte independente das primeiras.
§ 2º Considera-se fonte independente aquela que por si só, seguindo
os trâmites típicos e de praxe, próprios da investigação ou instrução criminal, seria capaz de
conduzir ao fato objeto da prova.
Os defensores da Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada,
afirmam que tal postura “tem direta relação com a prevalência dos direitos e
garantias individuais sobre o interesse do Estado, no caso específico da punição150”.
A atual Constituição da República Federativa do Brasil não
prevê expressamente a admissibilidade ou não das provas derivadas de uma
148 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal . 9. ed. rev e atual. São Paulo: Saraiva. 2007, p. 522/523. 149 AVOLIO, Luiz Francisco Torquato. Provas ilícitas : Interceptações telefônicas, ambientais e gravações clandestinas. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2003, p. 68. 150 MARTINS, Jorge Henrique Schaefer. Prova criminal . Modalidades. Valoração. (incluindo comentários sobre a Lei 9.296, de 24/07/96). Curitiba: Juruá, 1996, p. 103.
44
primeira ilícita, deixando lacuna para discussões doutrinárias e jurisprudenciais.
Existindo, entretanto posicionamentos divergentes.
Diante dessas discussões, sobre o tema, posiciona-se Alberto
José Q. T. de Camargo Aranha151:
Se a não prova ou a prova inexistente, em razão de sua ilicitude, gera outra prova, embora esta tenha a aparência formal de perfeita, esta última está contaminada pelo defeito de sua origem, tornando-se, consequentemente, também prova ilícita e, como tal, imprestável.
Sobre o tema Grinover, Scarance e Magalhães152 afirmam que:
Na posição mais sensível às garantias da pessoa humana, e conseqüentemente mais intransigente com os princípios e normas constitucionais, a ilicitude da obtenção da prova transmite-se às provas derivadas, que são assim, igualmente banidas do processo.
Ainda, seguem os referidos doutrinadores fazendo uma
ressalva:
No entanto, é preciso atentar para as limitações impostas à teoria da
inadmissibilidade das provas ilícitas por derivação, ou dos frutos da árvore envenenada,
pelo Supremo norte americano e pela doutrina internacional: excepcionam-se da vedação
probatória as provas derivadas da ilícita, quando a conexão entre uma e outra é tênue, de
modo a não se colocarem a primária e as secundárias como causa e efeito; ou, ainda,
quando as provas derivadas da ilícita poderiam de qualquer modo ser descobertas por outra
maneira. Fala-se, no primeiro caso, em independent source e, no segundo, na inevitable
discorery. Isso significa que se a prova ilícita não foi absolutamente determinante para o
descobrimento das derivadas, ou se estas derivam de fonte própria, não ficam
contaminadas e podem ser produzidas em juízo.
151 ARANHA, Adalberto José Q. T. de Camargo. Da prova no processo penal . 7. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva. 2006, p. 69. 152 GRINOVER, Ada Pellegrini; SCARANCE FERNANDES, Antonio; GOMES FILHO, Antonio Magalhães. As nulidades no processo penal . 9. ed. rev, atual e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, p. 153.
45
Salienta ainda, Eveline Lima de Castro153, que a admissão
desta teoria não é unânime, pois se encontra limitações nas doutrinas nacionais,
estrangeiras e, também na Suprema Corte Norte-americana, assim, neste sentido,
traz algumas dessas limitações:
Independent source (quando a prova ilícita não é absolutamente determinante para a descoberta da prova derivada, e, se entre elas não houver conexão de causa e efeito), inevitable discovery (quando a prova seria, inevitavelmente, descoberta por investigação legal); purget taint (quando for possível distinguir o meio de obtenção da prova secundária da ilegalidade inicial).
Entretanto, nota-se que a doutrina e a jurisprudência ainda não
chegaram a uma posição unânime, quer no direito comparado, quer no brasileiro154.
Atualmente, o Supremo Tribunal Federal não admite provas
ilícitas, encontrando-se dividido quanto à (in) admissibilidade das provas ilícitas por
derivação. Assim, ensina Alexandre de Moraes155:
Essa definição foi tomada pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, que, invertendo a antiga maioria (6 X 5), adotou em relação às provas derivadas das provas ilícitas a teoria do fruits of poisonous tree, ou seja, pela comunicabilidade da ilicitude das provas ilícitas a todas aquelas que dela derivarem. Em conclusão, atual posição majoritária do Supremo Tribunal Federal entende que a prova ilícita originária contamina as demais provas dela decorrentes, de acordo com a teoria dos frutos da árvore envenenada.
Nota-se que a problemática é mais ampla do que se percebe,
deixando lacunas que servem de fomento aos vários posicionamentos doutrinários.
153 CASTRO, Eveline Lima de. Interceptação telefônica face às provas ilícitas . Jus navegandi, Teresina, <http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=3274> Acesso em 13 nov. 2007. 154 AVOLIO, Luiz Francisco Torquato. Provas ilícitas : Interceptações telefônicas, ambientais e gravações clandestinas. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2003, 68. 155 MORAES, Alexandre de, Direito Constitucional . 21. ed. São Paulo: Atlas. 2007, p. 102/103.
46
2.5 A TEORIA DA PROPORCIONALIDADE
A teoria da proporcionalidade tem por objetivo equilibrar os
direitos e garantias individuais com os interesses de toda uma coletividade, segundo
essa teoria é preciso ponderar os interesses em jogo, se houver confronto entre
bens jurídicos constitucionalmente garantidos, a fim de se admitir ou não, a prova
obtida por meio ilícito, deverá ser admitido àquela que ferir o de menor monta156.
Estando a Constituição no ápice da pirâmide normativa,
regendo todas as demais leis vigentes no país, preponderando sobre estas e lhes
determinando o sentido. Contudo pode haver, e frequentemente há conflitos de
princípios (espécies normativas) constitucionais, ou seja, colisão de princípios. Como
exemplo as hipóteses do art. 5º da CRFB/88, onde se encontram inúmeros
princípios que contemplam variados direitos igualmente protegidos, por exemplo: a
vida, a liberdade, a segurança, a igualdade, a propriedade etc. Na hipótese de um
conflito de princípios em um caso concreto, um dos métodos mais utilizados para a
correta solução é o princípio da proporcionalidade, que pode revestir-se de variantes
mais ou menos aperfeiçoadas157.
Em suma, é o princípio da proporcionalidade que permite o
sopesamento dos princípios e direitos fundamentais, no caso de conflito entre eles,
proporcionando uma solução que respeite ao máximo todos os interesses
envolvidos, ou se necessário o sacrifício do de menor carga valorativa no caso
concreto158.
Vale ressaltar a posição de Vicente Greco Filho159:
O texto constitucional parece, contudo, jamais admitir qualquer prova cuja obtenção tenha sido ilícita. Entendo, porém, que a regra não seja absoluta, porque nenhuma regra constitucional é absoluta, uma vez que tem de conviver com outras regras ou princípios também constitucionais. Assim, continuará a ser necessário o
156 NUTTI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado . 2. ed. rev, atual e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribuanis, 2003, p. 296. 157 BONFIM, Edilson Mougenot. Curso de processo penal . 2. ed. rev, aum. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007, 300. 158 BONFIM, Edilson Mougenot. Curso de processo penal . 2. ed. rev, aum. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 300. 159 GRECO FILHO, Vicente, Manual de processo penal . 3. ed. atual. São Paulo: Saraiva. 1995, p.178.
47
confronto ou peso entre os bens jurídicos, desde que constitucionalmente garantidos, a fim de se admitir ou não, a prova obtida por meio ilícito. Veja-se, por exemplo, a hipótese de uma prova decisiva para absolvição obtida por meio de uma ilicitude de menor monta. Prevalece o princípio da liberdade da pessoa, logo a prova será produzida e apreciada, afastando-se a incidência do inc. LVI do art. 5º da constituição, que vale como princípio, mas não
absoluto.
Grinover, Scarance e Magalhães160, esclarecem que:
A teoria, hoje dominante, da inadmissibilidade processual das provas ilícitas, colhidas com infringência a princípios ou normas constitucionais, vem, porém, atenuada por outra tendência, que visa a corrigir possíveis distorções a que a rigidez da exclusão poderia levar em casos de excepcional gravidade. Trata-se do denominado verhältnismassigkeitsprinzip, ou seja, de um critério de proporcionalidade, pelo qual os tribunais da então Alemanha Federal, sempre em caráter excepcional e em casos extremamente graves, têm admitido a prova ilícita, baseando-se no princípio do equilíbrio entre valores fundamentais contrastantes.
Surge atualmente na doutrina e na jurisprudência estrangeira
forte tendência no sentido da adoção do critério da proporcionalidade, o qual visa
corrigir excesso de rigidez na valoração ou vedação das provas.
Neste sentido, dispõe Luiz Francisco Torquato Avólio161 que:
A teoria da proporcionalidade ou da razoabilidade, também denominada teoria do balanceamento ou da preponderância dos interesses, consiste, pois exatamente, numa construção doutrinária e jurisprudencial que se coloca nos sistemas de inadmissibilidade da prova obtida ilicitamente, permitindo, em face de uma vedação probatória, que se proceda a uma escolha, no caso concreto, entre os valores constitucionalmente relevantes postos em conflito.
160 GRINOVER, Ada Pellegrini; SCARANCE FERNANDES, Antonio; GOMES FILHO, Antonio Magalhães. As nulidades no processo penal . 9. ed. rev, atual e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, p. 152. 161 AVOLIO, Luiz Francisco Torquato. Provas ilícitas : Interceptações telefônicas, ambientais e gravações clandestinas. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2003, p.60.
48
Professando em favor da teoria da proporcionalidade aduz o
mestre José Carlos Barbosa Moreira162:
Seria mais sensato conceder ao juiz liberdade de avaliar a situação em seus diversos aspectos; atenta a gravidade do caso, a índole da relação jurídica controvertida, a dificuldade para litigante de demonstrar a veracidade de suas alegações mediante procedimentos perfeitamente ortodoxos, o vulto do dão causado e outras circunstâncias, o julgador decidiria qual dos interesses em conflito deve ser sacrificado, e em que medida.
Lembra ainda, Luiz Francisco Torquato Avólio163 quanto à
aplicação do princípio da proporcionalidade, que há necessidade de uma definição
dos critérios para sua aplicação, através da determinação:
a) dos valores em jogo; b) da ordem (normativa) da prioridade; e c) do cânone da proporcionalidade (entre o meio empregado e o fim a ser obtido). Adverte que as maiores incertezas derivam, efetivamente, da errônea individualização dos valores em jogo.
Neste sentido, manifesta-se Fernando Capez164:
As provas ilícitas (diretamente ou por derivação) e as ilegítimas poderão, excepcionalmente, ser aceitas no processo, por adoção do princípio da proporcionalidade dos valores contrastantes. Segundo este princípio, largamente adotado na jurisprudência alemã do pós-guerra, nenhuma garantia constitucional tem valor supremo e absoluto, de modo a aniquilar outra de equivalente grau de importância.
162 MOREIRA. José Carlos Barbosa. A Constituição e as Provas Ilicitamente Obtidas. <http://www.ccj.ufsc.br/buscalegis>, desde 01.05.1999, p. 2 163 AVOLIO, Luiz Francisco Torquato. Provas ilícitas : Interceptações telefônicas, ambientais e gravações clandestinas. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2003, p. 67. 164 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal . 12. ed. ver. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 280.
49
Manifesta-se ainda, Paulo Bonavides165 afirmando que:
Uma das aplicações mais proveitosas contidas potencialmente no princípio da proporcionalidade é aquela que o faz de instrumento de interpretação toda vez que ocorre antagonismo entre direitos fundamentais e se busca daí solução conciliatória, para o qual o
princípio é indubitavelmente apropriado.
O entendimento da jurisprudência tem sido no mesmo sentido
do entendimento doutrinário, ou seja, pela necessidade de sopesar os bens
conflitantes no caso concreto sempre à luz do princípio da proporcionalidade.
Como manifestação do princípio da proporcionalidade,
encontra-se na doutrina a utilização da prova ilícita pro reo, ainda que com
infringência de direitos e garantias individuais, o que será visto a seguir.
2.6 ADMISSIBILIDADE DE PROVA ILÍCITA EM BENEFÍCIO DO ACUSADO
Discute-se na doutrina, a despeito da vedação constitucional às
provas ilícitas, se é possível a sua utilização em benefício do acusado. Há neste
caso, um conflito entre normas constitucionais, quais sejam, o princípio da proibição
da prova ilícita, de um lado, e os princípios da ampla defesa e da liberdade, do outro.
Neste sentido, ensina Luiz Francisco Torquato Avólio166:
A aplicação do princípio da proporcionalidade sob a ótica do direito de defesa, também garantido constitucionalmente, e de forma prioritária no processo penal, onde impera o princípio do “favor rei” é de aceitação praticamente unânime pela doutrina e pela jurisprudência.
165 BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional . 9. ed. Rio de Janeiro: Malheiros, 2000, p.
386.
166 AVOLIO, Luiz Francisco Torquato. Provas ilícitas : Interceptações telefônicas, ambientais e gravações clandestinas. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2003, p. 67.
50
No confronto entre valores, proposto pela teoria da
proporcionalidade, deve prevalecer, evidentemente, a proteção ao direito à prova da
inocência, não só porque a liberdade e a dignidade humana constituem valores
insuperáveis, mas também, a impunidade do verdadeiro culpado167.
A possibilidade de carrear aos autos provas ilícitas em
benefício do réu, deriva-se da idéia de que terá sua liberdade ameaçada por futura
sentença injusta, sendo assim, quando tais provas introduzidas, são amparadas por
uma causa excludente de antijuricidade.
Nesse sentido, ensina Fernando Capez168:
Se, por um lado, a constituição garante a proteção da intimidade, e o sigilo das comunicações, por outro assegura também o direito do acusado ao devido processo legal e à ampla defesa. [...] Entre aceitar uma prova vedada, a qual se apresenta como único meio de comprovar a inocência de um acusado, e permitir que alguém, sem qualquer responsabilidade pelo ato imputado, seja privado injustamente de sua liberdade, a primeira opção é, sem dúvida, a mais consentânea com o Estado Democrático de Direito e a proteção da dignidade humana.
Sobre o tema, assim se manifesta Ada Pelegrini Grinover169:
Predominante é o entendimento na doutrina que possível é a utilização de prova favorável ao acusado ainda que colhida com infringência a direitos fundamentais seus ou de terceiros, e, que quando produzida pelo próprio interessado (como de gravação de conversação telefônica em caso de extorsão, por exemplo), traduz hipótese de legítima defesa, que exclui a ilicitude.
Note-se, entretanto, que é afastada a inadmissibilidade das
provas ilícitas no processo penal, quando esta favorecer o réu, e ser o único meio
eficaz de evitar uma condenação injusta.170
167 GOMES FILHO, Antônio Magalhães. Direito à prova no processo penal . s/ed., São Paulo, Revista dos Tribunais, 1997, p. 106/107. 168 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal . 12. ed. ver. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, 280/281. 169 GRINOVER, Ada Pellegrini. O regime brasileiro das interceptações telefônicas . Revista brasileira de Ciências Criminais. São Paulo, ano 5, n. 17. p. 114/126, jan/mar. 1997, p. 116.
51
2.7 ANÁLISE DO CONCEITO E RELATIVIDADE JURÍDICA DOS DIREITOS
INDIVIDUAIS DA INTIMIDADE E PRIVACIDADE FRENTE À LEI 9.296/96
Antes de adentrarmos ao estudo da Lei n. 9.296/96 que
regulamenta o inciso XII, parte final, do artigo 5º da Constituição Federal (conhecida
como a lei das interceptações telefônicas), que será tema do capítulo 3, necessário
se faz o estudo referente às garantias constitucionais de tutela aos direitos da
intimidade e privacidade, eis que há grande crítica, quanto a violação destes.
No Brasil, as garantias constitucionais ao direito a intimidade e
à vida privada estão previstos no inciso X do art. 5º da CRFB/88, onde dispõe:
“Art. 5º. [...]
X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a
imagem as pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral
decorrente de sua violação”.
O conceito etimológico da palavra intimidade, deriva-se do
latim intimus, o que quer dizer o mais profundo e íntimo, indicando a qualidade ou o
caráter das coisas e dos fatos, que se mostram estreitamente ligados, ou das
pessoas, que se mostram afetuosamente unidas pela estima171.
A respeito da intimidade, Luciana Fregadolli172 exemplifica:
Não há um conceito absoluto de intimidade, mas é possível exemplificá-la: o diário íntimo, o segredo sob juramento, as próprias convicções as situações indevassáveis de pudor pessoal, o segredo íntimo, cuja mínima publicidade constrange.
170 FERNANDES, Antonio Scarance. Processo penal constitucional . 3. ed. rev. ,atual e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2002, p. 92. 171 SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico . 27. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 768. 172 FREGADOLLI, Luciana. O direito à intimidade e a prova ilícita . Belo Horizonte: Del Rey, 1998, p. 44.
52
Nesse sentido, Rubens Limongi França173 ensina:
A vida particular da pessoa é um bem de supremo valor moral, que cumpre ser preservada juridicamente, por disciplina própria, autônoma. Diz respeito à sua existência interior, espiritual, familiar, dentro da qual se expande e afirma a personalidade, no gozo exclusivo do que tem de autentico. A proteção civil do indivíduo, exercida contra interferências estranhas e arbitrárias, reveladoras do que se passa no círculo fechado de sua vida privada, chama-se direito à intimidade. Uma das prerrogativas da criatura como ser humano, com suas virtudes e fraquezas, vaidades e mazelas, ideais e frustrações, e como ser social, em qualquer condição na escala da sociedade. A doutrina, que evolui notavelmente em muitos países, a maior parte deles, sem lograr a sistematização civil da matéria, dá-lhe vários outros títulos: direito à privacidade, ao recato, reserva ou resguardo, ao segredo; e ainda o direito de estar só.
Definir conceitualmente a questão do direito à intimidade e à
vida privada é tarefa complexa, uma vez que são vocábulos muitas vezes
considerados sinônimos, contudo, a própria Constituição Federal traz em seu bojo
como sendo direitos distintos174.
Para De plácido e Silva175 vida privada “ou vida particular,
designa aquela afastada do convívio ou da observação de estranhos”.
Túlio Vianna divide o direito à privacidade em 3 outros direitos
que, em conjunto, caracterizam a privacidade:
a. Direito de não ser monitorado, entendido como direito de
não ser visto, ouvido, etc.;
b. Direito de não ser registrado, entendido como direito de
não ter imagens gravadas, conversas gravadas, etc.;
173 FRANÇA, Rubens Limongi. Enciclopédia Saraiva do Direito . v. 16. São Paulo: Saraiva, 1977, p. 46. 174 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo . 13 ed. rev e atual. São Paulo: Malheiros Editores, 1997, p. 202. 175 SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico . 27. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 1484.
53
c. Direito de não ser reconhecido, entendido como direito de
não ter imagens e conversas anteriormente gravadas publicadas na Internet em
outros meios de comunicação176.
Assim, diferenciando intimidade de vida privada, Manuel
Gonçalves Ferreira Filho177 aduz:
Intimidade relaciona-se às relações subjetivas e de trato íntimo da pessoa, suas relações familiares e de amizade, enquanto vida privada envolve todos os demais relacionamentos humanos, inclusive os objetivos, tais como relações comerciais, de trabalho, de estudo, etc.
Nesta senda, Ariane Fucci Wady178 salienta:
[...] a vida privada é mais ampla do que a intimidade da pessoa. A vida privada é composta de informações em que somente a pessoa pode escolher se as divulga ou não. Já a intimidade diz respeito ao modo de ser da pessoa, à sua identidade, que pode, muitas vezes, ser confundido com a vida privada. Podemos dizer, assim, que dentro da vida privada ainda há a intimidade da pessoa.
Nota-se que os direitos constitucionalmente garantidos da
intimidade e da privacidade são considerados relativos, numa análise perante os
direitos inerentes à coletividade. Entretanto, há limitações impostas à todos os
direitos, cujo detrimento se dá em função da manutenção da ordem jurídica a fim de
garantir a convivência social179.
176 VIANNA, Túlio. Transparência pública, opacidade privada . 1 ed. Rio de Janeiro: Revan, 2007, p.116 177 FEREIRA FILHOS, Manuel Gonçalves. Comentários à constituição brasileira de 1988 . 2 ed. São Paulo: Saraiva, 1997, p. 35. 178 WADY, Ariane Fucci. Qual a diferença entre vida privada e intimidade ? LFG – Rede de ensino luiz Flávio Gómez. Disponível em: <http://www.lfg.com.br/public_html/article.php?story=20080722095043227>. Acesso em: 15 out. 2008. 179 CRUZ, Paulo Márcio. Fundamentos do direito constitucional. Curitiba: Juruá, 2001, p.156.
54
Arrematando, assevera Marco Aurélio C. M. de Oliveira180:
Ao Estado, portanto, cabe intervir na vida privada, apenas dentro desses limites, abstendo-se de agir autoritária e desnecessariamente. Isto é, a intervenção estatal na vida dos homens deve cingir-se ao mínimo necessário e indispensável para assegurar a harmonia da vida social, em conformidade com os fins da vida e, portanto, com o bem comum.
180 OLIVEIRA, Marco Aurélio Costa Moreira de. O direito penal e intervenção mínima. Revista Brasileira de Ciências Criminais. São Paulo, ano 5, n. 17, p. 152. jan/mar. 1997.
55
3 A QUESTÃO DA (IN) ADMISSIBILIDADE DAS PROVAS ILÍ CITAS NO PROCESSO PENAL: QUANTO AS INTERCEPTAÇÕES TELEFÔNICA S
Neste terceiro capítulo, falar-se-á da previsão legal da
interceptação telefônica, frente à Constituição da República Federativa do Brasil de
1988, bem como da questão da (in) admissibilidade das provas ilícitas quanto às
escutas telefônicas e ambientais, inserindo-as no contexto atual no qual estamos
vivenciando.
3.1 PREVISÃO LEGAL DA INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA NA CONSTITUIÇÃO
DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988
O uso dos meios eletrônicos para conhecer ou documentar o conteúdo de conversas telefônicas é, atualmente, bastante comum e de fácil acesso. Diante ao avanço tecnológico, estes meios na prática são acessíveis não apenas às autoridades públicas, mas também ao particular181.
A inadmissibilidade das provas ilícitas de um lado, e a necessidade de não privar o Estado dos instrumentos necessários para a elucidação dos casos tido como criminosos, do outro, originou legislações no mundo todo com o escopo de regularizar e disciplinar a utilização desses meios eletrônicos de captação de prova182.
A Constituição Federal, em seu art. 5º, XII183, consagra a garantia da inviolabilidade do sigilo das comunicações: por carta, por telegrafia, por transmissão de dados e telefonia. Somente no último caso, ou seja, na hipótese do sigilo das comunicações telefônicas, o Texto Constitucional admitiu a quebra. Nos demais, aparentemente, o sigilo foi estabelecido de modo absoluto184.
181 AVOLIO, Luiz Francisco Torquato. Provas ilícitas : Interceptações telefônicas, ambientais e gravações clandestinas. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2003, p. 90. 182 GRINOVER, Ada Pellegrini; SCARANCE FERNANDES, Antonio; GOMES FILHO, Antonio Magalhães. As nulidades no processo penal . 9. ed. rev, atual e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, p. 195. 183 Art. 5º, XII da CRFB/88 “é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal”. IN BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Lex: Vade Mecum Acadêmico de Direito. 4 ed. São Paulo: Rideel, 2007. 184 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal . 12. ed. ver. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 282.
56
Contudo, afirma Alexandre de Moraes185:
Ocorre, porém, que apesar de a exceção constitucional expressa referir-se somente à interceptação telefônica, entende-se que nenhuma liberdade individual é absoluta, sendo possível, respeitados certos parâmetros, a interceptação das correspondências e comunicações telegráficas e de dados sempre que as liberdades públicas estiverem sendo utilizadas como instrumento de salvaguarda de práticas ilícitas.
Quanto à inviolabilidade do sigilo das comunicações telefônicas, a Constituição Federal prevê entretanto a necessidade de ordem judicial para a investigação criminal e instrução processual penal186.
Exigiu-se, portanto, a regulamentação legal para a obtenção do alvará judicial.
Diante disso, promulgou-se a lei 9.296/96, que veio viabilizar a
autorização judicial e regulamentar a parte final do inciso XII do art. 5º da CRFB/88.
Disciplinando a interceptação de comunicações telefônicas para prova em
investigação criminal, e em instrução processual penal, a ela equiparando a
interceptação do fluxo de comunicações em sistemas de informática e telemática187.
As outras formas e espécies de provas ilícitas continuam a
merecer a atenção do intérprete e do operador do direito, no sentido de fixar o
âmbito de aplicação do princípio constitucional da proibição da prova obtida
ilicitamente188.
Neste sentido, afirma Edílson Mougenot Bonfim189:
A interceptação telefônica não é um processo ilícito em si mesmo. Com efeito, a Constituição Federal, diversamente do que ocorreu no caso da interceptação de correspondência, ressalva a possibilidade
185 MORAES, Alexandre de, Direito Constitucional . 21. ed. São Paulo: Atlas. 2007, p. 52/53. 186 Art. 5º, XII da CRFB/88 “é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal”. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Lex: Vade Mecum Acadêmico de Direito. 4 ed. São Paulo: Rideel, 2007. 187 MIRABETE, Julio Fabrini. Processo penal . 18. ed. rev e atual. São Paulo: Atlas, 2006, p. 255. 188 MORAES, Alexandre de, Direito Constitucional . 21. ed. São Paulo: Atlas. 2007, p. 200. 189 BONFIM, Edilson Mougenot. Curso de processo penal . 2. ed. rev, aum. E atual. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 302.
57
de que a interceptação de conversa telefônica se faça licitamente, desde que autorizada judicialmente, com a finalidade específica de que se aplique à investigação criminal ou instrução processual penal, nas hipóteses previstas em lei.
Entretanto a Constituição Federal, em seu inciso XII, do art. 5º,
abriu uma exceção, qual seja, quando presentes determinados requisitos, haverá
possibilidade de violação das comunicações telefônicas. Sendo eles: a) ordem
judicial, b) para fins de investigação criminal ou instrução processual penal e nas
hipóteses e na forma que a lei estabelecer190.
Concernente aos requisitos, o sigilo poderá ser quebrado se
houver prévia autorização judicial, se a finalidade for instruir investigação policial ou
processo criminal (não se admite a quebra do sigilo para instruir processo civil, por
exemplo, onde é comum a ação de detetives particulares “grampeando” o telefone
do suspeito), desde que haja indícios razoáveis de autoria ou participação em crime,
que o crime seja punido com reclusão e quando aquela prova não puder ser
produzida por nenhum outro meio disponível191.
Conforme Julio Fabbrini Mirabete192:
[...] prevê a lei a sua possibilidade apenas nos crimes apenados com reclusão, quando houver indícios razoáveis de autoria ou participação em infração penal, mas somente quando a prova não puder ser feita por outros meios disponíveis. A interceptação deve ser feita em autos apartados, preservando-se o sigilo das diligências, gravações e transcrições respectivas [...].
A expressão investigação criminal engloba tanto o inquérito
policial, bem como qualquer outro procedimento administrativo instaurado pelo
Ministério Público, e outros a fim de averiguar fato típico caracterizado como crime
ou contravenção penal.
190 MORAES, Alexandre de, Direito Constitucional . 21. ed. São Paulo: Atlas. 2007, p. 53/54. 191 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal . 12. ed. ver. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 283. 192 MIRABETE, Julio Fabrini. Processo penal . 18. ed. rev e atual. São Paulo: Atlas, 2006, p. 255.
58
Já a expressão instrução processual penal indica prova para o
processo penal, produzida com a denúncia ou queixa (podendo tanto ser a ação
pública quanto a privada).
3.2 INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA LATU SENSU
Etimologicamente a interceptação tem o sentido de:
Interromper no seu curso, deter, reter, (o que era destinado a outrem); ser obstáculo,
captar193.
Gomes e Cervini194 esclarecem que:
Do ponto de vista jurídico (mais precisamente na Lei 9.296/96) a palavra ‘interceptação’ não corresponde ao seu sentido idiomático. Interceptar uma ‘comunicação telefônica’ não quer dizer interrompê-la, impedi-la, detê-la ou cortá-la. Na lei a expressão tem outro sentido, qual seja o de captar a comunicação telefônica, tomar
conhecimento, ter contato com o conteúdo dessa comunicação.
Segundo Luiz Francisco Torquato Avólio, as interceptações,
lato sensu195, juridicamente podem ser entendidas como ato ou interferência nas
comunicações telefônicas, quer para impedi-las, com conseqüências penais, quer
para delas apenas tomar conhecimento. Podendo subdividi-las em várias
modalidades de captação eletrônica, quais sejam:
1. interceptação telefônica em sentido estrito (stricto sensu);
2. escuta telefônica (interceptação telefônica com conhecimento de um dos
interlocutores);
193 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda, Minidicionário da língua portuguesa . 6. ed. rev. ,atual. Curitiba: Posigraf, 2004, p. 485. 194 GOMES Luiz Flávio; CERVINI, Raúl. Interceptação telefônica : lei 9.296, de 24.07.96. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1997, p. 95. 195 Lato sensu. Em sentido amplo. O contrário de stricto sensu. LUIZ, Antônio Filardi. Dicionário de expressões latinas . 2. ed. São Paulo: Atlas, 2002.
59
3. interceptação ambiental (interceptação de conversa entre presentes, sem
conhecimento dos interlocutores);
4. escuta ambiental (interceptação da conversa entre presentes conhecida por um
dos interlocutores);
5. gravação clandestina (da própria conversa), e, por fim,
6. gravação clandestina ambiental (gravação de conversa pessoal e direta, entre os
presentes)196.
Grinover, Scarance e Magalhães197 citam as modalidades de
captação de conversa, da seguinte forma:
a) interceptação da conversa telefônica por terceiro, sem o conhecimento dos dois interlocutores; b) a interceptação da conversa telefônica por terceiro, com o conhecimento de um dos interlocutores; c) a interceptação de conversa entre presentes, por terceiro, sem o conhecimento de nenhum dos interlocutores; d) a interceptação da conversa entre presentes por terceiro, com o conhecimento de um ou alguns dos interlocutores; e) a gravação clandestina da conversa telefônica por um dos sujeitos, sem o conhecimento do outro; f) a gravação clandestina da conversa pessoal e direta, entre presentes, por um dos interlocutores, sem o conhecimento do(s) outro(s).
Para melhor compreensão, será visto a seguir, individualmente,
cada modalidade supracitada.
3.2.1 Interceptação telefônica stricto sensu
Denomina-se interceptação telefônica stricto sensu, ou seja,
em sentido estrito, como sendo a captação feita por terceira pessoa da comunicação
realizada entre dois ou mais interlocutores, sem o conhecimento de qualquer deles.
196 AVOLIO, Luiz Francisco Torquato. Provas ilícitas : Interceptações telefônicas, ambientais e gravações clandestinas. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2003, p. 91. 197 GRINOVER, Ada Pellegrini; SCARANCE FERNANDES, Antonio; GOMES FILHO, Antonio Magalhães. As nulidades no processo penal . 9. ed. rev, atual e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, p. 196.
60
Neste sentido, aduz Luiz Francisco Torquato Avólio198 que “A
interceptação telefônica, em sentido estrito, é a captação da conversa telefônica por
um terceiro, sem o conhecimento dos interlocutores”.
Afirma Alexandre de Moraes199 que “Interceptação telefônica é
a captação e gravação de conversa telefônica, no mesmo momento em que se
realiza, por terceira pessoa sem o conhecimento de qualquer dos interlocutores”.
Corroborando Gomes e Cervini200 acerca da interceptação
stricto sensu, concluem que:
[...] é da essência da interceptação, no sentido legal, a participação de um terceiro. Interceptar comunicação telefônica, assim, é ter conhecimento de uma comunicação ‘alheia’. Ter ciência de algo que pertence a terceiros (aos comunicadores) [...] Interceptação é aquela que se concretiza ‘sem’ o conhecimento dos comunicadores (nenhum deles sabe que o conteúdo da comunicação está sendo captado); a ofensa, portanto, endereça-se a todos eles; a intimidade de todos está sendo violada.
3.2.2 Escuta telefônica
Considera-se escuta telefônica a captação realizada por um
terceiro de uma comunicação telefônica alheia, mas com o conhecimento de um dos
comunicadores. Por exemplo: os casos de familiares que autorizam a polícia a ouvir
as negociações com os seqüestradores201.
Neste sentido, preceitua Ada Pellegrini Grinover202:
[...] a doutrina configura a hipótese como espécie de direito do indivíduo ao controle de seu próprio telefone: assim, por exemplo, os familiares da pessoa seqüestrada, ou a vítima de estelionato, ou
198 AVOLIO, Luiz Francisco Torquato. Provas ilícitas : Interceptações telefônicas, ambientais e gravações clandestinas. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2003, p. 96 199 MORAES, Alexandre de, Direito Constitucional . 21. ed. São Paulo: Atlas. 2007, p. 53.. 200 GOMES Luiz Flávio; CERVINI, Raúl. Interceptação telefônica : lei 9.296, de 24.07.96. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1997, p. 95. 201 AVOLIO, Luiz Francisco Torquato. Provas ilícitas : Interceptações telefônicas, ambientais e gravações clandestinas. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2003, p. 96. 202 GRINOVER, Ada Pellegrini; Liberdades públicas e processo penal : as interceptações telefônicas, 2. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1982, p. 250.
61
ainda aquele que sofre intromissões ilícitas e anônimas através do telefone, em sua vida privada.
Na visão de Gomes e Cervini, a escuta encontra-se no âmbito
da Lei 9.296/96, pois, ao se referir, em seu art. 1º, à interceptação telefônica de
qualquer natureza, utilizou-se termo amplo, deixando de fora somente a gravação
clandestina (telefônica ou ambiental), a interceptação ambiental e a escuta
ambiental203.
Ainda, continuam os referidos autores afirmando que se faz
necessário proteger a intimidade do comunicante que não tem conhecimento da
interceptação, então, as escutas telefônicas para serem consideradas lícitas devem
ter autorização judicial, o que não pode a escuta telefônica estar fora do âmbito da
referida lei204.
Quanto à escuta telefônica, tem-se a seguinte decisão do
Supremo Tribunal Federal:
Habeas Corpus. prova. licitude. gravação de telefonema por interlocutor. é licita a gravação de conversa telefônica feita por um dos interlocutores, ou com sua autorização, sem ciência do outro, quando há investida criminosa deste último. É inconsistente e fere o senso comum falar-se em violação do direito à privacidade quando interlocutor grava diálogo com seqüestradores, estelionatários ou qualquer tipo de chantagista205.
Observa-se, que não é unânime que as escutas telefônicas
estão regulamentadas pela Lei 9.296/96.
203 GOMES Luiz Flávio; CERVINI, Raúl. Interceptação telefônica : lei 9.296, de 24.07.96. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1997, p. 104/105. 204 GOMES Luiz Flávio; CERVINI, Raúl. Interceptação telefônica : lei 9.296, de 24.07.96. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1997, p. 104/105. 205 Supremo Tribunal Federal – Segunda turma – HC nº 75.338/RJ – Relator Ministro Nelson Jobim – DJ. 25.09.98.
62
Vicente Greco Filho, entende que tal procedimento não está
regulado pela Lei 9.296/96. Para sua utilização como prova, dependerá do confronto
do direito à intimidade com a causa motivadora de sua realização206.
3.2.3 Interceptação e escuta ambiental
Interceptação ambiental é a captação da conversa entre
presentes, realizada por um terceiro, dentro do ambiente onde se situam os
interlocutores, sem o conhecimento destes.
Nessa linha é a doutrina de Gomes e Cervini207, segundo a
qual “Se nenhum dos interlocutores sabe da captação, fala-se em interceptação
ambiental em sentido estrito; se um deles tem conhecimento, fala-se em escuta
ambiental”.
Neste sentido, Luiz Francisco Torquato Avólio, denomina
interceptação entre presentes ou interceptação ambiental, como sendo a captação
sub-reptícia208 da conversa entre presentes, realizada por terceiro, dentro do
ambiente onde se situam os interlocutores, com o desconhecimento destes209.
Ressaltam Gomes e Cervini, que tanto a interceptação quanto
a escuta ambiental são operações diferentes das realizadas por meio do telefone,
pois são realizadas no ambiente, sem o emprego do aparelho telefônico.
Entendendo-se por interceptação ambiental a captação de uma conversa alheia,
feita por terceiro, valendo-se de qualquer meio de gravação210.
206 GRECO FILHO, Vicente, Manual de processo penal . 3. ed. atual. São Paulo: Saraiva. 1995. 207 GOMES Luiz Flávio; CERVINI, Raúl. Interceptação telefônica: lei 9.296, de 24.07.96. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1997, p. 111. 208 Sub-reptícia – adj. 1. Fraudulento; ilícito. 2. Feito às ocultas; furtiva. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda, Míniaurélio : o minidicionário da língua portuguesa. 6. ed. rev. atual. Curitiba: Posigraf, 2004, p. 753. 209 AVOLIO, Luiz Francisco Torquato. Provas ilícitas : Interceptações telefônicas, ambientais e gravações clandestinas. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2003, p. 96. 210 GOMES Luiz Flávio; CERVINI, Raúl. Interceptação telefônica: lei 9.296, de 24.07.96. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1997.
63
3.2.4 Gravação clandestina: telefônica e ambiental
Denomina-se gravação clandestina a gravação de uma
conversa por meio de um dos interlocutores, sem o conhecimento do destinatário.
Não havendo a presença de um terceiro estranho a relação comunicativa.
Conforme Luiz Francisco Torquato Avólio211, a gravação
clandestina, é praticado pelo próprio interlocutor, inexiste o terceiro. “Consiste no
registro da conversa telefônica (gravação clandestina propriamente dita) ou da
conversa entre presentes (gravações ambientais) por um de seus participantes, com
o desconhecimento do outro”.
Neste mesmo sentido, aduzem Gomes e Cervini212:
A expressão genérica ‘gravações clandestinas’, aliás, abrange tanto a telefônica (quando se grava uma comunicação telefônica própria) quanto a ambiental (quando se grava uma conversação entre pessoas presentes, clandestinamente, isto é, sem o conhecimento do
interlocutor).
Observa-se que a lei brasileira não tem normas específicas
acerca do tema, assim, configura-se ilícita a divulgação da gravação se seu
conteúdo importar segredo, conforme prevê o artigo 153 do Código Penal213. E,
considera-se lícita, quando a prova advinda de gravação clandestina, haja justa
causa para a divulgação de seu teor214.
211 AVOLIO, Luiz Francisco Torquato. Provas ilícitas : Interceptações telefônicas, ambientais e gravações clandestinas. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2003, p. 99. 212 GOMES Luiz Flávio; CERVINI, Raúl. Interceptação telefônica: lei 9.296, de 24.07.96. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1997, p. 105/106. 213 Artigo 153 do Código Penal – “Divulgar alguém, sem justa causa, conteúdo de documento particular ou de correspondência confidencial, de que é destinatário ou detentor, e cuja divulgação possa produzir dano a outrem: Pena – detenção, de um a seis meses, ou multa”. BRASIL. Decreto-Lei nº 2.848, de 07 de dezembro de 1940. Código Penal. Lex : Vade Mecum Acadêmico de Direito. 4 ed. São Paulo: Rideel, 2007. 214 GRECO FILHO, Vicente, Interceptação telefônica (Considerações sobre a lei nº 9.296, de 24 de julho de 1996). São Paulo: Saraiva, 1996, p. 5.
64
3.3 NATUREZA JURÍDICA DAS INTERCEPTAÇÕES TELEFÔNICAS
AUTORIZADAS
As interceptações telefônicas são lícitas e admissíveis no
processo penal, quando legalmente disciplinadas e rigorosamente efetuadas dentro
dos parâmetros previstos pelo ordenamento jurídico215.
E, é nesse ponto que a interceptação telefônica e o direito
constitucional à inadmissibilidade de prova ilícita se entrecruzam216.
O provimento que autoriza a interceptação se reveste de
natureza cautelar. Exige-se, para tanto, os requisitos que justificam essa medida.
Quanto ao fumus bonis juris217, a autoridade concessora da medida deve dispor de
elementos seguros da existência do crime, de extrema gravidade. Concernente ao
periculum in mora218, deve ser considerado o risco ou prejuízo que da não realização
da medida possa resultar para a investigação processual219.
Neste sentido, Grinover, Scarance e Magalhães lecionam
que220:
A execução das interceptações exige, na maioria dos ordenamentos, ordem judiciária. O provimento que autoriza a interceptação tem natureza cautelar, visando assegurar as provas pela fixação dos fatos, assim como se apresentam no momento da conversa. Por isso mesmo a operação só pode ser autorizada quando presentes os requisitos que justificam as medidas cautelares (fumus boni juris e
periculum in mora), devendo ainda a ordem ser motivada. 215 GRINOVER, Ada Pellegrini; SCARANCE FERNANDES, Antonio; GOMES FILHO, Antonio Magalhães. As nulidades no processo penal . 9. ed. rev, atual e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, p. 197. 216 MORAES, Alexandre de, Direito Constitucional . 21. ed. São Paulo: Atlas. 2007, p. 54. 217 Fumus boni juris – Fumo do bom direito. Expressão muito usada no mundo jurídico , a significar certa atitude que parece estar em consonância com as regras jurídicas. LUIZ, Antônio Filardi. Dicionário de expressões latinas . 2. ed. São Paulo: Atlas, 2002, p. 126/127. 218 Periculum in mora – Perigo da demora [...] Trata-se de um dano potencial, uma situação de fato que pode sofrer um dano irreparável se não tomada uma providência imediata. LUIZ, Antônio Filardi. Dicionário de expressões latinas . 2. ed. São Paulo: Atlas, 2002, p. 229. 219 AVOLIO, Luiz Francisco Torquato. Provas ilícitas : Interceptações telefônicas, ambientais e gravações clandestinas. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2003, p. 94. 220 GRINOVER, Ada Pellegrini; SCARANCE FERNANDES, Antonio; GOMES FILHO, Antonio Magalhães. As nulidades no processo penal . 9. ed. rev, atual e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, p. 197.
65
3.4 DOCUMENTAÇÃO E VALOR PROBANTE
Afirma Luiz Francisco Torquato Avólio221, que:
A conversa telefônica interceptada, que é o objeto da prova, pode ser provada por vários meios, até pelo testemunho do interceptador. Em se tratando, todavia, de interceptações autorizadas por autoridade judiciária, o resultado da operação técnica deve revestir-se de forma
documental.
Acerca do assunto, os doutrinadores Grinover, Scarance e
Magalhães222, asseveram que:
O resultado da interceptação deve revestir-se de forma documental. Normalmente, vem ela acompanhada de gravação da conversa telefônica, com a finalidade de se dispor de uma reprodução sonora, que permita a escuta. Tal gravação, de per si, já se constitui documento, mas isto não exime os órgãos encarregados da operação técnica de certificar todas as etapas desenvolvidas: aliás, a doutrina tem se manifestado no sentido da lavratura de termo,
mesmo quando a interceptação não tenha tido êxito.
Entretanto, tanto a gravação, que permite a reprodução sonora
do objeto da prova e a sua escuta, quanto a degravação (transcrição) da conversa,
devem ser introduzidas no processo como meio de prova223.
No tocante ao valor probante do resultado da interceptação, a
questão insere-se no momento probatório da valoração pelo juiz, nada tendo a ver
com a admissibilidade da prova224.
221 AVOLIO, Luiz Francisco Torquato. Provas ilícitas : Interceptações telefônicas, ambientais e gravações clandestinas. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2003, p. 95. 222 GRINOVER, Ada Pellegrini; SCARANCE FERNANDES, Antonio; GOMES FILHO, Antonio Magalhães. As nulidades no processo penal . 9. ed. rev, atual e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, p. 197. 223 AVOLIO, Luiz Francisco Torquato. Provas ilícitas : Interceptações telefônicas, ambientais e gravações clandestinas. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2003, p. 95. 224 GRINOVER, Ada Pellegrini; SCARANCE FERNANDES, Antonio; GOMES FILHO, Antonio Magalhães. As nulidades no processo penal . 9. ed. rev, atual e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, p. 198.
66
Quando o objeto da interceptação recair diretamente sobre o
fato a ser provado, a prova denomina-se prova direta; quando recair sobre fato
diverso, que poderá conduzir ao fato que se pretende provar, será denominada de
prova indiciária225.
Entretanto, esclarecem Grinover, Scarance e Magalhães, que,
nos casos em que envolve a autenticidade das reproduções mecânicas, se a pessoa
a quem a conversa é atribuída não a reconhecer como sendo sua, será necessário a
realização de uma perícia, para a devida comparação do espectograma da voz
(técnica de comparação das vozes), para análise e comparação das vozes226.
3.5 QUEBRA DE SIGILO DE DADOS TELEFÔNICOS
Entende-se por dados ou registros telefônicos aqueles registros
geralmente escritos, pertencentes às comunicações telefônicas, os quais são
documentados e armazenados pela companhia telefônica, quais sejam: data da
chamada telefônica, horário, número do telefone chamado, duração do uso, valor da
chamada etc. São as denominadas contas telefônicas227.
Discorrendo acerca da característica e diferenciação de
interceptação e quebra de dados telefônicos, Gomes e Cervini228 asseguram que “A
interceptação de comunicação telefônica versa sobre algo que está ocorrendo, atual;
já a quebra do sigilo de dados telefônicos relaciona-se com chamadas telefônicas
pretéritas já realizadas”.
Há na doutrina discussão quanto a possibilidade de quebra de
sigilo dos dados telefônicos, tendo em vista a Constituição da República Federativa
225 AVOLIO, Luiz Francisco Torquato. Provas ilícitas : Interceptações telefônicas, ambientais e gravações clandestinas. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2003, p. 96. 226 GRINOVER, Ada Pellegrini; SCARANCE FERNANDES, Antonio; GOMES FILHO, Antonio Magalhães. As nulidades no processo penal . 9. ed. rev, atual e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, p. 198. 227 GOMES Luiz Flávio; CERVINI, Raúl. Interceptação telefônica : lei 9.296, de 24.07.96. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1997, p. 100/101. 228 GOMES Luiz Flávio; CERVINI, Raúl. Interceptação telefônica : lei 9.296, de 24.07.96. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1997, p. 101.
67
do Brasil de 1988 fazer distinção entre comunicações telefônicas e dados
telefônicos, conferindo a esses a proteção absoluta, e se essa quebra pode ser
determinada com base na lei 9.296/96229.
Entretanto, é preciso estabelecer que as liberdades públicas
sejam relativas por força do princípio da convivência das liberdades. Diante disso, a
proteção ao sigilo dos dados não é absoluta, mas sua quebra se submete a uma
justa causa que justifique a limitação da liberdade individual, bem como à ocorrência
do processo legal230.
Gomes e Cervini231 lecionam que a quebra do sigilo de dados
telefônicos pode ocorrer somente quando existir lei autorizadora, a qual não se
enquadra na lei 9.296/96, pois este diploma legal se referiu apenas as
comunicações telefônicas:
Onde a lei diz ‘comunicação telefônica’ não se pode ler ‘também’ registros telefônicos. O § 1º, do art. 6º (No caso de a diligência possibilitar a gravação...), dentre outros dispositivos, leva a conclusão de que somente a comunicação pode ser interceptada. É uma lei que cuidou das ‘comunicações’ atuais, presentes). Não alcança, portanto, os registros telefônicos que são ‘dados’ (relacionados com comunicações telefônicas passadas, pretéritas).
De forma divergente, retira-se da doutrina de Vicente Greco
Filho, onde assevera que deve ser aplicada a lei 9.296/96 para a quebra de sigilo de
dados telefônicos, existentes nas concessionárias de serviços públicos, quais sejam,
a lista de chamadas interurbanas, os números chamados para celulares, etc232.
229 GOMES Luiz Flávio; CERVINI, Raúl. Interceptação telefônica : lei 9.296, de 24.07.96. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1997, p. 101. 230 GOMES Luiz Flávio; CERVINI, Raúl. Interceptação telefônica : lei 9.296, de 24.07.96. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1997, p. 101. 231 GOMES Luiz Flávio; CERVINI, Raúl. Interceptação telefônica : lei 9.296, de 24.07.96. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1997, p. 103 232 GRECO FILHO, Vicente, Interceptação telefônica (Considerações sobre a lei nº 9.296, de 24 de julho de 1996. São Paulo: Saraiva, 1996, p. 6.
68
3.6 ANÁLISE DA LEI 9.296/96
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
preservou o sigilo das comunicações telefônicas, entre outros direitos individuais,
esse mesmo Texto Constitucional ressalvou que a violação desse sigilo somente
poderá ocorrer nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer, por ordem judicial,
para fins de investigação criminal ou instrução processual.
Para melhor entendimento do assunto, se faz necessário o
comentário do texto normativo da Lei 9.296/96233, a qual regulamentou o inciso XII,
parte final, do art. 5º da CRFB/88.
3.6.1 A (In) constitucionalidade do parágrafo único do art. 1º da lei 9.296/96
Art. 1º A interceptação de comunicações telefônicas, de qualquer natureza, para prova em investigação criminal e em instrução processual penal, observará o disposto nesta Lei e dependerá de ordem do juiz competente da ação principal, sob segredo de justiça.
Parágrafo único. O disposto nesta Lei aplica-se à interceptação do
fluxo de comunicações em sistemas de informática e telemática.
O citado artigo apresenta de imediato, um impasse
interpretativo referente à abrangência que o legislador ordinário quis dar ao referir-se
às interceptações telefônicas, de qualquer natureza, ou não.
Gomes e Cervini234 afirmam que:
O texto legal (art. 1º, sob análise) refere-se tanto à interceptação propriamente dita (em sentido estrito) como à escuta telefônica. Ambas estão contempladas na lei. [...] Não é porque um dos
233 BRASIL. Lei n. 9.296, de 24 de julho de 1996, Regulamenta o Inc. XII, parte final, do art. 5º da Constituição Federal. Lex : Vade Mecum Acadêmico de Direito. 4 ed. São Paulo: Rideel, 2007. 234 GOMES Luiz Flávio; CERVINI, Raúl. Interceptação telefônica : lei 9.296, de 24.07.96. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1997, p. 96.
69
comunicadores sabe da ingerência alheia autorizada judicialmente
que a lei deixa de ter influência.
Posicionando-se em sentido contrário, adverte Vicente Greco
Filho, que a lei não disciplina a interceptação telefônica com o consentimento de um
dos interlocutores (escuta), pois, a gravação clandestina, a gravação ambiental,
como também a interceptação consentida por um dos interlocutores, não podem ser
regulamentadas no âmbito do inciso XII do art. 5º da Constituição da República
Federativa do Brasil de 1988235.
Sobre o assunto, corrobora Luiz Francisco Torquato Avólio,
que o legislador ordinário se limitou a tratar da interceptação telefônica scricto sensu
(sentido estrito), ignorando a modalidade escuta telefônica. Contudo, o juiz pode
autorizar a escuta com base no princípio da proporcionalidade, independentemente
da previsão legal236.
Ainda, em conformidade com o caput do referido artigo, tal
interceptação dependerá de ordem do juiz competente da ação principal. Tendo
somente o juiz da área criminal competência para deferir o pedido de interceptação,
sendo vedado ao juiz civil tomar tal providência, eis que a prova a ser produzida
servirá à investigação criminal ou a instrução processual penal237.
Concernente ao parágrafo único, questiona-se sua
constitucionalidade ou inconstitucionalidade, quando o legislador, na Constituição da
República Federativa do Brasil de 1988, art. 5º, inciso XII, utilizou a expressão “no
último caso”, referindo-se ao alcance e aplicabilidade específico do mencionado
dispositivo, que manda aplicar a citada lei à interceptação do fluxo de comunicações
em sistemas de informática e telemática238.
235 GRECO FILHO, Vicente, Interceptação telefônica (Considerações sobre a lei nº 9.296, de 24 de julho de 1996. São Paulo: Saraiva, 1996, p. 6. 236 GRECO FILHO, Vicente, Interceptação telefônica (Considerações sobre a lei nº 9.296, de 24 de julho de 1996. São Paulo: Saraiva, 1996, p. 6. 237 PARIZZOTO, João Roberto. Comentários à lei nº 9.296, de 24-07-96 . Interceptação de comunicações telefônicas. São Paulo: Editora de direito Ltda, 1996, p. 16. 238 GOMES Luiz Flávio; CERVINI, Raúl. Interceptação telefônica : lei 9.296, de 24.07.96. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1997, p. 164.
70
A primeira dificuldade que apresenta o dispositivo é com
relação à exata abrangência da palavra telemática. Pois, trazendo seu conceito
Gomes e Cervini afirmam que é a ciência que trata da transmissão e manipulação
de dados, imagens, escritos e informações por meio do uso combinado da
informática (do computador) com as várias formas de telecomunicação239.
Aduzem, ainda, que qualquer comunicação está sujeita à
interceptação, não importando se seu conteúdo estiver em forma de som, imagem,
dado; não importa se a comunicação está conjugada ou não com a informática, não
interessa se é via internet, resumem que qualquer tipo de comunicação está
abrangida pela lei240.
Ao entendimento de inconstitucionalidade, posiciona-se Vicente
Greco Filho241, onde afirma que o termo “comunicação telefônica”, deve ser
interpretado em sentido estrito, aduzindo que:
[...] não poderia estender a possibilidade de interceptação do fluxo de comunicações em sistemas de informática e telemática. Não se trata, aqui, de se aventar a possível conveniência de se fazer interceptação nesses sistemas, mas trata-se de interpretar a Constituição e os
limites por ela estabelecidos à quebra do sigilo.
3.6.2 Casos de admissibilidade da interceptação
Art. 2° Não será admitida a interceptação de comuni cações telefônicas quando ocorrer qualquer das seguintes hipóteses:
I - não houver indícios razoáveis da autoria ou participação em infração penal;
II - a prova puder ser feita por outros meios disponíveis;
III - o fato investigado constituir infração penal punida, no máximo, com pena de detenção.
239 GOMES Luiz Flávio; CERVINI, Raúl. Interceptação telefônica : lei 9.296, de 24.07.96. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1997, p. 165. 240 GOMES Luiz Flávio; CERVINI, Raúl. Interceptação telefônica : lei 9.296, de 24.07.96. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1997, p. 114. 241 GRECO FILHO, Vicente, Interceptação telefônica (Considerações sobre a lei nº 9.296, de 24 de julho de 1996. São Paulo: Saraiva, 1996, p. 12/13.
71
Parágrafo único. Em qualquer hipótese deve ser descrita com clareza a situação objeto da investigação, inclusive com a indicação e qualificação dos investigados, salvo impossibilidade manifesta,
devidamente justificada.
O referido artigo recebeu por parte do legislador, uma redação
de inadmissibilidade, considerada na doutrina como redação negativa, ou seja,
enumera os casos em que não será admitida a interceptação, em vez de indicar
taxativamente os casos em que será possível242.
Em virtude da interceptação das comunicações afrontarem à
intimidade, embora tendo o Estado o direito de obter provas para demonstrar a
existência de um ilícito penal, a interpretação dá-se no sentido de não ser admitida
quando não houver indícios razoáveis da autoria ou participação em infração
penal243.
A segunda situação, ou seja, a de que a prova possa ser feita
por outros meios disponíveis. Tal exceção se tem que a interceptação é uma medida
de exceção, que só se realizará quando for impossível a colheita por outro meio,
desde que lícita, eis que a própria CRFB/88, proíbe as provas obtidas por meios
ilícitos.
Observa-se que a lei ora em comento, traz uma grande
margem de subjetividade para o juiz no tocante a razoabilidade dos “indícios” e da
“existência de outros meios” da colheita da prova244.
Adverte Vicente Greco Filho245 :
Diferente é a segunda situação, ou seja, a de que a prova possa ser feita por outros meios disponíveis. Além do aspecto subjetivo que a idéia encerra, o ‘não estar disponível’ pode significar, na verdade, estar oculta (inconscientemente ou propositadamente) ou,
242 GRECO FILHO, Vicente, Interceptação telefônica (Considerações sobre a lei nº 9.296, de 24 de julho de 1996. São Paulo: Saraiva, 1996, 13/14. 243 PARIZZATO, João Roberto. Comentários à lei nº 9.296, de 24-07-96 . Interceptação de comunicações telefônicas. São Paulo: Editora de direito Ltda, 1996, p. 20. 244 GRECO FILHO, Vicente, Interceptação telefônica (Considerações sobre a lei nº 9.296, de 24 de julho de 1996. São Paulo: Saraiva, 1996, p. 17. 245 GRECO FILHO, Vicente, Interceptação telefônica (Considerações sobre a lei nº 9.296, de 24 de julho de 1996. São Paulo: Saraiva, 1996, p. 17.
72
simplesmente, não haver interesse de se investigar por outro meio [...] logo deve-se entender que os meios disponíveis são os
existentes no momento em que é solicitada a interceptação.
Arrematam Gomes e Cervini, aduzindo que somente poderá
ser autorizada a interceptação telefônica, quando a prova não puder ser feita por
outros meios disponíveis, com o alcance do mesmo resultado menos drástico e
devassador que a interceptação246.
A terceira situação verifica-se que cuidou o legislador de não
permitir a prática nos fatos de menor gravidade, reservando aos crimes apenados
somente com reclusão. Portanto, onde não se comina pena de detenção, se admitirá
a interceptação telefônica tendentes à prova em instrução criminal e em instrução
processual penal247.
Vicente Greco filho, considera a redação utilizada
excessivamente permissiva, pois alguns delitos, muito embora sejam punidos com
pena de reclusão, não justificam o emprego da interceptação, tendo em vista a
necessidade de ponderar os bens jurídicos envolvidos; não se pode sacrificar o bem
jurídico da magnitude do sigilo das comunicações telefônicas em que não estejam
envolvidos bens jurídicos de maior valor248.
Quanto ao parágrafo único do art. 2º, da lei em comento, diz-se
da necessidade de descrever o objeto da investigação com clareza, devendo ser
feita por quem requereu ao juiz, ou seja, a autoridade policial ou o Ministério Público,
com isso, demonstrando os elementos de convicção para o juiz, para que o mesmo
analise as circunstâncias fáticas do caso, para deferir ou não, tal autorização249.
246 GOMES Luiz Flávio; CERVINI, Raúl. Interceptação telefônica : lei 9.296, de 24.07.96. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1997. 247 PARIZZATO, João Roberto. Comentários à lei nº 9.296, de 24-07-96 . Interceptação de comunicações telefônicas. São Paulo: Editora de direito Ltda, 1996, p. 22/23. 248 GRECO FILHO, Vicente, Interceptação telefônica (Considerações sobre a lei nº 9.296, de 24 de julho de 1996. São Paulo: Saraiva, 1996, p. 15. 249 PARIZZATO, João Roberto. Comentários à lei nº 9.296, de 24-07-96 . Interceptação de comunicações telefônicas. São Paulo: Editora de direito Ltda, 1996, p. 35.
73
3.6.3 Iniciativa do pedido de interceptação
Art. 3° A interceptação das comunicações telefônica s poderá ser determinada pelo juiz, de ofício ou a requerimento:
I - da autoridade policial, na investigação criminal;
II - do representante do Ministério Público, na investigação criminal e na instrução processual penal.
Neste artigo, trata-se das pessoas legitimadas a requerer a
interceptação das comunicações telefônicas.
Leciona Vicente Greco Filho250 que “A interceptação, portanto,
pode ser tanto antecedente ao processo penal quanto incidental, depois daquele
instaurado”.
Afirma ainda, o referido autor que em qualquer caso, tanto na
determinação de ofício quanto a requerimento, deverá ser descrita com clareza a
situação objeto da investigação, inclusive com a identificação e qualificação dos
investigados, salvo impossibilidade manifesta, devidamente justificada251.
Neste sentido, comenta João Roberto Parizatto252:
O juiz só poderá determinar ex officio a interceptação das comunicações telefônicas, durante o curso da instrução processual, pois no caso de investigação criminal, tal providência deverá ser requerida pela autoridade policial ou pelo Órgão do Ministério Público, presumindo-se que o juiz não tem conhecimento das atividades policiais e se fosse necessária à comunicação da autoridade para que o juiz determinasse tal meio de prova, à evidência, caberia à própria autoridade requere-la.
250 GRECO FILHO, Vicente, Interceptação telefônica (Considerações sobre a lei nº 9.296, de 24 de julho de 1996. São Paulo: Saraiva, 1996, p. 29. 251 GRECO FILHO, Vicente, Interceptação telefônica (Considerações sobre a lei nº 9.296, de 24 de julho de 1996. São Paulo: Saraiva, 1996, p. 29. 252 PARIZATTO, João Roberto. Comentários à lei nº 9.296, de 24-07-96 . Interceptação de comunicações telefônicas. São Paulo: Editora de direito Ltda, 1996, p. 37.
74
3.6.4 A inequívoca demonstração da necessidade da i nterceptação
Art. 4° O pedido de interceptação de comunicação telefôn ica conterá
a demonstração de que a sua realização é necessária à apuração de infração penal, com indicação dos meios a serem empregados.
§ 1° Excepcionalmente, o juiz poderá admitir que o pedido seja formulado verbalmente, desde que estejam presentes os pressupostos que autorizem a interceptação, caso em que a concessão será condicionada à sua redução a termo.
§ 2° O juiz, no prazo máximo de vinte e quatro hora s, decidirá sobre o pedido.
A medida somente poderá ser reputada indispensável quando
não haja outros meios de se provar o fato delituoso, é preciso elencar os meios que
serão empregados na interceptação, evidenciar o motivo da escolha, o
funcionamento do equipamento, fazer menção se houve a requisição de serviços
técnicos especializados às concessionárias de serviço público, como também
mencionar o procedimento253.
Luiz Francisco Torquato Avólio afirma que, embora em regra o
pedido deva ser feito por escrito, em casos excepcionais o juiz admitirá o pedido
verbal, embora condicionando sua concessão à redução a termo. Por exemplo,
somente com relação a uma escuta telefônica nos casos de seqüestros justificaria o
pedido verbal254.
Quanto ao prazo para o magistrado pronunciar-se a respeito do
pedido de interceptação é de vinte e quatro horas, em virtude do caráter urgente que
reveste a diligência. Tal prazo, entretanto é impróprio, sem conseqüências
processuais, caso seja descumprido. Este prazo terá início na data do termo de
conclusão dos autos do incidente de interceptação ao juiz255.
253 PARIZATTO, João Roberto. Comentários à lei nº 9.296, de 24-07-96 . Interceptação de comunicações telefônicas. São Paulo: Editora de direito Ltda, 1996, p. 41. 254 AVOLIO, Luiz Francisco Torquato. Provas ilícitas : Interceptações telefônicas, ambientais e gravações clandestinas. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2003, p. 188. 255 PARIZATTO, João Roberto. Comentários à lei nº 9.296, de 24-07-96 . Interceptação de comunicações telefônicas. São Paulo: Editora de direito Ltda, 1996, p. 43.
75
3.6.5 Fundamentação, diligência e prazo
Art. 5° A decisão será fundamentada, sob pena de nu lidade, indicando também a forma de execução da diligência, que não poderá exceder o prazo de quinze dias, renovável por igual tempo uma vez comprovada a indispensabilidade do meio de prova.
Exige o dispositivo em comento, que a decisão que deferi ou
não a medida cautelar deverá ser fundamentada, como em todas as decisões
judiciais, por força do princípio inscrito no art. 93, IX, CRFB/88256, sob pena de
nulidade257.
A decisão deverá indicar a forma de execução da diligência,
podendo o juiz acatar aquela indicada pela autoridade policial ou pelo Órgão
Ministerial, ou determinar outra forma para a realização do procedimento258.
O lapso temporal começa a contar do dia em que se tem o
início da interceptação, incluindo o dia do começo.
O cumprimento da decisão judicial será de até 15 dias,
podendo ser renovada por igual tempo apenas uma vez, ou seja, no limite total de
30 dias, contudo, é superveniente uma crítica a tal limitação, pois permanecendo os
pressupostos para a concessão da medida, esta poderia ser renovada por igual
período, pois nos crimes de lavagem de dinheiro ou tráfico de entorpecentes, pode
ser praticado o ato ilícito por meses, o qual requer operações sucessivas259.
256 Art. 93 [...] IX CRFB/88 “todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em caso nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação. Brasil Constituição da República Federativa do Brasil , de 05 de outubro de 1988. Lex: Vade Mecum Acadêmico de Direito. 4 ed. São Paulo: Rideel, 2007. 257 AVOLIO, Luiz Francisco Torquato. Provas ilícitas : Interceptações telefônicas, ambientais e gravações clandestinas. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2003, p. 188. 258 PARIZATTO, João Roberto. Comentários à lei nº 9.296, de 24-07-96 . Interceptação de comunicações telefônicas. São Paulo: Editora de direito Ltda, 1996, 44/45. 259 AVOLIO, Luiz Francisco Torquato. Provas ilícitas : Interceptações telefônicas, ambientais e gravações clandestinas. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2003, p. 188/189.
76
De forma divergente entende Vicente Greco Filho260, aduzindo
que: “A lei não limita o número de prorrogações possíveis, devendo entender-se,
então, que serão tantas quantas necessárias à investigação, mesmo porque 30 dias
pode ser prazo muito exíguo”.
Seguindo este entendimento, corrobora João Roberto
Parizatto261:
“O pedido de prorrogação deverá ser feito antes de esgotar o prazo inicial de quinze (15) dias, concedidos inicialmente para a diligência, pelo que não se admitirá a prova obtida após tal decurso, sem que tenha havido pronunciamento judiciário, autorizando a respectiva prorrogação”.
As interceptações telefônicas prolongadas por muito tempo,
tornaram-se práticas reiteradas, extrapolando o princípio da razoabilidade. Em
alguns casos, não encontrando prova, no tempo determinado na lei, a autoridade
policial reitera o pedido, até que possa comprovar a veracidade dos fatos, por isso
recentemente o Superior Tribunal de Justiça assim decidiu:
A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) anulou quase dois anos de interceptações telefônicas no curso de investigações feitas pela Polícia Federal contra o Grupo Sundown, do Paraná. A decisão é inédita no STJ. Até então, o Tribunal tinha apenas precedentes segundo os quais é possível prorrogar a interceptação tantas vezes quantas forem necessárias, desde que fundamentadas262.
Após esta decisão foi aprovado pela Comissão de Constituição,
Justiça e Cidadania Projeto de Lei do Senado nº 525, de 2007, aumentando o prazo
para 60 dias. Conforme dispõe no seu art. 4º:
art. 4º [...]
260 GRECO FILHO, Vicente, Interceptação telefônica (Considerações sobre a lei nº 9.296, de 24 de julho de 1996. São Paulo: Saraiva, 1996, p. 31. 261 PARIZATTO, João Roberto. Comentários à lei nº 9.296, de 24-07-96 . Interceptação de comunicações telefônicas. São Paulo: Editora de direito Ltda, 1996, 45. 262 BRASIL. STJ – Sexta Turma. HC 76.686. Rel. Min. Nilson Naves, decisão em 09.09.08, pendente de publicação.
77
§ 1º O prazo de duração da quebra do sigilo das comunicações não
poderá exceder a 60 (sessenta) dias, permitida sua prorrogação por
igual período, desde que continuem presentes os pressupostos
autorizadores da medida, até o máximo de 360 (trezentos e
sessenta) dias ininterruptos, salvo quando se tratar de crime
permanente, enquanto não cessar a permanência.
3.6.6 Deferimento, procedimento policial e opção de acompanhamento pelo
Ministério Público
Art. 6° Deferido o pedido, a autoridade policial co nduzirá os procedimentos de interceptação, dando ciência ao Ministério Público, que poderá acompanhar a sua realização.
§ 1° No caso de a diligência possibilitar a gravaçã o da comunicação interceptada, será determinada a sua transcrição.
§ 2° Cumprida a diligência, a autoridade policial e ncaminhará o resultado da interceptação ao juiz, acompanhado de auto circunstanciado, que deverá conter o resumo das operações realizadas.
§ 3° Recebidos esses elementos, o juiz determinará a providência do art. 8° , ciente o Ministério Público.
Sendo autorizada a interceptação, a autoridade policial
comunicará o representante do Ministério Público, do início, para que o mesmo
acompanhe, querendo a diligência. Sendo, portanto seu acompanhamento
facultativo263.
Consoante o § 1º do art. 6º da lei em comento, no caso da
diligência possibilitar a gravação da comunicação interceptada, será determinada a
263 PARIZATTO, João Roberto. Comentários à lei nº 9.296, de 24-07-96 . Interceptação de comunicações telefônicas. São Paulo: Editora de direito Ltda, 1996, p. 47.
78
sua transcrição (degravação), sem prejuízo de ser preservada e autenticada a fita
original, para que a mesma possa ser entendida e possa ir para os autos264.
Neste sentido, leciona João Roberto Parizatto265:
Cumprida a diligência, cumprirá à autoridade policial determinar à sua transcrição, encaminhando-a ao juiz competente, acompanhado de laudo circunstanciado, ou seja, específico acerca das diligências realizadas, a forma de sua realização, o período, a data da interceptação, a data da gravação, enfim, esclarecendo ao juiz, por escrito, o que fora realizado e a forma utilizada para tanto, para que o juiz, em momento oportuno, possa apreciar a prova produzida, no contexto probatório constante nos autos, servindo ou não de alicerce para sua convicção e decisão.
Lembra ainda, o referido doutrinador que a prova não é
absoluta, pois o juiz é livre na apreciação das provas presentes nos autos, podendo
ou não acatá-la, devendo, pois fundamentar sua decisão266.
Art. 7° Para os procedimentos de interceptação de q ue trata esta Lei, a autoridade policial poderá requisitar serviços e técnicos especializados às concessionárias de serviço público.
A autoridade policial não irá realizar por si mesmo a
interceptação de comunicação telefônica, assim requisitando serviços e técnicos
especializados às concessionárias de serviços públicos, devendo ser feito por
escrito ao chefe da repartição competente, impondo-se o sigilo da interceptação
pretendida267.
Lembra ainda, o referido doutrinador que tal requisição a
concessionária não poderá ser negado, muito menos cobrado, em virtude das
264 GRECO FILHO, Vicente, Interceptação telefônica (Considerações sobre a lei nº 9.296, de 24 de julho de 1996. São Paulo: Saraiva, 1996, p. 33. 265 PARIZATTO, João Roberto. Comentários à lei nº 9.296, de 24-07-96 . Interceptação de comunicações telefônicas. São Paulo: Editora de direito Ltda, 1996, 49/50. 266 PARIZATTO, João Roberto. Comentários à lei nº 9.296, de 24-07-96 . Interceptação de comunicações telefônicas. São Paulo: Editora de direito Ltda, 1996, p. 50. 267 PARIZATTO, João Roberto. Comentários à lei nº 9.296, de 24-07-96 . Interceptação de comunicações telefônicas. São Paulo: Editora de direito Ltda, 1996, p. 52.
79
concessionárias de serviços públicos funcionarem mediante concessão dada pela
União268.
Assevera Luiz Francisco Torquato Avólio269 que:
A amplitude do dispositivo é vasta, podendo a autoridade policial, tanto na fase do requerimento quanto na de execução da interceptação telefônica requisitar das concessionárias não apenas os serviços, mas a orientação técnica necessária. Havendo requisição, a concessionária de Serviço Público, segundo a doutrina,
não pode eximir-se de seu cumprimento.
3.6.7 Sigilo das diligências, autos apartados, ampl a defesa e contraditório
Art. 8° A interceptação de comunicação telefônica, de qualquer natureza, ocorrerá em autos apartados, apensados aos autos do inquérito policial ou do processo criminal, preservando-se o sigilo das diligências, gravações e transcrições respectivas.
Parágrafo único. A apensação somente poderá ser realizada imediatamente antes do relatório da autoridade, quando se tratar de inquérito policial (Código de Processo Penal, art.10, § 1°) ou na conclusão do processo ao juiz para o despacho decorrente do disposto nos arts. 407, 502 ou 538 do Código de Processo Penal (sic).
A razão para a autuação em apartado da interceptação
telefônica, consiste em preservar o sigilo do que foi colhido e a sua forma de
aquisição. Diante disso, o parágrafo único estabeleceu o momento do apensamento
dos autos apartados aos do processo principal, (inquérito ou processo penal)270.
Salienta-se que logo após o apensamento, deverá o juiz dar
conhecimento da medida cautelar as partes e seus advogados, sob pena de violar
os princípios do contraditório e ampla defesa, pois a jurisprudência é pacífica no
268 PARIZATTO, João Roberto. Comentários à lei nº 9.296, de 24-07-96 . Interceptação de comunicações telefônicas. São Paulo: Editora de direito Ltda, 1996, p. 52. 269 AVOLIO, Luiz Francisco Torquato. Provas ilícitas : Interceptações telefônicas, ambientais e gravações clandestinas. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2003, p.191/192. 270 AVOLIO, Luiz Francisco Torquato. Provas ilícitas : Interceptações telefônicas, ambientais e gravações clandestinas. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2003, p. 192.
80
tocante a nulidade da decisão que não observou a manifestação das partes
referente as provas acrescidas271.
3.6.8 Incidente de inutilidade de gravações na inte rceptação
Art. 9° A gravação que não interessar à prova será inutilizada por decisão judicial, durante o inquérito, a instrução processual ou após esta, em virtude de requerimento do Ministério Público ou da parte interessada.
Parágrafo único. O incidente de inutilização será assistido pelo Ministério Público, sendo facultada a presença do acusado ou de seu representante legal.
O objetivo da interceptação da comunicação telefônica é a
gravação, em seguida sua transcrição (degravação), para que sirvam como meio de
prova na investigação criminal ou na instrução processual penal. Entretanto, quando
esta não for significante ou não servir como prova, poderá ser inutilizada, destruída,
necessitando, portanto decisão judicial devidamente fundamentada272.
A inutilizarão, destruição poderá ser realizada durante o
inquérito, a instrução processual ou após esta, dependendo do momento em que
essa se realizar273.
Conforme João Roberto Parizatto274:
A presença do acusado ou de seu representante legal, é facultativa, devendo, contudo, ser esse cientificado do dia e hora em que será realizada tal inutilização, que deverá contar com a presença do juiz, devendo se lavrar um auto de tal providência, que ficará juntado no
pedido de interceptação.
271 AVOLIO, Luiz Francisco Torquato. Provas ilícitas : Interceptações telefônicas, ambientais e gravações clandestinas. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2003, p. 193. 272 PARIZATTO, João Roberto. Comentários à lei nº 9.296, de 24-07-96 . Interceptação de comunicações telefônicas. São Paulo: Editora de direito Ltda, 1996, p. 59. 273 PARIZATTO, João Roberto. Comentários à lei nº 9.296, de 24-07-96 . Interceptação de comunicações telefônicas. São Paulo: Editora de direito Ltda, 1996, p. 59. 274 PARIZATTO, João Roberto. Comentários à lei nº 9.296, de 24-07-96 . Interceptação de comunicações telefônicas. São Paulo: Editora de direito Ltda, 1996, p. 60.
81
3.6.9 Crimes previstos no art. 10 da lei 9.296/96
Art. 10. Constitui crime realizar interceptação de comunicações telefônicas, de informática ou telemática, ou quebrar segredo da Justiça, sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei.
Pena: reclusão, de dois a quatro anos, e multa.
Com o objetivo de proteger o bem jurídico, quais sejam, a
intimidade e a vida privada, o legislador não deixou de incriminar a conduta que
venha a violar esse direito fundamental.
Entretanto neste artigo, a lei comina a pena de dois a quatro
anos de reclusão a quem realizar a interceptação, ou quebrar o sigilo do segredo de
justiça, sem a competente autorização judicial275.
Note-se que são dois os crimes, a interceptação e a quebra do
segredo de justiça.
Conforme aduz Luiz Francisco Torquato Avólio276:
A redação legal é deficiente ao dispor, alternativamente, que constitui crime praticar interceptação telefônica ‘sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei’, devendo ser entendida, para fazer sentido, que tanto a autorização do juiz como o preenchimento dos requisitos legais são indispensáveis.
Os artigos onze e doze tratam da entrada em vigor deste
diploma e da sua revogação das disposições contrárias ao seu texto.
Art. 11. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 12. Revogam-se as disposições em contrário.
275 AVOLIO, Luiz Francisco Torquato. Provas ilícitas : Interceptações telefônicas, ambientais e gravações clandestinas. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2003, p. 195. 276 AVOLIO, Luiz Francisco Torquato. Provas ilícitas : Interceptações telefônicas, ambientais e gravações clandestinas. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2003, p. 195.
82
3.7 A INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA NA ATUALIDADE
Como visto anteriormente, a lei 9.296/96, regulariza o uso racional das interceptações para servirem como meio de prova na investigação criminal e instrução processual penal, mas o que vem acontecendo atualmente, como se pode perceber e assistir, nos noticiários, está havendo uma vulgarização quanto ao seu uso, muitas têm sido deferidas como primeiro recurso na investigação dos fatos, o que contraria sua previsão legal277.
Os direitos e garantias fundamentais estão sendo violados, principalmente o direito à liberdade, à intimidade e a privacidade, em nome do combate a corrupção, para transformar-se em rotina institucional que não poupa ninguém278.
3.7.1 A INTERCEPTAÇÃO E A COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUÉRITO (CPI)
A questão recebeu notoriedade após a divulgação da escuta clandestina de um diálogo havido entre o Presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Gilmar Mendes com o senador, Demóstenes Torres, do DEM de Goiás279.
O gabinete do Presidente do Supremo Tribunal Federal foi alvo de monitoramento criminoso, espiões instalados do lado de fora do tribunal, usaram equipamentos para tentar interceptar as conversar ali realizadas280.
A descoberta da escuta deu-se no dia 10 de julho de 2008, um dia após o ministro ter concedido o primeiro habeas corpus libertando da prisão o banqueiro Daniel Dantas, detido pela Polícia Federal (operação Satiagraha). A varredura acusou a presença de sinais eletromagnéticos de espionagem eletrônica. As conversas realizadas naquele local eram captadas e transmitidas para o lado de fora do STF281.
277
Boletim IBCCRIM. Periódico 34 Direito PER. V. 16, n.191, out. 2008. p. 1 278
ESCOSTEGUY, Diego e Policarpo Júnior, Veja, De olho em nós . V.41, n.32, abril, 13 agosto 2008. p. 56. 279
Boletim IBCCRIM. Periódico 34 Direito PER. V. 16, n.191, out. 2008. p. 1 280 ESCOSTEGUY, Diego e Policarpo Júnior, Veja, De olho em nós . V.41, n.32, abril, 13 agosto 2008. p. 56. 281 ESCOSTEGUY, Diego e Policarpo Júnior, Veja, De olho em nós . V.41, n.32, abril, 13 agosto 2008. p. 56.
83
Os peritos afirmam não terem dúvidas que o ministro Gilmar Mendes foi vítima de escuta telefônica e um ‘provável monitoramento’282.
A vice-presidente do Tribunal Regional Federal de São Paulo, desembargadora Suzana Camargo, confidenciou ao ministro ter ouvido do juiz Fausto de Sanctis, a informação de que a Polícia Federal com a ajuda da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), haviam monitorado seu gabinete283.
Agentes ligados a Abin repassaram à revista Veja relatos de que os espiões a serviço da agência, grampeavam sem autorização judicial conversas telefônicas de várias autoridades de Brasília, e que os grampos chegavam em CDs, posteriormente transcritos e transformados em relatórios, cuja prova era o diálogo do ministro Gilmar Mendes com o senador Demóstenes Torres284.
Diante disso, foi instalado uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), tendo como presidente o deputado Marcelo Itagiba (PMDB-RJ), para apurar o caso, o qual vem deixando cada vez mais evidente o avanço do estado policial sobre o estado de direito. Descobriu-se um instrumento poderoso de invasão de privacidade ativado com a concordância da justiça e cedido a polícia, tratando-se de uma senha que permite o acesso aos registros telefônicos de qualquer cidadão do país. “Isso mesmo: de qualquer um285”.
Note-se que a operação da Polícia Federal, comandada pelo delegado Protógenes Queiroz, a qual foi apresentada em julho ao país, denominada “Satiagraha”, cuja terminologia em sânscrito significa ‘busca da verdade’ ou ‘insistir pela verdade’, não faz jus ao nome, tendo em vista tamanhas armações, encrencas e contradições, prestadas pelos integrantes na CPI286.
282 ESCOSTEGUY, Diego e Policarpo Júnior, Veja, De olho em nós . V.41, n.32, abril, 13 agosto 2008. p. 56. 283 EXPEDITO FILHO; ESCOSTEGUI, Diego. Veja, O ministro grampeado também foi vigiado .
V.41, n.38, abril, 24 set. 2008. p. 63.
284 EXPEDITO FILHO; POLICARPO JUNIOR. Veja, A abin manuseou escutas telefônicas . v.41,
n.39, abril, 1 out. 2008. p. 105. 285 ESCOSTEGUY, Diego e Policarpo Júnior, Veja, De olho em nós . V.41, n.32, abril, 13 agosto 2008. p. 64. 286
PEDROSA, Mino e Hugo Marques, A sombra ameaçadora da Abin . Isto é. V. 31, n. 2038, 17/9/2008, p. 41.
84
3.7.2 Projeto de Lei do Senado nº 525, de 2007
A imprensa divulgou no início de 2007, informações prestadas pelas empresas operadoras de telefonia, que foram realizadas aproximadamente 409 mil interceptações telefônicas, salientando que esse número é bem maior, em virtude das escutas clandestinas287.
Como também, frente ao caos vivenciado pela mais alta corte brasileira, está tramitando no Congresso um projeto de lei de autoria do senador Jarbas Vasconcelos, que altera o tratamento legal dado as interceptações telefônicas (Projeto de Lei do Senado n. 525, de 2007), tendo como escopo controlar tamanha medida desenfreada a qual estão expostos os cidadãos brasileiros, com vistas a estabelecer novas condições para o procedimento de interceptação telefônica, informática e telemática, além de outras providências.
Embora assevera Helena Regina Lobo da Costa288com toda propriedade:
Não é preciso, portanto, aguardar qualquer mudança legislativa. Basta compreender e aplicar a Lei n. 9.296/96 em consonância com seu próprio texto e com a Constituição, tratando as interceptações telefônicas não como ‘rainha das provas’, mas como limitação a direito fundamental, cuja interpretação tem sempre de ser restrita.
Após visto a previsão legal da interceptação telefônica na
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, bem como analisados os
artigos da lei 9.296/96, e sua possível reestruturação, passar-se-á, por fim a
conclusão.
287
COSTA, Helena Regina Lobo. Boletim IBCCRIM. Breves notas sobre o uso abusivo das interceptações telefônicas . Ano 16, n.186, maio de 2008. p. 2. 288
COSTA, Helena Regina Lobo. Boletim IBCCRIM. Breves notas sobre o uso abusivo das interceptações telefônicas. Ano 16, n.186, maio de 2008. p. 2.
85
CONCLUSÃO
A presente pesquisa teve como análise a (in) admissibilidade
das provas ilícitas no processo penal: quanto às interceptações telefônicas, cujo
tema constitui-se devido vivenciarmos um cenário nacional envolvido por um mar de
escândalos políticos e diversas situações que colocam em dúvida a ideologia e os
meios de atuação do sistema de justiça criminal.
Para tal, analisou-se, primeiramente, a teoria geral da prova no
Processo Penal, cujo desconhecimento levaria a não compreensão ideal do cerne
do tema abordado.
Assim, verificou-se que a atividade probatória possui
importância fundamental no processo, pois é através dela que o juiz se convence da
existência ou não dos fatos, da veracidade ou não das alegações, proferindo sua
decisão frente às provas presentes nos autos, devendo ainda fundamentar sua
decisão, consoante dispositivo constitucional, onde todas as decisões judiciais
precisam ser fundamentadas, sob pena de nulidade. (art. 93, inciso, IX da
CRFB/88).
Destarte, as provas possuem extrema relevância para a
motivação do Juiz, pois as decisões exaradas são nelas embasadas. Não há como
condenar alguém num processo carecedor de elementos probatórios.
Apesar de o Processo Penal ter por objetivo a busca da
verdade real, buscando a reconstituição dos fatos ocorridos historicamente,
necessário se faz o estabelecimento de regras delimitando essa atividade
probatória, pois a falta destas, as partes ficariam sujeitas ao livre arbítrio e ao
desrespeito das garantias constitucionais.
Entretanto, nesse contexto, revela-se a importância do instituto
de prova ilícita, uma vez que no Brasil ela é vedada pelo artigo 5º, LVI, da
Constituição Federal de 1988 in verbis “são inadmissíveis no processo, as provas
obtidas por meios ilícitos”.
86
A prova ilícita, em regra, deve ser rechaçada, pois caso
contrário pode-se incorrer no equívoco de ferir a segurança jurídica do ordenamento
jurídico. Considerada ilícita a prova, deverá esta ser desentranhada dos autos e não
se tem decretado a nulidade do processo que contém prova ilícita, no caso de haver
outras provas contundentes que levaram à condenação.
Primeiramente imagina-se uma conotação rígida e absoluta do
mandamento constitucional. Mas, sempre, que num caso concreto, onde haver bens
jurídicos conflitantes, e houver discussão acerca da ilicitude ou não da prova, deve-
se invocar o princípio da proporcionalidade, para que o magistrado faça um
balanceamento dos bens em questão, prevalecendo o mais relevante, eis que
nenhum princípio ou garantia constitucional é absoluto, podendo ceder para outro
com peso maior no caso concreto.
Entretanto, a doutrina e a jurisprudência brasileira, pugnam
pela necessidade de se levar em conta os bens conflitantes e que o caso concreto
seja sempre solucionado à luz do princípio da proporcionalidade.
Quanto a prova derivada, ressalta-se que o STF tem entendido
que, vigora em nosso ordenamento jurídico a regra do direito americano revelada
pela expressão fruits of the poisonous tree (frutos da árvore envenenada), ou prova
derivada, onde a regra é que não se deve admitir a validade de um elemento
probatório colhido de outro reputado ilícito, do contrário, se estaria retirando
totalmente a eficácia do comando constitucional a propósito da proibição da prova
ilícita. Pois, realmente, o veneno da planta se transmite a todos os seus frutos, que
implica a nulidade das provas subseqüentes.
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
estabeleceu, em seu artigo 5º, XII, “é inviolável o sigilo da correspondência e das
comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no
último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para
fins de investigação criminal ou instrução processual penal”.
Assim, adveio a Lei nº 9.296/96, regulamentando tal inciso,
tentando acabar com as discussões doutrinárias e jurisprudenciais acerca da
ilicitude da prova colhida mediante interceptação telefônica, trazendo vários
87
dispositivos, prevendo que para a captação ser considerada lícita, é imperativo a
integral observância dos comandos legais. Que por sinal não é o que se pode ser
visto nos jornais, noticiários e outros meios de telecomunicação.
Outro aspecto é que a interceptação telefônicas somente pode
ser autorizada para fins de investigação criminal e instrução processual penal.
Ademais, a interceptação, para ser lícita, dependerá de ordem do juiz competente da
ação principal, sendo tal providência proibida pelo juiz da área civil.
A interceptação telefônica deverá ser realizada sob segredo de
justiça e isso se justifica para que não seja prejudicada a própria finalidade da prova.
Para obter a autorização judicial é indispensável a presença de
indícios razoáveis de autoria ou participação em infração penal, não bastando a
mera suspeita. Sendo a interceptação telefônica medida cautelar, está sujeita aos
seus requisitos: fumus boni iuris e o periculum in mora.
A interceptação telefônica somente deve ser autorizada quando
a prova não puder ser realizada por outros meios disponíveis, porque consiste em
medida excepcional, de extrema necessidade, violadora da intimidade dos
interlocutores e não se justifica nos casos passíveis de outros elementos
probatórios.
Os crimes sujeitos à pena de detenção não são passíveis de
interceptação telefônica, sendo esta admitida apenas nos fatos criminosos sujeitos à
pena de reclusão. Contudo, tal comando legal é desproporcional, tendo em vista que
muitos crimes punidos com reclusão não necessitam de medida tão extrema.
A autoridade policial somente possui legitimidade para requerer
a interceptação telefônica durante a investigação criminal. Já o Ministério Público
tem dupla legitimidade, podendo pedir a medida cautelar na investigação criminal e
na instrução processual penal.
A autoridade policial deve executar os atos dentro dos limites
estabelecidos pelo juiz, sem abusos, já que, do contrário, será pronunciada a
ilicitude da prova.
88
Em contrapartida, caso a interceptação seja realizada com a
finalidade correta, porém sem a necessária autorização judicial, também incide a
norma penal sob comento. Todas essas condutas são criminosas e a prova colhida
por essas maneiras é ilícita e deve ser rejeitada pelo julgador.
Em virtude de defeitos e lacunas deixadas pelo legislador na lei
em comento, bem como, o uso abusivo e desenfreado de tal medida, está
tramitando no Congresso Nacional o Projeto de lei 525/2007, o qual tem como
objetivo disciplinar e corrigir os defeitos na legislação em vigor.
Por derradeiro, se faz necessário acrescer que as inquietações
anunciadas nesta pesquisa não sejam respostas acabadas, pois a reflexão encetada
nesta monografia no tocante a (in) admissibilidade das provas ilícitas no processo
penal: quanto às interceptações telefônicas, caminham a passos estreitos, pois
muitas irregularidades comentem-se por parte das agências de controle (Polícia,
Ministério Público e Judiciário), na busca de “culpados” para o esclarecimento de
muitos crimes que afogam o judiciário. Assim, espera-se que outros acadêmicos
dêem continuidade ao estudo do tema proposto.
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REFERÊNCIAS
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ANEXO
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TEXTO FINAL APROVADO PELA COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO, JUSTIÇA E CIDADANIA
PROJETO DE LEI DO SENADO Nº 525, DE 2007
Regulamenta a parte final do inciso XII do art. 5º da Constituição, altera o art. 581 do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941- Código de Processo Penal, e revoga a Lei nº 9.296, de 24 de julho de 1996, e dá outras providências.
O CONGRESSO NACIONAL decreta:
CAPÍTULO I
DAS DISPOSIÇÕES GERAIS
Art. 1º Esta Lei disciplina a quebra, por ordem judicial, do sigilo das comunicações telefônicas, para fins de investigação criminal ou instrução processual penal.
§ 1º O sigilo das comunicações telefônicas compreende o conteúdo de conversas, sons, dados e quaisquer outras informações transmitidas ou recebidas no curso das ligações telefônicas.
§ 2º Para os efeitos desta Lei, considera-se quebra do sigilo das comunicações telefônicas a interceptação, escuta, gravação, decodificação ou qualquer outro procedimento que permita a obtenção das informações e dados de que trata o § 1º.
§ 3º Aos registros de dados referentes à origem, destino, data e duração das ligações telefônicas aplicam-se, no que couber, as disposições desta Lei.
§ 4º As disposições desta Lei também se aplicam ao fluxo de comunicações em sistemas de tecnologia da informação e telemática.
Art. 2º A quebra do sigilo das comunicações telefônicas não será admitida na investigação criminal ou instrução processual penal de crimes de menor potencial ofensivo, assim definidos em lei, salvo quando a conduta delituosa tiver sido realizada por meio dessa modalidade de comunicação.
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Parágrafo único. Em nenhuma hipótese poderão ser utilizadas as informações resultantes da quebra de sigilo das comunicações entre o investigado ou acusado e seu defensor, quando este estiver no exercício da atividade profissional.
CAPÍTULO II
DO PROCEDIMENTO
Art. 3º O pedido de quebra de sigilo das comunicações telefônicas será formulado por escrito ao juiz competente, mediante requerimento do Ministério Público ou representação da autoridade policial, ouvido, neste caso, o Ministério Público, e deverá conter:
I - a descrição precisa dos fatos investigados;
II - a indicação da existência de indícios suficientes da prática do crime objeto da investigação;
III - a qualificação do investigado ou acusado, ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, salvo impossibilidade manifesta devidamente justificada;
IV - a demonstração de ser a quebra de sigilo da comunicação estritamente necessária e da inviabilidade de ser a prova obtida por outros meios;
V - a indicação do código de identificação do sistema de comunicação, quando conhecido, e sua relação com os fatos investigados;
VI - a indicação do nome da autoridade investigante responsável por toda a execução da medida;
VII - a indicação do número do procedimento policial ou ministerial a que esteja vinculada a solicitação.
Art. 4º O requerimento ou a representação será distribuído e autuado em separado na forma de incidente processual, sob segredo de justiça, devendo o juiz competente, no prazo máximo de 24 (vinte e quatro) horas, proferir decisão fundamentada, que consignará de forma expressa, quando deferida a autorização, a indicação:
I - dos indícios da prática do crime;
II - dos indícios de autoria ou participação no crime, salvo impossibilidade manifesta devidamente justificada;
III - do código de identificação do sistema de comunicação, quando conhecido, e sua relação com os fatos investigados;
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IV - do prazo de duração da quebra do sigilo das comunicações.
§ 1º O prazo de duração da quebra do sigilo das comunicações não poderá exceder a 60 (sessenta) dias, permitida sua prorrogação por igual período, desde que continuem presentes os pressupostos autorizadores da medida, até o máximo de 360 (trezentos e sessenta) dias ininterruptos, salvo quando se tratar de crime permanente, enquanto não cessar a permanência.
§ 2º O prazo correrá de forma contínua e ininterrupta e contar-se-á a partir da data do início da quebra do sigilo das comunicações pela prestadora responsável pela comunicação, que deverá comunicar este fato, imediatamente, por escrito, ao juiz.
§ 3º Para cada prorrogação será necessária nova decisão judicial fundamentada, observado o disposto no caput.
§ 4º Excepcionalmente, o juiz poderá admitir que o pedido seja formulado verbalmente, desde que estejam presentes os pressupostos que autorizem a interceptação, caso em que a concessão será condicionada à sua redução a termo, observadas as seguintes hipóteses:
I - quando a vida de uma pessoa estiver em risco, podendo o juiz dispensar momentaneamente um ou mais requisitos previstos no caput do art. 4º e seus incisos;
II - durante a execução da medida de quebra de sigilo, caso a autoridade policial identifique que o investigado ou acusado passou a fazer uso de outro número, código ou identificação em suas comunicações, havendo urgência justificável.
§ 5º Despachado o pedido verbal e adotadas as providências de que trata o caput do § 4º, os autos seguirão para manifestação do Ministério Público e retornarão à autoridade judiciária, que, em seguida, reapreciará o pedido.
Art. 5º Contra decisão que indeferir o pedido de quebra de sigilo caberá recurso em sentido estrito do Ministério Público, podendo o relator, em decisão fundamentada, conceder liminarmente o pedido de quebra.
Parágrafo único. O recurso em sentido estrito tramitará em segredo de justiça e será processado sem a oitiva do investigado ou acusado, a fim de resguardar a eficácia da investigação.
Art. 6º Do mandado judicial que determinar a quebra do sigilo das comunicações deverá constar a qualificação do investigado ou acusado, quando identificado, ou o código de identificação do sistema de comunicação, quando conhecido.
§ 1º O mandado judicial será expedido em 2 (duas) vias, uma para a prestadora responsável pela comunicação e outra para a autoridade que formulou o pedido de quebra do sigilo das comunicações.
§ 2º O mandado judicial poderá ser expedido por qualquer meio idôneo, inclusive o eletrônico ou similar, desde que comprovada sua autenticidade.
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Art. 7º A prestadora de serviços de telecomunicações deverá disponibilizar, gratuitamente, os recursos e meios tecnológicos necessários à quebra do sigilo telefônico, indicando ao juiz o nome do profissional encarregado.
§ 1º A ordem judicial deverá ser cumprida no prazo máximo de 24 (vinte e quatro) horas, sob pena de multa diária até o efetivo cumprimento da medida, sem prejuízo das demais sanções cabíveis.
§ 2º No caso de ocorrência de qualquer fato que possa colocar em risco a continuidade da interceptação, incluindo as solicitações do usuário quanto a portabilidade ou alteração do código de acesso, suspensão ou cancelamento do serviço e transferência da titularidade do contrato de prestação de serviço, a prestadora deve informar ao juiz no prazo máximo de 24 (vinte e quatro) horas contadas da ciência do fato, sob pena de multa diária, sem prejuízo das demais sanções cabíveis.
Art. 8º A decretação da quebra de sigilo de comunicação caberá ao juiz competente para o julgamento do crime investigado ou responsável pelo inquérito.
Art. 9º A execução das operações técnicas necessárias à quebra do sigilo das comunicações será fiscalizada diretamente pelo Ministério Público.
Art. 10. Findas as operações técnicas, a autoridade investigante encaminhará, no prazo máximo de 60 (sessenta) dias, ao juiz competente, todo o material produzido, acompanhado de auto circunstanciado, que detalhará todas as operações realizadas.
§ 1º Decorridos 60 (sessenta) dias do encaminhamento do auto circunstanciado, o juiz, ouvido o Ministério Público, determinará a inutilização do material que não interessar ao processo.
§ 2º A inutilização do material será assistida pelo Ministério Público, sendo facultada a presença do acusado ou da parte interessada, bem como de seus representantes legais.
Art. 11. Recebido o material produzido, o juiz dará ciência ao Ministério Público para que requeira, se julgar necessário, no prazo de 10 (dez) dias, diligências complementares.
Art. 12. Não havendo requerimento de diligências complementares ou após a realização das que tiverem sido requeridas, o juiz intimará o investigado ou acusado para que se manifeste, fornecendo-lhe cópia identificável do material produzido exclusivamente em relação à sua pessoa.
Art. 13. As dúvidas a respeito da autenticidade ou integridade do material produzido serão dirimidas pelo juiz, aplicando-se, no que couber, o disposto nos arts. 145 a 148 do Código de Processo Penal.
Art. 14. Conservar-se-á em cartório, sob segredo de justiça, as fitas magnéticas ou quaisquer outras formas de registro das comunicações cujo sigilo fora quebrado até
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o trânsito em julgado da sentença, quando serão destruídos na forma a ser indicada pelo juiz, de modo a preservar a intimidade dos envolvidos, observado o disposto no art. 17.
Art. 15. Na hipótese de a quebra do sigilo das comunicações telefônicas revelar indícios de crime diverso daquele para o qual a autorização foi dada e que não lhe seja conexo, a autoridade deverá remeter ao Ministério Público os documentos necessários para as providências cabíveis.
Art. 16. A prova obtida por meio da quebra de sigilo das comunicações telefônicas realizada sem a observância desta Lei não poderá ser utilizada em qualquer investigação, processo ou procedimento, seja qual for sua natureza.
Art. 17. Finda a instrução processual, dar-se-á ciência a todas as pessoas que tiveram comunicações telefônicas interceptadas, tenham ou não sido indiciadas ou denunciadas, salvo se o juiz entender, por decisão fundamentada, que a providência poderá prejudicar outras investigações.
Art. 18. A autoridade que tomar conhecimento da existência de abuso ou irregularidade no procedimento de quebra de sigilo das comunicações telefônicas remeterá ao Ministério público os documentos e as provas de que dispuser, para a apuração da responsabilidade.
CAPÍTULO III
DAS SANÇÕES PENAIS
Art. 19. Violar o sigilo de comunicação telefônica, de informática ou telemática, sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei.
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.
§ 1º Incorre nas mesmas penas quem viola o segredo de justiça decorrente do procedimento de que trata esta Lei.
§ 2º A pena é aumentada de um terço até metade se o crime previsto no caput ou no § 1º deste artigo é praticado por funcionário público no exercício de suas funções.
Art. 20. Fazer afirmação falsa com o fim de induzir a erro a autoridade judicial no procedimento de interceptação de comunicações telefônicas, de informática ou telemática.
Pena - reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa, se o fato não constitui elemento de crime mais grave.
Art. 21. Oferecer serviço privado de interceptação telefônica ou telemática:
Pena - reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.
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Art. 22. Utilizar conteúdo de interceptação telefônica ou telemática com o fim de obter vantagem indevida, constranger ou ameaçar alguém:
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.
CAPÍTULO IV
DAS DISPOSIÇÕES FINAIS
Art. 23. A captação e a interceptação ambiental de sinais eletromagnéticos, óticos ou acústicos, e o seu registro e análise sujeitam-se às disposições desta Lei, no que couber.
Art. 24. É o Poder Executivo autorizado a instituir, para fins exclusivamente estatísticos e de planejamento de ações policiais, sistema centralizado de informações sobre quebra de sigilo de comunicações telefônicas, na forma do regulamento.
Parágrafo único. O sistema de que trata o caput não conterá o conteúdo das comunicações realizadas nem os códigos de identificação ou outros elementos e meios capazes de identificar os envolvidos, inclusive investigados e acusados.
Art. 25. A Agência Nacional de Telecomunicações ¿ ANATEL regulamentará, no prazo de 180 (cento e oitenta) dias, o padrão dos recursos tecnológicos e facilidades necessárias ao cumprimento desta Lei, a serem disponibilizados gratuitamente por todas as prestadoras responsáveis pela comunicação.
Art. 26. É proibida a comercialização de equipamentos destinados especificamente à interceptação, escuta, gravação e decodificação das comunicações telefônicas, incluindo programas de informática e aparelhos de varredura, salvo nas hipóteses e condições fixadas no regulamento desta Lei, sendo obrigatório o registro no órgão competente.
Art. 27. O art. 581 do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal, passa a vigorar acrescido do seguinte inciso:
Art. 581. .................................................................................
...................................................................................................
XXV - que indeferir o pedido de quebra do sigilo das comunicações telefônicas.- (NR)
Art. 28. Aplicam-se subsidiariamente a esta Lei, no que com ela não colidirem, as disposições do Código de Processo Penal e do Código de Processo Penal Militar.
Art. 29. Esta Lei entra em vigor 60 (sessenta) dias após a data de sua publicação.
Art. 30. É revogada a Lei nº 9.296, de 24 de julho de 1996.