01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de...

75
01 30 de Setembro de 2008

Transcript of 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de...

Page 1: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

0130 de Setembro de 2008

Page 2: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

DIRECTORA Isabel Caixeiro; CONSELHO EDITORIAL Cipriano Justo,

Eduardo Pacheco, Florindo Esperancinha, Jaime Azedo, José António

Salgado, José Correia, José França, José Poças, Martins dos Santos,

Nuno Cunha, Pedro Vasconcelos; REDACÇÃO Diamantino Cabanas,

Dora Guerreiro, Liliana Fernandes; SECRETÁRIA DE REDACÇÃO

Manuela Oliveira; FOTOGRAFIA Luciano Reis, Vera Vidigal; PROPRIEDADE

Secção Regional do Sul da Ordem dos Médicos - Av. Almirante Gago

Coutinho, 151 - 1749-084 Lisboa; SEDE E REDACÇÃO Av. Almirante

Gago Coutinho, nº 151 - 1749-084 Lisboa Tel. 21 842 71 00 - Fax 21

842 71 01; GRAFISMO Helena Figueiredo; TIRAGEM 18 000

exemplares; PRODUÇÃO GRÁFICA E IMPRESSÃO MultiComp-Artes

Gráficas, lda. Praceta José Gomes Ferreira, 9 - 2725-553 Mem-

Martins Tel. 21 921 33 13 [email protected]; DEPÓSITO LEGAL

nº 153809/00; Isento inscrição ICS, nº 1, art. 12, DR nº 8/99

FICHA TÉCNICA

Medi.comwww.medi.com.pt

S U M Á R I O

BOLETIM INFORMATIVO DA SECÇÃO REGIONAL DO SULDA ORDEM DOS MÉDICOS

EI EDITORIAL

Isabel Caixeiro

04 ACTUALIDADE

Futuros especialistas “encheram” OMA Ordem dos Médicos promoveu, pelo quarto ano consecutivo,

um conjunto de sessões de esclarecimento para os jovens

médicos,

06 DEBATE

Primeira sessão do ciclo «30 anos SNS»

Defesa das carreiras é uma causa comumA primeira sessão do ciclo de debates que assinala as

três décadas do SNS assentou na intervenção dos três

conferencistas convidados – João Lobo Antunes, José

Luís Biscaia e Eduardo Santana

@Envie-nos o seu

endereço de email

e receba informações

sobre todas as

iniciativas da Secção

Regional do Sul

O Gabinete de Comunicação quer

fazer chegar ao maior número de

médicos possível e o mais

rapidamente possível informações

sobre as iniciativas do Conselho

Regional do Sul, nas mais diversas

áreas, desde as realizações

culturais ou de lazer até aos

debates, conferências ou outras

reuniões abertas.

Para receber estas

informações na sua caixa

de correio electrónico, basta

enviar-nos o seu endereço de

email para um dos seguintes

endereços:

[email protected]

[email protected]

A essas e outras

informações pode também aceder

online através

do site

www.omsul.pt

Ficou clara apreocupação geral

de defender ummodelo de

carreiras médicasadequado à nova

realidadeem que trabalham

os médicos.

Page 3: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

Isabel Caixeiro

Concursos, vagas e outras trapalhadas– “Yes we can!”

este clima de instabilidade global, com paísesa falirem e economias ultraliberais a nacio-nalizarem sectores da banca indiscutivel-mente lucrativos, o comum cidadão fica

confuso e preocupado.Quando os gigantes económicos europeus e mundiaisencaram o encerramento de indústrias florescentes,com o consequente desemprego de milhares deindivíduos, qualquer médico começa a perceber adimensão da crise.Pouco percebo de macroeconomia, sub-prime, carrosselbolsista a subir e a descer, off-shores e tantos outrostermos cabalísticos que nos fazem recear o futuro.Hipoteca tem, por outro lado, um significado muitopróximo e indexado à Euribor. Todos sabemos que senão cumprirmos as nossas obrigações corremos o riscode ficar sem abrigo. Se não entregarmos religiosamentea uma instituição bancária uma parte significativa doresultado do nosso trabalho, o nosso futuro não seafigura risonho.Mas porque acreditamos no futuro, como já vem sendohabitual, o CRS organizou, com os Colégios deEspecialidade e o Conselho Nacional do Médico Interno,as Jornadas do Internato Médico, entre os dias 21 e 23de Outubro, para permitir aos jovens médicos umaescolha mais fundamentada da especialidade a quepretendem dedicar a sua vida profissional.Informações úteis, sessões muito participadas, mas emambiente de incerteza, pois só, posteriormente, a 31 deOutubro, estes colegas iriam saber a que especialidadese poderiam candidatar e em que hospital ou centro desaúde iria decorrer o seu futuro mais próximo.Partindo da má experiência no início da sua vida profis-sional, em que o Ano Comum começou atrasado e emdatas diferentes, conforme o local de colocação, passandopor sucessivas informações contraditórias prestadaspelos funcionários da Administração Central do Sistemade Saúde (ACSS), as dúvidas avolumavam-se.Entretanto, a data de publicação do mapa de vagas foiadiada, a sua composição foi “corrigida” não se sabe emque moldes e, por último, saiu um despacho do Secretáriode Estado Adjunto e da Saúde a alterar o regime de vagasprotocoladas, na véspera da escolha.Mesmo quando já nada parece capaz de nos espantar,a falta de respeito de que têm sido vítimas os jovens

médicos é algo só admissível num país de telenovela.De resto, não se entende em que estudo ou tipo deplaneamento se baseiam mapas de vagas que num anosão maioritariamente no Norte do país e no ano seguinteno Sul. Será uma das consultadorias externas em que foidesbaratado o orçamento do Ministério da Saúde?Em contraponto, há muito que dirigentes da OMtrabalham gratuitamente para o país na verificação deidoneidades e capacidades formativas, na definiçãodos programas de especialidade, nos júris de exame, naelaboração de pareceres técnicos para tribunais ecidadãos, na apreciação de legislação e em tantasoutras áreas. Com este esforço voluntário de centenasde colegas empenhados temos construído uma formaçãode qualidade reconhecida e de que nos orgulhamos.Também por isso, não se consegue perceber que umdepartamento de um ministério responsável de umaárea tão sensível como a Saúde não seja capaz, a tempoe horas e com critérios perceptíveis, de dar resposta àsnecessidades do país, concluindo um concurso decolocação de jovens desejosos de dar um rumo à vida.Há que “fazer as malas”, procurar casa, já que aespecialidade que se escolhe implica muitas vezesmudar do local onde se fez o curso ou o ano comum.Não se questiona a necessidade de fixar médicos naszonas mais carenciadas, periféricas ou no interior dopaís, mas é necessário criar verdadeiros incentivos quemotivem os jovens médicos a optar por uma especialidadefora dos grandes centros e aí prosseguir o seu futuropessoal e profissional.Se os primeiros contactos com o Ministério que ostutela e é responsável pelo Serviço Nacional de Saúdedemonstram este nível de incapacidade, o futuro serácertamente encarado com cepticismo.Será com estes exemplos que queremos motivar osfuturos especialistas, de quem esperamos odesenvolvimento da excelência da medicina portuguesae da qualidade do nosso SNS?Não estaremos a hipotecar o futuro?Mas apesar de tudo, mesmo considerando que o quevem dos Estados Unidos nem sempre é de copiar, é comabertura de espírito para considerar novas propostas edesafios que aqui deixo o desejo vindo do outro ladodo Atlântico: – “Yes we can”.

N

e d i t o r i a l

Há que“fazer asmalas”,procurarcasa, jáque aespecialidadeque seescolheimplicamuitasvezesmudar dolocal ondese fez ocurso ou oanocomum.

Page 4: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

Jornadas do Internato Médico

Futuros especialistas“encheram” OM

A Ordem dos Médicos promoveu, pelo quarto ano consecutivo, um conjuntode sessões de esclarecimento para os jovens médicos, que visa apoiá-losna escolha da sua especialidade. Ricardo Mexia, do Conselho Regional do

Sul, mostrou-se satisfeito com a participação, enquanto muitos dos internosmanifestaram ainda muita indecisão.

ntre o final do mês deNovembro e início deDezembro, chega a altura deos internos do ano comumoptarem pela especialidade

em que querem fazer carreira médica. Éuma altura que suscita dúvidas ehesitações, pois muitos dos novosmédicos, além de estarem ainda sujeitosao número de vagas abertas peloMinistério da Saúde, mantêm algumaincerteza sobre a especialidade quequerem escolher.Para os apoiar nesta fase inicial das suascarreiras, decorreram, entre 21 e 23 deOutubro, no auditório da Ordem dosMédicos (OM), as Jornadas do InternatoMédico, uma iniciativa que abordou umvasto conjunto de conhecimentos sobreas 47 especialidades.Ricardo Mexia, membro do Conselho

Regional do Sul e um dos organizadoresdo evento, manifestou a sua satisfação,no final dos três dias de trabalho,sobretudo quanto à afluência deinteressados, realçando: “As coisascorreram lindamente. Todas as especia-lidades foram representadas; umaparticipação maciça dos colegas,auditório sempre cheio, o que nos alegrasempre muito”.O dirigente passou também, não hámuitos anos, pela hesitação entre optarpor uma ou outra especialidade e, porisso mesmo, defende que “é sempre umprazer ouvir a visão de cada um doscolegas, de cada uma das especia-lidades”, pois, como disse, “não há umasó medicina, existe um fio condutor queé comum a todas”, ao mesmo tempo que“existem maneiras muito próprias depensar subjacentes a cada uma”.

Interactividade

Para Ricardo Mexia, um dos objectivosdesta iniciativa é o de esclarecer osfuturos médicos relativamente a cadauma das especialidades existentes. Porisso, “acredito que depois destasapresentações, haja alguns colegas queainda ficaram mais confusos”, afirmou,aludindo à possibilidade de poderem seratraídos por uma especialidade que nãotivessem ponderado até aí. Isto porque,

E“Houve uma grandeinteractividade entre osque vieram para ouvir eos que vieram para fazeras apresentações”

ACTUALIDADE

A presidentedo ConselhoRegional doSul, IsabelCaixeiro,presidiu àabertura dasJornadas doInternatoMédico; comÁlvaro Beleza,vice-presidentedo CRS (àdireita, nafoto), e NélsonMilagre, doConselhoNacional doMédico Interno(à esquerda,na foto)

Page 5: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

é da maior mportância que nas Jornadassejam divulgadas especialidades aindapouco em voga, como o caso da MedicinaDesportiva ou da Medicina do Trabalho.Por outro lado, pretende-se, igualmente,que este evento funcione como umespaço de interacção entre os oradorese os participantes, sendo que, na opiniãode Ricardo Mexia, tal aconteceu : “Houveuma grande interactividade entre os quevieram para ouvir e os que vieram parafazer as apresentações”. Acrescenta,assim, que estas Jornadas foram “umaaposta ganha”, uma alavanca que se crêmais do que motivadora para que para oano haja mais.

Uma apostaa não perder

As Jornadas proporcionam algo que,durante o curso, nem sempre se revelapossível: o contacto mais directo epróximo com diversos especialistas e ummaior conhecimento de cada uma dasáreas. Deste modo, os jovens médicospresentes nas Jornadas tiveram aoportunidade de ouvir cada um dosmédicos oradores, interagir com estes,fazendo todas as perguntas sobrequalquer das especialidades represen-tadas. Esta sessão pode ajudar osinternos a decidir o seu futuro ou, poroutro lado, motivar-lhes para uma áreadistinta da que imaginavam exercer,suscitando, assim, algumas dúvidas oudissipando outras.Catarina Barradas sempre quis ser médicae nem se imagina a fazer outra coisa. Jáconcluiu o curso, está agora no internatoe chegou a fase da tomada de decisão.Participou nas jornadas para esclarecerincertezas e conhecer melhor “outrasmedicinas”. Acredita que ficou elucidadae, por isso, vai “fazer uma escolha maisconsciente”.Das Jornadas, além de várias respostas,leva, consigo, outros aspectos positivos,como a “entreajuda entre os colegas.Esta é uma iniciativa que eu recomendovivamente”.Não foi apenas Catarina que se mostroureceptiva quanto a esta iniciativa. ÁlvaroNunes afirmou que as Jornadas “são delouvar, sobretudo num momentoimportante da carreira médica”, poiscontribuem para estarem “em contactocom especialidades que estavam maisdistantes, com as quais não há umcontacto prático”.A explicação mais detalhada, fê-lo

despertar para pormenores que passarama causar-lhe a incerteza quanto ao fu-turo: “Admito que pode ter criado algumaconfusão. Vinha com algumas ideiasdefinidas e as cartas voltaram a baralhar-se. Tenho mais dúvidas agora”.Ainda assim, acredita pender para a áreacirúrgica, embora admita que “a CirurgiaGeral, uma opção viável, saiu beliscada”.

(In)certezas

O Medi.com conversou com outrosinternos participantes, assumindoposturas bem distintas: uns maiscautelosos que outros. “Tenho algumaideia, sei o que é que não quero e achoque só quando saírem as especialidadese o número de vagas é que vou saber qualescolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos,interno do ano comum. Mas se a incertezapersiste quanto à escolha, o mesmo nãose pode dizer relativamente às opções aevitar: “Não quero especialidadescirúrgicas e outras especialidades comoPatologia Clínica ou Medicina Legal”.Relativamente à sessão, Pedro Gomesnão hesita quanto à sua utilidade: “Achoque é muito boa e tenho gostado dealgumas apresentações, que me têmcriado mais dúvidas. Ajudam a percebercomo são estas especialidades, mas aindanão me ajudou a decidir a especialidadeque gostaria de seguir”.

Quanto a Teresa Almeida Alexandre, 26anos e interna do Hospital de SantaMaria, a escolha quanto ao futuro estátomada: “Quero seguir Oncologia. Estádefinido”. Firme nas resposta, explica oporquê da escolha: “Gosto muito destetipo de doentes. São doentes muitoexigentes, não só a nível humano”, maspor obrigar a que o profissional de saúde“lide com a fronteira entre a vida e amorte”. A vontade de exercer é tal, que ajovem médica acredita que vai conseguirentrar na especialidade, até porque vaicandidatar-se a qualquer zona do país.Na opinião de Teresa Almeida Alexandre,estas Jornadas “são muito proveitosas.Proporcionam não só reencontrar muitoscolegas, como contactar com espe-cialidades que, se calhar, durante o cursonunca tive oportunidade de lidar, comoa Pediatria ou a Genética Clínica”. Afutura médica de Oncologia afirma:“Apesar de já saber o que vou seguir,quero saber mais, saber o que é que osoutros fazem”.Quanto ao futuro, Teresa AlmeidaAlexandre tem um desejo: “Gostaria dedizer que tinha sido uma boa opção, queme sentia realizada com aquilo que fazia”.Na opinião da interna, existem algumascaracterísticas que devem estarintrínsecas a quem quer ser médico.Enumera, por isso: “Em primeiro lugargostar daquilo que faz. Acho que tem deser uma pessoa bastante humana”.Quanto a si, admite procurar ter estasqualidades, referindo, porém: “Procuroaperfeiçoar-me no dia-a-dia. Os própriosdoentes ensinam-nos a crescerinteriormente”. Sabe que o ritmo detrabalho tende a intensificar-se, mas,mesmo assim, “procuro ter um equilíbrioe não deixar que o sistema altere asminhas características de me relacionarcom os doentes”, salienta.Apesar da segurança com que expõe assuas ideias, Teresa Almeida Alexandrereceia o futuro: “Tenho medo de não tera capacidade psicológica que é precisopara esta especialidade, porque sei queé dura”. Igualmente consciente, fala, sempudor, do medo que tem dos sinais queo tempo lhe possa vingar no carácter:“Tenho medo de me tornar uma pessoafria e com menos paciência para osdoentes porque a nossa carga horáriavai começar a aumentar”. Porém, apontauma estratégia para fintar os receios: “Aprimeira coisa é ficar atenta, detectar oproblema para depois resolver e procurarlidar com pessoas que admire”.

Os jovens médicospresentes nas Jornadas

tiveram a oportunidade deouvir cada um dosmédicos oradores,

interagir com estes,fazendo todas as

perguntas sobre qualquerdas especialidades

represen-tadas. Estasessão pode ajudar osinternos a decidir o seu

futuro ou, por outro lado,motivar-lhes para umaárea distinta da queimaginavam exercer,suscitando, assim,algumas dúvidas oudissipando outras

ACTUALIDADE

Page 6: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do
Page 7: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do
Page 8: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

08 Medi.Com 152

Primeira sessão do ciclo «30 anos SNS»

A primeira sessão do ciclo de debates que assinala as três décadas do SNSassentou na intervenção dos três conferencistas convidados

– João Lobo Antunes, José Luís Biscaia e Eduardo Santana – e no debateque se lhe seguiu. Ficou clara a preocupação geral de defender um modelo

de carreiras médicas adequado à nova realidadeem que trabalham os médicos.

Defesa das carreiras é umacausa comum

o passado dia 17 de Novembro, o auditório daSecção Regional do Sul da Ordem dos Médicosrecebeu o primeiro dos vários debates previstoso Serviço Nacional de Saúde (SNS). O tema geral

do ciclo, que se prolongará por quase todo o próximo ano,é «30 anos SNS» e esta primeira sessão visou debater «Acontribuição do SNS para o desenvolvimento profissionaldos médicos». João Lobo Antunes, José Luís Biscaia eEduardo Santana foram os conferencistas, enquanto o

moderador foi Cipriano Justo, presidente do ConselhoDistrital da Grande Lisboa, a quem cabe a organizaçãoexecutiva deste ciclo.O discurso de João Lobo Antunes abordou as carreiras médicase os internos; José Luís Biscaia optou por uma retrospectivadas leis aplicadas no âmbito do SNS e, finalmente, o de EduardoSantana que focou as transformações sociais que o SNSprovocou e o modelo de carreiras.Aqui fica o essencial de cada uma das intervenções.

N

DEBATE

Cipriano Justo, ao centro, moderou a primeirasessão do ciclo de debates sobre o SNS.

Page 9: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

0930 de Setembro de 2008

João Lobo Antunes“Relatório das CarreirasMédicas é precursor do SNS”

João Lobo Antunes, neurocirurgião, professor einvestigador, começou por dizer: “Penso que não é legítimofalar do SNS sem dizer uma palavra sobre o relatório dascarreiras médicas. O «Relatório das Carreiras Médicas»reconhecia que havia cinco sectores de actividade médicaprincipais: a saúde pública (nunca seduziu os médicos), amedicina organizada, os serviços médico-sociais, oshospitais e depois a clínica livre. Isto é de 1961”, assinalouo neurocirurgião.“Por outro lado, qual era o propósito das carreiras médicas?”,questionou João Lobo Antunes, que respondeu com acitação de um excerto do Relatório: «criação de carreirashierarquizadas com garantias seguras, de acesso, deestabilidade económica e de previdência, que coloque osmédicos ao abrigo das incertezas da clínica livre cada vezmais minguada devido ao progresso da medicinaorganizada».Segundo o médico, “este ponto de vista histórico é muitointeressante porque, de facto, o grande inimigo, assim oentenderam, eram as caixas de previdência. De facto, orelatório das carreiras médicas é precursor do SNS. Nessaaltura, invocando o que chamam seguro social, ele diziaque estava na ordem das ideias sociais do nosso tempo. Agrande palavra era a liberdade do médico, a medicina daprofissão liberal”.João Lobo Antunes continuou: “O modelo proposto do«Relatório das Carreiras Médicas» era novo e garantia uma

Page 10: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

10 Medi.Com 153

carreira que estava indissociavelmente ligada ao treinohospitalar. Portanto, o conceito de formação estava jáconsagrado de uma forma inequívoca na doutrina das carreirasmédicas; ao mesmo tempo que se entrelaçava a carreira hospitalare universitária porque, de facto, a grande parte dos redactoresda forma final do relatório eram académicos de formação, eramprofessores de faculdade e um dos fenómenos que valia a penaanalisar foi o afastamento progressivo dos académicos dasorganizações profissionais, pelo menos com a força, com o

peso, com a visibilidade que tinham há30 anos. De facto, aparece a lei de 1979que cria o SNS. No seu artigo 7.ºconsagrava que devia ser gratuito,sem prejuízo das taxas moderadorasdiversificadas. Esta ideia de taxamoderadora estava evidentementepresente no documento das carreirasmédicas. Ao mesmo tempo criava,como órgão do SNS, um departamentode ensino e investigação que tinhacomo missão promover e coordenaractividades de investigação na saúde”.

O que mudou ao fim de30 anos?

“Um dos fenómenos que, de facto,marca 30 anos de medicina é aexpansão brutal das tecnologiasmédicas, quer tecnologias de suportede vida, quer de diagnósticos, quercirúrgicas, com uma expressão cadavez mais visível e, de facto, eu diria quehoje em dia julga-se um hospitalpúblico ou um hospital privado pelastecnologias que oferece. Hoje, amedicina está dependente dastecnologias. Uma consequência dodesenvolvimento tecnológico e doprogresso científico foi asubespecialização, a necessidade dealargar o tempo de formação; ao mesmotempo que se tem nos últimos anosobservado a tendência para reduzir onúmero de horas de trabalho”,considerou o neurocirurgião.João Lobo Antunes prosseguiu: “Asubespecialização tem exigênciasmuito próprias; nasce, por um lado, demotivos relacionados com a doença –tomei a Neurocirurgia como paradigma–, a idade dos doentes (NeurocirurgiaPediátrica), a patologia (vascular, tu-moral), a anatomia (nervos periféricos).Depois, cognitivas, geradas peloconhecimento e pelo progresso doconhecimento, forças sociais quedeterminam e muito a necessidade desubespecialização e particularmente

o prestígio profissional; razões relacionadas com o uso datecnologia; alguém que domine uma técnica, de alguma forma

se torna distinto no conjunto das especialidades médicas.Obviamente, a subespecialização tem vantagens em termos deaperfeiçoamento técnico. Obriga a uma creditação própria quemuitas vezes continua a ser difícil de estruturar; razõescorporativas; académicas e pessoais, padrões de referência,reconhecimento pelos pares e de alguma forma do prestígio quedaí advém. Tem por outro lado, desvantagens, de fragmentaçãoda prática clínica, interfere com o treino dos residentes ou dosinternos de especialidade, ou seja, quando um serviço é apenascomposto de superespecialistas de áreas muito distintas, e tem,certamente, hoje em dia, já repercussões claras na forma comoa medicina é ensinada. Finalmente, a vulnerabilidade legal, ouseja, argumentar-se que um médico pratica uma técnica para aqual não está preparado”.

Os internos

O neurocirurgião recordou, então a propósito dos tempos deformação, referindo-se a números estudados nos EstadosUnidos: “Até 2003, o tempo de trabalho de um interno deNeurocirurgia era de 80 horas por semana, às quais seacrescentavam oito horas de educação; em 2008 reduziram para56”. Esta redução, segundo João Lobo Antunes, “afectou acontinuidade dos cuidados prestados aos doentes” e acaboupor exigir “recrutamento de pessoal com outra formação”.Analisando o que se passa na Europa, continuou: “Umasemana reduzida para 48 horas teve como consequências queos dias de trabalho passaram de 225 para 150 a 160 por ano, oque levou os internos a fazerem menos 30 por cento deintervenções, ou seja, há o sentimento, nas especialidadescirúrgicas, que com este tempo de trabalho não é possíveltreinar de uma forma eficaz o especialista”.

Médicos vs indústria

João Lobo Antunes passou, então, à relação entre os médicose a indústria. “O médico é investidor, investe, entre nós, muitomais nas tecnologias que pratica; há o problema da publicidademédica que, devo dizer, o novo Código Deontológico a meu vernão cobre com a modernidade que o fenómeno exigiria, e,finalmente, os conflitos de interesse que decorrem dos váriosaspectos de qualquer prática profissional. De facto, ainvestigação biomédica é obviamente parte integrante daquiloque fazemos. De facto, cada vez mais a indústria farmacêuticaé o grande fornecedor de investigação biomédica, cada vezmais as universidades americanas investem em empresas. Está-se, ao mesmo tempo, a tentar que isso seja uma realidade emPortugal, sobretudo porque o financiamento é cada vez maisescasso. Além de a indústria farmacêutica dominar em grandeparte a agenda de investigação biomédica, na realidade, dominacompletamente a formação pós-graduada. Não há congressosmédicos sem o apoio financeiro da indústria e este apoiocontinua a ter, entre nós, na minha opinião, uma regulaçãodeficiente ou inexistente”, considerou o neurocirurgião, querecordou um texto do Bastonário na ROM, em que Pedro Nunesdisse a propósito deste assunto: “A situação é chocante,quando não escandalosa”.Segundo o médico, “continuamos numa situação que não setem alterado sensivelmente nos últimos anos, em que a indústriadetermina em grande parte o que é a actividade, na selecção dosoradores, no financiamento e, portanto, esta dependência da

Hoje, a medicina

está dependente

das tecnologias.

Uma

consequência do

desenvolvimento

tecnológico e do

progresso

científico foi a

subespecialização,

a necessidade

de alargar o

tempo de

formação; ao

mesmo tempo

que se tem nos

últimos anos

observado a

tendência para

reduzir o número

de horas de

trabalho

DEBATE

Page 11: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

1130 de Novembro de 2008

indústria tem repercussões seríssimas na forma como o SNSacaba por interferir, por participar na educação pós-graduada”.

Os médicos dão a segunda opinião

João Lobo Antunes considerou a seguir que os dias de hojetrouxeram uma maior exigência dos “utentes”, termo que,assinalou, não usa quotidiano, mas trouxeram também uma“multiplicação das organizações de doentes, maiorconflitualidade, maior escrutínio dos média e novas formas deinformação”. Segundo o médico, agora há “uma nova colega;nunca trabalhou num hospital, que não é responsabilizada peloque diz, não se cansa, tem uma infinita paciência, não se zangae está disponível a qualquer hora, que é a internet”.Perante isto, de facto, acabam por ser os médicos “a dar umasegunda opinião”, considerou o neuricirurgião. O que, do seuponto de vista, “significa que hoje em dia a assimetria deconhecimento começa a estar diluída porque os doentesentendem que sabem pelo menos tanto e por vezes mais do queos médicos”.A propósito da conflitualidade, o conferencista disse: “É umamatéria que não nos pode escapar: eu trago o número deprocessos recebidos no Conselho Médico-Legal desde a criaçãodo Instituto Nacional de Medicina Legal, em 2001, que eram 32,e este ano, até Setembro, já havia 160. Escamotear o facto de quea conflitualidade aumentou de forma exponencial e cada vezmais sofisticada, obriga, em meu entender, a que os internossejam educados pelos contornos de prática clínica, sobre oerro, sobre o risco, sobre a incerteza e comecem a perceber quea medicina não é uma actividade tão pacífica; é arriscada, édifícil, é complexa e é perigosa”.

O sector privado

Quanto à possibilidade de ser necessário um dia os internospagarem a educação que receberam, o que João Lobo Antunesrecusa, recordou: “É função social do Estado preparar os seusprofissionais e os profissionais bem preparados têm obviamenteuma influência decisiva na qualidade da medicina que se praticae eventualmente dos custos e, de facto, quando os internosestão a trabalhar nos nossos serviços, estão a servir o SNS”.A capacidade formativa do sector privado mereceu umaabordagem e várias questões do conferencista, para reflectir:“Será a ecologia do sector privado favorável à formação? Seráo treino dos especialistas a vocação do sector privado?Aceitarão os subsistemas, as seguradoras e os clientes seremtratados por médicos em treino? Haverá diferença entreespecialidades médicas e cirúrgicas?”.

Declínio da investigação por médicos

João Lobo Antunes abordou também alguns aspectos queafectam a investigação, para tanto, começou por recordar ostrabalhos de Bello de Moraes, que remontam a 1898, em que seapontavam vantagens a actividades de investigação duranteo internato. “Curiosamente era uma experiência basicamenterestrita aos cirurgiões, internos de cirurgia dos hospitais civise, de facto, hoje há uma grande preocupação em toda a Europa,em relação ao declínio de investigação por médicos. Os factoresque contribuíram para isto são vários: o progresso científico émuito rápido, os médicos têm que aprender a investigar, a

dominar técnicas cada vez mais sofisticadas, o treino clínicoabsorve mais, é mais exigente, é muito fraca a recompensaacadémica, é difícil financiar programas de investigação deinternos e de especialistas e a questão que se põe é se às vezesé possível compatibilizar as duas carreiras”, questionou.O conferencista recordou então que, em Fevereiro, o Ministérioda Ciência e o Ministério da Saúde, “depois de muito tempo dematuração, publicaram uma portaria, visando preparar umanova geração de médicos altamente qualificados que possamcontribuir para uma boa prática clínica.Mencionam apenas investigação clínica,não mencionam investigação básica”, disseconsiderando que esse aspecto “é grave”.De resto, João Lobo Antunes enalteceu oPrograma Gulbenkian de formaçãoavançada, que, do seu ponto de vista “temcorrido muito bem, é extraordinariamenteexigente do ponto de vista científico, maspode ser um primeiro passo, um mecanismode articulação”. Recordou então a iniciativade criar uma unidade de investigação quecongrega o Instituto de Medicina Molecu-lar, a Faculdade de Medicina de Lisboa, oServiço de Reumatologia, portanto os trêsserviços articulados, com sede no Institutode Medicina Molecular e com áreasespecializadas: um serviço hospitalar comas várias consultas e uma unidade deinvestigação no Instituto Molecular.O neurocirurgião deixou algumas questõespendentes, como “a selecção doscandidatos em treino”, que “continua a serextremamente satisfatória, a rigidez dosprogramas de formação, a certificação dasinstituições, novas áreas de treino ouespecialização – aí a função da Ordem dosMédicos –, a verificação de competênciasde certificação”.

SNS indispensável

João Lobo Antunes concluiu, então: “OSNS é indispensável para a educaçãomédica e formação profissional e esta é umaindeclinável função social; ainda não seinventou método de formação melhor queo internato; a articulação das instituiçõesde saúde a todos os níveis e as instituiçõesde ensino é fundamental para melhoreficácia do sistema; as alterações profundascientíficas, tecnológicas e socio-económicas obrigam a repensar estaformação e a forma de avaliação dacompetência profissional e, finalmente, odeclínio do médico-cientista temconsequências graves na qualidade doscuidados prestados, na translação doconhecimento, na investigação clínica e nos ensaios das novastecnologias”.

O SNS é

indispensável

para a

educação

médica e

formação

profissional

e esta é

uma

indeclinável

função

social; ainda

não se

inventou

método de

formação

melhor que

o internato

Page 12: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

12 Medi.Com 153

José Luís Biscaia“SNS e desenvolvimentoprofissional médico essenciaispara os bons resultados”

José Luís Biscaia, que foi subdirector-geral para a Qualidade emSaúde, é médico de família e integra uma USF na Figueira da Foz.Este médico começou por considerar que “o SNS existe damaneira que existe porque surgiram as carreiras médicas”. Oconferencista assinalou igualmente a importância do «Relatóriodas Carreiras Médicas» e achou “interessantíssimo” que nolivro houvesse esta frase: “Encarar isoladamente as carreirasmédicas… compromete a instauração do Serviço de Saúde”, oque, defendeu, “caracteriza esta questão relacional que estásubjacente a todos os elementos que tivemos no nosso sistemade saúde. Encarar e discutir as carreiras médicas sem perceber ocontexto organizacional ou discutir o sistema de saúde semperceber que modelo de carreiras é um equívoco tremendo”. JoséLuís Biscaia resumiu então o que vai defender na sua intervenção:“O SNS e o desenvolvimento profissional médico foram essenciaispara a profissionalização dos profissionais de saúde e para osbons resultados de saúde que têm sido alcançados”.O médico de família passou a explicar: “Ao longo destes anosaconteceu o que chamaria a funcionarização, leia-se maisacentuadamente no início deste século XXI, e, portanto, osdesafios que neste momento temos é como é que descobrimospara as carreiras médicas um novo impulso de profissionalização,como é que poderíamos fazer um novo relatório das carreirasmédicas. Pareceu-me importante clarificar o que para mim é acarreira médica. O que é que significa? Qual é o conceito? O queé que está subjacente? O que é mais singular no «Relatório dasCarreiras Médicas» é que a maior parte dos conceitos sãoextremamente actuais. Falam do que é a matriz de desenvolvimentoda profissão médica e há uma visão da matriz dessa profissãointegrada num contexto organizacional. Falam dos modelosremuneratórios com uma base fixa e outra ligada ao desempenho,isto em 1961. Centrando na carreira médica e assumindo-a comomatriz do desenvolvimento da profissão, eu penso que de umaforma simples poderíamos assumir que é o trajecto profissionalque todos nós devemos ter, com uma progressiva diferenciaçãotécnico-científica e responsabilidade funcional, clínica eorganizacional e é importante esta consequência entre adiferenciação e o que acontece no nosso dia-a-dia, obtidaatravés de provas públicas de competência e de desempenho”.A seguir, José Luís Biscaia colocou “três questões importantes”:“As modalidades de formação e de ensino (os internatos, oacesso, como é que é feita a sua regulamentação), o exercício(acesso, progressão, vínculo, remuneração, contextoorganizacional, auto-regulação) e investigação, que é funda-mental numa carreira médica. O que tem acontecido?”. O«Relatório das Carreiras Médicas» é “um documento ímpar nahistória da nossa administração”, disse o conferencistarecordando o que dizia o ministro da Saúde, Henrique Carvalho,em 1961. “Esta declaração foi importante porque assumiu queuma profissão conseguiu ultrapassar ou ter uma visão para alémda sua imagem, do seu interesse; teve uma visão de como deviaser o desenvolvimento do sistema de saúde. Este contributo daprofissão médica de então para o que deveria ser o sistema deorganização de saúde é hoje uma marca indelével”, rematou.

Quando surgiu a carreira médica

José Luís Biscaia contou um pouco da história da criação doSNS: “É importante perceber que a carreira médica hospitalarnão surgiu com o SNS. Em 1971-73, houve um Decreto-lei quedefiniu o quadro e progressão na carreira e criou o primeiroregulamento do internato médico. Foi um internato, pelo que li,de grande dificuldade de acesso porque havia poucas vagas,tinham de fazer uma prova extremamente difícil e o resto dosprofissionais organizavam-se na antiga saúde pública. Já em1971, criaram-se os centros de saúde, extremamente importantesem termos de saúde pública, ligados à promoção da saúde, àprevenção da doença.Em 1974, foi criada a rede hospitalar nacional, integração doshospitais regionais administrados pelas misericórdias. Um outrofacto marcante foi o serviço médico à periferia (1976-83), que temvários pontos que gostaria de realçar: nova forma e contexto deexercício; autonomia e reconhecimento profissional; a criaçãode uma necessidade e a saúde como um direito.O SNS, em 1979, trouxe os grandes princípios de universalidade,equidade; acessibilidade; unidade de concepção, direcção eorganização; integração do regime das carreiras. Os serviços desaúde de então deviam organizar-se, tendo uma unidadeconcentrada da sua concepção, da sua direcção ou organização,permitindo que o grau de precisão estivesse em três ou quatropontos. Em 1982, apareceu outro marco, que foi o Decreto-lei dascarreiras médicas e que criava carreira de Clínica Geral e SaúdePública (a regulamentação do exercício profissional), a hospitalarjá existia de uma forma autónoma. E foi feita a granderegulamentação do exercício profissional, com os regimes detrabalho, com formas de acesso, com a progressão ao longo da

DEBATE

Page 13: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

1330 de Novembro de 2008

carreira. E só em 1983 é que veio a regulamentação dos centrosde saúde, criados em 1971, que tentou consolidar aquelaintegração de serviços médico-sociais, os serviços ditospreventivos ou dispensários.Outro marco importante, para a Medicina Geral e Familiar, a partirde 1987, quando a clínica geral foi assumida como sendo umaespecialidade, foi preciso resolver o problema dos milhares demédicos que tinham entrado par a carreira de clínica geral, criadaem 1982. Portugal fez uma coisa avançada para a época e foi oúnico país da Europa que fez o processo de formação específicaem exercício (1987-95).Em 1990, surge o Decreto-lei que regulamentava de formadiferente as carreiras. Só realço: reforçou a igualdade de estatutodas três carreiras; perda da singularidade da Medicina Familiar;redefiniu os regimes de trabalho e retirou os médicos de famíliadas urgências hospitalares.Outro processo muito interessante foi em 1993, titulação única,ou seja, nesta altura a OM assumiu que há um processo formativo,que é idóneo, se de facto as mesmas pessoas só mudavam decamisola quando estavam do lado dos elementos do júri, nãohavia razão para os médicos fazerem dois exames para terem umatitulação para ser reconhecidos pela OM e pelo Estado, ou sequiserem pelo SNS. Isso foi resolvido. O estatuto do SNS, quesaiu em 1993”.

Mudanças nos centros de saúde

O conferencista abordou a seguir vários aspectos das mudançasque foram sendo introduzidas nos centros de saúde e nas formasde trabalho e de remuneração ao longo dos anos: “Todos os quetrabalhavam no SNS eram pagos por salário. Em 1998, houve umaexperiência inovadora, que foi fazer um Decreto-lei que permitiapagar aos médicos uma remuneração ligada ao desempenho.Foi nesta altura que surgiu uma legislação de centros de saúdede 3ª geração (1999), legislação essa que nunca saiu da gavetaou do papel, se quiserem, mas que foi importante. Os centros desaúde tinham um conceito de autonomia gestionária e de criaçãode uma hierarquia técnica. Sistemas locais de saúde (1999), outroconceito bondoso, um dispositivo de integração de cuidadosque neste momento está a ser reinventado como unidade localde saúde e que, na altura, beneficiou de algumas experiênciasresiduais. A única forma que as carreiras médicas tinham de seassumir era pelo lado da qualidade, liderança clínica no processodo hospital ou dos centros de saúde. Foi criado o Instituto daQualidade em Saúde que teve uma vida efémera, quatro/cincoanos, e com a reestruturação que houve agora no Ministério daSaúde ficou encostado em algum lado na Direcção-Geral deSaúde”.

Gestão hospitalar e USF

José Luís Biscaia fez também uma síntese da evolução do sistemahospitalar e do recente processo de criação de USF: “Em 2005,apareceram os hospitais EPE, que levaram ao desaparecimentodas carreiras médicas. Nesse mesmo ano, foi feito o Regulamentodo Internato Médico, com o objectivo de criar um trajecto únicode formação, e a OM assume o júri da avaliação final. Um anodepois, surgem as USF, pequenas unidades autónomas em quese privilegia a autonomia, acessibilidade, efectividade, eficiênciae em que se procura replicar a questão da remuneração ligada aodesempenho. Na sequência das unidades de saúde familiar, está

em curso a criação de agrupamentos de centros de saúde, umprocesso muito complicado porque mexe onde dói muito – adifícil reforma das ARS”.

Aspectos positivos e negativos

José Luís Biscaia apontou os aspectos positivos das reformasque enumerou: “Profissionalização, os internatos médicos, adiferenciação profissional, hierarquia clínica (hospital),investigação clínica (hospital), estabilidade profissional, quese reflectem nos resultados em saúde”.Como aspectos negativos referiu “a funcionarização, isto é, oprogressivo peso da hierarquia administrativa e odesaparecimento da liderança clínica, a má gestão de recursoshumanos; o SNS nunca fez gestão de recursos humanos, ouseja, não sabe dizer ao longo destes anos quantos somos; nãotem o mínimo planeamento estratégico do que é que vaiacontecer. Por outro lado, a própria gestão operacional, sequiserem dos recursos humanos, é catastrófica. Depois, umproblema que, se calhar, faz parte da nossa cultura portuguesa,nós não conseguimos sustentar estes processos de mudança”.

Desafios

O conferencista apontou alguns desafiosimportantes no momento que vive o SNS: “Aautonomia clínica tem de ser assumida comoum privilégio e não como um direito. É óbvioque ninguém consegue regular a nossaprática; é para isso que existe uma Ordem, emque está delegada essa competência. Masisto pressupõe que devemos ter um controlodo diagnóstico e do tratamento, controlo daavaliação dos cuidados, controlo da naturezae organização do trabalho, independênciacontratual; auto-regulação efectiva etransparente; trajecto formativo único eindependente do contexto e diferenciaçãoclínica clara e consequente”.

Nada mudou no SNS

Para José Luís Biscaia no SNS “não mudounada”, mas explicou melhor: “O SNS con-tinua a ter os seus princípios deacessibilidade, equidade, universalidade, nosquais agora estão muito mais prementes a efectividade e aeficiência e aqui é que gera uma questão diferente. De uma formasimples, o SNS quando surgiu era um compromisso de oferta e,neste momento, o SNS é um compromisso de resultados. Isto éuma mudança radical; esta é que é verdadeiramente a mudança.Ser um compromisso de resultados inclui as expectativasdiferentes dos cidadãos, os diferentes resultados em saúde, acapacidade de dizer se o resultado era esperado ou não. Portanto,o grande desafio que o SNS tem que fazer é discutir estecompromisso de resultados. Isto tem a ver com a capacitação;contratualização e transparência. Em suma, todos osprofissionais devem ter boas práticas; doentes devem serprotegidos das más práticas; maus desempenhos devem sermelhorados; abertura e demonstração reforçam a confiança. Ascarreiras médicas, em relação ao SNS, seriam uma exigência éticade responsabilidade individual e colectiva”.

O SNScontinua ater os seusprincípios deacessibilidade,equidade,universalidade,nos quaisagora estãomuito maisprementes aefectividadee a eficiênciae aqui é quegera umaquestãodiferente

Page 14: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

14 Medi.Com 153

Eduardo Santana“SNS, a mais importanteconquista social do século XX”

Eduardo Santana, gastrenterologista, director do Hospital daForça Aérea e membro do Conselho Regional do Sul da Ordemdos Médicos, foi o último orador da primeira sessão de debatedo ciclo «30 anos SNS». Este médico confessou-se um“incondicional defensor do Serviço Nacional de Saúde (SNS)e um entusiasta, muitas vezes incontido, de tudo o que lhe digarespeito”.Eduardo Santana leu então um discurso escrito que considerou“totalmente despretensioso e sem preocupações de caráctercronológico ou valorativo”, que admitiu deixar “para oshistoriadores e estudiosos”, e que visou transmitir “uma visãoestritamente pessoal”, do que considera “ter ocorrido de maisrelevante neste já longo percurso”.O especialista fez a seguinte intervenção que se segue naíntegra.“Quando, em 1979, o então deputado Dr. António Arnautapresentou a proposta de lei que iria consagrar o SNS mais nãofez que verter para a legislação os princípios consagrados naConstituição de 1976 e que resultavam de uma clara opçãopolítica já anteriormente assumida pelos primeiros GovernosProvisórios.Iniciava-se desta forma aquela que considero a mais importanteconquista social do século XX e escrevia-se a primeira páginadaquela que iria ser uma história de enorme sucesso, pelo bem-estar que trouxe à população em geral e aos mais desfavorecidosem particular. A medida, por ser inovadora e surpreendenteentre nós, era também a expressão do atraso que o paísapresentava neste sector, à semelhança do que acontecia comoutros, comparativamente aos seus congéneres europeus. Emboa verdade, com pequenas diferenças na concepção, nosrecursos empregues, e no modo de financiamento, eram váriosos países que desde há alguns anos apresentavam serviços desaúde universais e gratuitos ou fortemente comparticipadospelo Estado. Todos resultantes de políticas sociais que seenquadravam na concepção do «estado providência», pelaqual muitos já tinham optado e que era estudada e experimentadaum pouco por toda a Europa desde o início do século, mau-grado as sucessivas tragédias que o iriam ensombrar”.

Apoio não foi unânime

“Convêm recordar, para memória futura, e por razões que nãovêm agora a propósito, que a aprovação legislativa do SNS nãocontou, já nessa altura, com a unanimidade das forças políticasentão com assento na Assembleia da República.Este facto, aparentemente irrelevante, talvez nos ajude a melhorcompreender as dificuldades e contestações que o SNS temvindo a enfrentar ao longo da sua existência e para as quaisparece nunca ter faltado motivação e vontade.Numa sociedade profundamente carenciada e desigual, ondeo pouco que existia era mal distribuído e inacessível à maioriada população, a adesão a um projecto generoso e solidário sópoderia ter sido entusiástica e catalisadora. Convêm referir queesse clima de entusiasmo e de generosidade que se vivia àépoca era fruto de uma compreensível imaturidade democrática

e resultava da utopia que muitos alimentavam em ver construídauma sociedade mais justa e solidária onde a discriminação e adesigualdade não tivessem lugar.A irreverência da contestação então vivida, algum oportunismoe precipitação impediam a maioria das vezes que fossem tomadasdecisões ponderadas e razoáveis que permitissem encontrar assoluções adequadas aos problemas, nos mais diversos sectoresda vida pública.Aconteceu assim com as Faculdades de Medicina que seencheram precipitadamente de um exagerado número de alunose não tiveram outra solução que não fosse formar licenciadosde forma pouco ortodoxa e, nalguns casos, demasiado rápidapara o que seria prudente e desejável que acontecesse.Ironicamente, este processo arriscado e imprudente viria amostrar-se decisivo para triplicar o número de médicos entãoexistente num tempo recorde e deixar-nos a falsa ilusão de terencontrado solução fácil para um problema que nuncahaveríamos de ver solucionado. Apesar de tudo, o futuro viriaa mostrar-se surpreendentemente generoso ao demonstrar-nos que a qualidade dos profissionais então formados nãodestoava do todo já existente.”

Orientação para a comunidade

“A política de saúde de então modificava os seus objectivos,deixando de estar centrada no indivíduo e na visão estritamentehospitalar do homem doente, para se orientar para a comunidade,para a prevenção e profilaxia da doença, para a promoção dasaúde e do bem-estar das populações e para a educaçãosanitária das comunidades. Apesar das dificuldades sociaisque o país enfrentava, dava-se início ao programa de cobertura

DEBATE

Page 15: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

1530 de Novembro de 2008

médica de todo o território nacional. Assistia-se assim à criaçãode centros de saúde com vocação na área preventiva da SaúdePública, em conjunto com os postos da então denominadaCaixa de Previdência, a que eram atribuídas responsabilidadesno âmbito da medicina curativa. Anos mais tarde, da sua fusãonasceriam os chamados centros de saúde de segunda geração.

O serviço médico à periferia, entretanto criado, davacontinuidade ao Internato Policlínico que antecedia aespecialização médica pós graduada. Daqui iria resultar amelhoria da assistência médica das populações, oenriquecimento da formação e experiência dos profissionaisenvolvidos e a qualificação da política de saúde até entãopraticada.Muitos médicos não regressariam às suas origens, radicando-se nos locais de colocação e assumindo uma opção de vida atéentão pouco vista e que se viria a mostrar decisiva para adescentralização da cobertura médica até então confinada aosgrandes centros urbanos.Aos clínicos gerais era então facultada a possibilidade de seespecializarem como médicos de família, num processovalorativo de formação em exercício que mais tarde viria aoriginar a especialidade de Medicina Geral e Familiar, verdadeiropilar do nosso sistema de saúde.Rapidamente, o acesso às consultas e aos exames auxiliares dediagnóstico deixavam de ser uma miragem distante para setornarem uma realidade ao alcance de todos. Facilmente seultrapassariam os quarenta milhões de consultas/ano, o númerode internamentos subiria em flecha e as urgências atenderiammais de um milhão de utentes em igual período, demonstrando,por um lado, a vitalidade do processo e as necessidadesexistentes, mas, por outro, pondo já a descoberto algumimproviso e falta de organização e planeamento nas soluçõesencontradas.Apesar disso, a cobertura médica atinge rapidamente númerosnunca antes imaginados, alcançando-se num curto espaço detempo mais de 98% da população nacional, apesar das marcantesdesigualdades e assimetrias que ainda se verificavam nosacessos e nos tempos de espera pelo atendimento que, emmuitos casos, perdurariam até hoje.As transformações sociais e as profundas alterações verificadasna educação e no acesso ao rendimento transformariam paramelhor as condições de vida das populações, aumentando oconsumo de bens essenciais e melhorando os seus hábitos,contribuindo desse modo para elevar o bem-estar das famílias.

Como resultado, os indicadores médico-sanitários que noscolocavam, antes da criação do SNS, na cauda da Europa,transportar-nos-iam, por critérios da Organização Mundial deSaúde, em pouco mais de vinte anos, para um surpreendente12.º lugar entre as nações, na avaliação do desempenho donosso Sistema de Saúde.Para além das modificações sócio-económicas já enunciadas,o sucesso ficou em boa parte a dever-se à vontade política dosdecisores, à estratégia escolhida, mas sobretudo à competênciae à qualidade do trabalho efectuado pelos profissionaisenvolvidos e dentre estes, o realizado pelos médicos.O numerus clausus entretanto criados eram mais fruto dalimitada capacidade formativa dos estabelecimentos de ensinoe dos interesses corporativos instalados do que resultado dequalquer planeamento, visando acautelar o futuro. Apostava-se tudo na quantidade em detrimento da excelência, facto quemais tarde iria ter consequências muito negativas nas maisdiferentes áreas do pensamento, da cultura, da investigaçãocientífica e da liderança no nosso país.Construíram-se novos hospitais, centros de saúde, faculdades,institutos e escolas técnicas superiores, públicos e privados.Aumentaram-se os meios e recursos indexados à formação e àespecialização profissional. As instituições adquiriam prestígioproporcional ao trabalho que produziam e tornavam-se motivode orgulho para os que nelas trabalhavam e de referência paraaqueles que procuravam os seus serviços.”

Conselhos de Gerência dos Hospitais

“Nascem os Conselhos de Gerência dos Hospitais que irãojuntar médicos, administradores e enfermeiros nas suasdirecções, inicialmente presididas apenas por médicos. Estasituação, que perdurou durante mais de dez anos, viria a sermodificada com a clara oposição da classe médica em temposde forte conturbação para com o poder político, nos finais dosanos oitenta. O mesmo aconteceria anos mais tarde com osdirectores clínicos, inicialmente eleitos entre os seus pares paradepois serem alvo de nomeação pelas administraçõeshospitalares, num processo de clara clivagem das relaçõesinstitucionais entre os médicos e a sua hierarquia que se arrastaaté hoje e ao qual urge pôr cobro para benefício das instituições,dos seus profissionais e da transparência de processos.Adquiriram-se progressivamente novos sistemas de recolha etratamento da informação e inicia-se a informatizaçãoprogressiva dos serviços, de um modo nem sempre bem

Maria de Belém:“SNS tem importância estratégica”

Maria de Belém, ex-ministra da Saúde e actualpresidente da Comissão Parlamentar da Saúde,referiu, sobre o SNS, que “é um serviço em grandetransformação, que continua a ter uma importânciaestratégica absolutamente essencial.Podemos dizer que foi o serviço público da erademocrática, mais bem conseguido, isto na lógicae na óptica dos serviços consagrados.Foi realmente um percurso de sucesso até aqui.

Evidentemente que todas as coisas precisam deser permanentemente ajustadas às exigências domundo moderno, que, aliás, assim o exigem.A velocidade a que as coisas hoje acontecem émuito superior ao que acontecia no passado e énecessário, se quisermos continuar asalvaguardar a excelência de resultados que oSNS teve, ir mais à frente e não ter medo desermos ousados”.

Page 16: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

16 Medi.Com 153

planeado e que iria originar muitas dasvezes inesperadas resistências.Algumas, que infelizmente aindaperduram e se devem ao deficit decomunicação e de formação adequadapromovida pelos seus responsáveis.Apesar de tudo, a referenciação dedoentes entre unidades de saúde torna-se uma importante mais-valia que irápotenciar os recursos disponíveis epermitir dar resposta às situações maisgraves e complexas ao mesmo tempoque irá conferir coerência ao sistema esegurança aos utentes, disfarçandoalgumas das suas graves carências. Ainiciativa e o empenhamento pessoaldos profissionais, o conhecimento interpares das capacidades instaladas, oreconhecimento das competências dosserviços e do mérito dos colegasdesempenham um papel determinantepara o êxito deste processo, em claraoposição à desnatação de doentes e àescolha selectiva de patologias comque hoje em dia, somos frequentementeconfrontados.As instituições remodelam-se ereequipam-se num notável esforçocolectivo de actualização emodernidade, mau grado o

subfinanciamento que desde sempre as penalizará e que apenasserá temporariamente amenizado com as verbas recebidas daCEE após 1985, ao abrigo dos fundos estruturais entãodisponibilizados para o sector.Persiste a indefinição de acto médico, que cada vez mais setorna necessário concretizar mas que se arrasta ao longo dotempo, atravessado diferentes governos, facto a que não seráestranho a instabilidade decorrente dos ciclos eleitorais quetemos vivido e a falta de vontade política para o fazer.Entretanto, todas as unidades de saúde, dos hospitais aoscentros, são postas à disposição do ensino, da formação e dainvestigação científica nas mais diferentes áreas doconhecimento e da formação profissional. Esta é asseguradaem exclusivo pelo Estado através dos meios que coloca aoserviço nas instituições de que é detentor com recurso aprofissionais diferenciados que assumem funções docentescomplementares à sua profissão. Simultaneamente, assiste-sea uma invulgar colaboração interministerial entre Cultura,Saúde e Ciência, nunca antes observada e que irá possibilitara integração do ensino e da formação a todos os níveis epossibilitar o acesso a programas multidisciplinares e dedimensão internacional até então pouco viáveis.”

O poder das tecnologias

“O exercício da Medicina torna-se mais complexo, exigindorecurso a novas tecnologias, a diagnósticos mais rápidos eseguros. O trabalho especializado e em equipa com certificaçãode procedimentos e de boas práticas torna-se preponderanteao inverso do até então praticado. Nesse sentido promovem-se auditorias, creditam-se Serviços e certifica-se a sua qualidade,

ao mesmo tempo que se sistematizam processos, adoptando-se códigos de nomenclatura e grupos de diagnóstico homogéneoque irão permitir monitorizar a produção, comparar resultados,padronizar o custeio e quantificar objectivos.Os utentes tornam-se mais informados e conhecedores dosseus direitos contribuindo desta forma para a melhoria daassistência prestada ao tornarem-se consumidores maisqualificados e exigentes. Isso apesar de esse poder ter sido,algumas vezes, incorrectamente manipulado por alguns sectorespolíticos contra os profissionais de saúde com as desastrosasconsequências que daí advieram e que todos conhecemos.”

Titulação única

“A Ordem dos Médicos em cooperação com o Ministério daSaúde cria a titulação única para o ensino médico pós graduado,assumindo-se como única autoridade competente para atribuiridoneidade formativa aos serviços do SNS, responsabilizando-os deste modo e aos seus tutores pelos internos a seu cargo.Consegue-se desta forma prestigiar as instituições, os colégios,os clínicos e a formação médica em geral.Dinamizam-se os colégios que se abrem a novos especialistasapós um polémico período de titulações por consenso que osirá retirar do marasmo e da exclusão a que se haviam remetido.Criam-se novas especialidades e emergem diversascompetências e subespecialidades em diferentes áreas daciência médica. De entre estas, merece particular referência aCompetência em Gestão de Unidades de Saúde, patrocinadapela Ordem, que irá dotar os médicos das ferramentas necessáriaspara assumirem qualquer função dirigente nas instituiçõesonde trabalham ou para melhor poderem participar nastransformações actualmente em curso na área da saúde.Os internatos passam a ser regulados tendo em conta atransparência e a igualdade de processos e de oportunidadesentre os candidatos, valorizando o seu mérito individual. Aescolha das especialidades obedece a critérios onde se conciliamas capacidades instaladas, a idoneidade dos Serviços e acimade tudo as necessidades do País e do seu Serviço Nacional deSaúde. Promove-se a especialização e diferenciação profissionalde todos os médicos numa feliz iniciativa tendente a acabar comprofissionais indiferenciados e desqualificados. Diversas áreasda especialização médica constituem-se como núcleos deexcelência e são motivo de referência internacional e exemplopara outros serviços e sectores. A qualidade técnica e científicados médicos e o nível da sua formação são sobreponíveis àsdos melhores centros e são raras as situações que aconselhame recomendam o recurso ao estrangeiro para intervençõesqualificadas a não ser em casos raros que encontram justificaçãona baixa casuística ou falta de experiência.”

Medicina sem vínculo contratual

“A medicina estritamente liberal, desligada de qualquer vínculocontratual, assume papel residual no espectro da profissãomédica. Em contrapartida, a medicina convencionada nos termospropostos pela Ordem continuará a ser uma solução adiadatendente a solucionar os problemas de acessibilidade e dademora média no atendimento existentes no SNS.Aparentemente viável do ponto de vista financeiro, permitiriarecuperar os benefícios decorrentes de uma relação médico-doente personalizada resultante da livre escolha, por parte

A Ordem dos

Médicos em

cooperação com

o Ministério da

Saúde cria a

titulação única

para o ensino

médico pós

graduado,

assumindo-se

como única

autoridade

competente

para atribuir

idoneidade

formativa aos

serviços do SNS

DEBATE

Page 17: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

1730 de Novembro de 2008

destes, do seu médico assistente.Assistimos à intenção de tornar a medicina convencionadaexclusiva dos grandes operadores levando à falência os médicosconvencionados em nome individual e os pequenosconsultórios, sem qualquer consideração pelos investimentosefectuados, um pouco à semelhança do que aconteceu com ocomércio de retalho e as grandes superfícies mas, neste caso,não por iniciativa dos consumidores mas sim por decisão doúnico emissor credenciado.Contudo, subsistem graves e estruturais problemas que nuncaconseguiram ser ultrapassados. O crescimento da despesapública com a saúde torna-se exponencial, quasequadruplicando nestes trinta anos, a percentagem do PIB quelhe é destinada.Por força das circunstâncias, o SNS torna-se “tendencialmentegratuito” a partir de 1989 e assiste-se a uma aproximação desteàs ideologias de mercado. Nasce a concepção ampla do sistemade saúde sendo-lhe reconhecida uma componente pública eoutra privada. Criam-se os Centros Regionais de Saúde Pública,reforçando esse importante sector da actividade médica navigilância e promoção da saúde das populações. Maisrecentemente promove-se a articulação em redes locais dasunidades de saúde, redefine-se a rede de referenciação dasurgências a nível nacional, debaixo de forte polémica econtestação por parte de profissionais, utentes e autarcas.Tudo à semelhança do que já pouco antes acontecera com ofecho de maternidades, ditado apenas por razões de ordemtécnica e de segurança, mas que se iriam revelar de umaprecipitação descontrolada só compreensível pela necessidadeem concentrar recursos para desesperadamente diminuirdespesas.O sobreconsumo de cuidados, as listas de espera, as variaçõesda actividade e dos custos unitários, a indução ao consumo,a falta de coordenação entre prestadores e as enormesdesigualdades persistentemente observadas nasacessibilidades tornam o sistema vulnerável a todo o tipo dedetractores e alvo de recorrentes contestações.Os custos de todo o processo crescem em flecha e para issocontribui decisivamente o desenvolvimento tecnológico, oenvelhecimento da população, o preço dos medicamentos, acrescente complexidade da prática médica, a alteração dopadrão das doenças, a expansão e diferenciação dos serviços,as expectativas crescentes dos doentes e a nossa dependênciado exterior, pondo em causa a sustentabilidade do sistema etornando crescente a insatisfação dos utentes.

Incrementa-se a cirurgia ambulatória e osinternamentos de curta duração,privilegiando-se os cuidadoscontinuados e o apoio domiciliário.Implementam-se as taxas moderadoras ecriam-se programas de combate às listasde espera para cirurgias. Torna-secrescente a insatisfação dos utentesaumentando rapidamente o número dosque aderem a seguros complementares desaúde os quais não se assumem comoalternativa válida capaz de assegurar acustos razoáveis o risco completo desaúde dos seus segurados sempreviamente os discriminar por idade oupatologias associadas ou promovendo ainacessibilidade contratual por custosinaceitáveis face ao risco e ao poder decompra dos interessados nos casos quenão lhes interessam.Adoptam-se novas políticas na área domedicamento e promove-se o consumode genéricos ao mesmo tempo que sesujeita o recurso a novas moléculas àprévia comprovação dos seus benefíciosface aos custos. Formam-se comissõeshospitalares de farmácia e consultas dedecisão terapêutica que tornam aprescrição de imunomoduladores, antibióticos de nova geração,quimioterápicos, e fármacos com actuação no sistema nervoso,mais rigorosa e controlada com a imprescindível colaboraçãodos médicos envolvidos.”

Migração do sector públicopara o privado

“Aumenta o número de unidades privadas de saúde e assiste-se ao êxodo de profissionais do sector público para o privado,a coberto de um vazio legislativo que permite que tal aconteçasem a devida compensação pelos custos de formaçãodespendidos pelo Estado, a exemplo do já anteriormente ocorridonoutros sectores da vida pública.Reformulam-se os centros de saúde e a sua forma derelacionamento com a população através das USF, as quaisassumem uma intervenção mais autónoma mas mais responsável

Cipriano Justo:“Carreiras devem ser um pilar”

Cipriano Justo, presidente do Conselho Distritalda Grande Lisboa, o moderador deste primeirodebate do ciclo que assinala os 30 anos de SNS,e salientou: “O que ficou de todas as intervençõesfoi a questão das carreiras médicas para o reforçodo SNS, e da necessidade de todos os actores

que estão no terreno elaborarem as novas carreirasmédicas. A esses actores pedimos que o façamcom rigor e transparência, no sentido das carreirasmédicas constituírem, no futuro, um pilar para amaioria dos cuidados de saúde e inclusivamentetambém para os profissionais de saúde”.

Page 18: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

18 Medi.Com 153

para com as populações que servem e cuja avaliaçãoda mais-valia que trouxeram para doentes eprofissionais envolvidos é ainda prematuro fazer.As actividades de saúde a nível das organizaçõescentram-se nos resultados, não interessando quemfaz e como faz. Descuram-se os processos e ocorremos primeiros desvios à equidade dos procedimentosresultante do recurso a meios de diferente qualidadepara solucionar situações idênticas. Nasce, assim,uma das mais inquietantes preocupações a que osmédicos e todos os profissionais de saúde terão dedar resposta cabal, num futuro próximo, nuncaesquecendo que o seu compromisso e dever éticosão para com os doentes por quem são responsáveise não para com gestores ou empresários.Nascem as parcerias público-privado. Ensaia-senos hospitais públicos um novo modelo de gestãodo tipo empresarial. Altera-se a Lei de Bases daSaúde e nascem novas modalidades de contrato detrabalho, novos modelos de financiamento dasinstituições e uma nova lei de gestão hospitalar.Os hospitais privados candidatam-se à formação deespecialistas nos seus serviços, não sendo clarosos termos em que se propõem fazê-lo e as motivaçõesque lhes estão subjacentes. Desconhece-se se setrata de um modo de potenciar os recursos quedetêm e, desta forma, contribuir para o esforçocolectivo do país ou antes uma forma de exploraruma nova área de negócio, ao mesmo tempo queresolvem as necessidades exclusivas das suasempresas. Importante é saber se o pretendem fazerà revelia do que se encontra definido para o sectorpelo Ministério da Saúde e pela Ordem dos Médicos,fomentando desigualdade de processos, ou, antes,respeitarem essas regras e assim contribuírem paraaumentar a qualidade do serviço público.”

Saldo negativo ou positivo parao SNS?

“Passados estes trinta anos, e mau grado asdificuldades e os erros cometidos, o saldo é,indiscutivelmente, positivo. As alternativasconhecidas, pelo que se observa nos países em queconstituem modelo, não despertam entusiasmo nemse mostram atractivas. Na verdade, como se podemaceitar sistemas de saúde liberais, regidos pelas leisde mercado, se não conseguem gerar poupançapara o erário público nem trazer mais-valia para oscontribuintes? Como confiar em modelos privadosde financiamento da saúde ou de segurança socialtendo em conta os exemplos recentementeobservados com bancos, seguradoras e fundos depensões em sociedades onde a poupança e aactividade mutualista eram a única forma de osgarantir?É esta, como qualquer outra, uma boa ocasião parareequacionarmos o futuro do nosso SNS. Tudorecomenda que o futuro passe pela convergência

entre as virtudes dos modelos públicos, maisestatizados, e as dos modelos privados, concep-tualmente mais liberais, numa tentativa de diluir ofosso das divergências que os separam. Tenho,infelizmente, sérias reservas quanto à sua viabilidade.Por um lado, porque a separação entre prestadores efinanciadores que ela preconiza, não temnecessariamente de ser a única solução viável para oconseguir. Por outro, porque as motivações queimpulsionam os dois modelos não conduzem aresultados de valor idêntico para os consumidoresnem se regem pelos mesmos princípios desolidariedade e coesão. Finalmente, porque a exemplodo que se vê noutros sectores de actividade, aregulação que lhe está inerente não nos pode merecerconfiança. Na verdade, num mercado pequeno comoo nosso em que a cartelização é difícil de impedir,regula quem sabe e quem sabe está normalmenteligado a quem produz, sendo determinante para a suacaptura ou para a ineficácia do processo.Ideal e provavelmente utópico seria um sistema emque coexistissem os dois modelos de forma sustentada,unidos ou separados, de modo a permitir retirar o quede melhor cada um tem, expurgando-os dos seusdefeitos. Ao mesmo tempo, permitiria que exercessemauto-regulação, sob supervisão do Estado, partilhandoambos os encargos inerentes à satisfação dos benspúblicos.Aos médicos deslumbrados com o clima de excepçãoque vivem no acesso ao mercado de trabalho convémrecomendar-lhes alguma moderação em relação aoque o futuro lhes reserva e que parece, tudo o indica,não vir a ser particularmente auspicioso. Melhor seráque se unam em torno da revisão das carreiras médicas,actualmente em discussão, o que me parece ser a únicaforma de prestigiarem a sua profissão, assegurarem aqualidade dos cuidados prestados e o nível da suadiferenciação, numa hierarquia de conhecimento eexperiência imprescindível à aquisição do saber, comodesde tempos imemoriais acontecia com o aprendiz, ooficial e o mestre, venham eles agora a ter o nome quelhes quiserem dar.Tenho a certeza que apenas por mera coincidência esem qualquer outra intenção, simultaneamente aoinício destas comemorações, disparavam notícias nosmeios de comunicação social alertando para a“desastrosa” derrapagem financeira do SNS e para aqueda vertiginosa do país no ranking das naçõesquanto à qualidade do seu Sistema de Saúde nosúltimos sete anos.Nesta data que se deseja festiva, a conclusão parece-me simples: mais do que um problema de financiamentoe de boa gestão das instituições, que não se pode nemdeve menosprezar, a sustentabilidade do SNS é, desdesempre, uma questão de opção política, de modeloorganizacional, de justiça social e de maturidade cívicada sociedade.”

Tenho a

certeza que

apenas por

mera

coincidência

e sem

qualquer

outra

intenção,

simultaneamente

ao início

destas

comemorações,

disparavam

notícias nos

meios de

comunicação

social

alertando

para a

“desastrosa”

derrapagem

financeira do

SNS e para

a queda

vertiginosa

do país no

ranking das

nações

quanto à

qualidade do

seu Sistema

de Saúde

nos últimos

sete anos.

DEBATE

Page 19: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

1930 de Novembro de 2008

Debate muito participadoApós as três intervenções, foi aberto o espaço de debate e de questõescolocadas pelos participantes. Carreiras Médicas foi o assunto que reveloususcitar as maiores preocupações. O bom funcionamento dos serviços, osinternatos, a qualidade da medicina e a dedicação dos profissionais foramigualmente temas abordados neste primeiro ciclo de debates dedicados ao SNS.

Os internos

Relativamente aos internos, João Lobo Antunes defendeu quedeviam ser confrontados com a especialidade o mais cedopossível, de maneira a terem uma ideia mais bem definida sobreo dia-a-dia do exercício de uma determinada especialidade. Avocação também é importante e “daí defender a existência dasentrevistas. São mais justas e determinam uma escolha maisvocacionada, no entanto, em Portugal, há o medo daresponsabilidade de assumir uma escolha”, argumentou.Em contrapartida assume-se terminantemente contra os testesde escolha múltipla que na, na sua opinião, não o são. “Escolhamúltipla é a prática da medicina, essa sim implica várias escolhas.O teste é exactamente o contrário, admitindo apenas umaopção. Os testes são completamente descabidos”, defendeu.E concluiu com uma frase que traduz em pleno a sua visão: “Estesistema é uma aberração mas não temos outro, resigno-me!”.José Luís Biscaia, por seu turno, referiu que “em relação àescolha da especialidade, há coisas que se podem melhorar.Actualmente não há capacidade de escolha. Ao introduzirmosa entrevista há uma escolha natural. Mas é mais confortável aexistência de um concurso público. Na verdade, temos de tercapacidade de escolha, de tomar uma decisão e de aprender alidar com a discriminação”, que decorre da entrevista em vez doactual teste de escolha múltipla que classifica os internos comum valor que lhes dá o acesso a determinada especialidade.Quanto aos internatos, na opinião de deste médico de família,estes “não têm mudado muito. O maior problema é o do contextodo internato, onde são feitos, quantas cirurgias fazem, como éo dia-a-dia etc. Mas aí intervêm os colégios, são eles quedeterminam os internatos, nomeadamente a duração. Se háalgum problema é de sistema, mas o sistema somos nós. Nósfazemos o sistema”, alertou.Eduardo Santana, por seu turno, quanto a este aspecto,discordou de João Lobo Antunes e recordou: “Defendo um

critério mais equitativo, mais justo, menos tendencioso. O testede escolha múltipla pretende ser uniforme e hierarquiza. É paramim uma forma justa de escolha porque é igual para todos”.Relativamente ao internato, considerou que “não devem ser tãobalizados. A escolha deve ser mais eclética, indo de encontro àsnecessidades dos serviços mas também atendendo à vocaçãode quem cumpre os internatos. Por vezes perde-se a noção deconjunto porque são demasiado direccionados paradeterminadas técnicas”, alertou.

Carreiras médicas

Quanto às carreiras, o neurocirurgião alertou para o facto de aquestão ser delicada. Embora defenda uma alteração, a verdadeé que considera o assunto complexo. “Assisti a situaçõesverdadeiramente absurdas e defendo que se deve ter a liberdadede escolher os profissionais com quem se quer trabalhar e quefazem falta numa equipa. O actual sistema não é perfeito, mas,como dizia Churchill, “a democracia é o pior sistema de Governose excluirmos todos os outros”, recordou João Lobo Antunes.Por outro lado, José Luís Biscaia optou por fazer a distinçãoentre dois elementos que considera fundamentais e que são porvezes motivo de confusão. “Temos de separar dois universosdistintos: um que é o universo da carreira, composta pelo queconstruímos e que depende das competências, das capacidadese da qualidade de cada um. Outra coisa é o contexto do exercício,nomeadamente as relações laborais que vamos tendo edesenvolvendo. Este é outro universo. Não podemos confundiros dois. São distintos!”, reforçou.Em relação às contratações defende o princípio da flexibilidade.“É óbvio que devia ser possível a qualquer chefe de equipaescolher o profissional com quem quer trabalhar. Devia haveruma maior flexibilidade para escolher com quem se quertrabalhar”, considerou José Luís Biscaia.

No finaldasintervençõesdos oradores,os participantesempenharam-seno debate.

Page 20: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

020Medi.Com 152

Page 21: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

SÉRIE III N.º 36 Coimbra,Novembro/Dezembro 2008�

editorialDr. Fernando Gomes

(…) Nos últimos dias a opinião públi-ca viu-se confrontada com a aparen-te descida do nosso SNS de um hon-roso 12.º lugar para um 26.º. Nem in-teressava ver se as classificaçõeseram comparáveis no seu âmbito eobjectivos. O importante era o NÚ-MERO.

Prof. José Manuel Silva

Que futuro para os HUC e o SNS?

opinião

Dr.ª Teresa Lopes

A receita do nosso descontentamento

Mas então, afinal…

Dr. José Diniz Vieira

Código Deontológico

Prof. Carlos Costa Almeida

Prof. Massano Cardoso

Vinismo

Dr. Ricardo Gabriel

USF em choque tecnológico

A necessidade de pu-blicação do programado internato de Medici-na Geral e Familiar(MGF), o aumento dotempo de formação, averificação das idonei-dades e capacidadesformativas, quer dosorientadores de forma-ção, quer dos servi-ços, e a falta de médi-cos de família foramalgumas das questõesabordadas durante amesa redonda realiza-da na Secção Regio-nal do Centro da Or-dem dos Médicos, emCoimbra, com o tema“Os Internos e a Medi-cina Geral e Familiar –presente e futuro”.

Presente e futuro do Internato de MGF

Memórias da vida da Dr.ª Luísa Paiva de CarvalhoCom 91 anos, a Dr.ª MariaLuísa Paiva de Carvalho man-tém a juventude de espírito.Todos os dias, seja Verão ouInverno, sai de casa às 8h30para ir tomar café e ler os jor-nais, acompanhando comatenção e preocupação tudo oque se passa no mundo. Parahomenagear uma vida dedica-da à Medicina, a SRC visitou amédica, em Coimbra.

B O A S F E S T A SB O A S F E S T A SVamos entrar num períodode Festas Natalícias.

O Conselho Regional doCentro deseja

a todos os colegasum Natal Feliz, na companhia

de todos os familiares, e um

2009 pródigo em felicidade.

Page 22: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

B O L E T I M . I N F O R M A T I V O Novembro/Dezembro 2008

Boletim InformativoSecção Regional do Centro

Av. Afonso Henriques, 39. 3000-011 – Coimbra

tel. 239792920, telm. 962128252e-mail: [email protected]

site: www.omcentro.com

Propriedade:Secção Regional

do Centro

Director:Prof. Doutor José

Manuel Silva

Redacção:GABINETE DE

COMUNICAÇÃO

Coordenadora:Dr.ª Paula Coutinho

Assessor:Dr.ª Maria Filipa Seabra Pereira

Colaboradores:Dr.ª Ana BentoDr. Ávila Costa

Dr. Carlos OrdensDr. Celso CruzeiroDr.ª Marília PereiraDr.ª Teresa Lopes

Presidentes dosConselhos Distritais:

Dr.ª Constança MariaTipping Miranda

(Aveiro)Dr. Ernesto Rocha(Castelo Branco)Dr. José Couceiro

(Coimbra)Dr. Augusto Lourenço

(Guarda)Dr.ª Ana Rodrigues

de Barros(Leiria)

Dr. José Pedro Saraiva(Viseu)

Tesoureira:Dr.ª M.ª dos Prazeres

Francisco

Secretariado:Isabel Santos

Fotografia:Foto Paulos

FICHA TÉCNICA

Sanosseguros: Diariamente – 15h00 às 18h00

Gabinete jurídico:Sextas-feiras – 14h00 às 17h30

Secretaria: Manhã – 9h00 às 12h00Tarde – 14h00 às 18h00

H o r á r i o d e f u n c i o n a m e n t o d a S e c ç ã o R e g i o n a l d o C e n t r o

A Secção Regional do Centro da Ordem dosMédicos, reconhecendo a meritória obra da Ca-sa dos Pobres de Coimbra, decidiu associar-sea esta instituição promovendo um almoço-conví-vio para o qual convida todos os médicos que aele se queiram juntar.

Este almoço-convívio terá lugar no dia 21 deJaneiro de 2009.

Aceitam-se inscrições na sede da SecçãoRegional do Centro da OM, por telefone (239792 920) ou e-mail ([email protected]).O preço por pessoa é de 20 euros.

Porque a solidariedade não pode ser uma pa-lavra vã, a SRC gostaria que os Médicos en-chessem o refeitório da Casa dos Pobres.

livros

iniciativa

“Voo adormecido” e “Mo-mento”, livros de poesia daautoria do Prof. Norberto Ca-nha, professor jubilado e anti-go director do Serviço de Or-topedia dos Hospitais da Uni-versidade de Coimbra e edita-do pela editora Minerva Coim-bra, foram apresentados re-centemente na Secção Regio-nal do Centro da Ordem dosMédicos.

Também o livro “Até o DiaboTem as Malas Feitas” , da auto-ria do Dr. Henrique Pinto, espe-cialista em Saúde Pública econsultor da Organização Mun-dial de Saúde, da UNICEF e do Centers for Di-sease Control and Prevention, foi lançado naSecção Regional do Centro. O livro reúne umconjunto de crónicas escritas pelo autor nos úl-timos anos, que surgem como reflexões sobreacontecimentos significativos, mas tambémacerca das suas muitas viagens, quer como

consultor das organizações desaúde, quer como membro domovimento rotário, no âmbitodo qual tem estado envolvidono plano de erradicação dapoliomielite em diversos Paí-ses.

De igual modo, se sugere aleitura do livro “Plantas na Te-rapêutica – Farmacologia eEnsaios Clínicos”. Da autoriade dois médicos e dois farma-cêuticos, a obra é um manualpara o ensino na área da saú-de, que pretende colmatar afalta de uma publicação em

língua portuguesa que aborde este tema deuma maneira cientificamente correcta e inde-pendente. Os autores de “Plantas na Terapêu-tica” são A. Proença da Cunha, Frederico Tei-xeira, Alda Pereira da Silva e Odete RodriguesRoque e a edição é da Fundação Calouste Gul-benkian. Os pedidos podem ser feitos a [email protected].

Leituras para todos

Almoço de solidariedade na Casa dos Pobres de Coimbra

Page 23: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

B O L E T I M . I N F O R M A T I V ONovembro/Dezembro 2008

Nos últimos dias a opinião pública viu-seconfrontada com a aparente descida donosso SNS de um honroso 12.º lugar paraum 26.º. Nem interessava ver se as classifi-cações eram comparáveis no seu âmbito eobjectivos. O importante era o NÚMERO. Omote estava dado e para alguns críticos, co-mo eu, da bondade de algumas “reformas”na saúde, aí estava a confirmação!!!

Fui então ler o estudo, “The 2008 Euro-pean Health Consumer Index”, da respon-sabilidade da Health Consumer Powerhou-se, que nos colocava em 26.º num rankingde 31 países europeus. Aparentemente na-da de novo para quem anda habituado a vero país na cauda dos ditos rankings.

Os autores, na sua introdução, até afir-mam que o estudo serve também: To me-dia, the ranking offers clear-cut facts for con-sumer journalism with some drama into it.

Deparei então com algo um pouco diferen-te daquilo a que estamos habituados entrenós: tratava-se de um estudo que dizia pre-tender comparar 34 indicadores, na suagrande maioria pela óptica dos consumido-res. A curiosidade aumentou, pois bem melembrava de um estudo pioneiro, entre nós,de Villaverde Cabral, que causou muitos en-gulhos àqueles que com o objectivo de im-plementarem investimentos comerciais naSaúde (ainda me lembro de ver na TV umasra. engenheira dizendo que melhor que onegócio da saúde só o das armas!!!) preten-diam denegrir o Serviço Nacional de Saúde.

Estava pois à espera de que as fontes dosdados fossem organizações de utentes e játinha preparado alguns argumentos, comoas diferenças culturais, as diferenças de in-formação, etc. Mas não, a grande maioriados dados tem origem naquelas fontes ha-bituais, OCDE, WHO, etc., e outras muito lo-calizadas. Os próprios autores se queixamda fiabilidade dos dados, apontando parauma melhoria da sua qualidade como umanecessidade óbvia, e lamentam: “The HCPwould love to have national consumer orga-nisations represented in our expert panels.Sadly, these groups seldom engage in heal-thcare matters”.

O primeiro ponto do relatório ainda me dei-xou mais cauteloso. Habitualmente, em re-latórios de muitas páginas, a tendência doleitor é de ler o princípio e de seguida asconclusões, porque o tempo que temos é li-mitado. E eis que o primeiro ponto – 1.1BBB; Bismarck Beats Beveridge – yetagain! – informa que os 10 primeiros classi-

ficados são dos de Bismarck!!! Em lingua-gem comum, seguros de saúde contra osbeveridgeanos Serviços Nacionais de Saú-de.

Perante este início, que afrontava as mi-nhas convicções, a resolução foi ler commaior cuidado o dito relatório, cuja leituracontinuo a aconselhar. E foi compensador.Não vou discutir a metodologia do trabalho,nem o sistema classificativo e seus critérios(bom, assim-assim e não tão bom), nem afalta de adequação de algumas classifica-ções atribuídas ao nosso sistema de saúde,que saltam aos olhos.

É também curioso verificar que dizem osautores: “This procedure had been preparedfor during the spring and summer of 2008 byextensive mail, e-mail, telephone contactsand personal visits to ministries/agencies”.

E apresentam em quadro os países queresponderam. Portugal não respondeunem em 2007, ao relatório anterior, nemem 2008.

Outro factor curioso é o dos “pagamentosinformais aos médicos”, incluídos na rubricaBlack Market for Healthcare Information:“The cross-European survey on informalpayments is, in spite of its obvious imperfec-tions, the first one in history, which also illus-trates the low level of attention paid by na-tions and European institutions to the pro-blem of parallel economy in healthcare.

This observation gives reason for twoquestions:

1. Unlike other professionals, such as airli-ne pilots, lawyers, systems engineers etc.working for large organisations, doctors areunique in being allowed to run side jobswithout the explicit permission of the main

employer. What is the reason(s) for keepingthat?

2. What could be done to give doctors “nor-mal” professional employment conditions,i.e. a decent salary and any extra energyspent on working harder (Yes, and makingmore money) for the main employer?”

Interessantes perguntas, que mereceriaminteressantes respostas.

Sublinho um dos factores novos introduzi-dos no estudo e que foi a e-Health. Faço-o,não pela confusão de designação em queos próprios autores caem ao generalizaremo conceito (prescrição electrónica, registosclínicos, etc.) e ao não o analisarem naperspectiva do consumidor (quem é o donodos dados, quem os armazena, quem ospode alterar). Realço este factor para dizerquão atrasados estamos neste campo eque se torna urgente uma ampla discussãodeste tema. Quando há dois anos questio-nei publicamente uma Secretária de Estadoda Saúde, ela respondeu-me em termos deexistência de computadores e de redes in-formáticas. Mas o que está aqui em causa émuito mais relevante em termos de direitos,liberdades e garantias dos cidadãos.

O que está em causa é de quem é a pro-priedade da informação que está nos taiscomputadores e na tal rede. Se neste mo-mento há Estados na Europa em que a pro-priedade é levada ao extremo de o doentepoder apagar a informação (com ou sem“rasto” informático) que vai apresentar aopróximo médico que o observe, noutros pro-cura-se separar os dados objectivos do quepode ser considerada propriedade intelec-tual do médico.

O que está em causa é quem tem o direi-to ao acesso e que salvaguardas de segu-rança.

O que pode estar em causa é algo queconsta em todos os Códigos Deontológicose que se chama sigilo profissional.

Será este um preço que como cidadãosvamos ter que pagar?

Àqueles que se servirão deste relatório pa-ra mais uma vez denegrirem o Serviço Na-cional de Saúde deixo a pergunta:

Este posicionamento em 26.º lugar foi in-fluenciado pela proliferação explosiva dehospitais privados, seguros de saúde e pelatão apregoada empresarialização feita porempresarializadores de curricula partidário?

*Membro do Conselho Regional do Centro da Ordem dos Médicos

editorial

� Dr. Fernando Gomes *

Em 26.º...

Page 24: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

B O L E T I M . I N F O R M A T I V O Novembro/Dezembro 2008

O papel do clínico de Medicina Geral eFamiliar no actual contexto da reforma daSaúde, que elegeu como uma das suasprioridades a reestruturação dos Cuidadosde Saúde Primários, é incontornável.

A actuar na primeira linha do Sistema deSaúde, o médico de família desenvolveuma das práticas clínicas mais complexase desgastantes. Aborda tipologia vária deproblemas de saúde, assiste a todo o tipode pessoas, e de doentes, nos mais diver-sificados contextos familiares e sociais. De-para-se com situações complexas sem asprotecções técnicas de que dispõem os es-pecialistas hospitalares. Com todo o rigorda palavra, é uma arte ser médico de famí-lia, ser especialista em pessoas. Assim, ointernato médico em MGF terá que conterem si particularidades que deverão permitiro treino adequado para um desempenhode sucesso no futuro.

Estes tempos actuais colocam, inquestio-navelmente, novas necessidades e exigên-

cias em Saúde e crescentesdesafios à prática da Medici-na Geral e Familiar. O enve-lhecimento da populaçãoportuguesa, e da regiãoCentro em particular – ondevive cerca de meio milhão decidadãos com mais de 65anos – veio trazer, concomi-tantemente, um maior núme-ro de cidadãos com doençascrónicas incapacitantes aque a MGF tem de dar res-posta. A sociedade actual,movida por um consumismoagressivo, profissionalmente mais exigentee muito complexa a nível de valores e rela-cionamento humano e social, tem contri-buído para um mau estar psicológico gera-dor de comportamentos e hábitos que de-mandam dos cuidados primários uma inter-venção rápida e direccionada. O alcoolis-mo, as toxicodependências, a violência fa-

miliar exigem hoje a aten-ção do médico de MGF,bem como as novas epi-demias como a obesida-de, as doenças cardio-vasculares e, natural-mente, as neoplasias.

O treino em internatodeve, por isso, privilegiarestas áreas.

Detenhamo-nos agora,um pouco detalhada-mente, sobre alguns dosprincipais aspectos da re-

forma da Saúde no que respeita aos Cui-dados de Saúde Primários, nos quais osnovos internos deverão participar e enqua-drar-se activamente:

Como sabem, os Cuidados de Saúde Pri-mários têm vindo a assumir novo figurino,consentâneo com novos tempos que de-mandam essa verdadeira essência da me-

destaque

A necessidade de publicação do programa do Internato de Medicina Geral e Familiar (MGF), o aumento do tempo de for-mação, a verificação das idoneidades e capacidades formativas, quer dos orientadores de formação, quer dos serviços, e afalta de médicos de família foram algumas das questões abordadas durante a mesa redonda realizada, a 4 de Novembro, naSecção Regional do Centro da Ordem dos Médicos, em Coimbra. Intitulada “Os Internos e a Medicina Geral e Familiar – pre-sente e futuro”, a mesa redonda foi moderada pelo Bastonário da Ordem dos Médicos, Dr. Pedro Nunes, e contou com as in-tervenções dos Dr.s João Pedro Pimentel, Presidente da Administração Regional de Saúde do Centro, José Silva Henriques,Presidente do Colégio da Especialidade de Medicina Geral e Familiar, Isabel Caixeiro, Presidente do Conselho Regional doSul e representante da UEMO, Maria dos Prazeres Francisco, membro do Conselho Regional do Centro, Rui Nogueira, Coor-denador do Internato de Medicina Geral e Familiar da Zona Centro, e Inês Rosendo, membro do Conselho Nacional do Médi-co Interno. Nas páginas seguintes publicamos as intervenções apresentadas pelos oradores na mesa redonda.

Na mesa, os Dr.s Inês Rosendo, Silva Henriques, Isabel Caixeiro, Pedro Nunes, João Pedro Pimentel, Maria dos Prazeres e Rui Nogueira�

Internato de MGF e reforma da Saúde

� Dr. João Pedro Pimentel*�

Page 25: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

B O L E T I M . I N F O R M A T I V ONovembro/Dezembro 2008

dicina familiar e respostas prontas e efica-zes às necessidades dos utentes dos ser-viços de saúde.

* Criação de USF: organizadas volunta-riamente pelos profissionais em equipa,baseadas no modelo da intersubstituiçãoapoiadas por um sistema de informaçãoque regista e processa a informação ne-cessária e útil , e um regime remuneratórioque se pretende que seja, cada vez mais,associado ao desempenho, medido por ob-jectivos e metas contratualizadas e avaliá-veis.

* Criação dos ACES: estão em forma-ção. Gozam de autonomia administrativa esão constituídos por várias unidades fun-cionais, que agrupam um ou mais centrosde saúde, tendo por missão garantir aprestação de cuidados de saúde primáriosà população de determinada área geográ-fica e assentam numa equipa multiprofis-sional, com autonomia organizativa e técni-ca, estando garantida a intercooperaçãocom as demais unidades funcionais docentro de saúde e do ACES.

Destas unidades funcionais constam:• Unidades de Cuidados na Comunidade;• Unidades de Saúde Pública;• Unidades de Recursos Assistenciais

Partilhados;As USF e as unidades de cuidados de

saúde personalizados são as unidades on-de a aprendizagem dos internos deve sermais focalizada.

* Unidades Locais de Saúde: Modeloque visa optimizar a resposta dos serviçosatravés de uma gestão integrada das vá-rias unidades de saúde da região. A cria-ção das ULS procura ser uma via para me-lhorar a interligação entre centros de saúdee hospitais e ainda com outras entidades li-gadas à saúde regional ou local.

Pretende-se, em suma, rentabilizar umacapacidade hospitalar instalada, através dadefinição de uma carteira de serviços dediagnóstico e terapêutica disponíveis noscentros de saúde da sua área de acção,criar consultadoria hospitalar nos centrosde saúde, a partir dos principais serviçosde referenciação de cada um, coordena-das e acompanhadas em conjunto pelosdirectores dos serviços hospitalares envol-vidos e dos centros de saúde.

* Cuidados Continuados Integrados:Implicada na ampla reforma da saúde, aRede Nacional de Cuidados ContinuadosIntegrados pretende ser uma resposta ca-bal para os cidadãos com necessidadesassistenciais especiais – idosos e pessoascom dependência – e acaba por implicarigualmente as equipas de profissionais doscentros de saúde.

Os cuidados continuados não são ape-nas unidades de internamento. Os cuida-dos domiciliários são agora a forte aposta aeste nível e exigem uma verdadeira articu-lação da RCCI com os centros de saúde.

OS MÉDICOS DE MGF NA REGIÃO CENTRO

Actualmente, existem cerca de 1500(1485 número exacto) médicos de MGFem exercício nos 6 distritos da região Cen-tro. Mais de 60% destes médicos tem ida-des compreendidas entre os 50 e os 60anos, logo seguidos de uma faixa etáriaque vai dos 40 aos 50, o que determinaráque, por volta do ano de 2015, o número demédicos de família possa ser insuficiente.

Independentemente do número de médi-cos de MGF em exercício, factores há quedificultam a sua distribuição de forma maiseficaz: a existência de um elevado númerode extensões de saúde dispersas na re-gião centro (cerca de 700), bem como adesactualização das 400 bases de dadosdo SNS, que, logo que concluída a actuali-zação já em curso, constituirá um excelen-te instrumento de planeamento em cuida-dos de saúde primários.

Tendo em conta as reais necessidadesde saúde da população anteriormente refe-ridas, o seu envelhecimento, bem como oenvelhecimento dos médicos de MGF, épreciso aprofundar o aumento do númerode internos e de MGF que tem vindo a serfeito nos últimos anos, sendo que a ARSCpropôs, para 2009, a abertura de mais de60 vagas no internato de MGF, o que nosaproxima do objectivo definido pelo minis-tério da saúde e que é de 30% de vagas deMGF sobre o total de vagas. É imperiosoprosseguir este caminho ainda que, episo-dicamente, possa haver algum excesso demédicos de MGF.

No fundo, deseja-se que todas as entida-des responsáveis pelo internato (ARS,ACSS, Ordem dos Médicos e os organis-mos dos Internatos) convirjam para que o

reconhecimento das idoneidades e a fixa-ção das capacidades formativas sejam ri-gorosas e adequadas.

Face ao anteriormente exposto, em que anovos desafios e novas exigências técni-cas se colocam ao médico de MGF do sé-culo XXI, a actualização dos curricula e oaumento do tempo de formação são duascondições essenciais para a adequação dopapel do interno às exigências, em saúde,desta sociedade do século XXI. Há, semdúvida, que desenvolver novas capacida-des.

Entre essas novas capacidades requeri-das, insere-se a necessidade de domíniodas novas tecnologias de informação e co-municação, área que deverá obrigatoria-mente fazer parte da formação dos médi-cos de MGF. Aqui se insere o exercício datelemedicina, instrumento precioso de liga-ção entre hospitais e centros de saúde, noâmbito de especialidades como a pediatria,cardiologia, imagiologia, dermatologia, en-docrinologia, obstetrícia.

Outra área a valorizar no internato será amelhoria da comunicação entre profissio-nais da medicina. Aperfeiçoamento da co-municação entre profissionais entre si, e acomunicação médico-doente é fundamen-tal para o êxito dos novos modelos organi-zacionais em curso nos centros de saúde.A comunicação directa e em tempo útilcontribui para a eficiência e eficácia dosserviços e a confiança que deve existir en-tre as equipas de profissionais.

Por outro lado, num tempo como o nosso,neste como noutros internatos, deve serpermitida e estimulada a realização de pro-gramas de investigação clínica e progra-mas de doutoramento, favorecendo-se aaproximação entre as unidades de saúde eoutros centros do conhecimento.

Finalmente, num tempo de recursos fini-tos, é necessário no internato uma primei-ra abordagem aos impactos económicos fi-nanceiros que as propostas, os actos mé-dicos e as opções terapêuticas determi-nam. Por isso, o ensino da economia dasaúde deverá, obrigatoriamente fazer partedo programa de internato.

Caros colegas, ficaram aqui, de uma for-ma despretenciosa, algumas notas, nãoexaustivas, sobre as múltiplas potenciali-dades do internato médico da MGF e docenário que o envolve.

*Presidente da Administração Regional de Saúde do Centro

Page 26: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

A evolução do programade Internato de MedicinaGeral e Familiar (MGF) de 3para 4 anos é uma necessi-dade sentida e desejada portodos os envolvidos noprocesso. Há mais de 10anos que se discute oassunto. Em Outubro último,a Ordem dos Médicos envi-ou os fundamentos do novoprograma elaborado peloColégio de MGF para oConselho Nacional doInternato Médico. Falta

agora a publicação da portaria de modo a poder entrar emvigor em Janeiro de 2009.

A falta de médicos de família foi um dos argumentos usadosno passado para não publicar o programa de 4 anos. Hoje nãoé argumento válido. Por vários motivos, mas principalmentepela necessidade de desenvolver a formação médica daespecialidade em áreas julgadas fundamentais.

E, se outros argumentos não houvesse, deve referir-se quea evolução do número de médicos de família do SNS no con-tinente teve uma variação positiva de 2,3% no período de2002 a 2006 (Gráfico 1).

Por outro lado, o número de ingressos no internato da espe-cialidade de MGF teve um aumento de quase 50% nos últi-mos quatro anos (2005 a 2008), em relação aos quatro anosanteriores (2001 a 2004). E é previsível que venha a aumen-tar a um ritmo maior nos próximos anos (Gráfico 2), quer de-vido ao aumento relativo de vagas atribuídas a MGF, querpelo aumento absoluto de candidatos ao internato médicodecorrentes do aumento de ingressos nas faculdades demedicina. Em 2009 ultrapassaremos pela primeira vez os 300ingressos no internato de MGF e em 2011 passaremos os 400ingressos.

Nos últimos 10 anos os ingressos nas faculdades de medi-cina aumentaram 188%. É bom notar que o aumento donúmero de alunos de medicina começou a ser notório a partirde 2000 e só agora está a produzir efeitos nos ingressos nointernato médico. Os internos que receberemos em Janeirodo próximo ano nos internatos de especialidade entraram nasfaculdades de medicina no ano lectivo de 2001/02, isto é,ainda no início da curva ascendente de ingressos nas facul-dades. Estamos apenas no início da formação médica emlarga escala.

O trabalho das faculdades de medicina está a produzir osseus efeitos. Mas é preciso saber esperar pelas consequên-

B O L E T I M . I N F O R M A T I V O

destaque

O programa do Internato de MGF e o mito da falta de médicos de família

Novembro/Dezembro 2008

� Dr. Rui Nogueira *�

GRÁFICO 1

GRÁFICO 2

GRÁFICO 3

Page 27: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

A Especialidade de Me-dicina Geral e Familiar(MGF) é uma especiali-dade complexa, pela suaabrangência e modo deabordar a pessoa, poden-do o seu exercício tornar-se desgastante, quandoas condições para a suapraxis não são as melho-res, como más instalaçõesou quando a burocraciaimpera, sendo esta já,uma autêntica instituiçãonacional.

A escolha da Especialidade de MGF pe-los estudantes de Medicina e jovens mé-dicos é um problema multifactorial. De-pende entre outras variáveis: de uma for-mação pré-graduada com pouco investi-mento numa Medicina preventiva e deCuidados de Saúde Primários, de proxim-idade das populações, em detrimento deuma formação fortemente “hospitalocên-trica” e tecnológica e, também na poucaimportância da transmissão de valoreséticos e humanísticos nessa formação;da existência de poucos professores deMedicina Geral e Familiar nas Facul-dades; do acompanhamento dos estu-dantes durante o seu estágio nos Cuida-dos Primários por tu-tores de MGF qualifi-cados; de um progra-ma de formação atrac-tivo e bem estrutura-do, quer do ponto devista das técnicas decomunicação, procedi-mentos técnicos e degestão; da qualidadede Orientadores deFormação de MGF nocampo pedagógico,assim como no desempenho técnico-científico; de espaços físicos ondedecorre a formação pós-graduada.

O prestígio da especialidade é tambémum factor importante para a sua escolha.A MGF é uma especialidade cujo prestí-

gio se afirmou e se impôsjunto dos cidadãos, comorevela um estudo de 2005(Hespanhol A: A imagemdos serviços de saúde edos médicos de famíliaem Portugal. Rev Por ClinGeral; 21:185-91).

Voltando ao Programade Formação Específicade MGF, torna-se impe-rioso, pela abrangênciada sua prática, formar osfuturos Médicos de Fa-mília com um Programa

que contemple um tempo de formação depelo menos de 5 anos, não sendo escan-daloso se passasse a ser de 6 anos, pro-porcionando um treino mais adequado àsexigências da praxis da Especialidade,em serviços e com orientadores, logica-mente, idóneos para a formação emMedicina Familiar.

As idoneidades formativas são umacompetência da Ordem dos Médicos(OM), através dos seus órgãos consul-tivos, os Colégios da Especialidade. OsOrientadores de Formação de MGF têmobrigatoriamente de estar inscritos noColégio da Especialidade.

A atribuição das capacidades formati-vas, a nível nacional,é uma prerrogativa doMinistério da Saúde,baseada nas idonei-dades formativas fac-ultadas pela OM. Noentanto, esta prerrog-ativa poderia e deve-ria ser alargada a enti-dades privadas, coop-erativas ou de soli-dariedade social, deprestação de cui-

dados de saúde, sempre no pressupostoque os respectivos serviços tivessem aidoneidade formativa atribuída pelaOrdem dos Médicos.

*Presidente do Colégio da Especialidade de Medicina Geral e Familiar

B O L E T I M . I N F O R M A T I V O

destaque

O Internato Médico da Medicina Geral e Familiar

Novembro/Dezembro 2008

� Dr. José Silva Henriques*�

cias da planificação. E não deve seresquecida a necessidade de olhar ofuturo e avaliar as necessidades demédicos a 10 anos de distância.Quantos médicos teremos em 2020 noSNS? Os ingressos nas faculdades em2010 deverão depender das necessi-dades do país lá para 2020. A diminuiçãoprogressiva de vagas nas faculdades demedicina não é difícil de prever a partirde 2010 para evitar nova acumulação demédicos.

O esforço na formação médica nestaespecialidade justifica-se pela acumu-lação de médicos de família numa faixaetária e a consequente aposentaçãomassiva num curto espaço de tempo. NaARS Centro, 67% dos médicos defamília estava na faixa etária dos 50-59anos em Junho de 2006 (Gráfico 3). Asituação é semelhante em todo o país.

Em 2009 ultrapassaremos pelaprimeira vez os 300 ingressos no inter-nato de MGF e em 2011 passaremos os400 ingressos.

Mas até 2015 aposentar-se-ão cercade 4000 médicos de família. E até lá for-maremos apenas cerca de 2500. Mesmocom o aumento significativo do númerode vagas no internato da especialidade.Mas não é o programa de 4 anos que vaiatrapalhar esta falta, antes pelo con-trário.

Em Janeiro de 2009 teremos a últimaoportunidade de aumentar o internato deMGF de 3 para 4 anos sem causar difi-culdades de falta de médicos de família.Devido à reforma do internato médico(DL 203/2004 de 18 de Agosto) ocor-reram três ingressos de internos (alémdos 3 concursos extraordinários) numcurto espaço de 16 meses. Esta concen-tração vai originar uma acumulação demédicos de família recém-formados em2010, ainda antes do período crítico deaposentações em grande número. Apassagem de 3 para 4 anos de internatoem Janeiro de 2009 facilita o descon-gestionamento desta acumulação.

É urgente aprovar e publicar o novoprograma de MGF. A oportunidade éesta. A necessidade há muito que é sen-tida.

*Médico de Família, Centro de Saúde Norton de Matos,Coimbra

O prestígio da especialidade é um

factor importante paraa sua escolha. A MGF éuma especialidade cujo

prestígio se afirmou e se impôs junto

dos cidadãos.

Page 28: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

A minha experiência nas reuniões médi-cas internacionais fez-me olhar para a nos-sa realidade com outros olhos. Partindo danossa quase intrínseca sensação de estar-mos atrasados para apanhar o comboio dodesenvolvimento, verifiquei que afinal nospaíses que considerava avançados algoestava bem pior do que no nosso “cantinhoà beira mar plantado”.

Nas primeiras reuniões da UEMO –União Europeia dos Médicos de ClínicaGeral a que assisti em 1999, um grupo detrabalho sobre igualdade de oportunidadesdebatia problemas como o pagamento di-ferenciado pelo sexo (com as médicas areceberem menos que os médicos na Sué-cia) ou as especialidades hospitalares me-lhor remuneradas que a clínica geral.

Em Portugal há muito que as CarreirasMédicas Hospitalar, de Clínica Geral e deSaúde Pública tinham igual estrutura e re-muneração, a especialidade de MedicinaGeral e Familiar era já um dado adquirido enão passaria pela cabeça de ninguém quese pagasse mais aos médicos que às mé-dicas!

Aos poucos fui conhecendo melhor a rea-lidade europeia e fui constatando que osnossos internatos de especialidade eramdos melhores estruturados.

Apercebi-me também que, na Directivaque regula a livre circulação de profissio-nais na UE pelo reconhecimento automáti-co das suas qualificações, a Medicina Ge-ral e Familiar estava num Anexo diferentedas outras especialidades e que em muitospaíses europeus não era considerada se-quer especialidade.

Muito se evoluiu desde que a UEMO foifundada, em 1967, tendo sido reconhecidoque para se exercer medicina geral nossistemas de segurança social dos diferen-tes países era exigível ter feito uma forma-ção específica de dois anos (actualmentetrês) após a licenciatura.

Cada vez mais se reconhece que a sus-tentabilidade dos Sistemas de Saúde é in-fluenciada positivamente pela existênciade cuidados primários qualificados e estru-turados.

O principal objectivo da Presidência Por-

tuguesa da UEMO, que se iniciou em2007, é o reconhecimento da Especialida-de de Medicina Geral e Familiar em todosos países europeus com igual dignidade ereconhecimento socioeconómico das ou-tras especialidades.

O futuro da Especialidade é também umadas nossas preocupações, objecto de umgrupo de trabalho. O envelhecimento dosmédicos de família e a insuficiente opçãopela MGF, pelos mais jovens, são transver-sais a todos os países e daí a importânciadeste debate.

Comparativamente com os 24 países queactualmente estão representados na UE-MO, Portugal tem um programa de forma-ção de MGF com vasta experiência e qua-lidade que nos coloca muito à frente de ou-tros países europeus. Por exemplo, a Fran-ça só recentemente reconheceu a especia-lidade e o Reino Unido, muitas vezes apre-sentado como modelo, ainda pondera essereconhecimento.

Muito tem sido feito, mas urge que sejaaceite pelo Ministério da Saúde a propostado aumento do tempo de formação daMGF de quatro para cinco anos (incluindoo Ano Comum), há muito aprovado pelaOrdem dos Médicos e enviado à tutela.

Muito há ainda a corrigir e melhorar, masacredito que o futuro da especialidade estágarantido, com o entusiasmo dos jovensmédicos que escolhem a MGF como pri-meira opção, a experiência e a motivaçãodos orientadores de formação e o empe-nhamento do Colégio de Especialidade.

*Representante da UEMO; Presidente do Conselho Regional do Sul da Ordem dos Médicos

Esta mesa redonda foi organizada pelaSecção Regional do Centro da Ordem dosMédicos na sequência da necessidadesentida por internos de Medicina Geral eFamiliar (MGF) e também dos respectivosorientadores em discutir com todas as es-truturas responsáveis o estado presente eo futuro do Internato.

Temos o péssimo hábito de só nos reunir-mos para debater situações que são tidascomo problemáticas de preferência paraapontarmos o dedo ao culpado e com issoencerrarmos alegremente a situação.

A nossa reunião hoje tem um perfil dife-rente deste. Encontram-se nesta mesa to-dos os responsáveis pelo Internato emMGF: ARS Centro, Coordenação do Inter-nato Complementar de Clínica Geral daZona Centro, Ordem dos Médicos, Inter-nos. E o objectivo é identificar o que nãotem corrido bem, como aconteceu, e deque forma o podemos resolver.

Para tudo o que fazemos na vida, querem termos profissionais, quer em termospessoais, regemo-nos por regras. Em rela-ção ao Internato de MGF existem leis e re-gras: Decreto-lei 60/2007, de 13 de Março;Regulamento Geral dos Colégios das Es-pecialidades; Normas do Colégio de Medi-cina Geral e Familiar de 1995. Indepen-dentemente de podermos concordar ounão com estas regras, se elas fossemcumpridas muitos dos problemas que hojevão ser aqui elencados pura e simples-mente não surgiriam.

Apesar de, pessoalmente, me sentir mui-to lisonjeada quando todo e qualquer diri-

B O L E T I M . I N F O R M A T I V O

destaque

Será que a Europa podeaprender com Portugal?

A Ordem e o Internatode MGF

Novembro/Dezembro 2008

Dr.ª M.ª dos Prazeres Francisco�

� Dr.ª Isabel Caixeiro *�

Page 29: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

B O L E T I M . I N F O R M A T I V O

destaque

Os internos e a MGF: presente e futuro

Quanto à visão dos inter-nos e, para melhor expor osseus pontos de vista, foi fei-to um inquérito online, de 1a 4 de Novembro de 2008,sobre o assunto, que obte-ve 93 respostas. Estaamostra era 72% do sexofeminino (que é o sexo maisprevalente nos internos daespecialidade) e equitativa-mente distribuída pelo país:32% da zona Norte, 37% da zona Centroe 31% da zona Sul (incluídos neste grupocinco das ilhas), segundo a divisão dascoordenações de Internato de MedicinaGeral e Familiar. A maioria das respostas(94%) eram de internos (34% há 1 ano,41% há 2 anos, 23% há 3 anos e 1% há 4anos) e, dos recém-especialistas, 33%eram-no há 1 ano e 67% há 3 anos.

A maioria dos inquiridos declarou quevoltaria a escolher Medicina Geral e Fami-liar como especialidade (93%) e os quenão a voltariam a escolher eram todos in-ternos (há 1, 2 ou 3 anos, equitativamentedistribuídos): 67% do sexo feminino emaioritariamente da zona Norte, seguidosdo Centro e do Sul.

As razões mais importantes menciona-das para voltar a escolher a especialidade(figura 1) foram o lado humano da medici-na (86,7%) e a diversidade de conheci-mentos e abrangência do dia-a-dia(84,3%), seguidas da satisfação como pro-fissional (77%). Também foram muitoapontadas razões pessoais /familiares/tempo livre (65%) e a importância da es-pecialidade (49%). Já menos de um terçoapontam como razões que ponderariampara voltar a escolher a especialidade ohorário de trabalho (30,1%), as perspecti-vas de futuro (27,7%) e facilidade de em-prego (21,6%), a autonomia (25,3%) e otrabalho em equipa (24%).

Os internos que não voltariam a escolhera especialidade apontam como principaisrazões as económicas e perspectivas defuturo (83,3%), seguidas da (in)satisfação

como profissional (66,7%).Metade referiu também oisolamento e a escassezde recursos e investi-mento nos cuidados desaúde primários comorazões para não voltar aescolher a especialida-de. Excesso de trabalhoe dificuldade de empregoforam também mencio-nados, em um terço dos

casos.Foi questionada a opinião quanto à for-

mação de Médicos de Família em Portugalnos tempos que correm e esta foi conside-rada organizada (53% dos inquiridos) eacompanhada/tutorizada (57%). O pontopositivo mais referido foi de que esta pre-para para abordar o utente no seu todo(74%), preparando para intervir em estilosde vida e na prevenção (70%), para abor-dar uma família (58%) e para abordar clini-camente uma grande diversidade de pato-logias (56%). O ponto negativo que reuniumais respostas foi a duração insuficientedo internato (95% dos respondentes con-cordaram com isto), sendo o tempo passa-do no centro de saúde insuficiente (78%).Logo se seguiu a falta de uniformidade noPaís (94%), que se sente muito entre ascoordenações do internato no Norte, Cen-tro e Sul. Foi também apontado que a for-mação não promove o conhecimento deoutras realidades (72%), nomeadamentede outros centros de saúde, quer a nívelnacional, quer internacional. Apontou-se afalta de abrangência da formação (65%),que não promove o trabalho em equipa(69%), na comunidade (68%), nem a in-vestigação (65%), e não prepara para agestão do dia-a-dia ou dos recursos desaúde (65%). Sobre este tema foi tambémopinado que o excesso de internos aindanão leva a pouca qualidade na formação(72%) e a formação não é necessariamen-te melhor nas Unidades de Saúde Familia-res (72%).

Foi pedido aos inquiridos que escolhes-

Novembro/Dezembro 2008

gente da Saúde que fala sobre esta espe-cialidade, que é a minha, o que é certo éque depois a prática pouco correspondeaos elogios rasgados e o exemplo mais evi-dente é sermos a única especialidade quenão tem o seu programa de formação pu-blicado em Diário da República. Esta é umaquestão com a qual sempre vivemos, masque inegavelmente nos fragiliza e é de ful-cral importância.

Cabe à Ordem zelar pela qualidade damedicina prestada à comunidade e comotal é responsável por fazer cumprir o pro-grama de formação através de parecer téc-nico sobre a verificação de idoneidade dosOrientadores de Formação e dos respecti-vos Serviços, assim como da fixação da ca-pacidade formativa dos serviços e profis-sionais. A Ordem não vai deixar de exercero seu dever.

Também é de referir a responsabilidadeda tutela do SNS em colocar os médicos re-cém-especializados, tarefa que, nos últimosanos, tem sido inaceitavelmente problemá-tica, com os sucessivos adiamentos dosconcursos, não falando sequer no hipotéticonúmero de vagas que desconhecemos.

Todos os presentes têm o seu papel equota de responsabilidade neste processoformativo. Todos queremos ser bem suce-didos, e portanto há que dialogar, acertardetalhes, limar arestas, equacionar solu-ções e, o que é mais difícil, mas de enormeimportância, colocá-las no terreno.

Uma última palavra para verberar o baixonúmero de internos de MGF presentes nes-te debate, apesar da ampla divulgação domesmo, quando seria de esperar que todosestivessem interessados em discutir equestionar os vários responsáveis presen-tes, nesse lote incluindo o próprio modera-dor, o nosso Bastonário, relativamente aosmúltiplos problemas que putativamente ospossam preocupar. Ou será que devemosconcluir que a nossa juventude não temproblemas nem preocupações? Se assimfor, tudo bem. Mas se esse não for o caso,depois ninguém venha dizer que a Ordemnão se interessa e não se empenha na re-solução desses mesmos problemas. Toda-via, para os presentes, esperamos que te-nham dado por bem empregue o tempoque despenderam neste debate.

*Membro do Conselho Regional do Centro da Ordem dos Médicos

Dr.ª Inês Rosendo�

Page 30: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

sem os pontos mais importantes a melho-rar na formação do médico de família (fi-gura 2) e o aumento do tempo de forma-ção foi o mais referido (65,6%), assim co-mo a formação em áreas de psicologia(comunicação, intervenção motivacional,aconselhamento), formação em áreas téc-nicas (infiltrações, pequena cirurgia, etc.) eformação de tutores. Cerca de metade ain-da achava importante mais formação prá-tica em mais áreas médicas, 40% em ur-gência/emergência e 37,6% em medicinabaseada na evidência. Também cerca demetade dos inquiridos são da opinião queera essencial aumentar o incentivo a co-nhecer outras realidades nacionais e inter-nacionais, uniformizar o internato e cercade um terço ainda achavam importanteuniformizar a avaliação.

Quanto a perspectivas pós-especialida-de estas são bem negativistas (figura 3):não há noção de facilidade em arranjaremprego no presente (66,6% dos inquiri-dos são desta opinião) e no futuro pensa-se que esta facilidade será inferior (77,4%dos inquiridos pensam que não será fácilarranjar emprego no futuro). É quase unâ-nime a dificuldade em trabalhar em zonasde preferência dos médicos, no momentopresente e no futuro (97,8%). Esta dificul-dade de emprego sente-se nos centros desaúde (73,1% no presente e 81,7% no fu-turo) e na dificuldade em criar USF (86%no presente mas com menor percentagemno futuro 83,3%). Também não há noçãode facilidade em trabalhar na privada(81,7% são da opinião que é difícil no pre-sente e 82,8% no futuro). Os contratos sãoconsiderados precários, sem tendência amelhorar (61,3%), mas a remuneração,apesar de baixa no presente (75,3% sãodesta opinião) terá tendência a ser menosreduzida (apenas 66,7% pensam que serábaixa no futuro), talvez aliado à ideia demaior facilidade em criar mais USF no fu-turo. Quanto aos postos de trabalho nopresente, estes são, segundo os inquiri-dos, muito isolados (56%) e, quanto ao fu-turo, as perspectivas de subir na carreirasão nulas (0%) e as perspectivas de havermais carreiras universitárias na área sãobaixas (14% são desta opinião). Ainda as-sim, há esperança de que a imagem daespecialidade vá melhorar (59% são destaopinião).

Concluindo, é da opinião dos internos e

recém-especialistas incluídos neste estu-do que a formação em Medicina Geral eFamiliar é organizada, prepara para umaabordagem holística, mas é pouco unifor-me, pouco virada para o exterior, para acomunidade, para o trabalho de equipa,para a gestão e a investigação. Sugeremque seria importante ter uma duraçãomaior (nomeadamente mais tempo nocentro de saúde), com mais formação emáreas da psicologia e técnicas. E aindaque a formação de tutores é essencial.

Na minha opinião, é necessário não sócriar mais oportunidades mas tambémmais condições para haver esta formaçãode tutores. A visão quanto ao presente efuturo da pós-especialidade é de que sãotempos difíceis em termos de emprego eem termos económicos, havendo no pre-sente um grande isolamento dos recém-

especialistas nos postos de trabalho emque são colocados.

Apesar de tudo isto, a maioria dos inqui-ridos voltaria a escolher Medicina Geral eFamiliar como especialidade pela sua hu-manidade, diversidade e globalidade e háuma confiança na melhoria da imagem daespecialidade. Na minha opinião, apesarde o inquérito ter um viés por seleccionartalvez os mais interessados e informados(a divulgação foi via internet e a respostavoluntária), ele revela uma geração de fu-turos médicos de família preocupados emrelação ao futuro mas interessados, acti-vos, e sobretudo aceitando o desafio e es-perando poder ajudar na melhoria da qua-lidade da especialidade de Medicina Gerale Familiar.

*Interna 2.º ano Medicina Geral e FamiliarCentro de Saúde de Eiras, Coimbra

B O L E T I M . I N F O R M A T I V O Novembro/Dezembro 2008

Figura 2 – O essencial a melhorarna especialidade de Medicina Ge-ral e Familiar, indicado no inqué-rito efectuado

Figura 3 – Perspectivas pós-espe-cialidade no presente e futuro se-gundo opinião expressa no inqué-rito

Figura 1 – Razões para voltar aescolher Medicina Geral e Fami-liar indicadas no inquérito

Page 31: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

B O L E T I M . I N F O R M A T I V ONovembro/Dezembro 2008

É já a medo que, dia sim, dia não, es-preito o site da ACSS à procura do mapade vagas para o Internato Complementarque iniciarei em 2009. A anterior ansieda-de deu, agora, lugar à angústia e à espe-rança de que passe mais um dia sem terde montar um plano. A impaciência – e ur-gência! – para dissecar um mapa de va-gas, estudar todas as opções, reflectir so-zinho e em conjunto, fazer um plano A, umplano B, C e D, deram lugar a um desinte-resse forçado.

À hora a que escrevo este texto (às 22horas do dia 17 de Novembro), encontro-me a exactamente uma semana do iníciodo período de escolha. E ainda não há si-nal do mapa de vagas. Se tivesse acesso,neste preciso momento, a esse mapa, so-brar-me-ia uma semana para decidir osmeus próximos cinco anos e, em últimaanálise, os próximos trinta e cinco. Tendoem conta que a data limite estabelecidapara a publicação do malfadado mapa é ofinal desta semana (e nestas coisas o me-lhor é mesmo contar com o pior), sobrar-me-ão três dias. Um dia útil e um fim-de-semana para fazer listas de prioridades –de especialidades, de hospitais de forma-

ção, de cidades –, para pedir conselhos acolegas mais velhos, para visitar serviços,para ponderar novamente e refazer as lis-tas... Não é difícil perceber que este perío-do de reflexão não passa de um “não-pe-ríodo”, mero pro forma, para que não sediga que escolhemos às escuras, sem co-nhecer de todo as vagas. E torna-se, as-sim, inevitável pensar em razões que jus-tifiquem este adiamento – um atraso, pelacerta. Propositado? Ou simples apatia?Seja qual for a razão, revela uma ausên-cia total de compreensão, de empatia, decomiseração por parte das entidades res-

ponsáveis.Impõe-se uma chamada à razão, para

que os atrasos não se repitam no futuro.Contudo, a manterem-se as datas do pe-ríodo de escolha, já não há muito a fazerpor nós, os que escolhemos este ano.

Começo, por isso, a achar que o melhoré que este mapa não saia de todo. Por-que, no dia em que sair, começa o gotejardas horas e dos minutos, vertiginoso, im-parável. E eu vou ter de me decidir, a bemou a mal. Bem ou mal. Vou ter tempo pa-ra fazer apenas o esboço de um plano, acaminho da ARS, numa qualquer folha on-de outrora imprimira umas análises. Coma sorte que eu tenho, vou de certeza co-meter alguma estupidez ou, pelo menos,escolher alguma especialidade que, den-tro das possibilidades, não era bem o quequeria ou onde queria. Sinto-me, cada vezmais, tentado a acreditar que tudo isto éum esquema para nos passar uma men-sagem dissimulada, superior às preferên-cias de qualquer IAC: o importante é sermédico, não interessa onde nem a fazer oquê, pois tudo o resto é paisagem – será?

*Interno do Ano Comum – HUC

O importante é ser médico

Decorreu entre os dias 20 e 22 de Outu-bro, na Secção Regional do Centro da Or-dem dos Médicos, mais uma MostrEM –Mostra de Especialidades Médicas.

Organizado pelo Conselho Nacional doMédico Interno (CNMI), em parceria com oNúcleo de Estudantes de Medicina deCoimbra e com a Secção Regional do Cen-tro da Ordem dos Médicos (SRC-OM), esteevento vai já na sua 3.ª edição, e tem comoprincipais destinatários os colegas que es-tão agora a frequentar o Ano Comum, e quebrevemente escolherão a sua especialida-de.

Consiste numa curta e informal apresen-tação feita por internos de cada uma destasespecialidades, em que se procuram focaraspectos como as principais áreas de ino-vação, empregabilidade e potenciais vanta-gens e desvantagens da área médica em

que se encontram.Para além das apresentações propria-

mente ditas, outra das virtudes desta inicia-tiva é colocar de forma instantânea em con-tacto os potenciais interessados numa es-pecialidade com quem já a frequenta, po-tenciando-se assim a troca de ideias e mes-mo a visita aos serviços em causa.

Estiveram também presentes o Presiden-te da Secção Regional do Centro da Ordemdos Médicos, Prof. José Manuel Silva, e oPresidente do Conselho Nacional do Médi-co Interno, Dr. Rui Guimarães, que presta-ram à audiência valiosos conselhos para acaminhada profissional agora iniciada pormuitos, assim como uma mensagem dedisponibilidade e apoio por parte das estru-turas que representam.

A resposta à divulgação deste MostrEMfoi maciça, tendo-se contabilizado mais de

200 presenças, só na Secção Regional doCentro. Em todos os presentes se denota-va a curiosidade e ansiedade inerentes aomomento especial nas suas vidas profissio-nais e pessoais que se aproxima. Algunsansiavam pelo conhecimento do último de-talhe que os conduzisse a uma escolhamais fundamentada e esclarecida, a armaque resta a muitos depois das irregularida-des verificadas na última prova de seriação.

Da parte da Comissão Organizadora, ficao agradecimento à Secção Regional doCentro, que patrocinou este evento, assimcomo aos internos que disponibilizaram oseu (quase sempre escasso) tempo para virfalar à MostrEM, e desta forma ajudar osseus colegas mais novos.

A estes últimos, boas escolhas!

Membros do CNMI

MostrEM – Mostra de Especialidades Médicas

espaço do interno

Dr. Manuel Mendes Gomes*�

Page 32: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

B O L E T I M . I N F O R M A T I V O Novembro/Dezembro 2008

um médico, uma vida

Continuando o contacto e a troca devivências com a nossa memória colec-tiva, os colegas que nos precederam, aSecção Regional do Centro da Ordemdos Médicos visitou a Dr.ª Maria LuísaPaiva de Carvalho, nascida em 16 deOutubro de 1917, ano de grandesacontecimentos históricos.

A Dr.ª Maria Luísa, tia de dois distin-tíssimos colegas nossos, Rui Pedro,especialista em Medicina Geral e Fami-liar do Centro de Saúde de Celas/USFCruz de Celas, e José Humberto, pro-fessor de Pneumologia da Faculdadede Medicina, Chefe de Serviço dosHUC e actual Governador Civil do Dis-trito de Leiria, formou-se em 1942, navéspera do seu 25.º aniversário. Alunabrilhante, foi a melhor do seu curso,formando-se com 18,3 valores de mé-dia! Do mesmo curso faziam parte ape-nas mais duas senhoras e 51 homens.Partilhou as salas de aula com colegascomo Fernando Namora, Fernando deOliveira, Viegas de Carvalho e Peres-trelo Cavaco.

Enquanto estudante de Medicina ha-bitou no n.º 1 da Rua de Tomar, um lo-cal celebrizado por Egas Moniz.

Terminada a licenciatura foi assisten-te do Prof. Novais e Sousa na ClínicaDr. Daniel de Matos, antiga maternida-de, onde trabalhou de 1943 a 1945.

Sentindo-se atraída por outras aven-turas concorreu e ganhou o lugar de Di-rectora da Colónia Correccional de S.Bernardino, numa localização aprazívela sul de Peniche. Aí se manteve até1949. Lembra-se muito bem de tudo enão esquece as horas agradáveis quepassou na praia.

Sentiu novamente o apelo da mudan-ça e concorreu para médica escolar noLiceu Infanta D.ª Maria, onde ficou atéà idade da reforma, em 1987. Tantosjovens e professores passaram pelassuas mãos e beneficiaram do seuimenso saber! É caso para dizer, compropriedade, que, em Coimbra, toda a

gente a conhecia.Durante muitos anos viveu num dos

torreões do Colégio Rainha Santa, atése mudar para a Rua do Brasil. Actual-mente vive na Rua do Teodoro, com umcasal que lhe presta o apoio e ajudasnecessárias.

Mas não se pense que se trata deuma velhinha, bem pelo contrário! Con-tinua a ser uma mulher livre e indepen-dente, com a fortepersonalidade quesempre a caracteri-zou. Não admite quelhe digam o que devefazer nem toleragrandes conselhos.

Todos os dias, sejaVerão ou Inverno, saide casa às 8h30 parair tomar café e ler osjornais, acompanhan-do com atenção epreocupação tudo oque se passa nomundo.

Sublinha que sempre fez aquilo deque gostava e que sempre foi muito fe-liz e mimada. À pergunta provocatória

sobre a razão do seu celibato respon-de, sem hesitar, que não se casou por-que não estava nos planos de Deus.Todavia, alguém ao lado sussurrou quea verdadeira razão seria a de não estardisposta a aturar um homem sempre acondicioná-la e a dizer-lhe o que tinhade fazer... Mas afirmou, com uma pon-tinha de emoção, que há um meninoque lhe chama avó!

Imbuída de grandeespírito filantrópico,depois da reforma foivoluntária na Peni-tenciária, nos HUC ena Maternidade Dr.Daniel de Matos.

Ficámos impressio-nados com a sua ju-ventude de espírito eresistência física,apenas maculadapor uma ligeira pres-biacúsia. Nem umpequeno enfarte domiocárdio que teve

há três anos a condicionou. O segredotalvez seja o de sempre ter andado apé!

Dr.ª Maria Luísa Paiva de Carvalho– uma médica de imenso saber

Dr.ª Luísa Paiva de Carvalho, acompanhada pelos sobrinhos, os Dr.s José Humberto e RuiPedro, e pelo presidente da Secção Regional do Centro, Prof. José Manuel Silva

Imbuída de grande espírito

filantrópico, depois da reforma

foi voluntária na Penitenciária,

nos HUC e na Maternidade

Dr. Daniel de Matos.

Page 33: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

B O L E T I M . I N F O R M A T I V ONovembro/Dezembro 2008

De forma esperada e anunciada, poucosanos após o desmoronamento do Comu-nismo, consumou-se a falência dos arautosdo Capitalismo ultraliberal. Depois de cola-borar e permitir a ruína do sistema financei-ro mundial, foi patético ver Alan Greenspanreconhecer que se enganou! Talvez agorahaja condições para aqueles que defen-dem a necessidade de alguma prudênciana empresarialização massiva da saúdeserem escutados com mais atenção e pon-deração.

Sublinhe-se que não contestamos a intro-dução de regras de gestão de tipo empre-sarial na saúde, mas sim a mudança de pa-radigma, pois os algarismos financeirospassaram a substituir os doentes na mis-são dos hospitais! A gestão hospitalar de ti-po empresarial terá as suas virtualidades,nem sequer o contestamos, mas tambémliberta uma verdadeira Hidra de Lerna deproblemas, quase totalmente varridos paradebaixo do tapete quando se faz a análisepolítica e as contas do deve e haver doshospitais EPE. Da mesma maneira como,durante anos, os riscos e problemas dosubprime foram ignorados, até explodiremnas mãos dos teóricos do ultraliberalismo.

Sem quaisquer dúvidas, uma das gran-des lições da crise americana é que é ne-cessário governar com mais rigor, mais se-riedade, mais verdade, mais competência,mais transparência, mais regulação e ummuito maior sentido de serviço público.

Ora, alheado de toda esta nova realidade,recentemente o Presidente do Conselhode Administração (PCA) dos HUC afirmoufascinado que os HUC obtiveram um resul-tado líquido em 2007, leia-se lucro, de 16,5milhões de euros!

No exercício daquilo que Mário Soaresapelidou, e bem, de direito à indignação,não podemos deixar de comentar, sob vá-rios ângulos, esta afirmação do PCA dosHUC, por tudo aquilo que ela traduz relati-vamente ao actual primado da gestão hos-pitalar, alicerçada na mesma filosofia con-tabilística que está na base da crise finan-ceira mundial. Fazemo-lo particularizandoos Hospitais da Universidade de Coimbra,que agora vivem a experiência de passa-

gem recente a EPE, mastemos a consciência queos problemas se repetirãoem muitos outros hospitaisdeste País, colocando ca-da vez mais em causa aqualidade da medicinaportuguesa e do SNS.

Em primeiro lugar, recor-de-se que, em meados de2007, o anterior PCA dosHUC se demitiu afirmandopublicamente que os HUCeram ingeríveis com oscortes financeiros que lhe estavam a serimpostos pelo Governo. Pois bem, não éestranho que, mesmo tendo recebido umreforço de verbas, de repente apareça umMidas que, no mesmo ano, transforma a in-governabilidade dos HUC numa chorudaactividade lucrativa?! O que estará por de-trás deste resultado líquido?...

É evidente que se trata de uma impres-sionante contabilidade criativa e completa-mente desvirtuada. Como diz uma velhamáxima da estatística, “os números podemser martelados até confessarem a verda-de”... Razão tem o Tribunal de Contasquando afirma que os hospitais manipulama sua contabilidade! Faça-se uma auditoriaséria à contabilidade real dos HUC, porquefontes fidedignas garantem que não deu lu-cro real nenhum!

E o que dirá o Governo perante um tãovasto “lucro”? Os HUC devolveram verbasao Governo? Será que para o ano o Gover-no vai reduzir o orçamento dos HUC nummontante correspondente?!

Mais grave ainda, e muito estranho, é umPCA, escondendo o crescente rol de difi-culdades e deficiências que o seu hospitalenfrenta, regozijar-se por obter um “lucro”,ainda que fictício, de tantos milhões! É re-velador de que nem sequer entendeu quea missão de um hospital é tratar doentescom qualidade e não dar “lucro”! Demons-tra uma gestão virada exclusivamente paraos números e para agradar ao Governo enão orientada pelas necessidades do hos-pital e dos doentes. São desnecessárioscomentários adicionais...

Face a este paradoxo fi-nanceiro, é caso para per-guntar: se o hospital deutanto lucro, porque é quenão se investiu na sua mo-dernização tecnológica? Eporque é que existem ser-viços a funcionar abaixodos mínimos? E porque éque foi necessário esperarpela primeira tranche docapital estatutário paracomprar camas novas, hátantos anos requeridas? E

porque é que se pressionam alguns médi-cos para gastarem menos dinheiro em fár-macos, contra as boas práticas da medici-na? E como podem as agulhas descartá-veis de medulograma esgotar no serviçode Hematologia? E porque é que até naSala de Emergência chegam a faltar serin-gas para as bombas perfusoras? E porqueé que se fazem mediáticas campanhas delavagem das mãos mas o papel para aslimpar continua a faltar, obrigando a utilizartoalhas colectivas e encharcadas? E por-que é que a Medicina Interna não tem umaUnidade de Cuidados Intermédios para vi-giar e tratar convenientemente os doentesmais instáveis, reduzindo o risco de compli-cações evitáveis (e que actualmente nemsempre são evitadas, com as inerentesconsequências...)? Porque é que o sistemaALERT está cada vez mais lento e continuacom inúmeras insuficiências e falhas e pro-blemas nas interfaces? Porque é que nãohá mais investimento na informatização pa-ra deixar de ser necessário passar recei-tuário à mão e para informatizar os velhi-nhos processos clínicos (nesta área o hos-pital tem um enorme atraso relativamenteaos Centros de Saúde!)? E para quando arequisição digital de análises clínicas? Eporque é que a resposta aos pedidos de re-novação de material ou de pequenos in-vestimentos nos diferentes Serviços é inva-riavelmente negativa? E porque é que atépara passar um pequeno cheque de pou-cos euros para a assinatura de revistascientíficas, com o dinheiro que legalmentepertence aos Serviços e não ao hospital, os

opinião

Que futuro para os HUC e o SNS?

� Prof. José Manuel Silva *

Page 34: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

HUC demoram tantos meses que o acessoàs revistas acaba por ser bloqueado? Eporque é que não se contratam os recursoshumanos de que o hospital e os doentestanto carecem, nomeadamente na Urgên-cia, onde a procura ultrapassa quase sem-pre a capacidade de resposta com qualida-de, aumentando o sofrimento dos doen-tes? E porque é que, mais uma vez na Ur-gência, há doentes a urinarem-se porquenão há ninguém disponível para lhes che-gar um simples urinol (etc., etc.)? E porqueé que, de forma desumana e com risco deagravamento da sua situação clínica, sedeixam doentes horas infindáveis à esperade serem transferidos da Urgência dosHUC para outros hospitais apenas porquenão existem meios próprios ou contratadospara o transporte de doentes e não há umaescala de enfermeiros para fazer o acom-panhamento destes doentes? E porque éque o bloco cirúrgico da urgência está ofi-cialmente fechado na maior parte do dia (oque já teve consequências...)? Etc., etc.,etc., etc! Tudo com o único objectivo decontribuir para os tais 16,5 milhões de eu-ros de “lucro”... É isto a que alguns cha-mam e elogiam de reforma do SNS?!

Infelizmente, todos os profissionais dosHUC sabem, e os doentes e os seus fami-liares também já o começam a perceber,como no caso do recente esgotamento dasfraldas nos HUC, que foi objecto de recla-mação formal e pública por parte de um fa-miliar, que a missão do actual PCA dosHUC, cumprida sem remorsos, foi a deefectuar cortes chocantemente cegos e ir-racionais em tudo o que fosse despe-sa/compra dos HUC, independentementedas consequências sobre a qualidade defuncionamento da instituição ou das dificul-dades colocadas aos profissionais. Até ossimples clipes estiveram esgotados, sendoas faltas do mais diverso material uma si-tuação recorrente nos HUC, porque os res-pectivos concursos são invariavelmenteadiados para evitar despesa, independen-temente das consequências! Só os núme-ros interessam, com a preocupação daqualidade a passar para um plano comple-tamente secundário! Mas isto é que é boagestão?!

Os nossos aprendizes de gestores preci-sam de reler e estudar William Deming(1900-1993), que há muitos anos afirmouuma verdade insofismável: “Quando aspessoas e as organizações se concentramna qualidade, então a qualidade tende a

aumentar e os custos diminuem com otempo. Porém, quando as pessoas e as or-ganizações se focam primeiramente noscustos, então a qualidade diminui com odecurso do tempo e os custos tendem aaumentar”.

Em vez de auto-elogiardespropositadamente asua gestão, talvez fossemais conveniente que oPCA solicitasse a certifi-cação externa de quali-dade dos HUC. Salientoo recente exemplo doHospital de Santo Antó-nio (HSA), no Porto, cujoServiço de Urgência re-cebeu, no passado mêsde Setembro, a certifica-ção de qualidade pelanorma internacional ISO 9001:2000, tor-nando-se no primeiro do País com esta dis-tinção. Isto sim, é trabalhar com qualidadee com factos e não apenas com jogos flo-rais.

Deixo aqui bem explícito o desafio públi-co para que os HUC entrem imediatamen-te num processo consequente e profissio-nalizado de certificação de qualidade. Hajacoragem! Eu bem sei que há longos anosexiste uma Comissão, mas nada avançaporque não é dado seguimento às propos-tas apresentadas, nem tão pouco são cria-das as condições para que, de facto, a Co-missão funcione. Será que não há interes-se em que funcione? Será que os HUC nãose sentem com o mesmo nível de qualida-de de tantos hospitais que já foram certifi-cados?... Faça-se algo de concreto paraque os HUC, apesar dos empenhados es-forços dos seus profissionais, não conti-nuem a perder terreno relativamente a ou-tros hospitais pelo acumular de sucessivoserros e adiamentos de gestão!

As preocupações dos profissionais dosHUC agudizaram-se com o anunciado ca-pital estatutário. Infelizmente, não obstanteestar afinal previsto um capital estatutáriode 108,5 milhões, os nossos receios ini-ciais, motivados pelos valores que vieram apúblico, eram totalmente fundamentados.Efectivamente, ao contrário do que foi erra-damente afirmado por alguns responsáveise alguma comunicação social, o capital es-tatutário dos HUC não será constituído emcinco anos. O que consta da resolução140/2008 do Conselho de Ministros é quea esmagadora maioria do putativo capital

estatutário dos HUC será constituído em2010 e anos seguintes, sem referência,sublinhe-se, a qualquer prazo! Ou seja, oGoverno pode dar 1 milhão de euros porano durante 93 anos que está a cumprir asua resolução! Será que alguma vez os

HUC chegarão a rece-ber a totalidade do seuputativo capital esta-tutário que, em qual-quer altura, pode serreduzido por um sim-ples despacho conjun-to do Ministério da Saú-de e das Finanças?NINGUÉM sabe!...

Este faseamento semlimite temporal colocaos HUC e o seu Conse-lho de Administração

totalmente dependentes das prioridades edas disponibilidades financeiras do Gover-no e sem quaisquer possibilidades e auto-nomia para definir e calendarizar planosestratégicos de investimento. Com a agra-vante dos reflexos da crise financeira dosEUA, que estão a afectar a economia mun-dial e o investimento público em Portugal,em paralelo com a política liberal deste Go-verno, favorecendo os grandes grupos pri-vados em detrimento do SNS, serem fortís-simos indícios que acentuam os motivosde preocupação quanto ao real futuro dosHUC e do seu financiamento.

De uma coisa todos podem estar certos.A Secção Regional do Centro da Ordemdos Médicos não silenciará a defesa incon-dicional e continuará a pugnar pela quali-dade dos HUC, do SNS e da Medicina pri-vada com verdade, frontalidade e determi-nação. Por isso lançamos um forte apelo atodos os profissionais de saúde para quenão tenham medo e comuniquem à Ordemdos Médicos todas as dificuldades que lhesforem artificialmente levantadas e para quedefendam a qualidade do seu exercícioprofissional contra todos aqueles que, ape-nas motivados pelo objectivo de agradarservilmente à tutela e apresentar as ditas“boas contas”, não se importam de colocarem risco a excelência do tratamento dosdoentes em benefício de um economicis-mo obsceno. Racionalidade e qualidadesim, racionamento de fraldas, não!

*Presidente da Secção Regional do Centro da Ordem dos Médicos

(Artigo publicado no Tempo Medicina a 10/11/08

e, em três partes, no Diário de Coimbra)

B O L E T I M . I N F O R M A T I V O Novembro/Dezembro 2008

E o que dirá o Governoperante um tão vasto“lucro”? Os HUC

devolveram verbas aoGoverno? Será que para

o ano o Governo vai reduzir o orçamento dos

HUC num montantecorrespondente?!

Page 35: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

B O L E T I M . I N F O R M A T I V ONovembro/Dezembro 2008

A expressão “choque tecnológico” entroudefinitivamente no quotidiano portuguêshá não muito mais de três anos. Promes-sas foram feitas no sentido de transformarPortugal num país informático, de proces-sos simplificados e acelerados, menos su-jeitos aos erros inerentes à burocracia quetanto gostamos de enfatizar como caracte-rística dos serviços em Portugal.

No que concerne à Medicina, e em espe-cial à área que me diz directamente res-peito, o choque passava (e passou) pelaequipagem dos Centros de Saúde comhardware informático actualizado e comum sistema de software que pudesse inte-grar as funções administrativas e clínicas.Tornou-se até um ponto fulcral na Missãopara os Cuidados de Saúde Primários ainformatização do processo clínico dosutentes. Dela depende a premissa de ummelhor registo de dados clínicos e é a ba-se de dados que permite a avaliação daUnidade de Saúde Familiar (USF) no quese refere ao atingimento dos objectivoscontratualizados pela mesma.

Hoje, mais de um ano e meio depois daabertura da USF Cruz de Celas em Coim-bra, a expressão de choque tecnológicomudou de sentido. Tornou-se até talvezmais próxima do próprio sentido etimológi-co de cada uma das palavras que a cons-titui. O choque a ser verdadeiro pelo im-pacto negativo que teve no dia-a-dia dofuncionamento da própria USF e na in-fluência desgastante que condiciona naconsulta médica (e não só).

Desde o início que o sistema demonstrafragilidades graves. Na prática, e para quese perceba bem, essas fragilidades pas-sam, em primeira instância, pela lentidãoatroz com que o software corre. Cada cli-que no rato é seguido de uns bons 10 a 20segundos, na melhor das hipóteses, à es-pera que algo aconteça. Posso supor queem cada consulta eu tenha que fazer pelomenos cerca de 20 cliques... Pior aindasão os mais do que frequentes bloqueiosdo sistema. Em dias bons o computadorbloqueia apenas quatro ou cinco vezes

numa manhã... Numa ma-nhã má dificilmente se con-segue fazer seja o que forutilizando o computador,estando constantemente adesligá-lo com a esperan-ça que ao ligar tudo se te-nha resolvido. A cada novodia colocamos a hipóteseingénua de que os proble-mas estarão resolvidos. Enunca estão.

Inicialmente parecia natu-ral. Novo sistema, no-vos hábitos, novosproblemas a ser resol-vidos pela recente ino-vação tecnológica.Hoje o desalento égrande. A incompreen-são maior. As justifica-ções são muitas. A fal-ta de um servidor maispotente, a necessida-de de um computadorbase em cada consul-tório, alguns bugs dosoftware. As soluções– nenhuma até hoje.

Não se pense no en-tanto que isto é umproblema exclusivo daUSF Cruz de Celas.Relatos semelhantesvão-se ouvindo de ou-tros lugares do país.

Parece que a paciên-cia chegou ao fim...Ninguém quer ouvirfalar em vantagens in-formáticas. Ninguémjá consegue dizer aosutentes que houve umproblema informático,tão gasta que está ajustificação. Ninguém consegue suportaros atrasos contínuos que estragam a con-sulta com o doente ou que atrasam o es-quema diário de consultas.

E ainda nos pedem queinformatizemos todas asanálises e exames comple-mentares de diagnóstico.Que contabilizemos a nos-sa produtividade com basenuma prática diária inseri-da informaticamente. Quemelhoremos a nossa as-sistência. Que reduzamoso tempo de espera dosutentes.

E ainda assim é possível.A USF Cruz de Celasatingiu os seus objecti-vos para o ano de2007. À custa de umesforço contínuo dededicação e paciência.

Mas já chega demanter a situação den-tro de portas. É precisorelatar esta situação.Chamar a atenção pa-ra o que eu considerouma falta de respeitoinjustificável para comos profissionais desaúde. Em última ins-tância para com osutentes.

Encontre-se uma so-lução. Rápida e eficaz.Sem demagogias oujustificações.

Deverá – ou deveria– haver alguém com opoder de exigir uma re-solução.

Porque agora tudo oque apetece é desligara ficha. Meter o com-putador num canto epuxar da caneta. Pelomenos, quando essa

falha, podemos sempre ir buscar outra.

*Interno de Medicina Geral e FamiliarMembro do Conselho Distrital de Coimbra

da Ordem dos Médicos

opinião

USF em choque tecnológico

� Dr. Ricardo Gabriel*

Parece que a paciênciachegou ao fim...

Ninguém quer ouvir falar em vantagens

informáticas. Ninguémjá consegue dizer aosutentes que houve umproblema informático,tão gasta que está a

justificação. Ninguémconsegue suportar osatrasos contínuos queestragam a consultacom o doente ou queatrasam o esquemadiário de consultas.

Page 36: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

B O L E T I M . I N F O R M A T I V O Novembro/Dezembro 2008

opinião

Muitos colegas me têm pedido que abordeo modelo de receita actual e os problemasexistentes devido ao seu formato e conteú-do.

Tentarei hoje ser o seu porta-voz.A palavra receita nunca foi exclusiva da

área médica. No dicionário, entre outras de-finições pertencentes a outras áreas, podeler-se que receita deriva de recepta, femini-no de receptus, recebido; é a fórmula queprescreve um remédio ou indica a composi-ção de certos medicamentos. Mas tambémpode ser o produto de venda de mercado-rias numa loja ou empresa...

Desde estudante que nos foram ensinandoque uma consulta culmina sempre numa re-ceita, seja ela escrita, oral, encaminhamen-to, conselho...

O modelo de receita foi variando, contudoo resultado manteve-se – a escolha terapêu-tica do médico para melhor tratar o doente.

Melhorámos muito quando, podemos dizerque ainda recentemente, foi introduzida a re-ceita tripla, o que evita a vinda mensal dedoentes só para renovar receituário, e a re-ceita informática, o que evita os erros devidoà dificuldade de leitura.

Com o aparecimento dos genéricos e a ne-cessidade de os implementar, no sentido decontrolar os custos em medicamentos, hou-ve campanhas de sensibilização para médi-cos e doentes, estes no sentido de os solici-tar ao médico e aqueles para que os pres-crevessem como primeira escolha.

Não me cabe a mim, ou aos médicos, du-vidar da eficácia dos genéricos, comparati-vamente aos produtos originais, uma vezque a sua introdução no mercado tem achancela do Infarmed, sendo este responsá-vel pelos estudos de equivalência, entre ou-tros. Contudo, a experiência ensinou-nosque nem todos são iguais... nos resultados ena tolerância... o que leva à escolha do mé-dico, entre os vários genéricos e não só en-tre originais e genéricos.

Sendo a vontade do médico ainda sobera-na na escolha do melhor medicamento parao seu doente, numa qualquer situação clíni-

ca, a ele caberá escolher en-tre um genérico e um produ-to de marca ou entre doismedicamentos genéricos decasas comerciais diferentes,segundo a sua experiência,a leges artis e a informaçãoveiculada ao doente.

Então não deveria ser pos-sível, em nenhum caso, umfarmacêutico, ou mesmo umtécnico de farmácia, alterar asua prescrição.

Contudo, este modelode receita assim o permi-te, ao ter-lhe sido introdu-zida essa hipótese. Odoente, aconselhado pelofarmacêutico ou pelo téc-nico de farmácia, pode al-terar a prescrição do mé-dico, desde que este seabstenha de colocar umascruzes a não autorizar asubstituição da prescriçãopor um medicamento genérico, ou desdeque o doente assine no verso da receita queautoriza a troca, muitas vezes nem sabendoque o faz... se tem de assinar num local, as-sina em dois...

Porque é que o médico terá de colocarumas cruzes numa prescrição em que é so-berano, se foi esse o medicamento queprescreveu e é nesse que tem mais confian-ça?

Actualmente, o médico que não coloca asditas cruzes estará implicitamente a deixaralterar a sua prescrição?

Não! Simplesmente, a maioria já chegou àconclusão que, mesmo com as cruzes, a re-ceita pode ser alterada e, para isso, como jádisse, basta que o doente consinta e assine.Então para quê colocá-las e ser desautoriza-do por quem não deveria ter o direito de o fa-zer, não fora terem-lho dado...

Todos sabemos também que a iliteracia éo nível de escolaridade mais alto numa gran-de percentagem da nossa população... ler e

não compreender equivalea ser mais facilmenteorientável...

E também sabemos quehá muitos doentes que ad-quirem os medicamentosa crédito numa determina-da farmácia, não podendoir a outra quando a suanão tem o medicamentoprescrito, e aceita a trocaporque o doutor da farmá-cia lhe disse ser o mes-mo...

Então, nesta situação, aquem pedir responsabili-dade quando houverreacção adversa ou inefi-cácia da terapêutica?

Ao farmacêutico? Aotécnico de farmácia? Aomédico que não colocouas cruzes?

O frequente é o doente,cada vez que vem à con-

sulta, ser portador de um genérico diferente,mesmo na mesma farmácia. Mas nesse ca-so o preço não muda. Então para quê as tro-cas frequentes?

Sendo tão grande o número de medica-mentos genéricos, a farmácia pode não ter,no momento, o escolhido pelo médico, maspode adquiri-lo em pouco tempo, sem ter deo trocar.

E, contudo, as maiores trocas são efectua-das em situação de não urgência...

Então porquê tanta troca?Não é segredo para ninguém os incríveis

negócios que se farão nas farmácias, asmais-valias de algumas empresas às farmá-cias em troca da saída do seu produto, asempresas cujo “negócio” principal é a farmá-cia, deixando de se preocupar em informar omédico sobre as características e vantagensdo seu medicamento.

As histórias que se ouvem contar de com-pra cem e leva mais duzentas (quinhen-tas?!) de borla são inesgotáveis!

A receita…do nosso descontentamento

À Sr.ª Ministra, quetambém é médica e que

não recusará a suaanálise e solução,

pedimos um modeloque não suscite

dúvidas quanto à vontade do médico.

� Dr.ª Teresa Lopes *

Page 37: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

B O L E T I M . I N F O R M A T I V ONovembro/Dezembro 2008

opinião

Código Deontológico

E para quê convencer e provar ao médicoque o seu medicamento é de confiança,quando lhe basta negociar com a farmáciae aproveitar-se da receita, que lhe irá permi-tir todas as alterações?

Para que não surjam algumas dúvidas,cabe dizer nesta altura que nunca ouvi ne-nhum médico ser contra os genéricos, ape-nas porque sim... E as taxas de utilizaçãoassim o vão demonstrando. O problema es-tá na sua troca tão frequente...

E quanto aos circuitos mundiais de bran-queamento de medicamentos?... O Infar-med tem capacidade instalada para garan-tir o controlo de todos os lotes de medica-mentos que entram no mercado nacional?

O Ministério, uma vez alertado para estasproblemáticas, deveria tomar as medidasnecessárias para evitar estes abusos. Parafomentar a venda de genéricos e diminuir adespesa em medicamentos não é necessá-rio deixar que se cometam ilegalidades ecolocar depois a cabeça na areia... pois, co-mo diz o ditado, “tão ladrão é quem rouba ahorta como o que fica à porta”.

A receita é parte integrante do acto médi-co e como tal deve ser respeitada.

Mas então a quem aproveita este modelode receita?

Aos médicos?Aos doentes?Às farmácias?Ao Ministério?Penso que encontraremos facilmente a

resposta, assim o queiramos.À tutela pedimos, porque somos respon-

sáveis pelo receituário que produzimos, queseja respeitado o acto médico na sua inte-gralidade, que culmina com a receita.

À Sr.ª Ministra, que também é médica esensível certamente a este problema, e quenão recusará a sua análise e solução, pedi-mos um modelo que não suscite dúvidasquanto à vontade do médico, responsávelúltimo pelo tratamento do doente que tem àsua responsabilidade.

Então para quando um modelo sem cru-zes?

Ficamos a aguardar um novo modelo dereceita, sem cruzes, onde o que prescreve-mos seja respeitado, pois a decisão final énossa, assim como é nossa a responsabili-dade quando nos acusam de erro médicoou negligência e por eles temos de respon-der.

*Médica de família, Centro de Saúde Fernão de Magalhães; Membro do Conselho Regional

do Centro da Ordem dos Médicos

O código deontológicomédico é omisso na de-finição de “início de vidahumana” (IVH), deixan-do este começo ser de-terminado pela cons-ciência individual do mé-dico assistente.

A nossa actividade sótem sentido na presençade vida humana, sendoque a Medicina étambém uma for-ma mista de co-nhecimento, mascom um fundo ine-q u i v o c a m e n t ecientífico. As difi-culdades sentidaspelos relatores nadefinição de IVHprendem-se a múl-tiplos factores,mas poderão terorigem na não di-ferenciação dasexpressões “vidahumana” e “pes-soa humana”.

A pessoa é um“ser autónomo derelação”, fazendoos seres humanosparte da natureza,embora como su-jeitos livres, dota-dos de valores mo-rais e espirituais,transcendendo as-sim a natureza. A“pessoa humana”é assim funda-mentalmente umconceito cultural que procura com-preender uma realidade enigmática e énormal haver dúvidas acerca do mo-mento do seu início.

A vida humana, embora englobe mui-

tos dos aspectos acimareferidos, tem um refe-rencial mais vasto e umcunho marcadamentebiológico (natural), peloque o seu início pode edeve ser datado. Na mi-nha opinião e à luz detoda a evidência científi-ca, a vida humana teminício em cada um de

nós no momento daconcepção.

Em conclusão:

a) A Medicina éuma actividade nor-teada pelos princí-pios éticos de bene-ficência, não malefi-cência, autonomia ejustiça, juntando aopensar cientifico (de-monstrativo) o pen-sar simbólico (repre-sentativo)

b) A pessoa huma-na é um conceitomultifacetado cultu-ral (simbólico)

c) A vida humanabrota da natureza deque o ser humano éparte e o seu concei-to não é sobreponí-vel ao de pessoa hu-mana

d) O começo da vi-da humana em cadaum de nós é passívelde ser datado, atéporque o ser huma-

no é também história (narrativa) – me-mória de si e dos outros.

*Assistente graduado de Medicina Interna dos Hospitais da Universidade de Coimbra

As dificuldades sentidas pelos

relatores na definiçãode “início de vida

humana” prendem-sea múltiplos factores,

mas poderão ter origem na não

diferenciação das expressões “vida

humana” e “pessoahumana”.

� Dr. José Diniz Vieira*

“Já é homem aquele que o será”Tertuliano

Page 38: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

B O L E T I M . I N F O R M A T I V O Novembro/Dezembro 2008

opinião

Mas então, afinal...O Verão que passou trouxe três factos

novos à saúde do nosso país. O primei-ro é a constatação de que há falta demédicos, e uma falta grande e com ten-dência para se agravar nos próximosanos, e os outros são duas maneirasque o Governo engendrou para a corri-gir, “adquirindo” de repente ou numtempo muito curto mais umas centenasde licenciados em Medicina.

Mas então afinal há falta de médicosem Portugal?! E esse panorama vaipiorar dentro de alguns anos? Mas issonão se passava já há quatro ou cincoanos atrás? Nessa altura não veio oGoverno afirmar que não havia nadafalta de médicos, se calhar até haviademais, estavam era mal distribuídos?E a comissão governamental nomeadaespecificamente para avaliar a situaçãonão transmitiu essa conclusão? Estare-mos todos a ser vítimas de um aciden-te vascular cerebral colectivo que nosapaga memórias recentes e confunde oespírito?

Há erros grosseiros, com repercus-sões dramáticas, que simplesmentenão se podem ter. Não quando impli-cam a governação de um País, aindapor cima numa área tão sensível e tãoimportante para os seus cidadãos comoé a saúde. Não se pode errar tanto. Eprincipalmente não se pode depois vircalmamente dizer tudo ao contrário, nofundo esperando que, como de costu-me, a culpa seja “da política”. É verda-de que “a política” tem sido responsá-vel por tanta coisa mal feita neste País,tanta que já nos habituámos. Masquem lida com a saúde sabe que há há-bitos fatais, quer isto dizer que têm dese perder porque senão podem condu-zir rapidamente à morte.

A limitação da entrada de estudantesnas nossas Faculdades de Medicinaassentou afinal em contas e cálculosmal feitos. Pois expliquem isso agoraaos alunos com médias de 17 e 18 va-

lores no 12.º ano quenão conseguiram seguira sua vocação para mé-dico. E ao jovem estu-dante com média de18,43 que não pôde en-trar em Medicina por-que a nota mínima nes-se ano foi de 18,45. Eafinal faziam falta, de-viam ter entrado, eles emuitos outros, já que aclassificação mínimaexigida tem apenasque ver com o nú-mero total de alunosa admitir. E essedeveria ter sidomuito maior, dizem-nos agora: às cen-tenas. Como é pos-sível errar tanto?!Mas perguntamo-nos também, à cau-tela: as contas deagora estarão bemfeitas? Serão preci-sos tantos?...

Os médicos sãoprocessados judi-cialmente pelosseus erros; os con-selhos de adminis-tração dos hospitaisEPE são responsa-bilizados pessoal e individualmente pe-la má gestão económico-financeira (etarda que o sejam também pelo malba-ratar ou desbaratar dos recursos huma-nos e da capacidade instalada nos hos-pitais que lhes foram confiados); já sepercorreu algum caminho no sentido deresponsabilizar os juízes quando come-tem erros (no Egipto antigo o Faraómandava cortar as orelhas aos juízesque julgavam mal). E os nossos políti-cos? Continuarão a esconder-se impu-nemente atrás da “política”?...

Na sequência daqueleerro vem o segundo fac-to notável deste Verão:o anúncio da importa-ção de centenas de mé-dicos do estrangeiro (dainevitável Cuba, mastambém doutros países,fora e dentro da CEE),responsabilizando-se onosso Governo pelasdespesas com o proces-so de equivalência dos

oriundos de fora daComunidade Euro-peia, cubanos in-cluídos. Quer dizer,tem de se pagar pa-ra virem para cá, evirão por certo nãoos melhores da ter-ra deles, esses fica-rão lá ou emigrarãopara locais maisapetecíveis paramédicos bem pre-parados, com ape-tência científica edesejo de progredirenquanto profissio-nais. Isto porque anossa medicina pú-blica, tradicional-mente mal pagamas que tinha ainda

assim, numa medida razoável, atracti-vos nesse aspecto, deixou de os tercom a sua empresarialização e o fimdas carreiras médicas. Atente-se, porexemplo, no predomínio exigido daquantidade sobre a qualidade nos hos-pitais-empresa; na substituição dagrande cirurgia por pacotes enormesde cirurgia de ambulatório ocupandonalguns hospitais o espaço operatóriodaquela, perante a indiferença ministe-rial; no encerramento da prestação deserviços em algumas patologias, com

� Prof. Carlos Costa Almeida *

Os médicos são processados

judicialmente pelos seuserros; os conselhos

de administração doshospitais EPE são responsabilizados

pessoal e individualmente pelamá gestão económico-

–financeira. E os nossospolíticos? Continuarão

a esconder-se impunemente atrás da “política”?...

Page 39: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

B O L E T I M . I N F O R M A T I V ONovembro/Dezembro 2008

afastamento dos doentes para outroshospitais, por ficarem caros à empresa-hospital; na dificuldade crescente de in-trodução de medicamentos novos e deaquisição e pagamento de instrumen-tos e material de consumo mais sofisti-cados e com aplicação menos frequen-te. Nos hospitais públicos a gestão clí-nica cedeu lugar à gestão puramenteadministrativa, atulhados que estão deadministradores li-mitando, compli-cando e encare-cendo a actividadeclínica, razão deser da sua existên-cia. Estabeleceu-se uma enorme di-ficuldade em fazerinvestigação clíni-ca, com equipasmédicas desmoti-vadas e compos-tas e recompostasa bel-prazer dequem manda nohospital, semprenuma lógica eco-nomicista de con-tratação dos maisbaratos e corda-tos, que não dosmelhores. E nemvale a pena falarduma quase abso-luta falta de investigação experimental.Se juntarmos a tudo isto o facto da saí-da de muitos dos médicos mais expe-rientes desses hospitais, uns para hos-pitais privados, outros por reforma, agrande maioria antecipada (por-quê?...), ficamos com o panorama queno momento presente a medicina públi-ca hospitalar em Portugal oferece.

Compreende-se assim que a maioriados médicos que para cá venham o fa-çam apenas numa lógica de emigrantemercenário, que vem ganhar “o seu”,

empregar-se por exemplo como tarefei-ro à hora numa dessas empresas dealuguer de médicos que por aí agorapululam, geridas por administradoreshospitalares, por médicos ou mesmopor enfermeiros. E eu a esses colegasaté os compreendo (afinal o nosso Mi-nistério da Saúde não lhes oferecemuito mais), enquanto que outros, osde cá, se desqualificam desempenhan-

do um trabalho mé-dico desgarrado,ocasional e indife-renciado a trocoapenas de um paga-mento principescoem comparação como que auferem doseu trabalho hospi-talar específico. E opolítico responsávelpor esta aberraçãoainda escreve livrosa vangloriar-se dela!

Mas o Governo nãoaposta só nos es-trangeiros, anuncioutambém que vai pro-duzir médicos rápi-dos no Algarve, numcurso de quatroanos – terceiro facto.

Fico espantado – eespanta-me aindamais o silêncio ge-

neralizado – quando se anuncia umcurso rápido de medicina, para formar“clínicos gerais”. Estarão a falar daque-la especialidade para cujo internato seconcorre depois de tirar o curso de Me-dicina e fazer um ano de internato co-mum? Ou de outra coisa, eventualmen-te com o mesmo nome mas até agoradesconhecida? Ainda pensei que fossealguma brincadeira (teria de ser demau gosto), mas não, foi apresentadocom pompa e circunstância pelas maisaltas individualidades do Governo. E

semelhante anúncio não pareceu preo-cupar a Associação dos Médicos deClínica Geral, pelo menos publicamen-te, nem do mesmo modo a Ordem dosMédicos. Mas será que esses profissio-nais serão inscritos na Ordem dos Mé-dicos? E depois poderão concorrercom os outros para uma especialidadediferente? É conhecido o programa deformação acelerada anunciado? Nãopoderá ele, quem sabe, ser aplicado àsEscolas de Medicina, aligeirando a for-mação dos médicos portugueses eadaptando-a ao futuro que se começaa prever da nossa realidade em termosde saúde, com a Espanha aqui tão per-to para os casos mais complicados(leia-se “mais caros”)?...

A verdade é que das Faculdades deMedicina também não se ouviu qual-quer comentário, nem expressaram pe-lo menos curiosidade. Por um cursoanunciado oficialmente para começarantes do fim do ano, dirigido expressa-mente àqueles que queriam ser médi-cos, que tinham essa vocação e nãoconseguiram entrar em Medicina, poruma limitação de entradas consideradaagora desadequada. Se se quiser dealgum modo compensá-los – admitindoo erro – permita-se a sua entrada numaFaculdade de Medicina com as equiva-lências a que tiverem direito. Apoucá-los para o resto da vida dando-lhes“uma espécie” de curso de medicina,apoucando ao mesmo tempo os clíni-cos gerais, é que não me parece mini-mamente razoável. O que parece pre-tender-se é usá-los para aumentar rapi-damente a mão-de-obra médica emPortugal através de “médicos rápidos”,acompanhando afinal a época de “co-mida rápida” em que vivemos. Esque-cendo primariamente que está de-monstrado que a fast food não é boapara a saúde.

*Presidente da Associação Portuguesa dos Médicos de Carreira Hospitalar

A limitação da entradade estudantes nas

nossas Faculdades de Medicina assentou

afinal em contas e cálculos mal feitos.Pois expliquem isso

agora aos alunos commédias de 17 e 18

valores no 12.º ano quenão conseguiram seguir

a sua vocação para médico. E ao jovem

estudante com média de 18,43 que não pôde

entrar em Medicina porque a nota mínimanesse ano foi de 18,45.

O Boletim Informativo da Secção Regional do Centro está aberto e desejoso de publicar artigos de opinião enviados pelosColegas. Agradecemos que os textos que nos queiram enviar não excedam, como limite máximo, os 5.000 caracteres(com espaços).

A Redacção

A r t i g o s d e o p i n i ã o

Page 40: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

B O L E T I M . I N F O R M A T I V O Novembro/Dezembro 2008

opinião

As virtudes do vinho têm sido, nos últimosanos, divulgadas à exaustão. Não há diaque não surja uma notícia sobre os efeitosbenéficos na saúde, apontando como res-ponsáveis, entre outras, substâncias comoos polifenóis e o resveratrol.

As doenças cardiovasculares são a princi-pal atracção desta campanha, a que nãodevem ser alheios muitos produtores e in-dustriais. Quanto mais venderem, mais lu-cram, além de oferecerem à população ummeio profiláctico de preservar a saúde eprolongar a vida! Enriquecem as economiasnacionais e evitam doenças. Nada mau.

Mas não se pense que esta ideia de o vi-nho fazer bem à saúde é de agora. Qualquê! Já tem muitos anos.

A este propósito, não queria deixar de co-mentar um interessante ensaio sobre “O Vi-nho na Medicina” da autoria de um portu-guês, Fernando de Castro Pires de Lima,incluída na obra, “Ensaios”, publicada em1943.

O autor, que era médico, dedicava-se àetnografia, facto que o levou a escrever umensaio com o objectivo de demonstrar queo vinho é um importante elemento terapêu-tico em diversas doenças, chegando aoponto de considerar esta hipótese como“revolucionária”.

Descreve exemplos curiosos, sobretudodas pessoas do Minho, que usavam, se-gundo o Padre António Vieira, “aquele cor-deal simples, medicado pela natureza paraalegrar o coração humano”. “As cefaleiasdesaparecem com um bom copo de vinhoverde” (Dói-me tanto a cabeça, Que mequer cair ao chão, Dai-me mais uma pingui-nha, Ou ela me caia ou não...). Dores deouvidos? Lançar um pouco de vinho mornono ouvido doente! E eu que levei com leitede mulher! Laringites e faringites? Nadamelhor do que meia dúzia de copos de vi-nho verde com açúcar. O indivíduo está fra-co? Uma tigela de vinho tinto com sopas deboroa fortalece-o rapidamente. Espinhelacaída? Pão-de-ló embebido em excelentevinho verde! Aqui fiquei furioso! Quando erapequeno, talvez porque devia andar meioenfezado, fizeram-me o diagnóstico popu-lar de que devia ter a espinhela caída. Cha-

maram uma mulher, meiatrombuda e seca, lá dasbandas do Rossio, para melevantar a espinhela. Foium tormento. Entre rezas,lamparinas e movimentosbruscos, fui sujeito a umabesuntada, nos bracitos,nos punhos e no peito, comazeite. Não suportavaaquela gordura e muito me-nos o cheiro que me fazialembrar o azeiteiro quecheirava a ranço que tre-sandava. Se tivesse tido conhecimentodesta medida exigiria de imediato que medessem pão-de-ló embebido em vinho emvez daquele ritual assustador. Se não hou-vesse vinho verde sempre havia tinto!

O ensaísta continua na sua longa lista deefeitos benéficos. Para aumentar a diurese,vinho verde e muito! Para tratar as diarreiase a obstipação, vinho. Para combater asdores do tubo digestivo, vinho. Para curarfurúnculos e feridas exteriores, vinho. Emcertos tipos de doenças cardíacas, nalgu-mas doenças infecciosas, incluindo blenor-ragias e enterites (!), nas bronquites e nasanginas, e sei lá que mais, vinho. Não hápraticamente doença nenhuma que, naperspectiva de antanho, não possa ser tra-tada com vinho, excepto, talvez, as úlcerasgastro-duodenais e o cancro do estômago,afirma o autor. No entanto, até nas úlceras,se o vinho for fraco ou traçado com água,os efeitos benéficos manifestam-se quasede imediato.

A apologia ao vinho é de facto extraordi-nária. O autor recomenda que toda a gentedevia beber vinho, inclusive até as crian-ças. Deveria ser um imperativo nacional!Obviamente que descreve alguns cuidadosa ter com a ingestão que deve ser modera-da e adequada a cada caso e a cada tipoparticular de afecção. Muitas vezes preco-niza o uso de vinho fraco ou então mistura-do com água, em proporções adequadas.

A este propósito, vinho misturado comágua, recordo que, em miúdo, nos decur-sos das brincadeiras com os meus amigos,ficar, naturalmente, com muita sede. Batia

à primeira porta e pediaum copo de água. –Água? Nem pensar nissomeu menino! Espera umpouco que eu faço-te umrefresco. Passados algunsminutos, era presenteadocom uma generosa cane-ca de barro cheiinha deuma mistura de água e vi-nho a que juntavam umpouco de açúcar. Vinhamesmo a matar. Sabia tãobem! Noutras casas não

me davam este tipo de refresco, mas simum à base de groselha ou de capilé. Pes-soalmente preferia o outro, mais saborosoe mais energético...

Daqui a alguns anos, quando os seres hu-manos andarem cheios de próteses, defios, de mecanismos nanotecnológicos, im-plantes e órgãos artificiais, é provável queapareçam artigos, e as correspondentesnotícias, a afirmarem que está provado,cientificamente, que as próteses durammais, os fios não fazem curto-circuitos, osdispositivos nanotecnológicos são muitomais eficientes, enfim, que os doentes, pa-ra não falar dos sãos, viverão muito maisanos, caso bebam vinho! Espero que nãodigam: – Mas só do tinto!

Também fiquei a saber que o famoso pro-fessor Portman, que presidiu ao “PrimeiroCongresso do Comité Internacional para apropaganda do vinho” (Lausanne, 1935),citou, na abertura do congresso, a seguintefrase de Mussolini: “O homem doente quebebe vinho chega a mais velho que o mé-dico que lhe proíbe”. Nem mais. Não sei seo dito bebia vinho! Pelo menos não evitamortes violentas! Deve ser por isso que,ainda hoje, depois de muitos conselhosdietéticos, higiénicos e farmacológicos, lávem, no final da consulta, a pergunta sacra-mental: “Senhor doutor, eu posso beber umcopito de vinho?”. Ou não fôssemos portu-gueses e... portuguesas!VINISMO – termo utilizado no Estado Novoem contraponto ao alcoolismo: “vício benignoe salutar”!!!...

*Professor da Faculdade de Medicina da UC

“Vinismo”

� Prof. Massano Cardoso*

Page 41: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

B O L E T I M . I N F O R M A T I V O

ecos

O professor doutor António Correia deCampos, ex-ministro da Saúde, vai publicarum livro sobre notas à sua governação noMinistério da Saúde. Pelas notas prévias àsua publicação e entrevista ao jornal PÚBLI-CO depreendo que venha explicar detalha-damente a sua política na Saúde, as refor-mas que promoveu durante o tempo emque foi ministro da Saúde, com medidaseconómica e financeiramente correctíssi-mas, estratégia de contenção de custos eaumento de produtividade mais do que jus-tas, orientações de grande rigor para as ad-ministrações hospitalares, no sentido demelhorar a prestação de cuidados de saúdeem Portugal.

Tudo muito bem, com a certeza que seráum livro para leitura avisada dos estudantesde Administração Hospitalar e de mestran-dos da Escola Nacional de Saúde Pública.

É necessário, todavia, para sermos total-mente justos, analisar o ambiente e a quali-dade da prática médica antes e depois de oprof. doutor António Correia de Campos terestado no Ministério da Saúde:

– Antes, os médicos pensavam que erampeças fundamentais no bom funcionamentodos hospitais e centros de saúde, que a suaactividade diária exercida em muitos casosem situações tão penosas deveria ser enal-tecida, já que tão mal retribuída, que tinham

direito a serem reconhecidos no seu traba-lho, a progredirem nas suas carreiras, asentir-se estimulados para ensinar os maisnovos e lutar pela melhoria da qualidadedos cuidados de saúde, onde se integraobrigatoriamente a formação contínua;

– Após a passagem do prof. António Cor-reia de Campos pelo Ministério da Saúde, aera que fica é aquela em que, como recen-temente alguém comentava, os médicosque permanecem no SNS são simplesmen-te tratados como meros “pontómetros” dehorários (quantas vezes em seu prejuízo),recebendo vencimentos mensais de 1900euros brutos para 35 horas de trabalho co-mo especialista, sem vínculo, com contratosa termo de um ano, sem hipóteses de pro-gressão na carreira, sem qualquer estímuloao ensino e formação (actividade funda-mental para a garantia de uma medicina dequalidade), ao sabor de administraçõeshospitalares que apenas pretendem ver otrabalho médico traduzido em números(mais consultas, mais internamentos, maisepisódios retribuíveis em valores de GDH),muitas vezes com recurso a engenharias fi-nanceiras ridículas.

Onde estão consideradas as horas de for-mação dos mais novos, o trabalho de equi-pa, a dinâmica dos serviços, a discussão decasos e a aprendizagem contínua? Tudo is-

so vai-se esfumando, não há tempo a per-der, é preciso trabalhar para os números,colocar o dedo no “pontómetro” à hora cer-ta (nem que isso signifique fazer esperar osdoentes para que o médico tenha obrigato-riamente que cumprir a sua hora de almo-ço).

Trabalhar no SNS actualmente como mé-dico é, como recentemente um ilustre cole-ga referia, trabalhar no âmbito de uma co-missão liquidatária do SNS, porque semavaliação e reconhecimento da qualidademédica (progressão na carreira profissio-nal), sem lugar à formação, sem remunera-ções justas e transparentes, o SNS terá osseus dias contados como prestador de cui-dados de qualidade.

O prof. doutor António Correia de Camposanalisou bem os números, delineou a estra-tégia económica que lhe pareceu mais jus-ta, esqueceu-se porventura do aspectomais importante de um gestor bem sucedi-do: gerir com justiça as pessoas, os recur-sos humanos qualificados e escassos... Co-mo médica do SNS, não tenho saudades doseu legado e anseio por uma mudança derumo.

Helena Sá, médica

Carta publicada no Público de 26/09/08, na rubrica Cartas ao Director,

que aqui se reproduz na íntegra

A propósito do SNS

Novembro/Dezembro 2008

CONSELHOS DISTRITAIS

Morada Horário

Rua Cristóvão Pinho Queimado, n.º 5, 1.º DtºConselho Distrital de Aveiro 15h00 – 19h00

3800 – 012 AVEIRO

Rua Dr. Henrique Carvalhão, Lt. 13, Loja 5Conselho Distrital de Castelo Branco 14h00 – 16h00

6000 – 235 CASTELO BRANCO

Av. D. Afonso Henriques, 39 09h00 – 12h00 Conselho Distrital de Coimbra

3000 – 011 COIMBRA 14h00 – 18h00

Rua D. Sancho I, n.º 14 a 22 (Lg Paço do Biu)Conselho Distrital de Guarda 14h30 – 17h30

6300 – 548 GUARDA

Qta de Santo António – Rua José Oliveira Zúquete, Lt. 70Conselho Distrital de Leiria 16h00 – 19h00

2415 – 581 LEIRIA

Rua Alexandre Herculano, 43 – 3.º Dtº e Esq. PosteriorConselho Distrital de Viseu 15h00 – 17h00

3510 – 036 VISEU

Page 42: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

B O L E T I M . I N F O R M A T I V O Novembro/Dezembro 2008

ecos

Da nobreza do voluntariado...“Não entendo que se façam re-formas com base em volunta-riado, que é condicionado pormil e um factores, nem sempreos mais nobres. Não pode ha-ver reformas feitas desta ma-neira! Espero assistir, no futu-ro, a uma verdadeira reformada MGF e do SNS”.

Silva, José Manuel, Presidente doConselho Regional do Centro da Or-dem dos Médicos, sobre a reforma emcurso nos CSP . Cerimónia de Abertu-ra das XXIII Jornadas de MGF deCoimbra, 15 de Outubro de 2008,17H25, Hotel Tryp, Coimbra, Portugal

Foi pena a incursão do dirigente daOrdem em campo de análise concep-tual da reforma dos CSP ter ficado as-sim, qual Convento do Carmo, inaca-bada.

Uma vez mais, ficámos todos semperceber, exactamente, o que JoséManuel Silva tem a apontar, de concre-to, ao movimento reformista, de que asUSF são o testemunho mais visível.

Como também ficámos todos sem sa-ber o que entende o senhor por “umaverdadeira reforma da MGF e do SNS”.

É evidente que já estamos habitua-dos, no internista coimbrão, à analoseda crítica por falimento da substânciaem crise.

Há quem garanta ter o lapso raiz napropensão para a dieta, nascida da li-pídica tese que lhe conferiu estaturade Doutor. O que não é caso isolado,convenhamos.

Resta-nos, pois, conjecturar... Desde logo, surge evidente que, para

José Manuel Silva, uma qualquer as-sociação entre o sujeito e o predicadoé espúria, por ser passível à contami-nação por “mil e um factores, nemsempre os mais nobres”.

A dimensão numérica da objecçãoque, in extremis, pode degenerar nafalta de nobreza dos factores que con-

d i c i o -nam a adesão do sujeito, leva-nos aconcluir pela existência, a montante,de uma imensidão de factores que,não estando maculados pelo anátemasão, ainda assim, repudiados pelo fac-tótum de Coimbra. Ou seja, numa aná-lise sematológica, é possível depreen-der, da invectiva, uma multiplicidadede objecções e uma gradação adjecti-va da malfeitoria. De facto, nem todos(o que é possível deduzir da condicio-nante “nem sempre”), os “mil e um fac-tores” pecam por “falta de nobreza”.

Ainda que José Silva não avancecom qualquer exemplo concreto, épossível encaixar, em cada um destesdois grupos, um sem número de situa-ções potencialmente criticáveis. Avan-çamos com algumas, a título mera-mente exemplificativo.

No grupo restrito dos factores “nemsempre os mais nobres”, poderíamosincluir, por exemplo, aquelas situaçõesem que um grupo multidisciplinar, inte-grando médicos, enfermeiros e admi-nistrativos, decide voluntariamente – oque numa dimensão jurídica, configuradolo – juntar-se (associação crimino-sa) numa USF para assaltar os uten-tes, aproveitando-se dos muitos mo-mentos em estes são obrigados aabandonar os seus pertences para se-rem observados e submetidos a trata-mentos vários, por médicos e enfer-meiros.

Já no grupo mais vasto dos factores

não afectados por “faltade nobreza”, mas aindaassim criticáveis, esta-va capaz de incluir, porexemplo, aqueles ca-sos em que médicos,administrativos e enfer-meiros decidem aderira uma USF, voluntaria-mente, movidos pelofacto de viverem próxi-mos uns dos outros, eassim poderem parti-

lhar boleias de e para otrabalho, contribuindo, deste modo,para um desagravamento das despe-sas individuais com transportes e paraa contenção do aquecimento global.Ou ainda aquelas situações em que asequipas se constituem em função deafinidades futebolísticas (diz-se baixi-nho, que terá sido esse o caso da USFHorizonte, bem conhecida pelo fanatis-mo portista de alguns dos seus ele-mentos... Ou o da Briosa...)... Ou aindaaquelas USF que se constituem porcausa das vistas (foi certamente esseo motivo que levou à constituição daUSF Marginal, no Estoril, instaladanum maravilhoso edifício, virado parao mar)...

Claro está que à falta de exemplosapresentados pelo responsável daConsulta Externa de Lipidologia e Dis-lipidemias no Hospital Universitário deCoimbra, apenas podemos especular.O que por força da lacuna, é perfeita-mente legítimo. Como também é legíti-mo arquitectar sobre o modelo que omesmo adoptaria em alternativa ao daadesão voluntária...

Estou até a ver cena... O nosso caricaturista, também...

MMMJornal Médico de Família, em 4/11/08

NOTA – Sobre este assunto, sugere-se aleitura do comentário escrito pelo Prof. JoséManuel Silva, intitulado “A Analose da Críti-ca” (página seguinte).

Page 43: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

B O L E T I M . I N F O R M A T I V ONovembro/Dezembro 2008

ecos

Como nem sempre recebo o Jornal Médi-co de Família (JMF), com grande pesarmeu porque é interessante, embora talvezdemasiado alinhado, mão amiga, com umcomentário pouco abonatório para a pecu-liar prosa, fez-me chegar o editorial do seuDirector, Miguel Múrias Mauritti (MMM), pu-blicado numa das últimas edições do JMF.Com a devida vénia decidi transcrevê-lo in-tegralmente no nosso Boletim, assim comoa respectiva caricatura, porque me mere-cem alguns comentários.

Em primeiro lugar não posso deixar de sa-lientar que me sinto lisonjeado por mereceruma tão cerrada atenção por parte do meuamigo MMM. É uma honra que faço ques-tão de agradecer.

Em segundo lugar, e é a principal razãoporque escrevo esta réplica, não queria dei-xar de dizer ao meu amigo MMM que, ten-do os meus contactos, se não sabia o queeu queria dizer, podia ter-me perguntado!Era simples, bastava um mero e-mail ou umtelefonema. Nada de demasiado complica-do nos tempos que correm, nem mesmopara uma criança. E como MMM até escre-ve com palavras tão elaboradas e revelado-ras de uma aprimorada e exigente cultura,não tenho dúvidas que também dominaráestas novas tecnologias.

Devo concluir, pois, que foi deliberado onão esclarecimento da minha frase, retiradado contexto em que foi proferida, para quepossibilitasse ao autor do editorial do JMFassestar baterias de uma censura ácida,verrinosa e fantasiosa sobre a minha mo-desta pessoa. Não me parece um jornalis-mo elegante. Mas as atitudes ficam comquem as assume. E as críticas assim artifi-cializadas acabam por sofrer de irreversívelanalose.

Não quero alongar esta pequena redac-ção, mas não posso deixar de salientar queas minhas críticas à reforma das USF, quetanto preocupam MMM (e não só...), sãomais de forma do que de conteúdo e nãosão novidade nem arrogo a sua autoria,porque são partilhadas por muitos, quiçápela grande maioria dos interessados.

Além de que, uma reforma que envolve

somente uma minoriados profissionais desaúde e dos cidadãos,não é uma verdadeirareforma dos CSP. E dequem é a responsabili-dade?

De modo algum pre-tendo tirar o mérito aquem tanto se empe-nhou e entregou à re-forma dos CSP, quemsou eu para o fazer,mas talvez seja sinto-mática a lentidão da sua implementação eas fracturas e incomodidades que têm afec-tado o seu percurso.

E a verdade é que a forma como as mu-danças foram regulamentadas permitiu, en-tre outros problemas, demasiados atropelose aproveitamentos, por um lado, e frustroulegítimas expectativas de muitos Colegas,que depositavam na habitual abertura de lu-gares por concurso a esperança de recom-pensa pelo seu trabalho e dedicação com aaproximação dos locais desejados.

É fácil dar um exemplo prático. Uma Cole-ga que ia integrar uma USF elogiava entu-siasticamente a reorganização dos CSP, oque me levou a perguntar-lhe se também in-tegraria uma USF se isso implicasse fazer opercurso inverso, ou seja, deslocar-se da ci-dade para uma pequena vila periférica e dis-tante. A resposta foi uma honesta negação.

Entre várias outras questões, também nãoconcebo que a reorganização dos CSP im-ponha a Centros de Saúde que funcionambem e como verdadeiras USF’s a necessi-dade de se esquartejarem em pequenosgrupos.

Mas a tutela decidiu que seria assim. Poisbem, mantendo a minha visão crítica da re-forma e as minhas dúvidas, só me resta de-sejar que seja um êxito, para bem dos pro-fissionais de saúde, dos cidadãos e doPaís.

Mais uma vez repito, para acalmar algunsespíritos mais clubistas, que não estou con-tra o espírito das USF e o funcionamentoem equipa. Permitam-me o direito, porque

vivemos em Democra-cia, de considerar que ametodologia da refor-ma, que ostracizou e ul-trapassou tantos Cole-gas e introduziu enor-mes disparidades nosistema, podia ter sidodiferente, para melhor,bem menos polémica,mais equilibrada, maisabrangente e estar jáconcluída. Noutras oca-siões já referi quais se-

riam as minhas opções e prioridades.É interessante verificar que para a consti-

tuição dos Agrupamentos dos Centros deSaúde, também eles de resultados duvido-sos e em risco de serem partidarizados(uma análise demasiado longa para a pro-longarmos neste texto), a prática já foi com-pletamente diferente. Aqui não se apelou aovoluntariado!...

Enfim, é evidente que muito haveria a di-zer e a explicar sobre uma reforma que jáfez correr tanta tinta e despertar tantas pai-xões. Mas esta não é a oportunidade ade-quada, nem é o objectivo deste pequenoescrito.

O terceiro motivo para garatujar estas li-nhas é o de dizer que adorei a caricatura,aliás reveladora da impressionante capaci-dade artística e técnica do seu autor. Aque-le ar rejuvenescido, musculado e domina-dor agrada-me e lisonjeia-me! E entre oschicoteados parece-me vislumbrar os tra-ços faciais de um ex-ministro da saúde e deoutros adversários dos Médicos e da quali-dade e coerência do SNS, o que ainda maisme enaltece e estimula! Um genuíno agra-decimento ao caricaturista e ao JMF!

Por último, para o meu amigo MMM e comum grande abraço, aqui fica toda a minhadisponibilidade para explicar qualquer fraseminha que porventura não consiga enten-der na plenitude. Não vale a pena queimartempo e neurónios com tanta lucubração eespeculação!

Prof. José Manuel Silva

A analose da críticaUma reforma que

envolve somente umaminoria dos

profissionais de saúde e dos

cidadãos, não é umaverdadeira reforma

dos CSP. E de quem é a

responsabilidade?

Page 44: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

B O L E T I M . I N F O R M A T I V O

auditoria

A responsável do Bloco Operatório e asAnestesiologistas do Hospital de Cantanhe-de invocaram ausência de condições técni-cas adequadas para a Anestesia Pediátricano referido Hospital, em 16 de Abril de2008, posteriormente esclarecendo os re-quisitos julgados necessários para o efeitoem 07 de Maio de 2008.

Em 21 de Abril de 2008, a Direcção Clíni-ca do Hospital solicitou internamente dadossobre as condições técnicas necessárias,realizou uma reunião interna em 08 de Maiode 2008 e, em 16 de Maio de 2008 (comdados rectificados em 23 de Junho de2008), solicitou parecer à Ordem dos Médi-cos.

Em 04 de Junho de 2008, é endereçadopela Secção Regional Centro da Ordemdos Médicos ao Colégio da Especialidadede Anestesiologia pedido de apreciação dasituação, tendo dois elementos da direcçãodo mesmo sido indigitados para, em 03 deSetembro de 2008, efectuar uma visita aoHospital e elaborar relatório com parecer doColégio.

Analisada a documentação fornecida aoColégio de Anestesiologia, realizada a visi-ta ao Hospital, e tendo havido oportunidadepara, in loco, tomar conhecimento das ale-gações e argumentos das partes envolvi-das, considera-se pertinente informar o se-guinte:

São princípios gerais:1. A Ordem dos Médicos constitui o orga-

nismo independente e idóneo para a delibe-ração sobre questões técnicas respeitantesao exercício da medicina.

2. No contexto da Ordem dos Médicos, oColégio de Anestesiologia constitui a enti-dade com autoridade para se pronunciarsobre as áreas de actuação da Anestesiolo-gia, incluindo as questões colocadas noprocesso em apreço.

3. Reconhecido o devido respeito pelasSociedades Científicas, o parecer técnicodo Colégio de Especialidades constitui oprecedente e a força maior e final na deter-minação da leges artis em Anestesiologia.

4. Todo o Anestesiologista possui forma-ção obrigatória em Anestesia Pediátrica.

5. Se as condições locais assim aconse-lharem, a eventual dedicação e diferencia-ção numa área temática poderá ser benéfi-ca, com acumulação de perícia e saberes.

6. O facto de existir o investimento secto-rial numa área temática específica decor-rente do tipo de exercício profissional verifi-cado ao longo da carreira médica, implica orespeito pela diferenciação técnica, masnão diminui a idoneidade geral que advémda formação geral.

7. Em nenhuma circunstância, deve a re-ferida diferenciação desresponsabilizar osdemais Anestesistas em relação às suasobrigações profissionais.

8. Não se advoga a sub-especialização daespecialidade de Anestesiologia.

9. Desejavelmente, como forma de au-mentar a segurança e prever a possibilida-de de entre ajuda em situações mais com-plexas, a actividade do médico Anestesistadeve-se enquadrar numa equipa de Anes-tesia onde, no mínimo, existem dois médi-cos simultaneamente de serviço. Estaquestão é obrigatória em caso da existênciade Serviço de Urgência.

10. Em todas as circunstâncias, o médicoAnestesiologista somente deve exercer asua profissão se entender que existem ascondições adequadas para a provisão decuidados em ambiente adequado e seguro.

São princípios especialmente relevan-tes em relação às questões colocadasna presente situação:

11. Entende-se que, em função das espe-cificidades técnicas existentes, será aceitá-vel e desejável que crianças de pouca ida-de (igual ou menos do que 3 anos de idade)devam prioritariamente ser tratadas emcentro cirúrgico especializado em Pediatria.Deve ser enfatizado o carácter prioritário doreferido encaminhamento, não havendouma obrigatoriedade absoluta.

12. Respeitando o enunciado, entende-seque, na generalidade dos casos, centros ci-rúrgicos de âmbito geral poderão procedercom intervenções em crianças, inclusiva-

mente menores a 12 anos de idade, se fo-rem reunidas as condições para a provisãode cuidados de forma adequada e segura.

13. Entende-se que, a provisão de cuida-dos de forma adequada e segura implicaequipamentos, recursos humanos e sabe-res técnicos.

14. Quanto aos saberes técnicos, faz sen-tido que a casuística relacionada com amesma patologia, ou faixa etária, seja con-centrada em determinada equipa multidisci-plinar e multiprofissional, com consequên-cias inerentes na feitura das escalas de ser-viço (onde se deve concentrar os referidoscasos).

15. Como regra geral, não é bom princípioo investimento em técnicas ou intervençõescom baixa casuística, seja em termos depatologia ou faixa etária.

Valorizando o acima descrito e analisa-da a realidade do Hospital de Cantanhe-de, considera-se o seguinte:

16. Não se afigura que, presentemente, ohospital possua casuística apreciável quemotive o investimento específico à cirurgiapediátrica ou à faixa etária pediátrica

17. Caso venha a possuir casuística apre-ciável na área pediátrica, seria desejávelque se procedesse à concentração dos ca-sos em determinadas equipas e temposoperatórios, a fim de obter ganhos em pro-cedimentos técnicos.

18. Devem ser elaborados protocolos enormas orientadoras na selecção e prepa-ração dos doentes a serem submetidos aintervenções cirúrgicas, que sistematizemos critérios de inclusão e exclusão, o circui-to de encaminhamento e gestão do doenteao longo do seu trajecto de avaliação e pre-paração para o acto cirúrgico/anestésico,bem como o conteúdo funcional e respon-sabilidades dos profissionais para que asobrigações e deveres sejam assumidos euniversalmente conhecidos.

19. Como forma de melhor se prepararpara os diversos desafios técnicos que pos-sam surgir, inclusivamente na faixa etáriapediátrica, recomenda-se a actualização doequipamento de monitorização e ventilação

� ASSUNTO: AUDITORIA. CONDIÇÕES EXISTENTES E EXIGÍVEIS PARA A ANESTESIA PEDIÁTRICA NO HOSPITAL ARCEBISPO JOÃOCRISÓSTOMO – CANTANHEDE

Colégio da Especialidade de Anestesiologiaanalisa condições no Hospital de Cantanhede

Novembro/Dezembro 2008

Page 45: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

B O L E T I M . I N F O R M A T I V O

mecânica no bloco operatório.a) O monitor de sinais vitais deverá pos-

suir módulos e acessórios pediátricos bemcomo, em geral, prever todos os requisitosmínimos da ASA – American Society ofAnesthesiologists, com especial relevo adi-cional para a possibilidade de monitoriza-ção dos gases anestésicos (inspirados eexpirados), da capnometria/capnografia e amonitorização hemodinâmica invasiva econtínua. O existente na Sala Operatória éadequado apenas faltando os módu-los/acessórios pediátricos.

b) O ventilador mecânico deverá possuirmódulos compatíveis com ventilação deadultos e crianças, por volume (controladoe garantido), por pressão (controlada e as-sistida), com ciclos respiratórios obrigató-rios e/ou doente dependentes, com ou semsincronização, aplicação de pressão positi-va no fim da expiração, controlo de pressãona via aérea e expirometria numérica e grá-fica. O equipamento existente, embora utili-zado nalgumas instituições, é antigo e nãodispõe de um leque alargado de módulosventilatórios, entre outras possíveis consi-derações, pelo não nos afigura como sendorepresentativo do tipo de equipamento maisdesejável, actual e polivalente para o localem apreço. Mais, não possui sistema dealarme de pressão nas vias aéreas funcio-nante, algo que se considera fundamentalpara a segurança.

20. Ainda no que se refere ao equipamen-to do Bloco Operatório, considera-se quedeve haver cuidados na atribuição exclusi-va de meios a funções específicas, como,por exemplo, que o Carro de Anestesia se-ja unicamente para esse fim (e não simulta-neamente o Carro de Emergência para ou-tras áreas do Hospital, como parece ser ocaso verificado) e que o frigorífico para o ar-mazenamento dos fármacos seja exclusiva-mente para esse fim (e não, em simultâneo,o depósito de alimentos dos profissionais,como foi verificado).

21. No que se refere ao pessoal de enfer-magem nas Salas do Bloco Operatório,considera-se boa prática que haja, sempree em contínuo, enfermeiro adstrito à anes-tesia (com formação e integração adequa-da). Pelo descrito, a equipa de enfermagemmínima na sala de operações deve fixar-senum enfermeiro de anestesia, num enfer-meiro circulante e num enfermeiro instru-mentista (sendo como as funções de circu-lante e de instrumentista, e como estas sãoasseguradas, constituem matéria que nãonos diz respeito). Se bem que o descrito setrate de uma exigência permanente, supor-tada por documentos oficiais do Ministério

da Saúde, é muito mais premente e notóriaa sua necessidade quando se consideramdoentes em situações especialmente gra-ves ou com exigências técnicas específi-cas, como é o caso da Pediatria.

22. No que se refere à Unidade de Cuida-dos Pós-Anestésicos (Recobro), é obrigató-rio prever, no mínimo, condições de obser-vação e manutenção de doentes de acordocom o habitualmente entendido por nível in-termédio de cuidados e, se e quando ne-cessário, durante um período de tempo limi-tado até o encaminhamento adequado, aprovisão de cuidados intensivos.

23. Obrigatoriamente, o nível intermédiode cuidados (caso em apreço) exige a mo-nitorização individual, contínua e simultâ-nea dos parâmetros vitais de todos osdoentes no recobro. Presentemente, exis-tem quatro leitos sendo que apenas se dis-põem de dois monitores de sinais vitais,com pressão arterial indirecta e saturaçãoperiferia de 02, com ecrãs pequenos e pou-co adequados para a fácil visualização (nocontexto da função em apreço) e sem traça-do de ECG.

24. Obrigatoriamente, toda a organizaçãolocal deve estar preparada em função daresposta adequada em caso de emergên-cia. Assim, não fará sentido que as cabecei-ras das camas do recobro não sejam facil-mente removíveis (as presentes no localnão são removíveis) nem que o Carro deAnestesia da Sala de Operações seja si-multaneamente o Carro de Emergência deapoio a um piso inteiro do Hospital (como éo caso).

25. Obrigatoriamente, o nível intermédiode cuidados exige uma relação do n.º enfer-meiros/cama de 1/3 (no caso de existiremdoentes do foro intensivos, a relação passapara 1/2 ou 1/1).

26. Obrigatoriamente, o pessoal de enfer-magem que trabalha na área anestésicadeve possuir formação e integração ade-quada para o efeito, nomeadamente, for-mação e experiência em anestesia e, dese-javelmente, cuidados intermédios e/ou cui-dados Intensivos.

27. Obrigatoriamente, o pessoal de enfer-magem que trabalha em local com activida-de cirúrgica Pediátrica, deve possuir forma-ção e experiência em complementar e es-pecífica (desejavelmente, em centro espe-cializado com casuística apreciável paradotar os profissionais de experiência ade-quada).

28. Obrigatoriamente, enquanto existiremdoentes colocados no Recobro, tem deexistir médico Anestesista responsável peloapoio ao Recobro, permanentemente e em

permanência física no Hospital, em grandeproximidade ao Recobro (como é o caso).

29. Adicionalmente, se existem doentescirúrgicos internados, considera-se obriga-tório o seguimento e acompanhamentodestes por médico responsável e compe-tente para o efeito. Não é da competênciado pessoal de enfermagem estabelecerdiagnósticos, nem poderá ser credível umasituação onde durante um largo período detempo, inclusiva mente naquele onde as es-tatísticas demonstram maior perigo (o pós--operatório imediato e horas seguintes), umHospital se encontre desprovido de apoiomédico com competência para o efeito, e,diferenciado).

Em função do descrito, seja como prin-cípio geral como na análise da situaçãoespecífica do Hospital de Cantanhede,considera-se premente proceder com oseguinte:

30. Obrigatoriamente prever no Hospital aatribuição da responsabilidade nominal pe-la área Pediátrica, incluindo a organizaçãodo circuito do doente, participação na aqui-sição de material específico e criação decondições adequadas para a manutençãodo apoio ao doente pediátrico que, no casodo Bloco Operatório e o Recobro, obrigato-riamente, deve incluir um médico Anestesis-ta, coadjuvado por um enfermeiro de Anes-tesia.

31. Desejavelmente, adquirir um ventila-dor mecânico com características actualiza-das e mais polivalentes (em conformidadecom as exigências descritas) para a SalaOperatória.

32. Obrigatório equipar o monitor de sinaisvitais da Sala de Operações com módulospediátricos, mantendo em estado operacio-nal outras funcionalidades como a capaci-dade de monitorização de gases medicinaise anestésicos, bem como monitorizaçãohemodinâmica invasiva.

33. Equipar a Sala de Operações comequipamento de apoio dedicado e em ex-clusivo (entre os quais, Carro de Emergên-cia e frigorifico para fármacos) que, no casodo Carro de Emergência, dada a proximida-de, poderá ser utilizado também no Reco-bro.

34. Equipar o Recobro com monitor de si-nais vitais por cada doente, com disponibili-dade de acessórios pediátricos (pelo me-nos, nalguns dos casos), com ecrã de ra-zoável dimensão (para fácil visualização) e,em termos ideais, passível de integraçãoem rede no contexto de uma central de mo-nitorização e um eventual processo clínicoelectrónico.

Novembro/Dezembro 2008

Page 46: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

B O L E T I M . I N F O R M A T I V O

35. Equipar o Recobro com um Carro deEmergência com os meios adequados enecessários para a abordagem da dificulda-de respiratória e a reanimação cardiopul-monar, incluindo monitor desfibrilhador,com marca passo (e acessórios pediátri-cos).

36. Equipar o Recobro com meios detransporte de doentes (transporte internoe/ou externo, inclusiva mente do doente crí-tico), em conformidade com o Guia deTransporte de Doente crítico da Ordem dosMédicos/Sociedade Portuguesa de Cuida-dos Intensivos (2008), sendo especialmen-te relevante realçar a necessidade demeios portáteis para o fornecimento de oxi-génio, um aspirador de secreções portátil,um ventilador portátil (com capacidade paraa maioria dos casos pediátricos – mínimo20 Kg peso), monitor de sinais vitais portátil(com acessórios pediátricos) e um monitordesfibrilhador portátil (igualmente comacessórios pediátricos).

37. No que se refere aos médicos Aneste-sistas no Recobro:

a) Presentemente, a grande proximidadecom as Salas do Bloco Operatório nãomandata a dedicação exclusiva de um ele-mento para o Recobro. Este parecer pres-supõe que, obrigatoriamente, na Sala deOperações existe um enfermeiro de Anes-tesia permanentemente dedicado a essafunção. No caso da não existência de enfer-meiro de Anestesia em permanência, devi-damente formado e integrado, não é legíti-mo que o médico Anestesista deixe a Salade Operações sem acompanhamentoanestésico mínimo para se deslocar a qual-quer outro local para abordagem de doen-tes, inclusivamente o Recobro em proximi-dade.

b) Para além do descrito, se a casuísticacirúrgica ou o nível de gravidade médio dosdoentes aumentar significativamente, pode-rá ser legítimo equacionar a marcação fixade um Anestesista em apoio directo ao Re-cobro.

c) Seja qual for o cenário, enquanto exis-tirem doentes no Recobro, é mandatória aexistência de médico Anestesista responsá-vel pelo Recobro, em permanência física nainstituição.

38. No que se refere à permanência médi-ca no Hospital: Considerando a existênciade doentes cirúrgicos internados, o neces-sário acompanhamento para o alívio da dore para o despiste e controlo de eventuaiscomplicações que, inclusivamente, podemmotivar ida emergente para o Bloco Opera-tório, bem como, considerando a necessá-ria resposta à eventual emergência/para-

gem cardio-respiratória que possa acorrerno internamento, é obrigatório como critériode segurança a permanência de um médi-co com reconhecida capacidade em supor-te de vida durante a totalidade do períodonocturno no Hospital.

39. Capacidade tecnicamente idónea emreanimação cardio-respiratória e aborda-gem de situações emergentes não se defi-ne pela frequência de um curso de suporteavançado de vida, ou similar. Antes, consis-te na formação adequada acrescida de de-sempenho regular e experiência prática reale continuada na abordagem de doentesgraves e nas técnicas relacionadas com aexigência desta abordagem, como porexemplo, no manuseamento da via aérea eno suporte cardiovascular.

40. É mandatório que todos os doentesoperados em ambulatório sejam submeti-dos a uma consulta de Anestesiologia, pe-lo que deverá proceder-se à sua organiza-ção.

41. No que se refere ao pessoal de Enfer-magem na Sala de Operações e Recobro:prever a diferenciação comprovada emapoio ao trabalho da Anestesia, incluindo avigilância nível Cuidados Intermédios e aresposta à Emergência. No Recobro, pre-ver recursos humanos nível cuidados inter-médios (incluindo, a relação de um enfer-meiro para cada 3 doentes).

42. Para o bom funcionamento da equipade Anestesia, entre si e no contexto daequipa alargada multidisciplinar e multipro-fissional que é a equipa Médico-Cirúrgica,deverão ser implementados regulamentose normas de serviço que sistematizem pro-cedimentos, equipamentos e competênciasnecessárias, envolvendo os profissionaisna delineação dos objectivos e no acompa-nhamento do desempenho.

43. Para o bom funcionamento da equipae por uma questão de hierarquia técnica ca-racterização dos níveis de responsabilida-de, deverá ser definido o conteúdo funcio-nal e a missão dos vários intervenientes,nomeadamente os dos Anestesiologistas.

São ainda conclusões pertinentes naanálise do Hospital de Cantanhede:

44. Idealmente, para que a actividade ci-rúrgica seja rentável para a instituição e ha-ja resposta permanente às eventuais solici-tações, os Hospitais devem estar dotadosde um mínimo de duas Salas Operatórias.No caso em apreço existe uma, algo que seestranha em termos de programa funcional.

45. Mesmo considerando apenas umaSala Operatória, a presente casuística cirúr-gica total do Hospital é muito baixa (em

2007, cerca de 400/ano, este ano com 436até à data), podendo ser legítimo questio-nar-se se, na ausência de um aumento sig-nificativo do movimento cirúrgico, será ren-tável manter uma unidade cirúrgica em fun-cionamento. A análise custo/benefício posi-tiva recomenda cerca de 1.100 cirurgias/sa-la operatória/ano como número mínimo pa-ra assegurar a rentabilidade.

46. Certamente que, no caso específicoda Pediatria, a média de 15-20 crianças porano (em 2007 houve cerca de 30 casos,aparentemente por acumulação de casosdevido à inactividade do bloco durante al-gum tempo) não é sustentável em termosde defesa do investimento para a imple-mentação de condições para a cirurgia nes-ta faixa etária.

47. Pelo descrito, a questão em causa ul-trapassa a situação estrita da Anestesia Pe-diátrica, sendo de analisar as condições ge-rais para o funcionamento da Anestesia(Bloco, Recobro, apoio à Emergência...) e asustentabilidade e rentabilidade existente eprevista para justificar os necessários inves-timentos.

São conclusões gerais aplicáveis a es-ta situação:

– A eventual invocação de ausência demeios para garantir os requisitos descritosnão é aceitável e deve pressupor a incapa-cidade do Hospital para garantir cuidadosde anestesia de acordo com o actualmenteconsiderado aceitável, adequado e seguro.

– Aeventual invocação de ausência de ca-suística para justificar os investimentos nãoé aceitável e deve pressupor a inexistênciade segurança, idoneidade técnica e justifi-cação para a permanência em funciona-mento da unidade cirúrgica em si para o ti-po de doentes em causa.

NOTA FINAL: Em todos os eventuais ca-sos de litigância civil ou penal para deter-minação de responsabilidades médicas,sempre que for chamado pelas entidadesjudiciais a pronunciar-se, o Colégio de Es-pecialidade terá a posição ora enunciada,tendo em consideração os conhecimentose as boas práticas conhecidas até ao mo-mento.

03 de Setembro de 2008

Os Auditores:Dr. José Martins Nunes

Dr. António MarquesColégio da Especialidade de Anestesiologia

Novembro/Dezembro 2008

Page 47: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

António Augusto da Costa Simões nas-ceu na Mealhada em 23 de Agosto de1819, filho de D. Teresa Justina Simões,da Mealhada, e de Francisco José Si-mões, de Almofala de Baixo.

Licenciou-se em Medicina, pela Facul-dade de Medicina da Universidade deCoimbra, com 24 anos, e de imediato foiexercer para o “partido médico” da Cin-co Vilas e Arega acumulando por algumtempo o “partido” de Figueiró dos Vi-nhos.

É esta experiência clínica e o conheci-mento profundo da terra e suas gentesque lhe dão elementos para escrever“Fotografia Médica da Cinco Villas eArega” em 1860, que a Associação deAposentados da Bairrada, promotora decelebrações do centenário da morte doProf. Costa Simões – 26 de Novembrode 1903 –, solicitou às Câmaras Munici-pais da região (Alvaiázere, Ansião e Fi-gueiró dos Vinhos) a reposição em fac-simile.

No Hospital de Avelar, agora FundaçãoNossa Senhora da Guia, existe uma fo-tografia do Prof. Costa Simões e na fa-chada da antiga escola feminina deChão de Couce, hoje pertencente à Fun-dação D. Fernanda Marques, perduraainda o seu nome.

No Avelar existia muita devoção pelaNossa Senhora da Guia e, com o produ-to das esmolas, ali foi construída umacapela em 1767.

No primeiro fim-de-semana de Setem-bro ali há uma grande romaria comenorme afluência de romeiros, que noseu tempo deixavam muitas esmolas.

Costa Simões apercebeu-se de queenormes quantias eram desviadas paraoutros fins e, assim, pensou na organi-

zação de uma irmandade que adminis-trasse esses fundos, com vista à criaçãode um hospital e logo oferece um projec-to de compromisso, isto é, os estatutosda Irmandade.

Não me podendo alongar aqui, nãoquero deixar de referir o seu artigo 91.°:“Construído o edifício do hospital, em-pregará a mesa todos os esforços parair capitalizando em todos os anos osfundos que puder economizar; servindode estímulo ao seu zêlo e actividade alembrança consoladora de ir encami-nhando as esmolas dos fieis devotos àmelhor aplicação, que pode conceber-se em honra de Nossa Senhora da Guia;à obra de caridade mais meritória e maisapreciada por Deus e pelos homens; aoagazalho, em fim, o tratamento da po-breza enferma, destes infelizes duas ve-zes desgraçados. Passados anos, estascapitalizações sucessivas de parte dosrendimentos provenientes das esmolas,dos juros, etc., darão por si só juros ourendimentos bastantes para a sustenta-ção do hospital e dos encargos da ir-mandade, emancipando-se deste modoa capela e o hospital da contingênciadas devoções, que podem tomar outrocaminho. Com este sistema de capitali-zações, poderão converter-se de futurotodos estes fundos num verdadeiro ban-co rural, de que a agricultura daquelessítios poderá tirar grande proveito...”.

Se se tivesse concretizado esta ideia,estaria criada a primeira Caixa de Crédi-to Agrícola Mútuo do País, quase 150anos antes das actuais, embora imbuídade uma mentalidade completamente di-ferente!...

Efectivamente Costa Simões estavademasiado avançado para o tempo!

Por iniciativa de Adelino de Melo, di-rector de um pequeno jornal local (Vaca-riça) – Bairrada Elegante –, foi erigidoem 1928, para assinalar os 25 anos desua morte um monumento no JardimMunicipal que desde 20 de Março de1912 tem o nome do Prof. Costa Si-

mões.As cerimónias de inauguração foram

presididas pelo General Vicente de Frei-tas, ao tempo Ministro do Interior, estan-do representadas a Universidade deCoimbra, a Faculdade de Medicina epresentes muitas individualidades, entreas quais salientamos uma numerosa re-presentação de Cinco Vilas e Arega,tendo usado da palavra entre outros oDr. Alberto Rego (representando as fre-guesias de Chão de Couce, Pousa Flo-res e Aguda) e o Dr. José Pereira Bara-ta (representando as freguesias de Ave-lar e Maçãs de D. Maria).

Para os estudiosos que tenham inte-resse em aprofundar a vida e obra doProf. Costa Simões, recomendamos aleitura de um livro sobre o tema o Prof.Costa Simões – O passado como exem-plo no futuro, da autoria do Dr. NunoSalgado, editado pela Imprensa da Uni-versidade, dentro destas comemora-ções da iniciativa da Associação de Apo-sentados da Bairrada e aqui deixamos ainformação sintética das suas activida-des, em que evidenciou o maior empe-nho, dedicação, zelo e competência, elocais onde se encontra algum espólio.

ACTIVIDADES

• Médico em Cinco Vilas e Arega(1843) e promotor da construção doHospital de Avelar.

• Professor da Faculdade de Medicinada Universidade de Coimbra (1848).

B O L E T I M . I N F O R M A T I V ONovembro/Dezembro 2008

história

Costa Simões, a pessoa mais importante de Coimbra

Monu-mento a Costa Simões

Escola PrimáriaDoutor CostaSimões emChão de Couce

Page 48: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

• Co-fundador do Instituto de Coimbra(1852) e da sua revista.

• Co-fundador e grande impulsionadordos Banhos de Luso (1852) e do desen-volvimento do Luso.

• Abastecimento de água canalizada àcidade de Coimbra a partir do Rio Mon-dego (grande impulsionador).

• Presidente da Câmara Municipal deCoimbra (1856-1857).

• Introdutor da Histologia em Portugal(1863).

• Deputado por Figueiró dos Vinhos(1868) e eleito Vice-Presidente.

• Administrador dos Hospitais de Uni-versidade de Coimbra (1870-1886).

• Fundador da primeira escola de en-fermagem do País (1881).

• Administrador dos Hospitais da Mise-ricórdia do Porto em Comissão de Servi-ço (1882-1883).

• Par do Reino em representação dascorporações científicas (1885).

• Reitor da Universidade de Coimbra(1892-1898).

• Estudioso de construções hospitala-res pela Europa (três viagens de estu-do).

• Promotor do Hospital da Misericórdiada Mealhada.

• Promotor da construção dos murosda Capela de Sant’Ana e da ponte deCasal Comba.

• Promotor da construção do edifíciodos Paços de Concelho da Mealhada(1895).

• Estudioso das doenças das vinhas eprodutor de vinhos com prémios em ex-posições internacionais.

ESPÓLIO

Biblioteca da Faculdade de Medicinada Universidade de Coimbra

• Maior parte das obras publicadas,com curiosidade de haver alguns ma-nuscritos dessas obras!

• Colecção de plantas de hospitais na-cionais e estrangeiros, sobre os quaisse debruçou para estudo e elaboraçãode pareceres. Esta colecção é tão rica eprocurada, por investigadores do Depar-tamento de Arquitectura da Faculdadede Ciências, que a Biblioteca elaborou,em 2000, um catálogo de todo esse ma-terial de estudo.

Faculdade de Medicina da Universi-dade de Coimbra

Pórtico nascente da Faculdade de Me-dicina. Uma das seis figuras representa-das no baixo relevo (inferior esquerdo) éo Prof. Doutor Costa Simões.

Instituto de Histologia e EmbriologiaProf. Doutor Costa Simões

Foi o Prof. Doutor Costa Simões quecriou o estudo da Histologia em Portugalem 1863.

• Insígnias doutorais do Prof. DoutorCosta Simões.

• “Libermemorialis” que descreve a ho-menagem dos alunos da Faculdade deMedicina, que decorreu à noite, na Salados Capelos, em 21 de Fevereiro de1883, após a sua jubilação, e inclui odiscurso do quintanista Eduardo Abreu.

• Álbum de fotografias de todos os alu-nos da Faculdade de Medicina de 1881–1882, que foi oferecido ao Prof. DoutorCosta Simões, naquele mesmo dia, eque na capa tem a seguinte dedicatória:Ao sábio, honrado e benemérito Profes-sor Costa Simões, os estudantes da Fa-culdade de Medicina do Ano de 1881-1882

• Álbum fotográfico de professores es-trangeiros (64) com quem se relacionounas três viagens de estudo que fez pelaEuropa.

• Máscara mortuária do Prof. DoutorCosta Simões.

• Quadro com a fotografia do Prof.Doutor Costa Simões, que a Faculdadede Medicina mandou colocar no Gabine-te de Histologia e Fisiologia Geral, em27 de Setembro de 1883.

Escola Superior de Enfermagem Ângelo da Fonseca

O Prof. Doutor Costa Simões fundou aprimeira Escola de Enfermagem emPortugal – 1881– e a Escola Superior deEnfermagem Ângelo da Fonseca assu-miu ser a sua continuadora.

• Vários livros da sua autoria que lheforam recentemente doados por familia-res e se encontram numa sala que temo seu nome.

Santa Casa da Misericórdia de Mealhada

• Quadro a óleo do Prof. Doutor CostaSimões.

• Maquete do Monumento do JardimMunicipal Prof. Doutor Costa Simões

• Alguns livros

Junta de Freguesia de Mealhada• Quadro a óleo.

Junta de Freguesia de Vacariça• Modelo em gesso, para reprodução

em bronze, do busto que está no Monu-mento do Jardim Municipal Prof. DoutorCosta Simões.

Sociedade da Água de Luso• Retrato a óleo da autoria de Luciano

Freire.

Reitoria da Universidade de Coimbra• Quadro a óleo na galeria de Reitores

(Sala Amarela).

Quinta do Murtal (Mealhada)A Quinta do Murtal é propriedade de

descendentes do Prof. Doutor Costa Si-mões – D. Joana Alegre

• Diploma de curso.• Termos de posse dos diferentes car-

gos que assumiu como Professor da Fa-culdade de Medicina.

• Diplomas de prémios de concursosinternacionais de vinhos.

• Vários livros da sua autoria.• Livros diversos com dedicatória, ofe-

recidos ao Prof. Doutor Costa Simões.

Fundação de Nossa Senhora da Guia• Fotografia do Prof. Doutor Costa Si-

mões.

J. A. Branquinho de Carvalho26 de Novembro de 2003

B O L E T I M . I N F O R M A T I V O Novembro/Dezembro 2008

Entrada da Faculdade de Medicina deCoimbra, com o baixo relevo de CostaSimões (inferior esquerdo)

Page 49: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

Formulário de Reclamaçãodo Doente

7 Regulamento sobreos profissionais médicosseropositivos e a práticade procedimentos invasivos

8 Medicina do Trabalho– exames médicos

9 Alterações ao Regulamentode Inscrição

Medicina dos Lusitanos

12 Reuniões da UEMO emSófia entre 30 de Outubroe 1 de Novembro

Isabel Caixeiro: «Multi-plicidade de experiências»

Eutanásia: afinal de quefalamos?por Isabel Galriça Neto

22 Eutanásia, uma questãopersistentepor A Direcção do Centro deEstudos de Bioética

24 Eutanásia Sim e Nãopor Rosalvo Almeida

26 A importância da nossasaúdepor Álvaro Durão

IRS: Abatimentos e dedu-ções aos rendimentosde 2008

Cruzeiro da Históriada Medicina– A História da Balança

INFORMAÇÃOINFORMAÇÃOINFORMAÇÃOINFORMAÇÃOINFORMAÇÃO6

ACTUALIDADEACTUALIDADEACTUALIDADEACTUALIDADEACTUALIDADE10

ENTREVISTENTREVISTENTREVISTENTREVISTENTREVISTAAAAA16

CONSULCONSULCONSULCONSULCONSULTTTTTORIA FISCALORIA FISCALORIA FISCALORIA FISCALORIA FISCAL30

EDITEDITEDITEDITEDITORIALORIALORIALORIALORIAL4

S U M Á R I O

Ano 24 – N.º 95 – Novembro 2008

PROPRIEDADE:

Centro Editor Livreiro da Ordemdos Médicos, Sociedade Unipessoal, Lda.

SEDE: Av. Almirante Gago Coutinho, 1511749-084 Lisboa • Tel.: 218 427 100

Redacção, Produçãoe Serviços de Publicidade:

Av. Almirante Gago Coutinho, 1511749-084 Lisboa

E-mail: [email protected].: 218 437 750 – Fax: 218 437 751

Director:Pedro Nunes

Directores-Adjuntos:José Manuel SilvaIsabel Caixeiro

Directora Executiva:Paula Fortunato

E-mail: [email protected]

Redactores Principais:José Ávila Costa,

João de Deus e Paula Fortunato

Secretariado:Miguel Reis

Dep. Comercial:Helena Pereira

Dep. Financeiro:Maria João Pacheco

Dep. Gráfico:CELOM

Impressão: SOGAPAL, Sociedade Gráfica da Paiã, S. A.Av.ª dos Cavaleiros 35-35A – Carnaxide

Depósito Legal: 7421/85Preço Avulso: 1,60 Euros

Periodicidade: MensalTiragem: 38.000 exemplares

(11 números anuais)Isento de registo no ICS nos termos do nº 1, alíneaa do artigo 12 do Decreto Regulamentar nº 8/99

Nota da redacção: Os artigos de opinião e outros artigos assinados são da inteira responsabilidade dosautores, não representando qualquer tomada de posição por parte da Revista da Ordem dos Médicos.

MédicosOrdem dos

Ficha TécnicaFicha TécnicaOPINIÃOOPINIÃOOPINIÃOOPINIÃOOPINIÃO20

REV

IST

A

BOLETIM DABOLETIM DABOLETIM DABOLETIM DABOLETIM DA S S S S S.....RRRRR..... CENTRO CENTRO CENTRO CENTRO CENTRO33

MEDI.COMMEDI.COMMEDI.COMMEDI.COMMEDI.COM63

HISTÓRIAS DA HISTÓRIAHISTÓRIAS DA HISTÓRIAHISTÓRIAS DA HISTÓRIAHISTÓRIAS DA HISTÓRIAHISTÓRIAS DA HISTÓRIA32

Page 50: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

4 Revista ORDEM DOS MÉDICOS • Novembro 2008

E D I T O R I A L

Por entre os meandros da crise eco-nómica vão-se sabendo uns factosaté aqui convenientemente ignora-dos.Habituados que estávamos a ser acausa das desgraças pátrias, impeni-tentes despesistas geradores de obs-cenos défices, vemo-nos agora bemacompanhados, com banqueiros egestores vários a disputarem as ha-bituais páginas dos jornais.Já não somos só nós que gastamosde mais, que ignoramos os funda-mentos da ciência económica, queinsistimos, insensatos, em todos que-rer tratar por igual.Merecedores da mais substantiva crí-tica por nos recusarmos ao acto decontrição e ajoelharmos perante amodernidade e seus cultores, vemosagora estes mesmos a caminho daprisão ou dos telejornais, explican-do onde a realidade levou de vencidaa tese e como na sua inocência dei-xaram escorregar milhões para pa-raísos fiscais ou créditos incobráveis.Antigos ministros que nos invecti-varam de cenho cerrado, ou nosolharam magnânimos do alto do seusaber, brandindo em economês con-ceitos que pressupunham herméti-cos para banais esculápios, justificamagora, em linguagem chã, relaçõesperigosas, buracos financeiros eangélicas distracções.Enquanto os dinheiros públicos vãofluindo na presunção, que todos que-remos acreditar vera, que talvez hajasalvação para o modo de vida quenos habituámos a ver eterno, os ac-tores do espectáculo vão desempe-nhando os seus papéis, fiéis às mar-cações, antes que o pano por umavez desabe.A Sr.ª Ministra da Saúde num mo-mento de sinceridade confessou ig-

A estrelanorar qual o montante da dívida doSNS, não deixando no dia seguintede baralhar os zeros e alvitrar unsdesadequados milhões. Caiu o Car-mo e a Trindade, não faltando umresponsável da oposição, desde logo,a pedir a sua cabeça, pois cabeça aves-sa a memorizar números não me-rece integrar o Governo da Lusi-tânia.Compreende-se a tese. Sendo apolítica um espectáculo virtual emque os números, de preferência osque pelo seu volume não sejam ma-terializáveis pelo pensamento co-mum, constituem os objectos dearremesso, troca e disputa, não sa-ber manejá-los compromete irre-mediavelmente o actor e retira bri-lho ao drama.Esquecer um objecto tão incontor-nável como o valor da dívida é nes-tas tertúlias o mesmo que trocar asdeixas ou replicar em francês noMercador de Veneza levado à cenaem Stratford-upon-Avon.Se os ministros começassem agoraa fazer como Ana Jorge, que displi-centemente disse ao Expresso quepara tomar decisões era mais impor-tante o bom-senso e o conhecimen-to de causa do que a memória dosnúmeros, estaria aberto um perigo-síssimo precedente.Pretender que cada ministro fosseconhecedor da área e dos temas so-bre os quais é pressuposto decidir,seria limitar perigosamente os po-tenciais candidatos aos lugares, oque para além de reduzir as opçõesdo Primeiro-Ministro seria geradorde um insuportável desempregoentre os peritos de banalidades elugares comuns.Poluir a esfera pública com profissi-onais com provas dadas nas respec-

tivas áreas, seria fazer perigar obem-estar daqueles que fazem dapolítica carreira, todos os que, comdedicação, esforço, espírito de sacri-fício e abnegação, prestam diaria-mente provas – sempre que a deglu-tição de paquidermes ou o contor-cionismo da espinal-medula separaamadores de profissionais.Sem uma linguagem comum, semuma plataforma partilhada em quetodos os saberes e gestos se plas-mem, como seria possível fazer po-lítica e traduzi-la nas páginas dosperiódicos ou nas pantalhas das te-levisões?A uniforme e polida esfera públicapassaria a ser uma cacofonia em quemédicos falavam de Saúde, engenhei-ros de aeroportos e professores deensino – uma Babel. Sem esta con-venção perfeita que só a linguagemdos números assegura, tanto maisquanto tão politicamente correctossão árabes, como seria possível tu-telar o povo e deixá-lo viver feliz asua vidinha?Se agora cada um quisesse serdecisor em causa própria como se-ria possível levar à cena êxitos debilheteira tão garantidos como«David contra as corporações» ou

Page 51: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

5Revista ORDEM DOS MÉDICOS • Novembro 2008

«Os Funcionários Públicos – essescalaceiros»?Privado do circo, era de esperar queao povo não bastasse o pão e come-çasse a exigir coisas para o que mani-festamente não está preparado, taiscomo tomar decisões em matériasque lhe digam respeito ou, audáciasem nome, ouvir quem pudesse dosassuntos ter conhecimento.Em momentos de crise é que se co-nhecem os amigos. E esta, sendo re-conhecidamente uma altura que tal,desencadeou o inexorável momen-to de solidariedade. Em socorro do«Sistema» logo se levantou um dosseus fiéis guardiães, a verdadeira es-sência da «Força», a Entidade Regu-ladora.Assim, mal pousavam as partículas depoeira de tão inconveniente entre-vista, de tão inocente confissão, e lo-go os jornais anunciavam um exer-cício da maior pureza ideológica, me-recedor de ser inscrito nos anais decomo administrar a coisa pública daSaúde e como obter o tão conheci-do value for money.Os Hospitais, e no futuro todos osoperadores (não estamos a falar decirurgiões), seriam classificados numranking identificado por estrelas.Em breve deixará de existir Hospi-tal de Santa Maria, de São João ouda Senhora da Oliveira. Deixarão deexistir os HUC, com esse anacronis-

mo de universidade, os distritais ouconcelhios. Mesmo a ainda recenteclassificação das urgências em bási-cas, médico-cirúrgicas e polivalentescederá o passo à nova e simples for-ma de classificação.Como os hotéis e pensões, os hos-pitais passarão a ser classificados porestrelas, presumivelmente de uma acinco. Apesar de também neles secomer, felizmente hoje em outsour-cing, resistiu-se à sua comparaçãocom restaurantes e casas de pastoo que levaria a que muitos, não atin-gindo o brilhantismo das estrelas, ti-vessem de ser classificados em ta-lheres.Para demonstrar que se trata deuma iniciativa séria, e não mais umapromessa sem consequência, fomosdevidamente informados de que jáestaria escolhido o parceiro (leia-sequem vai cobrar milhões pelo exer-cício) e já teriam sido comprados,sublinhe-se comprados, os indicado-res.Resisto de momento a interrogar-me quanto teriam custado os ditosou imaginar a Medicina exercida comtal cultura. Os doentes, agora trans-formados em clientes, comprariamà entrada do hospital os seus indica-dores de Saúde, da febre à marchaautónoma, da acuidade visual àverbalização, num sem fim de poten-cialidades que tornariam possível os

grandes progressos à semelhança doque se tem registado nas médias dosexames de matemática.De momento só me cabe curvar pe-rante a originalidade e o interesseda ideia. Atento o facto dos hospi-tais públicos fornecerem serviçostendencialmente gratuitos, mediadospor umas taxas moderadoras pou-co mais que irritantes, tal atribuiçãode estrelas não arrisca sequer a frus-tração tão comum nos hotéis de nãopoder frequentar alguns por falta decabimento orçamental doméstico.Considerando ainda que, de uma for-ma geral, os doentes são encaminha-dos para o hospital conforme a áreade residência, as estrelinhas da ERSnem sequer arriscam a tensão da es-colha mas unicamente a disputaautárquica que tantos réditos asse-gura à política pátria.Fico esmagado com o poder da ideia.Como foi possível a Ordem não seter lembrado mais cedo de tal siste-ma.Falta-nos de facto uma percepçãofundamental... a de que the show mustgo on...

E D I T O R I A L

Envie-nos os seus artigosPara que a revista da Ordem dos Médicos possa ser sempre o espelho da opinião dos profissionais detodo o país, agradecemos a colaboração de todos os médicos que desejem partilhar as suas opiniões,experiências ou ideias com os colegas, através do envio de artigos para publicação na Revista daOrdem dos Médicos. Os artigos devem ser acompanhados de uma fotografia do autor (tipo passe) epoderão ser enviados para os contactos que se encontram na ficha técnica (morada da redação e/ourespectivo e-mail).

Page 52: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

6 Revista ORDEM DOS MÉDICOS • Novembro 2008

I N F O R M A Ç Ã O

Formulário de Reclamação do DoenteEncontra-se disponível para download no site da Ordem dos Médicos o Formulário de Reclamação do Doente.Trata-se de um documento que já existe, por exemplo, em países como o Reino Unido. O formulário tem porobjectivo servir como um instrumento de simplificação da participação disciplinar e, consequentemente, dos direi-tos do doente, o que constitui uma preocupação central da Ordem dos Médicos enquanto associação pública como poder de exercer a acção disciplinar de uma forma absolutamente abrangente da actividade médica.

Pode imprimir o formulário em www.ordemdosmedicos.pt

Médico precisa-seA Organização Não Governamental «Douleurs Sans Frontières» necessita, para a sua missão de saúde rural emAngola, de um médico de nacionalidade portuguesa.

Condições:

- O médico tem que estar inscrito na Ordem dos Médicos portuguesa;- Pede-se capacidade de elaborar e executar acções de formação relacionadas com enfermeiros, técnicos básicos eparteiras tradicionais e área de higiene;- Disponibilidade para trabalhar em província;- Bons conhecimentos de informática (Word, Excel, Power Point, Access).

A ONG exige ainda domínio do português e conhecimentos razoáveis de francês.

Curriculum Vitae - incluindo contacto telefónico - a enviar por email para:

[email protected]

Page 53: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

7Revista ORDEM DOS MÉDICOS • Novembro 2008

I N F O R M A Ç Ã O

O Conselho Nacional Executivo aprovou, em reunião de 21 de Outubro de

2008, uma peça regulamentar que estabelece as práticas clínicas adequadas

às situações de risco de transmissão de VIH por médicos.

A transmissão do V.I.H. coloca em risco os profissionais de Saúde envolvidos em procedimentos invasivos.De igual modo, os doentes submetidos a actos médicos invasivos ficam expostos à infecção pelo V. I.H. Noentanto, não estão descritos casos de transmissão de V. I.H. por médicos, desde que sejam cumpridas aspráticas clínicas adequadas e os cuidados universais praticados em ambiente hospitalar. Com base no estadodos conhecimentos e da experiência da medicina, a Ordem dos Médicos, através da deliberação aprovadaem 17 de Junho de 2008, do Conselho Nacional Executivo, e ao abrigo das disposições conjugadas da alíneaa) do artigo 6.º, das alíneas e) e j) do artigo 64.º e com observância da alínea h) do artigo 89.º, todos doEstatuto da Ordem dos Médicos, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 282/77, de 5 de Julho, aprova, para valercomo Regulamento, o seguinte:

1. Os médicos devem usar os mais altos padrões de controlo da infecção, recorrendo às melhores barrei-ras estéreis conhecidas, às precauções universais e às práticas cientificamente aceites do controlo dainfecção. Estas medidas devem ser extensíveis a todos os locais onde se praticam procedimentos invasivoscirúrgicos e a todos os doentes que sejam objecto desses procedimentos.

2. Os médicos, nomeadamente especialistas em áreas cirúrgicas, seropositivos para o V.I.H. podem continuara praticar procedimentos invasivos e intervenções cirúrgicas.

3. São excepções ao disposto no número anterior:

a) A demonstrada incapacidade do médico para cumprir os procedimentos básicos de controlo dainfecção; ou

b) O médico estar, comprovadamente, incapaz funcionalmente para tratar os seus doentes.

4. A comprovação das circunstâncias referidas nas alíneas a) e b) do número anterior deverá ser efectuadapelo clínico assistente do médico seropositivo ou por uma Comissão institucional designada para esse fim.Esta comissão deverá incluir infecciologistas, cirurgiões e especialistas de Medicina do Trabalho.

Regulamento sobre os profissionaismédicos seropositivos e a práticade procedimentos invasivos

Page 54: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

8 Revista ORDEM DOS MÉDICOS • Novembro 2008

I N F O R M A Ç Ã O

Obviamente, este Departamento Jurídico não está habilita-do à emissão de um parecer técnico, pelo que se quedarápela análise legal e deontológica da questão, devendo amatéria ser também apreciada pelo Colégio da Especialida-de de Medicina do Trabalho.O artigo 245.º da Lei n.º 35/2004, de 29 de Julho, queregulamenta o Código do Trabalho, determina o seguinte:

1 – O empregador deve promover a realização de exames desaúde, tendo em vista verificar a aptidão física e psíquica dotrabalhador para o exercício da actividade, bem como a reper-cussão desta e das condições em que é prestada na saúde domesmo.2 – Sem prejuízo do disposto em legislação especial, devem serrealizados os seguintes exames de saúde:a) Exames de admissão, antes do início da prestação de traba-lho ou, se a urgência da admissão o justificar, nos 15 dias seguin-tes;b) Exames periódicos, anuais para os menores e para ostrabalhadores com idade superior a 50 anos, e de dois em doisanos para os restantes trabalhadores;c) Exames ocasionais, sempre que haja alterações substanciaisnos componentes materiais de trabalho que possam ter reper-cussão nociva na saúde do trabalhador, bem como no caso deregresso ao trabalho depois de uma ausência superior a 30 diaspor motivo de doença ou acidente.3 – Para completar a observação e formular uma opinião preci-sa sobre o estado de saúde do trabalhador, o médico do trabalhopode solicitar exames complementares ou pareceres médicosespecializados.4 – O médico do trabalho, face ao estado de saúde do trabalha-dor e aos resultados da prevenção dos riscos profissionais naempresa, pode reduzir ou aumentar a periodicidade dos exa-mes, devendo, contudo, realizá-los dentro do período em queestá estabelecida a obrigatoriedade de novo exame.5 – O médico do trabalho deve ter em consideração o resultadode exames a que o trabalhador tenha sido submetido e quemantenham actualidade, devendo instituir-se a cooperação ne-cessária com o médico assistente.

MEDICINA DO TRABALHO– EXAMES MÉDICOS

O Conselho Nacional Executivo aprovou, a 21 de Outubro de 2008, um pare-

cer do Departamento Jurídico sobre a legitimidade das empresas de Medici-

na do Trabalho passarem requisições para a realização de exames comple-

mentares de diagnóstico sem que o médico tenha consultado previamente o

trabalhador, que se publica.Por outro lado, e com relevância para a questão, o CódigoDeontológico da Ordem dos Médicos (1985) dispõeo seguinte:

Artigo 46.º – Liberdade dos Médicos

O Médico tem o direito à liberdade de diagnóstico e terapêutica,mas deve abster-se de prescrever exames ou tratamentos desne-cessariamente onerosos ou de realizar actos médicos supérfluos.

Artigo 91.º – Responsabilidades

O Médico deve ter em consideração as suas responsabilidadessociais no exercício do seu direito à independência na orientaçãodos cuidados e na escolha da terapêutica, assumindo uma atitu-de responsável perante os custos globais da saúde.

Artigo 97.º – Médico perito

O Médico encarregado de funções de carácter pericial, tais comoserviços biométricos, Juntas de Saúde, Médico de Companhias deSeguros e Médico do Trabalho, deve submeter-se aos preceitosdeste Código, nomeadamente em matéria de segredo profissio-nal, não podendo aceitar que ponham em causa esses preceitos.

Artigo 98.º – Independência

O Médico encarregado de funções periciais deve assumir umaatitude de total independência em face da entidade que o tivermandatado e das pessoas que tiver de examinar, recusando-se aexaminar quaisquer pessoas com quem tenha relações susceptí-veis de influir na liberdade dos seus juízos.

Artigo 103.º – Actuação

1. O Médico perito deve utilizar apenas os meios de exameestritamente necessários à sua missão e não prejudiciais ao exa-minando, abstendo-se sempre que este se recuse formalmentea deixar-se examinar. (…)

Page 55: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

9Revista ORDEM DOS MÉDICOS • Novembro 2008

Analisados estes preceitos, concluímos que existe uma pe-riodicidade estabelecida pela Lei para a realização de exa-mes médicos para verificação da aptidão física e psíquicado trabalhador. Estes exames devem ser os adequados averificar as condições específicas de um determinado tra-balhador para uma concreta função.O juízo que precede a emissão das requisições deve serfeito pelo médico que conhece a natureza da actividadedesempenhada, os riscos que lhe são inerentes e as eventu-ais implicações dessa actividade na saúde física e psíquicado trabalhador. É, portanto, da competência e da responsa-bilidade do médico do trabalho a decisão de requerer arealização dos exames, bem como o momento em que ofaz, devendo realizar uma consulta prévia.

Na consulta posterior deve o médico do trabalho observar apessoa e avaliar o resultado dos exames requeridos, bemcomo dos demais que o trabalhador apresente, realizadospor indicação do seu médico assistente. Perante esta análise,ponderará da necessidade da realização de outros exames.

Em suma:

– Os médicos de trabalho devem sempre consultar os do-entes para melhor poderem decidir quais os exames neces-sários ao apuramento do seu estado de saúde;

A Consultora JurídicaAna Simões Ferreira

I N F O R M A Ç Ã O

Alterações ao Regulamento de Inscrição«Tendo em atenção as alterações introduzidas no ensino da Medicina, derivadas da implementação do processo deBolonha, as Faculdades deixarão de emitir o grau de licenciado em Medicina, passando a atribuir o grau de mestre emMedicina. Estas alterações não comportam mudanças significativas em termos curriculares ou de formação académica.Nesta medida, importa assegurar a igualdade de tratamento, em termos de acesso à profissão, entre licenciados emestres em Medicina. Assim, o Conselho Nacional Executivo, reunido a 16 de Setembro, deliberou alterar o artigo 1.°do Regulamento de Inscrição, aditando os números 3, 4 e 5, ficando com a seguinte redacção:Art. 1.ºIncrição e exercício da Medicina1 – Para o exercício da Medicina é obrigatória a inscrição na Ordem dos Médicos. 2 - Só podem inscrever-se na Ordemdos Médicos: a) os portugueses e estrangeiros licenciados em Medicina por escola superior portuguesa; b) os portugue-ses e estrangeiros licenciados em Medicina por escola superior estrangeira, desde que vejam reconhecidos os seustítulos; c) os portugueses e estrangeiros licenciados em Medicina por escola superior estrangeira que tenham obtidoequivalência oficial de curso devidamente reconhecida pela Ordem dos Médicos. 3 – São equiparados aos licenci-ados em Medicina, cujos títulos tenham sido emitidos antes da implementação do processo de Bolonha,os mestres em Medicina, cujo grau tenha sido obtido após a implementação daquele processo. 4 – Opresente regulamento aplica-se a todos os interessados independentemente de apresentarem diplomade licenciatura pré-Bolonha ou de mestre pós-Bolonha. 5 – Aos mestres e aos licenciados em Medicina,tal como definidos nos números anteriores, é assegurado tratamento igual e não discriminatório noacesso à profissão.»

Page 56: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

10 Revista ORDEM DOS MÉDICOS • Novembro 2008

A C T U A L I D A D E

Medicina dos LusitanosNo dia 30 do passado mês de Outubro, na Sala Portugal da Sociedade de

Geografia de Lisboa, foi lançada a segunda edição de «Medicina dos Lusita-

nos», lição proferida em 1925 na belíssima Sala de Actos Grandes do Campo

de Santana da Faculdade de Medicina de Lisboa, pelo Professor Doutor Leite

de Vasconcellos. Esta edição foi levada a cabo pela Secção de História da

Medicina da Sociedade de Geografia, com o apoio do Museu Nacional de

Arqueologia e da Ordem dos Médicos através do seu Centro Editor Livreiro.

A primeira edição estava esgotada e sendo esta umaobra primordial da medicina primitiva da Lusitânia,escrita pelo grande cientista, merecia ser posta denovo à disposição do público, principalmente de mé-dicos e estudantes de medicina, arqueólogos e his-toriadores. Foi o que fez a Secção de História daMedicina da Sociedade de Geografia, instituição cen-tenária e de referência na Ciência portuguesa, como empenhado apoio do Museu Nacional de Arque-ologia e da Ordem dos Médicos através do seu Cen-tro Editor Livreiro, CELOM.Prefaciada pelo Presidente da Secção de História daMedicina da SGL, Victor Machado Borges, cujo em-penho e dedicação ao projecto de reeditar a «Medi-cina dos Lusitanos» foram enaltecidos pelo presi-dente da Sociedade de Geografia, e com uma exce-lente e documentada introdução da médica, poeti-sa, escritora e germanista Maria do Sameiro Barro-so, a obra, que mantém a ortografia original, inclui atradução do Código Visigótico que regulamentava aactuação médica (em latim no original) bem como atranscrição das inscrições epigráficas, da autoria de

Representantes das entidades envolvidas no projecto dereedição da Medicina dos Lusitanos

Page 57: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

11Revista ORDEM DOS MÉDICOS • Novembro 2008

A C T U A L I D A D E

Na mesa: Paulo Coelho, responsável pela Biblioteca Histórica da OM,em representação do Bastonário da Ordem dos Médicos, Luís Aires-Barros, presidente da Sociedade de Geografia e João Luís Raposo,director do Museu Nacional de Arqueologia

Inês de Ornellas e Castro e de José d’Encarnação, respec-tivamente, e ainda com fotografias em extra-texto das peçasarqueológicas representadas em desenho na edição original.A edição foi apresentada numa sessão científica na Socie-dade de Geografia, e estiveram presentes, entre outros, LuísAires-Barros, presidente da sociedade, Paulo Coelho, res-ponsável pela Biblioteca Histórica da OM, em representa-ção do Bastonário da Ordem dos Médicos, João Luís Rapo-so, Director do Museu Nacional de Arqueologia Dr. Leitede Vasconcelos, Santinho Cunha, fundador da Secção deHistória da Medicina da Sociedade de Geografia, Victor Ma-chado Borges, actual presidente da Secção de História daMedicina. Nesta sessão enalteceu-se Leite Vasconcellos comoum homem de grande rigor científico e de uma honestida-de intelectual admirável, que construiu uma obra pautadapelo rigor da análise. Um homem extraordinário, ímpar, umpatriota que estudou as raízes da cultura portuguesa, umexemplo ético e moral. Maria do Sameiro Barroso salientouna sua intervenção a interdisciplinariedade deste «cientistade todos os saberes».Seguidamente foi inauguradauma exposição sobre a vida eobra de Leite de Vasconcellos euma exposição de objectos pes-soais e das obras desse médicoque se assumiu sempre como tal,apesar de não fazer clínica, masse distinguiu como filólogo, etnó-logo, arqueólogo, numismata, efoi director da Biblioteca Na-cional e professor da Faculdadede Letras de Lisboa. Esta sessãofoi uma organização conjunta daSecção de Arqueologia, de Etno-grafia, de História, de História daMedicina e da Biblioteca da SGL.Esta obra pode ser adquiridaatravés do Centro Editor Livrei-ro da OM.

Exposição sobre a vida e obra de Leite de Vasconcellos

Entre a vasta audiência encontrava-se Santinho Cunha, um dos fundadores da Secção de Históriada Medicina da Sociedade de Geografia

Page 58: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

12 Revista ORDEM DOS MÉDICOS • Novembro 2008

A C T U A L I D A D E

A capital búlgara foi o local de reu-nião da organização europeia de mé-dicos de clínica geral e de família(UEMO), entre 29 de Outubro e 1 deNovembro de 2008. Ao longo dos trêsdias de trabalho decorreram reuniõesdo Conselho Executivo, dos Gruposde Trabalho, de Chefes de DelegaçõesNacionais e a Assembleia-geral.Com a participação de delegações emrepresentação da Medicina Geral eFamiliar (MGF) de 23 países euro-peus, o conjunto de reuniões de Ou-tono decorreu em Sófia com o aco-lhimento da Associação MédicaBúlgara, no âmbito da presidênciaportuguesa da UEMO para o man-dato 2007-2010.Foram apresentados desenvolvimentosem relação a diversas temáticas espe-cializadas no seio da UEMO, tais comoa formação pós-graduada e desenvol-vimento profissional contínuo, o futu-ro dos recursos humanos em MGF,prevenção em saúde, responsabilida-de médica, qualidade na prática médi-ca em MGF e o reconhecimento euro-peu da especialidade de MGF.Nesta reunião foi aprovada uma po-sição da UEMO relativa à prevençãoda violência familiar, com ênfase nopapel do médico de famíl ia nadetecção destas situações. Atenden-do à proximidade e confiança esta-belecida com os seus doentes, o mé-dico de família pode desempenharuma intervenção fulcral no reconhe-cimento e acompanhamento de po-tenciais vítimas de violência física,emocional ou de negligência.No âmbito do desígnio estratégico dereconhecimento europeu da especi-alidade de MGF (nomeadamente noâmbito da Directiva Europeia 2005/

Reuniões da UEMO em Sófia entre30 de Outubro e 1 de Novembro

Presidência portuguesa reforça aposta na necessidade de reconhecimento

europeu da especialização em MGF.36/CE relativa a qualificações pro-fissionais), a presidência portuguesaapresentou um relatório sobre o pon-to de situação nos diferentes paísese propostas para o reforço da estra-tégia traçada pela UEMO neste âm-bito.A intervenção, apoiada pelas delega-ções de todos os países, passará peloreforço de interacção com os deciso-res políticos europeus e dos diferen-tes países, bem como com as autori-dades nacionais responsáveis pelo re-conhecimento da qualificação médi-ca. Esta abordagem preconiza o au-mento de informação e conhecimen-to sobre a especialidade de MGF esensibiliza para a necessidade de serestabelecido um quadro harmoniza-do de especialização médica em MGFno espaço europeu.A garantia indispensável à qualidade esegurança dos cuidados prestados aosdoentes passa assim pelo reforço doscuidados de saúde primários e, nesteâmbito, pela adequada valorização docontributo dos médicos de família. Estanecessidade é reforçada pelo surgimen-to recente de um maior número deiniciativas comunitárias no âmbito dasaúde, nomeadamente as que visamfavorecer a mobilidade de doentes, emparalelo com a já existente mobilida-de de médicos e outros profissionaisde saúde.As delegações nacionais presentesapresentaram também os relatóriosnacionais sobre a evolução da MGFem cada país, promovendo a troca deinformações e de experiências úteis àsorganizações representativas dos mé-dicos europeus.No âmbito da organização da UEMOforam actualizados os desenvolvimen-

tos do seu estabelecimento como or-ganização sob legislação belga, tendoem vista o reforço do seu papel deparceira das instituições europeias. Foieleito o médico espanhol Francisco To-quero para substituir o médico austrí-aco Reiner Brettenthaler, que cessoufunções como um dos vice-presiden-tes da UEMO.Nesta reunião foi orador convidado oXavier Deau, do Conselho Nacionalde Educação Médica da Ordem dosMédicos Franceses, que apresentoudetalhadamente a organização e espe-cialização da MGF em França, que en-volve 60.000 médicos.A presidente da UEMO, Isabel Caixei-ro, lançou o desafio aos representan-tes dos médicos europeus de MGFpara o desenvolvimento de uma parti-cipação activa da UEMO nas iniciati-vas europeias em curso, nomeadamentea «Europe for Patients», uma das pre-vistas no âmbito da Comissão Europeia,com particular destaque para as im-plicações de uma mobilidade alargadade doentes.Recorde-se que a UEMO (UniãoEuropeia dos Médicos de Clínica Ge-ral e Medicina Familiar) representa osmédicos de MGF de 24 países euro-peus, com presidência portuguesapara o mandato 2007-2010: IsabelCaixeiro (Presidente), Luís Filipe Go-mes (Secretário Geral), Manuela San-tos (Tesoureira), Henry Finnegan(Vice-Presidente), Eirik Bø Larsen(Vice-Presidente), Ferenc Hajnal (vice-presidente) e Francisco Toquero (Vice-Presidente). A delegação portuguesaà Assembleia-geral da UEMO foi com-posta por Jaime Correia de Sousa(chefe de delegação), Luiz Santiago eJosé Luís Gomes.

Page 59: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

16 Revista ORDEM DOS MÉDICOS • Novembro 2008

E N T R E V I S TA

ROM – Qual é a importância deste con-gresso?Isabel Caixeiro – Considero uma

mais-valiao facto deconseguir-mos pela

primeiravez realizar

em conjuntoo CongressoNacional deMedicina, oCong re s so

Isabel Caixeiro fala sobre o congresso que vai reunir a Medicina portuguesa e lusófona

«Multiplicidadede experiências»

A 19, 20 e 21 de Fevereiro de 2009 decorrerão, em Lisboa, o III Congresso da

Comunidade Médica de Língua Portuguesa, o V Congresso Nacional do Mé-

dico Interno e o XIV Congresso Nacional de Medicina. Isabel Caixeiro, a pre-

sidente do Conselho Regional do Sul, que é presidente executiva desta inicia-

tiva da Ordem, destaca o cruzamento de experiências e saberes médicos das

várias regiões do espaço lusófono, o objectivo de atrair os jovens médicos

para a participação e o lançamento de uma discussão abrangente sobre as

carreiras médicas e as especialidades como os pontos mais importantes.Nacional do Médico Interno e ainda oCongresso da Comunidade Médica deLíngua Portuguesa. Isso permite umamultiplicidade de experiências e a tro-ca dessas experiências entre médicosque falam português. Teremos connoscoos bastonários e presidentes das asso-ciações congéneres dos países de lín-gua portuguesa que já fazem parte daComunidade Médica de Língua Portu-guesa (CMLP), nomeadamente as Or-dens dos Médicos de Angola,Moçambique e Cabo Verde, ConselhoNacional de Medicina do Brasil e As-sociação Médica Brasileira. Estará tam-

bém presente um colega da comuni-dade de médicos portugueses emMacau, onde se espera que seja cridauma associação. Estão a ser efectuadoscontactos com médicos de Timor demodo a poderem vir a estar presentes.Estamos assim a alargar a CMLP, que,saliento, possui já o estatuto de obser-vador da Comunidade dos Países deLíngua Portuguesa.

ROM – São médicos de regiões muitodistintas do mundo e com problemasmuito diversos...IC – Claro, mas a importância destaparticipação da CMLP tem muito a vercom o reconhecimento de que a Me-dicina e os seus conceitos éticos sãotransversais a todos os médicos e acultura médica de língua portuguesa éum património comum que devemosdesenvolver.

ROM – Os médicos africanos, por exem-plo, não terão problemas mais básicos pararesolver?IC – A fundamentação ética e deonto-lógica é independente das condiçõesem que os médicos têm que exercer asua profissão. É evidente que quanto

«A fundamentaçãoética e deontológicaé independente dascondições em que

os médicos têm queexercer a sua

profissão»

Page 60: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

17Revista ORDEM DOS MÉDICOS • Novembro 2008

piores forem as condições mais difícilé conseguirem o pleno exercício dasua profissão. Nós temos apoiado, coma nossa experiência, os colegas dasoutras ordens para o reconhecimentodas Ordens enquanto entidades regu-ladoras da profissão e responsáveispela exigência do comportamento éti-co e deontológico dos médicos.

ROM – O modelo português da Medici-na, nomeadamente de formação, pode serpassado para esses países?IC – Temos todos a aprender com aexperiência de todos. O nosso mode-lo de formação é muito estruturado ereconhecido a nível internacional. Al-guns dos colegas que vêm de paísesda CMLP poderão aprender com onosso modelo e até já tem havido apro-ximações; recordo-me que logo no iní-cio da actividade da CMLP, os colegasdo Brasil conseguiram introduzir mo-dificações quanto ao tempo de forma-ção nas especialidades. A Ordem dosMédicos de Cabo Verde está em plenoprocesso de criação das suas especia-lidades e nós disponibilizámos os nos-sos programas de formação. Está tam-bém a avançar o projecto do Centrode Formação Médica Pós-Graduada daCPLP. Cada país tem conhecimento dassuas necessidades e terá que definir aformação na especialidade adequadaà sua realidade.Neste contexto de aprendizagem recí-proca e de um conhecimento mais pró-ximo de outras realidades, estou certaque este congresso será enriquecedorpara todos os participantes. Na Ses-são de Abertura, a presença do Direc-tor Regional para África da Organiza-ção Mundial da Saúde, dr. Luís Sambo,que proferirá a conferência de abertu-ra, com o tema «Medicina e desenvol-vimento dos povos – objectivos domilénio» salienta a importância desteevento.

ROM – Quais são os temas mais impor-tantes do congresso?IC – Os temas decorrem da nossa preo-cupação quanto à responsabilidade dosmédicos em relação ao desenvolvimen-to humano e ao direito à saúde.

Uma das áreas importantes é o debatesobre os Sistemas Nacionais de Saúdede cada um dos países e as experiên-cias e expectativas, nomeadamente emtermos de carreiras médicas, um temaque está em discussão no nosso país.A reestruturação das carreiras médi-cas e o desenvolvimento do SNS sãoimprescindíveis para o desenvolvimen-to profissional contínuo dos jovensmédicos. Outra área importante a de-bater é o papel das associações médi-cas na política de saúde de cada umdos países.No caso dos temas «A Ética Médica– Desafios do séc. XXI» e «Responsa-bilidade Civil e Penal dos Médicos», aexperiência dos brasileiros pode sermuito útil para nós e vice-versa. Ou-tro aspecto aliciante para os médicosportugueses, neste mundo global demobilidade de médicos e de doentes,é tomarem conhecimento das realida-des dos países lusófonos. A possibili-dade de, durante a formação, os médi-cos internos realizarem estágios nou-tro país onde a língua é comum estácontemplada no nosso modelo de cri-ação do Centro de Formação MédicaPós-Graduada da CMLP. Um dos ob-jectivos é permitir que a formação sejafeita de modo alternado, no país deorigem, em hospitais ou centros desaúde reconhecidos como idóneos paraformação, complementado com está-gios noutro país com maior experiên-cia, como Portugal ou Brasil. Este mo-delo abre espaço para a aprendizagemmútua e evita que os médicos que vãofazer formação fora não regressem aopaís de origem que deles tanto neces-sita.

ROM – E estritamente para a medicinaportuguesa, há algum grande tema?IC – Há um tema que está relaciona-do com a evolução na carreira, que éo modelo de especialidades médicas.Temos assistido a uma pulverização deespecialidades médicas, de superespe-cialização, e está na altura de entrar-mos numa reflexão nova: será que émais útil voltarmos ao modelo de umtronco comum e depois daí partiremas subespecializações?

Em resumo, há aqui um debate de idei-as que é importante ser lançado e par-ticularmente num ambiente aberto elusófono, o que pode ser muito útil pa-ra a discussão.

ROM – Acha que estão criadas as condi-ções para atrair um número grande demédicos?IC – É importantíssimo que os médi-cos estejam presentes no congresso enos debates. Considero que os temassão, só por si, atractivos. Para além dis-so, o Conselho Regional do Sul deci-diu incluir a cerimónia de Juramentode Hipócrates na abertura do congres-

E N T R E V I S TA

«Neste contexto deaprendizagem

recíproca e de umconhecimento maispróximo de outras

realidades, estou certaque este congressoserá enriquecedor

para todos osparticipantes»

Page 61: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

18 Revista ORDEM DOS MÉDICOS • Novembro 2008

so, porque consideramos importanteque os jovens médicos tenham conhe-cimento da existência do CongressoNacional de Medicina, dirigido a to-dos os médicos e cuja inscrição é gra-tuita, também do Congresso Nacionaldo Médico Interno, que será o seu es-paço preferencial de debate. A divul-gação da Comunidade Médica de Lín-gua Portuguesa e o lema do congres-so, «Os médicos e o desenvolvimentohumano. O direito à saúde – que futu-ro?», são também atractivos para to-dos os médicos. Termos jovens que ini-ciam agora a sua carreira e médicoscom diferentes experiências, no con-

gresso, vai permitir a todos perceberas dificuldades e as realidades de ou-tros países que falam a mesma línguae, por conseguinte, ficar com uma no-ção mais global deste mundo globali-zado.

ROM – Mas o congresso tem ainda umanovidade no último dia...IC – Vamos fazer uma assembleia-ge-ral de médicos... penso que é a segun-da vez que se realiza uma iniciativadeste tipo no nosso país. A primeirafoi nos tempos conturbados em que aministra da Saúde era a dra. LeonorBeleza. O momento que vivemos justi-

«Com as mudanças eos riscos, que quer ascarreiras quer o SNS

correm, pensamosque é muito impor-tante convocar oscolegas para esta

assembleia-geral demédicos paradiscutirmos as

carreiras»

fica fazer uma nova assembleia, que iráser no sábado à tarde (dia 21 de Feve-reiro). Com as mudanças e os riscos,que quer as carreiras quer o SNS cor-rem, pensamos que é muito importan-te convocar os colegas para estaassembleia-geral de médicos para dis-cutirmos as carreiras.

ROM – É só para discutir as carreiras?IC – É para discutir basicamente ascarreiras e também o futuro. A subes-pecialização pode ser considerado umgrau de carreira, portanto, o debateem relação à estruturação das especi-alidades pode encaixar nesta discus-são. A Ordem dos Médicos compro-meteu-se a criar um sistema de evolu-ção e avaliação do desenvolvimentoprofissional contínuo dos médicos e éisso que fará durante o próximo ano.Este congresso pode ser um marcoimportante para o lançamento do de-bate e para a consciencialização dosmédicos. A situação caótica de existi-rem no mesmo hospital variadíssimasmodalidades de exercício, contratosindividuais de trabalho, médicos dacarreira médica e «tarefeiros» cria umambiente que provoca mal-estar e des-trói o desenvolvimento harmónico doServiço Nacional de Saúde.

E N T R E V I S TA

Page 62: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

19Revista ORDEM DOS MÉDICOS • Novembro 2008

E N T R E V I S TA

Regulamento da atribuição da Medalha de Mérito da Ordem dos Médicos

Medalhas de mérito

Como é tradicional no Congresso Nacional de Medicina vão ser entregues, na Sessão de Encerramento, as medalhasde mérito atribuídas a médicos que se distinguiram. A atribuição é decidida de acordo com o seguinte regulamento:

Regulamento da atribuição da Medalha de Mérito da Ordem dos Médicos

Artigo 1º – É instituído o galardão «Medalha de Mérito da Ordem dos Médicos»

Artigo 2º – A «Medalha de Mérito» é conferida aos médicos que tenham contribuído relevantemente, pela suaactividade e mérito pessoal, para a dignificação da profissão médica, da medicina em geral e da humanidade.

Artigo 3º – a) A atribuição desta distinção depende da deliberação tomada pelo Conselho Nacional Executivo, aproposta de qualquer dos seus membros; b) O Conselho Nacional Executivo é assessorado por uma comissão daqual fazem parte os ex-Bastonários, os Presidentes das Assembleias Regionais e os Presidentes dos ConselhosNacionais Consultivos, que deverá ser consultada e ter um parecer favorável na atribuição da Medalha de Mérito.

Artigo 4º – Os homenageados com a «Medalha de Mérito da Ordem dos Médicos» terão direito a usá-la em todasas cerimónias solenes promovidas pela Ordem dos Médicos.

Artigo 5º – a) A entrega da «Medalha de Mérito» será feita pelo Presidente da Ordem dos Médicos em sessão solene.b) Cabe à Ordem dos Médicos, através do Conselho Nacional Executivo, dar a necessária publicidade ao evento.

Artigo 6º – A «Medalha de Mérito da Ordem dos Médicos» deverá ter o desenho, formato e demais característicasda Medalha da Ordem dos Médicos, banhada a Ouro e com colar de cor amarela.

Page 63: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

20 Revista ORDEM DOS MÉDICOS • Novembro 2008

Para alguns, a eutanásia é a respostacorrecta para o sofrimento insuportá-vel das pessoas que, tendo doençasincuráveis e numa fase final da suavida, entendem não querer continuara viver.A eutanásia inclui sempre o acto deprovocar a morte numa pessoa grave-mente doente e em sofrimento intole-rável, no fim da sua vida, e a pedidodesta. Os seus defensores dizem que éuma resposta a reservar apenas parasituações excepcionais.

Eutanásia: afinalde que falamos?

O tema eutanásia tem vindo a ser sido abordado em diferentes notícias, com

grande relevo, nomeadamente pela opinião que os portugueses têm sobre

esse tema. Dada a sua importância e complexidade, toda a informação, isen-

ta e objectiva, favorece um debate esclarecedor, e como tal nos parece

bemvinda e imprescindível. Já uma informação deturpada, longe dos pro-

gressos da ciência actual e ocultando dados relevantes, numa linguagem

ambivalente, favorecerá os equívocos, seguramente a evitar numa àrea des-

ta envergadura. E os maiores equívocos surgem quando não se define cor-

rectamente a que nos referimos quando falamos de eutanásia.A eutanásia não é a recusa de trata-mentos desproporcionados, ditos fú-teis, e a eutanásia não é a suspensãodesses mesmos tratamentos, quando oobjectivo é evitar a reprovável obsti-nação terapêutica. Com efeito, a recu-sa ou suspensão de tratamentos des-proporcionados é uma boa práticamédica, já recomendada e aprovadarecentemente em código deontológico.A eutanásia também não é a adminis-tração de medicamentos opióides e se-dativos, em doses adequadas, por pro-fissionais devidamente qualificados,e quando a intenção é aliviar o sofri-mento. Por outro lado, é inútil associ-ar a eutanásia a vagos conceitos como«morte assistida», «morte digna», «boamorte serena», pois isso só contribuipara confundir a opinião pública, comexpressões que são tópicos sentimen-tais e susceptíveis de aludir a muitasoutras actuações, de âmbito e nature-za diferente da da eutanásia.A realidade do sofrimento em fim devida preocupa e assusta qualquer um,e isso é natural e compreensível. To-dos queremos garantir para o final dosnossos dias a tranquilidade de um tem-po sem dores, sem mal estar, e encer-

rar serenamente a nossa vida, em pazconnosco, com o mundo e com os quenos são queridos.Os que trabalhamos com doentes emfim de vida e seus familiares sabemosque a larga maioria nos diz «Eu nãotenho medo de morrer, tenho é medode sofrer!». As pessoas querem habi-tualmente viver, viver com dignidade,e só um sofrimento insuportável as farádesejar morrer, e mais, as fará desejarque as matem, o que é bem diferente.Os portugueses precisam saber quetêm hoje uma resposta técnica e hu-manizada da Medicina para essas situ-ações de sofrimento e que se chamaCuidados Paliativos. Estes cuidados desaúde, prestados imprescindivelmentepor equipas de profissionais e volun-tários devidamente especializados, pro-movem a qualidade de vida e a digni-dade, respeitam a vida (não a encur-tam) mas também respeitam a inevita-bilidade da morte (e por isso não pro-longam artificialmente a vida).Isto é: no mundo actual e moderno, aMedicina tem meios para mitigar osofrimento humano, não o deixandotornar-se intolerável, e sem manter aspessoas vivas a qualquer custo. Esta é

O P I N I Ã O

Page 64: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

21Revista ORDEM DOS MÉDICOS • Novembro 2008

uma resposta não para casos excepcio-nais, mas «a» primeira resposta nos cui-dados de saúde para os que têm doen-ças graves e incuráveis, que pode edeve ser prestada muito antes dos úl-timos dias de vida.Se não houver acesso a equipas devi-damente qualificadas e, sobretudo, senão houver informação alargada so-bre Cuidados Paliativos, a escolha so-bre o que queremos para o fim dosnossos dias será feita de forma imper-feita e deturpada, sem estar na possedos mais recentes dados sobre a ma-téria. Não se trata de contrapor a «al-ternativa Cuidados Paliativos» à «al-ternativa eutanásia»: qualquer que sejaa nossa posição sobre a eutanásia, to-dos devemos ter acesso aos CuidadosPaliativos. Demos aos Cuidados Palia-tivos, enquanto Direito Humano, o lu-gar universal que lhes está reservado.Um recente estudo pioneiro, de repre-sentatividade nacional, promovido pela

Associação Portuguesa de CuidadosPaliativos (ver www.apcp.com.pt), de-monstra que 2/3 dos portugueses des-conhece a existência e as práticas dosCuidados Paliativos. Curiosamente,nesse mesmo estudo, nos indivíduosinquiridos – que representavam a rea-lidade nacional –, 50% dos que se as-sumiam a favor da eutanásia diziam quemudariam essa posição se tivessem agarantia de que a Medicina não osdeixaria em sofrimento intolerável. Es-tes factos revelam um nível de desinfor-mação preocupante e justificam, porsi só, mais e melhor informação paraos portugueses sobre estas matérias.Justificam também esforços concertadosna formação rigorosa dos profissionaisde saúde nesta matéria, nomeadamentedos médicos, e a diferentes níveis: pré-graduado, pós-graduado e de especia-lização, à semelhança do que já se pas-sa noutros países e de acordo com asrecomendações do Conselho da Euro-

pa e de outros organismos internacio-nais. É precisamente esta formação queé hoje consensualmente considerada ofactor crítico de sucesso na implementa-ção de serviços de cuidados paliativosde qualidade e não de «sucedâneos»,estes últimos altamente compromete-dores do resultado desejável para aQualidade de Vida dos Doentes, razãomaior do nosso trabalho.Só pode haver debate sério sobre umtema se houver conhecimento alarga-do sobre ele. Importa, pois, colocartoda a informação disponível ao servi-ço do público, com rigor e verdade,evitando abordagens sensacionalistas.Este é um tema que diz respeito a to-dos nós, enquanto Pessoas e enquan-to médicos.A importância do tema nas nossas Vidas,o respeito pelos mais vulneráveis e, so-bretudo, o respeito pela opinião públicae o dever de a informar, justificam-no.Oxalá possamos assistir a essa mudança.

O P I N I Ã O

Page 65: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

22 Revista ORDEM DOS MÉDICOS • Novembro 2008

Entre nós, num destes surtos cíclicosde abordagem da questão, o proble-ma tem sido ultimamente de novo agi-tado, não faltando sequer propostas«fracturantes».Perante esta situação, o Centro de Es-tudos de Bioética, que foi pioneiro naanálise e no aprofundamento desteproblema, como aliás de resto em todoo esforço de difusão da Bioética emPortugal, entende dever pronunciar-senos seguintes termos:

1. A vida humana é inviolável (artigo24 nº1 da Constituição da RepúblicaPortuguesa).É pois dever inalienável do Estado eda Sociedade tudo fazer para minorara solidão e o sofrimento físico dos queprecisam de acompanhamento huma-no de «consultas de dor» e de cuida-dos paliativos nas situações de doen-ça grave ou de incapacidade prolon-gadas.O papel dos profissionais de saúde éo de proporcionar aos doentes toda aatenção necessária para poder dar-lhesuma vida com qualidade.

2. Para tal, urge implementar o direito

Eutanásia, uma questão persistenteEntre as questões éticas respeitantes à vida humana, a eutanásia permanece

sempre actual. A morte provocada a uma pessoa, a seu pedido, tem sido apre-

sentada, por alguns, como expressão de compaixão por quem sofre e como

sinal de respeito pela autonomia do doente terminal. Ao contrario desta ideia

que tentam banalizar pertencemos ao grupo claramente maioritário para

quem é inaceitável matar um doente seja qual for a explicação que se preten-

da dar para essa morte provocada. O mais importante é fornecer-lhe todos os

cuidados, de modo a tratar a dor e outros sintomas, de forma a proporcionar-

lhes uma vida com qualidade, até ao fim natural. O direito comparado aceita

esta posição, verificando-se a proibição da eutanásia na esmagadora maioria

dos países (só a Holanda e a Bélgica abrem excepção).de acesso a bons cuidados paliativos,como de resto existem já em Portugal,infelizmente em número claramentenão suficiente para quem deles neces-sita.

3. A proibição da eutanásia na lei jus-tifica-se pela protecção de um bemfundamental, que é o da vida do doen-te. Defende ainda o paciente de possí-veis abusos de uma hipotética autori-zação para matar a pedido, mesmoquando ela não existe como tem su-cedido na Holanda (eutanásia involun-tária de doentes adultos e mesmo demenores).Essa protecção é exigida pela éticamédica, que seria gravemente compro-metida se o papel dos médicos e dosenfermeiros que com eles colaboram,como garantes da defesa da vida, setransformasse no de prestadores ofici-ais da morte.

4. Nestas condições, o Centro de Es-tudos de Bioética exprime, através dasua Direcção, um parecer positivoquanto à mais rápida e total imple-mentação da rede de cuidados paliati-vos, certo de que a resposta a um (raro)

pedido de eutanásia é a compassiva etotal prestação de cuidados, de modoa que o doente terminal viva em paz asua vida até morrer. Esta é, na verda-de, a morte medicamente assistida aque todos temos direito.

A Direcção do Centro de Estudosde Bioética

Jorge Biscaia, Daniel Serrão, Antóniode Almeida e Costa, Michel Renaud,

Vasco Pinto de Magalhães s.j.

O que se propõe:

1. Envio, pelo CEB, aos principais jor-nais médicos deste texto (com as mo-dificações entendidas necessárias ouadequadas)– Notícias Médicas, Tempo Medicina,Semana Médica.

2. Envio ao Dr. Pedro Nunes, com pe-dido de publicação na Revista da Or-dem

3. Colocação no Público, Diário deNotícias e Jornal de Notícias (atravésde contactos)

O P I N I Ã O

Page 66: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

24 Revista ORDEM DOS MÉDICOS • Novembro 2008

Se se perguntar, ao comum dos mor-tais, se é legítimo praticar actos quetornem a morte digna, todos respon-derão: Sim. Mas, neste caso, estaremosa falar em cuidados paliativos. Esta ex-pressão, recordo, tem sido muito usa-da significando apenas cuidados ter-minais. Na verdade, os cuidados palia-tivos incluem acções de vários tiposque devem iniciar-se a partir do mo-mento em que se estabelece um prog-nóstico fatal, ainda que distante.Se, por exemplo, estivermos peranteuma pessoa que, no meio do seu sofri-mento extremo, pede: «deixem-me mor-rer em paz!», todos aceitarão que omédico suspenda intervenções fúteise actos que apenas prologam esse so-frimento, mantendo toda a atenção naaplicação de medidas que o atenuem.Estaremos, nesta situação, a falar deevitar a distanásia (cujo significado émorte dolorosa, agonia lenta). Este éum posicionamento ético já previstono Código Deontológico dos médicosportugueses e não carece de legitima-ção especial.Se, por outro lado, um médico enten-der que um seu doente está a sofrerde mais e decide pôr-lhe termo à vida,antecipando uma morte esperada, ain-da que certa, este médico estará a as-sumir poderes que não lhe foram con-feridos. Estaremos, neste caso, a meuver, perante um homicídio. Daí que

Eutanásia Sim e Não

entenda que a resposta sobre a lega-lização de um tal acto, independenteda vontade do doente, deva ser, natu-ralmente, um Não, embora não jul-gue que seja isso que se pretendeperguntar em referendo.Se, finalmente, o doente pede: «matem-me, não posso sofrer mais!», muitos acei-tarão que, em certas condições, se ad-mita como lícito o suicídio medicamen-te assistido. A antecipação activa damorte (de pessoa que, conscientementee sem margem para dúvidas, a peça)difere assim da suspensão ou não apli-cação de medidas que prologuem inu-tilmente a vida.Aceito que se fosse feito um referendoespecificamente sobre a legalização dosuicídio medicamente assistido, com anecessária informação associada, mui-tos, como eu, votariam no Sim, apesarde algumas reservas, mas não me sin-to capaz de antecipar a quem caberiaa maioria.Na minha vida profissional, em maisde três décadas de prática clínica, nun-ca ouvi o pedido: «matem-me» mas,muitas vezes, ouvi ou pensei ter ouvi-do a segunda parte: «não posso sofrermais». Acredito pois que, se os médi-cos tiverem os ouvidos, ou a mente,em alerta, saberão encontrar as formasadequadas de atenuar esse sofrimentoe de administrar as expectativas comsensatez, em cooperação activa com a

família, de modo a que aquele grito nãochegue a aparecer.Restarão, no final das contas, situaçõesem que outra não possa ser a saídasenão a satisfação de um desejo pro-fundamente amadurecido, autonoma-mente determinado, não influenciadopor interesses alheios e livre de qual-quer suspeita.É por isso que me declaro pelo Nãoao referendo e pelo Sim à aprovaçãode uma lei que contemple a possibili-dade de a Eutanásia Voluntária (porparte do doente) e Activa (por partedo médico) não ser considerada cri-me e deixe de ser eticamente conde-nada, desde que salvaguardadas tan-tas condições, quantas as necessárias,para a tornar uma verdadeira excep-ção na prática clínica quotidiana.

Manifesto-me firmemente contra a ideia de que se faça um referendo sobre

a legalização da eutanásia.

Esta opinião deriva de não me parecer possível reduzir a questão a ser-se a

favor ou contra a legalização de algo que contém, em si mesmo, diversos

significados. Vou, aliás, evitar o uso dessa palavra até ao final deste texto para

melhor me fazer entender.

O P I N I Ã O

Page 67: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

26 Revista ORDEM DOS MÉDICOS • Novembro 2008

Estudar a Saúde dos Médicos éinédito em Portugal.

Da saúde do médicoA responsabilidade dos médicos nasáreas da saúde pública, da clínica, dareabilitação, da investigação e do en-sino é relevante em todos os sistemasde saúde, tanto na prática preventivacomo na curativa. Independentemen-te de exercerem em ambiente hospi-talar ou não, estão sujeitos a níveis destresse elevado, a cargas horárias pro-longadas, rotativas ou irregulares, tan-tas vezes com falta de repouso. A batabranca que vestem não os defendecontra os factores de risco físicos, quí-micos, biológicos e psicossociais a queestão expostos. A qualquer hora dodia e da noite convivem com situaçõesgraves, de sofrimento e de morte. Nãoestão protegidos nem são resistentes aosagentes capazes de causar dano à saú-de humana, infectando, intoxicando ou

A importância da nossa saúde

Álvaro DurãoEspecialista em Medicina do Trabalho

causando malformações e neoplasias.Não são imunes aos riscos devidos àscondições, técnicas e ambientes de tra-balho em que permanecem.Com eles compartem situações dramá-ticas, de emergência, fadiga e cansaço,e as dificuldades de programação derotinas os enfermeiros e outros profis-sionais que também se obrigam a cui-dar de doentes. São estes também res-ponsáveis e, da mesma forma, não sãoimunes às bactérias, fungos e víruscontra os quais todo o sector saúdetrava uma incessante e séria luta noshospitais, nas clínicas, nos laboratóri-os, nos centros de investigação e emtodas as actividades do sector.A boa saúde dos médicos é essencialpara todos nós, como profissionais dasaúde e como doentes.

Do médico doenteNão admira portanto que os médicosadoeçam e desenvolvam quadros deBurnout. Alguns médicos auto medicam-se, e permanecem a trabalhar quandoem idênticas condições aconselhariamos seus doentes a ficar em casa a re-pousar. Diversos Autores e entre elesKlitzman, R. (2008), Varella, D. (2007),Rosvold, E. and Bjertnesse, E. (2001 e2002) e Korkeila, J. et al. (2003) dizemque os médicos são maus doentes, eque são muitos os que não se prote-gem com planos de vigilância da saú-de, nunca se submetem a checkupsperiódicos, nem sequer têm médicoassistente; referem também que osmédicos doentes têm dificuldade emaceitar fórmulas que eles mesmosusam para acalmar os seus pacientese lhes dar esperança, recomendando«tenham paciência» ou para os conven-cer de que «o pior já passou».

A saúde como bem e direitoTemos caracterizado saúde como umbem essencial e, na sociedade global,defensável como um bem individual,colectivo, social, público e, no mundoactual, como um bem global.A vida em sociedade implica a produ-ção de bens, serviços e riquezas queproporcionem o desenvolvimento soci-al e económico necessário para que to-dos e cada um dos cidadãos tenhamacesso aos bens essenciais e necessáriospara se manterem saudáveis e activos.Se cada indivíduo considera como asua maior riqueza a boa saúde, umasociedade organizada tem que privile-giar o direito à saúde, e o direito àeducação, áreas que justificam os mai-ores investimentos orçamentais.

A Educação como determinanteda saúdeA educação é básica para o desenvolvi-mento. É motor que impulsiona o conhe-cimento, os estilos de vida e de trabalhoe os comportamentos dos cidadãos.No âmbito da saúde dos médicos estádisponível muita bibliografia interna-cional e as escolas médicas estão pre-parando os estudantes para que valo-rizem a manutenção e promoção dasaúde e para que aprendam e ensinema privilegiar estilos de vida saudáveise as determinantes de uma boa saúde.Educar assim os futuros médicos be-neficiará a sua própria saúde, propici-ará o incremento da cultura de saúdedos demais profissionais, resultará naidentificação e defesa das determinan-tes da saúde e na expansão da culturaconducente a assegurar uma vida ac-tiva e saudável dos cidadãos.

O P I N I Ã O

Não apenas a ausênciade doença, mas o bem-estar físico, psíquico esocial caracterizam a

saúde.

A Conferência Internacional sobre a Saúde dos Médicos, 2008 BMA – AMA –CMA International Conference on Doctors’ Health, Doctors’ Health Matters– Finding the Balance, tem, pela primeira vez, lugar fora da América do Norte.A Associação Médica Mundial apoia a Conferência a decorrer de 17 a 19 deNovembro de 2008 em Londres.

Page 68: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

27Revista ORDEM DOS MÉDICOS • Novembro 2008

Os Média como determinantes dasaúdeA disseminação de informação estárelacionada com a cultura e com aeducação. A informação sobre saú-de, quando alimentada adequada-mente por fontes fidedignas de co-nhecimento e investigação baseadasna experiência e na evidência, con-tribui para corrigir comportamen-tos de risco dos cidadãos, para va-lorizar a manutenção e promoçãoda saúde e para desenvolver hábi-tos saudáveis.

Em casa de ferreiro espeto de pauO Estudo da saúde de grupos profissi-onais dos diversos sectores de activi-dade e a identificação dos riscos a queestão expostos são tarefas fundamen-

tais desenvolvidas pela SaúdeOcupacional e Ergonomia. Com o ob-jectivo de prever e prevenir acidentese doenças a SO preconiza medidas deprevenção e de protecção. Além da vi-gilância da saúde e da caracterizaçãoe correcção das técnicas e ambientespotencialmente perigosos, preconiza,planifica e coordena intervenções ori-entadas à melhoria das condições eambientes de trabalho e à manuten-ção e promoção da saúde, essenciaispara assegurar o desenvolvimento hu-mano e manter a capacidade de tra-balho. Para isso se requer a compreen-são e cooperação dos empregadorese a participação dos trabalhadores.Embora o sector saúde disponha deconhecimento e meios menos habitu-ais em outros sectores de actividadepara manter e promover a saúde, osestudos que temos desenvolvido noshospitais permitiram constatar quemuito mais poderia ser feito nas áreasde saúde e segurança no trabalho. Ofenómeno poderá estar na base do ditopopular «em casa de ferreiro espetode pau».

Do Estudo sobre a Saúde do Mé-dico em desenvolvimentoCompartimos preocupações sobre asaúde dos médicos com muitos auto-res que a estudam e consideram queela tem impacto sobre a saúde das po-pulações que atendem. Entre eles cita-mos Miller, M. et al (2000), Cornuz, J.et al (2000) e Juntunen, J et al (1988)que, como muitos outros, desenvolve-

ram Estudos sobre a saúde dos médi-cos em diversos países, como a Aus-trália, Cambodja, Canadá, Espanha,EUA, Finlândia, Noruega e Suiça.A análise da saúde e segurança no tra-balho hospitalar que vimos fazendo háanos fez-nos procurar identificar pos-síveis estratégias para motivar a ges-tão hospitalar e os profissionais dosector a tomarem em conta a suaresponsabilidade acrescida em preven-ção e promoção da saúde. A identifi-cação das dificuldades e a pesquisa depossíveis factores facilitadores levaram-nos a solicitar a colaboração do De-partamento de Ergonomia da Faculda-de de Motoricidade Humana da UTL,

O P I N I Ã O

A saúde como um bem e um direito social e globalA defesa deste ponto de vista tem por base a seguinte lógica: a saúde de um cidadão representa, paraele, um bem individual, bem que não colide com os interesses de terceiros e, antes pelo contrário,beneficia os seus familiares e conviventes. Assim, este bem individual é também colectivo, porque umcidadão saudável não expõe os seus concidadãos a contágio como sucederia se estivesse doente, nemfaz sofrer os que com ele convivem. Este bem colectivo repercute-se sobre toda a comunidade erepresenta assim um bem público e social e, na sociedade global, corresponde a um bem global.Dada a relação entre a saúde e a comunidade de trabalho, a sua manutenção e promoção beneficia ostrabalhadores e os empregadores, e proporciona à sociedade desenvolvimento humano e social. Asaúde de todos, especificamente a saúde dos trabalhadores e designadamente a dos trabalhadores dosector saúde, pode ser acreditada como motor de desenvolvimento, ética, competência profissional ede progresso económico. A saúde dos médicos, além do interesse que tem para eles próprios e para osseus pacientes, repercute, de forma muito marcada, para a saúde pública e global.

A educação motiva oscidadãos a prestarematenção à saúde e aacorrerem adequa-

damente aos serviços desaúde, os quais, paraalém da vigilância e

manutenção da saúde,lhes oferecem o

diagnostico, a cura e arecuperação das

situações de acidente ede doença.

A informação podecontribuir para evitar

más práticas individuaisem saúde e a

proliferação de char-latães e indivíduos não

preparados que seapresentam a defenderpráticas curativas e a

executar actos quecorrespondem estar e

permanecer a cargo deprofissionais de saúde

com formaçãoadequada.

Page 69: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

28 Revista ORDEM DOS MÉDICOS • Novembro 2008

onde são entendidas as nossas preo-cupações e o interesse em identificara possível relevância e impacto da saú-de dos médicos para que a populaçãose mantenha activa e saudável.Estas preocupações justificaram o nos-so interesse em utilizar a experiênciadisponível e pretender conhecer a re-alidade portuguesa, para o que identi-ficamos a orientação necessária e ela-boramos um projecto de investigaçãoestruturado. Nas mais recentes etapasda preparação do Estudo temos con-sultado Erica Frank, distinguida pelasua dedicação à área da saúde e hábi-tos preventivos dos médicos e investi-gadora principal do Canadian Physi-cians’ Health Study, que nos asseguraapoio e autoriza a usar o Questioná-rio já testado, validado e aplicado noCanadá. Adaptamos para Portugal esteQuestionário, que entretanto foi utili-zado em outras pesquisas. De dezenasde trabalhos que esta investigadoratem publicado nesta área desde 1995

citamos a seguinte afir-

mação «The Women Physicians’ HealthStudy demonstrate that: 1. Physicians’health practices strong and consis-tently influence their patients care, and2. Women physicians represent a highstandard of adoption of health beha-viours» Frank. E. (2004).As perguntas deste inquérito são denatureza pessoal, mas será garantido oanonimato das respostas. Toda a infor-mação será tratada com estrita confi-dencialidade, e a análise e divulgaçãodos resultados será feita unicamente deforma agregada. O questionário chega-rá aos inquiridos que, dispensando 15minutos do seu tempo, poderão comas suas respostas caracterizar a sua sa-tisfação profissional; o seu estado de saú-de; os seus comportamentos de saúde;a sua actividade física e nutrição; os cui-dados, conselhos e sugestões que fa-zem aos seus pacientes sobre preven-ção; as suas opiniões sobre cuidadosde saúde; formação e locais de traba-lho, isto além dos dados demográficos.Obtivemos parecer muito favorávelsobre esta investigação de diversas ins-

tituições académicas e científicas, oque terá contribuído para o apoio

com que contamos da Ordem dosMédicos e da Direcção Geralda Saúde.

Referências1. Klitzman, Robert. WhenDoctors become patients. Ed.Oxford University Press, 2008(332 pp).

O P I N I Ã O

O aumento significativo da longevidade, que na segunda metade do Século XXduplicou, justifica um enorme incremento da atenção de saúde para que as

doenças congénitas e as adquiridas não contribuam para uma má qualidade devida dos idosos que agora precisam manter-se activos e saudáveis por períodosmais latos. Este facto justifica todo o esforço necessário para manter a saúde,

para controlar as doenças congénitas e evitar as patologias crónicas adquiridas.Os médicos têm assim ferramentas e uma responsabilidade acrescida em

prevenção. Têm agora recursos e meios para «evitar os defeitos de fabrico, osresultantes da má manutenção e da utilização inadequada da sua saúde».

2. Varella, Drazio. O Médico doente.Companhia das Letras. Ed. Schwarcz,São Paulo, 2007 (132 pp).3. Rosvold, E. and Bjertnesse, E.Physicians who do not take sick leave:hazardous heroes? In Scand J PublicHealth, 2001; 29(1): 71-75.4. Rosvold, E. and Bjertnesse, E. Illnessbehaviour among Norwegian physi-cians. In Scand J Public Health, 2002;30(2): 125-132.5. Korkeila, J., Töyry, S., Kumpulainen,K., Toivola, JM., Räsänen and Kalimo,R. Burnout and self-perceived healthamong Finnish psychiatrists and childpsychiatrists: a national survey. In Scan-dinavian J of Public Health, Vol. 31, Nº2, 85-91 (2003).6. Miller, M., Mcgowen, K., Quillen, J.The Painful Truth: Physicians are notinvincible. In South Med Journal93(10):966-972, 2000.7. Cornuz, J., Ghali, W., Carlantonio, D.,Pecoud, A. and Paccaud, F. Physicians’attitudes towards prevention: impor-tance of intervention-specific barriersand physicians’ health habits. In FamilyPractice. Oxford University Press 2000;17 nº 6: 535-540.8. Juntunen, J., Asp, S., Olkinuora, M.,Äärima, M., Strid, L., Kautttu, K. Doc-tors’ drinking habits and consumptionof alcohol. In British Medical Journal1988, Vol 297:951-954.9. Frank, E. Physician Health andPatient Care. In J Med Assoc, Feb 4,2004; 291(5):637. Retrieved on 30January 2008.

Page 70: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

A Ordem dos Médicos convida e apela à participaçãona segunda Assembleia Geral de Médicos que decorrerá

no dia 21 de Fevereiro de 2009, pelas 14.30h, no finaldo Congresso Nacional de Medicina.

Esta Assembleia Geral assume particular importâncianum momento em que a OM vai lançar a discussão final

sobre as Carreiras Médicas, um sistema adequadoaos diferentes regimes de trabalho actuais.

O objectivo desta Assembleia Geral de Médicosé precisamente permitir essa discussão, envolvendo

o maior número de Colegas possível.

Não falte!

Assembleia Geral de Médicos

Dia 21 de Fevereiro de 2009Centro de Congressos de Lisboa

A Ordem dos Médicos convida e apela à participaçãona segunda Assembleia Geral de Médicos que decorrerá

no dia 21 de Fevereiro de 2009, pelas 14.30h, no finaldo Congresso Nacional de Medicina.

Esta Assembleia Geral assume particular importâncianum momento em que a OM vai lançar a discussão final

sobre as Carreiras Médicas, um sistema adequadoaos diferentes regimes de trabalho actuais.

O objectivo desta Assembleia Geral de Médicosé precisamente permitir essa discussão, envolvendo

o maior número de Colegas possível.

Não falte!

Page 71: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

30 Revista ORDEM DOS MÉDICOS • Novembro 2008

1. ABATIMENTOS1.1 – Dedução específica do trabalho dependente (Art.º25.º do CIRS):

72% de 12 vezes o salário mínimo mais elevado ou ovalor das contribuições totais pagas efectivamente àSegurança Social quando superiores.

1.2 – Dedução Específica de Pensões (Art.º 53.º do CIRS):Tem o limite de € 6.000,00Porém, se o rendimento bruto da categoria H exceder€ 30.000,00, este limite de € 6.000,00 será reduzidoaté à sua concorrência de 13% da Parte que esceder os€ 30.000,00.

1.3 – Organizações Sindicais (Art.s 25.º e 53.º):Valor pago acrescido de 50% até ao limite de 1% dorendimento bruto de trabalho dependente ou de pen-sões.

1.4 – Pensão de Alimentos (Art.º 56.º):Totalidade dos encargos quando fixados na respectivasentença judicial.

1.5 – Rendimentos profissionais (Recibos verdes) – Regimesimplificado (Art.º 31.º):

O rendimento bruto é abatido de 30% para despesas eencargos, não sendo necessários quaisquer documen-tos.Não poderá resultar um rendimento líquido global infe-rior a metade do valor anual do retribuição mínima (€2.982,00).

1.6 – Rendimentos prediais (Prédios arrendados) (Art.º 41.º):As despesas de conservação e manutenção suportadas sãoabatidas, quando devidamente documentadas bem comoo respectivo IMI (Imposto Municipal sobre Imóveis).

2. DEDUÇÕES À COLECTA2.1 – Despesas de Saúde (Art.º 82.º)

30% das despesas efectuadas com bens e serviços comIVA às taxas de 0% e 5%, sem limite.As despesas com bens e serviços com IVA à taxa de21%, são limitadas a 2,5% daquelas despesas ou a €

62,00, desde que documentadas com receitas médicas(al. d) do Art.º 82.º):

2.2 – Despesas de educação e de formação profissional(Art.º 83.º):

30% das despesas suportadas com o limite de 160% daretribuição mínima nacional mensal (€ 644,80). Nosagregados com 3 ou mais dependentes, o limite é eleva-do em 30% por cada dependente (€ 765,70).2.2.1 – São dedutíveis à colecta 30% da totalidade dasdespesas efectuadas com a educação e reabilitação dosujeito passivo ou dependente com deficiência maiorou igual a 60%, bem como 25% da totalidade dos prémiosde seguro de vida (art.º 87.º n.º 2)Porém, a dedução dos prémios de seguros não podeexceder 15% da colecta de IRS.

CONSULTORIA FISCAL

IRSABATIMENTOS E DEDUÇÕES AOS RENDIMENTOS DE 2008

2.3 – Juros e amortizações de imóveis para habitação pró-pria e permanente, rendas pagas pelos inquilinos (contra-tos posteriores a 15/10/91) e entregas para cooperativasde habitação (Art.º 85.º):

30% dos encargos com o limite de € 586,00.2.4 – Encargos com lares e outras instituições de apoio àterceira idade relativos a sujeitos passivos, bem como dosencargos com lares e residências autónomas para pessoascom deficiência, seus dependentes, ascendentes e colateraisaté ao 3.º grau que não possuam rendimentos superiores àretribução mínima (Art.º 84.º):

25% das despesas com o limite de 85% da retribuiçãomínima mensal (€ 362,10).

2.5 – Prémios de seguros de vida, acidentes pessoais e fun-dos de pensões, 25%das despesas com o limite de (Art.º86.º):

Casados – € 124,00; não casados – € 62,00.2.6 – Prémios de seguros de saúde (Art.º 86.º, n.º 3):

30% dos encargos com os limites de:Casados – € 164,00; não casados – € 82,00Por cada dependente a seu cargo os limites são eleva-dos em € 41,00.

2.7 – Custos com equipamentos novos para utilizaçãode energias renováveis e equipamentos para produçãode energia eléctrica ou térmica por micro turbinas, compotência até 100 W que consumam gás natural (Art.º85.º, n.º 2):

30 % das despesas com o limite de € 777,00 € (desdeque não sejam susceptíveis de ser considerados custosda categoria B).

2.8 – DEFICIENTES:São dedutíveis à colecta por cada sujeito passivo comdeficiência igual ou maior que 60% uma importânciacorrespondente a 3,5 a retribuição mínima mensal (€1.491,00), bem como 1 retribuição mínima mensal porcada ascendente que viva em comunhão de habitaçãocom o declarante e não aufira mais que uma retribuiçãomínima mensal nacional (Art.º 87.º).Se a invalidez for superior a 90% então a dedução porcada sujeito passivo é de 5,5 retribuições mínimas naci-onais (€ 1.612,00).

2.9 – Os pagamentos por conta e as retenções (At.º 78.º,n.º 2): Sem qualquer limite.3. MANIFSTAÇÕES DE FORTUNA(Art.º 89.º-A da LGT)Devem ser declaradas tratando-se das seguintes aquisições:

– Imóveis de valor igual ou superior a 250.000,00 €– Automóveis ligeiros de passageiros de valor igual ousuperior a 50.000,00 €– Motociclos de valor igual ou superior a 10.000,00 €– Barcos de recreio de valor igual ou superior a25.000,00 €

Page 72: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

31Revista ORDEM DOS MÉDICOS • Novembro 2008

CONSULTORIA FISCAL

– Aeronaves de turismo– Suprimentos e empréstimos feitos no ano, de valorigual ou superior a 50.000,00 €.

BENEFÍCIOS FISCAIS

4. COMPUTADORES PESSOAIS NOVOS, bem comosoftware e aparelhos de terminal (art.º 64.º do EBF):

50% das despesas de aquisição, com o limite de € 250,00.Este benefício só pode ser utilizado uma vez durante osanos de 2006 a 2008.– È necessário ainda que o sujeito passivo ou qualquerdependente frequente qualquer nível de ensino.– Que a factura tenha o número fiscal do adquirente econtenha a menção «uso pessoal».– Que a taxa de IRS seja inferior a 42%.

5. PPR (Art.º 21.º do EBF)São dedutíveis à colecta 20% dos valores aplicados em PPRaté ao limite de :

€ 400,00 – se o sujeito passivo tiver menos de 35 anos.€ 350,00 – se o sujeito passivo tiver entre 35 e 50anos.€ 300,00 – se o sujeito passivo tiver idade superior a50 anos.Os reformados não têm direito a esta dedução.

6. MECENATO (Art.ºs 56.º-D e E do EBF)6.1 – São dedutíveis, sem limite, 25% das doações ao Esta-do, Regiões Autónoas, Autarquias e seus serviços.

Associações de Municípios e de Freguesias.Fundações em que o Estado participe no patrimónioinicial.Fundações com fins de natureza social ou cultural.

6.2 – São dedutíveis 25% das restantes doações com o limi-te de 15% da colecta:

IPSS; PCUP; Centros de cultura; etc..6.3 – São dedutíveis à colecta 25% dos donativos concedi-dos a igrejas, instituições religiosas, pessoas colectivas de finsnão lucrativos pertencentes a confissões religiosas ou por

OTNEMIDNERLEVÁTCELOC

)sorue(

SAXAT)%(

lamroN

SAXAT)%(aidéM

9364étA 5,01 0005,01

7107a9364 31 2743,11

10471a7107 5,32 4995,81

02004a10471 43 7303,72

00085a02004 5,63 5451,03

64526a00085 04 1078,03

64526> )a(24

(a) rectificado pela Declaração de Rectificação n.º 2/2008, de 28de Janeiro

TABELA DE IRS DE 2008 no Continente (Art.º 68.º)

elas instituidas, sendo a sua importância considerada em 130%do seu quantitativo, com o limite de 15% da colecta.

PAGAMENTOS POR CONTAEstes pagamentos, quando devidos, devem ser pagos até aodia 20 dos meses de Julho, Setembro e Dezembro.NÚMERO FISCAL DE CONTRIBUINTEQualquer alteração, nomeadamente da residência, deve sercomunicada no prazo de 15 dias em qualquer serviço definanças ou na loja do cidadão, podendo também fazer-seatravés da internet.A Retribuição Mínima Nacional para 2008 é de € 426,00.

Quaisquer dúvidas ou esclarecimentos sobre matéria fiscalpoderão ser tratados todas as 3.ªs e 5.ªs Feiras, das 10 às13 horas nas instalações da Ordem dos Médicos, sitas naAvenida Gago Coutinho, 151 em Lisboa.

Page 73: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

32 Revista ORDEM DOS MÉDICOS • Novembro 2008

Nessa tarde, passeava pelas ruas de-sertas da cidade e cobertas de silên-cio, à procura do nada. De súbito, odim-dom duma porta comercial abri-ra-se, despertando a curiosidade deolhar através da vitrina embaciada.Lá dentro, um grande recheio de pe-ças antigas, bem arrumadas, enchia oespaço do antiquário.Abri a porta e o sonante dim-dom avisoualguém que se aproximava lentamente.- Posso entrar e olhar a sua loja?- Esteja à vontade, por favor!Inicialmente o meu olhar fixou-se numabalança elegante, alta, vistosa, de poli-dos brilhantes com pratos pendentes,quietos e adormecidos.- Gosta dessa balança? Está em bompreço e, tem graça, conta a históriaoculta da vida de alguém!Assim falou o comerciante, talvez en-contrando uma boa oportunidade parafazer negócio.Seguiu-se uma curta pausa de silêncio.Olhei de frente o senhor e curiosa-mente pedi que contasse a referidahistória…- Sim! Então ouça – adiantou gentil-mente a pessoa em atitude de refle-xão. Esta balança tinha dois pratos. Umdia, inesperadamente, desapareceu umprato. A dona, com grande desgosto,mergulhou numa profunda crise de-pressiva. Ainda tentou substituir aquelaperda irrecuperável. De momento, su-focado com o reviver da história, algode misterioso aparecia no seu olhar.- Deve ser amargo o desaparecimentodo prato, mas não estou a entender!...continue por favor.- Sei que a senhora se isolou, trilhan-do caminhos diferentes e mais nada

Cruzeiro da História da MedicinaCruzeiro da História da MedicinaCruzeiro da História da MedicinaCruzeiro da História da MedicinaCruzeiro da História da MedicinaA História da BalançaA História da BalançaA História da BalançaA História da BalançaA História da Balança

O dia era triste e respirava-se uma atmosfera densa, carregada de humidade.

Por sua vez, o céu acinzentado e apagado por nuvens movediças anunciava

chuva miudinha, que já caía.

soube do seu destino. Ape-nas sei que o fiel, sempreinclinado, chorava a tristesorte da sua amiga.- Desculpe interromper,mas esta história não fazparte da sua vida? Pergun-tei a seguir.- Ouça, a dona desta balan-ça era uma senhora quesempre imaginou a vidanum prato duma balançaque estimou e guardou en-quanto viveu.A surpresa surgiu logo após.Por momentos retirou-se evoltou, trazendo entre mãos,uma balança «MATHIEU» defabrico francês, do séc. XIX,de pesar bebés, com um pra-to em berço de lona (Figura1). Fiquei maravilhado ao re-conhecer tal peça e com-preendi o segredo da perdado prato.Esta balança mora há anosna casa Museu Dr. Hermes,ao lado da sua homólogainglesa (Figura 2).

Fim do conto

As balanças dinamómetrosdo chão, patente Alexandra,foram peças de uso correntenos consultórios médicosdesde o séc. XIX (Figura 3),existentes na Casa MuseuDr. Hermes.

Hermes de OliveiraCastanhas

H I S T Ó R I A S d a H I S T Ó R I A

Figura 1

Figura 2

Figura 3

Page 74: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do
Page 75: 01ideia, sei o que é que não quero e acho que só quando saírem as especialidades e o número de vagas é que vou saber qual escolher”, afirma Pedro Gomes, 25 anos, interno do

INCENTIVOS PARA OS MÉDICOS

Em termos gerais, os médicos são pouco incentivados a recei-tar medicamentos genéricos. Desde 2002, os médicos devem prescrever medicamentos pela sua denominação comum inter-nacional, para os quais existam equivalentes genéricos, embora tenham a liberdade de adicionar uma denominação comercial ou o nome de um titular da autorização de introdução no mercado. Os médicos podem consultar o “Guia dos Medicamentos Genéri-cos”, o sítio do INFARMED. O INFARMED desenvolveu igualmente bases de dados que permitem aos médicos comparar preços dos medicamentos.

INCENTIVOS PARA OS FARMACÊUTICOS

Desde 2002, é permitida aos farmacêuticos comunitários a subs-tituição de medicamentos de marca por genéricos. Se o médico efectuar a prescrição pela denominação comum internacional, o farmacêutico deve dispensar o medicamento genérico mais barato disponível. Se o médico emitir uma prescrição pela de-nominação comum internacional, seguida de uma denominação comercial, o farmacêutico pode substituir o medicamento por um genérico, caso o médico permita essa substituição. No entanto, a margem comercial da Farmácia é uma taxa única de 18,25%, des-de Fevereiro de 2007. Isto significa que, em termos absolutos, os medicamentos mais dispendiosos libertam uma margem maior.

INCENTIVOS PARA OS UTENTES

O Governo levou a efeito nos média campanhas vocacionadas para os utentes, para além dos médicos e farmacêuticos, visando incen-tivar o consumo de medicamentos genéricos. Estas campanhas parecem ter contribuído para aumentar a procura de genéricos.

A EXPERIÊNCIA EUROPEIA

Uma análise comparativa das políticas dos medicamentos ge-néricos realizada em 11 países da União Europeia indica que a indústria de medicamentos genéricos apenas terá capacidade para implementar e manter uma politica de preços competitivos

se lhe for garantido um volume elevado do mercado farmacêutico português. Este volume elevado depende de políticas do lado da procura que incitem os médicos a receitar, os farmacêuticos a dispensar e os utentes a utilizar medicamentos genéricos.

A procura de medicamentos genéricos tem sido impulsionada por medidas de política que incentivam os médicos a prescrever por denominação comum internacional e os farmacêuticos a dispen-sarem o genérico mais barato quando os médicos receitam por denominação comum internacional. Esta procura pode ser ainda intensificada, sensibilizando os estudantes de medicina para re-ceitarem por denominação comum internacional durante o res-pectivo curso, como acontece no Reino Unido. Em alternativa, pode recomendar-se aos médicos que receitem medicamentos de baixo custo, salvo se for necessário um medicamento de marca mais dispendioso por razões terapêuticas.

Os farmacêuticos devem receber uma remuneração que não os penalize financeiramente por dispensarem medicamentos genéri-cos. Portugal deve reflectir sobre a introdução de um sistema de remuneração aos farmacêuticos que, em termos financeiros seja neutra ou favoreça o fornecimento de medicamentos genéricos. Na Alemanha, por exemplo, os farmacêuticos podem reter 30% da diferença de preço entre o medicamento genérico e o de marca. Em França, os farmacêuticos têm direito a descontos superiores sobre os medicamentos genéricos do que sobre os de marca.

Portugal deve incentivar os utentes a procurarem medicamentos genéricos. O Governo deve ponderar reintroduzir os incentivos financeiros que aumentaram em 10% a taxa de comparticipação dos medicamentos genéricos. Poderá ser igualmente útil educar o público relativamente à economia potencial que advém da utili-zação de medicamentos genéricos.

CONCLUSÕES

O desenvolvimento do mercado português de medicamentos ge-néricos tem sido basicamente impulsionado por políticas do lado da oferta. A fim de apoiarem a expansão adicional do mercado, os decisores políticos devem fortalecer medidas do lado da procura, incitando os médicos a prescrever, os farmacêuticos a dispensar e os utentes a utilizar medicamentos genéricos.

BIBLIOGRAFIADirectiva 2004/27/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de Março de 2004, alterando a directiva 2001/83/CE que estabelece um Código Comunitário relativo aos medicamentos para uso humano. Jornal Oficial das Comunidades Europeias L 136/34-57 INFARMED (Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos da Saúde). Dados comerciais. Lisboa: INFARMED, 2008, (disponibilizados a 16 de Setembro de 2008, em http://www.infarmed.pt/portal/page/portal/INFARMED) Barros PP, de Almeida Simoes J. Portugal: health system review. Health Systems in Transition. 2007;9:1-140 Portela C, Pinto M. Reference pricing as a competition trigger on the Portuguese pharmaceutical market. Oral presentation at the 9th Conference of the Portuguese Association of Health Economics. Coimbra, November 22, 2005 Pinto CG, Teixeira I. Pricing and reimbursement of pharmaceuticals in Portugal. Eur J Health Econom. 2002;3:267-70 INFARMED. Boletim Infarmed Notícias n.º 19. Lisboa: INFARMED, 2006. (disponibilizado a 19 de Setembro de 2008, em http://www.infarmed.pt/infarmed_noticias/infarmed_noticias_01_02_2006.pdf imoens S, De Coster S. Sustaining generic medicines markets in Europe. J Generic Med. 2006;3:257-268.