NOT AS SOBRE A CHAMINE VULcANICA DO GUINCHO E 0 FIL.~O ... · A composicao determinada e a de um...

Post on 02-Apr-2020

14 views 0 download

Transcript of NOT AS SOBRE A CHAMINE VULcANICA DO GUINCHO E 0 FIL.~O ... · A composicao determinada e a de um...

NOT AS SOBRE A CHAMINE VULcANICA DO GUINCHO E 0 FIL.~O BASAL TICO

DA CRISMINA

POR

FERNANDO REAL ASSISTENTE DA FACULDADE DE CIENCIAS DA UNIVERSIDADE DE LISBOA

Um/dos modos de jazida das rochas basalticas e 0 de cha­mines vulcanicas ou necks que, por vezes, originam relevos carac­teristicos.

Estas forma~oes sao bastante comuns dentro das regioes basaiticas das orlas meso-cenozoicas portuguesas, e 0 seu estudo tem sido feito com certo pormenor. Entre as mais conhecidas podem referir-se: a chamine de Monte Serves (entre Vila Franca e Sacavem), a de Santa Quiteria de Meca (Alenquer), a da Senhora do Socorro (Dois Portos), etc.

Nos arredores de Lisboa, existem a de Morganhal-Laveiras, a de Pa~o de Arcos e a de Monsanto.

Nao pode ~eixar de citar-se, tambem, a regiao da Malveira, constitufda por uma serie de chamines vulcanicas, que determina­ram um relevo local caracteristico, representado pelas eleva~oes de Cabe~o do Funchal, de Moinhos, Monte Leite e Forte Matou­tinho.

Acidentes do mesmo tipo ocorrem na orla meridional do Pais. Todos os necks ate agora indicados atravessam forma~oes

sedimentares que, por vezes, metamorfizam, sendo testemunhos,· segundo os conhecimentos actuais, de erup~oes post-turonianas e ante-burdigalianas.

o enchimento destas chamines e, normalmente, de basalto compacto, apresentando, em Quase todas. disiuncao em nrismas

SGP
Referência bibliográfica
Boletim da Sociedade Geológica de Portugal, Vol. IX, Fasc. III, 1951.

162

hexagonais ou pentagonais, com aspectos colunares. Do ponto de vista quimico, 0 maior mimero de rochas basalticas estudadas, procedentes dasreferidas chamines, sao basanit6ides, com fraca percentagem de potassio e percentagem media de aluminio e magnesio.

A chamine vulcanica da Praia Grande do Guincho

Semelhante em muitos aspectos aos aparelhos vulcanicos anteriormente citados, po de referir-se a chamine da Praia Grande do Guincho, nao registada na carta geologica 1/50.000, editada, em 1935, pelos Servicos Geologicos de Portugal. Em seu lugar aparece uma pequena mancha de Cenomaniano.

A chamine referida esta situada a meio da praia, precisa­mente na foz da Ribeira do Guincho, parecendo localizar-se no prolongamento da falha que atravessa os calcarios cretacicos desde a Ponta da Alpendurada, onde se da 0 contacto dos terrenos do Urgoniano com as formacoes do Valanginiano, ate a Praia Grande do Guincho. 0 afloramento da rocha eruptiva e limitado pelas areias da praia, que 0 cobrem parcialmente.

A norte da praia, a cerca de 200 metros da chamine, suce­dem-se as formacoes cretacico-jurassicas, ate 0 contacto com 0

batolito granito-sienitico de Sintra. Os estratos apresentam inclina~ cao de cerca de 70° para sudoeste, resultante do levantamento provocado pela instalacao do macico eruptivo. Algumas das forma­coes cretacicas que se encontram a nordeste da chamine reapare­cem a sudoeste, com inclinacao inversa, embora mais suave, forman do sinclinal.

Os afloramentos basalticos £icam, na sua quase totalidade, cobertos pelas aguas da preiamar, variando com a epoca do ano a extensao posta a descoberto.

A maior extensao da chamine e na direccao noroeste-sudoeste, com cerca de 200 metros de comprimento. A largura nao ultra­passa 60 metros. As areias cobrem-na em grande parte, sendo, no entanto, visiveis afloramentos de rocha com 3 metros de altura, .na extremidade noroeste, precisamente no ponto que esta durante

163

mais tempo coberto pelas aguas do mar. Este afloramento parece corresponder a zona central do neck, pois que a rocha e, ai, mais compacta e apresenta disjuncao prismatica.

Quase toda a rocha, principalmente a que esta durante mais tempo sujeita a accao erosiva das areias transportadas pelo vento, muito intenso nesta regHio, esta polida, com 0 brilho caracteristico. Em alguns pontos, porem, aparece incrust ada de imlmeros organis­mos, que provocam a sua mais nipida alteracao.

Estudando os !imites da chamine, reconhecemos a presenca, do lado sudeste, fazendo transicao para 0 bas alto negro e compacto, de uma mancha de rochas acastanhadas, a que se sucedem aflora­mentos de brecha basaltica; esta contem inumeros fragmentos de ca1ca,rio metamorfizado que atingem, por vezes, dimensoes cons i­deraveis.

A brecha engloba, tambem, um calcario mais negro, bastante fragmentado, e pequenos graos de quartzo. Contem, alem disso, em certos pontos, diferenciacoes arredondadas de lava consolidada, salpicada de manchas de um mineral esbranquicado.

Os graos de quartzo e os fragmentos de calcario escuro pare­cem ser provenientes do Cenomaniano, que a'flora a suI da praia, constituido por calcario amarelado, com muitos graos de quartzo, bem rolados, e restos de ostras.

Facto que merece atencao e a existencia de uma rocha eruptiva, bastante alterada, e de palhetas de biotite, inc1usas na brecha descrita. A rochaeruptiva, em virtude da sua alteracao, e de dificil diagnose. A biotite, pelo contrario, esta fresca e encon­tra-se com relativa facilidade; alguns exemplares medem quase 1 cm. de diametro.

Estudo petrografico

Arocha da zona central do neck e negra, de textura afirica, irresohivel a vista desarmada. 0 exame microsc6pico permitiu verificar que e constituida por uma pasta fina, encerrando como elemento dominante a piroxena. Os micr6litos de feldspato sao pouco abundantes, encontrando-se mesmo zonas onde sao raros. A sua determinacao mostrou tratar-se de uma labradorite com cerca de 68 mol % de anortite. A pasta tem coloracao negra intensa, produzida pela magnetite que apresenta graos, de dimensoes

164

consideraveis, associados a outros bastante menores e finamente disseminados. 0 elemento mais importante da pasta e, como dissemos, a piroxena, que se apresenta em agregado fino de graos e constitui a quase totalidade da mesma. Na pasta existe, ainda, vidto castanho, parcial mente desvitrificado.

Os fenocristais sao, quase exclusivamente, de olivina, encontrando-se raramente a piroxena. A olivina apresenta formas euedricas perfeitissimas, sendo algumas secryoes paralelas a (100) (fig. 3). Esta muito fresca, permitindo com facilidade 0 estudo optico. A sua forte birrefring~ncia, ng-n p = 0,041, e 0 facto do ramo da isogira ser praticamente recto, nas secryoes normais ou quase normais a um eixo optico, permite-nos admitir para angulo dos eixos opticos um valor proximo de 90° j deve tratar-se dum crisolito.

A piroxena, em virtude de so raramente se apresentar em cristais de dimensoes que permitam estudo, e de dificil determjna­ryao. Tem cor castanha-violacea e e bastante policroica, 0 que nos leva a concluir que e augite titanifera. Para angulo de extinryao c"ng obtivemos 0 valor de 42° e para a birrefring~ncia 0

valor de ng-np =0,026. Em resumo, verifica-se que a rocha e muito pobre em felds­

pato, rica em piroxena e olivina, sendo constituinte da pasta um vidro parcial mente desvitrificado.

Estes caracteres e, em particular, a sua acentuada pobreza em feldspato, leva-nos a classifica-Ia como um basalto limburgitico.

o filio basaltico da Praia da Crismina

Tentanto encontrar elementos de possivel relaryao com a chamine anteriormente descrita, percorremos as regioes vizinhas da Praia Grande do Guincho. Assim, localizamos um filao de basalto na Praia da Crismina, situada entre a Ponta da Gale e a Ponta Alta, cerca de 900 metros a S. S. W. da chamine do G-uincho.

o filao dispoe-se quase na direcryao norte-suI, entre a Praia do Rio Velho e a Praia da Crismina. Tem metro e meio de espes­sura e atravessa os estratos do Cenomaniano inferior e parte

165

do Albiano. A zona atravessada deste ultimo, constituida por camadas de calcario com bancadas de ostras, sobrepoe-se a areias e gres esbranquicados, com intercalacoes de margas avermelhadas.

o filao esta quase sempre coberto pelas aguas do mar, ficando em grande parte descoberto durante a mare baixa. Aflora a super­ficie, em forma de dique, em virtude do basalto ser mais resis­tente que as camadas envolventes. Nota-se, tambem, pequena zona de metamorfismo nos calcarios, com cerca de um decimetro.

N a carta topografica 1: 1 0.000 reconhece-se, perfeitamente, 0

alinhamento do filao. Arocha e diferente da do Guincho, como se podera verificar

pela sua descricao.

Estudo petrogrcifico

Arocha e de cor cinzenta clara, com porfirismo des envol­vido. A vista desarmada, observam-se fenocristais de piroxena (oem ,6 X Oem,4), com habito prismatico curto, regularmente distri­buidos pela pasta. .

o exame microsc6pico revel a textura microlitica, com pasta essencialmente feldspatica, constituida por numerosos microlitos de plagioclase, de dimensoes consideraveis, 0 que confere a rocha uma facies doleritica. A plagioclase destaca-se, tambem, em feno­cristais geminados segundo as leis de Karlsbad-Albite e Albite. A composicao determinada e a de um labrador com 68 mol 010 de anortite.

A estrutura zonada, muito perfeita, e vulgar nos fenocristais de feldspato, evidenciando '!ariacao na composicao quimica dos cristais (fig. 7). A magnetite, elemento finamente disseminado na pasta, apresenta-se, tambem, em graos de maiores dimensoes.

A piroxena e 0 mineral que apresenta melhores form as cris­talinas. Destacam-se, ainda, na pasta, fenocristais de olivina alte­rada e aglomerados de cristais de calcite.

A olivina reconhece-se, apenas, pelas formas euedricas carac­teristicas, pois 0 mineral esta quase total mente alterado. A subs­tituicao deu-se por serpentinizacao, sofrendo posteriormente uma calcificacao que, alias, parece ter actuado fortemente em toda a rocha. A serpentina tem birrefringencia fraca (ng-np = 0,009), 0

que leva a admitir tratar-se de antigorite.

166

A calcite reconhece-se facilmente pela forte birrefring~ncia (branco de ordem superior); dispoe-se em laminas e inclusoes fibrosas, principalmente nas zonas de fractura dos cristais de olivina (fig. 8).

A piroxena, bastante abundante, apresenta-se· em grandes cristais zonados e maclados (fig. 5). Encontra-se, tambem, em pequenos graos, espalhada na pasta. A gemina~ao e, por vezes, constituida por maclas multiplas e lamelares. A combina~ao das maclas (100) com (001), da origem a estrutura «herringbone». Observa-se com facilidade· a exist~ncia de nucleos acastanhados, de cor pouco acentuada, e de uma orla violacea, titanifera, com inclusoes (fig. 6).

N a determina~ao dos caracteres opticos obtivemos os val ores c"ng=43°, ng-np =0,022 e (+) 2V;o;;46°, valor medio, que nos leva a conc1uir ser esta piroxena uma augite.

Arocha estudada e, pois, pela sua composi~ao e textura, urn basalto doleritico lipico.

* .* *

As rochas basalticas atras descritas sao, quanta a situa~ao geografica, as mais ocidentais do nosso Pais, encontrando-se bas­tante proximas do maci~o batolitico de Sintra. 0 problema da idade da chamine e do filao nao e possivel resolv~-lo com rigor. Para 0 primeiro podemos admitir, em virtude de englobar ca1carios com graos de quartzo, semelhantes aos das forma~oes que afloram a suI da Praia do Guincho, que a erup~ao foi post-cenomaniana. o limite superior nao e possivel determina-lo. Considerando a composi~ao da rocha - bas alto limburgitico - reconhece-se a sua pouca vulgaridade nas forma~oes basaIticas dos arredores de Lisboa.

Associando, agora, a composi~ao mineralogica com 0 facto de se encontrarem, com bastante frequ~ncia, na rocha que constitui 0

cimento da brecha, palhetas de biotite, somos levados a lembrar­-nos da existencia de limburgitos no Algarve (6.800 metros a N. N. E. da Mexilhoeira Grande) bastante semelhantes a rocha descrita. Nos limburgitos do Algarve, a exist~ncia de fenocristais de biotite e de hornblenda da-Ihes urn caracter especffico.

o filao doleritico da Praia da Crismina, tambem post-ceno-

167

maniano, pois atravessa as formacoes deste andar, leva-nos a admitir fases diferentes de actividade vulcanica na regHlo referida: uma correspondente a emissao de lavas que originaram rochas doieriticas, outra correspondente a emissao de basaltos limbur­giticos.

A proximidade da chamine do Guincho em relacao a Serra de Sintra e 0 caracter limburgitico do basalto, dao a,quele aparelho vulcanico interesse notavel, reconhecEmdo-se a necessidade de pro­ceder ao estudo quimico da rocha, 0 qual podera fornecer novos elementos para comparacao com as formacoes do manto basaltico da regiao de Lisboa e, alem disso, com as formacoes da orla meri­dional.

BIBLIOGRAFIA

1. TORRE DE ASSUNI;AO, C. F. - Cristalizac;ao-diferenciac;ao do magma basal­tico (Observac;oes em rochas portuguesas) - Lisboa, 1937.

2. MACHADO E COSTA, A. - Vestlgios da acidentac;ao vulca.nica. Boletim do Museu e Laboratorio Minera16gico e Geo16gico da Universidade de Lisboa, n.OS 7 e 8 - 1938-40.

3. MACHADO E COSTA, A. - Acidentes vulca.nicos portugueses. Boletim do Museu e Laborat6rio Minera16gico e Geologico da Universidade de Lisboa, n.· 6-1937.

4. PEREIRA DE SOUSA, F. L. - Algumas rochas eruptivas das orIas mesozoica e cenozoica de Portugal- Boletim do Museu e LaboraiOrio Minera16-gico e Geologico da Universidade de Lisboa, n.O 1- 1931.

5. TORRE DE ASSUNI;AO, C. F. - Sobre a petrologia das formac;oes eruptivas do Algarve. - Boletim do Museu e Laboratorlo Mineralogico e Geo16gico da Universidade de Lisboa, n.OS 7 e 8 -1938-40.

6. FLEURY, E. e CABRITA, C.- Um vulcao perto de Lisboa entre Morganhal e Laveiras. Tecnica, n.OS 1 e 2 -1.a Serie, Lisboa 1925-1926.

7. ROGER, F. AND KERR, P. F. - Optical Mineralogy, pag. 265. Londres, 1942. 8. ZBYSZEWSKI - Panorama sur la geologie de la ville de Lisbonne. Bole­

tim da Sociedade de Geografia de Lisboa, 65 Serie, n.OS 9 e 10 -1947.

F. REAL - Chamine vulcanica do Ouincho EST. I

F .g. 1 - Vista geral da parte central da ehamine da Praia Grande do Guincho, destacando·se ao tundo 0 Cabo da Roca e as arribas da Serra de Sintra.

F ig. 2 - Pormenor da zona brechOide da chamine da Praia Grande do Guincho. Destaca-se um bloco de calcario que apresenta torte mar­moriza9ao. A brecha engloba, tambem, peda90s de calcario negro, de menores dimensoes, e uma rocha muito alterada de diticil deter­min a(,ao. Contem, ainda, graos de quartzo em alguns pontos.

F. REAL - Chamine vulcanica do Ouinclzo EST. II

. Fig. 3 - Basalto lirnbtwgitico da Praia G1'ande do Guincho - Destaca-se da pasta urn belo cristal de oli vina, em sec~ao paralela a (100), muito fresco. Os graos de magnetite sao abundantes, reconhecen­do-se a pobreza de microlitos de f·eldspato . Sern analisador. ex 27).

F. REAL - Clzamine vulcanka do Ouincho EST. III

F ig. 5 - Basalto dole/'itieo da Praia da C,'is1nina - Piroxena mostrando maclas lamelares mlUtiplas (001) e maclas simples (100). VEl-se ainda, no canto inferior direito, urn fenocristal de olivina quase totalrnente alterado. Nicois cruzados.. ( X 54).

Fig. 6 - Basalto dole"itico da Praia da Cris1nina - Fenocristal de augite,

F. REAL - Chamine vulctinica do Ouincho EST. IV

Fig. 7 - B asalto doieritico da Praia da Crismina - Fenocristal de feIds­p at o zona do, traduzindo comp osi<;ao quimica diferente no Dllcleo e nas orias. Nicois cruzados. ex 54).